HIPOCAMPO
Primeira publicação impressa do acervo HIPOCAMPO
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AVESSO
TRADIÇÃO
04 LIM
Quando nasci veio o avesso, destes
que costuram as sombras, e disse
“vá, criança, vá ser rendeira na
vida”. Ainda pequena aprendi a tecer o
vento. De canto em canto, amarro um
ponto, embolo e desembolo um carretel de
linhas que ouso chamar de Tempo. Um dia,
costurei o amor e me furei com sua fiada
agulha. Do sangue que brotou bordei na
pele, poros por poros, esta mulher.
A velha preta sentada
embalado balanço
sobre a cadeira
coze o pano
dita o ponto:
a vida o que é?
Nem da cruz nem do santo
da palavra, o encanto
do bordado, o avesso
da cabaça, o feitiço
do tempo, o tropeço
A tradição faz sua escrita
trançada e híbrida
sobre o terreiro
escurece o morro
miragem!
Pinta de preto
o pé da paisagem
feito noite no açude
jongo de tambozeiro
feito puxada de aboio
no louvor do carreiro
Lá do canto pau a pique, sorrateiro
fumaça salpica dum braseiro
e calha certeiro no cachimbo
do velho malungo preto
A velha desfia a barra
desaranjou o traçado
repuxa a linha e repara
amarra o ponto cantado.
1/2 2/2
São João Del Rei
LARISSA IBÚMI MOREIRA
MG