27.10.2021 Views

Coleções - O Mundo de Angela

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Textos <strong>de</strong><br />

<strong>Angela</strong> Maria<br />

Brighenti


<strong>Coleções</strong><br />

Dados Internacionais <strong>de</strong> Catalogação na Publicação (CIP)<br />

B855<br />

Brighenti, <strong>Angela</strong> Maria<br />

<strong>Coleções</strong> / <strong>Angela</strong> Maria Brighenti;<br />

ilustrações <strong>de</strong> Milena Nogueira ... [et al.]. – São Paulo : Edições Viva e Deixe Viver,<br />

2021.<br />

68 p. : il.<br />

ISBN: 978-65-994682-5-4<br />

1. Coletânea/Miscelânea. I. Nogueira, Milena (il.). II. Título.<br />

CDU: 82-8<br />

Ficha catalográfica elaborada por: Adriana Aparecida da Luz - CRB: 8/9360<br />

Índices para catálogo sistemático<br />

1. Coletânea/Miscelânea B869.8<br />

Associação Viva<br />

e Deixe Viver<br />

Valdir Cimino<br />

Atados<br />

Augusto Lima Conte<br />

Fernanda Tiveron Dall’Antonia<br />

Isabela <strong>de</strong> Paula Beato<br />

Coor<strong>de</strong>nação<br />

Paulo Zilberman<br />

Produção<br />

Ana Paula Monteiro<br />

Projeto gráfico<br />

Luciana Souza<br />

Sabrina Zerlini <strong>de</strong> Sá<br />

Vanessa Lopes<br />

Victor Luiz Magalhães<br />

Capa<br />

Luciana Souza<br />

Diagramação<br />

Victor Luiz Magalhães<br />

Ilustrações<br />

Ananda Laura<br />

Gabriela Tiburcio Guimarães<br />

Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva<br />

Leticia Santana<br />

Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

Milena Nogueira<br />

Nicolie Santana<br />

Talysson Lima<br />

2 3


Índice<br />

Introdução 6<br />

Prefácio 9<br />

Coleção Crianças<br />

Contos vivos 12<br />

Que bolodório! 14<br />

Pula- pula, pula pulga, pula mais! 16<br />

O que é o que é? 18<br />

Era uma vez... 20<br />

O poema da pizza 22<br />

Minhas crianças 24<br />

Crianças 26<br />

Meu cachorro 28<br />

On<strong>de</strong> brincam as crianças? 32<br />

Coleção Canto Real<br />

On<strong>de</strong> está? Aon<strong>de</strong> foi? 36<br />

A alegria das luzes 38<br />

Quem és tu? 40<br />

Sob a noite <strong>de</strong> chuva 42<br />

Acasos são falsos 44<br />

Por on<strong>de</strong> tu me levaste 46<br />

A<strong>de</strong>us 48<br />

O tempo 50<br />

Tu, que eu nunca esperei 52<br />

A arte e a vida 54<br />

Eu em teus braços 56<br />

A mão que escreve (para Pedro Du Bois) 58<br />

Domingo é dia... 60<br />

As aparências enganam 62<br />

Se eu tivesse passado minha vida a teu lado I 64<br />

Se eu tivesse passado minha vida a teu lado II 66<br />

Minibiografia 68<br />

4 5


Introdução<br />

Natural <strong>de</strong> São Carlos, no Estado <strong>de</strong> São Paulo,<br />

<strong>de</strong> uma família <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> italianos da<br />

região do Veneto, <strong>Angela</strong> Maria Brighenti<br />

foi a terceira <strong>de</strong>ntre seis filhos. Estudou na<br />

“Escola Normal” da cida<strong>de</strong>, dos 7 aos 17 anos, e<br />

adorava línguas estrangeiras, principalmente<br />

Inglês e Alemão.<br />

Graduou-se em Engenharia <strong>de</strong> Materiais pela<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos, em 1978,<br />

e seguiu carreira instigante e <strong>de</strong>safiadora até<br />

2006. Concluiu pós-graduação lato sensu pelo<br />

MBA Internacional e Curso <strong>de</strong> Especialização<br />

em Gestão Ambiental da Proenco Brasil, tendo<br />

escrito monografia intitulada “Os plásticos e<br />

o lixo nas cida<strong>de</strong>s” em 2006.<br />

Em 2007 tornou-se contadora <strong>de</strong> histórias<br />

pela “Associação Viva e Deixe Viver” e esta<br />

foi uma experiência inesquecível, assim<br />

como, provavelmente, o gatilho do processo<br />

<strong>de</strong> escrever e compor. A partir <strong>de</strong> 2008<br />

começou a compor textos e canções que<br />

servem à teatralização e contação <strong>de</strong> histórias<br />

no contexto da educação ambiental para<br />

o consumo consciente, lixo pós-consumo,<br />

poluição ambiental e coleta seletiva.<br />

Infelizmente, vítima <strong>de</strong> um câncer, <strong>Angela</strong><br />

faleceu em 2011.<br />

Em março <strong>de</strong>ste ano a família da <strong>Angela</strong><br />

entrou em contato com a Associação Viva<br />

e Deixe Viver para apresentar um legado <strong>de</strong><br />

histórias, estórias e canções para divertir,<br />

ensinar e apren<strong>de</strong>r.<br />

O objetivo <strong>de</strong> mobilizar pessoas gerando<br />

transformações positivas na socieda<strong>de</strong> foi<br />

o elo que levou a Viva a contatar a Atados,<br />

para a realização <strong>de</strong> uma parceria para esse<br />

projeto, convidando pessoas à oportunida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> um trabalho voluntário para a execução<br />

das ilustrações e diagramação dos livros<br />

<strong>de</strong>ixados por <strong>Angela</strong>, com a supervisão <strong>de</strong> um<br />

profissional técnico da área.<br />

A transformação positiva é o que move o<br />

trabalho <strong>de</strong> ambas as organizações envolvidas<br />

nesse projeto, gerando um brilhante resultado<br />

que você encontra aqui.<br />

Agra<strong>de</strong>cemos à querida voluntária <strong>Angela</strong><br />

(in memoriam), assim como sua família que<br />

acreditou nessa união viva e potente da arte.<br />

Luciana dos Santos Bernardo<br />

Associação Viva e Deixe Viver<br />

Outubro/2021<br />

<strong>Angela</strong>, <strong>de</strong>senhada por<br />

Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

6 7


Prefácio<br />

<strong>Angela</strong>, pintada<br />

por Flora Brina<br />

Como bem disse o meu irmão,<br />

o “Anda Ambiente” nasceu da<br />

transformação, da reinvenção<br />

e da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se olhar<br />

para frente e cuidar, ensinar e<br />

influenciar as nossas crianças.<br />

Inclusive as internas.<br />

Essa coleção é inteiramente<br />

<strong>de</strong>dicada às nossas crianças.<br />

As que são. As que foram.<br />

As que gostaríamos <strong>de</strong> ter sido.<br />

As que virão. Até as crianças <strong>de</strong><br />

quatro patas.<br />

Segundo a autora, são bênçãos<br />

na entrada da sala <strong>de</strong> visitas.<br />

Feixe <strong>de</strong> luz clara.<br />

Parte <strong>de</strong> quem por alguns<br />

momentos se amou.<br />

As crianças são o futuro.<br />

As novas possibilida<strong>de</strong>s.<br />

A chance <strong>de</strong> se fazer o certo.<br />

“Minhas crianças por alguns<br />

momentos <strong>de</strong> sua dor se separam,<br />

Mamães e papais novamente<br />

se alegram, Brilham os olhares<br />

<strong>de</strong> seus pequenos e abre-se<br />

seu sorriso,<br />

Porque no mundo da contação<br />

<strong>de</strong> histórias, ser menino<br />

e menina é que é glória!”<br />

Felipe Brighenti Salles<br />

Leonardo Brighenti Salles<br />

<strong>Angela</strong>, <strong>de</strong>senhada por Ananda Laura<br />

8 9


10<br />

COLEÇÃO<br />

CRIANÇAS


CONTOS VIVOS<br />

Contar, cantar, fazer <strong>de</strong> conta, acalantar, brincar! Amar!<br />

Alma!<br />

Mala!<br />

Tudo cheio <strong>de</strong> contas e contos!<br />

Contadores cheios <strong>de</strong> histórias!<br />

Histórias vivas do Viva!<br />

Risos vivos da contação dos livros <strong>de</strong> histórias,<br />

Que se perpetuam nos rabiscos, nas falas, nas bibliotecas,<br />

E abrem espaço para o sentimento contido que a vida presencia,<br />

Nos corações dos pequenos que cantam o canto vivo da melodia,<br />

Dos contos vivos do Viva!<br />

Ilustração: Milena Nogueira<br />

13


QUE BOLODÓRIO!<br />

Era uma vez um chinês que era bem gordo e falava francês.<br />

Era outra vez outro chinês que era bem magro e falava inglês.<br />

O chinês bem gordo comia brioche, pavê, mousse e patê e dizia<br />

“Voilá, isso sim é que é passar bem”! O chinês bem magro comia<br />

arroz hoje, amanhã e <strong>de</strong>pois e não falava nada porque comer arroz<br />

hoje, amanhã e <strong>de</strong>pois, é <strong>de</strong>mais, arroz!<br />

Era uma vez um francês bem gordo que falava chinês.<br />

Era outra vez um inglês bem magro que não falava inglês!...Ops!<br />

O inglês bem magro não falava chinês nem francês, mas o chinês<br />

bem magro falava inglês e francês.<br />

Era uma vez um chinês que era bem gordo e falava português.<br />

Era outra vez outro chinês que era bem magro e falava japonês.<br />

O chinês bem gordo comia pastel e falava<br />

“quero esse que tem gosto <strong>de</strong> mel”!<br />

O chinês bem magro comia acelga e não falava nada<br />

porque acelga tem gosto <strong>de</strong> relva!<br />

Chinês, francês, inglês, português! Falatório frenético<br />

esse palavreado! Palavrório doido esse bolodório!<br />

Qual era o chinês que falava japonês?<br />

14<br />

Ilustração: Talysson Lima<br />

15


Ilustração: Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

PULA-PULA,<br />

PULA PULGA,<br />

PULA MAIS!<br />

Pula um, pula dois, pula três!<br />

Pula-pula, pulga, pulou!<br />

Saltita, levanta, sobe a alavanca!<br />

Desce e vira, sobe e <strong>de</strong>sce - que tortura!<br />

Pula e salta, mas não voa!<br />

Pren<strong>de</strong> e solta, escapa e não volta!<br />

Veja bem, pulguinha, estou vendo você,<br />

De on<strong>de</strong> você vem? Para on<strong>de</strong> você vai?<br />

Por que vive tanto a saltar?<br />

Deixe meu amigo em paz!<br />

Rolando para lá e para cá,<br />

Bibo quer livrar-se <strong>de</strong> seu pulo, pulguinha!<br />

Você vai ajudar?<br />

Venha logo se molhar!<br />

Bibo toma banho dia sim,<br />

dia não e vai lá fora secar<br />

Agora é sua vez <strong>de</strong> se afogar<br />

Aproveite para escapar !<br />

Pula-pula, pulga, pulicidae, pulou!<br />

16<br />

Escon<strong>de</strong>u, fugiu...<br />

Afogou<br />

17


18<br />

O QUE É<br />

O QUE É?<br />

Ludopédio será um jogo com<br />

bola que se joga com os pés?<br />

Dou-lhe uma, dou-lhe três!<br />

Ah! Já sei, é o futebol do freguês,<br />

Mas é também o bate-bola do inglês.<br />

Enciclopédico, ortopédico, védico,<br />

po<strong>de</strong>ria ser alguém que é médico?<br />

Dou-lhe uma, dou-lhe três!<br />

Centopéia é um caterpilar que tem<br />

cem pés? O sabe-tudo que<br />

é enciclopédico já respon<strong>de</strong>u,<br />

E agora apren<strong>de</strong>u que tratamento<br />

védico não é ortopédico!<br />

Ludâmbulo, funâmbulo, sonâmbulo,<br />

o que é o que é? Será o fulano turista<br />

que é noctâmbulo?<br />

Ilustração: Leticia Santana<br />

Dou-lhe uma, dou-lhe três!<br />

Alguém viu passar um<br />

noctívago ou voar um noctívolo?<br />

O turista quer saber quando vai<br />

acabar esse jogo.<br />

Jerimu, jeritacaca, jerivá,<br />

Guariroba, jeribá, jeratacá, manacá...<br />

Entre palmeiras, frutos, folhagens,<br />

o palmito ficou amargo.<br />

E a guariroba virou gororoba,<br />

quem vai querer comer jerimum?<br />

Dou-lhe uma, dou-lhe três!<br />

E a gororoba vai pro prato do freguês!<br />

O freguês <strong>de</strong>sistiu logo<br />

que a gororoba viu,<br />

E correndo foi pulando pela calçada,<br />

Até a quitanda do Manoel para<br />

comprar uma boa salada!<br />

Lá na serra o manacá <strong>de</strong>u<br />

flores e cores, mas,<br />

Quando foi trazido pra cida<strong>de</strong>,<br />

As cores se fundiram<br />

e só o branco apareceu<br />

O turista quer pintar <strong>de</strong> azul<br />

as flores do jeratacá,<br />

Pois a florista passa cantando<br />

a quem violetas quer comprar.<br />

19


ERA UMA VEZ...<br />

Uma casa amarela, numa rua<br />

amarelada, na beira da calçada<br />

On<strong>de</strong> dava pra avistar<br />

a vizinha pequenina,<br />

Que era uma casa ver<strong>de</strong>, numa rua<br />

ver<strong>de</strong>jante, on<strong>de</strong> a grama e as violetas<br />

Desenhavam canteiros inteiros <strong>de</strong><br />

amores-perfeitos e éricas branquinhas.<br />

Pare<strong>de</strong>s, janelas e portas, colunas<br />

e varandas, tijolos e vidraças.<br />

Telhas no telhado, azulejos<br />

nas pare<strong>de</strong>s, adorno nas pilastras,<br />

Cada um encontra seu lugar<br />

on<strong>de</strong> se encaixa.<br />

Na cristaleira da vovó,<br />

na sala ou na cozinha,<br />

Espaço sempre há para<br />

travessas e gominhas.<br />

Uns passos a mais e era a vez da casa<br />

azul que ficava na rua azul anil,<br />

E da casa cor-<strong>de</strong>-rosa lá na rua<br />

das roseiras mil.<br />

De brinquedo ou <strong>de</strong> mentira<br />

entre casas verda<strong>de</strong>iras,<br />

A vizinha pequenina mostrava róseas<br />

flores brotando da espirra<strong>de</strong>ira.<br />

De criança ou da vovó, não importa,<br />

a casinha pequenina<br />

Fica lá adiante na rua distante,<br />

do carro que passa,<br />

Fazendo barulho, batendo pino<br />

e biela e espalhando fumaça.<br />

No meio da noite não há ruído<br />

nem poeira, só as luzes lá da rua,<br />

Pois na beira da calçada,<br />

o canteiro é ver<strong>de</strong>jante,<br />

Tal o viço da planta que a vovó plantou<br />

Na floreira, que dá flor o ano inteiro,<br />

Amarela, cor-<strong>de</strong>-rosa, branca<br />

e vermelha.<br />

20<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva


O POEMA DA PIZZA<br />

22<br />

Todo dia a toda hora,<br />

O paulista tem agora<br />

o poema da pizza,<br />

Reunião da família, ou dos<br />

amigos, com namorada ou<br />

criançada, Celebrar sem<br />

motivo especial, quando não<br />

é Natal nem carnaval,<br />

Nem Páscoa, nem feriado<br />

nacional, pois o paulista quer<br />

mesmo a <strong>de</strong>lícia Da pizza!<br />

No dia seguinte<br />

vem queixar-se<br />

Das calorias exageradas<br />

pra queimar na aca<strong>de</strong>mia,<br />

Na piscina, na esteira, na bike<br />

e na correria.<br />

Tem pizza no Bexiga,<br />

no Brás, no Itaim,<br />

No bairro, na serra, na praia<br />

Mas não existe pesto<br />

na al<strong>de</strong>ia da terra,<br />

Ilustração: Milena Nogueira<br />

Que tenha sabor <strong>de</strong> samambaia!<br />

Calabresa, da casa, portuguesa,<br />

peperoni, italiana, anchovas ou<br />

aliche, Brotinho, média e gran<strong>de</strong>,<br />

Quem vai dar palpite?<br />

Tem calzone à espanhola?<br />

Quem gosta <strong>de</strong> pizza?<br />

Laércio não gosta, Paulinha<br />

gosta <strong>de</strong> todas, Dudu só quer<br />

<strong>de</strong> muçarela, Beatriz só pensa<br />

em Marguerita,<br />

Mas logo vem a mamãe Rita<br />

Dizer não à massa frita!<br />

Tem pra todo gosto e todo mundo,<br />

Massa fina, massa grossa, recheada,<br />

com e sem beirada, Saiu a pizza,<br />

mais uma e mais outra,<br />

O paulista vai dormir pensando na<br />

Manhã seguinte, no trânsito, no<br />

chefe e na meninada, E sonha com<br />

musculação e natação,<br />

Ginástica onírica, essa, prá ganhar<br />

tempo E comer pizza à beça!


MINHAS<br />

CRIANÇAS<br />

Daniela, Flávia, Beatriz, Mayara, Stefany<br />

Laerson, Josiel, Felipe, Rafael...<br />

Venho trazer-lhes palavras contadas<br />

Em histórias <strong>de</strong> bruxas,<br />

príncipes e princesas,<br />

Fadas, meninos e meninas, João e Maria,<br />

A menina que a história<br />

do pobre chinês sabia,<br />

O jovem que a floresta atravessou até o<br />

cume da montanha alcançar,<br />

Para ao espírito da montanha perguntar,<br />

Por que pobre continuava<br />

se tanto trabalhava.<br />

Minhas crianças vêm e vão, são e estão,<br />

Seus olhos por vezes se arregalam,<br />

outras vezes se calam,<br />

Outras vezes <strong>de</strong>sistem e choram<br />

E vão embora,<br />

Do dia, da tristeza,<br />

da ausência, da vida.<br />

Os livros num instante roubam<br />

o conto real.<br />

Rodolfo era um caracol que viajava com<br />

a casa nas costas e a barriga no chão,<br />

A vovozinha foi parar<br />

na barriga do lobão,<br />

A margarida friorenta tremia <strong>de</strong> frio,<br />

Clifford era o cachorrão vermelho,<br />

O patinho que era feio cresceu,<br />

E um lindo cisne branco no lago refletiu,<br />

Mas muitas vezes fora humilhado<br />

por ser <strong>de</strong>sengonçado.<br />

Tininha sonhava acordada<br />

e Faisquinha banho não tomava.<br />

E um dia havia o Cacá e a Bia,<br />

Seus olhos bem abertos<br />

nem estavam <strong>de</strong>spertos,<br />

Das palavras, a melodia<br />

dos contos mal<br />

falavam,<br />

Mas ao mundo<br />

das maravilhas<br />

<strong>de</strong> Alice sinalizavam,<br />

Compreendiam<br />

e sorriam!<br />

Minhas crianças por<br />

alguns momentos<br />

<strong>de</strong> sua dor se separam,<br />

Mamães e papais novamente se alegram,<br />

Brilham os olhares <strong>de</strong> seus pequenos e<br />

abre-se seu sorriso,<br />

Porque no mundo da contação<br />

<strong>de</strong> histórias,<br />

Ser menino e menina é que é glória!<br />

24<br />

Ilustração: Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo


CRIANÇAS<br />

Crianças são bênçãos, na entrada da sala<br />

<strong>de</strong> visitas, são feixes <strong>de</strong> luz clara,<br />

Da vida, quentes, velozes, cheirando<br />

a leite, chupando balas.<br />

Sem censura, contas <strong>de</strong> um colar<br />

Que dá voltas ao mundo, em um<br />

segundo, Por tantas alegrias juntar.<br />

26<br />

Crianças são pedaços <strong>de</strong> amor,<br />

Parte <strong>de</strong> quem por alguns<br />

momentos se amou,<br />

Prova do braço ao abraço,<br />

a primeira palavra,<br />

O primeiro dia em que<br />

a cabeça sustentou.<br />

“Papai, esse aqui não precisa <strong>de</strong> ficha?”<br />

O pequeno gran<strong>de</strong> inquiridor<br />

ao reconhecer<br />

O pônei <strong>de</strong> carne e osso<br />

que achou parecido<br />

Com o brinquedo pela era<br />

da eletrônica concebido.<br />

Ilustração: Ananda Laura<br />

Crianças vão ao shopping,<br />

à exposição <strong>de</strong> animais,<br />

Encantam-se ao ver coelhos,<br />

cães, filhotes <strong>de</strong> gatos,<br />

Colibris e rouxinóis; será que<br />

tem também alguns patos?<br />

O amarelinho é da galinha<br />

e do galo o pintinho,<br />

Crianças querem-no para casa levar,<br />

Mas o vovô diz que para ele não há lugar.<br />

“Vovô, por que na sua cama<br />

não po<strong>de</strong> dormir o amarelinho?“<br />

E cantam bem-te-vis,<br />

tico-ticos e periquitos,<br />

Como as crianças pedindo e insistindo,<br />

“Compra Vô, compra pra mim um<br />

passarinho?”<br />

Crianças são assim,<br />

parecem frágeis doçuras,<br />

Mas são aquelas que se fortalecem<br />

como a rocha do rochedo<br />

Para formar o lastro,<br />

que fundamenta e estrutura,<br />

Pois à sua volta espera uma vida futura.<br />

Crianças são aves, são canções,<br />

são choros e gritos,<br />

Às vezes não esperam e esperneiam,<br />

querem mais ou nada querem,<br />

Caem e se ferem,sangram, choram<br />

para sorrir logo em seguida,<br />

E saboreiam imagens rápidas,<br />

que estão <strong>de</strong> passagem,<br />

Logo imaginam a próxima,<br />

e outra, brinca<strong>de</strong>ira fugitiva.<br />

Dos livros correm as páginas,<br />

pois, se cansaram.<br />

À vida pe<strong>de</strong>m caminho,<br />

abrem portas e janelas,<br />

Porque vieram e não tem pressa,<br />

para lembrar o que esqueceram.<br />

E, a cada dia, sua arte e seus <strong>de</strong>senhos,<br />

Obras-primas do faz <strong>de</strong> conta<br />

enfileiram.


28<br />

MEU CACHORRO<br />

Meu cachorro é preguiçoso – até parece<br />

o mais preguiçoso dos gatos,<br />

Quando a puxar-me não está<br />

pelas calçadas,<br />

Como se fosse o trenó <strong>de</strong> Noel,<br />

Deslizando pelo asfalto e pulando<br />

nas poças d’água.<br />

Meu cachorro acha que <strong>de</strong>le<br />

são as alamedas,<br />

Não sabe se fareja, se late, ou protesta,<br />

Contra a corrente<br />

que lhe força o pescoço<br />

E que na garganta, parece ter-lhe<br />

atravessado um osso!<br />

Meu cachorro gosta <strong>de</strong> ossinhos<br />

e biscoitos<br />

Com sabor esquisito, para cachorro.<br />

Adora comer mamão,<br />

maçã não é com ele não,<br />

Passa longe do melão,<br />

banana - só quando era filhote,<br />

De Cocker Spaniel inglês que sai a galope<br />

Para correr atrás <strong>de</strong> quero-quero,<br />

Patos, marrecos e passarinhos,<br />

Tanto que corre no embalo das asas<br />

Daqueles que voam sem ser avião.<br />

A hora do passeio é sua gran<strong>de</strong> alegria,<br />

Seu domínio se amplia,<br />

ao sair pelo portão,<br />

Deve pensar que assim é ser valentão!<br />

Quando em casa fica o dia inteiro,<br />

só dorme,<br />

Depois levanta e late, corre e outra vez,<br />

ar<strong>de</strong>m meus ouvidos,<br />

Ao avistar o Chocolate que sai<br />

para passear,<br />

Meu cachorro torna-se feroz<br />

e reclamam os vizinhos,<br />

Atrás do portão, corre pra lá<br />

e pra cá, entra e sai,<br />

Que fazer com o canino?<br />

Lá veio um dia miar o gato, coitado!<br />

Pouca aparição, pois, era miado<br />

e latido pra todo lado!<br />

E o gato sumiu todo assustado!<br />

Pequenino que era quando<br />

para casa mudou-se,<br />

Cabia numa caixa <strong>de</strong> sapatos<br />

e em suas pare<strong>de</strong>s<br />

Escorregava e escalava,<br />

tal fossem o Everest!<br />

Pequenino e <strong>de</strong>sengonçado,<br />

da caixa escapulia,<br />

E iniciava uma expedição,<br />

Ao redor da máquina <strong>de</strong> lavar,<br />

Cujo vão lhe parecia uma gran<strong>de</strong><br />

construção.<br />

Meu cachorro gosta mesmo<br />

<strong>de</strong> sua dona agradar,<br />

É falsa a melancolia que se vê<br />

em seu olhar Inteligente,<br />

tem segurança ao nadar,<br />

Mas não foi feito para a casa guardar.<br />

Ilustração: Leticia Santana


Se houver ovelhas por perto, Chi!<br />

Saia correndo<br />

Porque elas vão fugir e atrás <strong>de</strong>las<br />

você terá <strong>de</strong> ir.<br />

Enrolados e bifões para caninos,<br />

Comilão <strong>de</strong> guloseimas,<br />

fujão da cuia <strong>de</strong> ração,<br />

Pula diante do pote, caixa <strong>de</strong> surpresas,<br />

Como se a dizer estivesse - dê-me<br />

logo essas belezas!<br />

Reino Unido, UK, o país dos reis<br />

e dos lor<strong>de</strong>s,<br />

Cocker spaniel originou-se<br />

também na Espanha,<br />

Perrito, amigo perro, my dog.<br />

Meu cachorro é instruído,<br />

ouve FM e news na TV<br />

Adora coisas novas apren<strong>de</strong>r,<br />

É verda<strong>de</strong> sim que<br />

meu cachorro late muito,<br />

Pois <strong>de</strong> outros cães ele<br />

quer se aproximar,<br />

Mas é ciumento com as crianças,<br />

É um cachorro feliz e isso se vê pelo<br />

rabo que sem parar balança,<br />

E os “presentes” que espalha sobre<br />

tapetes, pelos cantos e camas.<br />

Quer saber como ele se chama?<br />

As surpresas que estão no pote,<br />

São para agradar meu amigo Slot!<br />

Ilustração: Leticia Santana<br />

30 31


ONDE BRINCAM<br />

AS CRIANÇAS?<br />

Crianças brincam o tempo todo, Nascem<br />

chorando, apren<strong>de</strong>m a sorrir,<br />

Brincam com a mamãe<br />

que há tempos conhecem,<br />

Mas quase sempre<br />

primeiro falam “papai”,<br />

Quantas vezes com o papai<br />

mais se parecem,<br />

Mesmo que nove meses<br />

tenham passado<br />

E a barriga da mamãe<br />

as tenha carregado.<br />

Crianças brincam na sala,<br />

no quarto, no terraço<br />

Quando <strong>de</strong>ntro do<br />

carrinho ao<br />

parque vão<br />

passear<br />

Para<br />

tomar<br />

sol e ar e<br />

reconhecer,<br />

em outros rostinhos,<br />

Outras crianças que<br />

um dia com elas irão brincar.<br />

Ensaiando os primeiros passos,<br />

lá se vai o joelho vermelho,<br />

E a bochecha roxa combinando<br />

com a testa ralada na festa,<br />

Para lembrar <strong>de</strong>pois da folia,<br />

que ninguém mais queria<br />

Acabar com tamanha alegria.<br />

Em casa em seu quartinho,<br />

sempre muitos brinquedos<br />

No baú da mamãe ficam guardados.<br />

Brinca<strong>de</strong>iras barulhentas<br />

ou <strong>de</strong> piscar luzes,<br />

Figuras <strong>de</strong> monta e <strong>de</strong>smonta,<br />

liga e <strong>de</strong>sliga,<br />

Bonecas espalhadas, carrinhos<br />

com faróis quebrados,<br />

E lá <strong>de</strong>baixo da gela<strong>de</strong>ira,<br />

rodas e fantoches coloridos,<br />

32 33<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva


No meio da sala, super-heróis<br />

<strong>de</strong> fantasias vermelhas,<br />

Rainhas que vestem roupas brancas,<br />

Em seus cavalos brancos montadas<br />

Em busca do vale encantado.<br />

Mais tar<strong>de</strong> um pouco<br />

e ao final da brinca<strong>de</strong>ira<br />

Meninos chamam a arruma<strong>de</strong>ira<br />

Para ajudá-los com a <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m,<br />

E quem sabe, recriar a or<strong>de</strong>m?<br />

Por on<strong>de</strong> começar?<br />

O telefone <strong>de</strong> mentira ou a bola<br />

que acertou uma janela?<br />

Na gaveta ou na sacola?<br />

O baú superlotado<br />

não tampa nem fecha,<br />

E os meninos abençoados, apren<strong>de</strong>m<br />

que um brinquedo reservar<br />

É <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo apren<strong>de</strong>r a compartilhar.<br />

Meninas bonitas já não<br />

querem mais brincar,<br />

De boneca e <strong>de</strong> casinha, pois agora,<br />

unhas e lábios apren<strong>de</strong>ram a pintar,<br />

Para ficar parecidas com as<br />

mo<strong>de</strong>los das revistas<br />

Ou ir ao shopping passear.<br />

On<strong>de</strong> brincam as crianças?<br />

Dia e noite, <strong>de</strong>scalças,<br />

Com um brinquedo ou nada nas mãos,<br />

Querem que o tempo congele<br />

A bola no parque, as horas no quintal,<br />

Para que nunca se acabe,<br />

O jogo, a correria,<br />

a brinca<strong>de</strong>ira em sua tenra vida,<br />

Tal que tudo o que não for felicida<strong>de</strong>,<br />

Fique por último na fila,<br />

em último lugar,<br />

Para <strong>de</strong>pois quando amanhã chegar,<br />

Saber que mesmo as crianças que<br />

<strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> ser crianças,<br />

Não querem parar <strong>de</strong> brincar.<br />

COLEÇÃO<br />

CANTO<br />

REAL<br />

34 35<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva


ONDE ESTÁ? AONDE FOI?<br />

A alegria e a voz, a canção<br />

e a comoção,<br />

Ao ver crianças que choram<br />

e correm, correndo e chorando.<br />

Apertou o coração, restringiu<br />

a respiração,<br />

Liberda<strong>de</strong>, qual o que?<br />

Por que o invisível<br />

não mais se vê?<br />

Narinas que escorrem<br />

tampadas por água.<br />

Que lágrimas são.<br />

Sufocação!<br />

Do pensamento<br />

encontrado no peito,<br />

E na cabeça o coração,<br />

Mas a razão repete e diz, não!<br />

Não é aí que moram os retratos<br />

Das palavras que entoam<br />

a canção.<br />

Por que foi?<br />

Por on<strong>de</strong> foi?<br />

A palavra mal falada,<br />

o retrato <strong>de</strong>sbotado,<br />

O tempo suprimido, o mundo<br />

na dor incompreendido.<br />

Crianças que choram<br />

e correm,<br />

Correndo e chorando.<br />

As mulheres ficaram doentes<br />

Alguém a perguntar?<br />

Seus olhares<br />

perdidos na sala,<br />

Como conter o vazio?<br />

On<strong>de</strong> estão?<br />

Aon<strong>de</strong> foram?<br />

Olhos que não sabem brilhar,<br />

Sequer imaginam<br />

que ainda há tempo<br />

para transformar.<br />

Por que a alegria<br />

<strong>de</strong>sapareceu?<br />

A sala sem brilho percorreu.<br />

Então a criança parou,<br />

remexeu e exclamou.<br />

Crianças vieram observar<br />

e reinar,<br />

Já sabem o que há para<br />

apren<strong>de</strong>r e ensinar.<br />

E estão a nos mostrar<br />

o segredo e o sagrado<br />

da paz.<br />

Olham e sorriem,<br />

exclamam e correm,<br />

Mas já não choram mais.<br />

36<br />

Ilustração: Milena Nogueira


A ALEGRIA<br />

DAS LUZES<br />

As luzes da cida<strong>de</strong>,<br />

Que se levanta para ver o sol<br />

E <strong>de</strong>pois se abaixa<br />

Para recolher os vestígios do dia,<br />

E se esten<strong>de</strong><br />

Para mo<strong>de</strong>lar longas<br />

ruas e avenidas,<br />

Mas escon<strong>de</strong> ruelas e bueiros,<br />

buracos e passagens obscuras.<br />

A alegria das luzes nos distritos<br />

abastados e fartos<br />

<strong>de</strong> flores e comida,<br />

Desvanece e se per<strong>de</strong> por on<strong>de</strong><br />

a vida não passa,<br />

Por on<strong>de</strong> não há cores, nem ares,<br />

nem suaves odores<br />

Como nas ruelas escuras<br />

por entre favelas que a luz<br />

<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> visitar,<br />

Para não ver criança faminta,<br />

<strong>de</strong>snuda e <strong>de</strong>scalça.<br />

A noite na cida<strong>de</strong> que nunca<br />

se recolhe e jamais silencia,<br />

Ri-se da ausência da luz<br />

fugitiva e imprecisa,<br />

On<strong>de</strong> na espreita esperam aqueles que<br />

sua própria luz já per<strong>de</strong>ram, Ou talvez<br />

<strong>de</strong>la um dia nem sequer conta se <strong>de</strong>ram,<br />

Pois escon<strong>de</strong>m corpos e almas que<br />

vagam na escuridão das esquinas.<br />

A alegria das luzes a quem pertence?<br />

À cida<strong>de</strong> ou ao sol?<br />

Às festas que as luzes celebram?<br />

E quando <strong>de</strong>svanece a luz?<br />

Como nas noites da cida<strong>de</strong><br />

que é bela e perversa,<br />

Ruidosa e sublime, lenta<br />

e <strong>de</strong>sumanamente veloz,<br />

Ouve-se da gente em alta e média voz,<br />

Que a alegria das luzes veio<br />

primeiro brilhar,<br />

Ou percebe simplesmente que,<br />

forte e ausente, faz ocultar,<br />

Tal qual fosse da pequena gente,<br />

até que o eterno movimento<br />

do tempo leve <strong>de</strong> volta as luzes,<br />

Ao tempo presente, pois este cabe<br />

no tempo eterno do passado,<br />

E do futuro breve ou distante.<br />

Ilustração: Milena Nogueira


QUEM ÉS TU?<br />

Teu riso se expandiu e o sentido<br />

em mim atingiu<br />

Quisera - quem <strong>de</strong>ra, tu vieras<br />

<strong>de</strong> volta na primavera.<br />

Da minha vida distante<br />

da primavera hoje ausente.<br />

Mas tu quem és?<br />

Pergunto como se alguém<br />

houvesse a me respon<strong>de</strong>r,<br />

Já que nem tu presumes<br />

que eu an<strong>de</strong> a perguntar, na rua,<br />

Da aurora ao meio-dia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o dia pela<br />

noite que avança e a<strong>de</strong>ntra a cida<strong>de</strong>,<br />

E tu on<strong>de</strong> estás?<br />

O que fazes tu em teus dias<br />

enquanto caminho e pergunto,<br />

E sem saber a resposta,<br />

vou vagando e perguntando,<br />

Sem cansar a esperar pelo dia, pelo riso,<br />

pela voz, pela canção, pela mão<br />

A <strong>de</strong>slizar pela pele, a respirar pelos<br />

poros, a exalar o teu perfume,<br />

a tua doçura o teu gosto.<br />

De amor maduro que veio<br />

e se expandiu e não mais saiu<br />

De mim, do meu peito não tem jeito<br />

e se eu perguntar e se ninguém disser<br />

que tu irás voltar.<br />

Só sei que sempre vou te esperar.<br />

Ainda que não haja tempo<br />

para apren<strong>de</strong>r e saber quem tu és,<br />

quem és tu, on<strong>de</strong> estás?<br />

Ilustração: Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

40 41


SOB A NOITE DE CHUVA<br />

Surgiste à porta do museu <strong>de</strong> arte<br />

como uma obra-prima,<br />

Tivesse <strong>de</strong>cidido <strong>de</strong>ixar seu pódio<br />

e experimentar o sabor da chuva,<br />

Lavando ruas e calçadas <strong>de</strong> pedras<br />

milenares la<strong>de</strong>adas por folhagens,<br />

Jovens flores <strong>de</strong> pétalas claras<br />

e macias como veludo das cortinas<br />

A escon<strong>de</strong>r a luz nos corredores,<br />

ora afunilados, ora apontando<br />

para esquinas,<br />

Ampliados, para apresentar<br />

o instante <strong>de</strong> andar<br />

sob a chuva torrencial,<br />

E ver calçadas <strong>de</strong> pedras milenares,<br />

lavadas, assustadas, machucadas,<br />

Envelhecidas, pois nem o tempo parou<br />

para sua majesta<strong>de</strong> chuva gelada.<br />

E seguimos sob a torrente<br />

que importância já não tinha,<br />

pois que agora<br />

Tu meus braços tomavas<br />

com teu abraço para me proteger<br />

da água bendita,<br />

Nem torrencial caía fosse minha<br />

alegria ou fosse tua euforia.<br />

E logo nem chuva mais havia, o vilarejo<br />

se acendia para ver passar centelhas<br />

Nascidas dos olhares castanhos<br />

<strong>de</strong> nossos olhos entre brilhos e faíscas<br />

<strong>de</strong> pedras milenares,<br />

Quantas vezes presenciaram faíscas <strong>de</strong><br />

castanhos olhares, pele cor <strong>de</strong> canela,<br />

Sorrisos faceiros, flor-<strong>de</strong>-cetim, cacos<br />

<strong>de</strong> vidro cortantes, ver<strong>de</strong>s olhares.<br />

O sentido não morre e não passa,<br />

a lembrança volátil logo<br />

em seguida se concentra,<br />

E robusta, vibrante, amante,<br />

saudosa e <strong>de</strong>sperta, retorna.<br />

E o tempo que não parou para<br />

sua majesta<strong>de</strong> a chuva fria,<br />

Sopra em nossos ouvidos e diz,<br />

vive o vento por um momento,<br />

Or<strong>de</strong>nando imperioso<br />

que passem os lamentos.<br />

Quando amanhã chegar bem<br />

perto do tempo do amor<br />

tardio em nossas vidas,<br />

Que <strong>de</strong> todas as vidas<br />

o eterno azul valeu,<br />

E à água que tudo<br />

encharcasse or<strong>de</strong>nou,<br />

Um dia retorna,<br />

já não passa, e fica.<br />

Tu me chamaste, seria eu mesma?<br />

E quem nos via logo percebia crescer<br />

Tu me ofereceste o abrigo fugaz <strong>de</strong> um<br />

para nós a palavra, a medida, o<br />

guarda-chuva,<br />

arroubo, Seria paixão, que arrebata<br />

Se como a chuva pesada e forte<br />

e mata, aterroriza e energiza, <strong>de</strong>pois<br />

intimidar se <strong>de</strong>ixasse,<br />

se afasta,vai longe, foge, duvida,<br />

Ilustração: Leticia Santana<br />

enfraquece, esquece e passa.<br />

42 43


ACASOS SÃO<br />

FALSOS<br />

44<br />

À mesa do jantar,<br />

a surpresa - o falso acaso.<br />

Teu nome junto ao meu.<br />

Anônima gentileza ou adivinhação;<br />

seria traição?<br />

De olhos que um conto vivo <strong>de</strong>lataram.<br />

O acaso não é nem se impõe,<br />

Quando o encontro é porque ali está,<br />

Pequeno momento instante <strong>de</strong> se dar.<br />

Sabores e melodias, suaves, fragrâncias<br />

exóticas <strong>de</strong> ervas e aromas <strong>de</strong> sais.<br />

O teu perfume e o meu perfume,<br />

obra <strong>de</strong> mais um falso acaso.<br />

Tudo era adorável, tanto quanto<br />

inflexível, tal qual a memória. Que agora<br />

expurgo do mais fundo <strong>de</strong> mim.<br />

Tão certa como a lógica sequência<br />

à mesa do jantar<br />

Era do novo dia a incerteza<br />

<strong>de</strong> ao teu lado voltar.<br />

Mas foste tu o primeiro<br />

a cortar o silêncio,<br />

Invadindo meus pensamentos<br />

e tirando-me a paz,<br />

Vou mostrar-te a cida<strong>de</strong>, penhascos<br />

on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>rosas ondas<br />

Quebram-se, explo<strong>de</strong>m tal como verás.<br />

A chuva continuava forte e majestosa.<br />

Castelos, construções que o tempo imunizou,<br />

Passagens estreitas,<br />

caminhos longos e tortuosos,<br />

Escadas, e tu, para on<strong>de</strong> me levas?<br />

Vem ver on<strong>de</strong> nasci, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> eu vim,<br />

para que tu me vejas e me tenhas<br />

Olhando cada pedaço <strong>de</strong> lugar,<br />

ainda que o medo te assombre.<br />

Tu temes o penhasco<br />

e das ondas o estrondo,<br />

Gigante é a dor. Fugir? Por on<strong>de</strong> for?<br />

Foi assim ao me apaixonar.<br />

Desse amor há páginas que contar.<br />

E haverá livros para viver,<br />

Se não hoje e amanhã, no dia em<br />

que a falsida<strong>de</strong> dos acasos<br />

Deixar <strong>de</strong> acontecer.<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva


POR ONDE TU ME LEVASTE<br />

Ainda chovia forte – que diferença fazia?<br />

Sólida memória tal qual blocos <strong>de</strong> pedra.<br />

Iluminação fraca neles incidia,<br />

Para-brisa incessante, vai e vem,<br />

<strong>de</strong>sliza e separa,<br />

Gotas <strong>de</strong> chuva, gotas <strong>de</strong> água,<br />

Suave música, tuas mãos suaves<br />

segurando a minha, escuro,<br />

Barcos na marina, ca<strong>de</strong>iras sentadas<br />

<strong>de</strong> encantamento,<br />

Ninguém, tu e eu, e a chuva somente.<br />

Costa noroeste do velho continente,<br />

Por on<strong>de</strong> tu me levaste,<br />

E quando me trouxeste,<br />

De volta, compreen<strong>de</strong>r não mais podia,<br />

Nem mais sabia - <strong>de</strong> querer<br />

não mais haveria.<br />

Tua ausência distante<br />

e a impossibilida<strong>de</strong> do presente,<br />

Fosse ontem ou amanhã.<br />

Des<strong>de</strong> quando eu,<br />

que já nem mais sei quem fui?<br />

Ou talvez quem fora, um dia,<br />

ao final <strong>de</strong> dias, meses, anos,<br />

Anos a lembrar algo<br />

que nunca existira.<br />

Mas hoje já não é mais como disseste,<br />

Que te alegrarias, que serias,<br />

que voltarias.<br />

Ainda hoje tu não vieste,<br />

E eu fico estática,<br />

meio morta-viva, parada,<br />

Feito pedra, feito roda-viva, rodopiando,<br />

Sem exalar suspiros, sem ser pião,<br />

sem cantar nossa canção.<br />

Ilustração: Gabriela Tiburcio Guimarães<br />

47


Bem cedinho e o telefone<br />

serviu como <strong>de</strong>spertador.<br />

Do outro lado tua voz...<br />

Do meu lado o <strong>de</strong>vaneio<br />

<strong>de</strong> um sonhador.<br />

Cheguei primeiro à mesa<br />

do café, buscava olhares<br />

inexistentes,<br />

Sentia o perfume da presença<br />

que se aproximava.<br />

E teu sorriso me lembrava<br />

a canção que dizia,<br />

Apenas um sorriso seria capaz<br />

<strong>de</strong> iluminar tudo ao redor.<br />

O perfume que sentira<br />

durante a noite toda<br />

Enquanto tentava<br />

dormir em vão,<br />

Porque tu me roubavas a razão.<br />

Explicar o inexplicável?<br />

Marcar o invisível?<br />

Quebrar a or<strong>de</strong>m do irreal?<br />

Partir é real?<br />

48<br />

ADEUS<br />

Esquecer-se<br />

<strong>de</strong> retornar, apaga-se,<br />

Assim como este instante<br />

que no próximo já se nega,<br />

Enquanto passam as horas,<br />

que compõem os dias,<br />

Que engordam<br />

semanas e séculos,<br />

Meses que se repetem<br />

arquivando milênios,<br />

E o irreal permanece,<br />

até que se esvanece?<br />

Per<strong>de</strong>-se?<br />

Esgota-se, sangra<br />

e morre.<br />

Qual a medida do tempo?<br />

Um breve momento?<br />

A eternida<strong>de</strong> que não po<strong>de</strong><br />

ser prisioneira,<br />

Da terra, da água<br />

e do vento,<br />

Do fogo que tenta<br />

queimá-la na fogueira.<br />

Ilustração: Ananda Laura<br />

No aeroporto<br />

o nome rabiscado<br />

em meu passaporte,<br />

Letras gravadas sobre<br />

minha i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

Aromas, sorrisos,<br />

cantos <strong>de</strong> bocas,<br />

olhos atenuados,<br />

Ouvidos <strong>de</strong>spertos<br />

tentando acertar<br />

a próxima parada,<br />

Para on<strong>de</strong> vou?<br />

E por que agora vou<br />

se a ti encontrei?<br />

Tanto <strong>de</strong>morou,<br />

a chegar, a tocar, a ser<br />

sem nada mais querer,<br />

Nem ter, nem ficar,<br />

mas partir e levar,<br />

O outro, a lembrança,<br />

o sutil, a gentileza,<br />

O breve instante do céu,<br />

Do a<strong>de</strong>us...


O TEMPO<br />

Novamente aqui eu,<br />

tempo amigo ou inimigo meu,<br />

Não estou certa, passaste<br />

e ainda aqui estou.<br />

Como por magia, tu me disseste<br />

quando criança que crescer iria e<br />

Feliz como um livre canto <strong>de</strong> pássaros<br />

partindo, então seria.<br />

Tempo, meu amigo,<br />

tu anunciaste que verões haveria,<br />

Longos invernos logo passariam<br />

E a primavera sempre<br />

outras cores traria<br />

Para <strong>de</strong> novo amarelar-se nos outonos<br />

das vidas - da minha, da tua, daquela<br />

dos dias e das noites úmidas que<br />

evaporam<br />

Dentro das salas entupidas,<br />

<strong>de</strong> gente que não sabe nem viu,<br />

Quando é que o tempo<br />

mais esta vez partiu.<br />

Inimigo tempo meu,<br />

tu sussurraste em meus ouvidos<br />

Que a beleza me visitaria<br />

e permaneceria,<br />

Intocada, perene, oh! Frágil anunciação,<br />

Já que só é bela aquela<br />

que acredita sem antes saber,<br />

Como é <strong>de</strong>pois que o tempo passar.<br />

Assim como eu, você que me viu<br />

e todos aqueles que a ti, tempo,<br />

querem seqüestrar,<br />

A ti, tempo, que te ris e vais, embora,<br />

na hora, agora,<br />

Para on<strong>de</strong>, qualquer outro lugar.<br />

Amigo, tempo amigo,<br />

só me dou conta ainda in<strong>de</strong>cisa,<br />

De que tu me acompanhas e me<br />

conduzes, a alguma porta, Ou será ao<br />

jardim <strong>de</strong> inverno da minha vida?<br />

Mas tu vens e me lembras<br />

<strong>de</strong> que tudo está por acontecer,<br />

Bobagem não querer,<br />

não basta ouvir falar,<br />

Há que se ver antes <strong>de</strong> enxergar,<br />

A janela se abrir, o jardim florescer,<br />

a grama morrer e <strong>de</strong>pois brotar.<br />

Criança que fui hoje quem sou<br />

sem ti não seria.<br />

Conheci a verda<strong>de</strong> em sonhos<br />

que sonhei,<br />

Dissabores vivi e mentiras ao céu lancei.<br />

Chorei, mas tempo, que me ouves,<br />

Guardaste meus segredos,<br />

Por mim os escon<strong>de</strong>ste,<br />

Tempo, por ti,<br />

quanto me enganei.<br />

50<br />

Ilustração: Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

51


TU, QUE EU NUNCA ESPEREI<br />

Um dia, que nem se anunciou<br />

em minha vida,<br />

Tu, que eu nunca esperei,<br />

me apareceste,<br />

Era manhã e frio<br />

não fazia, nem calor,<br />

Teu perfume o ar calmo<br />

e morno envolvia.<br />

Bem cedo tu,<br />

tua palestra iniciaste.<br />

Não falavas só a mim, era<br />

mais uma a ouvir tuas frases,<br />

Lúcidas e impru<strong>de</strong>ntes,<br />

<strong>de</strong>svendando moléculas,<br />

Desenrolando-as,<br />

das tuas idéias,<br />

A ação, das tuas mãos, que<br />

não eram as mãos da Criação.<br />

Não, meu amigo,<br />

já se esqueceu<br />

das vezes que amou?<br />

Tu ias e voltavas seguro<br />

<strong>de</strong> si, pobre <strong>de</strong> mim,<br />

Eu parada, te olhava.<br />

Rápida e in<strong>de</strong>cisa<br />

a <strong>de</strong>cisão então tomava:<br />

Finda tua encenação,<br />

eu fugiria para bem<br />

longe da tua canção.<br />

Mas tu já sabias o que viria.<br />

Calmaria. Seguida <strong>de</strong> silêncio<br />

vazio em minha memória,<br />

Turbilhão, noites e dias,<br />

meses feitos em anos<br />

<strong>de</strong> duração.<br />

Ferida em cortes<br />

invisíveis, dores terríveis.<br />

Hoje, amanhã,<br />

ontem – mudam as palavras,<br />

Porque para quem espera<br />

não há tempo bastante,<br />

Que faça inventar<br />

a vida não vivida,<br />

O encontro que aguarda,<br />

não esqueceu,<br />

A presença, o <strong>de</strong>vaneio ou<br />

a loucura- tantas lágrimas,<br />

O que dito não foi,<br />

vaga lembrança,<br />

<strong>de</strong>senroladas moléculas,<br />

Química da vida,<br />

cáustica ferida.<br />

Vultos que somos<br />

em corpos autônomos,<br />

Incerteza que hoje<br />

não cicatriza dores,<br />

Certeza <strong>de</strong> corpos que<br />

separados somos.<br />

A platéia <strong>de</strong>liciou-se,<br />

tua palavra encenada,<br />

Como se tu quisesses<br />

Eu duvido e enquanto<br />

brincar <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r.<br />

esta palavra pronuncio,<br />

Logo senti um sobressalto,<br />

É o tempo <strong>de</strong> a dúvida<br />

meu coração disparou<br />

instalar-se, bem sei,<br />

Ilustração:<br />

Das moléculas<br />

Leticia Santana<br />

52 a incerteza do <strong>de</strong>senlace,<br />

53<br />

Por fim, encarregar-se.


A ARTE E A VIDA<br />

Muito se fala mais ainda se revelam,<br />

Divagações, repetições, digressões<br />

Quem imita a vida?<br />

Será a vida uma arte?<br />

Ou a arte é a própria vida?<br />

On<strong>de</strong> está a arte que fugiu<br />

da minha vista?<br />

On<strong>de</strong> está a vida que ar<strong>de</strong> anônima<br />

em minha arte escondida?<br />

Nas páginas escritas <strong>de</strong> um livro,<br />

na frase <strong>de</strong> um poema,<br />

Folheio frenética, busco e vasculho<br />

Palavras, que são arte agrupada que<br />

<strong>de</strong>screvem e retratam,<br />

Meus dias, idênticos,<br />

feitos <strong>de</strong> meros instantes,<br />

Ora vãos, ora me <strong>de</strong>ixando perplexa<br />

Porque <strong>de</strong>monstram nada,<br />

vazio e sombra,<br />

Mas também falam <strong>de</strong> luz e calor,<br />

sons e melodia,<br />

Para ensinar que viver é assim,<br />

um dia a cada dia.<br />

Po<strong>de</strong> a arte substituir a vida?<br />

O livro que escrevo,<br />

sobre a vida que não vivo,<br />

Guarda as palavras<br />

que roubei <strong>de</strong> outro livro,<br />

Sobre a vida,<br />

<strong>de</strong> alguém que eu não sou,<br />

Alcançou a chegada antes<br />

do ponto <strong>de</strong> partida,<br />

Tumulto, <strong>de</strong>sencontros,<br />

vidas <strong>de</strong> outros, outras vidas,<br />

Palavras coloridas <strong>de</strong> arte<br />

que imita a vida.<br />

Vida vestida <strong>de</strong> arte<br />

pronta para a vida <strong>de</strong>senhar,<br />

Vida que <strong>de</strong>sce do palco<br />

para a arte interpretar,<br />

Juntas, arte e vida, a pé,<br />

um dia <strong>de</strong> cada vez,<br />

Porque viver é assim,<br />

nada há num dia<br />

Que não venha a ter<br />

o <strong>de</strong>pois.<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva<br />

54


EU EM TEUS BRAÇOS<br />

Primeiro a sauda<strong>de</strong> - não,<br />

primeiro, a lembrança<br />

Sinto sauda<strong>de</strong> e me lembro<br />

<strong>de</strong> mim nos teus braços,<br />

Relembro e sinto sauda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> teus abraços tomando conta<br />

<strong>de</strong> tudo em mim.<br />

Tão real que é este irreal – sou capaz <strong>de</strong><br />

sentir teu cheiro<br />

E <strong>de</strong>screver teu perfume, usando verbos<br />

Simples e complicados,<br />

Palavras doces e ácidas, jamais áridas,<br />

Pois no teu colo, em teus pelos<br />

emaranhei meus cabelos<br />

E hoje os cortei - tamanha sauda<strong>de</strong>,<br />

Lembrança que não passa, não sai,<br />

nem vai longe nem foge,<br />

Gruda em mim, não solta e volta, revive,<br />

Remexe, vasculha por <strong>de</strong>ntro, buscando<br />

outro amor em minha vida?<br />

Aromas e palavras me inva<strong>de</strong>m<br />

sem pieda<strong>de</strong>,<br />

A tua lembrança e a minha sauda<strong>de</strong>,<br />

Girando <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim<br />

com a força <strong>de</strong> um potente motor,<br />

Arremessam-me, atiram-me com vigor<br />

Em teus braços,<br />

<strong>de</strong>ntro dos arcos <strong>de</strong> teus abraços,<br />

Ontem, hoje, sempre e para sempre.<br />

Ilustração: Ananda Laura<br />

56 57


A MÃO QUE ESCREVE<br />

(para Pedro Du Bois)<br />

Quantas mãos<br />

nesse mesmo instante escrevem<br />

O enredo daqueles a quem obe<strong>de</strong>cem,<br />

Tanta vida em <strong>de</strong>dos tocando o teclado<br />

Que outrora pressionavam<br />

pontas <strong>de</strong> lápis,<br />

Marcando com força paixões<br />

<strong>de</strong> enamorados.<br />

Quantos <strong>de</strong>dos nesse mesmo instante<br />

Estalam, se agitam,<br />

abrem portas e vão embora,<br />

Dirigem carros, fazem um carinho,<br />

<strong>de</strong>safiam um afeto,<br />

Depois sufocam, as mesmas mãos<br />

endurecem e aprisionam.<br />

Mãos <strong>de</strong>sconexas elevam-se aos céus<br />

E então se escon<strong>de</strong>m atrás <strong>de</strong> uma flor.<br />

Mãos companheiras<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>dos companheiros,<br />

Parece simples, simples e concedido,<br />

Que as mãos escrevam, coor<strong>de</strong>nem-se<br />

ou se fechem, Em si mesmas, por seus<br />

<strong>de</strong>dos através do mundo.<br />

Mãos não percebem suave o teclado,<br />

Pois basta o leve toque <strong>de</strong> um <strong>de</strong>do<br />

sobre tênue folha<br />

Para <strong>de</strong>svendar-se a vida e o outro<br />

através <strong>de</strong> palavras.<br />

Porém os <strong>de</strong>dos permanecem<br />

a abrir sulcos em papel,<br />

Por vezes o rasgam, amarrotam<br />

e o <strong>de</strong>scartam,<br />

Sem notar que<br />

A mão que escreve,<br />

É o nome do poema que alguém<br />

já escreveu.<br />

58<br />

Ilustração: Nicolie Santana


DOMINGO É DIA...<br />

De poemas e legria!<br />

Meus amigos a quem não conheço<br />

Atrás <strong>de</strong>sta tela, porém, reconheço<br />

E busco saber entre imagens<br />

imagináveis e reais,<br />

Como são vocês?!<br />

Pois suas idéias e seus i<strong>de</strong>ais<br />

A cada dia se aclaram<br />

diante dos meus olhos<br />

Começando a ocupar parte<br />

do que eu sou,<br />

Atravessando e se instalando<br />

em meu coração!<br />

Amigos virtuais, um dia po<strong>de</strong>riam<br />

tornar-se materiais?<br />

Viva a vida, alecrim dourado!<br />

Luas sensíveis que são poemas,<br />

porém nunca <strong>de</strong> pedra,<br />

Amigos da web enrolando-se<br />

enquanto se doam,<br />

Poetas e poetisas, bruxos e bruxas,<br />

gran<strong>de</strong>s corações impressos na tela,<br />

Mentes brilhantes,<br />

Palavra compartilhada<br />

que forma figuras,<br />

De pessoas, gente humana,<br />

Gente que é gran<strong>de</strong>,<br />

Gente que é gente.<br />

Viva, floresta repleta <strong>de</strong> ramos!<br />

60<br />

Ilustração: Mariana Prava<strong>de</strong>lli Salmazo<br />

61


AS APARÊNCIAS ENGANAM<br />

(AS APARÊNCIAS NÃO ENGANAM, NÃO)<br />

Des<strong>de</strong> cedo o ditado aprendi – enganado<br />

está quem pensa<br />

que as aparências enganam<br />

Coração pequeno<br />

aberto ingênuo, criança<br />

Não era preciso ler nem enxergar<br />

Porque o verda<strong>de</strong>iro<br />

e o falso alvoreciam,<br />

Nem tudo o que reluz é ouro, reluzia.<br />

On<strong>de</strong> está escuro,<br />

porque não há sinal do sol,<br />

Escuro está pela ausência<br />

da luz que não se espalhou,<br />

Por toda parte bastando que haja<br />

um lago, uma sala,<br />

Uma alma disposta a ser caminho<br />

Ser canal <strong>de</strong> luz a atravessar.<br />

Fervem corações da cida<strong>de</strong><br />

sobre trilhos <strong>de</strong> trens<br />

Submersas as vidas nos túneis <strong>de</strong> metrô<br />

Esquecidas moradas na favela<br />

em morros <strong>de</strong>penduradas<br />

Aparências <strong>de</strong> ser o que aparentam ser,<br />

Verda<strong>de</strong>iro e falso que é.<br />

Crescido coração não mais <strong>de</strong> criança<br />

Engana-se quem pensa,<br />

Crescido se tornou<br />

Acredita que enganam as aparências<br />

Bem sei eu olhando meus fios brancos<br />

Que crescem sob o <strong>de</strong>sengano <strong>de</strong> cores,<br />

Brilhos e luzes, dores <strong>de</strong> amores.<br />

Para um pouco <strong>de</strong> amor apren<strong>de</strong>r a dar<br />

É preciso amar<br />

com o coração <strong>de</strong> criança,<br />

Quem pensa que enganam<br />

as aparências,<br />

Distraiu-se com o que se escon<strong>de</strong><br />

Sob monumentos <strong>de</strong> pedra e gelo<br />

Os olhos que hoje enxergam menos<br />

Ce<strong>de</strong>ram lugar ao coração<br />

que voltou a ver mais.<br />

62<br />

Ilustração: Leticia Santana


SE TIVESSE PASSADO<br />

MINHA VIDA A TEU LADO I<br />

Quantas vidas esta vida?<br />

Longo caminho largo<br />

Curvando-se por vezes, sobre linhas<br />

retas que cruzam esquinas, Indo ver,<br />

querendo cheirar, saber aon<strong>de</strong> vai dar,<br />

A curva tão curta que a ti me conduziu,<br />

Esten<strong>de</strong>u-se tão <strong>de</strong> repente quanto<br />

aquele tempo <strong>de</strong> outono,<br />

Dourado, longe <strong>de</strong>senhado,<br />

tal qual aquarela esfumaçada,<br />

Na memória límpida da vida<br />

que não passei ao teu lado.<br />

Não era mais do que menina,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito cedo, teu olhar castanho<br />

Buscou-me ligeiro, matreiro,<br />

por entre outros,<br />

Tantos outros que buscavam ao redor<br />

alguém, tu e eu também,<br />

Alguns poucos, somente alguns,<br />

esses que se farão acompanhar,<br />

Toda vez que nova aurora <strong>de</strong>spontar.<br />

Um dia tu te foste<br />

para domingo regressar,<br />

Eu menina aprendi o que é esperar<br />

E foi tanto o que esperei<br />

Que em mulher me transformei...<br />

A ti continuarei a buscar,<br />

posso me enganar,<br />

Mas o engano acomete<br />

o amor <strong>de</strong>scuidado,<br />

E o <strong>de</strong>scuido escolhe um livro rasgado,<br />

Arquivado vocábulo, dicionário<br />

investigado em pormenor,<br />

Perguntas a fazer ajustando<br />

brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> palavras:<br />

Viverá caso <strong>de</strong>cida a paixão<br />

<strong>de</strong> nome mudar?<br />

Paixão... Amor... Amor é dor e morre,<br />

como o ramo, on<strong>de</strong> mora a flor.<br />

Mora sim e morre na ilusão do amor.<br />

Teu amor continuarei a perseguir Dele<br />

fugir,quem sabe passou da hora, Já que<br />

tu não vens e <strong>de</strong>moras.<br />

E eu o que seria sem me apaixonar?<br />

Tu <strong>de</strong>sprezas tua vida e segues sobre<br />

linhas curvas <strong>de</strong>senhando retas,<br />

Pelos cantos da vida que não é minha.<br />

Tu permaneces longe <strong>de</strong> mim<br />

em outro país,<br />

N’algum lugar, com alguém a te cuidar.<br />

Enquanto eu arrisco,<br />

experimento e vou tentando,<br />

Estudo a solidão das horas repetindo,<br />

Complicando, buscando,<br />

adiando a vida para <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> amanhã.<br />

Recomeço a cada anoitecer,<br />

varando a noite <strong>de</strong> cada dia,<br />

Na certeza <strong>de</strong> a porta se abrir,<br />

Anunciando em seguida que tu chegaste<br />

Para nunca mais partir.<br />

64 Ilustração: Milena Nogueira<br />

65


SE TIVESSE PASSADO<br />

MINHA VIDA A TEU LADO II<br />

Quantas vidas esta vida?<br />

Longo caminho largo<br />

Curvando-se por vezes,<br />

sobre linhas retas que<br />

cruzam esquinas, Indo ver,<br />

querendo cheirar, saber<br />

aon<strong>de</strong> vai dar<br />

A curva tão curta<br />

que a ti me conduziu,<br />

Esten<strong>de</strong>u-se tão <strong>de</strong> repente<br />

quanto aquele dia <strong>de</strong> outono,<br />

Dourado, longe <strong>de</strong>senhado,<br />

tal qual aquarela<br />

esfumaçada,<br />

Na memória límpida da vida<br />

que não passei ao teu lado.<br />

Deixara há muito <strong>de</strong> ser<br />

menina, teu olhar castanho<br />

Buscou-me ligeiro, matreiro,<br />

por entre outros,<br />

66<br />

Tantos outros que buscavam<br />

ao redor alguém, tu<br />

e eu também,<br />

Alguns poucos, somente<br />

alguns, esses que<br />

se farão acompanhar,<br />

Toda vez que nova aurora<br />

<strong>de</strong>spontar.<br />

Chamo-te, te busco<br />

e procuro e sei que estou<br />

a me enganar,<br />

O engano acomete<br />

o amor <strong>de</strong>scuidado,<br />

E o <strong>de</strong>scuido escolhe<br />

um livro rasgado,<br />

Arquivado vocábulo no<br />

dicionário vasculhado.<br />

Retrato da vida se a tivesse<br />

passado a teu lado,<br />

Amor que morre<br />

tanto quanto vem a dor,<br />

Como o ramo,<br />

on<strong>de</strong> mora a flor,<br />

Azul na perfeita flor,<br />

ilusão pormenor <strong>de</strong>sse amor.<br />

Teimo em buscar-te,<br />

amor da vida que não viveu<br />

a teu lado,<br />

Tu te esqueces que traçaste<br />

linhas elípticas, cíclicas<br />

Ao riscar cantos da vida<br />

que não é minha,<br />

Pois tu permaneces<br />

promessa, lembrança.<br />

Eu vou arriscando,<br />

experimento e vou tentando,<br />

Estudo as horas e vou<br />

<strong>de</strong>scomplicando, buscando,<br />

Adiando a vida para <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> amanhã.<br />

Recomeço a cada alvorecer,<br />

avanço o dia <strong>de</strong> cada noite,<br />

Para ver a porta se abrir<br />

e do outro lado<br />

ver-te chegar.<br />

Ilustração: Gabriely <strong>de</strong> Campos Silva


Minibiografia<br />

Nasci em São Carlos, interior <strong>de</strong> São<br />

Paulo numa família <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

italianos da região do Veneto, sendo a<br />

terceira <strong>de</strong>ntre seis filhos. Estu<strong>de</strong>i na<br />

“Escola Normal” da cida<strong>de</strong> dos 7 aos 17<br />

anos e adorava línguas estrangeiras,<br />

principalmente Inglês e Alemão.<br />

Graduei-me em 1978 em Engenharia<br />

<strong>de</strong> Materiais pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<br />

<strong>de</strong> São Carlos, tendo seguido carreira<br />

instigante e <strong>de</strong>safiadora até 2006.<br />

Em 1980 lá fui eu com cara e coragem<br />

morar sozinha em Salvador, on<strong>de</strong><br />

jamais estivera antes, sem conhecer<br />

ninguém. Casei-me em 1981 – amor e<br />

paixão à primeira vista- e tenho dois<br />

filhos maravilhosos, sem nenhuma falsa<br />

modéstia. Concluí pós-graduação lato<br />

sensu pelo MBA Internacional e Curso<br />

<strong>de</strong> Especialização em Gestão Ambiental<br />

da Proenco Brasil, tendo escrito<br />

monografia intitulada “Os plásticos e<br />

o lixo nas cida<strong>de</strong>s” em 2006. Em 2007<br />

tornei-me contadora <strong>de</strong> histórias<br />

pela “Associação Viva e Deixe Viver” e<br />

esta foi uma experiência inesquecível,<br />

assim como provavelmente o gatilho<br />

do processo <strong>de</strong> escrever e compor.<br />

Foi a partir <strong>de</strong> 2008 que comecei a<br />

compor textos e canções que servem<br />

à teatralização e contação <strong>de</strong> histórias<br />

no contexto da educação ambiental<br />

para o consumo consciente, lixo pósconsumo,<br />

poluição ambiental e coleta<br />

seletiva- minha “mania”... São histórias,<br />

estórias e canções para divertir, ensinar<br />

e apren<strong>de</strong>r.<br />

68

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!