Regulagem Perfeita Vs. Equilíbrio Aparente
Sou autodidata e neste texto eu tento confrontar o pensamento metafísico, de uma suposta regulagem perfeita do universo, com o pensamento dialético materialista, mostrando que todo o equilíbrio das coisas é apenas aparente. Para isso, recorro à física e à filosofia para mostrar minha visão de mundo.
Sou autodidata e neste texto eu tento confrontar o pensamento metafísico, de uma suposta regulagem perfeita do universo, com o pensamento dialético materialista, mostrando que todo o equilíbrio das coisas é apenas aparente. Para isso, recorro à física e à filosofia para mostrar minha visão de mundo.
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Por: Magno M. Elias
REGULAGEM PERFEITA
versus
EQUILIBRIO APARENTE
(releitura)
Simulação de um asteróide se aproximando de nosso planeta. Afinal, a que ordem segue o nosso universo? E a
que leis ele obedece?
I- INTRODUÇÃO
Relâmpago surgido das cinzas do vulcão
Eyjafjallajökull, no sul da Islândia. Uma grande
quantidade de gelo glacial derretida esfriava e
fragmentava a lava em partículas de vidro arenoso e
eram carregadas com a pluma vulcânica em ascensão.
(Fonte-NASA)
Há aproximadamente 9 anos atrás, escrevi um
artigo no jornal O Rebate, cujo título se
chamava “Regulagem Perfeita versus
Equilíbrio Aparente". Decidi reescrevê-lo
mantendo o mesmo nome por considerá-lo
mais atrativo sendo que, desta vez, farei uma
releitura com mais abrangência e maturidade do que o conteúdo original.
O título se refere a duas formas de interpretação do universo: a primeira - Regulagem Perfeita -
influenciada pelas idéias da escolástica e, portanto, alinhando-se com a visão de mundo
conhecida como metafísica. A visão metafísica engloba um pacote de idéias à margem da ciência
e considera o universo regido por uma força suprema e oculta que controla perfeitamente toda
sua estrutura e funcionamento, com harmonia e equilíbrio. E a segunda - Equilíbrio Aparente -
alinhando-se a uma visão materialista e dialética afirma, ao contrário da primeira, que este
equilíbrio é apenas aparente e relativo. Considera que no universo nada está em repouso. Tudo e
absolutamente tudo está em movimento, sofrendo constantes mudanças, seja em pequenas ou
em grandes proporções, sujeito à leis universais onde atuam forças e grandezas físicas já
conhecidas e ainda a serem descobertas. Mas há que se tomar alguns cuidados. Por muito tempo
os filósofos enxergavam as mudanças nos fenômenos de forma mecanicista, como se a natureza
fosse uma grande máquina em que cada objeto fosse um simples componente, com funções
predeterminadas. Mas só considerar o movimento das coisas não é suficiente. As transformações
não são somente de lugar (deslocamento) ou de volume/quantidade (aumento e diminuição).
Implicam também em mudanças de caráter, de qualidade. Sendo assim, essas mudanças
imprimem novos significados à novos e inéditos acontecimentos.
Pois bem, o que nos faz imaginar que o universo seja tão perfeito e harmonioso? Será o universo
tão ordenado, simétrico e ainda por cima regido por uma força única e poderosa? Que força
oculta seria capaz de configurar o universo com tamanho poder, a tal ponto de ordenar e
controlar, de forma equilibrada, tantos planetas, astros, galáxias, buracos negros, explosões
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estelares, os quais já temos conhecimento? Que força misteriosa é capaz de intervir em todas as
imprevisibilidades acidentais de um cosmo aparentemente tão infinito e recheado de eventos
extremamente potentes? E mais: por quê tanto mistério do criador em nos revelar a criação?
Onde ele está? Será que a ciência está indo ao seu encontro? Teria o universo sido criado ou
sempre existiu? São muitas as perguntas e poucas as respostas.
A visão metafísica, de que tudo segue um equilíbrio perfeito ou regulagem perfeita, atende
mais à caprichos estéticos da subjetividade do que à frieza da verdade, e sempre ocupou um
lugar de destaque dentre as interpretações do mundo, do universo, dos fenômenos da natureza e
das leis que a regem. Ao se surpreender com o que não compreende, a metafísica cria
misticismos capazes de convencer meio mundo. Considerarei, neste meu raciocínio, duas fases
do pensamento metafísico que vejo como essenciais: a 1ª - metafísica enquanto solução de
conflitos existenciais num estágio do desenvolvimento humano onde a observação era
insuficiente para se construir conhecimentos sólidos sobre a realidade; a 2ª - metafísica
enquanto solução de conflitos existenciais num estágio superior do saber científico.
Imaginemos uma época onde os homens tentavam criar ordem e padrões estéticos nos
ambientes mais hostis. Mesmo contendo as fontes de subsistência, a natureza exigia dos homens
uma árdua luta cheia de obstáculos para que conseguissem sobreviver. Estar no mundo existindo
e, ao mesmo tempo, ter de lutar para a manutenção da existência, deveria ser um dilema infernal
e uma contradição que só se resolveria de duas maneiras: enfrentando a vida ou desistindo de
viver. As primitivas sociedades humanas começaram a encarar a natureza de uma forma
diferente de como ela realmente era. As pinturas rupestres nas rochas, por exemplo, além de
manifestação artística, revelavam uma forma dos homens enfrentarem seus medos, buscando
inspiração e coragem para continuarem sua labuta. Foi inevitável construir uma visão de mundo,
diante da dificuldade de apenas observar a natureza e deduzir sobre os fenômenos que nela
ocorriam. Das inspirações que os homens buscavam para encarar suas dificuldades, surgiram
aspirações de um mundo abstrato, paralelo ao real. Nesta fase, parecia insustentável entender
friamente as leis da natureza, diante de tantos perigos e desafios. Foi preciso sanar as dores
existenciais criando um poder cuja grandeza nos daria forças para enfrentar os tormentos aqui
na Terra. Agora há algo em que se apoiar, uma referência comum à todos e que preenche um
vazio que, antes, não fazia sentido. Eis o que considero aqui, sobre a 1ª fase do, inevitável,
pensamento metafísico.
Mas, em tempos atuais, homens de ciência e boa fé ainda sofrem os reflexos dessa visão
de mundo onde as abstrações do que se investiga continuam intimamente ligadas ao olhar
estético e padronizado dos devaneios alheios. Há sempre aquela fagulha de esperança em
encontrar os códigos secretos sobrenaturais, escondidos na natureza. Vide as idéias do design
inteligente e seus cálculos algébricos e geométricos que se repetem em quase tudo, a exemplo da
espiral de Fibonacci. Eu vejo, sinceramente, que este olhar estético e perfeccionista embassa o
olhar investigativo que depende de um compromisso sério. Investigar a realidade aspirando
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somente boas surpresas desconsiderando as frustrações que podem ocorrer, não é um trabalho
honesto de quem respeita a si mesmo e o mundo em que vive. Eis como vejo esta 2ª fase.
E para nossa alegria, todas as evidências da ciência que hoje são usadas em benefício da
sociedade, se deram graças a nobres curiosos que vão até o fim para entender como a natureza
funciona de fato. A medicina, a biorobótica, a astrofísica, a física nuclear, o GPS, a computação
quântica e etc, são alguns exemplos de resultados oriundos de uma investigação concreta da
natureza. Por isso considero esta segunda fase da metafísica, não como inevitável, mas como
uma fase oportunista de sua busca para solucionar problemas, deturpando realidades e
interferindo no progresso científico.
Devemos muito às grandes descobertas, que possibilitaram um novo olhar da realidade
influenciando até mesmo as ciências humanas. As leis, postulados, teses e corolários, a partir do
séc. XIX, contribuíram gradualmente para desconstruir a maneira cartesiana e linear de
enxergar as coisas. A não-linearidade e a assimetria da natureza começava a ser percebida. A
metafísica começava a perder seu espaço enquanto visão de mundo e a visão dialética, resgatada
por Hegel, começava a ganhar espaço com um novo olhar que dava fluidez às novas descobertas.
İsso literalmente revolucionou a ciência de uma vez por todas.
II- A VISÃO MATERIALISTA E DIALÉTICA.
Representação de uma espiral. Se olharmos de cima, a sensação é que seu giro
é em ciclos, diferente se a olharmos de perfil. A idéia da espiral nos mostra que
ela só pode ser aceita se considerarmos as mudanças sob o ponto de vista
evolutivo e progressivo. Nada volta ao seu ponto inicial, senão em uma nova
fase e com novas características.
Em contraposição à visão metafísica, este artigo tomará como base
uma grandiosa ferramenta de estudo e análise de casos que
revolucionou a filosofia no séc. XIX e, desde então, tem
contribuído profundamente na compreensão da realidade: o
materialismo dialético, um campo da filosofia que interpreta
os fenômenos (casos, eventos, situações) naturais (e também sociais) a partir de relações
específicas de oposição (contradição) existentes entre os elementos que os constituem. Cada
fenômeno, natural ou social, possui um determinado número de elementos que o constitui. Estes
elementos possuem uma relação de oposição entre si e compõem uma unidade(conjunto,
sistema) de contrários. Além de compor este sistema, os elementos se interagem numa espécie
de correlação de forças que os mantém num estado de interdependência e coexistência. E nesta
dinâmica o fenômeno ganha a vida e o movimento necessários a sua existência. Ou seja: todo
fenômeno, de qualquer natureza, ordem ou categoria, contém elementos específicos que estão
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em contradição entre si, ao mesmo tempo que dependem um do outro para existirem. Estes
elementos seguem sua trajetória histórica até um determinado momento. Ou seja, sua trajetória
não é infinita. No final de sua vida, esta unidade de contrários sofre uma ruptura qualitativa,
que é o resultado do ápice da contradição entre os elementos. É o que se chama também de
“antagonismo na contradição”: esta unidade, com seus elementos inseridos nela, chega ao seu
auge crítico e o seu fim se consuma. A partir deste momento surge um novo fenômeno (ou mais
de um). Sendo assim, os velhos e novos fenômenos não seguem um ciclo mas sim uma espiral
evolutiva.
Vejamos, por exemplo, o acelerador de partículas. Um fenômeno se encontra aí: duas
partículas se colidem a uma velocidade extraordinária, próximas a velocidade da luz. Neste caso,
as partículas formam um par de contrários, uma unidade. E nesta colisão, o que ocorre? Um
impacto tão destrutivo capaz de gerar partículas ainda menores. A descoberta do bóson de Higgs
em 2012 através do LHC (grande colisor de hádrons), foi um destes experimentos de colisão
entre partículas que possibilitou sua descoberta.
Portanto, o que podemos observar neste exemplo da colisão, é que houve uma ruptura
qualitativa, gerando um novo fenômeno composto de novos elementos. Outros inúmeros
fenômenos podem comprovar como que no mundo da matéria, até mesmo no plano das idéias,
nas ficções, nos contos, a tese dialética materialista se faz presente e necessária para que todo o
enredo dos fenômenos tenha sentido. Sendo assim, o materialismo dialético se confirma como
verdade universal e é de extrema importância a sua compreensão para que se compreenda os
mecanismos de tudo o que acontece.
Universo e multiverso
İmplosão e explosão estelar
Gravitação e pressão interna (forças contrárias na formação de uma estrela)
Sol e planetas
Planeta e satélite(s)
Matéria e antimatéria
Matéria e energia
Próton e antipróton
Próton e elétron
Elétron e Pósitron
Núcleo atômico e eletrosfera
Férmions e bósons
Quark e antiquark
Atração e repulsão
Absorção e emissão de energia
Forças centrípeta e centrífuga
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Forças nuclear forte e nuclear fraca
Ganho e perda
Ação e reação
Criador e criatura
Ordem e caos
Simétrico e assimétrico
Nada e tudo
Física e metafísica
Todos os exemplos acima formam unidades de contrários simples mas que, em outros
casos, poderiam ser compostos de dois ou mais elementos. Mas isso já é suficiente para
entendermos que para a matéria se mover e criar vida, ou seja, ter sua organicidade, é necessário
elementos que se confrontem e ao mesmo tempo se complementem. Senão, nada acontece.
Qualquer coisa funciona desta forma: inúmeros elementos trabalham ininterruptamente
compondo uma imensa gama de fenômenos. Mas essa gama de coisas não pode somente ser
reduzida à eventos numéricos, com simples movimento e deslocamento. Em um determinado
momento de seu processo de existência, um fenômeno qualquer sofre uma mudança tão
significativa que muda o seu caráter, resultando no fim parcial ou total deste processo. E, por
mais que seja um fim parcial, a mudança de caráter é, ela mesma, uma mudança de qualidade. E
deste fim surge(m) novo(s) processo(s), com novas características. E nesta espiral todas as coisas
seguem seu natural e eterno caminho evolutivo.
Portanto, se hoje você bebe leite gelado com Nescau no café da manhã, mas amanhã você
quer beber café com leite ( normalmente quente), isso significa que o leite continua no seu
cardápio e a solução desta contradição se resolveu com sua escolha e decisão em mudar
parcialmente o café da manhã. Mas pode acontecer de você desejar uma vida mais saudável.
Você larga tudo isso para trás e começa uma dieta detox. Você agora começa a beber suco verde
todos os dias de manhã. Logo, foi dada uma solução definitiva neste seu dilema que não passou
de um processo envolvendo elementos em contradição, substituídos por novos elementos e
sendo você mesmo um dos elementos deste processo. Um exemplo só para descontrair.
Em todo tempo ocorrem mudanças de processos em nosso dia-a-dia, assim como em
toda a natureza e no universo. Transformações quantitativas e qualitativas envolvendo
elementos em interdependência e ao mesmo tempo em contraposição. Querendo ou não,
acreditando ou não, é assim que funciona o motor em espiral que move e transforma tudo.
Literalmente!
III- O TEMPO E O ESPAÇO
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"Uma ilusão. A distinção entre passado, presente e futuro não passa de uma firme e
persistente ilusão." - Albert Einstein
Representação de uma interação gravitacional entre a Terra e
a Lua, gerada pela deformação do espaço-tempo,
contrariando a física newtoniana de um tempo e espaço
absolutos.
Quando se fala no tempo, pensamos no relógio e na
escala que marca os segundos, minutos, horas e por
aí vai. O tempo já está internalizado em nós. Estamos
sempre usando referenciais como forma de nos
situarmos no tempo e no espaço. Ora estamos num
lugar, ora em outro. O passado de onde estávamos é
o presente de onde estamos. E dependendo da minha escala - os segundos, por exemplo - cada
palavra que escrevo aqui já é passado, e o segundo que está para acontecer é o futuro. É o
presente se tornando passado a cada segundo. Mas, a cada vez que reduzimos o intervalo de
tempo entre passado e futuro, mais perto do presente chegaremos. Isto significa que só
sentiríamos o presente quando este intervalo de tempo chegasse a um valor infinitamente
pequeno, tendendo a zero, o que é impossível. Ou seja: o presente simplesmente não existe, a
não ser como uma abstração do nosso cérebro. O tempo, como o utilizamos, é uma construção
mental do homem para dar sentido à sua trajetória aqui no planeta.
Na física a visão de um tempo absoluto, igual para todos e em qualquer lugar, dentro e
fora do nosso planeta, foi superada com a descoberta da teoria da relatividade restrita e,
posteriormente, com a teoria da relatividade geral, do físico Albert Einstein. Em sua primeira
fase, a teoria da relatividade restrita (também chamada "especial"), Einstein observou que
quanto mais rápido um objeto se movia, mais lentamente o tempo passava para ele. Adotando a
velocidade da luz como referência para suas observações, ele chegou a conclusão de que quando
a velocidade tende ao infinito o tempo tende a parar. Além disso, um corpo submetido a altas
velocidades tende a aumentar a sua massa. Obviamente que isso só é possível com corpúsculos
minúsculos, no caso as partículas. Por estas observações se chegou à conclusão que matéria e
energia são interconversíveis, ou seja, a matéria pode se transformar em energia e vice-versa. Daí
surgiu a famosa fórmula E=mc². Onde E é energia, m é a massa e c a velocidade da luz. Mas
vem a pergunta: massa de que? A luz, por ser luminosa, é composta de partículas chamadas
fótons. Estas partículas possuem massa, mesmo sendo muito pequenas. Por isso todo o estudo
de Einstein tem tanto sentido.
Imagine você parado em algum lugar observando um trem-bala passando em alta
velocidade. E de repente, dois relâmpagos caem simultaneamente atrás do trem, a uns cem
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metros de distância. Agora imagine a mesma situação, mas agora você está dentro do trem. Você
olha para horizonte onde os raios irão cair e toma um susto enorme ao perceber que eles não
caíram simultaneamente. Enquanto você corria rapidamente na direção de um raio, se afastava
do outro. Ou seja, o tempo não é o mesmo quando você estava parada e quando você estava em
movimento.
A visão de um tempo relativo, não absoluto, foi um duro golpe na física newtoniana
clássica, que também refletiu em um outro fenômeno: a gravidade. A atração entre os corpos
celestes não era explicada mais pela simples interação gravitacional entre eles, mas por uma
deformação do tecido espacial provocado por eles. Einstein chegou a esta conclusão na segunda
fase de sua teoria, que ficou conhecida como teoria da relatividade geral.
No final dos anos 50, um físico chamado Leonard Schiff teve a brilhante ideia de lançar na
órbita da Terra aparelhos que simulavam giroscópios para provar a teoria da relatividade geral
de Einstein. Ou seja, provar que o espaço-tempo sofre torção. O experimento, chamado de
Gravity Probe B, durou mais tempo do que imaginado. Na expectativa de durar alguns anos,
acabou durando quatro décadas até que toda a tecnologia fosse desenvolvida e lançada na órbita
da Terra. Finalmente foi confirmada a veracidade das equações de Einstein através da inclinação
dos eixos dos giroscópios em órbita, provando que o espaço-tempo sofre torção causada pela
Terra. As variações na trajetória da luz emitida pelos diversos eventos cósmicos até chegar aqui,
também nos mostra que o espaço-tempo realmente sofre torções.
E qual a implicação disso para nós? Pois é. Um exemplo clássico é o nosso conhecido GPS,
que hoje usamos para acompanhar em tempo real a localização das coisas. Seu uso só se tornou
possível graças às descobertas de Einstein. A gravidade dos satélites em órbita que enviam os
sinais GPS é menor do que a gravidade na superfície terrestre. E onde a gravidade é menor, o
tempo é mais rápido. E por isso os relógios dos satélites precisam ser de alta precisão e
corrigidos com uma diferença de 38 microssegundos por dia, para que o sinal também chegue
com precisão até nós.
Paradoxo dos gêmeos
(tirado do livro “50 idéias de física quântica que você precisa conhecer” - Joanne Baker)
Como relógios em movimento batem mais lentamente, astronautas em uma espaçonave
veloz envelheceriam mais devagar do que seus colegas na Terra. Se você enviasse um gêmeo
para o espaço em um veículo ultrarrápido até, digamos, a estrela mais próxima, ele vivenciaria
um tempo mais lento. Ao retornar, ele poderia estar jovem ainda, enquanto seu irmão já seria
idoso. Isso soa impossível, mas não é, na realidade, um paradoxo. O gêmeo astronauta seria
sido submetido a forças extremas durante sua viagem, à medida que sua nave acelerasse e
desacelerasse no caminho de volta. Outra implicação de mudanças relativas no tempo é que
eventos que parecem simultâneos em um lugar não parecem sê-lo em outros.
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IV- MOVIMENTO NO EQUILÍBRIO E EQUILÍBRIO NO MOVIMENTO
Nossa estrela, o Sol. Esta bola de fogo é o resultado de uma dura
batalha entre força gravitacional e reações de fusão nuclear em seu
interior, fundindo em torno de 620 milhões de toneladas de hidrogênio
a cada segundo e liberando uma grande quantidade de energia. Este
processo cria um equilíbrio relativo que um dia irá se desfazer, gerando
fenômenos como as supernovas e buracos-negros.
Fredrich Engels em seu livro “ A Dialética da Natureza”,
escrito na segunda metade do séc XIX, abordou a relação
entre “Movimento e Equilíbrio” de forma a mostrar como o
equilíbrio é relativo. Ele diz:
“O equilíbrio é inseparável do movimento. No movimento dos corpos celestes, há
movimento em equilíbrio e equilíbrio em movimento (relativo). Mas todo movimento relativo
especial, isto é, neste caso todo o movimento independente de corpos individuais, em um dos
corpos celestes em movimento, é um ténder para o estabelecimento do repouso relativo do
equilíbrio. A possibilidade de um corpo ficar em repouso relativo, a possibilidade de estados
temporários de equilíbrio é condição essencial de diferenciação da matéria e,
consequentemente, da vida. No Sol, não há equilíbrio das diversas substâncias, mas somente
da massa em seu conjunto, ou seja, um equilíbrio muito restrito, determinado por
consideráveis diferenças de densidades; na sua superfície, há um eterno movimento e
inquietude, dissociação. Na Lua, parece prevalecer exclusivamente o equilíbrio, sem
movimento relativo algum: morte (Lua=negatividade). Na Terra, o movimento diferenciou-se,
tendo estabelecido o intercâmbio entre movimento e equilíbrio: o movimento individual tende
para o equilíbrio, e o movimento em seu conjunto destrói mais uma vez o equilíbrio individual.
A Rocha chegou ao repouso, mas a erosão, a ação das marés, dos rios e dos deslocamentos
glaciais, destroem continuamente o equilíbrio. A evaporação e a chuva, o vento e o calor, os
fenômenos elétricos e magnéticos, agem também da mesma forma. Por último, no organismo
vivente, assistimos a um incessante movimento de todas as suas menores partículas, assim
como de seus órgãos principais, donde resulta um continuado equilíbrio do organismo na sua
totalidade, durante o período normal de vida e que, no entanto, sempre permanece em
movimento, a vivente unidade de movimento e equilíbrio.
E conclui Engels o seu apontamento: “TODO EQUILÍBRIO É APENAS
TEMPORÁRIO E RELATIVO”.
Em nosso espaço cósmico o que mais encontramos são estrelas. Dizem que há mais
estrelas no universo do que grãos de areia em todas as praias do planeta. Logo, um dos eventos
mais comuns do cosmo é formar estrelas. A formação das estrelas surge também de um paciente
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trabalho entre movimento e equilíbrio e vice versa. E a gênese está nas nebulosas. As nebulosas
são compostas basicamente por nuvens moleculares de gás hidrogênio (H²) e poeira interestelar,
distribuídas de forma não uniforme no espaço. A composição dessa massa é bem mais complexa,
mas vamos lidar somente com o hidrogênio, que é um gás bastante abundante nas nuvens
cósmicas. Devido o seu aspecto disforme, há pontos nestas nuvens onde sua massa se concentra
mais. Desta concentração, um núcleo vai se formando juntamente com um campo gravitacional,
que puxa mais massa para o núcleo em formação. Na medida que a massa se condensa mais, sua
temperatura e pressão interna aumentam gradativamente, gerando uma força contrária que
força os gases compactados a saírem. Quando estas forças se equilibram, ocorre um fenômeno
chamado de “equilíbrio hidrostático”. Este equilíbrio, aparente e relativo, entre a força
gravitacional e a pressão interna dos gases, está sempre em conflito no sistema. Ele acumula
mais força para que, num breve futuro, se rompa este processo e seja gerado um novo. Este
rompimento nada mais é do que o colapso do equilíbrio hidrostático, gerando uma explosão da
matéria comprimida em seu interior. Uma protoestrela surge até que reações de fusão nuclear
começam a ocorrer, dando forma a uma estrela de verdade.
Vejamos um exemplo simples de equilíbrio aparente de forças: o cabo de guerra. Numa
simples brincadeira usamos uma corda onde em cada lado se encontra um grupo de pessoas.
Cada lado deve usar o máximo possível de força para saber quem vencerá. Mesmo assim, antes
de um lado vencer, algumas situações inesperadas podem ocorrer. Em um determinado
momento, as forças de ambos os lados podem se tornar iguais. Para o leigo observador, eles não
vão nem para um lado nem para o outro e todos parecem estar parados. A brincadeira começa a
ficar sem graça e o público fervoroso começa a vaiar os participantes. A tensão aumenta e, de
repente, algo acontece: um dos lados puxa com mais força e vence a disputa. Mas o que estava
acontecendo quando os participantes estavam “parados” puxando a corda? Eles estavam em
equilíbrio de forças. E por algum motivo, algo desbaratou esta correlação de forças quebrando o
equilíbrio entre elas.
Moral da história? Numa situação onde há equilíbrio é porque há forças agindo. Neste
caso em específico, as forças partiram de um esforço humano que podem se desfazer a partir do
momento que a disputa acaba. Porém, na natureza, as forças agem ininterruptamente em
diversos níveis. No universo, também há forças que, mesmo invisíveis, agem incessantemente
disfarçando um equilíbrio, até que algum abalo possa quebrar sua configuração. Em escala
astronômica, mesmo que demore milhões ou bilhões de anos, os eventos que apresentam um
determinado grau de equilíbrio, em algum momento vão se romper.
Imagine se o sol emitir menos radiação? E se a Terra mudar seu eixo de rotação, a sua
órbita e a velocidade? E se o sistema solar sofrer o reflexo de algum outro evento da galáxia? E
quando a Via Láctea se chocar com a nossa vizinha Andrômeda? Até que isso ocorra, centenas de
gerações humanas podem já ter se sucedido. E nossa ilusão de que nada ocorre no espaço
continuará.
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Em suma, o equilíbrio nada mais é do que aparente e relativo. Ele é o ensaio de sua futura
ruptura. E se houve ruptura é porque estava em movimento. Movimento no equilíbrio e
equilíbrio no movimento. Forças opostas estão o tempo todo em um suposto equilíbrio até que
algo inédito aconteça entre elas. Se existe a eternidade, ela é a correlação de forças que gera
movimento no equilíbrio e equilíbrio no movimento.
V- UNIVERSO ASSIMÉTRICO
“Desequilíbrio, assimetria e imperfeição são os motores da criação.”
Livro “A Criação İmperfeita”- Marcelo Gleiser
Os diversos pontos da imagem ao lado formam um aglomerado de
galáxias dispostas de modo aleatório no espaço. Perceba as diferentes
inclinações de cada galáxia e o modo como estão dispostas,
representando uma falta de ordem e de um padrão único na
organização espacial do aglomerado.
Olhe bem sua mão e perceba a sua assimetria. Quanto
tormento não devemos ter passado no decorrer de nossa
evolução para chegar a este formato de mãos, com tantas
articulações e pequenos ossos? Imagine como formaríamos
a pinça, com o polegar e o indicador, se estes dois dedos
fossem iguais! Hoje usamos as mãos com tranquilidade, mas
foi preciso muito tempo para esta adaptação. E mesmo com toda sua estranha assimetria, nossas
mãos continuarão sendo o nosso principal instrumento de trabalho, vitais a nossa sobrevivência.
Simplesmente sem elas não fazemos nada. Aí está a magia das mãos: na estranheza e assimetria
de seu formato se esconde a beleza de sua importância vital. Ou seja, sem a sua assimetria, ela
não nos serviria e, provavelmente, não seríamos o que somos.
Assim como nossas mãos, o nosso corpo e todas as formas de vida na Terra são o
resultado de um complexo e ardiloso trabalho da natureza. Enquanto vivos, continuaremos
nossa caminhada evolutiva incerta e tortuosa. Se, por exemplo, comemos muito, podemos
engordar. Se comemos pouco, podemos emagrecer. Se não comemos, morremos. Todos nós
sabemos que o caminhar da vida é cheio de percalços. Lidamos com todo o tipo de desafios.
Todos estes desafios e obstáculos nada mais são do que uma assimetria deste nosso curto
caminhar num planeta entre trilhões de outros.
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O homem sempre buscou compreender a natureza de forma a enquadrar seus argumentos
e provas em padrões simétricos. Ao investigar a realidade, a mente humana sempre idealiza e
constrói previamente um formato (forma=fôrma) daquilo que se pretende descobrir. E isso
acaba gerando um paradoxo entre o que se imagina ser e o que de fato é.
A matemática clássica é um ótimo exemplo. Seus cálculos tinham tanto fundamento que
não deixavam dúvidas. Por isso que a matemática, até certo momento, era a mais perfeita das
ciências. Tudo se encaixava muito bem, com ordem e simetria. Até que começaram a aparecer
determinadas situações que um simples cálculo não resolvia. Foi então que surgiu o cálculo
diferencial e integral, resolvendo problemas de ordem infinitesimal e, portanto, com maior
complexidade. Isso contribuiu para outras áreas da ciência como física, engenharia, química,
biologia, e em tecnologias mais atuais como a computação.
Vejamos o caso da composição do universo em matéria e antimatéria. Segundo pesquisas,
há uma grande disparidade entre uma e outra. Matéria e antimatéria se aniquilam e, portanto,
elas não podem coexistir. Como consequência deste aniquilamento, o espaço seria preenchido
somente de nuvens de radiação cósmica. Não haveria nenhum corpo sólido como planetas,
estrelas e outros. Em outras palavras: “caso matéria e antimatéria tivessem coexistido em
quantidades iguais durante a infância cósmica, teriam se aniquilado em radiação de forma tão
eficiente que, hoje, o universo consistiria principalmente em um banho de radiação. A vida,
nesse caso, seria impossível” - nos revela o físico brasileiro Marcelo Gleiser em seu livro “Criação
İmperfeita”. E ele complementa: “de acordo com a mecânica quântica, é perfeitamente possível
que antiátomos existam e que, portanto, possam existir galáxias de antimatéria. O
anti-hidrogênio, por exemplo, já foi produzido em laboratório”.
As interações entre a matéria e os resultados dessa interação se concretizam a partir das
assimetrias entre os elementos inseridos num processo. As imagens de conglomerados de
galáxias captadas por grandes telescópios, se repararmos bem, possuem uma assimetria sem
igual. Mas é no contexto da imagem que enxergamos o extraordinário, sem se preocupar com
seus pormenores. Se você olhar uma plantação de eucaliptos bem alinhados, mesmo que estejam
igualmente espaçados, as árvores de eucalipto não são idênticas por isso. Mas de longe, a
sensação que nos é criada é de ordem e simetria. Outra curiosidade são as sementes das plantas.
Como algo tão pequeno pode se transformar em algo tão surpreendente? Que relações são
estabelecidas entre a semente e outros elementos, e quanta energia deve haver no interior de um
pequeno grão? Todos sabemos que sem água a planta não “vinga”. İsso é certo. Mas o que é
fundamental neste despertar da semente? A terra, o adubo, a água, a radiação solar (calor),
dentre outros elementos. O que importa mesmo é sabermos que todos eles estão em sinergia
para que a semente brote e a planta cresça. É nesta sinfonia sinérgica que se encontram os
desníveis que darão impulso ao desenvolvimento da planta, do nascimento até sua morte. É
neste desnível que está sua assimetria.
Por mais que os empecilhos da vida não nos agrade, na natureza é comum ver processos
também nada agradáveis que ocorrem constantemente para que tudo tome suas devidas formas.
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Como dito no exemplo anterior: tente lembrar de tudo o que já aconteceu na sua vida até agora e
veja como um dia não foi igual a outro. Como seria representar em um gráfico todos os desníveis
do caminhar da vida? Teríamos tantas variáveis que o gráfico ficaria lotado de tanta informação.
É como falam por aí: "a vida tem seus altos e baixos". O que motiva afirmações como esta senão
por sua assimetria?
Desnível, arritmia, imperfeição, variação, desigualdade, desequilíbrio. São todos exemplos
de assimetria que nos provam que as coisas não funcionam de maneira linear como gostaríamos.
Compreender a assimetria do/no universo é também saber e reconhecer que ele não foi
projetado com perfeição e uniformidade. Se é que tenha sido projetado!! Se algo ou alguém o
projetou com grande sabedoria, devemos admitir que ele não foi um bom desenhista. Afinal, o
que significa "escrever certo por linhas tortas"?
“A simetria é a idéia por meio da qual o homem tentou compreender e criar ordem,
beleza e perfeição ao longo dos tempos.” - Hermann Weyl
VI- FORÇAS İNVİSÍVEİS, MAS QUE EXİSTEM.
Na natureza, existem forças e grandezas que, apesar
de invisíveis, são reais. Entre elas, há 4 forças
fundamentais até agora descobertas: força
gravitacional, força eletromagnética, força nuclear
forte e força nuclear fraca. Cada uma delas atua com
mais precisão em diferentes situações. Dentre as
quatro, quero ressaltar a mais forte de todas,
responsável pela interação das partículas do núcleo
do átomo: a força nuclear forte.
A força nuclear forte é estudada na física quântica e é
responsável pela interação das partículas que
compõem o núcleo dos átomos. Como sabemos, o átomo é composto basicamente pelo seu
núcleo e pela região da eletrosfera. No núcleo se encontram os prótons e nêutrons, de carga
positiva e neutra respectivamente. E na eletrosfera se encontram os elétrons, com carga
negativa. Mas veja só que curioso: por quê o núcleo é tão denso, capaz de manter unidos os
prótons? Afinal, eles têm carga positiva. Pelo que sabemos, cargas iguais se repelem. E por quê
os elétrons que circundam o núcleo não são atraídos pelos prótons? Provavelmente os átomos
não existiriam sem a força forte, não é mesmo? Somente uma força muito poderosa e sutil
poderia agir desta forma.
Imagine que em apenas um átomo ocorrem diversas situações e que, por seu tamanho, a
velocidade destes acontecimentos é absurdamente alta. Simplesmente não se pode calcular nada
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com precisão e nem saber que forças estranhas são estas que mantém partículas iguais unidas,
ao invés de repeli-las. O que se sabe até agora é como elas agem em determinadas situações. É o
caso dos prótons e nêutrons. Ambos são formados por 3 partículas elementares chamadas
quarks. São eles os responsáveis por manterem esta ligação forte entre cargas positivas através
da ação de outras partículas chamadas glúons, que são partículas fundamentais.
Diante deste cenário, podemos inferir que é através deste arranjo interno específico que o
núcleo atômico se comporta de uma maneira específica, unindo cargas de mesmo sinal. Via de
regra, não se pode compreender um fenômeno qualquer sem ter o domínio de suas causas
internas, ou seja, o seu funcionamento interno e os elementos em contradição que compõem o
sistema. Caso contrário, existiria átomo numa situação diferente desta? Talvez sim. Pois existe a
chamada antimatéria e suas partículas correspondentes, como os pósitrons (antielétrons),
antiprótons e antineutrons. Como se comportaria um átomo avesso ao que conhecemos? Não
sabemos!
Por outro lado, no universo cósmico, macroscópico, as interações entre os imensos corpos
celestes também geram curiosidades. Tanto é que se houvesse alguma alteração na configuração
dessa suposta ordem que controla o universo, e também de suas leis, poderíamos ter grandes
problemas. “Qualquer mudança, por menor que fosse, nessas leis, poderia trazer
conseqüências letais”, disse uma vez o cosmólogo britânico Paul Davies, doutor pela
Universidade de Londres. Quando um asteroide passa perto da Terra, fica a pergunta: foi
aleatório ou calculado? Que força(s) estaria(m) envolvida(s) neste caso, evitando uma colisão?
Mas uma coisa parece certa: forças ocultas e invisíveis parecem interagir entre si numa
dinâmica incessante e qualquer desnível nos padrões de seus movimentos mudam a qualidade
de seu funcionamento. É a ordem interagindo com o caos e vice-versa. O movimento das
minúsculas partículas que compõem a matéria segue movimentos aleatórios e difíceis de serem
calculados. As forças que mantém os elétrons girando em volta do núcleo do átomo, os prótons
ligados com os nêutrons e as próprias partículas dentro dos prótons e nêutrons, são forças
extraordinárias e específicas para cada uma dessas situações e podem variar de acordo com as
inúmeras configurações e reconfigurações que ocorrem no universo atômico e subatômico a cada
instante. E se há alguma harmonia entre estes elementos, isso depende desta correlação de
forças difíceis de calcular, já que em cada instante uma nova situação é gerada.
“O invisível governa o visível”. Uma frase bem curiosa, mas que possui diferentes
significados. E o que você pensa sobre? Será algo muito poderoso que governa, como um criador
de tudo? Ou serão forças que agem em diversos níveis no cosmo e na menor das partículas
subatômicas? Realmente não fica claro o que ou quem possa estar agindo nesse sistema tão
grande e complexo como o universo. Mais difícil ainda é saber como agem estas forças. A idéia
de se aproveitar do que não é visível para afirmar o improvável, parece ter sido uma grande
sacada do homem. Ao tentar fundir a dúvida com o desconhecimento, solucionou a contradição
entre ambas atendendo sua preguiça pragmática. Quando se afirma a onipresença de algo capaz
de arquitetar todo o universo e, mesmo que sua magnitude nunca tenha sido enxergada como
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um simples sol, é porque o mistério de sua invisibilidade desperta em nós uma curiosidade. Mas
para despertar a curiosidade é necessário que seja alimentada uma expectativa. A expectativa
supera a dúvida, pois cria no homem a ilusão de que, em algum momento, o mistério será
revelado.
É por isso que muita gente acredita na volta de um Salvador ou no dia do juízo final. Estas
pessoas alimentam uma expectativa que nada mais é do que a curiosidade de presenciar aquele
que representa a criação: Jesus. Ele é, neste caso, somente um porta-voz. Um elo entre o Deus
criador e o homem criatura. Jesus não é somente o sujeito em si, mas também o objeto que
representa a chave lógica de toda a criação. Ele é a prova personificada de que o criador existe.
Pois somente afirmar que um criador projetou e criou tudo não é suficiente para convencer as
pessoas. Seria muito frustrante para nós não constatarmos, em vida, o retorno do profeta. Mas
ainda há uma outra esperança: a eternidade. Se você não teve a sorte de presenciar este
momento tão mágico do retorno do messias, em vida, você terá a oportunidade de conhecê-lo
depois da morte.
Veja bem como parece haver uma intenção nessas construções mentais. Há um processo
que demanda bastante paciência dos fiéis, cujas expectativas são preenchidas com falsas
promessas. Vendem sonhos, esperanças e prometem o que não podem cumprir. O pensamento
metafísico, manifestado em sua vertente cristã, define, assim na terra como no céu, as
coordenadas que devem nos guiar para a felicidade única. Em suma: aqui na terra, a expectativa
do juízo final liderado por nada mais nada menos que Jesus. Ou após a morte, a expectativa do
inevitável encontro com o criador.
VII- O VAZIO E A MATÉRIA ESCURA.
A teoria da relatividade geral, de Einstein, e o
experimento do físico Leonard Schiff, comprovam
que o espaço vazio não é simplesmente um "nada".
A curvatura do espaço-tempo é gerada pela ação de
forças gravitacionais conjuntas, mas que ainda não
foram compreendidas em sua totalidade. Se os
corpos de grande massa torcem o meio
espaço-temporal onde estão, provocando desvios
na própria trajetória da luz, isso indica que este
meio é/tem alguma coisa. E logicamente que ele exerce uma força oposta para que ocorra um
determinado equilíbrio na composição deste sistema. Logo, há a presença de massa que compõe
a matéria invisível do espaço. Esta matéria é conhecida como Matéria Escura. É matéria, porque
se consegue medir sua existência por meio da força gravitacional que ela exerce. E é escura,
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porque não emite nenhuma luz.
(https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-e-materia-escura-2/).
Jamie Farnes, cosmólogo da universidade de Oxford, observou o seguinte: a matéria escura é
composta por um fluido de massa negativa, exercendo força gravitacional negativa. Isso quer
dizer que a gravidade da massa escura exerce uma aceleração contrária à gravidade da matéria
visível. Ou seja, quando você pressiona uma massa negativa, essa pressão provoca uma
aceleração de sentido contrário. Daí eu pergunto: seria a gravidade da massa escura uma espécie
de anti-gravidade? Seria a matéria escura o que sobrou de antimatéria depois da constituição da
matéria observável? Como pode um universo tão grandioso ter seu espaço preenchido apenas
por 5% da matéria que podemos ver? Algo compõe estes 95% do universo que não podemos ver.
Além disso, toda esta massa invisível não interage com a luz. Flutuamos como peixes na água,
mas não sabemos que fluido é este.
Albert Einstein, quando introduziu sua “constante cosmológica”, propôs um valor fixo
que representasse uma antigravidade, anti-massa e anti-energia, neutralizando os efeitos da
gravidade. Mas quando os cientistas descobriram que o universo estava se expandindo em vez
de ser estático, como Einstein acreditava, a constante cosmológica era colocada em zero e mais
ou menos ignorada. Mas depois que descobrimos que a expansão do universo está acelerando,
os cientistas não podiam mais cancelar convenientemente a sugestão antigravidade de
Einstein.
(https://www.vice.com/pt_br/article/j5yngp/o-universo-e-feito-de-pequenas-bolhas-contend
o-mini-universos-dizem-os-cientistas).
Muitos cientistas buscam encontrar o segredo que possa unir a gravidade relativística
Einsteiniana com a mecânica quântica, mais especificamente com a teoria quântica de campos
(TQC). Ou seja, estabelecer algum parâmetro que possa relacionar a gravidade cósmica com a
quântica. Do grande com o pequeno. É como foi falado no capítulo anterior em relação a uma
expectativa criada pela curiosidade de uma dúvida mal resolvida. Às vezes a própria ciência cai
neste equívoco de criar expectativas que acabam influenciando em suas pesquisas. São
expectativas quase que messiânicas de encontrar uma fórmula única que dê um ponto final nos
mistérios do universo. A chamada “Teoria de Tudo”. As teses que levam à origem de tudo, ao
meu ver, revelam um desvio de fé por parte dos cientistas, que se esforçam em encontrar
respostas que vão de encontro a um criador. Até aí, quase nada diferente da Bíblia. O Big Bang é
uma dessas teorias mais aceitas da origem do universo. Uma minúscula fagulha gerou uma
grande explosão, desencadeando ininterruptas reações, formando mais e mais matéria. Mas
como assim? Como a matéria pode se multiplicar através da explosão de um pequeno ponto tão
concentrado? Como a matéria foi se multiplicando? Onde está a lei da conservação de energia
neste momento inicial? Como se cria a matéria, assim, do nada?
Origem, criação, gênese, Big Bang… ambos subentendem a batuta mágica ou o estalar dos
dedos do grande criador. Até então não há conclusões. Só bastaria afirmarmos que o universo
sempre existiu para pôr na gaveta todo o idealismo conspiratório acientífico. Enquanto isso, a
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briga entre os fiéis sectários e os cientificistas perdurará por muito tempo até que a ciência séria
e isenta de especulações nos dê uma resposta plausível sobre a misteriosa matéria escura.
VIII- A ORDEM VEM DO CAOS
Colisão entre partículas. Além de oferecer a
possibilidade de descoberta de novas partículas, a
colisão libera uma grande quantidade de energia.
Como resultado, é possível observar, em gráfico
computadorizado, uma série de desvios caóticos.
Expressão um tanto quanto polêmica,
dependendo de onde a inserimos. Mesmo
assim, soa estranho. Como assim, a ordem
pode vir do caos? E mais: como convivem a
ordem e o caos nessa estranha sinergia?
Mas precisamos tomar cuidado. O caos aqui, como abordarei, não significa desordem
generalizada do início ao fim. Ele está presente em diversos processos da natureza e do universo,
e é condição essencial para que produza uma ordem ou seja um produto dela. Ordem= simetria,
periodicidade, equilíbrio. Caos= assimetria, aleatoriedade, indefinição, aperiodicidade, não
linearidade. Do caos à ordem ou da ordem ao caos: o belo e o feio caminhando juntos, num
eterno revezamento.
Sendo assim, podemos começar a falar de nós mesmos. De acordo com certas crenças,
somos imagem e semelhança do criador. Somos seres inteligentes capazes de transformar a
natureza a nosso favor. Nosso corpo tem um design complexo e tudo parece estar perfeitamente
encaixado. Será? Mais acima citei o exemplo da assimetria de nossas mãos e como passamos por
duras batalhas em nossa trajetória evolutiva para que as mãos chegassem a este formato
estranho e completamente necessário a nossa sobrevivência.
Ao estabelecermos uma relação entre ordem e caos, podemos dizer que num sistema onde
o caos se mostra presente, seus níveis periódicos, apesar de existirem, se encontram em um
estado de instabilidade e não conseguem se estabilizar. Isso significa que fragmentando este
sistema, os níveis de estabilidade estão presentes numa ordem muito pequena e que, ao se somar
com outros níveis, ele se torna caótico. Ou seja, a evolução de um sistema caótico visita infinitas
órbitas periódicas estáveis. Da mesma forma o contrário, sistemas que apresentam um certo
grau de ordenamento possui, nas partes que o constitui, níveis desalinhados que nada mais são
que níveis caóticos do sistema. Analisando determinados gráficos pode-se observar estes
desníveis como, por exemplo, num eletrocardiograma e nas funções cerebrais.
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Hoje, quando olhamos para o nosso sistema solar, costumamos dizer em alto e bom tom
que nada é tão harmonioso quanto ele. Tudo está em perfeito equilíbrio, muito bem calculado e
projetado. Mas temos sempre a tendência de falar aquilo que agrada aos nossos corações,
negligenciando a verdade. É como achar incrível o nascimento de um bebê mas negligenciar as
dores do parto. Acontece que a formação de sistemas solares, como o nosso, passa por um
doloroso e caótico processo desde a formação da protoestrela (um protótipo de estrela) até
chegar a um estágio de equilíbrio em sua configuração da maneira que conhecemos.
Normalmente estrelas se formam de uma gigantesca nuvem de gases e poeira. Quando uma
estrela começa a se formar surge uma força gravitacional muito forte. Como consequência desta
força gravitacional, surge um campo gravitacional que cria um grande anel de poeira ao redor da
estrela em formação. Estamos falando de porções gigantescas de matéria dispersa no espaço cuja
massa vai se condensando cada vez mais. Este grande anel que parece ser os restos daquilo que
formara a nova estrela, e que agora gira ao seu redor, possui novas características e agirá em
função deste núcleo denso e quente que é a estrela. Uma destas características é que a poeira e os
gases deste anel não possuem mais os atributos que darão vida a uma protoestrela, pois o
cenário mudou e as circunstâncias também. Agora, neste imenso disco que gira sem parar, sob
pressão e temperaturas específicos, futuramente se formarão os planetas que orbitarão a estrela
mãe. Como sabemos, cada estrela é um sol que emite luz própria através de radiação
eletromagnética. Neste processo de formação e consolidação de estrelas e planetas, milhões de
anos são necessários até que o sistema se estabilize num determinado grau, mas nunca
perfeitamente.
Vamos ver o caso dos átomos. O que me chamou a atenção, num primeiro momento, foi
imaginar o comportamento do elétron ao redor do núcleo atômico. Seria sua órbita circular?
Seria tão uniforme assim este movimento? É possível calcular sua posição e sua velocidade?
Não!! A não ser para efeitos de cálculo, algumas considerações podem ser levadas em conta. Mas
a realidade surpreende cada vez mais os físicos com novas descobertas das propriedades da
matéria. Uma destas descobertas foi o “princípio da incerteza”, um enunciado do físico W.
Heisenberg, onde é impossível determinar a posição e velocidade do elétron, a não ser por uma
aproximação probabilística. Ou seja, o movimento do elétron é simplesmente impreciso e
caótico.
No lugar de apenas achar que a matéria só diminui de tamanho, esta nova descoberta
frustrou mais uma vez as expectativas, mostrando que as forças que regem a natureza não
seguem linearidades. Ou seja, são forças que não são constantes e, portanto, estão
constantemente variando. Sendo forças variáveis, os movimentos das partículas que sofrem a
ação destas forças tornam-se imprecisos e portanto, irregulares e imprevisíveis. Fica uma
pergunta: as forças variam porque os movimentos variam ou o contrário, os movimentos variam
porque as forças variam? Quais forças devem ser levadas em consideração? E, se em algum
momento se chega a um equilíbrio, como por exemplo, entre prótons e nêutrons, será um
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equilíbrio muito breve até que a interação entre elétrons e núcleo se rompa, mudando a
qualidade do átomo e a composição de seu núcleo, transformando-o em outro tipo.
Sendo assim, a imprecisão do movimento e da posição do elétron nos prova todo o caos de
sua órbita. Por outro lado, átomos organizados em compostos maiores, nos causam a sensação
de uma ordem preestabelecida. Macroscopicamente há uma ordem. Microscopicamente há a
desordem, o caos.
Ordem e caos. Termos opostos, mas que formam um par quase perfeito neste jogo
dialético. Pois, na natureza, tudo parece funcionar assim: forças opostas que agem em conjunto e
em interdependência. Nunca agem isoladamente. Mas a natureza não é simplesmente uma
máquina, onde cada peça só existe para compor um conjunto de peças. A natureza não é só um
emaranhado de coisas que estão em movimento. É também transformação em qualidade. É
nesta “ordem caótica” e neste “caos ordenado” onde tudo acontece. As moléculas ou os
agregados iônicos se formam, assim como compostos mais complexos e a vida como
conhecemos.
Das imprecisões das partículas e suas forças de interação é que ocorrem suas ligações
específicas. Talvez medir essas forças seria um tanto “forçado” de nossa parte. Talvez seja menos
trabalhoso contemplar o que a natureza já faz e o que a ciência já descobriu. Já sabemos o
suficiente e quão grande é a natureza. E como é intrigante saber que sua aparente harmonia é
consequência da incerteza caótica de seu universo atômico.
"Devemos ser claros que quando se trata de átomos, a linguagem só pode ser usada
como poesia." —Niels Bohr
IX- O PROPÓSITO DA CRIAÇÃO
Falar da criação é falar também daquilo que ela gera: seus
objetos criados. É como um parto. A mãe dá à luz a um
novo ser. Um par de contrários surge: sujeito e objeto,
criador e criatura. São pares que compõem nossa conhecida
ordem dialética. Sujeito criador e objeto criado estabelecem
uma relação a partir do momento que surge este último. Há
sempre uma busca pela fonte da criação, mas nunca se
encontra este sujeito que tudo criou. Contudo, o que nos
resta é estudar aquilo que o sujeito gera e que, portanto,
nos é visível: o que foi criado. E nesse estudo precisamos nos perguntar: toda a criação segue
propósitos ou simplesmente cria? O exemplo do parto pode nos ajudar a refletir um pouco sobre
qual deve ser a idéia da criação divina. O ato do parto é somente um caso isolado de um processo
que possui seus estágios anteriores e que, portanto, devem ser levados em consideração. Desde a
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concepção, passando pela gestação, o parto simboliza algo grandioso: a perpetuação da espécie.
Sem este trabalho magnífico da natureza não estaríamos aqui confabulando sobre nada, pois
simplesmente não existiríamos. Apesar de parecer banal falar sobre isto, no dia-a-dia não
paramos para pensar no óbvio. Afinal, a metafísica criou tanto orgulho em nós que nos fez
pensar que somos exclusividade no/do mundo. Apesar de possuirmos uma inteligência superior
a outros seres, confundimos essa superioridade, em nível cognitivo, com a superioridade de
poder e "invencibilidade", oriunda do desenvolvimento das relações humanas no decorrer de
nossa história. Ou seja, estamos no topo do ranking da criação. Mas nos esquecemos de que, ao
nascer, a criança é completamente indefesa e depende integralmente dos cuidados dos pais.
Diferentemente de outros animais, que se desprendem da mãe assim que nascem, mas que não
se desvinculam completamente dela. Ou seja, não somos os melhores! Somos apenas mais um
elemento deste complexo mundo.
Quando se admite que a criação do universo e de todas as coisas seguiu um plano perfeito
e muito bem projetado, me vem à cabeça a idéia de que este plano foi prévio e que propósitos
foram atribuídos à cada elemento criado. Além disso, fico curioso em saber se existe uma relação
simbiótica e sinérgica entre estes elementos, já que cada um deles possui qualidades e propósitos
específicos. A pergunta é: houve um plano na construção do universo? Nesta criação, o sujeito
criador designou um propósito à cada objeto criado? Admitir um propósito nesta criação
subentende uma ordem preestabelecida com funções predeterminadas. Tudo precisa se encaixar
muito bem para que a existência das coisas tenha sentido lógico.
O homem, ao dar sentido à existência das coisas e a sua própria, não se colocaria em
segundo plano neste complexo jogo. O propósito de toda criação, ao que me parece, não tem
sentido algum sem a existência humana. Perceba só como muitos elementos da natureza
parecem terem sido feitos exclusivamente para os humanos. O ar, a luz, a água, o calor, as
plantas, os animais, a reprodução... são todos atributos "dados" - à natureza (pelo criador) e pela
natureza (ao homem) - que possuem relações vitais com a nossa existência. Mas que engraçado!
O homem - criatura, objeto criado - parece se colocar no lugar de Deus - sujeito criador - ao dar
propósito aos objetos, quando pensa que tudo existe para estar à sua disposição e a seu bel
prazer. Pelas palavras do pastor Silas Malafaia: "... O homem é o único ser capaz de
relacionar-se com o seu Criador de forma inteligente. Somos a obra-prima de Deus. Somos a
coroa da criação. Nossa origem é divina. Nosso destino é a glória. Fomos criados para
glorificar a Deus sempre!"... “Há várias implicações do fato de o homem ser uma criatura de
Deus. Os seres humanos não têm existência independente, ou seja, ele é um ser dependente de
Deus. Sem o Criador, não haveria homem. O homem não se gerou no princípio nem é auto
existente. Somente Deus é auto existente. Ele nunca foi criado. Ele sempre existiu (Salmo 90.2)
...” (https://www.vitoriaemcristo.org/noticia/242/o-proposito-da-criacao).
Portanto, ao que parece, a figura humana é a chave lógica da criação divina do universo. É
a velha ideologia medieval geocêntrica e antropocêntrica ainda prevalecendo em pleno século 21.
Sendo assim, o propósito da criação de tudo gira em torno de nossa existência. Pois como seria
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todo resto sem nós? Eu acharia mais justo perguntar o que seria de nós se não fossem os
dinossauros!!
X- UM SENTIDO PARA EXISTIR
Durante um longo período, o método da observação
da natureza e do céu, a olho nú, era a únicaferramenta
que cabia ao homem em sua tímida busca em tentar
compreender os fenômenos que despertavam sua
curiosidade. As estrelas, o dia, a noite, o sol, a lua, o
calor, o frio, a chuva, o vento, o relâmpago, as
trovoadas, o eclipse. Numa época onde não se havia
inventado o fogo e onde grupos de caçadores e coletores
iniciavam sua extensa jornada migracional pelo globo.
Tudo era um mistério. Afinal, como chegar a conclusões
apenas observando? Mas com insistência, o homem foi
dando significado às suas primeiras abstrações, na medida que percebia a repetição de
determinadas ações da natureza. A astronomia e a matemática davam seus primeiros passos.
Todo o mistério e toda a angústia que antes controlava os sentimentos do homem ignorante,
foram aos poucos sendo substituídos pelo esclarecimento e alívio que o entendimento das causas
lhe proporcionava.
O conhecimento, pouco a pouco, dava sentido à própria existência humana. Ou seja, a cada
descoberta, o homem também se descobria. E na medida que ampliava seu saber, ele se
perguntava qual era seu papel na própria natureza que o criou. Dos primeiros conhecimentos,
foram surgindo as primeiras especulações a respeito do como e por quê o homem e tudo mais
existiam. Mas a curiosidade humana não se contentava só com aquilo que via. Já tendo
conquistado um nível cognitivo que o tornou destacado dos animais, o homem começou a se
perguntar o que ou quem poderia ter criado tudo isso. Os enigmas da natureza não eram mais
simplesmente os objetos a serem desvendados pela investigação observacional. Estes enigmas,
agora, se transformaram numa fonte de especulações imaginativas, pois na medida que o
homem se descobria, ia tomando consciência de suas limitações, sendo uma delas a sua finitude.
A natureza, de um lugar primário, fonte das descobertas e do sustento humanos e, portanto,
cumprindo seu papel fundamental na manutenção da vida, se tornou um lugar secundário, pois
agora o homem busca um sentido existencial que a nua e crua realidade da natureza não lhe
pode oferecer mais.
O homem começa a encarar dilemas que precisam ser enfrentados e que aliviem suas dores
existenciais. E para enfrentar seus medos, foi necessário criar respostas que fortaleceriam sua
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posição enquanto ser dominante na Terra. Mas isso precisava ser endossado por uma força
sobrenatural e selado um vínculo entre estes dois mundos. Uma relação de poder foi estabelecida
com a criação do divino e, ao que tudo indica, as relações de poder entre os humanos possui
fortes ligações com a criação primeira. Ou seja, a crença humana em seres mitológicos tem muito
a ver com as relações hierárquicas de poder na constituição de sociedades mais organizadas e
tem, na figura divina, o símbolo de justiça que serve para justificar as injustiças do homem.
Buscar um sentido para a nossa existência. Esta tem sido a lógica de toda a crença
metafísica. Projetar algo maior do que nós, que domine todas as forças da natureza e a nós
mesmos. De alguma maneira e em algum momento foi imposta a nós a idéia de que somos
frágeis e que sem um referencial maior, nossas vidas não teriam sentido. A graça divina nos
enche de esperança e norteia nossas vidas. Sem o ar dessa graça, tudo é desgraça. Perdemos o
rumo da vida. Não há razão para viver. Questionar e duvidar disso, portanto, é um pecado
criminoso imperdoável. İmaginar que um vazio existencial preencheria nossas vidas caso não
tivéssemos algo supremo em que se apoiar, é praticamente nos tornar escravos de nossa
ignorância. Faça uma experiência: tente ficar numa sala grande e vazia. Peça a alguém pra te
deixar no meio desta sala e peça para que apague a luz. Você está de olho aberto, mas vê
somente a escuridão como se estivesse de olhos fechados. E o pânico toma conta quando você
procura a saída ou o interruptor, mas não encontra nada porque você nunca tinha entrado neste
lugar. A metafísica é isso: enxergar a luz de olhos fechados e ver a escuridão de
olhos abertos. Enxergar a luz de olhos fechados seria: desperdiçar as oportunidades que o
mundo real lhe oferece e mesmo assim insistir em continuar acreditando em contos fantásticos.
Por mais que você tenha olhos e veja as coisas, você é guiado por premissas dogmáticas que o
tornam convicto de um mundo de fantasia. Você convive COM o mundo mas parece não conviver
NO mundo; e ver a escuridão de olhos abertos seria: considerar como natural viver numa imensa
bolha criada pela imaginação, ao mesmo tempo que vive no mundo real.
Tanto um como outro nos tornam incapazes de ver o mundo como deve ser visto: através
da beleza de suas imperfeições. Em suma: você fecha os olhos para um mundo iluminado em
riquezas diversas, cheio de informações já descobertas e a serem descobertas, mas quando
decide abrir os olhos já é tarde demais, pois você já está mergulhado e contaminado na escuridão
de um mundo fictício, cheio de verdades prontas e absolutas que só servem para agradar o que
lhe convém.
XI- EM QUE(M) ACREDİTAR?
Apesar de tantas observações e descobertas
científicas, ainda vivemos numa sociedade onde o
obscurantismo de idéias leva simplesmente à
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crença em dogmas ao invés de estimular a busca pelo saber. Teleólogos contemporâneos se
utilizam das descobertas científicas para afirmarem, com suas lógicas capciosas, a existência do
divino criador. “Eu não quero acreditar, eu quero saber”, resume bem Carl Sagan nesta frase tão
simples. Mas apesar das divergências de idéias, a curiosidade desperta à todos igualmente.
Buscamos dar sentido ao desconhecido. Mas só existem dois rumos a serem tomados a partir da
curiosidade comum: o primeiro será a construção de personagens épicos que possuem poderes
que o homem, limitado e finito, gostaria de possuir. o homem, portanto, terceiriza os poderes
que não tem à uma entidade sobrenatural.
Há um criador de tudo que possui habilidades que todo homem sonha em ter: ele criou tudo,
governa a todos, vê tudo, sabe de tudo, sempre existiu e sempre existirá. É o olho que tudo vê. O
criador (o homem) se transforma em criatura e a criatura (o divino), inicialmente personificada
como projeção humana, se transforma em criador. E uma ordem dialética se estabelece a partir
deste momento: criador e criatura invertem os papéis e formam um par indestrutível. A tese se
fecha, não permitindo sua análise e muito menos sua síntese. Por isso que questionar Deus é
quase um crime. É como já dizia Ludwig Feuerbach: “ a consciência de deus é a consciência que
o homem tem de si mesmo, o conhecimento de Deus o conhecimento que o homem tem de si
mesmo… a religião é uma revelação solene das preciosidades ocultas do homem, a confissão
dos seus mais íntimos pensamentos, a manifestação pública dos seus segredos de amor…” (L.
Feuerbach em “ A essência do cristianismo”).
Observe só como o homem, sabendo de suas limitações terrenas e de seu trágico fim (a
morte), projeta para fora de si uma entidade cujos poderes ilimitados refletem aquilo que ele
mesmo gostaria de ser e fazer. Este grande ser, ora uma luz ora um super-homem, que castiga
com “mãos” de ferro. Pai do ocultismo de inúmeras manifestações religiosas espalhadas pelo
globo, está em todos os lugares ao mesmo tempo, como infinitas partículas em emaranhado
quântico. Seu poder e sabedoria, por si só, encerra toda a possibilidade de construção e
reprodução do saber, oferecendo uma resposta única e simples para tudo e limitando a
capacidade e o progresso humanos.
Lembro-me bem de um episódio conhecido que foi a queima da biblioteca de Alexandria
no séc. IV, a maior biblioteca da antiguidade. Uma forte perseguição da igreja foi feita ao
considerar como heresia e obra do maligno tudo aquilo que fugia de seus dogmas. Cristãos
alucinados e seduzidos pelos dogmas ortodoxos de uma igreja católica em ascensão, destruíram
um acervo impressionante contendo descobrimentos científicos valiosíssimos para a época, além
de assuntos ligados à ufologia. Destruídos os autores e suas obras, somente séculos depois, no
período renascentista, que ressurgem novos pesquisadores e a ciência retoma seu rumo natural.
Um adendo: os cristãos, de perseguidos pelo império romano, se tornaram perseguidores
tempos depois. Esta postura, por si só, já nos mostra o quanto esta vertente religiosa é
equivocada e perigosa ao impor as mesmas práticas que sofreram. As provas disso se encontram
entre os distintos períodos históricos e são muito bem conhecidas, a exemplo da santa
inquisição. Séculos depois, mesmo com o avanço da democracia na constituição das repúblicas,
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continua sendo um desafio para algumas nações manterem sua laicidade. Em países com muitos
cristãos, como é o caso do Brasil, políticos charlatões sempre ameaçam a democracia ao
sonharem com um governo teocrático, limpando as "sujeiras" dos outros enquanto escondem as
suas.
Mas por azar do destino, nobres homens de bom senso usam seus milhões de neurônios
disponíveis para explorar o ambiente a sua volta, desbravando e desafiando os limites do
conhecimento. E escolhem o segundo rumo, o da libertação que os liberta dos grilhões dos
pensamentos prontos e acabados. Cumprem um papel que muitos poderiam estar cumprindo,
desenvolvendo novas idéias fundamentadas que contribuam com o crescimento humano. Se não
fossem os dogmas, provavelmente Hipátia de Alexandria não seria linchada e escalpelada até a
morte. E séculos depois, Giordano Bruno não seria queimado na fogueira. São épocas distintas
que me trazem preocupação e me obriga a concluir que enquanto existir o cristianismo, haverá
sempre o risco de re-vivermos as trevas de suas insanidades.
A busca do conhecimento deve ser exaltada sem o medo de que isso possa descolorir o
sentido da existência. Aquele que busca desafiar os limites do conhecimento, além de praticar
suas mais elevadas virtudes, deve encontrar um caminho espiritual que tenha sentido naquilo
em que ele se dedica. É como uma boa música tocada por um bom músico. Se para o ouvinte é
agradável ouvi-la, imagine para quem está tocando! Quem vos escreve este artigo é um músico e
digo que a música me proporciona um prazer tão grande que a considero minha religião. E seria
muito desconfortável para mim, ter que me enquadrar em dogmas ultrapassados e
padronizados, impostos por um senso comum antiquado e monoteísta, que ainda não encontrou
um sentido real em suas vidas a não ser reproduzir cegamente bordões das escrituras, só para o
conforto de um ego que busca dar sentido a sua existência somente se a morte significar a
continuação da vida ao lado do criador.
O egocentrismo faz com que a fé em dogmas seja tão superestimada, que se corre o sério
risco de subestimar e desvalorizar aquilo que, cegamente, os dogmas não o fazem enxergar. E
deste egocentrismo característico do homem ignorante, surgem o orgulho, a intolerância e o
desprezo por tudo aquilo que seja diferente do que ele vê através da sombra no fundo da sua
caverna. O conhecimento do real também pode nos dar prazer sem que sejam necessárias
histórias metafóricas ou parábolas surpreendentes. Não há nenhum problema em
vislumbrarmos a complexidade da matéria a qual fazemos parte e reconhecer todo o esforço
incessante daqueles que buscam entendê-la cada vez mais.
XII- CONCLUSÃO
Tudo o que existe nos parece complexo demais para ser obra do acaso. Mas o “acaso” da
natureza não é como tentam deturpar. É necessário condená-lo para endossar a tese de que um
arquiteto planejou, projetou e executou tudo, na mais perfeita ordem. A natureza é muito
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mais complexa do que nossos pensamentos e do que achamos sobre ela. As forças
que interagem entre os corpos, tanto os grandes quanto as menores partículas, são provas que
não podemos falar indiscriminadamente que tudo é o acaso. O acaso subentende desordem,
caos. E parece inadmissível para muitos aceitar esta idéia que, na verdade, é uma ideia parcial.
Deve- se observar o contexto das coisas, sua totalidade, e entender que o acaso tem seus
momentos de ordem. Da mesma maneira, a ordem tem seus momentos de desordem, de caos,
proveniente do acaso. A natureza está sempre intercalando estes dois momentos. Ela possui o
incrível poder de compor, decompor e recompor a matéria de modo tão magistral que há sempre
uma nova informação neste ciclo, ou melhor dizendo, nesta espiral evolutiva. É por isso que
dizemos que tudo evolui e se transforma, porque são nestes arranjos e re-arranjos onde a
matéria se reinventa e a natureza vai se tornando mais complexa e ainda mais distante de nossa
compreensão real.
Toda a ordem que vemos hoje é estruturada pela correlação de várias forças invisíveis que
levaram muito tempo até chegarem ao seu equilíbrio de ações. Mas este equilíbrio é só na
aparência. Já sabemos que o movimento está no equilíbrio e vice versa. E por mais que algo
aparente estar em equilíbrio, em algum momento, nem que demore milhões ou bilhões de anos,
ele será rompido, acarretando profundas transformações e criando novas situações de equilíbrio
relativo. Toda a ordem e equilíbrio do universo passam por diversas situações de desordem e
desequilíbrio no decorrer de um processo. Quando vemos os planetas e o sol já formados,
esquecemos que coisas horríveis ocorreram para eles chegarem na situação em que se encontram
atualmente. Da formação de uma estrela até a constituição de um sistema composto de sol e
planetas, fácil não foi! Mesmo assim, neste suposto equilíbrio que hoje impera em nosso sistema
solar, muitas coisas continuam acontecendo sem parar para que haja o equilíbrio.
Imagine o sol em guerra consigo mesmo 24h por dia, incessantemente produzindo gás
hélio por fusão nuclear e liberando quantidades de energia tão grandes capazes de irradiar luz a
150 milhões de quilômetros até chegar em nosso planeta! Imagine nosso planeta ter que ficar
24h ininterruptamente girando em torno de si mesmo numa velocidade linear de ± 1.675
quilômetros por hora! Eu, sinceramente, acho isso espetacular!
É plenamente possível encontrarmos a felicidade e enfrentarmos nossos medos através da
compreensão das reais causas das coisas. A verdadeira libertação da humanidade só será
atingida quando houver um amplo combate a todas as idéias que possam, de alguma maneira,
aprisionar o pensamento dos homens, de modo a mantê-los subservientes à padrões impostos
que nada mais são do que formas de dominação e exploração alheias. As idéias metafísicas, de
um modo geral, limitam a consciência e alimentam uma ignorância necessária ao domínio
cultural sobre categorias sociais economicamente desprivilegiadas. E esta contradição só terá
solução quando os privilégios forem extintos.
Imagine aqui comigo: por mais que um indivíduo tenha boas intenções ao se envolver
numa crença qualquer, isso não exclui o fato desta crença se tornar uma doutrina e ampliar sua
influência, exercendo um controle social e correndo sérios riscos de distorcer verdades,
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prejudicando a solução de determinados problemas que exigem um olhar acurado e isento de
crenças e superstições. Verdade ou não?
A ideia da criação divina de todas as coisas não é uma idéia ruim, na medida em que o
homem não seja egocêntrico o suficiente em dizer que somos a imagem e semelhança do criador.
São afirmações como esta que enchem o ego do homem, que se torna autoritário e comete
diversas arbitrariedades. Tudo em "nome de Deus!! Pois imagine se um dia descobrirmos vida
em outro planeta, ou se outros seres inteligentes nos descobrirem? Tudo é possível neste
universo tão vasto e absurdamente grande, de bilhões e bilhões de estrelas, planetas e sistemas
solares. Só é preciso reunir algumas condições para que se tenha a vida mais simples e que a
partir daí ela siga seu caminho evolutivo natural. Enxergue a beleza da vida como um todo, sem
o temor de acreditar que foi o nosso glorioso Sol o responsável disso tudo.
Enfim, o que pretendo aqui é basicamente mostrar um contraponto entre a visão
científica e a visão deturpada dela, representada pela metafísica. E nesta busca pelo sentido da
vida eu encontro, na riqueza do meu planeta e na vastidão do universo, todas as razões deste
meu existir. Particularmente eu não vejo a ciência como algo que leve o ser humano à uma frieza
de espírito e a uma alma vazia descrente de tudo. Há uma tendência natural em nós de buscar
referências e sentido nas coisas. A ciência é só um resultado do esforço humano em encontrar as
respostas certas, porque somente assim as soluções dos problemas podem ser dadas. E na
medida que a ciência vai elevando nosso nível de conhecimento, também eleva nossa
consciência, facilitando, por exemplo, que alguém escolha um caminho diferente dos padrões
calejados que as religiões pregam. Neste sentido, confesso minha escolha pelo ateísmo, porém
não me considero um descrente de tudo. Eu busco um sentido real das coisas sem que isso perca
a magia, por mais dura que a realidade seja. E principalmente em meu dia-a-dia, eu tento buscar
sentido no que faço, seja no trabalho, nos estudos ou na arte. Esta busca tem o objetivo de criar
elos, de forma que eu estabeleça ligações fortes com o que faço, me proporcionando prazer e bem
estar. Na minha opinião, esta é uma forma bem diferente que eu encontrei para me libertar dos
padrões.
No mais, só tenho a dizer que é a primeira vez que um autodidata como eu escreve um
textão desses, bem maior e mais maduro do que o original, expondo minhas idéias de como vejo
o mundo e todo o universo. Mas que, modestamente, deseja a todos uma reflexão sobre o que foi
abordado.
Um grande abraço!
O que sabemos é uma gota
O que ignoramos é um oceano.
- Isaac Newton
FIM
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