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Monografia - Expressões Subjetivas dos Conflitos Escolares - Assembleias Escolares Valores Pró-sociais e Relações Dialógicas

Minha monografia em Psicologia.

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Faculdade de Ciências da Educação e Saúde – FACES

Curso de Psicologia

Expressões Subjetivas dos Conflitos Escolares - Assembleias Escolares, Valores

Pró-sociais e Relações Dialógicas

João Lucas Vale Giffoni

Brasília-DF

Julho de 2021


ii

Faculdade de Ciências da Educação e Saúde – FACES

Curso de Psicologia

Expressões Subjetivas dos Conflitos Escolares - Assembleias Escolares, Valores

Pró-sociais e Relações Dialógicas

João Lucas Vale Giffoni

Projeto de monografia apresentado à

Faculdade de Ciências da Educação e Saúde

do Centro Universitário de Brasília, como

projeto do trabalho de conclusão do curso de

Psicologia.

Orientadora: Profa. Dra. Luciana de Oliveira

Campolina

Brasília-DF

Julho de 2021


iii

Faculdade de Ciências da Educação e Saúde – FACES

Curso de Psicologia

Folha de Avaliação

Autor: João Lucas Vale Giffoni

Título: Expressões Subjetivas dos Conflitos Escolares - Assembleias Escolares, Valores

Pró-sociais e Relações Dialógicas

Banca examinadora:

___________________________________________________________________________

Professora orientadora: Profa. Dra. Luciana de Oliveira Campolina

___________________________________________________________________________

Profa. Dra. Valéria Deusdará Mori

___________________________________________________________________________

Profa. Dra. Luciana Câmara Fernandes Bareicha

Brasília-DF

Julho de 2021


iv

A João Paulo II,

Defensor da vida e da dignidade humana,

Amigo de todos os povos e nações


v

Agradecimentos

A Jesus Cristo, Sabedoria Eterna e Encarnada. Desde sempre, Filho bem-amado do

Eterno Pai. A partir da encarnação, Filho diletíssimo da Santíssima Virgem Maria.

A Jesus Cristo, meu Amor, meu único e grande Amigo.

À Santa Igreja Católica Apostólica Romana. À Igreja, Construtora da civilização

ocidental. À Igreja, que gerou os primeiros cientistas, os primeiros hospitais e foi a primeira a

declarar Direitos Humanos Universais e a dignidade e sacralidade de toda pessoa humana.

À Igreja, a qual criou as Universidades, pela oportunidade de ser universitário.

A Santo Tomás de Aquino, o Doutor Universal. A Santo Tomás, por articular o melhor

da Filosofia Clássica com o melhor da Patrística, especialmente Aristóteles e Agostinho.

A Santo Tomás, pela filosofia das virtudes, caminho para o aperfeiçoamento humano.

A São João Paulo II, poeta, ator, atleta, padre, papa e filósofo. A João Paulo II, por

extrair o melhor da Filosofia Contemporânea, a Fenomenologia e o Personalismo.

A João Paulo II, marcado pelo sofrimento, sempre sabendo dar respostas de Amor.

A Santa Edith Stein. A Edith Stein, assistente e discípula de Husserl, fundador da

Fenomenologia. A Edith Stein, primeira mulher doutora em Filosofia na Alemanha.

A Edith Stein, pelo desejo de conhecer a Verdade sobre a pessoa e o Sentido da Vida.

Ao Prof. Dr. Fernando Luis González Rey. A González Rey, pela sua vida e obra. A

González Rey, por continuar e aprimorar com maestria a visão sócio-histórica e cultural de

Vigotsky, enriquecendo a visão da pessoa a partir da Subjetividade e da Complexidade.

A González Rey, por sua fortaleza e energia vital, inspiração para meus professores.

À Profa. Dra. Albertina Mitjáns Martinez. A Mitjáns Martinez, companheira e

continuadora da obra de González Rey, com contribuições admiráveis na Educação.

À coordenadora Profa. Simone Roballo. À Simone, pela excelência com a qual

conduziu o curso de Psicologia do UniCEUB, logrando prêmios e reconhecimento nacional.

À Simone, pela sua firmeza e prudência e por ter me gerado profissionalmente.


vi

À atual coordenadora e minha orientadora, Profa. Dra. Luciana de Oliveira

Campolina. À Campolina, por me acompanhar desde o início da graduação e ter sido grande

motivação para eu escolher tanto a Teoria da Subjetividade quanto a Psicologia Escolar.

À Campolina, por me acolher em momentos difíceis e viver um autêntico humanismo.

A todos meus professores da faculdade. A meus professores, aos quais agradeço seus

notáveis conhecimentos e também as relações que estabelecemos, trocas e compartilhamentos

que fizemos. Aos professores que me deram feedbacks e me acolheram ao longo do curso.

A meu colega de turma José Victor Silva Cantanhede. Ao José em particular, por me

ter apresentado as Assembleias Escolares, que mudou completamente minha Monografia e

visão de mundo. Ao José, por seu empenho em ajudar e contribuir nas Monografias de vários

colegas, nos enviando conhecimentos valiosos.

A todos meus colegas de turma da faculdade. A meus colegas, que me ajudaram nas

matérias, mas também na minha contínua construção enquanto pessoa e profissional. A meus

colegas, que me permitiram participar de suas vidas e enriqueceram muito a minha.

A todos meus colegas e professores do Ensino Médio e Fundamental. Alguns já

reencontrei, outros agradeci pessoalmente, outros não mais vi. A meus colegas e professores,

essenciais no meu desenvolvimento humano, subjetivo, e também na minha escolha pela

Psicologia e pela área Escolar.

A meus pais Luis Renato e Theresa Elvira. A meus pais, bases, pilares de toda a minha

vida e formação biológica, social, emocional, intelectual e espiritual. A meus pais, gratidão

eterna pelo dom da vida.

A todos que se empenham em construir uma autêntica Cultura da Vida e Cultura do

Encontro. Uma Educação para Valores e para as Virtudes. A todos que reverenciam a pessoa

humana em sua riqueza infinita e dignidade inviolável.

A todos meu obrigado do mais profundo de meu coração e minha alma.


vii

Apelo ao homem que se tornou o corpo da história

(Wolanie do czlowieka, który stal sie cialem historii)

Eu te invoco e te procuro, homem

Coração e alma, desejo, dor e vontade

O homem no qual se encontram

Do homem a profundidade e o vértice

Cujo íntimo não é peso, nem treva,

Mas somente coração

Homem chego sempre a ti

Indo ao encontro de cada coração, de cada pensamento

Procuro ao longo da história o teu corpo

Procuro a tua profundidade.

trechos do poema de João Paulo II,

o jovem polonês, ator e autor

de poesias e peças de teatro,

Karol Wojtyla.


viii

Sumário

Introdução...................................................................................................................................1

Sociedade em Pandemia: impactos no contexto educacional.........................................1

Conflitos e Violência......................................................................................................2

Violência Escolar no Mundo..........................................................................................7

O Cenário Brasileiro no manejo dos Conflitos e Violência Escolar.............................10

Práticas Pedagógicas Inovadoras..................................................................................13

Assembleias Escolares no Brasil: Ênfase no Protagonismo Juvenil durante o Processo

Educacional em curso...............................................................................................................13

Práticas Pedagógicas Inovadoras em Perspectiva Crítica.............................................15

A importância dos Valores Pró-sociais e a constituição da Subjetividade....................19

Teoria da Subjetividade.................................................................................................21

Processos humanos...........................................................................................21

Processos dialógicos.........................................................................................22

Relações dialógicas..........................................................................................23

Caminho Dialógico para a Construção de Resoluções de Conflitos prevenindo a

Violência Escolar......................................................................................................................25

Objetivo Geral..............................................................................................................26

Objetivos Específicos...................................................................................................26

Justificativa...................................................................................................................26


ix

Método......................................................................................................................................30

Participantes.................................................................................................................31

Procedimentos Éticos...................................................................................................31

Instrumentos.................................................................................................................32

Cenário Social da Pesquisa..........................................................................................33

Processo de Construção e Análise das Informações....................................................35

Análise e Construção das Informações.....................................................................................38

Construções a partir da análise documental..................................................................38

Análise das dinâmicas conversacionais........................................................................43

Pré-pandemia - pós-pandemia...........................................................................44

Relação com a tecnologia, professores e alunos...............................................47

Relação professor - professor e valores............................................................50

Relação professor - aluno e valores..................................................................51

Relação aluno - aluno e valores........................................................................54

Estratégias socioemocionais para o campo virtual...........................................61

Situações de conflito e Assembleias Escolares.................................................64

Conclusão..................................................................................................................................71

Considerações Finais................................................................................................................76


x

Referências ...............................................................................................................................78

Apêndice A ..............................................................................................................................90

Apêndice B ...............................................................................................................................91

Anexo A ...................................................................................................................................93

Anexo B ...................................................................................................................................94

Anexo C ...................................................................................................................................97


xi

Resumo

A escola está passando por mudanças e tendo que enfrentar várias questões da

pós-modernidade, entre elas a pandemia Covid-19. Essas mudanças geram conflitos os quais

podem se tornar violências. Uma boa experiência de resolução de conflitos são as

Assembleias Escolares, as quais promovem valores como diálogo e cooperação. A partir do

olhar da Teoria da Subjetividade, as relações dialógicas se evidenciam como importante

espaço através do qual as pessoas podem produzir e expressar seus sentidos e configurações

subjetivas. O estudo visou compreender as expressões subjetivas de professores sobre os

conflitos existentes na escola, as relações e os valores presentes nesse ambiente. A partir do

método construtivo-interpretativo, foi possível formular indicadores, hipóteses e fazer

construção teórica sobre as relações entre professores e alunos. Os professores participantes

prezam pelas relações interpessoais com os próprios colegas profissionais e isso reverbera nas

relações entre os alunos, favorecendo um bom clima emocional em toda a escola. Foi possível

analisar também os tensionamentos entre a tecnologia e as relações humanas. Além disso, a

pandemia teve grande impacto nas subjetividades individuais e sociais (a pesquisa foi

realizada na pandemia, de Abril a Junho de 2021). Os participantes utilizaram seu potencial

criativo para construir estratégias pedagógicas e socioemocionais para o campo virtual.

Estratégias como música, jogos virtuais, grupos de aplicativo de mensagem etc, as quais se

revelaram eficazes para melhorar as relações no espaço escolar e para lidar com situações de

mediação de conflitos.

Palavras-chave: Psicologia Escolar, Psicologia Educacional, Assembleias Escolares, Teoria da

Subjetividade, Conflitos escolares.


Atualmente, na pós-modernidade, o modelo medieval e posteriormente moderno da

escola (chamado modelo tradicional) está se desestabilizando. Woods (2008) demonstra que o

espaço físico da escola e sua organização tem origens no período medieval. Kelday (2021, no

prelo) analisa a escola pós Revolução Industrial e identifica como a educação passou a ser

guiada por uma lógica industrial e mercadológica. Kelday (2021, no prelo) afirma também

que esse modelo tradicional atualmente está se desestabilizando. Muitas mudanças na

sociedade e no mundo estão acontecendo. Algumas delas tendo iniciado no século XX.

Entre essas mudanças estão as novas tecnologias (Alves, 2016; Body-Gendrot, 2002;

Santos & Oliveira, 2009; Zluhan & Raitz, 2014), a relativização dos valores e tradições

(Fanfani, 2000; LeVasseur, & Tardif, 2004; Zluhan & Raitz, 2014), o sentimento de não

pertencimento a um grupo social de referência, o individualismo (Santos & Oliveira, 2009), a

necessidade de satisfação imediata, as transformações familiares (Amorim, 2019; Peralva &

Sposito, 1997), as novas concepções sobre infância e adolescência (Fanfani, 2000; Zluhan &

Raitz, 2014).

Sociedade em Pandemia: impactos no contexto educacional

A presente pesquisa foi realizada durante o período pandêmico, de Abril a Junho de

2021. A partir de 2020, um fator marcante é a pandemia Covid-19 do novo Coronavírus

(SARS-CoV-2), a qual fechou escolas do mundo inteiro (Schmidt, Crepaldi, Bolze,

Neia-Silva, & Demenech, 2020), obrigando os profissionais escolares a se reorganizarem.

Escolas do mundo inteiro ficaram sem aulas durante determinado tempo, em 2020 e 2021.

Houve uma brusca ruptura em Março de 2020 com o fechamento das escolas (Schmidt et al.,

2020). Elas porém foram se reorganizando e retornando em modalidade remota (virtual),

híbrida (parte virtual e parte presencial) ou presencial (em apenas alguns lugares e momentos

nos quais se permitiu) (Zimmerman et al., 2021). Zimmerman e colaboradores (2021)


2

descrevem essa reorganização escolar, que demorou semanas ou meses em determinadas

regiões e momentos epidêmicos. A pandemia gerou um enorme impacto socioeconômico e

afetou de forma destrutiva a aprendizagem escolar (Unicef, 2021). O ensino remoto

emergencial, principal formato escolar na pandemia, permitiu a continuação do processo de

aprendizagem, porém com vários tensionamentos e problemas de ordem socioeconômica e

educacional (Moraes, Barros, Araújo, Silva, & Negreiros, 2020). Dados da Unicef mostram

que os efeitos são mais desastrosos na América Latina e Caribe. Essas regiões concentram o

maior número de crianças e adolescentes “que perderam um ano escolar de educação

presencial no mundo” (Unicef, 2021, par. 1). Dentre os efeitos desse fenômeno, a organização

destaca: perdas na aprendizagem e no bem-estar de crianças e adolescentes, aumento das

desigualdades sociais e vulnerabilidade social para crianças sem condições de acessar o

ensino remoto, crianças e adolescentes mais vulneráveis às violências familiares ou

domésticas. A organização destaca também o importante papel que o espaço físico da escola

tem, proporcionando serviços de saúde e alimentação para os alunos, os quais também foram

dificultados com o fechamento (Unicef, 2021). Além desses fatores, Guilherme, Becker e

Cheron (2020) evidenciam o impacto psicológico da pandemia, com fortes implicações

emocionais nas pessoas. Nesse sentido, os autores afirmam que a escola pós-pandêmica deve

ser também um espaço de cuidado e acolhimento.

Todas essas mudanças adentraram a escola. A escola está tendo de manejar essas

situações, as quais se chocam com o modelo, os valores e a organização tradicional dela.

Além disso, a lógica da escola vai de encontro com a lógica dos jovens, adolescentes, crianças

e famílias atuais. Há um choque de mentalidades, concepções e desejos, o que gera conflitos.

Esses conflitos podem se degenerar, degradar, corromper e tornarem-se violência (Martins,

Machado, & Furlanetto, 2016; Zluhan & Raitz, 2014).


3

Conflitos e Violência

Há uma distinção entre conflitos e violência. Os conflitos são naturais, frutos das

interações humanas na sociedade. Os conflitos sociais se expressam nas relações e surgem

quando “duas ou mais pessoas ou grupos manifestam a crença de que têm objetivos

incompatíveis (Kriesberg & Dayton, 2012, p. 2)”. As pessoas são diferentes, com desejos,

afetos, propósitos, compreensões e valores distintos, o que gera conflitos. Eles são, portanto,

inevitáveis e, de certa forma, potencializados na contemporaneidade, a qual é marcada pela

diversidade, multiculturalismo, globalização e pluralismo (Araújo, 2008; Kriesberg & Dayton,

2012; Salgado & Ferreira, 2012; Schilling & Angelucci, 2016; Diálogos, 2019; Zluhan &

Raitz, 2014).

Eles podem ser benéficos, produzindo reflexões, mudanças e melhorias nas relações e

no ambiente e são úteis e necessários ao aprendizado (Campos, Dayana, & Jorge, 2010;

Salgado & Ferreira, 2012). Esses são os conflitos construtivos. Nos conflitos construtivos, as

partes envolvidas se servem de meios como persuasão e negociação para chegarem a soluções

mutuamente aceitáveis, mantendo a consideração mútua entre elas e o reconhecimento da

existência do outro e da legitimidade de sua perspectiva (Salgado & Ferreira, 2012). Esses

conflitos devem ser não amenizados e sim manejados, trabalhados, compreendidos, pensados

“a partir de processos reflexivos, educativos, formadores (Diálogos, 2019, p. 75)”. Na escola,

esses processos reflexivos e educativos podem ser instaurados pelo psicólogo escolar (Mitjáns

Martínez, 2010).

Há também os conflitos destrutivos. Nestes as partes se utilizam de meios coercitivos

e violentos, em que uma impõe suas visões à outra. São conflitos em que há dano a pelo

menos uma das partes envolvidas (Kriesberg & Dayton, 2012; Salgado & Ferreira, 2012).

Nesses conflitos, as partes buscam não um acordo e sim a vitória sobre o outro, não a


4

cooperação e sim a competição. Há também a exclusão da perspectiva do outro ou mesmo de

sua existência. Os conflitos então se degeneram em violência, agressividade, força e coerção

(Kriesberg & Dayton, 2012; Martins et al., 2016; Salgado & Ferreira, 2012; Zluhan & Raitz,

2014).

A violência possui uma definição diversa. Há vários tipos de violência dos quais três

se revelam como mais propícios para o tema proposto. Segundo Minayo (1994) há a violência

estrutural, violência de resistência e violência da delinquência.

A violência estrutural é a praticada pelas organizações, instituições, sistemas

econômicos, culturais e políticos, oprimindo grupos e indivíduos, negando-lhes direitos,

gerando discriminação e fazendo com que esses grupos ou indivíduos aceitem como natural

essa negação de direitos ou tratamento diferenciado (Minayo, 1994). Há também, segundo a

autora, a violência de resistência, desses grupos ou indivíduos oprimidos que se opõem e

reagem à violência estrutural de forma agressiva para restabelecer a justiça e igualdade de

direitos. Por fim há a violência de delinquência, aquela que compõe o que a sociedade tipifica

como crime (roubos, assassinatos, furtos, sequestros, tráfico, infrações do trânsito etc). Essa

violência, segundo a autora, também é incentivada pela violência estrutural, a qual corrompe

os indivíduos, facilitando com que eles cometam crimes. A autora ressalta: “o menosprezo de

valores e normas em função do lucro, o consumismo, (...) são alguns dos fatores que

contribuem para a expansão da delinqüência. (Minayo, 1994, p.8)”. As instituições,

organizações, aqueles que deviam ser exemplos se corrompem, menosprezam os valores, a

ética, a moral, o respeito em função de poder, dinheiro, posição social etc, e isso facilita as

demais pessoas se corromperem também e desprezarem os mesmos valores (Minayo, 1994).

A autora Mundim Neto (2017) segue a mesma linha, afirmando que muitas vezes as

organizações dizem seguir valores humanistas, éticos, porém esse suposto humanismo fica


5

apenas no discurso e não na ação. A ação continua sendo anti-humanista, corrompida em seus

valores. A mesma ideia está presente em Branco, Freire e González (2012).

A partir disso, pode-se pensar que a escola é uma das instituições que por vezes gera a

violência estrutural. Os alunos, ao perceberem essa violência, sentindo-se lesados em direitos

que acreditam possuir ou discriminados de alguma forma, podem reagir com a violência de

resistência ou violência da delinquência. Essas duas últimas violências serão vistas pela escola

e punidas, enquanto a primeira, a violência estrutural, passará despercebida ou, por vezes,

legitimada na instituição. Essa visão dos problemas escolares como causados quase

exclusivamente pelos alunos mostra-se comum na visão de Penna-Moreira (2007) e Barbosa e

Marinho-Araújo (2010). A escola muitas vezes culpa os “alunos-problema”. A Psicologia

Escolar, no entanto, tem importante papel nessa mudança de olhar e pode trazer reflexões para

a escola sobre suas práticas em perspectiva crítica e construtiva (Mitjáns Martínez, 2010).

A violência estrutural está, portanto, ligada às relações de poder existentes na escola,

às autoridades que proporcionam relações verticalizadas para com os alunos. Foucault

(1979/2014) afirma que a partir do século XVIII instituições como a escola e o hospital

começaram a ser reorganizadas de forma muito diferente ao que era antes. Surge a técnica da

disciplina, que é o esquadrinhamento, a disciplinarização. Ela consiste em submeter cada

indivíduo a uma “pirâmide de olhares (Foucault, 1979/2014, p. 58)”. Esses olhares vigiam

todos os comportamentos dos indivíduos a todo momento, para garantir que cada gesto da

pessoa seja conforme o esperado pela instituição. O professor vigia o comportamento do

aluno, presta atenção nos mínimos gestos, registra o comportamento identificando o aluno,

reporta ao coordenador, o qual por sua vez reporta ao diretor.

Na escola, a disciplina, através desse monitoramento perpétuo, começou a se expressar

pela distribuição espacial dos alunos. Se antes estavam amontoados, agora cada aluno tem um


6

espaço individualizado na sala, um “quadrado” do qual não pode sair e é vigiado a todo

instante para garantir que desse espaço não saia (Foucault, 1979/2014).

Essa disciplinarização dos corpos também se expressa nas anotações que os

professores fazem sobre cada aluno, nas regras estabelecidas no contexto escolar como a de

que o aluno tem de pedir permissão ao professor para ir ao banheiro. Também se expressa no

fato de o aluno não poder conversar com os colegas, ter de ficar parado, em silêncio, sentado,

prestando atenção no professor e anotando a matéria. Qualquer mau comportamento, dever

não feito, má conduta, o professor faz um registro e pode até comunicar seus superiores ou os

pais do aluno. Esse registro contínuo e a comunicação da singularidade, da subjetividade de

cada indivíduo até o topo da pirâmide disciplinar (no caso da escola, a direção), é, segundo

Foucault (1979/2014), uma implicação da disciplina.

O mesmo autor ainda afirma que o instrumento principal da disciplina é o exame.

Segundo ele “o exame é a vigilância permanente, classificatória, que permite distribuir os

indivíduos, julgá−los, medi−los, localizá−los e, por conseguinte, utilizá−los ao máximo

(Foucault, 1979/2014, p. 58)”. Na escola, o exame (sejam os testes para avaliar o conteúdo,

sejam as avaliações atitudinais) permitem identificar o aprendizado de cada aluno, como cada

aluno entendeu ou não o conteúdo, a linha de pensamento, a forma como ele desenvolve seu

raciocínio, também classificá-los como bons ou maus alunos e analisar seus comportamentos

em sala de aula, cada gesto, para medi-los, julgá-los.

Foucault (1975/1999) destaca que esse julgamento classificatório implica em: divisão

binária e determinação coercitiva. A divisão binária consiste em dividir os alunos em dois

grupos (bons e maus alunos, comportados e não comportados, normais e deficientes,

tranquilos e agitados, inteligentes e não inteligentes etc). A determinação coercitiva está na

decisão de professores, coordenadores e diretores sobre o que fazer com o aluno, determinar


7

em que lugar o aluno deveria estar e como se pode vigiá-lo constantemente.

Fanfani (2000) destaca que essa lógica da escola, explanada historicamente por

Foucault (1975/1999, 1979/2014), tipificada como violência estrutural à luz do pensamento

de Minayo (1994) e confirmada como atual e recorrente por Penna-Moreira (2007) e Barbosa

e Marinho-Araújo (2010) entra em conflito com a lógica dos jovens e adolescentes, os quais

se opõem às propostas da escola e resistem a elas, fazendo com que os conflitos degenerem

em violência. Essa é agora uma violência de resistência ou delinquência, chamada no contexto

escolar de indisciplina, violência e bullying.

De acordo com Sebastião, Alves e Campos (2003) indisciplina é um ato mais leve e

diz respeito aos comportamentos incorretos e incivilidades que ocorrem na escola. A violência

no contexto escolar é mais grave e se refere à agressividade física ou verbal. Já o bullying é

ainda mais grave e conceitua-se como agressão sistemática, continuada e intencional. Alves

(2016) ressalta, porém, que na prática esses três tipos se misturam e constantemente são

tratados como semelhantes pela mídia, governo e sociedade.

Violência Escolar no Mundo

Esses três elementos (indisciplina, violência e bullying) existem há muito tempo na

escola e estão presentes em todo o mundo (Alves, 2016). São feitas várias pesquisas em

diversos países sobre a violência escolar. A OECD (Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Econômico) publicou os resultados da pesquisa TALIS (Pesquisa

Internacional de Ensino e Aprendizagem) feita em 2013. Foi realizada com 200 escolas,

aproximadamente 4.000 professores do Ensino Médio e 200 diretores, em mais de 30 países

(OECD, 2014; 2015). Em 2018 foi feita uma outra TALIS pela OECD com 15.000 escolas,

260.000 professores em 48 países (OECD, 2020).


8

Na TALIS 2013 foram possíveis de se identificar várias situações escolares. Ela

mostrou que no Brasil mais de 60% dos professores de Ensino Médio dizem que mais de 10%

de seus alunos possuem problemas de comportamento na sala de aula, sendo o país que mais

professores dizem ter alunos com problemas de comportamento (OECD, 2015). Em outro

dado verificado pela pesquisa, foi verificado que quanto mais desafiadora a sala de aula, mais

tempo se gastará para colocá-la em ordem (OECD, 2015).

Na TALIS 2018, verificou-se que professores experientes possuem um arcabouço

maior de estratégias, habilidades de ensinar e avaliar os alunos, sabendo melhor manejar a

sala de aula (OECD, 2019). Essas habilidades são conquistadas pela experiência. Voltando na

TALIS 2013, a pesquisa buscou verificar qual fator explica melhor a disciplina em sala de

aula, o controle disciplinar. Esses dados se encontram na Figura 1.

Figura 1. Distribuição da variação da disciplina em sala de aula no Ensino Médio através dos


9

três níveis: páis, escola e professor. 1

Foi identificado que o clima disciplinar, o clima de sala de aula (o quanto a sala de

aula está bem controlada e ordenada) é explicado 84% por cada professor individualmente,

7% pela escola e 8% pelo país (OECD, 2014). Isso indica que há poucas diferenças entre

professores de países ou escolas distintas, porém há grandes diferenças entre professores de

um mesmo país e professores de uma mesma escola. Em uma mesma escola, um professor

pode conseguir controlar bem a sua sala de aula e outro professor não. O controle disciplinar

da sala de aula depende das estratégias disciplinares e pedagógicas utilizadas pelo professor

(OECD, 2014), corroborando os dados da TALIS 2018 explanados anteriormente, de que

professores experientes possuem mais habilidades para lidar com alunos-problema.

Ao fazer uma leitura crítica desses dados, é possível resgatar a visão de Foucault

(1975/1999, 1979/2014) de que a escola se baseia e está estruturada na disciplina, no controle

disciplinar. Manter a ordem e a disciplina em sala é fundamental na visão da escola e dos

professores para lidar com os comportamentos indesejados.

É possível dizer, a partir dos dados da TALIS 2013 e 2018, que professores que

possuem maior experiência com alunos que têm problemas de comportamento (o que pode

incluir indisciplina/violência/bullying) são professores que em geral conseguem lidar melhor

com esses alunos e esses comportamentos, desenvolvendo mais estratégias e habilidades

pedagógicas e mantendo um maior controle disciplinar em sala.

Em contraposição, a pesquisa TALIS 2013 enfatizou que há um país que mais se

destaca negativamente dentre os outros: o Brasil (OECD, 2014, 2015). Na TALIS 2013 o

Brasil foi o país que mais relatou possuir alunos com problemas de comportamento. Foi

também um dos países que mais disse gastar tempo em sala colocando ordem (23% do tempo

1

Fonte: OECD, TALIS 2013 Database (tradução livre).


10

de aula em média). Ao pegar essa média e ver a variação entre o que os professores brasileiros

falaram, 25% dos professores dizem gastar entre 10-15% do tempo de aula mantendo a

ordem. Outros 25% relataram gastar entre 15 a 30% do tempo de aula.

Essa variação chegando a 30% do tempo de aula gasto não foi encontrada em nenhum outro

país, a maioria só se estende até 20% do tempo de aula (OECD, 2014). A pesquisa TALIS

2013 com isso afirma que as situações são particularmente problemáticas no Brasil, no qual

mais da metade dos professores de Ensino Médio relataram que: perdem muito tempo por

causa de problemas de comportamento, perdem muito tempo esperando os alunos se

assentarem, e na aula há muito barulho perturbador (OECD, 2014).

O Cenário Brasileiro no manejo dos Conflitos e Violência Escolar

O cenário brasileiro se mostra então preocupante, até mesmo internacionalmente, pela

quantidade e intensidade dos conflitos e violência. Ciente dessa situação, vários projetos e

políticas públicas foram feitas no Brasil para melhor manejo dos conflitos e violência escolar.

Um exemplo de projeto é o do Estado de São Paulo. Desde 2010, a Secretaria de Estado da

Educação de São Paulo (SEE-SP) implantou o programa Sistema de Proteção Escolar (São

Paulo, 2010). Esse programa consiste em estabelecer professores mediadores comunitários

(PMECs) para prevenir, mediar e resolver conflitos na escola. São professores adidos (que

não lecionam, porém estão na escola) e ficam responsáveis especificamente por essa função

de resolução de conflitos. O programa foi implantado em escolas públicas de São Paulo as

quais possuem casos consideráveis de conflitos e estão localizadas em áreas de

vulnerabilidade social e risco (São Paulo, 2010). A aplicação do programa está crescendo no

Estado de São Paulo. Em 2015, houve um aumento de 50% da adesão das escolas públicas ao

programa, em relação a 2010 (Martins, Machado, & Furlanetto, 2016).


11

As autoras Martins, Machado e Furlanetto (2016) fizeram uma pesquisa qualitativa

com 49 professores mediadores comunitários (PMECs) de diversas escolas públicas de São

Paulo que aplicaram o programa. Os PMECs relataram que a maioria dos problemas é

causada por alunos, como oposição à autoridade do professor e à instituição escolar. Pode-se

dizer então que a maioria da violência dos alunos nessas escolas se enquadra na violência de

resistência, uma forma de se opor à violência estrutural da escola (Minayo, 1994). Entre os

problemas que os PMECs destacaram, estão: uso de drogas por meninas grávidas, homofobia,

bullying e namoro na escola.

A partir do trabalho de mediação de conflitos, os PMECs disseram ter conseguido:

diminuir os conflitos, as faltas, o bullying, a depredação, a gravidez na adolescência. Além de

diminuir problemas, os professores mediadores comunitários falaram que a partir de suas

atuações houve melhorias: no rendimento escolar, no relacionamento entre alunos, no

relacionamento de alunos, professores e funcionários (Martins et al., 2016).

Esses professores relataram suas experiências enquanto mediadores de conflitos.

Algumas dessas experiências foram: a partir da presença dos PMECs, uma escola começou a

parabenizar os aniversariantes, elogiando-os; outra PMEC disse ter conseguido resgatar 5

crianças de 10 anos que estavam nas drogas; houve também uma importante parceria com a

família em casos de uso de drogas; em uma escola fizeram campanha de solidariedade para

ajudar um aluno em vulnerabilidade social extrema. Outras experiências mais complicadas

foram: acionar o Conselho Tutelar/Ronda Escolar quando um aluno levou uma arma de fogo

para a escola, que ele utilizaria se sua namorada terminasse o namoro; casos de abuso sexual

que resultaram na perda da guarda da criança pelos pais (Martins et al., 2016). As ações

protagonizadas nessas escolas pelos PMECs poderiam ter sido encabeçadas pela Psicologia

Escolar, em uma perspectiva de atuação conforme Mitjáns Martínez (2010). A Psicologia


12

Escolar poderia trabalhar em uma perspectiva de prevenção das violências, trabalhando de

forma coletiva temas como bullying, uso de drogas, educação sexual etc (Mitjáns Martínez,

2010), de forma contextualizada. Uma ação reflexiva a qual considere a violência estrutural

da escola (Minayo, 1994).

Na mesma pesquisa de Martins e colaboradoras (2016), os PMECs disseram quais

dificuldades encontraram em seu trabalho. Afirmaram que: às vezes há falta de apoio dos pais

no trabalho dos PMECs; alguns professores também são descrentes no diálogo e acreditam

mais na punição, alegando que o diálogo retira sua autoridade. Outro problema relatado é a

falta de infraestrutura: falta de sala para receber os alunos e falta de computadores para o

PMEC poder trabalhar. É possível perceber com isso a valorização do sistema disciplinar da

escola presente nos professores e possivelmente também na família. A valorização da

punição, da imposição das regras de comportamento, das relações verticalizadas

professor-aluno, e do professor como detentor das decisões sobre o aluno (Foucault,

1975/1999, 1979/2014).

Os PMECs, ao contrário, acreditam no diálogo. Na pesquisa disseram ser necessário:

saber ouvir, ter humildade, acolher e conversar. Ao mesmo tempo, disseram ser igualmente

importante ter um posicionamento seguro diante de situações graves. Em geral, as

experiências dos PMECs se mostram positivas. Eles falaram ainda que possuem credibilidade

e a confiança dos alunos, pois, quando há um conflito, muitos alunos os procuram antes

mesmo dos professores. Esse trabalho garante atendimento imediato às demandas de conflito

por meio do diálogo, buscando impedir de os conflitos degenerarem em violência. No entanto,

eles também relatam impotência e indecisão em alguns casos, ressaltando a falta de escuta do

outro como um expressivo problema (Martins et al., 2016).

A atuação dos professores mediadores comunitários em São Paulo foi respaldada pelo


13

programa Sistema de Proteção Escolar da SEE-SP. As autoras afirmam que os programas,

reformas, projetos etc que são feitos no âmbito escolar têm como objetivo preservar o modelo

tradicional de ensino-aprendizagem, o qual já está esgotado e não faz mais sentido para os

alunos. Fazendo uma leitura crítica desses programas, as autoras alegam que eles oferecem

“mais do mesmo (Martins et al., 2016, p. 587)”.

Práticas Pedagógicas Inovadoras

Frente a isso, as autoras da pesquisa, bem como outros autores, ressaltam a

importância atual das novas modalidades de ensino, metodologias ativas, práticas pedagógicas

inovadoras (Martins et al., 2016; Rose, Afonso, Bondioli, Gonçalves, & Prezenszky, 2016).

Alguns exemplos de escolas com pedagogias diferentes são: Escola Waldorf, Escola da Ponte,

Iasnaia Poliana, Escolas Montessorianas etc (Alternative Education Resource Organization

[AERO], 2020; Instituto Lasneaux, 2020; Marangon, 2004; Montessoriana, 2020; Sociedade

Antroposófica do Brasil [SAB], 1998). Essas práticas permitem que o aluno tenha um papel

mais ativo em seu processo de ensino-aprendizagem, valorizando uma aprendizagem na qual

os alunos são os protagonistas. Uma aprendizagem não centrada no cognitivo. Valorizando

também as relações, o experiencial, não uma simples recepção ou acúmulo de conteúdos.

Uma aprendizagem mais compreensiva e criativa e menos reprodutiva-memorística (Mitjáns

Martínez & González Rey, 2017a).

Assembleias Escolares no Brasil: Ênfase no Protagonismo Juvenil durante o Processo

Educacional em curso

Entre essas práticas que se utilizam de metodologias ativas, colocando alunos no

protagonismo de seu processo de aprendizagem, estão as Assembleias Escolares. As

Assembleias Escolares já estão presentes em algumas escolas de São Paulo e também


14

internacionalmente, em países como Inglaterra e Portugal. No Brasil, elas são vistas de forma

muito positiva pelo Ministério de Educação (MEC). O Ministério em 2005 fez um

documentário sobre as Assembleias e em 2007 um documento sobre o protagonismo juvenil,

incentivando as assembleias e orientando o passo a passo de como implementá-las nas escolas

brasileiras (Brasil, 2007; Gosuen, 2005). As Assembleias Escolares visam um papel mais

ativo nos alunos, maior participação deles nas decisões escolares, além de desenvolver a

cidadania (Araújo, 2008). Os alunos também são protagonistas na resolução de conflitos

escolares.

As Assembleias Escolares se dividem em: assembleias de classe, assembleias de

escola e assembleias docentes. Nas escolas que implantaram essas assembleias, um professor

e toda a classe se reúne uma vez por semana durante uma hora para dialogar sobre os conflitos

específicos daquela sala de aula, são as assembleias de classe. Há também as assembleias de

escola, uma vez por mês, com os representantes de cada classe, alguns docentes e

funcionários, para tratar sobre assuntos da escola que extrapolam a sala de aula. Há também

as assembleias docentes com o corpo docente, a direção e eventualmente representantes da

Secretaria de Educação (Araújo, 2008).

As assembleias escolares se pautam na democracia participativa, no diálogo como

forma eficaz de resolver conflitos. Elas valorizam as diferentes opiniões, buscando formar

uma consciência cidadã nos alunos de respeito, igualdade, descentralização de si para olhar o

coletivo, se importar com o outro, com o social. As assembleias não necessariamente

objetivam chegar em um consenso, mas ao menos lidar com o dissenso de forma não violenta

(Araújo, 2008; Schilling & Angelucci, 2016).

Essas assembleias são aplicadas em algumas escolas do Brasil, como foi apresentado

anteriormente, e estão dando resultados. Em uma pesquisa de Araújo (2008) realizada entre


15

1999 e 2003, os próprios alunos de escolas pública e privada de São Paulo expuseram o que

acharam das assembleias escolares. Alunos e alunas relataram que, antes das assembleias:

“tinha muita violência, eles xingavam, batiam e até ameaçavam”; “quando as crianças tinham

um probleminha como brigas (...) iam correndo contar para a professora ou para a mãe”.

Depois das assembleias, os alunos e alunas relataram que: “está melhorando muito, tem

poucas brigas e mais respeito”; “todos podem falar e dar soluções para os problemas”;

“quando colocamos no papel, todo mundo leva a sério e procuramos resolver o problema”;

“tinha vergonha de falar (...) Agora estou conseguindo me soltar mais”; “me “toquei” de

muitas coisas que faço e incomodam as pessoas”; “É muito bom falar o que sentimos, coisas

legais ou não”; “Todo mundo dá a sua opinião e resolvemos muitos problemas” (Araújo,

2008, p. 126).

Há também alunos e alunas relatando pontos negativos que viram na assembleia.

Esses alunos disseram: “Eu achei que no começo do ano as pessoas colocavam como crítica

(...) coisas bobas (...) Mas agora, no meio do ano, todo mundo está colocando críticas mais

sérias, que têm a ver com a classe toda”; “eu me sinto estressado porque eu sempre quero

resolver as críticas e fazer as regras”; “eu me sinto cansado porque demora muito”; “os itens

da pauta se repetiram muitas vezes porque não eram resolvidos rapidamente, mas a maioria

era resolvida” (Araújo, 2008, p.126-127). Com isso é possível perceber que, mesmo as

crianças que tecem alguns pontos negativos, estes se referem mais a problemas iniciais,

quando se está começando a implantar as assembleias, ou à ansiedade de querer resolver todos

os problemas. Essas falas, positivas e negativas, mostram o engajamento das crianças nas

assembleias.

Práticas Pedagógicas Inovadoras em Perspectiva Crítica

Essas metodologias ativas e novas teorias (europeias) de educação são vistas com


16

reticências pela filósofa Hannah Arendt. Segundo Arendt (1957/2011), a autoridade e as

tradições têm papel importante na educação e não podem ser negligenciadas. Valorizar as

tradições está no fato de que o professor deve apresentar às crianças o “mundo dos adultos”

(Arendt, 1957/2011, p. 233) e instruí-las sobre esse mundo, sendo a escola uma transição

entre família e sociedade. Em relação à autoridade, essa deve se expressar não em uma tirania,

e sim em uma responsabilidade que o professor deve ter em relação ao mundo que ele

apresenta aos alunos (Arendt, 1957/2011).

A autora expõe os conflitos que existem hoje entre escola, família e sociedade. Ela diz

que isso se dá, pois a escola, como sempre o fez, valoriza a autoridade e as tradições (o que

não é um problema), porém ela se encontra em um mundo que não é mais guiado por esses

valores. Ela ainda vai além ao afirmar que a sociedade atual rejeitou a autoridade - não porque

se conscientizou do dispositivo disciplinar ou da violência estrutural, conforme futuramente

diria Foucault (1975/1999, 1979/2014) e Minayo (1994) - e sim porque as pessoas do século

XX (em diante) não querem mais assumir responsabilidades. Ela afirma que ninguém mais

quer dar ordens nem obedecê-las, e por isso “os adultos se recusam a assumir a

responsabilidade pelo mundo em que colocaram as crianças (Arendt, 1957/2011, p. 240)”, se

referindo à educação permissiva que começou a crescer a partir da segunda metade do século

XX.

Ao retomar o programa Sistema de Proteção Escolar e as Assembleias Escolares,

conforme explicados por Martins e colaboradoras (2016) e Araújo (2008), é possível

confrontá-los com as reflexões de Arendt (1957/2011). Pode-se afirmar que os PMECS são

professores que se responsabilizam pelo mundo, principalmente pela parte mais vil deste, as

violências. Eles dão abertura aos alunos e a outros profissionais escolares em relação às

decisões a serem tomadas, valorizando o diálogo e sendo mediadores. Ao mesmo tempo,


17

demonstram assumir responsabilidade quando mostram ser necessário “ter um

posicionamento seguro diante de situações graves (Martins et al., 2016)”.

Nas Assembleias Escolares, os alunos elaboram decisões a serem tomadas para

resolução de conflitos e também há sempre um professor mediando (nas assembleias de

classe) e mais de um professor (nas assembleias de escola), assumindo a responsabilidade por

essas decisões. Um exemplo disso se encontra no documentário do MEC sobre as

Assembleias Escolares (Gosuen, 2005) na Escola Comunitária de Campinas. O documentário

mostra uma situação em que os alunos estavam insatisfeitos com o aumento dos preços na

cantina. O professor mediador, então, levanta a possibilidade de os alunos irem conversar com

o dono da cantina e fala para os alunos alguns fatores que podem explicar esse aumento de

preços. Após realizar uma votação com os alunos, o professor os levou até o dono da cantina

para que os alunos expusessem suas queixas, de forma respeitosa. Com isso podemos dizer

que o professor estava inserindo esses alunos no mundo dos adultos e assumindo a

responsabilidade pelas decisões tomadas.

As Assembleias incentivam valores como ética, respeito, princípios dos Direitos

Humanos, inserem as crianças no mundo da democracia, o que é incentivado pelo Plano

Nacional de Educação em Direitos Humanos [PNEDH] (Brasil, 2018). Com isso é possível

dizer que, por mais que os alunos sejam os protagonistas, é importante a mediação de um

adulto, professor (ou outro profissional escolar), no processo de ensino-aprendizagem,

resolução de conflitos e tomada de decisões. Nesse sentido, o psicólogo escolar pode ter

também uma importante atuação, como afirma Mitjáns Martínez (2010). Ele pode elaborar

estratégias educativas sistêmicas e permanentes sobre os mais diversos temas, conforme o que

se expressa na comunidade escolar. Um trabalho que é também coordenado com os outros

profissionais da escola (Mitjáns Martínez, 2010).


18

Ainda sobre a autoridade, Arendt (1957/2011) aponta outro erro cometido pelas novas

teorias da educação. Ela afirma que em escolas onde essas teorias são aplicadas, muitas vezes

acontece uma diluição da autoridade, que passa do professor para a turma, de um indivíduo

para um grupo de crianças. A autoridade que antes era do professor passa a ser das crianças.

Ela afirma que isso é um erro grave, pois a tirania de um grupo é muito maior que a pior

tirania de uma só pessoa. Se a maioria dos integrantes desse grupo de crianças/alunos decidir

regras que prejudiquem uma minoria, esta se sentirá muito mais impotente e receosa de

mostrar sua visão para o grupo. Mais uma vez, a autora reitera a obrigação dos adultos de se

responsabilizarem por suas crianças, de exercerem autoridade sobre elas (no caso, o

professor). Conforme já dito, a autoridade para Arendt (1957/2011) tem o sentido de

responsabilização.

Ao se deparar com as Assembleias Escolares, verifica-se que os professores

mediadores têm esse cuidado de permitir que toda criança expresse seu ponto de vista, ainda

que divirja da maioria. Retomando o exemplo da discussão sobre o preço na cantina, naquela

assembleia havia alunos que não concordavam com o aumento de preço, outros concordavam

e falavam, outros ainda não tinham interesse pela pauta e expressaram também isso,

afirmando que não era algo que os atingia etc. Todos, até as minorias discordantes, se

sentiram à vontade para falar (Gosuen, 2005).

Outro fator positivo para essa livre expressão é a forma como as Assembleias

Escolares se organizam, de modo que sejam criticadas não pessoas e sim situações. Outro

exemplo disso está neste relato de uma professora que aplica as assembleias: “as meninas

começaram a reclamar dos meninos passarem a mão no bumbum delas, na verdade era apenas

um menino (...) o autor do ato quis falar como se nada tivesse a ver com ele (Araújo, 2008, p.

125)”. É perceptível nessa fala a liberdade com que as meninas trouxeram para a pauta um


19

assunto possivelmente constrangedor no qual elas eram vítimas e também a liberdade do

autor, que no momento estava como minoria discordante. Ambas as partes se expressaram

livremente, sem receios, com respeito, sem acusação. A professora conclui dizendo que o

menino reincidiu no ato, porém, após mais uma assembleia com o assunto em pauta, o menino

não falou mais nada e depois não realizou mais o ato com as meninas.

A importância dos Valores Pró-sociais e a constituição da Subjetividade

A partir dos exemplos das escolas transformadoras, democráticas e práticas

pedagógicas inovadoras, é perceptível uma orientação para valores pró-sociais. De acordo

com os estudos de Palmieri e Branco (2007), muitas escolas (e pré-escolas) atuais incentivam

práticas individualistas, competitivas, egoístas e antissociais em seus alunos. As autoras

fizeram pesquisas em escolas de Educação Infantil e observaram que as professoras

propunham atividades individualistas: que estimulavam a competição entre as crianças, e em

outra escola reforçavam a dependência das crianças à figura do professor e puniam quando as

crianças queriam se ajudar. Ao promover atividades aparentemente cooperativas, as

professoras desses estudos davam mais ênfase à competição e ao individualismo, fazendo

com que as crianças rejeitassem a possibilidade de pedir ajuda ao colega “Eu não preciso de

ajuda!” (Palmieri & Branco, 2007, p. 373) e, em outra escola, a própria professora puniu

quando uma criança demonstrou querer ajudar a colega, interagir na atividade (que

supostamente era em grupo) e reforçou o comportamento egoísta da amiga que não queria

ajuda. Esses valores antissociais alimentados nas crianças refletem, segundo as autoras, a

cultura e sociedade atuais, as quais incentivam o individualismo e a competição, em vez da

cooperação. As autoras consideram a cooperação um importante valor pró-social (Branco,

Freire, & González, 2012; Palmieri & Branco, 2007).

Uma educação baseada em valores encontra respaldo em documentos oficiais sobre a


20

escola, família e educação de crianças e adolescentes. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional [LDB] (Brasil, 1996), a escola deve preparar o aluno para a cidadania. Na

mesma linha, o PNEDH (Brasil, 2018) diz que os alunos devem ser promotores dos direitos

humanos. O ECA (Brasil, 1990) garante o respeito aos valores culturais da criança e o direito

de suas famílias transmitirem os valores aos filhos.

A partir de uma perspectiva sociocultural e histórica, pode-se entender os valores

como: crenças impregnadas de aspectos afetivos e cognitivos, emocionais e simbólicos, que

são gerados a partir das práticas e experiências das pessoas em determinado contexto social,

cultural e histórico e, uma vez gerados, orientam as práticas, as ações e interações dessas

pessoas (Branco, 2006; Branco, Freire, & González, 2012; Mitjáns Martínez & González Rey,

2017b). Nas pesquisas supracitadas, vários valores foram considerados relevantes de serem

incentivados no contexto escolar, como: acolhimento, humildade, escuta, diálogo, respeito,

igualdade, descentralização de si, senso de coletividade, responsabilidade, ética, cidadania,

democracia, autonomia, solidariedade, cooperação.

Esses valores podem ser resumidos no humanismo, que é: ver o homem sempre como

um fim em si mesmo, um valor absoluto, nunca um meio para uso arbitrário (Kant,

1785/2019; Mundim Neto, 2017; Wojtyla, 1960/2015). A pessoa tem uma singularidade, uma

constituição subjetiva única e irrepetível (Mitjáns Martínez & González Rey, 2017c). Esse

valor sublime de cada ser humano só pode ser realizado pelo amor - amor autêntico, que parte

da realização da liberdade do homem e se realiza na relação humana, na solidariedade, na

comunhão, em reconhecer o outro como um bem e querer bem ao outro (Nogare, 1990, citado

por Mundim Neto, 2017; Wojtyla, 1960/2015). Amor que é a realização do ser humano com o

outro, no mundo, a realização mais completa das possibilidades do homem, amor que

aperfeiçoa e amplia a existência humana. Amar o outro em sua alteridade, o outro diferente de


21

mim, e o outro inteiro, a pessoa integral, tendo ela as mesmas crenças ou não, os mesmos

valores ou não (Mundim Neto, 2017; Nogare, 1990, citado por Mundim Neto, 2017; Palmieri

& Branco, 2007; Wojtyla, 1960/2015).

O reconhecimento do outro, da alteridade, enriquece o próprio eu, complexifica-o e

amplia sua capacidade de adaptação. Reconhecer o diferente possibilita a “emergência de

novos estados internos, novos significados e novas formas de relação (Salgado & Ferreira,

2012, p. 62)”. Sair da centralização de si e ir em direção ao outro, estar com o outro “em

termos afetivos, cognitivos e relacionais (Salgado & Ferreira, 2012, p. 62)”, na perspectiva do

humanismo e através do amor. Ir ao outro amplia o mundo da própria pessoa, contribui para

uma melhor relação consigo mesma e com o mundo, aperfeiçoa o próprio eu (Salgado &

Ferreira, 2012; Wojtyla, 1960/2015).

Teoria da Subjetividade

Processos humanos.

Portanto, os valores pró-sociais devem ser estimulados para uma melhor e duradoura

resolução dos conflitos e diminuição das violências. Dentre esses valores, pode-se aqui

enfatizar também o diálogo. Na presente pesquisa, os processos humanos serão entendidos

segundo o pensamento de González Rey (2010) através da lente da Teoria da Subjetividade.

Aliados a essa teoria, serão considerados também autores com visões semelhantes, como a

perspectiva sociocultural, tal como apresentada em Branco e Oliveira (2012a), perspectivas

filosóficas de Arendt (1957/2011), Kant (1785/2019), Mundim Neto (2017), Palmieri e

Branco (2007) e Wojtyla (1960/2015). A pesquisa também será norteada pelas diretrizes da

LDB (Brasil, 1996), os princípios do PNEDH (Brasil, 2018) e os direitos do ECA (Brasil,

1990). Ela terá também a inspiração das boas práticas das Assembleias Escolares (Araújo,

2008).


22

Processos dialógicos.

O diálogo é um processo relacional, que acontece através do engajamento dos

indivíduos. Nesse processo, os indivíduos trazem à tona o “microcosmos” de suas vidas

inteiras, seu universo subjetivo, através dos sentidos subjetivos e configurações subjetivas

(González Rey, 2016; Mori, 2019; Wojtyla, 1960/2015). Na Teoria da Subjetividade, os

sentidos e configurações subjetivas são a forma como a pessoa enxerga certas situações e

fenômenos de sua vida em termos emocionais e simbólicos. Esses sentidos subjetivos e

configurações subjetivas são constituídos ao longo da vida dos indivíduos por aspectos sociais

e históricos, pela cultura no qual os indivíduos estão inseridos (González Rey, 2016; Mitjáns

Martínez & González Rey, 2017b).

A Teoria da Subjetividade parte da ideia de que as pessoas não internalizam os eventos

externos e sim produzem sentidos, a partir dessas situações, de forma única, com

representações (simbolização) carregadas de afeto (emocionalidade). Essa forma única de

produzir subjetivamente sobre os fenômenos são os sentidos subjetivos e as configurações

subjetivas que cada um produz. Essas categorias teóricas, porém, não se confundem com um

“subjetivismo” ou “individualismo”. Elas são interiores ao indivíduo não de forma dissociada

de seu contexto sócio-histórico e cultural, pois os sentidos e configurações subjetivos são

constituídos de aspectos individuais e sociais ao longo de toda a vida (González Rey, 2016;

Mitjáns Martínez & González Rey, 2017b).

Essa Teoria, portanto, considera o social não como algo externo ao indivíduo, mas

como constituinte deste de forma recursiva - o indivíduo constitui o social e o social constitui

o indivíduo (Branco & Oliveira, 2012b). Além disso, os sentidos e configurações subjetivos

estão em constante movimento, concebidos como processos, com capacidade de gerar novos

sentidos e configurações subjetivas. Em um diálogo, os participantes expressam seus sentidos


23

subjetivos e produzem novos sentidos (Branco & Oliveira, 2012b; González Rey, 2010, 2016;

Mitjáns Martínez & González Rey, 2017b; Mori, 2019).

O diálogo é, portanto, um importante espaço para se compreender o outro em sua

alteridade, em seu universo, seu microcosmos configurado subjetivamente (González Rey,

2016; Wojtyla, 1960/2015). O diálogo assim é capaz de mobilizar a pessoa, a partir do

engajamento das pessoas envolvidas e da qualidade da relação com o outro, podendo produzir

novos sentidos subjetivos, incluindo os valores. A Teoria da Subjetividade se mostra como

importante contribuição teórica para se entender a subjetividade social da escola, os processos

subjetivos presentes nesse espaço, contextualizados, considerados em sua dimensão

cultural-histórica e social. Ela traz contribuições sobre o campo da ética e do compromisso

social, da responsabilidade que os atores escolares devem ter em suas práticas (Arendt,

1957/2011; Mitjáns Martínez & González Rey, 2017b), contribuindo para uma resolução de

conflitos de forma não violenta, a partir de valores pró-sociais e de processos dialógicos.

Relações dialógicas.

Os processos dialógicos implicam em relações dialógicas. De acordo com Salgado e

Ferreira (2012), o mundo é “socialmente e dialogicamente construído (p. 55)” e todos os

processos humanos são “intrinsecamente relacionais na sua origem (p. 54)”. Os mesmos

autores afirmam que o diálogo é uma tríade eu-outro-objeto (sendo que esse “objeto” é o

tema-foco do diálogo). Essa relação é mediada pelos signos (por exemplo, a linguagem). Na

mesma linha, Mitjáns Martínez e González Rey (2017a) afirmam que “a subjetividade, ainda

que não se dilua no diálogo, se configura e desenvolve dentro do sistema de relações sociais

de indivíduos e grupos (p. 66).”

Os autores ressaltam ainda que, na escola, as relações estabelecidas entre


24

professor-aluno e aluno-aluno são fundamentais para um bom processo de aprendizagem e

desenvolvimento subjetivo dos alunos. Importante frisar que boas relações favorecem não só

a convivência da pessoa com os outros atores escolares, como também todo o processo

escolar e educacional e a própria pessoa. Vale lembrar que a relação tem uma influência e um

benefício não direto, mas que depende de como a pessoa subjetiviza essa relação, de como ela

produz em termos emocionais e simbólicos a partir das interações (Mitjáns Martínez &

González Rey, 2017b).

É na relação com o professor que o raciocínio lógico do aluno toma forma (Mitjáns

Martínez & González Rey, 2017c; Salgado & Ferreira, 2012). O aluno está implicado

emocionalmente nesse processo. Relações que são subjetivadas pelo aluno com muitas

emoções negativas podem dificultar a aprendizagem, enquanto emoções positivas podem-na

facilitar. A relação com os outros colegas também influencia nas operações intelectuais do

aluno (Mitjáns Martínez & González Rey, 2017c; Salgado & Ferreira, 2012).

A posição social do aluno em relação aos colegas tem um importante papel. Se ele é

discriminado, excluído, visto como não inteligente, como nerd, como diferente, ou se ele é

visto como legal, popular, “da galera” etc. Essas posições sociais podem ser subjetivadas pelo

aluno, produzindo uma melhor/pior valorização de si mesmo, o que poderá impactar em sua

aprendizagem e desenvolvimento (Mitjáns Martínez & González Rey, 2017c; Tacca &

Branco, 2008). Os sentidos subjetivos produzidos no espaço escolar pelo aluno, que compõem

a configuração subjetiva de sua aprendizagem, são construídos a partir das vivências do aluno

nesse espaço (em especial a partir das relações, como já amplamente exposto) e também a

partir da própria história de vida desse aluno, das configurações subjetivas de outros espaços

sociais (por exemplo, da família) (Mitjáns Martínez & González Rey, 2017c).


25

Caminho Dialógico para a Construção de Resoluções de Conflitos prevenindo a

Violência Escolar

Sob essa ótica, práticas pedagógicas como as Assembleias Escolares ganham um novo

brilho. Os processos dialógicos e relações dialógicas são amplamente valorizados nessas

práticas. Os alunos conseguem expor seus universos, seus sentidos subjetivos, suas

representações e afetos, suas visões de mundo, e ao mesmo tempo conseguem entrar em

2

contato com o outro, a alteridade, o universo do outro, o alteri incommunicabilis . Com isso

os próprios alunos são enriquecidos, complexificados, aperfeiçoados, na medida em que

produzem novos sentidos subjetivos, produzindo valores cada vez mais pró-sociais . Isso

auxilia de forma eficaz e eficiente em todo o processo escolar-educacional, incluindo o

ensino-aprendizagem.

Recapitulando a discussão sobre os conflitos, as Assembleias manejam os conflitos

com maestria. São práticas que permitem a livre expressão de todos, de modo que surgem

naturalmente ideias conflitantes, objetivos incompatíveis, que são ouvidos e legitimados. Isso

possibilita reflexões, negociações e tentativas de chegar a soluções mutuamente aceitáveis.

Elas geram assim mudanças, melhorias nas relações e no ambiente escolar. Demonstram ser

práticas educativas, formadoras, com grande contribuição no aprendizado.

Na presente pesquisa, as Assembleias serão como uma inspiração, práticas que

desenvolvem valores considerados fundamentais em qualquer ambiente, sobretudo o escolar.

Em pesquisas qualitativas orientadas pela Teoria da Subjetividade, o pesquisador busca

compreender não os sentidos e configurações subjetivos da pessoa, os quais não podem ser

2

Segundo Wojtyla (1960/2015), o alteri incommunicabilis (traduzido livremente como “o outro

incomunicável”) é uma das características da pessoa humana. A pessoa, dada a sua complexidade, é

incomunicável e só poderá ser compreendida por outra pessoa se ela mesma se expor ao outro, expor seu

universo interior. Ainda assim, ela nunca poderá ser compreendida totalmente pelo outro, nem por ela, sendo

incomunicável em sua totalidade.


26

3

acessados diretamente , e sim suas expressões subjetivas, através de construções e

interpretações feitos pelo próprio pesquisador. Conforme o exposto, o presente estudo visará a

compreender as diferentes expressões subjetivas de professores sobre os conflitos existentes

na escola, identificando também as relações estabelecidas entre eles e com os alunos e os

valores existentes nas relações.

Objetivo Geral

Compreender as diferentes expressões subjetivas de professores sobre conflitos

existentes na escola.

Objetivos Específicos

● Caracterizar como se estabelecem as relações na escola entre professores e alunos;

● Identificar conflitos existentes dentro da escola, suas implicações nas relações entre

professores e alunos e como os conflitos são manejados por eles;

Justificativa

● Identificar os valores que estão presentes nas relações.

É importante identificar no contexto escolar as percepções e os sentimentos que alunos

e professores têm em relação a esse contexto, proporcionando um espaço para principalmente

os alunos se expressarem. Essa visão encontra respaldo no Plano Nacional de Educação em

Direitos Humanos [PNEDH] o qual visa uma ação pedagógica conscientizadora e libertadora,

na qual os alunos sejam cidadãos ativos, promotores dos direitos humanos. O Plano ainda

ressalta que a escola deve proporcionar o desenvolvimento social e emocional do aluno,

articulando a comunidade escolar com a comunidade local, regional na qual os alunos se

inserem (Brasil, 2018).

As dificuldades e conflitos que emergem na escola e se expressam nas relações dos

3

Se aproximando do conceito de alteri incommunicabilis.


27

alunos entre eles e dos alunos com os professores são atravessadas por diversos fatores:

disciplinares, pedagógicos, psicossociais, escolares, econômicos, culturais, ético-políticos,

familiares e da forma como cada aluno subjetiva esses fatores. Portanto, colocar os alunos em

evidência, valorizando-os como um todo e não apenas no aspecto cognitivo, mas

considerando os elementos propostos pelo PNEDH se faz necessário.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional [LDB] se constitui como base das

políticas educacionais. Ela fundamenta o que o PNEDH propõe, pois define que a educação

“tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando” e “seu preparo para o exercício da

cidadania” (Brasil, 1996, art. 2). A LDB também pontua aspectos como “liberdade de

aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber”, “pluralismo

de ideias”, “respeito à liberdade” e “consideração com a diversidade étnico-racial” (Brasil,

1996, art. 3), ao explanar os princípios do ensino.

O PNEDH desenvolve mais essas ideias ao instigar os atores escolares a valorizarem a

cultura regional na qual os alunos estão inseridos, permitindo que eles expressem essa cultura

(Brasil, 2018). Essa legitimação dos valores dos alunos encontra também fundamentos no

Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA], quando este pontua que “no processo

educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto

social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às

fontes de cultura” (Brasil, 1990, cap. IV, art. 58). O ECA resguarda ainda “o direito de

transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança” (Brasil,

1990, 2016, cap. 3, seção 1, art. 22, par. único). A LDB também se alia ao ECA ao estabelecer

os objetivos do Ensino Fundamental como formação básica do cidadão no qual um dos pontos

é “o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância

recíproca em que se assenta a vida social” (Brasil, 1996, cap. 2, seção 3, art. 32, inciso IV).


28

As falas dos alunos na pesquisa em questão poderão revelar também seus valores, os quais

devem ser respeitados pelo pesquisador, professores e pelos outros alunos participantes, todos

devem ser ouvidos e respeitados.

O PNEDH valoriza também a arte, esporte e lazer voltados para os Direitos Humanos

e o ECA afirma que serão destinados recursos e espaços para “programações culturais,

esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude” (Brasil, 1990, cap. IV, art. 59;

2018). Nessas programações extraescolares, em atividades e materiais didático-pedagógicos,

bem como em todo o currículo escolar, o PNEDH, o ECA e a LDBN pontuam temas

relevantes para se atentar e trabalhar, como gênero, raça e etnia, religião, pessoas com

deficiência, violação dos direitos na escola, prevenção de todas as formas de violência contra

a criança e o adolescente, prevenção das drogas ilícitas etc (Brasil, 1990, 1996, 2018). Na

presente pesquisa esses temas podem surgir, sendo então importante dar atenção a eles e

identificar como os alunos os percebem, quais os sentidos subjetivos dos alunos produzidos

sobre esses temas.

O PNEDH ressalta ainda que é importante uma articulação da escola com a rede de

assistência e proteção social, como um apoio importante caso sejam identificadas situações de

violação de direitos vivenciadas por alunos, as quais necessitem de acionar a rede de proteção

(Brasil, 2018). O ECA inclui também o Conselho Tutelar, o qual deve ser acionado pelos

dirigentes da escola em casos de maus-tratos dos alunos, evasão escolar ou repetência (Brasil,

1990). Esse respaldo da Assistência Social e do Conselho Tutelar é também interessante para

a pesquisa em questão, caso sejam identificadas tais situações que os alunos estejam

passando.

O pesquisador optou por esse tema, motivado por sua experiência na escola, pela

experiência de pessoas próximas e pela literatura as quais revelaram os conflitos, a crescente


29

violência, indisciplina, adoecimento nas relações dos alunos entre eles e com os professores, a

forma de estruturação da escola em seus aspectos físico, pedagógico, filosófico, ideológico,

psicossocial, cultural, ético-político etc os quais remetem ao modelo medieval e

posteriormente moderno de escola e muitas vezes não consegue se adaptar plenamente às

mudanças e necessidades da pós-modernidade.


30

Método

De acordo com Morin (1921/2005), a teoria permite o conhecimento. Ela organiza e

gera o método. O método é importante, pois ele aviva a teoria, ele a regenera e a rejuvenesce.

O método guia o conhecimento, a partir da atividade pensante e consciente da pessoa, a partir

do papel ativo do pesquisador e da pessoa na pesquisa.

O autor ainda afirma que a pesquisa deve gerar novos conhecimentos, deve conservar

a complexidade da teoria. A teoria é complexa, pois o real é complexo, diz Morin

(1921/2005). O real, a realidade, resiste à teoria e não se encaixa perfeitamente em seus

conceitos e lógicas. Seguindo o mesmo raciocínio, Becker (1998/2008) afirma que os

conceitos são generalizações, pois, ao ir para a realidade, dificilmente os fenômenos

estudados terão todos os critérios e os elementos do conceito teórico. Ainda assim, a realidade

nunca será totalmente compreendida, porém as pesquisas ampliam as zonas de sentido

(González Rey, 2010) e permitem com que conheçamos cada vez mais os fenômenos.

Nesse sentido, a pesquisa em questão se utilizará da metodologia qualitativa, para

melhor compreensão do fenômeno dos conflitos escolares. De acordo com Turato (2004) a

pesquisa qualitativa busca compreender o universo simbólico desse indivíduo, as

significações do fenômeno estudado para ele, como o fenômeno se expressa na vida dele,

quais os sentidos e significações produzidos por esse indivíduo. Na mesma linha, Fourez

(1991/1995) afirma que o pesquisador interpreta os fatos a partir de uma teoria e faz

construções teóricas.

Seguindo o mesmo raciocínio, González Rey (2010) estrutura a pesquisa qualitativa a

partir de uma Epistemologia Qualitativa, considerando o conhecimento como

construtivo-interpretativo. É interpretativo, pois a investigação qualitativa interpreta os


31

fenômenos a partir da teoria, e é construtivo, pois a atividade pensante do pesquisador

constrói novos modelos teóricos. Conforme o exposto, a presente pesquisa será qualitativa,

partindo de uma epistemologia qualitativa para se pensar sobre o conhecimento e baseando

sua prática em um método construtivo-interpretativo.

Participantes

Participaram do estudo três professores do Ensino Fundamental II de uma escola

privada de Brasília-DF.

Procedimentos Éticos

Diante do fato de que o pesquisador tem um compromisso ético com o outro, a

pesquisa teve submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa do UniCEUB. Após aprovação, o

pesquisador entrou em contato com a instituição escolar, pedindo a permissão para que a

pesquisa fosse realizada, apresentando o Termo de Aceite Institucional (Anexo A). A partir de

então, o pesquisador entrou em contato com a coordenadora do Ensino Fundamental II da

escola, se apresentou e explicou os objetivos da pesquisa e como seria a participação dos

professores. Então, a coordenadora selecionou e indicou três professores, os quais em sua

visão são destaques na escola por serem “dinâmicos, flexíveis e de forte engajamento

pedagógico” (sic). Foi realizada uma reunião virtual com esses três professores do Ensino

Fundamental II, indicados pela coordenadora na qual o pesquisador explicou brevemente

como funcionaria a pesquisa e a participação deles. A partir dessa reunião, o pesquisador

pegou o contato deles, enviando-lhes o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido [TCLE]

(Anexo B). O contato (e-mail) dos(as) participantes foi de conhecimento apenas do

pesquisador e não foi disponibilizado para terceiros. Os e-mails foram enviados de forma

individual - o pesquisador para um(a) participante em cada e-mail. Ao enviar o TCLE, o


32

pesquisador disse para o(a) participante salvar uma cópia desse documento em seus arquivos.

Instrumentos

Para melhor compreender a dinâmica e atividades escolares, foi feita uma análise

documental da proposta pedagógica mais recente da escola, das informações disponibilizadas

no site da escola e, com anuência da escola, de relatório de estagiários do UniCEUB que já

realizaram atividades na escola em questão. Essa análise possibilitou uma melhor

compreensão da subjetividade social da escola. A análise documental consiste em selecionar e

organizar materiais e analisá-los à luz do objetivo da pesquisa (Pimentel, 2001). Na pesquisa

atual, a proposta pedagógica foi analisada a partir do método construtivo-interpretativo de

González Rey (2010).

Na pesquisa qualitativa, à luz de González Rey (2005a), o instrumento é útil para

melhor compreender o participante concreto da pesquisa, é um indutor que facilita a

expressão desse. O pesquisador preza mais pela relação estabelecida entre ele e o participante

e as expressões subjetivas deste, do que com registros objetivos que o instrumento pode

proporcionar. Para melhor compreensão das expressões subjetivas dos(as) participantes, foram

feitas dinâmicas conversacionais (Apêndice A) individuais com os(as) professores(as),

utilizando como indutor um texto sobre as Assembleias Escolares (Apêndice B).

Conforme González Rey (2005a, 2010) a dinâmica conversacional consiste em uma

conversação entre pesquisador e participante em torno de um tema - objeto da pesquisa.

Diferente de uma entrevista, a qual é pautada em perguntas e respostas e guiada pela lógica do

pesquisador, na dinâmica conversacional o pesquisador conduz a conversação de modo que o

participante possa se expressar livremente sobre o tema, com relatos abertos, cheios de

emoção e experiência de vida. Os indutores são ferramentas que auxiliam a pessoa na


33

reflexão, permitindo que ela resgate outros campos de sua experiência (González Rey, 2005a;

Mori, 2019).

As Assembleias Escolares por sua vez, conforme anteriormente explanado, consistem

no exercício da democracia e do diálogo para manejar as situações escolares. Elas têm como

foco especialmente o que se refere ao convívio escolar e às relações interpessoais.

Diante do novo coronavírus SARS-CoV-2, que gerou a doença pandêmica Covid-19 e

resultou, dentre outras coisas, no fechamento das escolas e isolamento social, a pesquisa foi

feita de forma completamente virtual. A escola em questão está funcionando com aulas e

reuniões completamente virtuais no período pandêmico de 2020-2021. Para tanto, as

dinâmicas conversacionais foram adaptadas para esse contexto, utilizando-se do recurso das

videochamadas.

Cenário Social da Pesquisa

Na pesquisa qualitativa, o principal cenário de pesquisa são as relações, as interações

entre o pesquisador e os participantes. Nesse sentido, todos os momentos de comunicação

expressos ao longo da pesquisa são relevantes para produção teórica (González Rey, 2005b).

O pesquisador teve um contato inicial com a diretora da escola, via e-mail, e apresentou sua

pesquisa e seus objetivos. Para construir uma boa relação, o pesquisador elogiou os projetos

sociais da escola e projetos feitos no período da pandemia. O pesquisador relembrou também

a boa relação entre a escola da pesquisa e o UniCEUB e os estágios já feitos na escola por

outros estudantes de psicologia. A diretora aprovou a realização da pesquisa na escola e

enviou para o pesquisador o contato da coordenadora do Ensino Fundamental II. O

pesquisador entrou em contato via email com a coordenadora do Ensino Fundamental II e

apresentou a pesquisa e seus objetivos. A coordenadora então demonstrou interesse na

pesquisa e selecionou previamente três professores os quais considerava professores


34

destaques na escola. A coordenadora então marcou uma reunião por videochamada com ela,

os professores do Ensino Fundamental II selecionados por ela e o pesquisador. O pesquisador

se apresentou para os professores e apresentou o objetivo da pesquisa e como seria a

participação de cada um.

O pesquisador ressaltou que gostaria de conversar ao longo do mês com os professores

para compreendê-los como eles estão vivenciando esse tempo na escola. O pesquisador

posteriormente contactou os participantes via e-mail, parabenizando-os por terem se

destacado na escola e por isso terem sido selecionados pela coordenadora. A interação inicial

do pesquisador com a coordenadora e a seleção por esta dos três professores de maior

destaque foi um importante cenário que permitiu uma maior sensibilização dos professores

para se tornarem participantes e se engajarem na pesquisa, sentindo-se prestigiados pela

coordenadora. Através de e-mails, foram marcadas as dinâmicas conversacionais com os

professores, as quais foram realizadas por videochamadas. Foram feitas conversações

individuais sobre o convívio na escola (as atividades da escola, o convívio com os

funcionários, a organização) e sobre as relações interpessoais (relações entre os colegas,

professores e alunos e possíveis conflitos) em uma postura mais de compreendê-los(as). O

pesquisador enviou para os participantes o TCLE (Anexo B), e marcou um dia para realizar a

dinâmica conversacional individual.

No dia da dinâmica, o pesquisador incentivou que o(a) participante se expressasse em

torno do tema do convívio escolar e das relações interpessoais a partir de suas experiências na

escola em questão. Depois de o(a) participante se expressar e o pesquisador conseguir

formular indicadores, o pesquisador falou das Assembleias Escolares, apresentando um

pequeno texto que explica o que são as Assembleias e experiências de como elas manejaram

conflitos no convívio escolar e nas relações interpessoais a partir de relações dialógicas e


35

valores pró-sociais (Apêndice B). O pesquisador então, a partir desse indutor (texto sobre as

Assembleias), permitiu que o(a) participante se expressasse a partir do que compreendeu das

Assembleias ou de outras experiências em torno do tema ou outras reflexões proporcionadas

pelo indutor. Em um último momento, o pesquisador junto com o(a) participante pensaram

em sugestões do que pensam que pode ser feito de forma concreta e exequível para manejar as

situações de conflito naquela escola, ampliando processos dialógicos entre os atores escolares

e incentivando valores pró-sociais. Foi enviado para os participantes o vídeo do MEC (Anexo

C) sobre as Assembleias Escolares e foi sugerido que eles fizessem com os alunos uma

reunião no estilo das Assembleias ou ao menos aplicassem os princípios de cidadania das

Assembleias na escola. A dinâmica conversacional durou em torno de 40 a 50 minutos, e o

pesquisador apresentou o indutor a partir dos 30 minutos iniciais, permitindo que nesse tempo

inicial surgissem expressões mais livres do(a) participante.

A participação dos profissionais foi dessarte concluída, porém o pesquisador

continuou disponibilizando seu email e contato caso futuramente o(a) profissional quisesse

relatar suas experiências na escola e dar feedback de como estão as relações e os conflitos

relatados na pesquisa. Ao concluir a pesquisa, o pesquisador se dispôs a enviá-la por email

caso os profissionais da escola queiram ou entregá-la pessoalmente na escola pesquisada.

Processo de Construção e Análise das Informações

Segundo González Rey (2005a) não há separação entre construção das informações e

análise dessas, pois o pesquisador constrói as informações a partir do diálogo com o indivíduo

pesquisado, fazendo construções teóricas, reflexões e interpretações das expressões subjetivas

desse indivíduo. Considera-se assim os “elementos não-controlados, que não aparecem

simplesmente em forma de registros objetivos, mas nas ideias e construções que o

pesquisador produz ao estudá-los (González Rey, 2005a, p. 76)”.


36

As informações foram analisadas durante a leitura da proposta pedagógica, dos outros

documentos e informações e também ao longo das dinâmicas conversacionais a partir da

formulação de indicadores, hipóteses e, por fim, construção de modelo teórico. À medida que

surgiram as falas dos(as) participantes, os trechos de suas expressões foram unidades

interpretativas essenciais na construção teórica (González Rey, 2010). Vale lembrar que não

se analisa apenas o que é dito, mas também como é dito (González Rey, 2005a). As unidades

de análise na presente pesquisa foram as expressões subjetivas dos(as) participantes e não as

configurações propriamente ditas. Segundo Mori (2019, p. 10), as configurações subjetivas

são construções hipotéticas que vão se organizando a partir de diferentes indicadores que

emergem no processo dialógico e que tomam vida como possibilidade de explicação pelo seu

valor como modelo teórico a partir do caso estudado. Os indicadores são as elaborações

hipotéticas que o pesquisador faz a partir de conteúdos explicitados nas falas dos(as)

participantes (González Rey, 2010), a fim de compreender as expressões subjetivas e formular

possíveis configurações subjetivas. À medida que o participante se expressa proporciona mais

conteúdos para o pesquisador formular os indicadores. O pesquisador pode reunir os

indicadores a fim de delinear hipóteses.

Essa segunda fase de formulação das hipóteses são hipóteses mais consistentes sobre

os processos subjetivos da pessoa, fundamentadas nos indicadores previamente elaborados

pelo pesquisador (Mori & Goulart, 2019). Vale ressaltar que à medida que os indicadores e

hipóteses são construídos, o pesquisador os confronta com as falas subsequentes do(a)

participante para continuamente ir reformulando esses indicadores e hipóteses.

Por fim, com hipóteses estruturadas e corroboradas pelas construções do pesquisador

ao longo da pesquisa, é possível construir um modelo teórico, isto é, ampliar as zonas de

sentido, os espaços de inteligibilidade sobre o fenômeno em questão. As construções teóricas,


37

a partir da perspectiva da Subjetividade, são compreendidas sempre como modelos em aberto,

os quais novas pesquisas podem continuamente aprofundarem e assim construírem “modelos

cada vez mais úteis para a produção de novos conhecimentos (González Rey, 2010, p. 6)”.


38

Análise e Construção das Informações

Construções a partir da análise documental

A escola pesquisada é uma escola privada, porém, com a grande maioria, em torno de

80% dos estudantes, pertencentes às classes C, D e E (Relatório de estágio, 2019). É uma

escola que possui uma mega estrutura, com quadras poliesportivas, espaços de lazer e cultura.

A escola também preza muito pela tecnologia, com projetos de robótica, e visa formar alunos

trabalhadores preparados para o mercado do século XXI e para as constantes inovações

(Proposta pedagógica da escola, 2020). Além disso a escola valoriza as competências

socioemocionais, afirmando que a maioria dos empregos, em um contexto cada vez mais

automatizado, exigirá dos candidatos “criatividade, trabalho em equipe, persistência, abertura

ao novo, comunicação e pensamento crítico” (Proposta Pedagógica da escola, 2020). Somado

a isso, a escola também possui projetos sociais e oferece serviços para ajudar pessoas em

vulnerabilidade social. É uma escola, portanto, que valoriza práticas pedagógicas inovadoras

(Martins et al., 2016; Rose, Afonso, Bondioli, Gonçalves, & Prezenszky, 2016) e possui um

discurso humanista (Branco, Freire, & González, 2012; Mundim Neto, 2017).

A escola em questão conta com apenas uma psicóloga escolar. A Psicologia, diante

desse contexto, poderia ter muitos espaços de atuação, auxiliando no desenvolvimento das

competências socioemocionais, nas habilidades intra e interpessoais, na participação da

construção de projetos culturais etc (Diálogos, 2019; Mitjáns Martínez, 2010). Segundo

relatos de experiências anteriores, porém, aparentemente a psicóloga tem dificuldade de

imersão nos projetos da escola e poucas entradas nas salas de aula, bem como uma relação

um pouco distante com os outros professores (Relatório de estágio, 2019). Essas dificuldades

e tensionamentos com a equipe são relativamente comuns de acontecer com os psicólogos

escolares no processo de construção dos espaços sociais de trabalho na comunidade escolar


39

(Barbosa & Marinho-Araújo, 2010; Penna-Moreira, 2007). O trabalho do psicólogo escolar

deve ter articulação com os trabalhos desenvolvidos por outros profissionais, em uma

perspectiva integradora, contributiva, e criativa a partir do olhar qualificado da Psicologia

(Mitjáns Martínez, 2010).

No momento da pandemia, a escola, assim como outras no Brasil e no mundo

(Schmidt et al., 2020), interditou seu espaço físico e continuou funcionando de modo remoto.

Os alunos, porém, perderam apenas uma semana de aula em Março, diferente de outras

escolas, no Brasil e no mundo, nas quais os atores escolares demoraram mais tempo para se

reorganizarem no contexto remoto, híbrido ou presencial (Unicef, 2021; Zimmerman et al.,

2021). Esse fato se deve principalmente à capacitação que os professores já tinham sobre as

ferramentas educacionais e plataformas online de educação. A escola já possuía uma

adaptação e atualização às tecnologias mais relevantes para o ambiente educacional e de

trabalho. A escola também foi protagonista em seu olhar social, estando atenta aos alunos

com menos condições socioeconômicas, que não tinham computadores ou condições de

participar de videochamadas nas plataformas virtuais. Para abarcar também esses alunos, as

aulas foram ministradas também através de aplicativos de mensagem de celular (Site da

escola, 2020). Paralelamente, durante o período de isolamento social, a escola lançou

campanhas de leitura para seus alunos, distribuindo kits de clássicos da literatura para cada

um dos alunos. O intuito desse projeto era que os alunos: “ ampliem conhecimentos culturais,

conheçam os autores [...], melhorem o seu vocabulário e se preparem melhor para a [...] vida”

(gestora da escola sobre o kit leitura, 2020).

A partir das informações expostas e de outras que foram obtidas no processo da

análise documental, é possível formular indicadores sobre como se configura a subjetividade

social dessa escola. É uma escola que tem como foco formar trabalhadores competentes para


40

o mercado do século XXI e com base nisso estrutura sua forma pedagógica e técnica de

educação. Esse é um indicador importante da subjetividade social e de como se configuram e

são pensados os processos educacionais por parte dos profissionais e gestores da escola. É

uma escola que expressa, por meio de discursos e representações, uma preocupação com as

tecnologias do momento. Aparenta contudo servir-se das tecnologias não para romper com o

modelo tradicional de ensino e superar as críticas a esse modelo, como as de Foucault

(1975/1999, 1979/2014) e Minayo (1994). Na verdade, ela valoriza as tecnologias a partir de

um pensamento ainda do modelo tradicional da educação moderna industrial, o qual pode ser

problematizado ao se considerar que esse modelo instrumentaliza a educação para abastecer o

mercado de trabalho (Kelday, 2021, no prelo). Dessa forma, a escola em questão, mesmo com

diferenciais e com propostas que consideram o contexto sócio-histórico e cultural do século

XXI, parece não se aproximar tanto de uma visão das práticas pedagógicas inovadoras, as

quais propõem novas filosofias e formas de enxergar o humano e a educação (Alternative

Education Resource Organization [AERO], 2020; Instituto Lasneaux, 2020; Marangon, 2004;

Montessoriana, 2020; Sociedade Antroposófica do Brasil [SAB], 1998).

Nesse sentido é possível ver uma coerência no fato de a escola valorizar tanto a parte

tecnológica quanto a saúde emocional dos alunos. Esses dois elementos, aparentemente

distintos, estão inter-relacionados no objetivo de formar trabalhadores do século XXI. Esse

indicador é corroborado quando, em seus documentos, os gestores escolares afirmam: “Em

relação ao trabalho, estima-se que a maioria dos empregos possa ser 30% automatizados e

portanto para as pessoas serem contratadas será mais exigido qualidades humanas (soft

skills)” (Proposta Pedagógica da escola, 2020). Isso mostra que o foco no trabalho e em

formar trabalhadores produtivos e páreos para a inserção e sobrevivência no mercado de

trabalho a partir das exigências do século XXI é uma configuração subjetiva dominante na


41

escola e que norteia os pensamentos e práticas dos gestores e atores escolares, que de certo

modo se articula às representações dominantes nas sociedades produtivas no século XXI..

Esses indicadores são importantes ao se confrontar também com relatos de que a

Psicologia Escolar tem pouca atuação e poucos espaços de inserção na escola em questão

(Relatório de estágio, 2019). Uma possível explicação é que a Psicologia tem como foco a

pessoa e com base nisso busca fazer trabalhos socioemocionais, relacionais, promoção de

autocuidado, combate ao preconceito e à violência escolar etc (Diálogos, 2019; Mitjáns

Martínez, 2010). Esses trabalhos da Psicologia Escolar podem ser difíceis de serem aceitos se

a equipe gestora não perceber um efeito direto ou indireto na promoção do trabalho, por

exemplo. Pode-se hipotetizar, portanto, que a Psicologia Escolar foca na pessoa (em todas as

suas dimensões), enquanto a escola em questão foca no trabalho e na formação de

trabalhadores. Essas duas visões ora podem convergir em determinadas práticas, ora podem

divergir e gerar tensões importantes. Mesmo com práticas convergentes, os objetivos e visão

da Psicologia podem ser diferentes dos objetivos e visão dos gestores ou outros atores

escolares, em grande parte devido a diferentes sentidos subjetivos configurados em relação ao

que pensam sobre o humano e a educação. Alternativamente, a visão da escola voltada para o

trabalho muitas vezes pode ser uma demanda da própria comunidade escolar à qual a escola

serve. Por serem alunos com média ou baixas condições socioeconômicas, muitos podem ter

a necessidade de conseguir emprego durante ou logo após a conclusão do período escolar.

Em relação ao projeto literário no período da pandemia, ele possibilita elaborar alguns

indicadores interessantes sobre a subjetividade social da escola. Ao mesmo tempo em que a

escola valoriza a tecnologia, no momento no qual os alunos estão imersos 100% no contexto

online durante a pandemia, a escola protagoniza projetos não-tecnológicos, que valorizam

não-eletrônicos como livros e a não-inovação, como os clássicos literários. Esse fator


42

evidencia o aspecto cultural, pelo qual a escola também preza, e talvez um certo equilíbrio

em relação à tecnologia - reconhecendo a necessidade humana de outros recursos

não-tecnológicos e não-inovadores, que possuem também uma riqueza e um importante papel

na formação humana e social. A presente análise não aprofundou as motivações e as

diferentes configurações subjetivas dos gestores que mobilizaram a idealização, planejamento

e implementação do projeto literário. Pela fala supracitada da gestora, porém, há indicadores

de que o objetivo do projeto era: cognitivo e cultural “ampliem conhecimentos culturais”,

pedagógico “melhorem o seu vocabulário”, e profissional “se preparem melhor para a [...]

vida”. Esse projeto, porém, ainda se configura como no mínimo curioso e pode revelar

importantes indicadores sobre como a escola tensiona a valorização da tecnologia e da

cultura, eletrônicos e não-eletrônicos, inovação e clássicos, futuro e passado, tradição e

progresso etc.

É possível, portanto, mesmo com a análise de apenas alguns documentos e

informações disponibilizadas pela escola, perceber que ela preza por valores, como:

profissionalismo, inovação, liderança, postura empreendedora, domínio tecnológico e

apreciação cultural. Com isso é possível formular as seguintes hipóteses sobre as práticas

escolares e alguns aspectos dominantes sobre a subjetividade social da escola:

1. É uma escola alinhada às necessidades da comunidade escolar na qual está

inserida, profissionalizante e tecnicista, possibilitando a inserção dos alunos

no mercado de trabalho com competências desenvolvidas para o perfil

profissional exigido no século XXI.

2. É uma escola que investe muito na tecnologia, nas plataformas digitais

educacionais, na inovação tecnológica, na robótica, ao mesmo tempo com uma


43

visão equilibrada da tecnologia, investindo também em projetos culturais,

atividades esportivas e de lazer.

3. É uma escola com projetos de grande riqueza humana e social, nos quais

facilmente poderia se inserir a Psicologia Escolar, porém pela dificuldade de

relação entre a psicóloga escolar e os outros professores ou outros

profissionais, e a diferença de objetivos da psicologia e dos gestores,

configuram-se conflitos e dissonâncias entre os sentidos subjetivos que a

psicologia produz sobre o humano e a educação e os sentidos subjetivos dos

demais atores escolares.

Análise das dinâmicas conversacionais

Essas hipóteses, ainda incipientes, podem ser contrastadas com trechos de informação

das dinâmicas com os participantes da pesquisa, as quais serão relatadas a seguir. Foram

feitas dinâmicas conversacionais com três professores da escola em questão. Os professores

foram escolhidos pela coordenadora do Ensino Fundamental II por serem “dinâmicos,

flexíveis e de forte engajamento pedagógico” (sic). São eles:

F., está há 6 anos como professor de Filosofia do Ensino Fundamental II, há 2 anos

como professor de robótica e outros projetos na escola.

G., está há 13 anos como professora de Geografia do Ensino Fundamental II, há 1 ano

está ministrando aulas também para o Ensino Médio.

C., está há 1 ano como professora de Ciências da Natureza do Ensino Fundamental II,

há 1 ano como professora de projetos interdisciplinares cujos conteúdos são estudados e

trabalhados no projeto de leitura. Há 1 ano está em um projeto social da escola que visa

auxiliar alunos em situação de vulnerabilidade social.


44

A análise das falas dos participantes foi dividida em eixos, conforme os objetivos da

pesquisa. Esses eixos também se relacionam com as hipóteses anteriormente formuladas na

análise documental. Os eixos de análise são: (1) pré-pandemia e pós-pandemia; (2) relação

com a tecnologia, professores e alunos; (3) relação professor-professor e valores; (4) relação

professor-aluno e valores; (5) relação aluno-aluno e valores; (6) estratégias socioemocionais

para o campo virtual; (7) situações de conflito e assembleias escolares.

Pré-pandemia - pós-pandemia.

Inicialmente, o pesquisador perguntou como era a relação do participante com seus

alunos, considerando também o cenário da pandemia, o qual ocasionou mudanças e

reorganizações na escola. Os participantes F. e G. contextualizaram como eram as relações na

escola antes e após a pandemia. C. apenas relata como foi após a pandemia, período no qual

entrou na escola. F. relata que antes era mais fácil de se aproximar dos alunos, ter um contato

mais próximo, saber mais sobre o aluno e sobre a causa de alguns comportamentos que o

aluno demonstrava em sala de aula. F. diz que esse contato mais próximo é facilitado pelas

próprias matérias da área de humanas, tais como filosofia (matéria que ele leciona), geografia

e história. F. afirma que essa área lida com o humano e pensa sobre o humano e portanto tem

um olhar mais humanizado para os próprios alunos. Isso traz indicadores importantes sobre

os sentidos subjetivos (simbólicos e emocionais) que estão presentes no modo como F.

configura subjetivamente o conhecimento da matéria que ele leciona e a visão de ser humano

e das relações, aproximando-o de uma visão humanista (Kant, 1785/2019; Mundim Neto,

2017; Wojtyla, 1960/2015) e da promoção de uma cultura do encontro e favorecimento das

relações a partir da educação (Salgado & Ferreira, 2012; Wojtyla, 1960/2015). Esses

indicadores são reforçados quando F. conta o caso a seguir, o qual ocorreu pré-pandemia:


45

[...] o aluno não prestava atenção e passou uma semana, duas sem prestar atenção na

aula, era porque ele tava sem o óculos, olha a coisa mais simples, sem o óculos [...]

quando comecei a conversar, porque eu não fui direto, fui conversar, ele estava assim:

‘olha, você foi o primeiro que me perguntou porque que eu estava assim’. Então dá

para você notar a diferença dessa questão de estar mais próximo [...] a disciplina de

humanas permite chegar mais próximo né.

Com isso pode-se perceber a presença de sentidos subjetivos que configuram

subjetivamente o ensino de filosofia para F., como um olhar mais completo para o ser

humano, aproximando-se da filosofia humanista. Uma visão não conteudista de ensino, que

visa também compreender as relações que se estabelecem em sala de aula e aplicar os

próprios conceitos de ser humano da filosofia na relação que F. estabelece com seus alunos.

Os sentidos subjetivos em torno da configuração subjetiva de ser professor de filosofia para F.

incluem não apenas o passar o conteúdo para os alunos, aos moldes de uma educação

industrial (Kelday, 2021, no prelo), e sim uma apropriação do que é filosofia e, mais

especificamente, uma filosofia do humano, para aplicar essa visão humanizada na própria

vida, na relação com seus alunos em sala de aula. A Filosofia para F. não é apenas uma

matéria, mas uma configuração subjetiva importante que influencia e possui desdobramentos

nas várias áreas de sua vida, especialmente nas suas relações interpessoais na escola e

possivelmente em outros ambientes.

F. diz em seguida que a pandemia dificultou esse contato mais próximo, devido ao

contexto virtual, à dificuldade de os alunos abrirem as câmeras e de ligarem seus microfones

nas videochamadas. A mesma dificuldade foi encontrada na fala de C. Os problemas

enfrentados por professores, alunos e famílias em decorrência do ensino remoto emergencial

foram também levantados por Moraes e colaboradores (2020).


46

A participante G., no entanto, possui uma outra visão, afirmando que suas relações

com os alunos melhoraram após a pandemia. É possível observar essa afirmação no seguinte

relato de G.: “agora no online parece que, mesmo distante, a gente acabou se aproximando

mais do que no presencial. A carência deles, né, é assim bem maior, e aí no online acabou nos

aproximando mais, principalmente nos grupos de WhatsApp.”

G. relata que os alunos estão “se abrindo” mais com ela, estão mais carentes devido à

pandemia, e revelam situações mais íntimas deles, o que não acontecia pré-pandemia. Esse

clima emocional mais evidente no contexto escolar pós-pandemia é corroborado também por

Guilherme e colaboradoras (2020). Esses autores enfatizam o impacto psicológico da

pandemia nas pessoas, ocasionando efeitos como a fragilidade emocional, que se manifesta

no espaço escolar. A professora G. também diz que agora os alunos têm um contato mais

próximo e pessoal com ela, devido à participação dela em grupos de aplicativo de mensagem,

o que possivelmente traz transformações nas configurações subjetivas da relação professor e

aluno, podendo torná-la mais pessoal e íntima, favorecendo mais expressões emocionais por

parte tanto do professor quanto dos alunos.

Neste primeiro eixo, por conseguinte, é possível identificar já alguns valores

existentes nas relações professor-aluno dos participantes. Dentre esses valores estão:

acolhimento, escuta, solidariedade, humanização das relações, proximidade, expressividade

emocional. Com isso também já é possível problematizar as hipóteses anteriormente

formuladas, especialmente a primeira e a terceira. Os professores mostram valorizar não um

ensino tecnicista e profissionalizante, mas verdadeiramente humano, um ambiente com

relações humanizadas e valorização da intimidade e do emocional dos alunos. Uma visão que

favorece a atuação da Psicologia Escolar, o que também ao longo da conversa será


47

confirmado. De fato, esses professores falaram que possuem abertura e boas relações com a

psicóloga da escola em questão.

Relação com a tecnologia, professores e alunos.

O pesquisador questionou os participantes sobre as relações professor-aluno e sobre a

questão da pandemia. Nesse momento conversacional, os participantes de modo espontâneo

se pronunciaram também sobre a questão da tecnologia, como um fator que fora inserido na

escola e tem impactos na relação professor-aluno e demais relações entre os atores escolares.

Em relação à tecnologia, a professora C., a qual chegou na escola durante a pandemia, em

Julho de 2020, disse ter se utilizado da tecnologia para favorecer sua relação com os alunos.

Ela conta que, em seu primeiro dia de aula, propôs jogar com os alunos um jogo de desenho

online, Gartic. O jogo aproximou ela afetivamente dos alunos, possibilitou boas interações e

também permitiu uma maior liberdade na forma como os alunos falam uns com os outros e

com a professora. C. conta que uma das falas as quais apareceram durante o jogo foi: “ah,

mas que absurdo, quem desenhou isso?”, mostrando a liberdade de expressão emocional dos

alunos durante o jogo e possíveis repercussões dessa liberdade posteriormente nas aulas. O

jogo, dessarte, foi um mobilizador de sentidos subjetivos, os quais podem compor a

configuração subjetiva da relação professor-aluno no contexto educacional de C. com seus

alunos.

C. conta também que busca estratégias para os alunos abrirem as câmeras nas

videochamadas e para os alunos se envolverem mais durante as aulas online. Ela diz que em

uma das aulas fez uma brincadeira com os alunos, dizendo que: “quem abrisse a câmera, a

professora iria fazer alguma coisa eles pedissem”, “uma prenda”. Outra estratégia é sempre

quando ela faz a chamada ter um ajudante. Ela faz a chamada junto com eles para eles

mesmos irem chamando uns aos outros. Outra estratégia é um combinado que ela estabeleceu


48

com a turma: “Chamei o aluno 5 vezes, o aluno não atendeu, eu tiro o aluno e chamo ele de

volta para a chamada.” Uma forma de fazer os alunos se envolverem com a aula e se

implicarem em seu processo de aprendizagem ativamente, já que o contexto virtual muitas

vezes favorece uma posição mais passiva e cômoda dos alunos. Essa última estratégia,

porém, ela diz que alguns alunos ficam chateados, mas depois ficam bem ao perceber que é

uma brincadeira da professora e que não afetará sua nota e não acarretará em punições, sendo

apenas uma forma de a professora convidá-los a participar da aula.

Com isso é possível elencar um indicador da relação de C. e seus alunos através da

tecnologia. C. usa a tecnologia para favorecer as relações com seus alunos, para se encontrar

com eles, permitir expressões emocionais e um clima emocional mais descontraído na sala de

aula virtual. C. demonstra se preocupar com cada aluno, e fazer questão de eles estarem

presentes em sua aula e serem ativos em seu processo de aprendizagem, o que é perceptível

pelas estratégias pedagógicas e relacionais que ela adota com seus alunos. Ela se serve de

tecnologias educacionais como os jogos virtuais para favorecer as relações e de mecanismos

das plataformas virtuais, como o poder de retirar pessoas da chamada e convidá-las

novamente. Com essa atitude, C. provavelmente tem a intenção de favorecer a participação e

o protagonismo do estudante. A forma como ela faz a chamada, também reforça esse

indicador de que: C. prioriza uma boa relação com seus alunos, um bom clima emocional em

sala de aula; ela também parece ter necessidade de ter um contato próximo, mais humanizado

com os alunos; valoriza um ambiente mais descontraído com fala mais livres dos alunos e

expressões emocionais. Além disso parece que C. tem uma necessidade grande e talvez uma

certa inquietação de que todos os alunos estejam presentes, participando ativamente das aulas

e gostando das aulas. Parece que para C. a configuração subjetiva da relação professor-aluno

e do contexto de sala de aula são compostas por sentidos subjetivos de descontração, alegria,


49

intimidade, liberdade de expressão, engajamento de todos, participação ativa etc. Isso por

vezes pode gerar sofrimento em C., o que fica evidenciado em sua fala:

Eu gosto de atingir todo mundo. Eu acho que talvez seja um problema, acaba sendo

um problema e uma solução né. Por eu querer atingir todo mundo, eu quero que todo

mundo participe. E às vezes os alunos da aula online nem estão ali. Eu tento que todos

participem, eu chamo, vamos fulano, vamos participar com a gente. Assim, é

desgastante.

Essa problematização em relação à tecnologia e às relações foi também exposta por

F., o qual, sendo professor de filosofia e do projeto de robótica da escola, fez reflexões

interessantes. F. afirmou que:

a vida do outro tornou-se algo frio também como a tela do computador [...] o que eu

escuto são vozes [...] eu falava que o mundo voltado para tecnologia era o mundo que

te levava, te deixava sempre dentro de casa e no escuro, porque a tela já brilhava

sozinho e você precisava fechar as cortinas para não ver a claridade lá fora e a

tecnologia causa isso.

Destarte, esse segundo eixo consegue problematizar a segunda hipótese. De fato os

professores parecem ter uma visão equilibrada da tecnologia, identificando pontos positivos e

também pontos que podem ser conflitantes com as relações humanas. F. tem uma postura

crítica em relação à tecnologia e C. usa a criatividade para tornar a tecnologia sua aliada para

favorecer as relações e fazer emergir ricas e livres expressões emocionais dos alunos. A

insistência com a qual C. busca essa melhora nas relações através da tecnologia e o

sofrimento envolvido nesse processo corrobora o que F. traz: muitas vezes a tecnologia é fria

e esfria as relações e o contato humano, fazendo com que as pessoas tenham que

continuamente se esforçar para humanizar essas relações.


50

Relação professor - professor e valores.

Ao pesquisador questionar os participantes sobre as relações deles com os outros

professores e outros profissionais da escola, G. relata que há uma boa relação e uma

cooperação entre eles. Os professores já vinham fazendo capacitações para as plataformas

online mesmo antes da pandemia. G. contou que tem dificuldade de acompanhar, pois a

tecnologia está sempre avançando. Ela então diz que já pediu ajuda para seus colegas

professores e diz que eles fizeram videochamadas, construíram tutoriais, mandaram

mensagens, ensinando-a a mexer em algumas tecnologias educacionais com as quais ela tinha

dificuldade. G. falou que, quando algum dos professores tem dificuldade, por exemplo com

ferramentas tecnológicas, os professores se ajudam.

C. também relata um bom clima com os outros professores. Ela conta que chegou na

escola no meio da pandemia e por conseguinte teve pouco contato presencial com os

professores. Não havia mais os encontros nas salas dos professores e as reuniões pedagógicas

eram em sua maioria virtuais. C. conta que apenas no final do ano de 2020 teve reunião

presencial e ela pode ver e conhecer fisicamente os professores. C. diz que, mesmo assim,

sentiu-se desde o início muito acolhida pelos colegas: “a professora que me passou as turmas,

ela me acolheu muito bem, a coordenação também me acolheu muito bem. Um outro

professor também [...]. Então assim eu fui muito acolhida.”

C. diz que, mesmo sendo recente na escola, desde o início buscou contato com os

professores, já que estava encarregada de projetos interdisciplinares. Ela afirma ter tido “uma

interação muito grande com os outros professores”. A participante G. também ressalta a

questão da interdisciplinaridade. G. diz que os professores trocam informações entre si sobre

o que falaram em uma aula e pode refletir em outra aula, algo que os alunos gostaram e

podem comentar em outra aula de outro professor, etc. G. fala que essa interdisciplinaridade,


51

essa troca entre os professores, já existia antes da pandemia e continua existindo, mesmo que

de forma mais dificultada pelo contexto virtual. Ela também compartilha que, quando um

professor faz um trabalho legal com a turma, fala para outro professor e os professores

relatam uns para os outros, incentivando os trabalhos dos colegas profissionais. O trabalho

interdisciplinar e integrativo é visto de forma positiva por Mitjáns Martínez (2010), incluindo

também a psicologia escolar. A autora enfatiza a importância de um trabalho em equipe na

escola.

Destarte, é possível elaborar alguns indicadores de sentidos subjetivos que estão na

articulação da subjetividade individual e da subjetividade social, implicadas na relação

professor-professor. Há sentidos subjetivos de valorização das práticas dos outros

profissionais, incentivo mútuo dos colegas professores, que podem gerar a percepção de

como a atuação de um professor impacta na aula de outro professor. Em termos de ações

práticas, existe esse auxílio mútuo dos professores quando possuem dificuldade, disposição

para ajudar os colegas, o que pode favorecer de modo geral um ambiente social confortável

para expor dificuldades pessoais e profissionais etc. Essa cooperação entre os professores

pode ter se intensificado em termos emocionais em decorrência da pandemia, porém pelos

relatos parece que já existia pré-pandemia. Pode-se também afirmar que há valores

permeando essas relações, como: solidariedade, cooperação, interdisciplinaridade, escuta,

acolhimento, humildade, união, sinergia, abertura ao outro, reconhecimento do outro,

confiança.

Relação professor - aluno e valores.

Quando o pesquisador perguntou sobre a relação professor-professor, alguns

participantes falaram também sobre o entrelaçamento entre a relação professor-professor e

professor-aluno. G. diz que algumas coisas da relação professor-professor ela leva para os


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alunos para favorecer a relação com os alunos de pessoa-pessoa, relações mais

horizontalizadas e não relações de superior-subordinado. As falas de G. sobre sua relação

professor-aluno corrobora os indicadores já formulados e reforçam a ideia de que há sentidos

subjetivos em torno da configuração dessa relação marcados por valores como intimidade,

proximidade e pessoalidade.

G. fala que no início não sabia mexer com a tela interativa, viu que os outros

professores usavam, comprou e não sabia mexer. Aí os outros professores a ajudaram,

ensinaram e ela então passou a conseguir mexer e os alunos e ela comentaram: “eita,

professora a senhora aprendeu! Aprendi, tá vendo, foi igual vocês [...]”. Em outras ocasiões,

G. compartilha essas situações de aprendizado dela para os alunos. As falas de G.

demonstram que ela expõe aos alunos que também está em processo de aprendizagem como

eles, para favorecer a relação de proximidade professor-aluno e para auxiliá-los também na

parte pedagógica, incentivando-os a fazerem as atividades e as provas. G. parece servir-se de

suas fragilidades humanas para favorecer as relações com seus alunos. A fragilidade humana

como algo comum entre ela e os alunos, a qual proporciona relações mais horizontalizadas e

maior proximidade afetiva, empatia.

G. afirma que alguns alunos estão tendo dificuldades de entregar as atividades no

prazo. Às vezes porque não possuem impressora para imprimir as atividades, outras vezes

porque não estão em condições emocionais para fazer as atividades, e outras porque

esqueceram. Moraes e colaboradores (2020) falam dos desafios e dificuldades que envolvem

o ensino remoto emergencial, como o aspecto socioeconômico e Guilherme colaboradoras

(2020) falam também da questão emocional. Nesse contexto remoto e pandêmico percebe-se

uma dificuldade de os alunos reorganizarem sua rotina de estudo. G. diz que, junto com os

alunos, busca formas de eles conseguirem fazer a atividade, de imprimir, estender um pouco


53

o prazo etc. Ela também fala com eles sobre a importância de eles apresentarem suas

situações para os professores e terem responsabilidade. G. também conta situações da

realidade dela para favorecer essa maior proximidade:

“A coordenadora me pede uma atividade: ‘ai não aguento mais a coordenadora me

pedindo essas coisas, ai que saco’. Eu falo, não, eu tenho que fazer. ‘Coordenadora, eu

esqueci, mas eu vou fazer e amanhã eu vou te mandar’. No outro dia: ‘Coordenadora

aqui ó, eu estou te mandando aqui, você me desculpa, mas já está aqui’. Pronto.

Resolvido o problema. Então eu tento passar muito isso do que a gente vive.”

Dessa forma, alguns indicadores já construídos na análise são corroborados e outros

podem ser feitos. G. tem uma relação de proximidade com os alunos, permite expressões

emocionais deles e também se expressa emocionalmente para eles. Ela relata as experiências

pessoais de sua relação com os professores e outros profissionais da escola, de forma que

essas experiências são sentidos subjetivos através dos quais ela busca mobilizar outros

sentidos subjetivos nos alunos, construir com eles valores como responsabilidade e confiança.

Em relação à confiança, ela explicita a forma como buscou construir esse valor com os alunos

ao modificar a estrutura das avaliações devido à pandemia. Ela diz que está permitindo

consulta ao livro, não em uma postura de liberar a ‘cola’, mas de permitir o aprendizado, em

uma relação de confiança com os alunos. G. diz que os alunos se assustaram com essa

mudança na avaliação, achando que a professora estaria liberando a ‘cola’. G. então

respondeu a esses questionamentos com os exemplos de sua relação com a coordenadora:

“imagine a coordenadora me pede um trabalho e aí na hora: ‘eu não sei, pera aí, deixa eu

olhar aqui no meu livro’. Aí eu pego meu livro: ‘ah lembrei, tô fazendo!’ Eu colei? Não, eu

aprendi.”


54

Relação aluno - aluno e valores.

O pesquisador também questionou os participantes como eles viam a relação entre os

alunos, considerando também o atual contexto virtual e o fato de os alunos não estarem se

encontrando presencialmente, nem interagindo por exemplo no recreio. C. tem uma visão

interessante sobre os alunos. Ela diz que no contexto virtual parece que os alunos os quais

não falavam muito presencialmente estão se sobressaindo mais e se sentem mais à vontade

para falar no ambiente virtual. Já os alunos que eram mais falantes no presencial, agora no

contexto online, parece que estão “mais apagados”. C. diz que outros professores também

comentam sobre isso: “olha, tal aluno no presencial era muito tímido, agora no online ele está

falando bastante”. O ambiente virtual trouxe então mudanças significativas na configuração

do espaço social e relacional de alunos e professores, modificando as posições sociais dos

alunos. A posição social dos alunos na sala de aula influencia na configuração das relações

nesse espaço, conforme exposto por Mitjáns Martínez e González Rey (2017c) e por Tacca e

Branco (2008).

Os participantes identificaram também diferenças ligadas à fase de desenvolvimento

dos alunos. F. e G. explicitam uma diferença de pensamento e comportamento entre os alunos

de diferentes anos do Ensino Fundamental II.

Em relação ao 6º ano, por exemplo: F. afirma que os alunos do 6º ano não têm

vergonha uns dos outros, abrem a câmera sem se importar com sua aparência, se tomaram

banho ou não, se estão de pijama ou não, se estão com o cabelo arrumado ou não. F. diz que

os alunos de 6º ano também lidam melhor uns com os outros, querem saber sobre os outros,

perguntam como os colegas estão etc. G. diz que os alunos do 6º ano ainda são muito crianças

e gostam muito de falar, são muito participativos nas aulas e muitos falam ao mesmo tempo,

não esperam um a vez do outro de falar. G. explica que os alunos gostam de pesquisar e falar


55

sobre os assuntos da matéria e ir além. Ela afirma: “eu falo que eles viajam na maionese, né.

Eu falo assim: não, vamos voltar, vamos voltar para a Terra [...] a gente tem que botar um

freio neles senão vão embora.”

Em relação aos 7º, 8º e 9º anos: F. diz que os alunos do 7º ao 9º têm mais

preocupação com sua autoimagem. Ele diz que os alunos começam a ter vergonha do outro

adolescente, o outro torna-se uma barreira. Por medo de ser julgado pela aparência, por

exemplo, eles podem até falar no microfone, mas não abrem a câmera. F. e G. dizem que

esses comportamentos vão se acentuando com o passar dos anos, diminuindo o grau de

participação dos alunos nas aulas e a abertura das câmeras. Em relação à abertura de câmeras

dos alunos a partir do 7º ano, F. tem percepções interessantes. F. diz que os alunos que ligam

as câmeras são quem recentemente cortaram o cabelo, ou, principalmente as meninas, são as

que se maquiaram, passaram batom, arrumaram o cabelo. Ele diz que essa questão da

autoimagem é mais forte nas meninas, afirmando que os meninos mais facilmente abrem as

câmeras, mesmo sem estarem com cabelo arrumado, por exemplo. A autoimagem mostra-se

então como uma questão importante para a convivência dos adolescentes em geral e para as

meninas em particular. Essa questão da autoimagem e necessidade de aceitação que o

adolescente tem com seus pares é também vista nos estudos de Campolina e Oliveira (2012).

F. e G. relatam que os alunos do 7º ano têm comportamentos e pensamentos mais

parecidos com alunos do 8º e do 9º. A professora G. faz uma pequena diferenciação do 7º,

afirmando que os alunos são ainda participativos. São menos que o 6º ano, porém mais que os

anos posteriores.

G. percebe uma relação afetiva entre os alunos do 8º ano. G. diz que eles gostam de

compartilhar seus problemas, mesmo alguns sendo “bem confidenciais”, eles se expõem para

os colegas. G. diz que um aluno se identifica com a situação que o outro está passando e eles


56

se ajudam entre si. G. diz que os alunos gostam muito de participar quando na aula ela

envolve outros assuntos fora a matéria. Na pandemia principalmente ela percebe os alunos

mais carentes. G. criou, junto com os alunos, um grupo em aplicativo de mensagem. Ela

conta que os alunos perguntaram se podiam criar o grupo e ela apoiou. É um grupo dos

alunos de uma turma do 8º ano. Eles também quiseram incluir a professora G. no grupo. Ela

afirma que, nesse grupo de aplicativo, eles estipularam para não falar “nada de escola”. Eles

têm outro grupo de escola e esse é para “conversar outras coisas na hora que tiver a fim,

mandar memes [...]”. Nesse grupo eles também combinam de jogar juntos alguns jogos

virtuais. G. conta que eles colocaram o nome do grupo de “Alegria Total” e na descrição do

grupo colocaram: “uma família junto se resolve tudo”.

Essas situações de G. com seus alunos possibilitam importantes indicadores de como

se configura a subjetividade social da sala de aula de G. e as relações nesse espaço,

especialmente aqui com a turma de 8º ano. Essas informações de G. reforçam os indicadores

já formulados, de que sua relação com os alunos (e de certa forma, também dos outros

professores participantes da pesquisa) é marcada por valores como: intimidade, proximidade,

pessoalidade, horizontalidade e expressividade emocional. Além disso, há os valores de

responsabilidade e confiança, já identificados nas construções anteriores. A configuração

subjetiva das relações entre professor-aluno é permeada por um bom clima emocional

continuamente cultivado e cuidado. Esses sentidos subjetivos da relação professor-aluno

também reverberam na configuração das relações aluno-aluno e favorecem boas relações

também entre os alunos. Isso possibilita uma subjetividade social na sala de aula que propicia

a postura dos alunos como possíveis sujeitos, que podem agir como protagonistas de seu

processo de escolarização, como é a proposta das metodologias ativas e práticas pedagógicas

inovadoras (Alternative Education Resource Organization [AERO], 2020; Instituto Lasneaux,


57

2020; Marangon, 2004; Montessoriana, 2020; Sociedade Antroposófica do Brasil [SAB],

1998).

F. fala que os alunos de 9º ano não costumam abrir as câmeras. C. também é enfática

ao dizer que a “a exceção é abrir a câmera”. A professora G. exprime que os alunos do 9º ano

são “mais calados”. F. porém fala que fica atento quando alguém abre a câmera, pois

normalmente o aluno quer comunicar algo para a turma e para o professor. F. relata uma

situação interessante que aconteceu em uma turma de 9º ano:

O menino colocou a máscara do homem-aranha. Se fosse no 6º ano eu ia achar

normal, mas era lá no 9º ano. [...] colocar a máscara do homem-aranha, ligar a câmera

e ficar calado. O que que ele queria que você identificasse? O que que ele queria

mostrar? [...] comentei a máscara do homem-aranha e falei sobre o filme. [...] aí em

algo de 2, 3 minutos ele tirou a máscara e começou a conversar. [...] Eu percebi ou

recepcionei a ideia ou a atitude dele como sendo assim, que ele queria ser visto

naquele momento.

F. exprime que nunca pede para os alunos abrirem as câmeras, diz que eles ligam

espontaneamente quando eles querem ligar. F. diz que, ao perceber que algum aluno ligou a

câmera, ele busca compreender o que o aluno está tentando comunicar com esse gesto. Ele

fala que o aluno “colocou um brinco ou está com [...] uma roupa diferente [...]. Ele vai ligar a

câmera para que você note, que para você comente. Se você não comentar, de certa maneira

causa uma frustração nele. Então sempre tô atento a isso.” F. diz que, ao perceber a

mensagem que os alunos querem passar ao abrir as câmeras, ele os anima: “olha que legal, e

essa camisa, ficou legal, e esse boné!”.

Essas situações vividas por F. reforçam os indicadores já formulados sobre sua relação

com os alunos, que possivelmente também beneficia a relação dos alunos entre si em suas


58

aulas. Mais uma vez, F. atribui à filosofia esse olhar humanizado que possui: “eu costumo

falar para os colegas, falo assim: ‘talvez é a questão da filosofia, ela pega muito isso’, e eu

sou muito detalhista né”. Essas informações confirmam os indicadores de que F. preza por

uma relação humanizada com seus alunos, tem um olhar diferenciado para o humano,

demonstra valorizar cada pessoa humana em sua alteridade, em sua singularidade,

aproximando-se de um autêntico humanismo em discursos e práticas (Kant, 1785/2019;

Mundim Neto, 2017; Wojtyla, 1960/2015). O humanismo e a humanização das relações

mostram-se valores importantes para F., os quais integram e dão sentido à configuração

subjetiva de Filosofia e de ser professor de Filosofia para F. Ao mesmo tempo, essas mesmas

configurações subjetivas impulsionam a visão humanista de F. e fortalecem essa visão em

suas relações. O humanismo e a Filosofia para F. podem ser caracterizados como processos

subjetivos que se constituem mutuamente de forma recursiva e alimentam também outras

configurações subjetivas, nas relações com os alunos, com os professores e possivelmente em

outros espaços de relações em sua vida. São configurações e sentidos que demonstram

reverberar inclusive no projeto de robótica o qual ministra, provavelmente alimentando

também a configuração subjetiva que F. produz sobre a tecnologia e sua visão crítica em

relação a esta.

G. coloca uma visão geral sobre os comportamentos dos alunos do 6º ao 9º ano em

relação às provas. Ela diz que os alunos do 6º ao 8ª ano não consultaram o livro, nem

pesquisaram as respostas corretas para copiar e colar nas provas. G. percebeu isso através das

notas. Ela manifestou ter valorizado essa postura dos alunos. G. afirma que outros professores

também comentaram sobre isso. Ela então parabenizou os alunos por isso e melhorou a nota

deles, por terem mostrado essa responsabilidade e cultivado a relação de confiança. Esses já

foram valores vistos como importantes para G. Somado a esses pode-se identificar também o


59

valor da honestidade. Ela diz, porém, que os alunos do 9º ano já são mais “espertos”, já

pesquisam e colocam nas provas o que pesquisaram. G. exprime que, com esses

comportamentos e outros supracitados, ela consegue ver a “fase da adolescência ano a ano”.

A partir das informações apresentadas, pode-se construir indicadores sobre os valores

presentes nas relações aluno-aluno, as quais se mostraram ser propiciadas pelas boas relações

professor-aluno estabelecidas. No tocante ao 6º ano, destacam-se valores como: engajamento,

participação, estudiosidade, maravilhamento com o conhecimento, transparência, curiosidade,

amizade, positividade na concepção sobre o outro. Do 7º ano 9º, alguns valores em comum

aparentam ser: autoimagem, reputação, aparência, aceitação no grupo. Além desses, no 7º em

específico, ainda há a participação como um valor para a convivência. No 8º há também

valores de: intimidade, proximidade, expressividade emocional, amizade e união. No 9º,

percebe-se os valores já mencionados de autoimagem, reputação, aparência e aceitação no

grupo de forma mais acentuada. Há também o valor de negatividade na concepção sobre o

outro (o oposto do 6º ano). Isso pode estar gerando um possível sofrimento nos alunos e

receio de falar ou se mostrar pelo julgamento que podem receber de seus pares ou que

imaginam estar recebendo. A questão da necessidade da aceitação grupal pelo adolescente

torna-se muitas vezes uma configuração subjetiva dominante a qual se impõe sobre outras

configurações e sentidos subjetivos e desmobiliza o adolescente na produção de sentidos e

configurações subjetivas alternativas, fazendo-o querer inibir suas expressões subjetivas na

presença de seus pares (Campolina & Oliveira).

Essas formas diferentes de pensar e agir conforme os anos do Ensino Fundamental II

são configuradas subjetivamente a partir de aspectos individuais de cada adolescente e

também aspectos sociais e culturais. Essas diferentes configurações subjetivas construídas ao

longo da adolescência são marcadas por processos de desenvolvimento biopsicossociais


60

(Campolina & Oliveira, 2012). Há um emaranhado de sentidos e configurações subjetivas

presentes na adolescência, como: construção das identidades individuais e grupais,

construção da autoimagem, descoberta de desejos e interesses próprios ou coletivos, etc.

Esses processos subjetivos se desdobram em distintas formas de se relacionar entre os alunos

do 6º ao 9º ano, nesse recorte de 11 a 15 anos, com algumas diferenças também entre

meninos e meninas, conforme relatado pelos participantes e pela literatura científica de

Campolina e Oliveira (2012). Muitas vezes há grandes transformações entre um ano e outro,

devido à intensidade com que muitas vezes o adolescente vive sua construção e

desconstrução de identidade, de autoimagem, de pertença a um grupo ou mudança de grupos.

Além do mais, há processos biológicos, como o papel dos hormônios, os quais começam a se

intensificar, e a maturação cerebral, que passa por um processo de complexificação até em

torno dos 21 anos da pessoa (Campolina & Oliveira, 2012). Somado a esses aspectos, há

também a contínua transformação cultural, a imposição das modas e tendências, as quais

também são voláteis, a influência da mídia e redes sociais, as ideologias e filosofias de vida

propagadas e vividas por artistas ou influenciadores etc. Esses diferentes elementos culturais

estão presentes na subjetividade social na sociedade ocidental contemporânea e afetam de

modo particular os adolescentes (Campolina & Oliveira, 2012).

A visão da Teoria da Subjetividade sobre o desenvolvimento subjetivo da pessoa o

compreende como perpassado por representações e emoções, atravessado por processos

individuais e sociais. Sob essa ótica, esses diferentes fatores biopsicossociais serão

configurados subjetivamente por cada adolescente a partir dos recursos subjetivos que eles

possuem e que estão construindo para lidar com a realidade, com eles mesmos e com outros

(Campolina & Oliveira, 2012). Esse processo é singular para cada adolescente e também tem

diferentes produções subjetivas em cada fase do desenvolvimento. Além disso, os diferentes


61

fatores biológicos, psicoemocionais e socioculturais são configurados subjetivamente de

forma recursiva, um constituindo o outro, e alimentam diferentes processos e configurações

subjetivas nas diversas áreas da vida do adolescente (Campolina & Oliveira, 2012).

Estratégias socioemocionais para o campo virtual.

Ao pesquisador questionar sobre as relações professor-aluno, os participantes

exemplificaram situações interessantes que estavam vivenciando e estratégias que estavam

implementando para favorecer as relações na escola no ambiente virtual. F. expõe que, neste

período de pandemia, está usando a criatividade, pensando em estratégias para continuar

humanizando as relações, agora esfriadas pelo ambiente virtual. Ele afirma ter apenas uma

aula por semana, porém faz questão de, nos primeiros 20 minutos, conversar com os alunos.

F. diz que isso faz com que ele identifique as realidades dos alunos, as necessidades deles e

também faz os 30 minutos restantes de aula renderem mais. Isso mostra que as estratégias

adotadas por F. em sala de aula têm efeitos relacionais e também pedagógicos. F. também

fala que, durante a explicação da matéria, para e pergunta se os alunos estão entendendo, se

estão gostando. F. diz: “é para tentar mostrar para ele [...] olha, você é importante, [é

importante] você dar opinião. [...] é uma forma de construir esse cidadão, se expressando,

sem medo de falar, mostrando aquilo que ele acha que é certo.” Isso remete aos indicadores já

construídos e confirmados sobre as configurações subjetivas de F. e seus valores.

Mais uma vez, é reforçado o valor que cada pessoa humana tem para F. Ele também

consegue incentivar o desenvolvimento de competências socioemocionais nos alunos, como

comunicação e pensamento crítico. Essas duas estão entre as habilidades interpessoais

consideradas fundamentais para a escola em questão, de acordo com a visão dela sobre o

mercado profissional do século XXI, como anteriormente exposto na análise documental.

Nesse sentido, F. desenvolve ações que estão alinhadas ao que a escola espera. A motivação


62

de F. contudo, é humanista e não mercadológica, todavia com prováveis reverberações nas

futuras atuações profissionais dos alunos. São ações humanistas as quais podem favorecer

produções de sentidos subjetivos pelos alunos e desenvolvimento de ações que influenciam e

influenciarão nas mais diversas configurações subjetivas de diferentes áreas da vida ao longo

da trajetória deles. Sentidos subjetivos esses que possuem caráter processual e dinâmico e

podem favorecer a produção de novos sentidos. As ações de F. de construir cidadãos se

assemelham também aos princípios e objetivos das Assembleias Escolares (Araújo, 2008).

Uma importante estratégia socioemocional adotada por F. é a música. Ele disse que

inicia sempre sua aula com uma música, uma música que os próprios alunos escolhem e

pedem. Ele diz colocar a mesma música para todos os anos e tem já uma lista de música que

os alunos sugeriram. F. afirma que a música constrói pontes, sintoniza as pessoas, faz

conexões, entre ele professor e os alunos, entre os alunos entre si e também entre os alunos de

diferentes anos e fases de desenvolvimento entre si. Ele diz que é a mesma música para todos

os anos e todos gostam das mesmas músicas, do mesmo estilo, sempre músicas escolhidas e

sugeridas pelos alunos. A música para F. e para os alunos mostra-se uma importante

configuração subjetiva caracterizada por vários sentidos subjetivos que permeiam as

configurações subjetivas da relação professor-aluno, aluno-aluno e da relação dos alunos de

diferentes anos entre si. É uma estratégia de F. que está impactando a subjetividade social de

todo o espaço escolar, das diferentes salas de aula entre si, possivelmente influenciando o

clima emocional de todo o Ensino Fundamental II. Estratégia que favorece valores como:

união, conexão, proximidade afetiva e empatia. A música, desde a Idade Clássica até os

tempos atuais na Idade Contemporânea, é conhecida pela sua influência nos estados

psicoemocionais das pessoas (Mesti, 2015). Essa influência, de acordo com Mesti (2015) é

expressa pela própria Filosofia, como Platão em ‘A República’, o que reforça o indicador da


63

importância da filosofia para F. como configuração subjetiva, sendo inspiração para seus

pensamentos e ações.

Ademais, F., como filósofo que é, fez notáveis reflexões sobre as músicas escolhidas

pelos adolescentes. Ele diz que são músicas alegres ou que contém críticas sociais, o que

considera ser temas que os adolescentes gostam. F. fala também que os alunos enviam para

ele as músicas com os videoclipes e ele assiste. F. percebeu que as músicas e os videoclipes

que os alunos sugerem, a maioria aborda elementos como sol, praia, estar junto com os

amigos. Ou seja, tudo o que eles não estão tendo atualmente na pandemia. F. percebe serem

esses temas e elementos uma constante nas músicas sugeridas pelos alunos do 6º ao 9º ano.

Ele diz que os alunos estão tristes, desanimados, mas não sugerem músicas tristes, nem

solidão, nem que remetem a estar dentro de casa. F. interpreta esses comportamentos dos

alunos como que mostrando a saudade que eles têm do mundo lá fora, da vida pré-pandemia.

Ele diz que percebe essa saudade se refletindo nas músicas e nas conversas dos alunos.

Os estudos de Guilherme e colaboradoras (2020) já haviam alertado para o impacto

psicológico da pandemia e principalmente a fragilidade emocional das pessoas por conta da

situação pandêmica. Parece que os alunos estão buscando recursos subjetivos para compensar

essa fragilidade emocional, como no caso música que remetem à alegria e boas memórias.

Além da fragilidade emocional, os alunos de F. parecem expressar um sentimento forte de

saudade ou saudosismo. O que está sendo vivido pelos alunos no contexto pandêmico

assemelha-se à sensação de saudosismo de pessoas que sentem-se longe de sua terra, como

por exemplo Gonçalves Dias, o qual expressou fortemente essa sensação em sua famosa

“Canção do Exílio”, em 1846 (Correio Braziliense, 2021). Assemelha-se também à sensação

dos europeus no período das Guerras Mundiais em relação a como começaram a enxergar a

vida antes das Guerras, que passou a ser denominada de Belle Époque (a bela época)


64

(Oleques, 2021). Isso sinaliza que as diferentes configurações e sentidos subjetivos

produzidos na subjetividade individual e social de forma recursiva durante o contexto

pandêmico vigente serão importantes elementos de análises para futuros trabalhos científicos,

particularmente da Psicologia.

Situações de conflito e Assembleias Escolares.

A partir de em torno de 30 minutos da dinâmica conversacional com expressões mais

livres dos participantes, o pesquisador mostrou o indutor: uma breve apresentação das

Assembleias Escolares e dois casos de conflitos escolares que foram manejados a partir das

Assembleias. O primeiro caso envolvia o aumento de preços da cantina e o segundo envolvia

assédio sexual dos meninos com as meninas. Ambos os casos eram de crianças em torno de

8-10 anos. Ao ser apresentada ao indutor, G. conta algumas situações de conflitos as quais ela

teve de manejar. Ela diz que presenciou uma discussão no grupo de aplicativo de mensagem

dos alunos (o qual ela também está inserida, sendo essa uma importante informação já

comentada anteriormente). A professora G. então mandou mensagem no grupo querendo

compreender o motivo da discussão. Os alunos falaram que era uma situação de homofobia,

um dos alunos manifestou postura agressiva contra pessoas homossexuais e o resto da turma

se colocou contra ele, com muita mobilização emocional de raiva. Estudos de Natarelli,

Braga, Oliveira e Silva (2015) evidenciam essa discriminação de adolescentes em virtude da

sexualidade. Esse tipo de violência contra pessoas por causa de sua orientação sexual é

também visto com preocupação e recebe atenção especial em dados oficiais do Disque 100 e

Ligue 180 (Brasil, 2020).

A professora G. então se colocou em uma postura de mediadora (nesse momento, G.

falou que se identificou com o que o pesquisador falou sobre as Assembleias e, ao recordar

essa situação de conflito, ela estava se sentindo como se naquele momento tivesse feito uma


65

Assembleia - mesmo sem conhecer as Assembleias até então). G. diz que percebeu que os

alunos estavam com o “sangue quente”, estava um clima emocional muito “acalourado”.

Somado a isso, ela diz que o contexto virtual por mensagem dificulta uma satisfatória

mediação de conflitos. Ela então quis primeiramente acalmar os alunos e falou para eles que

iria abrir essa pauta para conversar na outra semana durante a aula dela. Ela falou para os

alunos também que quando estamos mobilizados pela raiva acabamos falando e fazendo

coisas que não queremos. G. disse também aos alunos naquele momento: “uma boa conversa

se resolve tudo”. Os alunos concordaram. Esse posicionamento de G. frente a uma situação

delicada de violência se aproxima muito dos princípios das Assembleias Escolares. Uma

postura de não acusação de pessoas e sim manejo de situações conflituosas. Uma postura

também de não necessariamente chegar a um consenso, mas ao menos lidar com o dissenso

de forma não violenta (Araújo, 2008).

G. continua falando sobre esse mesmo primeiro momento com os alunos via

aplicativo de mensagem. Ela parece ter aproveitado a situação para proporcionar um

momento educativo e reflexivo com os alunos. G. disse a eles “às vezes ele se interpretou

mal, não era aquilo que ele queria [falar], mas a gente já tá crucificando. Aí você pensa

assim, se fosse eu que tivesse falado?”. Parece que G. foi para um caminho de proporcionar a

autorreflexão nos alunos e a empatia com o colega que, mesmo tendo falado algo ruim, agora

estava em uma situação de linchamento e exclusão grupal. G. então agiu em uma perspectiva

de acalmar os ânimos para depois conversar sobre a situação com os alunos quando ele não

estiverem mais mobilizados emocionalmente e conseguirem fazer reflexões mais racionais.

Por fim naquele momento G. disse que ia habilitar a função de apenas o administrador do

grupo (no caso ela) poder mandar mensagem no grupo de aplicativo. Os alunos concordaram


66

e asim ela o fez. Esse primeiro momento ocorreu pela manhã, G. conta que estava de atestado

e viu essa movimentação no grupo de aplicativo.

G. disse que à noite habilitou novamente para todos falarem no grupo e perguntou se

os alunos estavam mais calmos. Eles responderam que sim. G. falou inclusive que o colega

havia se retratado e pedido desculpa, inclusive para a psicóloga escolar. Essa situação estava

ainda recente no momento da dinâmica conversacional, G. falou que no dia seguinte

retomaria essa pauta com os alunos na aula.

Ao analisar o posicionamento de G., é possível perceber que ela agiu conforme os

princípios das Assembleias Escolares, ainda que não conhecesse essa prática pedagógica.

Mediou o conflito, proporcionou reflexões, empatia, retirou o acusado de uma posição

vexatória e buscou junto com os alunos formas não violentas de lidar e resolver a situação

(Araújo, 2008). Chama a atenção também o fato de G. não ter tocado no conteúdo do

conflito: a violência verbal contra pessoas homossexuais, baseada em preconceito contra

pessoas em virtude de sua orientação sexual, o que pode se expressar em atos de

discriminação. É portanto uma situação grave de violência praticada pelo aluno em questão

(Brasil, 2020; Natarelli et al., 2015).

A professora C., no entanto, tem um olhar mais voltado para as questões sociais. Ela

diz que o fato de estar trabalhando com projetos sociais da escola está ajudando-a a ter mais

sensibilidade a esses temas sociais. Ser professora de projetos sociais e ter de manejar

situações que envolvem pessoas em situação de vulnerabilidade social tornaram-se

configurações subjetivas importantes na vida de C. Essas configurações fizeram-na produzir

sentidos subjetivos que alimentaram outras áreas de sua vida, outras configurações subjetivas.

C. conta:


67

nunca atendi menores em situação de vulnerabilidade, eu tô aprendendo bastante [...] e

eu percebo e já conversei com os alunos, é que na verdade os problemas são atrás de

mim. Os problemas são em casa, são problemas emocionais, afetivos, que tiveram,

que acabou, que culminou e acabou em uma briga comigo. Antigamente eu estaria

levando muito para o pessoal, hoje em dia eu já levo assim: não, calma.

Estar em projetos sociais foi um mobilizador para C. produzir sentidos subjetivos de

empatia e sensibilidade ao outro. Contribuiu também para C. ampliar sua compreensão da

complexa trama de sentidos e configurações subjetivas que envolve as causas de conflitos e

comportamentos como uma briga de um aluno com o professor.

Assembleias Escolares - Caso 1.

Ao comentar sobre o Caso 1 das Assembleias Escolares (Apêndice B), C. conta como

teria feito nessa situação. C. conta que primeiro motivaria os alunos a fazerem uma pesquisa

de mercado, para eles verem se o preço da cantina aumentou apenas na escola ou em outros

ambientes comerciais. Só depois de ter proporcionar nos alunos essa noção mais

contextualizada sobre a situação do aumento de preços que ela motivaria ir falar com o dono

da cantina. Essa visão de C. se aproxima do que foi feito nesse caso nas Assembleias

Escolares (Gosuen, 2020). No caso, o professor mediador falou para os alunos os vários

fatores sociais e econômicos que podem estar associados ao aumento de preços na cantina e a

partir dessa conscientização, também mobilizada pelos próprios alunos, que, a partir de uma

votação com os alunos, o mediador os motivou a queixarem-se com o dono da cantina. Uma

diferença é a forma como C. proporcionaria essa conscientização - a partir de uma pesquisa

de mercado. Essa proposta de C. provavelmente confirma o indicador formulado de que os

projetos sociais fizeram-na produzir sentidos subjetivos de maior sensibilidade para questões


68

sociais, fazendo-na ter esse olhar voltado para o social. Esse olhar é perceptível quando C.

propõe a pesquisa de mercado e fica mais evidente quando C. comenta sobre o Caso 2.

Ao falar sobre o Caso 1, F. elogia a proposta das Assembleias. F. reflete sobre como o

posicionamento do professor mediador nesse caso pode ter auxiliado esses alunos para toda a

vida deles. F fala: “olha essa criança, quando ele for adulto, ele sabe [...] o dono ele tem que

pagar funcionário, ele compra produto de uma, pode aumentar [..]”. F. também fala sobre os

alunos desse caso, dizendo que eles conseguem ter uma visão crítica da situação, talvez mais

do que o professor estava esperando. É interessante ressaltar que os dois casos das

Assembleias, que foram indutores nas dinâmicas conversacionais com os participantes,

aconteceram com crianças em torno de 10 anos. As Assembleias Escolares são aplicadas com

crianças desde a Educação Infantil (Araújo, 2008). O fato de o caso 1 ser com crianças de em

torno de 10 anos impressionou F.

A postura de F. frente a essa situação também confirma indicadores já formulados

sobre sentidos subjetivos produzidos por F. que envolvem as configurações subjetivas de F.

em relação à filosofia e à sua relação com os alunos. F. valoriza e incentiva o pensamento

crítico dos alunos. Isso o aproxima de princípios das Assembleias e mais ainda das

competências socioemocionais que a escola em questão visa construir em seus alunos

(Araújo, 2008; Proposta pedagógica da escola, 2020).

Assembleias Escolares - Caso 2.

O Caso 2, C. diz ser mais complicado. Ela conta que nessa situação ela teria que

primeiro saber se a situação é verdadeira e ouviria os dois lados, tanto do menino que estava

fazendo isso quanto das meninas. Depois de ouvir os dois lados, ela disse que falaria tanto

com o menino quanto com as meninas sobre a importância de se respeitar o outro e o corpo

do outro. C. conta como falaria com o menino junto com as meninas, após ouvir os dois


69

lados: “a partir do momento que você deixou alguém desconfortável com a sua atitude, não é

uma atitude legal. [...] É um desrespeito ao corpo dela. Você quer respeito com o seu corpo,

tenha respeito pelo corpo do outro também.” Isso mostra uma aproximação de C. aos

princípios das Assembleias de ouvir os dois lados ou os vários lados de uma situação,

proporcionando também reflexões e incentivando valores como respeito ao outro (Araújo,

2008).

C. conta também que teria de entrar no assunto da sexualidade e explicar essa questão

sexual para os alunos, fazendo uma breve educação sexual no momento. C. coloca que

explicaria que existem partes íntimas as quais não podem ser tocadas e falaria isso tanto para

as meninas quanto para o menino. Ela diria para eles que, se fosse ao contrário, se as meninas

tivessem esse comportamento com os meninos, também seria errado. C. mostraria que tantos

meninos quanto meninas têm partes íntimas e limites objetivos e subjetivos ao toque em seus

corpos. Ela mostraria a eles um critério para saber quando a ‘brincadeira’ é legal ou errada:

“se está desconfortável para mim então está errado. Se a sua atitude está desconfortável no

meu corpo então não é uma atitude legal”. C. então aproveitaria a situação para proporcionar

um momento educativo para ambas as partes, ensinando também valores e princípios para

eles levarem para suas vidas. Valores como o respeito ao corpo, seu e do outro, e a

sensibilidade às sensações próprias e às do outro, sensibilidade de perceber quando tal

comportamento está sendo confortável ou desconfortável para si ou para o outro, exercitando

assim o autoconhecimento e a empatia.

Por fim, C. afirma que em um último momento da conversa falaria apenas com as

meninas. C. diria para as meninas que, na escola, ela como professora pode mediar a situação,

porém elas deveriam se preparar para se o fato ocorrer em outro ambiente, como na rua ou

em casa. “Se acontecer isso na rua você vai reclamar para quem? Tem que falar para a própria


70

pessoa: ‘Olha, não gostei. Não faça. O corpo é meu.’ Saiba se posicionar em relação a isso.”

C. conclui afirmando: “Eu tento levar para o lado social. Não é só o ensinar ali a matéria, tem

que ensinar os alunos para a vida.” Isso confirma os indicadores já formulados de que C.,

muito por conta de sua experiência em projetos sociais da escola, produziu sentidos

subjetivos ligados à educação e à relação professor-aluno marcados por esse olhar para

questões sociais e maior sensibilidade a temas sociais. Essa afirmação de C. de uma educação

para a vida é também presente em Kelday (2021, no prelo), como um desafio e uma

necessidade da educação contemporânea.

F. fala que gostou do Caso 2 e de como foi manejado na Assembleia, destacando

também o processo de reflexão do menino, o qual inicialmente defendeu o comportamento de

passar a mão no bumbum das meninas e em um segundo momento não falou mais nada e

depois não emitiu mais o comportamento. F. diz que esse formato das Assembleias

proporciona “senso crítico” e uma percepção das normais sociais, necessárias para um bom

convívio, afirmando que os seres humanos são “animais políticos”. Mais uma vez as falas de

F. confirmam os indicadores de sentidos e configurações subjetivas que perpassam sua visão

filosófica sobre o ser humano e seu alinhamento com a escola no desenvolvimento de

competências socioemocionais como o “pensamento crítico”.


71

Conclusão

É possível afirmar que os objetivos da pesquisa foram alcançados. Foi possível,

através das dinâmicas conversacionais, compreender as expressões subjetivas dos

participantes relacionadas a suas experiências no contexto escolar. A partir dessas expressões

foi possível formular indicadores sobre as relações entre professores e alunos, os valores

presentes nessas situações e a atuação desses professores em situações de conflito que foram

vivenciadas por eles ou como eles teriam agido nas situações dos casos das Assembleias

Escolares. Somado a isso, a pesquisa também logrou êxito em compreender de forma ampla,

como um panorama geral, a escola pesquisada a partir da análise documental. A partir das

construções das informações na análise documental, o pesquisador pode formular indicadores

e hipóteses sobre configurações e sentidos subjetivos que possivelmente constituem a

subjetividade social da escola.

A escola mostrou ser uma escola voltada para o século XXI. Uma escola que pensa o

humano do século XXI e a sociedade do século XXI. Para isso, ela busca formar

trabalhadores competentes para este século, com foco nas inovações tecnológicas e no

desenvolvimento de competências socioemocionais nos estudantes. Importante frisar que esse

olhar da escola é considerado por Kelday (2021, no prelo) como imprescindível para todas as

escolas contemporâneas, especialmente a partir do ano de 2021. A escola pesquisada é

portanto em grande parte uma referência para as escolas atuais, com diferenciais que a põe

em destaque e em posição de vanguarda em relação a muitas outras escolas brasileiras, as

quais muitas vezes continuam no modelo tradicional, refém das críticas de Foucault

(1975/1999, 1979/2014), Minayo (1994) e Kelday (2021, no prelo). Somado a isso, a escola

tem também uma visão mais completa sobre ser humano e sobre educação e expressa isso ao

oferecer, além da educação, serviços de cultura, saúde, alimentação, esporte e serviços


72

sociais, através de espaços (é uma escola com boa infraestrutura) e de projetos (como os

projetos sociais de C.).

A problematização feita na pesquisa é de que: é importante esse olhar mais completo

sobre o humano e a educação ter motivações autenticamente humanistas e não puramente

mercadológicas, o que retornaria para o modelo tradicional industrial (Kelday, 2021, no

prelo). A pessoa humana deve ser sempre um fim em si mesma, nunca instrumentalizada para

se obter algo, como enfatizam os pensadores Kant (1785/2019), Mundim Neto (2017) e

Wojtyla (1960/2015). A educação deve servir à pessoa humana para que ela se aproprie de

sua vida e seja protagonista, sujeito de seu processo educativo, como propõem as práticas

inovadoras, por exemplo Alternative Education Resource Organization [AERO] (2020),

Instituto Lasneaux (2020), Marangon (2004), Montessoriana (2020) e Sociedade

Antroposófica do Brasil [SAB] (1998). Nesse sentido, o foco em desenvolver habilidades

relacionais e gestão das emoções deve ser motivado por um autêntico compromisso com a

pessoa, empatia, cuidado, escuta e acolhimento. A motivação não deve ser por exemplo

querer transformar essa pessoa para que ela se adeque a determinado perfil profissional

exigido pelo mercado do século XXI. Alternativamente, Kelday (2021, no prelo) confirma

que a escola contemporânea deve preparar os alunos para a vida e para o trabalho.

Ao mesmo tempo, o protagonismo juvenil deve ter uma mediação de adultos, como

relembra Arendt (1957/2011). Os professores participantes mostraram-se ser verdadeiros

mediadores de conflitos e situações com os alunos e favorecedores de uma boa relação

professor-aluno e também aluno-aluno. Foi perceptível que as relações professor-aluno

proporcionavam climas emocionais no espaço escolar que favoreciam as relações dos

próprios alunos entre si. Ademais, por vezes até mesmo a relação professor-professor

favorecia a relação professor-aluno e aluno-aluno. Essa última afirmação ficou mais evidente


73

na fala de G. que, de forma explícita, usa sua relação professor-professor ou

professor-coordenador para favorecer relações com os próprios alunos.

Isso reforça o que preconiza a Teoria da Subjetividade: os processos subjetivos, que se

expressam nas relações, são dinâmicos, processuais e recursivos. Ou seja, eles constituem

outros processos subjetivos e são constituídos por esses outros processos em uma complexa

trama de sentidos e configurações subjetivos que se inter-relacionam, se retroalimentam

(González Rey, 2016; Mitjáns Martínez & González Rey, 2017b). É possível afirmar com

isso a importância de os gestores escolares terem um olhar voltado para as relações no

ambiente escolar, para como elas estão se configurando, sobretudo as relações dos

profissionais entre si. O trabalho em equipe na escola deve ter uma perspectiva integrativa e

contributiva, não de superposição ou individualismo, como recorda Mitjáns Martínez (2010)

e Palmieri e Branco (2007). Por isso, mais importante do que desenvolver projetos ou fazer

uma modernização tecnológica, é prezar pelos profissionais da escola, professores e outros

profissionais. Prezar por um bom clima emocional entre eles e um eficiente trabalho em

equipe, com relações saudáveis. Isso pode favorecer o clima emocional da sala de aula,

favorecer a relação dos profissionais com os alunos e dos próprios alunos entre si. O

pesquisador, a partir da Teoria da Subjetividade, entende que os aspectos cognitivos e

afetivos estão inter-relacionados. Sob essa lógica, um bom clima emocional, a partir de boas

relações estabelecidas, proporciona também um eficiente trabalho pedagógico, com bons

resultados de aprendizagem dos alunos. O cuidado com as relações está, por conseguinte,

alinhado com os objetivos e resultados que os gestores escolares desejam em suas instituições

educacionais.

Além de a escola ser uma instituição diferenciada, que se destaca em relação a muitas

outras escolas atuais, os professores participantes também são, sob vários aspectos, sui


74

generis, como a própria coordenadora reconheceu e por isso os escolheu para serem

participantes. Mostraram-se ser professores que valorizam o protagonismo juvenil, uma boa

relação com o aluno, os aspectos emocionais, importam-se com as alegrias e sofrimentos de

seus alunos, buscam ajudá-los além do que envolve a disciplina, em situações sociais,

formando neles princípios para a vida etc. São professores que veem verdadeiramente os

alunos como pessoas, estabelecendo relações horizontalizadas de pessoa-pessoa e não

superior-subordinado. Ao mesmo tempo, têm em si sua autoridade e se responsabilizam pelo

mundo o qual apresentam aos alunos e no qual os inserem, conforme ressalta Arendt

(1957/2011). Essa autoridade está porém sempre à serviço dos alunos, de suas necessidades e

do crescimento deles nas dimensões cognitivas, afetivas e sociais.

Eles também usaram sua criatividade e desenvolveram interessantes estratégias

pedagógicas e socioemocionais para o campo virtual, servindo-se da própria tecnologia (fria,

como lembra F.) para impulsionar boas relações. Os professores participantes estão alinhados

tanto com a visão humanista (Kant, 1785/2019; Mundim Neto, 2017; & Wojtyla, 1960/2015)

quanto com as práticas pedagógicas inovadoras (Alternative Education Resource

Organization [AERO], 2020; Instituto Lasneaux, 2020; Marangon, 2004; Montessoriana,

2020; & Sociedade Antroposófica do Brasil [SAB], 1998). Eles também estão alinhados aos

princípios e objetivos das Assembleias Escolares (Araújo, 2008), sendo que G. disse que

fazia algo parecido com as Assembleias sem saber. Esses professores servem portanto de

exemplo e modelo para todos os professores. Com isso o pesquisador não quer dizer que eles

devem ser imitados, mas que é desejável que todos os professores também se guiem pelos

mesmos princípios humanistas - vendo os alunos como pessoas em toda sua rica

subjetividade e complexidade - e estruturem estratégias pedagógicas e socioemocionais com

o objetivo de - proporcionar o protagonismo juvenil nos alunos, para que eles se apropriem e


75

se tornem sujeitos, ativos em seu processo de aprendizagem. Tudo isso permeado pelos

valores pró-sociais, favorecendo boas relações e bom clima emocional na sala de aula.

Elementos que não eram foco da pesquisa, mas também apareceram foram: o papel da

psicologia escolar e o impacto da pandemia nas subjetividades individuais e sociais. A

psicologia escolar poder ter um importante papel no desenvolvimento de projetos sociais e

culturais, mediação de conflitos e questões sociais, educação sexual, desenvolvimento de

competências socioemocionais, etc (Mitjáns Martinez, 2010). Ela pode também auxiliar na

autorreflexão dos profissionais escolares sobre suas práticas, proporcionar boas relações na

escola e, principalmente no contexto pandêmico, ajudar na sensibilização dos profissionais a

aspectos emocionais dos estudantes, auxiliando a escola a ser um espaço de escuta, cuidado e

acolhimento, como sugere Guilherme e colaboradoras (2020). Os professores participantes

relataram ter boas relações e compartilhamentos com a psicóloga da escola em questão, mas

não foi possível obter informações suficientes sobre esse profissional escolar.


76

Considerações Finais

A escola pesquisada é excepcional, como também os professores participantes. Uma

escola aos moldes da sociedade contemporânea, com professores humanistas, os quais são

reconhecidos e prestigiados pela própria coordenadora pedagógica. Foi ricamente

identificado como se configuram as relações entre professores e alunos, como os

participantes lidam com os conflitos e fazem papel de mediadores. Também ficou evidente a

promoção de valores pró-sociais pelos participantes nas diferentes relações estabelecidas.

Foi interessante notar o caráter recursivo e dinâmico das relações professor-professor,

professor-aluno e aluno-aluno. Como essas três configurações subjetivas estão permeadas por

sentidos subjetivos que se inter-relacionam e se constituem mutuamente. Isso evidencia como

uma boa relação professor-professor pode beneficiar uma boa relação aluno-aluno e favorecer

um bom clima emocional em todo o espaço escolar. Foi animador também ver o potencial

criativo desses professores na pandemia, desenvolvendo estratégias pedagógicas e

socioemocionais para o campo virtual, alinhadas às práticas pedagógicas inovadoras.

A Teoria da Subjetividade se mostrou também como fundamental para as análises e

construções feitas a partir dos documentos e das dinâmicas conversacionais. A possibilidade

de o participante se expressar mais livremente, com relatos de suas experiências de vida,

atrelados às emoções que essas experiências evocam, permitiram uma boa relação entre

pesquisador e participantes. Além disso, todo o cenário social construído favoreceu boas

relações entre pesquisador e escola pesquisada. Desde a interação do pesquisador com a

diretora, o histórico de boas relações entre a escola pesquisada e a universidade do

pesquisador, bem como a abertura que a coordenadora demonstrou à pesquisa, selecionando

seus três melhores professores, professores de ‘forte engajamento pedagógico’ (sic)

proporcionaram um bom desenvolvimento da pesquisa. Esse cenário social da pesquisa


77

reforça ainda as conclusões feitas de que, mais do que instrumentos metodológicos ou

conhecimento teórico (no caso das pesquisas), é ainda mais importante cultivar as relações

que se estabelecem entre o(s) pesquisador(es) e os participantes ou instituições da pesquisa.

Por fim, ao longo da análise foi identificado outros elementos como o papel da

psicologia escolar e o impacto da pandemia nas subjetividades sociais e individuais. Esses

elementos não eram o foco da pesquisa e ainda carecem de informações, sendo assim

sugestões para futuros estudos.


78

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90

Apêndices

Apêndice A

Eixos para a dinâmica conversacional.

● convívio na escola (as atividades da escola, o convívio com os funcionários, a

organização);

● relações interpessoais (relações entre os colegas, professores e alunos e possíveis

conflitos).


91

Apêndice B

Assembleias Escolares.

As Assembleias Escolares visam um papel mais ativo nos alunos, maior participação

deles nas decisões escolares, além de desenvolver a cidadania. Elas valorizam as diferentes

opiniões, buscando formar uma consciência cidadã nos alunos de respeito, igualdade,

descentralização de si para olhar o coletivo, se importar com o outro, com o social. As

assembleias não necessariamente objetivam chegar em um consenso, mas ao menos lidar com

o dissenso de forma não violenta.

Nas assembleias, os alunos falam sobre o convívio escolar e as relações interpessoais.

O convívio escolar inclui limpeza da escola, as atividades da escola, os funcionários, a

organização. As relações interpessoais incluem brigas entre colegas, perseguições, relações

autoritárias, assédio psicológico ou moral, chantagens etc. Os alunos escrevem ao longo de

uma semana em uma cartolina afixada na sala as críticas e os elogios que querem debater na

assembleia. Eles escreverão de forma anônima, sem se identificarem. Escreverão também de

forma impessoal, sem identificar pessoa alguma, relatando apenas a situação. No dia da

assembleia, eles se reúnem em roda com um professor mediador e discutem cada ponto que

foi escrito na cartolina, sem citar ninguém e deixando livre para todos falarem sobre os

tópicos. Todo aluno pode expressar seu ponto de vista, ainda que divirja da maioria.

Caso 1: Os alunos falaram na Assembleia que estavam insatisfeitos com o aumento

dos preços na cantina. O professor mediador, então, levanta a possibilidade de os alunos irem

conversar com o dono da cantina e fala para os alunos alguns fatores que podem explicar esse

aumento de preços. Após realizar uma votação com os alunos, o professor mediador os leva

até o dono da cantina para os alunos falarem suas queixas, de forma respeitosa. Havia alunos


92

que não concordavam com o aumento de preço, outros concordavam e falavam, outros ainda

não tinham interesse pela pauta e expressaram também isso, afirmando que não era algo que

os atingia.

Caso 2: As meninas começaram a reclamar dos meninos passarem a mão no bumbum

delas, na verdade era apenas um menino. O autor do ato quis falar como se nada tivesse a ver

com ele. O menino reincidiu no ato. Após mais uma assembleia com o assunto em pauta, o

menino não falou mais nada e depois não realizou mais o ato com as meninas.


93

Anexos

Anexo A

CARTA DE ACEITE DA INSTITUIÇÃO

Eu, ______________________________, dirigente da instituição __________________,

cidade de ________________, CPF n.º ____________________, declaro que João Lucas Vale

Giffoni, aluno do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), Campus Asa Norte, CPF n.º

054.041.391-70, apresentou-me o projeto de monografia “Expressões Subjetivas dos

Conflitos Escolares - Assembleias Escolares Valores Pró-sociais e Relações Dialógicas”,

cujas atividades serão desenvolvidas na instituição por mim dirigida, e que me sinto

perfeitamente esclarecido sobre o conteúdo e os eventuais riscos e benefícios.

Desse modo, AUTORIZO a realização, nesta instituição, do projeto de monografia,

colocando-me à disposição para cooperar com a execução das atividades e permitindo o uso

de informações e imagens, exceto aquelas determinadas como sigilosas por aspectos legais e

éticos, para divulgação do projeto, desde que utilizadas para fins estritamente acadêmicos,

culturais e esportivos, sem finalidade de obtenção de lucro.

_____________________________________

LOCAL E DATA

_________________________________________________________

ASSINATURA DO DIRIGENTE DA INSTITUIÇÃO


94

Anexo B

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE

Título do projeto: Expressões Subjetivas dos Conflitos Escolares - Assembleias Escolares Valores

Pró-sociais e Relações Dialógicas

Instituição dos pesquisadores: Centro Universitário de Brasília (UniCEUB)

Pesquisadora responsável: Dra. Luciana de Oliveira Campolina

Pesquisador assistente: João Lucas Vale Giffoni

Você está sendo convidado(a) a participar do projeto de pesquisa acima citado. O texto abaixo

apresenta todas as informações necessárias sobre o que estamos fazendo. Sua colaboração neste

estudo será de muita importância para nós, mas se desistir a qualquer momento, isso não lhe causará

prejuízo.

O nome deste documento que você está lendo é Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Antes de decidir se deseja participar, de livre e espontânea vontade, você deverá ler e compreender

todo o conteúdo. Ao final, caso decida participar, você será solicitado a assiná-lo e receberá uma

cópia do mesmo.

Antes de assinar, faça perguntas sobre tudo o que não tiver entendido bem. A equipe deste estudo

responderá às suas perguntas a qualquer momento (antes, durante e após o estudo).

Natureza e objetivos do estudo

O objetivo deste estudo é compreender as diferentes expressões subjetivas de

professores/coordenadores sobre conflitos existentes na escola.

Você está sendo convidado a participar por ser professor ou coordenador dessa escola e voluntário. A

presente pesquisa faz parte de um trabalho de conclusão do curso de Psicologia.

Procedimentos do estudo

Sua participação consistirá em participar de uma dinâmica conversacional. Uma conversação em que

ficará livre para expor o que quiser. A dinâmica será em torno dos temas do convívio escolar e das

relações interpessoais na escola. Esse momento terá uma duração entre 40 e 60 minutos. A partir

dessa primeira dinâmica, poderão ser feitas outras dinâmicas conversacionais caso se interesse pelas

Assembleias Escolares. Não haverá nenhuma outra forma de envolvimento ou comprometimento

neste estudo. A pesquisa será realizada através de uma plataforma online de videochamada e será

gravada.

Riscos e benefícios

Este estudo possui riscos baixos que são inerentes aos temas abordados, que podem recordar

experiências negativas ou permitir falas com carga emocional. De acordo com a resolução CNS nº

(61) 3966-1200 | www.uniceub.br | central.atendimento@uniceub.br

Unidade sede: SEPN 707/907 – CEP 70790-075 – Brasília-DF


95

466/12 toda pesquisa envolve risco. No entanto, os riscos associados à participação nesta pesquisa

são baixos. Os riscos de participar desta pesquisa estão associados a suas experiências na escola, que

podem fazer emoções virem à tona.

Para minimizar qualquer risco ou incômodo relacionado à participação nesta pesquisa, solicitamos

que você participe em um ambiente tranquilo, o mais livre possível de barulhos e outros eventos que

possam desviar sua atenção.

Caso algum assunto possa gerar algum tipo de constrangimento, você não precisa abordá-lo. Os

pesquisadores se comprometem a oferecer serviço de Psicologia no CENFOR/UniCEUB, caso você

precise de atendimento psicoterapêutico. Com sua participação nesta pesquisa você poderá ajudar

na maior compreensão sobre o convívio escolar e as relações interpessoais na escola.

Com sua participação nesta pesquisa você poderá ajudar no maior conhecimento sobre possíveis

conflitos presentes na escola e os valores presentes no ambiente escolar.

Participação, recusa e direito de se retirar do estudo

Sua participação é voluntária. Você não terá nenhum prejuízo se não quiser participar. Você poderá

se retirar desta pesquisa a qualquer momento, bastando para isso entrar em contato com um dos

pesquisadores responsáveis. Conforme previsto pelas normas brasileiras de pesquisa com a

participação de seres humanos, você não receberá nenhum tipo de compensação financeira pela sua

participação neste estudo.

Confidencialidade

Seus dados serão manuseados somente pelos pesquisadores e não será permitido o acesso a outras

pessoas.

Os dados e instrumentos utilizados (como documentos, anotações, dinâmicas, etc) ficarão guardados

sob a responsabilidade de Luciana de Oliveira Campolina, com a garantia de manutenção do sigilo e

confidencialidade, e arquivados por um período de 5 anos. Após esse tempo serão destruídos.

Os resultados deste trabalho poderão ser apresentados em encontros ou revistas científicas.

Entretanto, ele mostrará apenas os resultados obtidos como um todo, sem revelar seu nome,

instituição a qual pertence ou qualquer informação que esteja relacionada com sua privacidade.

Se houver alguma consideração ou dúvida referente aos aspectos éticos da pesquisa, entre em

contato com o Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Brasília – CEP/UniCEUB, que

aprovou esta pesquisa, pelo telefone 61 3966-1511 ou pelo e-mail cep.uniceub@uniceub.br. Também

entre em contato para informar ocorrências irregulares ou danosas durante a sua participação no

estudo.

Caso você aceite participar dessa pesquisa, preencha, por gentileza, os dados abaixo:

Eu, ___________________________________________________, RG _______________, após

receber a explicação completa dos objetivos do estudo e dos procedimentos envolvidos nesta

pesquisa, concordo voluntariamente em fazer parte deste estudo.

Este Termo de Consentimento encontra-se impresso em duas vias, sendo que uma cópia será

arquivada pelo pesquisador responsável, e a outra será fornecida ao senhor(a).

Brasília, ____ de __________ de _______ .

(61) 3966-1200 | www.uniceub.br | central.atendimento@uniceub.br

Unidade sede: SEPN 707/907 – CEP 70790-075 – Brasília-DF


96

_________________________

Assinatura do(a) Participante

________________________

Luciana de Oliveira

Campolina

luciana.campolina@ceub.edu.br

________________________

João Lucas Vale Giffoni

joaolucasvgiffoni@sempreceub.com

Endereço dos responsáveis pela pesquisa:

Instituição: Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) | (61) 3966-1304 | (61) 3966-1200 Endereço:

SEPN 707/907, Bloco 9, Asa Norte, 70790-075, Brasília-DF

(61) 3966-1200 | www.uniceub.br | central.atendimento@uniceub.br

Unidade sede: SEPN 707/907 – CEP 70790-075 – Brasília-DF


97

Anexo C

Vídeo sobre as Assembleias Escolares do MEC TV

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