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Catálogo - UM CORPO NO AR PRONTO PRA FAZER BARULHO - 2018_2019

Exposição produzida como fruto do projeto "Trampolim: mergulho para jovens artistas" em parceria com o núcleo de ação educativa do MAC|GO durante o ano de 2018.

Exposição produzida como fruto do projeto "Trampolim: mergulho para jovens artistas" em parceria com o núcleo de ação educativa do MAC|GO durante o ano de 2018.

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Programa Trampolim: mergulho para jovens artistas

O programa “Trampolim: mergulho para jovens artistas” foi criado junto com Núcleo de Ação Educativa do

MAC-GO, com o intuito de constituir um lugar de convergência e troca de experiências sobre a produção em

artes visuais contemporâneas de jovens artistas na região metropolitana de Goiânia. Por meio de um programa

intitulado “Trampolim”, nome criado a partir da imagem do trampolim do Lago das Rosas, hoje um

monumento tombado como representante do estilo Art Déco da cidade de Goiânia. Tomado por seu potencial

metafórico de representar um salto rumo ao mergulho no campo das artes visuais, nos permitindo um

aprofundamento na cena local e, consequente, contato com artistas e produções não inseridas nas superfícies

dos circuitos já instituídos.

A convocatória para esta ação foi destinada a artistas que já possuíam uma trajetória e produção, dispostos a

participar do programa em três fases: 1ª) Uma visita aos ateliês dos artistas; 2ª) Seminário para

compartilhamento poético realizado no Centro Cultural da Universidade Federal de Goiás - UFG e 3ª)

Exposição na Galeria D.J Oliveira do MAC. Sob a orientação do curador Raphael Fonseca e da equipe do

programa, os artistas tiveram a possibilidade de apresentar suas pesquisas poéticas e sua produção,

possibilitando por meio das discussões e questionamentos.

Orientado por um pensamento metodológico que reforça o valor artístico do processo, na tentativa de pensar

de modo integrado todas as etapas da pesquisa em artes visuais, planejamos ações durante o programa que

dessem suporte ao artista, avaliando e contribuindo com sua formação em diferentes momentos do processo

criativo.

Durante todas as etapas do programa, percebemos o quanto ações como estas são importantes para a

formação de um setor cultural mais dinâmico, conectando várias etapas da produção de artes visuais: seleção,

formação, produção de obra, montagem e exposição. Este modo mais estendido do projeto possibilitou a

criação de um vínculo maior entre os participantes, fazendo surgir deste encontro outras parcerias e

produções. Porem outros fatores que surgiram ao longo do percurso fez com que o cronograma original fosse

modicado.

A intenção do programa sempre esteve pautada em uma perspectiva de acompanhamento educacional do

artista, neste processo era importante construir um percurso didático dos selecionados, que conduzisse os

participantes do seu universo criativo e de pesquisa em uma trajetória de publicitar gradualmente suas

produções. Deste modo o intuito da fase intitulada “Ateliê” se constituiu por meio de um encontro

individualizado com cada um dos artistas selecionados, para que seja alargado o encontro e a escuta sobre o

campo de investigação visual de cada um, para que a curadoria compreenda os repertórios e a profundidade

investigativa de cada artista para traçar o caminho e a conguração para o projeto expositivo ao término do

programa.

O seminário, abertos para convidado foi realizado no Centro Cultural da Universidade Federal de Goiás -

CCUFG, localizado no setor universitário. A proposta didática desta etapa estava pautada em ampliar os

olhares para os trabalhos desenvolvidos pelos artistas, deste modo convidamos um grupo de prossionais

ligados às artes visuais para acompanhar as apresentações e conferir argumentos a respeito dos trabalhos

apresentados. O programa convidou: produtores culturais, curadores, pesquisadores, artistas visuais,

educadores, conservadores de museus, gestores de museus, colecionadores, entre outros prossionais. Esta

profusão de conhecimentos possibilitou um ambiente diverso e com inúmeras contribuições a respeito dos

trabalhos apresentados.

Em m a etapa dedicada a exposição mantem a tônica e a ênfase neste modo de aprender com o processo, em

um diálogo constante com os artistas para denir juntos e de modo democrático sobre a montagem e

diagramação dos trabalhos no espaço expositivo, compreendendo este momento como parte do processo de

criação, descobrindo e inventando estratégias para uma melhor apresentação dos trabalhos selecionados.

Mantendo uma comunicação que reforça sempre o caráter democrático e educacional da exposição, por meio

de recursos que possam apresentar a exposição como parte de um circuito pedagógico e de capacitação

prossional evidenciando o processo, ou que possa minimamente sinalizar o empenho da pesquisa que

culmina no espaço do museu.

Assim acreditamos que o projeto para a exposição consolida e marca na história do MAC para a entrada não

apenas de novos artistas, mas, também de um novo pensamento sobre a função social dos espaços

museológicos, precisamos pensar o compromisso destes aparelhos culturais em fazer uso de suas

legitimidades para fortalecer a produção cultural local.

É importante também lembrarmos sobre o poder simbólico de se instalar nesta arquitetura, ocupando este

espaço de tantas disputas de poder e de tamanha legitimação, gera sem dúvida algumas tensões sob os

lugares de controle e autoridade, que durante muito tempo esteve preservado de qualquer questionamento.

No entanto é necessário neste momento histórico revisitar as memórias institucionais, identicar as ausências

e silenciamentos políticos que se mantiveram até agora. Acreditamos que o projeto “Trampolim” nos ajuda a

fazer esta pergunta: “de quem e para quem é este museu?”

O exercício de repensar o lugar histórico da arte e das instituições públicas de preservação da memória, deve

vir acompanhado de um pensar o futuro destes lugares, pois este movimento é também sobre o nosso futuro.

Gilson Andrade

Coordenador Educacional do Museu de Arte Contemporânea de Goiás

Já na segunda fase, 2 meses após o primeiro encontro, compreendendo que este período seria suciente para

o avanço na produção dos trabalhos artísticos, criando maior segurança para uma apresentação mais ampla a

respeito das pesquisas em processo. Esta comunicação foi planejada para acontecer como uma espécie de

seminário / leitura de portfólio, onde organizados por mesas cada artista teve um tempo determinado para

comunicar sua pesquisa, as apresentações aconteceram durante dois dias.



Um corpo no ar pronto pra fazer barulho

Todo trampolim é feito para impulsionar o nosso corpo para o alto e por vezes pra frente – sejam aqueles

usados nos saltos ornamentais olímpicos ou uma cama elástica, eles são um convite para sairmos da solidez

do chão e uma lembrança da certeza da gravidade. Esta exposição realizada é o resultado de um salto coletivo

– desde abril desse ano tenho o prazer de saltar junto aos onze artistas aqui presentes. Cada um projeta o corpo

à sua maneira e em uma velocidade diferente.

Após um concorrido edital, esse projeto esteve baseado primeiramente em uma visita a cada um de seus

ateliês-casas e depois um seminário em que todos apresentaram seus trabalhos e debateram coletivamente.

Oito meses separam nosso primeiro encontro e essa exposição, porém o nosso enfoque sempre foi o mesmo: a

experimentação.

Como em qualquer salto ornamental, por mais que se treine excessivamente, nada é capaz de prever o splash

nal. O mesmo pode ser dito a respeito das pesquisas em artes visuais; interesses ans podem levar a

resultados muito diferentes e, longe de buscar um “sucesso”, todos aqui anseiam por pensar e experimentar.

Cada artista que participou desse processo foi especialmente convidado a apresentar mais de um trabalho na

exposição nal. Se a experimentação era a nossa força-motora, porque também não encarar esse mostra como

a possibilidade de, perante o público, ocupar cada canto da Galeria D. J. Oliveira? Tentar agrupar e criar

paralelos entre suas poéticas é certamente um exercício desaador e ao mesmo tempo elucidativo do que

vivenciamos juntos.

Muitos desses artistas lançaram seu olhar para as noções de casa e domesticidade. Manuela Costa realizou

uma série de trabalhos a partir do estranhamento de um espaço que não era o seu – uma casa alugada onde

fez uma autoresidência – e de uma série de correspondências trocadas entre si e o seu inconsciente. Vídeo,

objetos e textos compõem o seu quebra-cabeça poético que sempre traz ao público um caráter enigmático.

Enquanto isso, Lina Cruvinel seguiu com sua pesquisa por meio da pintura em torno de narrativas geradas a

partir das visitas de banheiros de pessoas conhecidas. O desejo de reconstituir o espaço do outro pouco a

pouco cede espaço à exploração formal de detalhes que levam a sua pintura a um colorismo que causa

impacto. Talles Lopes também se interessa pelo espaço doméstico, mas desde uma perspectiva histórica – o

que levou os moradores de bairros populares de diversas regiões do Brasil a se apropriarem das colunas que

compõem a icônica arquitetura do Palácio do Planalto, em Brasília? Quais os limites entre a arquitetura ocial

de um país e seu uso kitsch? Do micro para o macro, o lar é um motivo de pesquisa para todos esses artistas.

Outros artistas, enquanto isso, se interessam mais pelas relações entre os objetos, o espaço público e o mundo

do trabalho que conuem em Goiânia. Ana Flavia Marú explora os muitos tipos de voyeurismo desde sua

janela – sejam os trabalhadores que dormem nas obras do prédio ao lado, sejam os vendedores da sua

calçada. Os tamboretes que aparecem em suas pinturas podem ser vistos não apenas como um sinal do seu

interesse pelo design popular, mas também como símbolo de resistência ao trabalho e convite ao descanso.

Por sua vez, Carlos Motta Morais também lança seu olhar para objetos especícos como a rede de dormir, os

cabos elétricos que ligam uma televisão de tubo e as enxadas. Longe de serem documentos, seus trabalhos os

inserem em narrativas ccionais desenhadas que transformam a banalidade de seu uso rotineiro em algo que

beira o fantástico. Por m, Carlos Monaretta traz para o espaço institucional algo da sua rotina no espaço

público – junto a um skate e duas partes da mesma rampa, deixa suas marcas desenhadas no espaço. O

público é convidado a imaginar essa ação rápida e expressiva, assim como suas fotograas de um corpo que

trabalha vendendo sorvetes na cidade também nos abre espaço para a imaginação.

O tempo, os corpos e as possibilidades de narrativas parecem ser o ambiente de reexão para outros artistas

presentes no projeto. Benedito Ferreira se utiliza da memória familiar recente para dedicar uma série de

colagens com remédios para sua avó. Se seus outros trabalhos não lidam de maneira tão direta com a memória

de uma pessoa, ao menos se apropriam de materiais e de metáforas que novamente nos remetem à passagem

do tempo, à infância e ao cerceamento do corpo. Já Hariel Revignet investiga as relações entre diferentes

gerações de mulheres não-brancas que podem ser vistas como antepassadas de sua própria existência. A

sororidade e as redes de afeto entre as mulheres são relembradas em pinturas de diferentes escalas onde os

materiais das belas-artes são fundidos com outras matérias extraídas da organicidade da natureza. Um olhar

atento observará o aspecto de árvore genealógica de sua pesquisa. Hélio Tafner se utiliza de seu próprio corpo

para tocar em questões existenciais dialógicas. Recortes de sua anatomia são fotografados e impressos em

pequenos pedaços de raio-x que convidam o público a percebe-los em contraste com a luz. Um vídeo traz um

repetitivo gesto e som que nos causa estranheza semelhante àquela de encontrar seus pedaços corporais nas

radiograas. Estranhar o corpo do outro é estranhar o nosso próprio.

Por m, compondo o time de onze artistas, Estevão Parreiras e Wander von Wander prosseguem com

pesquisas que aprofundam o uso da materialidade de suas linguagens em grande escala. O primeiro, por meio

da bidimensionalidade, reuniu toda a sua produção recente de desenhos, rascunhos, serigraas e pinturas

compondo uma grande nuvem de trabalhos em um dos cantos da galeria. A relação entre imagem e texto

talvez se congure como algo central na sua pesquisa e o artista parece explorar com destreza os muitos

labirintos que o simples ato de colocar lado a lado uma palavra e um desenho gurativo podem nos levar. Já o

outro artista experimenta a linguagem da abstração geométrica paralelamente nas linguagens da gravura e da

cerâmica. Padrões de desenho se repetem e se modicam aos poucos sendo capazes de se expandir tanto

pelas paredes da galeria, quanto também pelo chão. Logo na abertura da exposição cava claro como a

concentração de cerâmicas no chão convidava o público à interação. As abstrações vindas do artista se

tornam, então, algo de todos que podem intervir e não observar passivamente a sua instalação.

***

Goiás geralmente não é enxergado como um grande centro de produção de arte contemporânea nesse país

continental que é o Brasil. Essa impressão precisa ser revista e essas pesquisas aqui rapidamente comentadas

o conrmam. O estado – para além de seus artistas já reconhecidos – traz uma geração de jovens artistas

articulados que, quando tem o espaço oportuno para mostrarem as suas pesquisas e para serem escutados,

sabem fazer um bom barulho.

Acreditem - este é só o começo.

Raphael Fonseca

Curador





Ana Flávia Marú / sem título / aquarela e nanquim sobre tecido de algodão cru / 200x28cm - 2018

Ana Flávia Marú / Janela / vídeo e edição: Henrique Borela / 5'34” - 2018


Ana Flávia Marú / Carta ao curador / apropriação em objeto, bordado, madeira e tecido de algodão cru / em colaboração com Mathias Monio / 21x21x25 cm -

2018

Ana Flávia Marú / sem titulo / aquarela e nanquim sobre tecido de algodão cru em bastidor / 20cm (cada) - 2018


Benedito Ferreira / A galáxia de minha avó / comprimidos medicinais sobre páginas de livros de capa dura / 274x63cm - 2018 Benedito Ferreira / A galáxia de minha avó / vídeo / 26’ - 2018

Benedito Ferreira / Nenhum / vídeo / 7’ - 2018


Benedito Ferreira / Arquivo morto / pasta envelope com papéis de carta, mesa e cadeira de madeira / dimensões variadas - 2018


Carlos Monaretta / sem título / fotograa impressa em papel fotográco / 40x60cm (cada) - 2016

Carlos Monaretta / Desvio gráco / madeira, ferro e pedra portuguesa /110x300x220cm - 2018


Carlos Mota Morais / sem título (Divereu-o ou de car enrolando) / tamborete, TV CRT e o elétrico / 80x210x50cm - 2018

Carlos Mota Morais / sem título (rede) #1 e sem título (rede) #2 / vídeo, rotoscopia com 225 desenhos em sequência de 10

frames por segundo / 22" (cada) - 2018


Carlos Mota Morais / sem título (Da desenterrância dum buraco que caiu aqui) / MDF, papéis, linha, prego, parafusos e dobradiças / 40x10x9cm - 2018


Estêvão Parreiras / sem título / site specic / dimensões variadas - 2018


Estêvão Parreiras / sem título / site specic / dimensões variadas - 2018


Hariel Revignet / Agombenero ancestrais II / tinta a óleo, acrílica, esmalte e cascos / 250x20cm - 2018

Hariel Revignet / Agombenero ancestrais IV / tinta a óleo, acrílica, esmalte e cipós / 20x30cm (cada) - 2018


Hariel Revignet / Agombenero ancestrais I / tinta a óleo, acrílica, esmalte e cipós / 115x110cm - 2018 Hariel Revignet / Agombenero ancestrais III / tinta a óleo, acrílica, esmalte e cipós / 230x110cm - 2018


Hélio Tafner / Quase tudo aquilo que esmoreceu / imagens impressas sobre chapas de radiograa / 4x4cm (cada) - 2018 Hélio Tafner / Reminiscência intransiente / vídeo / 27" - 2018



Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre tela / 140x70cm - 2017-2018

Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre papel / 85x62cm - 2017-2018

Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre tela / 60x40cm - 2017-2018

Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre tela / 60x40cm - 2017-2018


Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre tela / 100x160cm - 2017-2018

Lina Cruvinel / sem título / acrílica sobre tela / 140x75cm - 2017-2018


Manuela Costa / Foz / vídeo / 3'19" - 2018


Manuela Costa / Óbito / raízes e pedra / 17x18x16cm - 2018

Manuela Costa / Através (somos) / papel, caneta e grate / 30x65,5cm - 2018

Manuela Costa / Solutio / bacias, máscara de gesso, concha e quartzo / dimensões variadas - 2018


Talles Lopes / Construção brasileira / impressão sobre papel / 80x386cm - 2018


Talles Lopes / Projeto para o Museu de Arte Contemporânea de Goiás / acrílica sobre tecido, realizada pelo pintor Jayme sob

encomenda a partir do projeto para o vão do MAC Goiás / 78x130cm - 2018

Talles Lopes / Projeto para o Museu de Arte Contemporânea de Goiás / acrílica sobre tecido, realizada pelo pintor Jayme sob encomenda a

partir do projeto para o vão do MAC Goiás / 80x160cm - 2018

Talles Lopes / A marcha / acrílica sobre tecido / 81,5x160cm - 2018


Wander Von Wander / Composição / cerâmica pentagonal impressão xilográca em placa de argila / 100x200cm - 2018 Wander Von Wander / Navalhas e espinhos / xilograa em papel / 250x300cm -

2018




- Ana Flávia Marú

minha pesquisa, faço com o outro.

quem é o outro? onde está? onde estou?

ali, não dá para saber se está dentro ou fora. O que se abre para outro lugar tem batente de dias corridos, desses que você se apressa

para não chegar atrasado, mas que no meio do caminho sente um cheiro de café passado e perde o rumo. Talvez, pelo leve

desarrumado do que ampara os dias corridos, alguém já esteve por ali. Será que ele entrou ou saiu? Aqui, o que é construído tem

calor, igual o cheiro de café. É desses construídos loooongos, retos, hora estreito, mas ao mesmo tempo amplo. O que tem atrás do

que é construído? O construído que tento dizer é desse que os olhos veem, que a mão sente e a palavra suporta. Talvez lá atrás dele

seja tudo torto, curto, curvo. Será que quem perdeu o rumo acaba se encontra lá atrás? Olhando o construído com olhos que

suportam, palavras que sentem e com mãos que veem? Daqui sinto o calor do café.

- Benedito Ferreira

Notei que meus trabalhos experimentais em vídeo não cabiam nas salas e festivais tradicionais de cinema. Na verdade, nunca me

reconheci apenas como “um artista do cinema”. Acaba que ele é uma das tantas ferramentas que utilizo para a produção de minhas

imagens, essa busca contínua de sentido e forma para as coisas. Segunda-feira eu quero nalizar um vídeo. Na terça eu penso em

fazer uma série de desenhos num papel novo que descobri numa loja de 1,99. Quarta eu acordo com o desejo de criar uma coleção

de objetos coloridos. Quinta eu saio para fotografar o centro de Goiânia... Utilizo essas possibilidades a meu favor e assim vou

construindo meu repertório e ampliando esses inúmeros interesses. Minha pesquisa sempre esteve atrelada a uma observação

diária do cotidiano, a uma realidade que se impõe sobre o gestual e ao manuseio das imagens de arquivo para, com rebeldia e

ironia, transformá-las. Me dei conta de que o grande barato para mim como gente e fazedor de imagens é a valorização de uma

simplicidade e o lance de jogar com quem estiver disponível. Sou apaixonado e sempre estou a m de fazer barulho, mesmo

quando me recolho em silêncio.

- Carlos Monaretta

Durante o meu processo de criação dentro das artes visuais eu passei por diversos interesses e produções. A realização da síntese

(trabalho de arte) muitas vezes é complexa e exige muita reexão sobre o que se está pensando. Nos processos de pesquisa e

estudos eu me deparei com um texto do artista Piero Manzoni, onde o mesmo diz que é necessário chegar a uma própria mitologia.

Comecei a me questionar o que seria essa mitologia, para isso fui atrás do mais supercial signicado de mitologia, apenas o seu

signicado no dicionário. Mitologia é o estudo dos mitos, suas origens, evolução e signicados. Com isso eu comecei a pensar sobre

esses eixos: origens, evolução e signicado. Os trabalhos que apresento na exposição são processos que ocorreram ao pensar sobre

essa mitologia própria. Pois apresento questões que são ligadas a minha origem, evolução e produção de signicados, partindo da

ideia de que o objeto de arte pode ser também uma junção de fragmentos, cacos, signos aparentemente desorganizados, expostos à

produção de sentidos e também de construção de realidades.

- Carlos Mota Morais

O desejo que depende da expectativa, que depende da falta, que depende da completude, que depende da sequência, que

depende da obsessão, que depende dos materiais, que depende do cotidiano, que depende da experiência, que depende

do vazio, que depende do lúdico, que depende do absurdo, que depende da representação, que depende do ciclo, que

depende do desejo que depende da expectativa, que depende da falta, que depende da completude, que depende da

sequência, que depende da obsessão, que depende dos materiais, que depende do cotidiano, que depende da

experiência, que depende do vazio, que depende do lúdico, que depende do absurdo, que depende da representação, que

depende do ciclo.

- Estêvão Parreiras

Uma vez,eu estava viajando, tinha uma queimada na estrada. Era tanta fumaça na estrada que nao dava pra enxergar

nada pra frente de uns 2 metros. Nós tivemos que parar o carro no acostamento, para esperar diminuir e continuar.

Esperamos mas ainda assim, entramos na fumaça. Iamos passando, sabe? Eu olhava para a janela e via vulto de coisas no

meio da fumaça densa. Isso são meus desenhos.

- Hariel Ravignet

Nomear as obras de Agombenero foi umas das formas de manifestar a herança de minha avó paterna. A palavra é Myene,

um dos vários grupos de povos ancestrais que resistem no Gabão , trazendo na linguagem e práticas culturais a memória

de uma África pré-colonização. Pra mim essa palavra evoca o peso e leveza de todos os processos de criação

autobiogeográa que geraram as pinturas e os desdobramentos durante o projeto Trampolim.

A essência do projeto foi buscar reconexão com raízes ancestrais de uma árvore genealógica pensada na perspectiva das

mulheres geradoras. Esse lugar de pesquisa, se criou tentando recuperar uma árvore decepada por violências coloniais,

patriarcais, processos de objeticação e escravização que criaram seivas de sangue. No primeiro momento minha

pesquisa e criação se voltou para o sangue e a dor. Mas enquanto me permiti adentrar em espaços de memória-culturaespiritualidade

ancestral o processo a natureza da árvore se mostrou mais intrínseca aos laços que minhas ancestrais

criaram, de resiliência e permanência. Cada parte de uma árvore é reexo do todo, e toda suas etapas de geração tem

uma poética. Me atraiu signicados e arquétipos femininos ligando árvore e divindades femininas em diversas culturas

afro-diaspóricas-ameríndia.

Fazia parte das minhas produções colagens e pintura, mas nunca tinha integrado antes essas praticas e me interessou a

sobreposição de aspectos da árvores como colagem que acrescenta um aspecto escultural à pintura. A ideia de tencionar

texturas que acrescentassem à representação das mulheres a materialidade dos momentos que vivenciei durante todo o

processo criativo. geração. proteção. Cordões do espaço-tempo. Distanciamentos e conexões. Cura. Os frutos das árvores

decepadas ainda geram novas sementes.


- Hélio Tafner

Persisto em criar como uma maneira de carregar a minha própria sombra e deixo com que ela se torne um projétil para o lado de lá!

Um local inundado de memórias desviantes, distorções e deslocamentos quase invisíveis, que entremeiam e se confundem com

feixes heterogêneos de ocasiões X, outrora Y, reveladas em estruturas superpostas, dispositivos efêmeros, estruturas frágeis, dão

ênfase naquilo que me interpela e me apoia enquanto criador. Morada por onde os motivos extrapolam a maneira de mapear

possíveis confusões cinzentas por terrenos não muito favoráveis, no lugar em que algumas cenas são fabricadas, operando na

integração da impermanência, dando como resultado, passagem para a revelação de novas condições de existência política, me

fazem utuar até aqui.

- Lina Cruvinel

A existência da tinta no quadro é algo complexo, que resulta da relação entre visão e ação. O artista olha o objeto, percebe-o por meio

de seus sentidos, processa sua percepção e a materializa com tinta. Em meu processo pictórico, não há qualquer preocupação de

delidade, apenas tento retratar mediante minha impressão. Evidentemente não há simplicidade nesse processo. O uso que faço da

fotograa como base para a pintura justica-se por mero conforto, mas não é confortável o esforço para entender por que de fato

estou pintando. Por hora sei que me move a necessidade de um embate físico doloroso, cujo começo é instigante e cujo m me é

totalmente desconhecido, que maltrata, mas compõe os sentidos no processo. Com a tinta crio camadas, sobreposições, massa que

se faz presente no espaço. Durante algum tempo acreditei que como pintora era uma mentirosa, anal criava ilusões pictóricas, um

banheiro que parecia banheiro, mas não era banheiro, era pura tinta. Por m percebi que, por mais que engambele o espectador, por

mais que junte tinta branca e preta e de alguma forma consiga criar algo que se compreenda visualmente como uma torneira, há

sobretudo muita sinceridade. A ação de pintar é verdadeira e a pintura é capaz de armar sua presença, seu peso é existente.

Pictoricamente me proponho a representar banheiros, mas quero que esses banheiros sejam sentidos, que o azulejo pareça

molhado, que o tapete pareça macio. Estou em busca da sensação.

- Manuela Costa

Me percebo como uma poeta visual que no exercício de sua natureza busca mergulhar a fundo no ser humano, descosturando e

desamarrando as tênues linhas que separam o cosmo interior da vida exterior. Situada no limiar da consciência, conduzo minha

prática poética como forma de criar sentidos de auto-conexão através de percepções ainda não descobertas ou instauradas. De

caráter essencialmente psicológico, subjetivo e humano, é na profundidade das manifestações da psique que invisto minha

pesquisa poética. Trânsito entre as zonas abissais e a orla da psique, interagindo com meu inconsciente por meio de diálogos

travados através dos meus sonhos e pela troca de cartas. Percorrendo o inconsciente coletivo, símbolos e arquétipos emergem

inspirando-me intuitivamente percepções que me conduzem – ainda que parcialmente – para um desvelar da (in)consciência

humana. Estas percepções se traduzem em obras que possuem uma realidade simbólica própria, que busco manifestar pelos meios

de execução mais apropriados e potentes para sua apresentação poética. Desenho, objeto, instalação, vídeo, fotograa ou pintura –

enquanto artista procuro atender ao que os processos criativos me pedem.

- Talles Lopes

No Atlas do Brasil de 1960, ano da fundação de Brasília, o mapa do país divide-se em leste e oeste pelo meridiano de

Tordesilhas - 1494, como em mapas coloniais. Esse limite, signo da dominação do Leste sobre Oeste, a marcha, narra

sempre um Oeste selvagem ansioso pela redenção civilizatória. O mito colonial de um Oeste a ser disciplinado sob forma de

marcha, constrange a representação do Brasil moderno bem como sua constituição, não seria essa modernidade também

um mito? Se a marcha ainda hoje disciplina a arquitetura do nosso imaginário e dos nossos espaços, o que se mantém

indisciplinar?

Sendo a arte aparelho de levar a signicação das coisas até os limites possíveis, intuir sua prática como exercício da

indisciplina sem ignorar suas contradições é quem sabe se aproximar dessas fronteiras. Marchar é deslocar-se de ponto a

outro, é demarcar um m, um limite, é ser em excesso. Fronteira é o entremeio das coisas que são, é espaço da indenição,

é não ser, arte é fronteira, eu acho. Daí essa aproximação do mundo de tudo que é coxo, tudo que tem talento para não ser,

lembro de Guilherme Vaz dizer, o talento pra não ser é tão importante quanto o talento pra ser, esse não ser é o ser.

- Wander Von Wander.

Nestes trabalhos artísticos desenvolvidos para o Projeto Trampolim/Um corpo no ar pronto pra fazer barulho, passo a

pensar e tencionar a gravura fora do seu suporte tradicional, isto é, a moldura, o papel e sua inserção no espaço

arquitetônico. Objetiva-se com essa pesquisa uma reexão sobre a experimentação das minhas práticas artísticas em

ateliê que propõem diluir as fronteiras da gravura no que diz respeito ao seu suporte. Pensar a gravura fora do suporte da

moldura é pensar a gravura e sua relação com o espaço arquitetônico e seus imbricamentos e a coparticipação do espaço

para a efetivação da obra.

A gravura modular com o pentágono regular não tem moldura de qualquer espécie, não estão separadas do espaço, estão

abertas para o espaço que neles penetra e nele se dá incessantemente. Essa gravura não “imita” o espaço exterior. Pelo

contrario, o espaço participa dela penetra-a vivamente, realmente. É uma gravura que não se passa num espaço

metafórico, mas no espaço “real” mesmo como um acontecimento dele. Não existe mais para mim qualquer separação

entre espaço e obra As gravuras são objetos vivos, ambíguos, acionados pelo movimento constante de uma metamorfose

espacial que, nem bem se faz, já se refaz: absorve, transforma e desenvolve o espaço, incessantemente. Trata-se aqui não

da relação entre o objeto e seu lugar, mas, como o lugar abriga o encontro de objetos e de sujeitos, essa relação pode

igualmente caracterizar uma dialética intersubjetiva.

A gravura na arte contemporânea permite linguagens que se hibridizam, que se fundem, superando assim, barreiras

tradicionais. Recentemente, tenho realizado experimentos de impressões com matrizes xilográcas em placas de argila

criando altos e baixos relevos, abandonando assim o papel e inserindo a impressão de matriz xilográca modular em

placas de cerâmicas.


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