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Enrolação_ Grossi, o Antigo (2023, Contos, 2a Ed)_

As discórdias amorosas, o uso de drogas e a violência não são a base dessa enrolação? E traição, morte, prazer? ENROLAÇÃO, 2ª Edição corrigida e ampliada 2011,13, 2017 © 2023 Grossi, o antigo

As discórdias amorosas, o uso de drogas e a violência não são a base dessa enrolação? E traição, morte, prazer?
ENROLAÇÃO, 2ª Edição corrigida e ampliada
2011,13, 2017 © 2023 Grossi, o antigo

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Enrolação


ENROLAÇÃO, 2ª Edição corrigida e ampliada

2011,13, 2017 © 2023 Grossi, o antigo

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Enrolação


Primeiro aviso

Mas vocês vão se perguntar, por qual motivo,

e mais ainda, mas como depois desses anos

ainda escrever sobre coisas desse tipo? Para

que uma reedição desse livro se hoje em dia

você nem sequer acredita e compactua com

essas situações? As discórdias amorosas, o

uso de drogas e a violência não são a base

dessa enrolação? E traição, morte, prazer?

Vejam, infelizmente há muita gente que

continua nessa vida, e é para esses que

endereço essa segunda edição, vinda

justamente com o intuito de enxergarem a

vida através da ótica do Bem, mesmo que

inserida na desvirtude. Isso soa estranho, com

certeza, mas para a pessoa que acha uma

existência sendo um purista ou xiita, para

esses é difícil se surpreender. Recentemente li

no livro de Hermínio C. Miranda as seguintes

palavras, que mais soam como sentenças que

avisos: Que “espíritos desarvorados partem

para a tentativa de criar um mundo à parte,

onde as leis de Deus possam ser esquecidas

ou desobedecidas, pelo menos por algum

tempo. Criado esse bolsão de rebeldia e

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Enrolação


irresponsabilidade, muitos são os que a ele

acorrem para viver a plenitude de suas paixões

e de seus desatinos. Sabem que a tentativa é

utópica e somente pode gerar mais

desacertos, em vez de atenuar os que já se

alojam, há tantos séculos, na consciência

anestesiada, mas não extinta. Mas quem irá

convencê-los de que estão apenas tentando a

impossível fuga de si mesmos?

Qual a motivação de tudo isso? Uma só, de

que o medo dá dor. Todos ali estão,

hipnotizados por uma filosofia inviável de vida,

sabem que, um dia, terão de ajustar as contas

com a harmonia cósmica perturbada, mas,

pelo menos enquanto estão ali, vivem suas

fantasias e alienações. Sabem perfeitamente

bem que o território da paz vai ficando cada

vez mais distante e de difícil acesso.” “Fomos

valentes para errar — acrescenta —, mas somos

covardes para enfrentar as consequências do

erro.” “Há, pois, um perigoso desequilíbrio de

forças que se opõem, uma vez que a maioria

ainda está do lado negativo, puxando a corda

com a força de seus temores e o empuxo

daquelas paixões negativas.” Viram como ele

ilustrou muito melhor que eu?

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Enrolação


Segundas

Boa parte do texto original de 2017 foi

mantido, entendendo que o que foi dito não

pode ser desfeito. Mas atenção! Esta é uma

obra imoral e displicente, leia e descarte logo

em seguida, ficando apenas com a impressão

do que não fazer. É uma brincadeira de estilo

e mal gosto, nada que valha como uma obrachave

ou coletânea.

Apresenta raras historietas de casais

emaranhados em situações banalizadas pela

sociedade então vigente (XX para o XXI) mas

nada dignas de riso. Ou só casos mesmo!

Uma segunda edição recomposta foi pedida

para que o leitor ou leitora em tamanha

curiosidade pela vida alheia veja como são

essas versões diferentes do que acontece por

aí, como dizem, e que para tudo há um outro

ponto de vista. Vejam, não imitem!

Então voltamos a esse mundo, muito mais

inseridos em nomes e personalidades

conflitantes; populares aos contos, e ainda

munidos de outros textos inéditos. Melhor

perdoar seus olhos, já estão testemunhando.

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Enrolação


Prévia #7

~(p^q) ou só ≠ (Sentença matemática) #11

E diário achado, #21

Foto realista demais #34

Dona #38

“Elevadora” #45

Funk das Pombita #47

Rogerin ou o destino, história oriemental #53

Gato e rato! #61

Luz verde no quarto escuro #67

Tião Bocanegra #78

Fogo #108

Incipt ou Ligações profundas #113

Conversa de zap com a Maluca #114

Razão de sexo #120

Racha, miniroteiro #122

Março fechado #124

Pé na porta #125

Te falar, vi Inês #126

A volta da outra, a Marie #133

Que uma nova paixão não possa levar #135

Cada dia é uma eternidade #141

Propriedades (Poema) #144

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Enrolação


Prévia

Era quinta. Bruno chamou Tito num papo torto

de alugar uma tal de casa na praia para fazer

umas sujeiras loucas! Disse, rindo ainda:

— Casa de praia, doido!!!! Levamos as mulé pra

lá e uhhrrú!

— Hahahahahah, entendi.

— Fechamos o negócio. Pega o carro, vai atrás

delas, que eu chego com a breja!

Sábado todos já estão felizes pela sala de estar

da tal casa de praia alugada a papear sem

muito compromisso. Assim, as vozes

entrelaçam-se em ‘inusitadas’ historietas, olho

no olho:

Bruno fala para a Juliana, explicando o que

seria Strip Poker:

— Bem devagar, é, assim... a parada com tua

mulher??

— Esquece isso, se liga: gosto mesmo é de ver

minha esposa acossada por um rapaz,

rebolando, gosto do rapaz; um homem

peludo roçando saliente a presa, a coitada

suspira. Tem mordidas, beliscões, açoites, a

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Enrolação


porrada comendo, eu só olhando. Sinto o

odor de sexo exalado pelos dois. O rapaz diria

“Seu descarado, hahah.”

— Que isso, hihihih, cê é biruta

— Relaxa, minha liberdade é minha força.

Depois, Cristiane fala para Margarettte, após

prestar atenção ao que disse Bruno:

— ELE QUIS É ME PROVOCAR PELO BATE-

PAPO VIRTUAL!!!

— Ah é!!!!! Que nem “desafio intelectual”!??

— Aham, e escreveu que “gosta eh d fuder um

suvaco bem macio, ow”

— Hahahahah, que isso, que absurdo! E eu

gosto é de vibradores e consolos, sendo

assim, essas coisinhas.

— Ou beltrana tem a xonga quente! Que tal???

— Chat no trabalho é foda, parece mais um

antro de sedução, traição... esses ‘ãos’ por

todo lado.

— O certo é que conseguiu me atiçar!

— Nem precisava tanto, convenhamos.

Nisso, Cotinha fala da vizinha para Juliana no

exato momento em que alguém liga o som:

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Enrolação


— Eles são esquisitos.

— UM MISTÉRIO DA HUMANIDADE. — Pensa e

pronuncia alto a Juliana.

— Pois é. A beata uiva “ui, ai, hu, ã, ã, ã, iírãrãã”

e relincha!

— Cruuuuuzes, eita nóis.!!!!!

— Como será a foda dos evangélicos? De

verdade. Elas, ou eles, quem sabe, dão o

brioco?

— É bem provável, né burra! Daí o maridão tem

que dizer pra beata: “Não enche, mulé, volta

logo pro leito do amor!”

— E toba nela!

— É o esperado — completa a dócil Juliana.

E então Cristiane continua enchendo a cabeça

de Margarette com suas peripécias:

— Me comeu feito um bicho no cio, aquele

filho-da-puta gostoso!

— E você, o que fez?

— Me amarrei, claro!!!!!

Por fim, Bruno fala a Tito, relembrando os

encantos de uma das ex-namoradas:

— Tão fácil ela. Eu gozava dentro, e a danada

se agitava toda, se sentia realizada.

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Enrolação


— Assim é sexo, pourra!

— Sim.... era uma grande mulher, uma fêmea

genuína, sim, sim!

— Vou comprar um maço de cigarros.... — Tito

responde, ainda sorrindo, levantando-se.

— Tito, meu caro, nunca esqueça..... a

personalidade de uma grande mulher é mais

valiosa até do que sua beleza exterior.

Diante disso, ali se dão conta de que as coisas

foram enxergadas com mais clareza, sim,

aquela última frase fez com que todos se

entreolhassem sentindo o futuro, tão logo se

despissem do que eram.

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Enrolação


~(p^q) ou só ≠ (Sentença matemática)

“Não somos loucos, somos médicos maravilhosos,

conhecemos a dosagem da alma, da

sensibilidade, da medula, do pensamento. Que

nos deixem em paz, que deixem os doentes em

paz, nada pedimos aos homens, só queremos o

alívio das nossas dores.”

(Antonin Artaud, ‘Segurança Pública,

A liquidação do Ópio’)

Agora prestem atenção, pois é diferente. Este

encontro é de duas histórias, uma dentro da

outra e um desfecho comum, tá bom?

Acredito que esteja bem. Foi o Narrador aqui

que ‘tomei, pô’, as rédeas de tudo! Porque eu

sou um pouco dele e dela! Vamos lá, falemos

destes jovens exemplos do nosso Tempo

condenado à reclamação, juntos vítimas para

suportarem as Estações. O desabafo tem que

ser um longo diálogo! Mas nem tanto, pois

estamos gordos e nonsenseados pelas duras

leituras! É só assim que é obtido o resultado

final. É... tá chegando A PARTE FINAL DAS

COISAS DESTAS VIDAS. É belo poder contar.

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Enrolação


Você, que prestou atenção aos detalhes da

vida, você, caro leitor, saberá. Meu nome é

Paulo Vitor Grossi, e vou como seu orador.

Espero que estejam à vontade.

Estão os dois protagonistas, chamaremos de

“Vicensi” & “Julia” num bar do começo da Rua

Voluntários da Pátria, Botafogo. É abril. É o

desespero humano Artaudiano revisado!!!

Ela atende ao celular, discute com Larissa, a

‘Ex’, imagina! e desliga. De histérica, passou a

exaltadinha. Ele logo após chega

desapercebido — voltando duma imobiliária —

incrivelmente, ganha a vida com isso! Não

sabe de nada, tá meio alto, procurando o que

fazer. Pede uma cerveja, olha pra ver se tem

alguém reconhecível e afunda-se na leitura

duma revista em quadrinhos qualquer. Mas

ela já estava lá, Juliando o ambiente.

“Larissa”, Julia pensa, “Que se pííí!!*** a La-risas.”

Lera o e-mail que enviou a Larissa.... e ficou

irritadinha. A própria cara avermelhada dela

deu pista. Vicensi à toa e de olhos paralisados

embaçados. A princípio, ambos seriam

apenas solteiros. Estes dois não sabem — ou

não deveriam — que o Destino lhes reserva um

acaso. É esquisito? Vicensi tinha reparado

nela. É bonita, simples mas sensual. Não

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Enrolação


retocada, sabe?! Ele olha, para, toma

coragem, puxa uma cadeira e senta de frente

— isso, sim, foi uma maratona física e mental.

Entretanto, era como se algo o impelisse a

fazer isso. Quem sabe do Vicensi entende que

esse ato não foi ensaiado, foi cuspido e inusual

em sua biografia. Mas será que vocês o

conhecem? Pensem num cara tranquilo, terão

uma ideia.

Instantes rápidos. Isso é um bar, daqueles com

cadeiras pra rua, típicos da Zona Sul do Rio de

Janeiro. Pessoas e mesas com mais pessoas

paquerando e pela bebida alegrando-se.

Amigos, conhecidos, gentes, universitários,

vagabundos, sustentados pela mãe,

periguetes, passantes e também outros

ocasionais saídos dos vários cinemas, além de

turistas, moradores dos prédios de cima,

enfim, “O Point”, a Voluntários! Pois nas

conversas nos botequins de aqui, todo mundo

se acha Nietzche e Freud, como na lembrança

duma música, como o apartamento e o

conforto próprio que tu não teve, até aqui!

Aliás, esse Nitz, diz-se, era um fracassado

sexualmente que escrevia trequinhos legais,

ainda que não soubesse os motivos femininos;

quanto ao Fróidi, heh, pobre, já vai

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Enrolação


ultrapassado, tanto que suas obras completas

são edições antííígas...... Enfim, chega. Vicensi

somado a Julia, temos aqui um reforçando o

outro. Julia assenta a proposta do rapaz e sorri

como que sem preocupações e aonde isso

parar. Os dois tagarelam, e não lhes cai a ficha

do que rola afora:

Coéééé. Ahhhh. Coé.— disse rápido Vicensi.

Esse teu “coé” soa meio como “eu não

acredito”. Tô certa?

Acho que é por aí, Dona Julia. Que

engraçado, notei, sei lá, tive a impressão de

que somos meio parecidos.

Que qu’eu tô fazendo aqui, genteee. Cê é

maluquinho, cara! — Falou ela, arrastada.

Nisso, chega o garçom e pergunta ao Vicensi:

Outra bebida, chefia? — Julia olha a mão do

atendente, sobre sua cabeça, vê os olhos e

paralisa-se. Ela soube na hora quem era!

Traz umas batatinhas fritas, amigo. Aliás, cadê

o Fábio Júnior? — Vicensi pede sem olhar nos

olhos do garçom.

Quem... o outro, né?, pergunta o tal garçom

da vez, que atendia por Felix.

É, o de sempre! Bato ponto aqui também,

entendeu? Gosto dum copo!!

Ah tá. Mas não, só tem eu.

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Enrolação


Qual teu sobrenome, Felix?

Protestado. Por qual motivo, posso saber?

Cê parece alguém que conheci em outro país,

mas deixa pra lá. Valeu pela ajuda, parceiro.

Naaada, brigado o senhor.

E a cena recomeça, perdendo-se no ar

mareado daquela noite, esquecem do Felix e

papeiam:

Eu te chamei? — Ela ri. Ele logo em seguida.

Mas não me expulsou, benzinho!

E não te expulsei. Corre em nossas veias o

mais puro veneno. Ih, tô bêbada!

Será que tu daria uma boa esposinha?

Calaboca e me beija — Assim falou Julia, bruta.

Quê? — Vicensi assustou-se zoando, meio

dando uma de desentendido. E pensa “Que

engraçado, notei, sei lá, tive a impressão de

que somos meio parecidos.” Mas logo se dá

conta de

EU DISSE: “CALABOCAEMEBEIJA!!”

Tá bom.

Tufi!

Dessa forma inesperada começam sua,

digamos, ‘ligação’.

Percebam, caros leitores, que adiantei o fio da

meada. Passei logo para a conversa e suas

parcas consequências. Para a ação, menos

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Enrolação


tanto discurso indireto.

Sabe, se eles estivessem zapeando de

assunto, procurando afinidades de outra

forma, cairiam no buraco da Alice maravilhosa.

Diriam que não curtem a Borboleta, e sim a

Lagarta. Que estranho seria ter um ímã de

sensações e não conseguir libertar-se da tal

SOLIDÃO. Julia catuca as ideias com

pensamentos. E o álcool dá um

empurrãozinho: “Há quanto tempo eu não

tenho um orgasmo de verdade? Por que não?”

Por fim, é Vicensi pensando também: “É

gostosa, tem cara de... sei lá... VIVA.” Enfim,

entendam que quero enfatizar esta pequena

derradeira, este capítulo rápido, ao som que

reverbera do ‘Tufi!’. Eles atravessam o círculo.

Se você tivesse o x da questão, não o usaria?

Parece que os dois já se conhecem desde o

tufi, a partir dele, no momento em que

aconteceu, ou aprenderam rápido pacas.

Tirem as próprias conclusões. Nas

imaginações, o intuito duma relação onde não

há namorados, apenas ficantes que estão bem

um com o outro no momento, nos momentos

juntos. E só. Podemos trampar com hipóteses?

Então. Sem ciúmes, sem um trato chato,

apenas a diversão. Amantes da noite, das

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Enrolação


possíveis festas. Uma vida onde reinasse

ousadia, fantasia, tranquilidade. Onde

celulites, cotidiano, risos e barriga fossem

descartáveis e motivos de chacotas.

Confidências? “Nós não temos”, diriam. “Bom,

só algumas”, responderiam. Mas nada que

impeça. “Eu tenho algo pra falar, pois EXISTO

e sei disso”, citaria Julia. “Não há temor de

causa ou efeito, compreende?! Quero tempo

pra mim, e um tempo pro outro”, deviam. Ah,

tanto poder dormir num quarto de cama

confortável e quentinha onde reinasse o mais

completo silêncio absoluto e descansar

olheiras na escuridão... ou rir! E se der

vontade, sair pra tomar um café, ou jantar

numa pensão ou mesmo transar dois dias e

sorrir. Pela madrugada, veriam o Corujão, ou

algo parecido... dos refugos da noite, dos

desesperados, dos ociosos. Nós três: Vicensi,

Julia e o narrador aqui, citando o fato da

situação ser tão intimista ao mesmo que

normal. Só as vidas importam.

É a faca e o queijo na mão, a dualidade ou o

destino. Quem sabe???

Olha só eu, pobre narrador. Perguntando

“quem sabe???” Quem sabe quem percebeu

que basta um detalhe. Não um daquêêles,

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Enrolação


mas um. Entretanto, garanto que nem são

somente as duas vozes anteriores que habitam

‘a casa’. Dá a entender onde terminariam

nossos dois heróis perdidos ou onde DEVERIA

‘‘ACONTECER’’. Ele, “Vicensi”, tinha que

aceitar aquela situação e tirar proveito

somente. Ela, Julia, ah Julia, ela precisa fazer,

mesmo que só pra saber que estava errada...

Porém, que seria do amor sem perdas? Essa

pergunta vai para Vicensi, Julia, Larissa, Felix,

e todos mais que compreendem.

Sei que interfiro. Falo de pessoas que ainda

não estão na época de relembrar histórias

com os amigos, mas sim pra criá-las! São

jovens. Começam seus erros. Indivíduos da

época de zero e zero. Eu sou jovem, narrador

também pode ser jovem!! Tá tudo à frente.

Sintam o desfecho:

Talvez não percebam o garçom contente ao

contemplar seu trabalho, por assim dizer.

Interferir ajuda! Ele fita munido de seus belos

olhos amêndoas tipo gato. Sabe que geriu a

feitura duma nova substância a partir deste

químico encontro. Sensação e pensamento

lado a lado franco atirando-se, frustrações e

promessas no sábado de aleluia! A nova

solução fisiológica pra atenuar nosso futuro

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Enrolação


apocalíptico enquanto viventes. É

folgadamente investigando o espírito

humano! Porquês!!

Depois:

Então, eu tenho uma coisa lá em casa

Ei, ei, epaa! Já me convida dessa forma?

Sou educado, poxa.

Tudo bem, tô acostumada.

Tu acha mesmo que eu perderia a

oportunidade? — Franziu este “Vicensi”.

Nem deveria — Responde Julia, politímida.

Tá, mas você deve, aliás, deve não, VAI SABER

O QUE É!

Na tua casinha? Eu já sei.

E tu?! A voz da mulher é tão bela quando

preenche todas as ações...

Doidinho! E se não der certo isso de fi-car? —

Indaga ela.

Ô, eu preciso repetir?...

Siiimnn, bobinho.. — Respondeu Julia, a Faca.

A GENTE SE ENCONTROU, E DAÍ? —

Respondeu Julia, de novo, como sempre. Tá

bom, a gente se encontrou, e daí?

Ei, já ouviu falar em ...? — Vicensi perguntou

meio que subitamente alegrando-se.

Ãh??? — Assustou-se Julia.

Que posso fazer além de rir? — Logo continua:

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Enrolação


Calaboca e me beija! — Foi o que decidiu o

“Queijo”.

E beijaram-se. Os dois. Feito. Que tal? E daí???

A faca e o queijo, utilizados.

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Enrolação


E diário achado,

Eu era uma menina novamente. Solitária e

ainda em uma casa velha e úmida, de madeira

despedaçando — como uma tipo de campo.

Havia uma mulher de, deixa eu ver,

aproximadamente uns 40 anos, ela que

cuidava de mim como uma tutora. E sempre

me dizia para ficar por perto, perto dela, que

saco!.... e também junto de um grupo, não sei,

obscuro, era uma coisa muito sinistra — uns

homens sujos, com seus lençóis pretos, tipo

mendigos que, reunidos, gozavam e jogavam

algo incompreensível. Não era da minha

conta. Parecia cerimônia antiga, vai saber.

Bem, continuando, essa tal mulher estava

muitas vezes ocupadinha com eles. Nem

perguntem como! Dava umas sumidas.

Quando ela se distraía, eu fugia — eu também

gostava de fingir. Meu motivo era esse. Todo

o resto, disfarce, meu carnaval idealizado, isso!

Fingia meio criança, meio mulher, meio tudo.

Quem pode me julgar? O que você vai fazer a

respeito?? Então, silêncio, a história segue.

Corria para o quintal, um terreno grande,

varias saídas. Era casa, quintal, rua, hunnf, pois

21

Enrolação


é, essa rua que eu não via, acho que já falei

dela. Esquece a rua, tinha uma trilha — fixa

trilha, partindo da casa. Aliás, acabava na porta

lateral da casa, entre arbustos que não

inspiravam medo. Enfim! Eu corria por lá e ia

olhar toda aquela paisagem, às vezes. Que

quintal tranquilo, várias árvores e muitos

arbustos, imagina algum lago muito raso e

transparente, a visão era boa — um pouco

parecido com pântano, mas não era agressivo,

vegetação fértil. Era é mágico, tinha lá seus

muitos peixes, lagartos, tartarugas, cobras e

outras criaturas que não consigo esboçar.

Alguns até voavam, é mesmo!! Mas não

investiam contra mim. Sabe, eu era uma

observadora. Era melhor daquele jeito,

simplesmente não funcionaria de outra forma.

Muito belo, como um lago de filme, poxa, a

era dos dinossauros, desses bonitões de fora

que nos fazem viajar sei lá pra onde — muitas

lembranças, pelo menos eu me sentia bem

nesse plano, a sensação do ambiente, nem

tem como explicar, suas verdades não devem

a ninguém. Me realizo! Água sem revolução,

lago cortado por trilhas já gastas, flores,

plantas e um gramado meio, pô, tapete. O

horizonte, eu não conseguia ver, somente

22

Enrolação


entendia que era estilo azulado, fundo

estático, duro, mas não ameaçador. Normal,

né.

Bem, ao que parece, o quintal era mesmo um

refúgio onde podia me sentir outra. Eu andava

de um lado para o outro, sempre me

divertindo, ainda que preocupada com a

mulher que cuidava de mim, se ela

aparecesse, a qualquer momento ela poderia

me chamar e estragar toda aquela felicidade —

ou calmaria, não sei dizer ao certo, de

verdade. Desculpa, acontece que era tudo ao

mesmo tempo, as lembranças, tudo numa luta

truncada.

Chega a hora, ela me chama — huuunnf, na

verdade, grita alto pra quem quiser ouvir! E eu

corro pela trilha e vou transbordando

ingenuidade. Já não tinha mais o que fazer. Ela

está um tanto quanto zangada e me diz para

entrar na residência, essa a palavra. Tudo era

estranho, mesmo assim eu me desvio e fujo

direto para o final da casa, havia esse

quartinho onde essa mulher não poderia me

fazer nada. A vantagem da idade nos serve

também, não devemos reclamar por detalhes

tipo cansaço, certo? Mas, ah! no quartinho

minúsculo, só dava para ficar em pé ou de

23

Enrolação


lado; sentada só se não tivesse nojo da sujeira,

poeira e do mofo espirrento que tinha lá

naquele cubículo. Caso pensasse em fazer

greve ali até que a mulher cedesse e eu

pudesse sair pela Justiça, não conseguiria —

não havia água nem comida. Odeio essa

impressão também, faz lembrar que eu era

apenas uma menina! Nossa, precisava de uma

pausa, respirar fundo e tal (...)

— TXXÍÍC VAMOS MAIS! GRAVAÇÃO SEGUE

Ah é, então, ainda que olhando de longe, dá

pra perceber que seria uma besteira. As

janelas estavam fechadas e assim deveriam,

de verdade, ficar é eternamente, de dentro e

fora. Eu tentava destruir, quebrar de todas as

formas. Tudo em vão, era minúscula ainda,

uma pessoa que não pode argumentar como

se deve, que nunca é realmente notada.

Mesmo assim, alma alguma se sentia

intimidada pelo que fazia, apesar dos meus

esforços — usei uma pá, uma pedra e, já

desesperada, a mão. Terra preta. Não grito de

jeito algum por socorro, escapa a fala.

Que pesar, ahhh, então, abri sorrateiramente

uma fresta da porta, deu para ver se a mulher

24

Enrolação


já tinha saído. Foi meu erro! Esperando, como

uma caçadora na espreita, baita cobra, tava

aliii. Não fez barulho, nem deve ter respirado,

a víbora minhocada. Agarrou meu corpinho e

me tirou de lá de dentro. Deixou a pobrezinha

que fui.

E tem mais, mais gente envolvida. Convém

revelar, sempre leio o final primeiro! Isso sim,

bem... duas outras figuras, uma empregada

cheinha de avental e um rapaz que também

jazia com medo, mas que parecia ser filho da

porca da mulher que me pegou. Mas, e

quanto minha integridade? O que era, quem

era? Como refletir? Tudo incerteza

pechinchada. Só sabia de uma, a única

certeza, queria ir pro quintal ficar a sós comigo

mesma. Porque, ao sair, sabia que iam me

fazer algum dano.

Começamos a conversar depois de uma

pausa, eu, ela e mais outros ocasionais, um

monte de palavras à toa. Reclamavam dela, da

tutora — devia mesmo ter sido chata a vida

toda. Tinha pinta, algo de podre. Acusada

demais!

Percebemos logo que ela tinha saído da casa

e foi ficar com aquelas outras pessoas sinistras

do lado de fora. Fui a que mais estranhou, olha

25

Enrolação


só! Até agora não entendo quem eram, pois

não sabia ao certo o que faziam, nem via rosto.

Embora, entre eles, entendiam-se muito bem,

por sinal.

Enfim, depois de um descansinho, até a

empregada e o rapaz se tornaram muito

repulsivos, principalmente da parte dele. Eles

murmuravam que queriam ir com a mulher, lá

fora mas ela não deixava — não entendo de

verdade como um “ser” poderia ter esse tipo

de vontade, já que a tal mulher não queria a

presença dos dois repulsivos serviçais, nem de

mais nada. Tá bom. Vamos chamá-la de

‘Magnésia’, Magnésia de Sá de aqui por

diante. Chega de esconder certas cartas!

Assim, o rapaz começou a me enxotar da casa,

já era hora. Nós discutimos, e eu falei algo que

não gostou, pra variar: “Você é tão igual a ela

quanto pensa, seu babaca, nunca vai sair

daqui. Sempre vai ser aturado! Usado pra

caramba!!” Triste fim de caso. Ele correu pra

me bater e eu fugi e fingi. A vida faz isso

quando perdemos o controle, eu então, ahhh.

O único lugar que sabia que ele não poderia

me pegar era no meu famigerado quartinho,

ainda que as consequências fossem óbvias.

Entrei lá rapidamente de novo e me tranquei

26

Enrolação


— não sei o porquê, mas fazer isso parecia tão

corriqueiro, esse ato. Ou talvez fosse só pra

tentar juntar os pensamentos e explicar a ele

como estávamos loucos ao brigar entre si. Só

que o idiota tenta forçar a porta, quem sabe

que passa naquela cuca!? Ainda bem que era

muito boa porta essa, ótima de ser trancada.

Aí é que ele grita, devolvendo... sempre essas

merrr***, “você sabe que vai morrer aí” ou

“sempre te odiei” Olha, essa eu não entendi

mesmo, cara, mas tudo bem, porque só me

lembro dele sendo incongruente; minhas

únicas lembranças legais eram do quintal e de

olhar a casa de longe, quando ventava e

ninguém mais proferia palavra. Todo o resto

era isso mesmo.

Depois deu pra trás, voltou e berrou

assustadoramente, tendo a força de um leão:

“Lembra do teu bichinho de estimação, o

tosco? Eu tranquei aí! Agora ele deve tá

agonizando e se debatendo enfiado nessa

porcaria de foice do teu lado(!)” Estremeci.

Mais essa agora. Olhei e estava lá mesmo. Era

horrível, coitado. Tão torradinho e zoado e

fedido. Ficou, droga, amassado e

apodrecendo aos poucos. E não pude fazer

nada, todos ali estavam com problemas. Era

27

Enrolação


parte dessa transição árdua.

Então, onde estava? Sim, claro. Temos que

continuar, uma questão de cada vez, eu sou

assim!

Tentei de novo quebrar a janela, percebia lá

fora a chuva, o tempo voava, a sensação de

quando vem e estava, aaaaaai, estava mesmo

com muita sede, e não conseguia o que

queria.

Podia sentir a umidade... a fome também.

Desculpa, mas é f*****! Ansiedade é que

mata... Faltou ar, a, deixa.

No entanto, as ofensas pararam, não havia

troca. Brotou um clima calmo, só me ouvia,

minha respiração, maior silêncio! O tempo foi

passando, e eu fiquei lá pensando e fuxicando

comigo. Refletir é legal, sabe. Tinha que dar

um jeito mesmo. Abri um pequeno armário

que um dos homens fez dentro do quartinho,

tijolos tapavam a saída. Que droga, tentei uma

janela que parecia girar... em vão, puxa vida. O

quartinho já me causando mal-estar, era

diabólico para mim agora, tinha me lascado

tanto, vendo por outro ângulo. Ia ficando com

aspecto de calabouço, cada vez mais alto.

Ouvi uma agitação! Será? O rapaz volta e diz

“não precisa mais fugir, sai e vê.” Não! A Mag

28

Enrolação


tinha morrido. Agora sim, uma piada difícil!!

Destranquei apreensiva e vi a cena bizarra. Ela

não havia perecido como uma pessoa normal,

mas, de alguma forma, poo, era varrida, como

se faz com folhas de árvore que a chuva

devolve. Jogada no canto ao lado da entrada

do quartinho, num tipo de pilha(...)

— ESPERA UM POUCO, QUE ISSO? ACHO

QUE DEU ALGUM ERRO NA

PROGRAMAÇÃO. O SOFTWARE TRAVOU,

REGISTRO. TEM RELATAR, É ASSIM QUE OS

ERROS GERAM MICROVÍRUS. COM TANTOS

ACESSOS, RETARDAM O

DESENVOLVIMENTO. ACHO MELHOR

REINICIAR.

— CALMA, DR... TALVEZ SEJA INTERFÊNCIA

PRÓPRIA DA VOLUNTÁRIA. NÃO FAZ

TEMPESTADE EM COPO D’ÁGUA. ALIÁS,

TEVE ALGUMA IMPRESSÃO DO LATENTE DA

CONOTAÇÃO SEXUAL?

— EM ALGUMA FALA? É DIFÍCIL PRECISAR,

HUMMMMM... DEPOIS FALAMOS NISSO!!!

VOLUNTÁRIA, PODE ME OUVIR?? ROSE,

ROSE É TEU NOME, NÃO É? QUE PASSOU,

29

Enrolação


ROSE?

— DESCULPA, GENTE! ACHO QUE ME MEXI

UM POUCO. ESSE LANCE CEREBRAL. NÃO

PRECISA PARAR. TÁ GRAVANDO AINDA??

— SIM... É... DE ACORDO A MESA DE

CONTROLE?

POSITIVO DE TODOS. 1,2

Dane-se, eu repetia pra me dar mais raiva e

motivação pra continuar. Fui andando

sorrateiramente e pude vê-la, ou o que ainda

existia e dava para ser reconhecido. Tinha que

ter certeza, tinha que ver.

Quanto ao resto, apenas ficaram lá

conversando e lamentado ter que fazer aquele

serviço de remoção, empacotar. Olhei bem

em suas caras, estavam distraídos batendo as

cabeças. Adeus, quartinho! Devagar, um, dois

passos e, e, iahhhh, corri e fingi. Atravessei

toda a casa e ainda consegui olhar o quarto da

mulher, perto da entrada, num risco de

segundo. Te falar, lustrava vazio, sem móveis,

limpinho. Cheguei à porta e vi o quintal; sim, o

adorado quintal, meu refúgio tranquilo! Corri

e fingi, só tinha isso em mente já que havia

30

Enrolação


mais um grupo de esquisitões que chegava

perto. Mas esses com certeza não conhecem o

esquema. Passei de novo pela trilha de

arbustos e estava como deixara, tudo o

mesmo, até o lago, uma parada só. Dessa

forma, fui nos pés e vi que os animais tinham

crescido e não me reconheciam. Fiquei

olhando e admirando como antes, até perdi a

noção da fuga. Tão perto mas era outro

cenário, os seres ficaram zangados e corriam

confusos de um lado pro outro. Um com a

forma de sapo bem pretinho, até mesmo

avançou contra, queria minha carne, eu acho.

É, evidentemente fiz o que sabia, já sei que

não se deve confiar nessas coisas. Já fui presa,

me liguei. Usei das trilhas alternativas e

despistei até a mim mesma, chegando ao

limite do quintal. Posso falar que eu vi! Uma

última vez fitei, olhei detalhadamente meu

adorado lar, achei lindo e solitário como

sempre, queria aquilo, aquela clareza. Vocês

veem, correr e fingir tinha sido tão cansativo

que o limiar do quintal me cegou. Foi num

instante, pisquei e tchau. Mesmo desse jeito

era lindo e desconhecido, muito melhor que

tudo o que já tive. Tinha continuação. Os

doutores podem visualizar. Dei meia volta

31

Enrolação


com a cabeça e era um tom azul refrescante o

outro lado. Como era dócil, como fui dócil e

me usaram! Uma herança. Saí. É isso. Mais ou

menos, tá bom

— TUDO BEM, ROSE, DEIXAMOS VOCÊ

TERMINAR SUA VERSÃO, MAS DEVERIA TER

SEGUIDO O ROTEIRO, POIS, COMO SABE,

ESTAMOS FAZENDO TESTES PARA ESTE

NOVO PROGRAMA QUE VAI AJUDAR MUITA

GENTE. INCLUSIVE VOCÊ, NÃO É?

CORRETO?

— EU SEI, MAS E ESSA FIARADA DE CHIP NÃO

SEI O QUÊ INCOMODA, COÇA. ENTENDE,

NÉ? POR QUE NÃO PENSAM NUM TRECO

MAIS SIMPLES E CONFORTÁVEL, PRA SER

USADO ATÉ NA RUA? HEIM?? ÃH? EU NÃO

OUVI!

— ROSE, ESTAMOS CORRIGINDO A SUA

DOSAGEM, RECEIO QUE PASSOU UM

POUCO A CARGA. FECHA!

O QUE SACANEIA MESMO ESSE PAÍS É A

PICARETAGEM!!!

— QUEM DERA OS PESQUISADORES, NÉ!?

32

Enrolação


Risos entre os presentes, eu sei que é de mim.

Será que sabem o que eu penso? Não é

possível(...)

— ENTÃO, RECOMEÇANDO! VOCÊ VAI PELA

RUA, ROSE. NEM MUITO APÓS TROPEÇA,

CORRE TÃO VULNERÁVEL. UM CASAL TE

AJUDA. ELES ESTÃO À PROCURA DE

CRIANÇAS, MAS PARECE QUE SÃO DO

LADO BOM.

Tudo possibilita alguma escolha, é isso que

sempre quis??

— VAMOS, QUERIDA. O QUE VOCÊ FARIA?

Se dormir não acordaaaa!

33

Enrolação


Foto realista demais

“Me tocava como louca”, ela sonhava

acordada cansada, depois que rompeu o

relacionamento que a mantivera viva e atenta.

Lembrou da visita que fez ao Centro de

Macumba, das mandingas da “Tia Maribel”,

vizinha, a vizinha sobrenatural possuída pelos

espíritos de crianças no ritual das danças...

rindo, zoando, rebolando e entornando

cachaça junto das outras “tias”, as pimas... “Vô

trazê tua namorada di volta, pena tudo tê um

preço, minina...”, e a Tia Bebel voltava ao ritmo

frenético, e o batuquezão rolando sem rédeas,

todas assumindo os papéis que cabiam. Tia

Bebel, que nome tinha!

Não existe essa palhaçada de felizes pra

sempre, Bebel dizia. Na hora H, pra quem tá

indo pra cova, ninguém faz cara de pombinho

apaixonado!!! Cada um corre prum lado e

solta pérolas covardes do tipo “se vira”, “dá teu

jeito”, “fuiii!!”. Cadê o “dá gosto de te ver”???

Acaba o amor, até onde alguém pode ir?

Kátya, pobre ela, largada a ficar repetindo e

repetindo... A ex pensava na irmãzinha

adolescente! “Me excluiu!!!”, pensou naqueles

34

Enrolação


momentos. Ninguém te devolverá tua

tranquilidade, mulher.

“O toque de outro no meu corpo, quero isso

de volta, Tia”, disse Kátya, pra macumbeira.

“Ela correspondia, né!”, respondeu a Tia.

“Agora só me sinto maltratada, ô Tia”, disse

triste a Kátya, e abaixou a cabeça. “Preciso

dela, além de mim”, completa.

Sete dias depois, Kátya levou a ex para

almoçar num tal de Hotel M, na orla carioca,

decidida a estragar as duas vidas. A ex, meio

desconfiada, ainda assim aceitou. Quem

imagina como serão seus últimos minutos?

Ninguém sabe.

Nem pediu arrego, nem implorou, nem nada

a ex, só foi!!... Sabia que tinha chegado o

momento, e não havia como modificar isso.

Sábia até o fim, grande era esta senhora. Viu

no rosto da Kátya aquela raiva irredutível. Tava

serena, parando de pensar. TUMMMM, um

baita estrondo do tresoitão na barriga,

fazendo aquele rombo grosseiro. Cheiros

incomuns pelos ares. É, por isso nem acharam

que foi profissional — mas a Polícia do Rio tem

mesmo que fazer muita atividade

extracurricular, de toda forma. Um simples

acerto de contas, estaria estampado no pior

35

Enrolação


dos jornais. Pela cara, Kátya não aparentava

arrependimento. “Minha vida é um saco”,

repito arremedando a tal Kátya, assassina,

corroída por desejos inverossímeis,

aterrorizada, dando seu depoimento rápido

ao RJTV. “Não sabia, não sabia!!” Que “Poeta”

que nada, que poetisa sim, apelidaram esta

vingadora. Era só deboche vangloriando-se.

Apelidaram de Poetisa esta mulher!!? Saibam

que Kátya é uma sobrevivente, uma artista e

vítima ao mesmo tempo? Deu até uma risada

gordurosa pras câmeras, típica das patroas,

imaginando tudo o que suas seguidoras

fariam.

Voz. Queria muito ter como descrever a cara

do Dono do Hotel M(eleca) entrando antes

dos canas, vendo a mulher lá, caída de mau

jeito, de bruços, as mãos abertas, Kátya ao

lado, com a pistola nas mãos, sem esperança,

apontando pra baixo, olhando com cara de

peixe morto a cama vazia. Perde-se.

Sigo fumando meu Camel ingual gambá,

como diz um amigão meu, pensando sobre o

quarto de número 1204, o da história da

analista vingativa, a senhora que abriu os olhos

do senso comum.

Você aí lendo, por favor, desculpa

36

Enrolação


interromper. Veja: “Toma teu café diário mas

seco, tira o tanto de açúcar e sente como é.

Assim na vida também, e será mais infalível; o

doce te deixa terno, prefere a força da

dureza.” Prossiga.

37

Enrolação


Dona

Anotem esse nome: Dolores Fuentes Fuertes,

ou só Dolores, que tal? Dolores mentiu às

esperanças de Armando Bacamartes, o

maridão, e não lhe deu filhos nem de uma

forma nem de outra, o que queria eram outros

500. Há quem diga que a índole natural da

Ciência é dar chá de cadeira; o nosso médico

esperou três anos, depois quatro, depois

cinco. Ao cabo desse tempo fez um estudo

profundo da matéria, releu todos os escritores

best-sellers e outros, que trouxera para

Itaguaí, enviou consultas às universidades

públicas e à distância, mas acabou por

aconselhar sua mulher um regime alimentício

especial consultado na Internet. A ilustre

dama, nutrida exclusivamente com a bela

carne de porco de Itaguaí, não atendeu às

advertências do esposo; e sob sua resistência,

— explicável, mas inqualificável, — devemos a

total extinção da dinastia dos Bacamartes.

Mas a Ciência tem o inefável dom de curar

todas as mágoas; o nosso médico mergulhou

inteiramente no estudo e na prática da

Medicina. Foi então que um dos recantos

38

Enrolação


desta lhe chamou especialmente a atenção, —

o lado psíquico, o exame de patologia

cerebral. Não havia em Itaguaí, e nem ainda

no Estado, uma só autoridade confiável em

semelhante matéria, mal explorada, ou quase

inexplorada. Armando compreendeu que a

Ciência atual, e particularmente a brasileira,

podia cobrir-se de dindin molin, — expressão

usada por ele mesmo, mas em um estopim de

intimidade doméstica; exteriormente era

modesto, segundo convém aos sabedores.

A saúde da alma, bradou ele, é a ocupação

mais digna do médico. AH, DOLORES

FUERTES. CÁLIDA CALIENTE AH,

DOLORES!!!

Do verdadeiro médico só a sombra!,

emendou Crispim Soares, farmacêutico das

redondezas, e um dos seus amigos, além de

vizinho.

A canalhice de Itaguaí, entre outros pecados

de que é tingida pelos cronistas, inclui não

fazer caso dos dementes. Assim é que cada

louco furioso era trancado em uma jaula, ou na

própria casa, e, não curado, mas descurado,

até que a morte o vinha defraudar do bem da

vida; os mansos andavam à solta pela rua.

Armando entendeu desde logo atualizar tão

39

Enrolação


ruim costume; pediu licença à Câmara para

agasalhar e tratar do edifício que ia construir

para todos os doidos de Itaguaí, e das demais

vilas e cidades vizinhas, mediante um agrado,

que a Câmara lhe daria quando a família do

enfermo não pudesse fazer. A proposta

excitou a curiosidade de toda a vila, e

encontrou grande resistência, já que

dificilmente se desfazem hábitos absurdos, ou

ainda maus. A ideia de meter os birutas na

mesma casa, vivendo em comum, pareceu em

si mesma sintoma de demência e não faltou

quem o insinuasse à própria mulher do

médico.

Olhe, Dolores, disse-lhe o Padre Bino, vigário

do lugar, veja se seu marido dá um passeio no

Rio de Janeiro para espairecer. Isso de estudar

sempre, sempre, não é bom, zureta um.

Dolores ficou baratinada. Não perderia o que

tem. Foi falar com o marido, dizia “que estava

com desejos”, um principalmente, o de ir ao

Rio de Janeiro e comer tudo o que a ele lhe

parecesse adequado a certa finalidade. Mas

aquele grande homem, com a rara sagacidade

que o distinguia, penetrou a intenção da

esposa e retrucou sorrindo que não tivesse

medo. Dali foi à Câmara, onde os vereadores

40

Enrolação


debatiam a proposta, e lhe defendeu com

tanta eloquência, que a maioria resolveu

autorizá-lo ao que pedira, votando ao mesmo

tempo um imposto destinado a subsidiar o

tratamento, alojamento e mantimento dos

malucos pobres. A matéria do imposto não foi

fácil achá-la; tudo estava tributado em Itaguaí.

Depois de longos estudos entre sestas,

resolveram por aumentar em 15% as taxas

gerais. O escrivão perdeu-se nos cálculos

aritméticos do rendimento possível da nova

mamata; e um dos vereadores, que não

acreditava na empresa do médico, pediu que

se relevasse o escrivão de um trabalho inútil.

Os cálculos não são precisos, disse ele,

porque o Armando, Armando é guerra, não

arranja nada. Quem é que viu agora meter

todos os doidos dentro da mesma casa?

Enganava-se o digno megeristrado; o médico

arranjou tudo. Uma vez empossado da licença,

começou logo a construir a casa. Era na Rua

Velha, a mais bela rua de Itaguaí naquele

tempo; tinha cinquenta janelas por lado, um

pátio no centro, e numerosos cubículos para

os hóspedes.

A Casa Verde foi o nome dado ao asilo, por

alusão à cor das janelas, que pela primeira vez

41

Enrolação


apareciam verdes em Itaguaí. Inaugurou-se

com imensa regalia; de todas as vilas e

povoações próximas, e até remotas, e da

própria cidade do Rio de Janeiro, correu

gente para assistir às cerimônias, que duraram

sete dias. Muitos pacientes já estavam

recolhidos; e os parentes tiveram ocasião de

ver o carinho paternal e a caridade cristã com

que eles iam ser tratados. Hipocrisia. Dolores,

contentíssima com a glória do marido, vestiuse

luxuosamente, cobriu o corpinho de joias,

flores e sedas. Ela foi uma verdadeira rainha

naqueles dias memoráveis; ninguém deixou

de ir visitá-la duas ou três vezes, apesar dos

costumes caseiros e recatados do século XXI,

e não só a cortejavam como a louvavam;

porquanto, — e este fato é um documento

altamente honroso para a sociedade do

tempo, — viam nela a feliz esposa de um alto

espírito, de um cara ilustre, e, lhe tinham

inveja, era a santa e nobre inveja dos

admiradores sedentos.

Logo, fica reclusa. Não acaba nenhuma frase;

ou antes, pouco levantou os olhos ao teto, —

os olhos, que eram a sua tara mais insinuante,

— negros, grandes, lavados de uma luz úmida,

como os da aurora. Quanto aos modos, eram

42

Enrolação


os mesmos que empregara no dia em que o

médico Bacamarte a pediu em casamento.

Não dizem as fofocas se Dolores brandiu

aquela arma com o perverso intuito de

degolar de uma vez a Ciência, ou, pelo menos,

decepar-lhe as mãos; mas a presunção é

verossímil. Em todo caso, o seu homem não

lhe deu atenção. E não se irritou o grande

homem, não ficou sequer consternado. O

metal de seus olhos não deixou de ser o

mesmo metal, duro, liso, eterno, nem a menor

prega veio quebrar a superfície da fronte

quieta como a água dos lagos do Brasil. Talvez

um sorriso lhe descerrou os lábios, por entre

os quais filtrou estas palavras macias como

óleo:

Deixo você dar um passeio ao Rio de Janeiro.

Dolores sentiu faltar chão debaixo dos pés.

Como assim? Nunca dos nuncas vira o Rio de

Janeiro, que não era sequer uma pálida

sombra do que hoje é, todavia era alguma

coisa mais do que Itaguaí. Ver o Rio, para ela,

equivalia a um sonho turístico. Agora,

principalmente, que o marido se fixou de vez

naquela povoação interior, agora é que ela

perdera as últimas esperanças de respirar os

ares de uma cidade grande; e justamente

43

Enrolação


agora é que ele a convidava a realizar os seus

desejos de menina e moça. Dolores não pode

dissimular o gosto de semelhante proposta,

ainda que desconfiasse. Armando pegou sua

mão e sorriu, — um risinho tanto ou quanto

filosófico, além de conjugal, em que parecia

traduzir-se este pensamento: — “Não há

remédio certo para as dores da alma; sei que

definha, porque lhe parece que não a amo;

deixo o Rio de Janeiro, consola a você

mesma.” E porque era homem estudioso

tomou nota da observação.

Mas talvez uma bala perdida tenha

atravessado o coração da Dolores. Contevese,

entretanto; apenas disse ao marido que, se

ele não ia, ela não iria também, porque não

havia de meter-se sozinha pelas estradas. Aí

tem algo!

Revisão da Obra Machadiana, “O Alienista”

Clássico.

44

Enrolação


“Elevadora”

Escuta isso, Serjãozinho — Disse o Jão Cólica,

um dos serventes do hotel. “Eu e mais dois

rapazes lá da cozinha tínhamo que pega

guerridón usado lá no sétimo andar. A parada

era que o elevadô de selvicio tava com

defeito.” Disseram: “NUNCA, REPETINDO,

NUNCA UTILIZAR O ELEVADOR SOCIAL”, a

parada era que sabíamo que, na prática,

quando o de selvicio quebra, TEMO que usá u

outro mais bonitão. A parada então, assim, o

esquema é que, qui, quando chega um

hóspede, temo mermo que “EVACUAR O

SOCIAL”. Esse é o lance...

Quando chegamu pra pegar u social di todas

as formas, já tinha até outro garoto lá

esperano, esse que fuma direto lá na portaria,

o novo, o Dascouvi. E assim ó... Então... Algum

tempinho depois entrô Ela, A LÔRA, LÔRA DI

VERDADE, ATRIZ CATIVA DUS TEUS SONHO,

A QUE ELEVÔ, DEXÔ “FELIZ” CADA

FUNCIONÁRIO DAQUELE CUBÍCULU

ELEVADOR. LINDA, CI-NE-MA-RRÃRRÃ-TO-

GRÁ-FI-CA, AHH, COXUDA, GOSTOSA,

PROPAGANDA PRA NÓIS, UMA DELÍCIA QUE

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Enrolação


CÊ SÁBI QUE NUM EXISTE PRO TEU MUNDO,

NÃO PRA GENTE COMO VOCÊ O EU... Entrô

e, TODOS, tavamo parados, vivos; ela, sei lá,

sorria. Tá certa, tem que sorri sim! Isso sim é

Brasil!!! A existência é tão breve que lembra

uma garrafa de boa cachaça. É, é... Queríamo

se fartá dela ali mermo, a gente era urubu, mas

ela não era carniça! BABAMOS! Owww Mas

tínhamo que sair, né. PUTA QUE ME AIIIIIII!!!

Saimo. Uns de nóis tinha até esposa, carai!!!

Comentamo e fizemo piadinhas entre a gente.

Nessas hora de tensão, tesão, essas parada, os

hômi se compadéci com as mediocridadi dos

pobre que são.” Assim falou este grande

observador, tal de Jão. Mas toda mulher fica

linda mesmo é danadinha — no bom sentido,

claro. Não tomem os oradores por machistas,

mas sim por ‘Safadinhos’ literais. Quando ela

vai embora, tem muito ar pra respirar, já que

somos mamíferos, que preferimos dividir.

46

Enrolação


Funk das Pombita

Keite & Kélly!!! Nesse quarto simplesmente

tavam hospedadas, ironicamente, ELAS

MESMAS!! Do grupo KEPEKÉPE!!!!!!!! Sim,

novíssimas estrelas em ascensão rápida.

Dizem que o funk carioca nunca teve tanta

projeção. Brazil em evidência, o “Funk das

Pombita” em todas as rádios e nas vozes até

das crianças da escola pública. Era turnê, viram

nos jornais. Eram também muito amigadas.

Mas davam seu exemplo! A bacanada tava

numa de sair sem calcinha pro baile também.

O esquema era que todas se juntavam pra

enviar pó pelo nariz. Davam cafungada e riam,

podendo fazer o que quiserem, isentas do

remorso. Quem entende essa gente? Se

alguém sensato conseguisse toda essa fama,

jamais ia atingir as massas propagando essa

enxurrada de FOFOCAS! Um besta de

repórter como eu não pode é desperdiçar isso

— pode me chamar de Tonio, primeiramente.

Mas logo eu tinha que saber como aproveitar

essa grande chance, já que sempre prezei

pela criatividade. Assim um profissional fica

bem-visto na praça... e eu sou o matador da

47

Enrolação


vez!

A primeira medida foi fazer o trabalho beeeem

profissa. Dei meu jeito de ter acesso às

câmeras; ‘suborno’ é a moeda de troca secreta

da cidade Maravilhosa também, fazer o quê?

Cara, esse hotel tá nas minhas mãos já tão

assim que, sei lá, me faltam palavras!!!

Então caminho com uma cópia por estes

corredores que já viram muito mais do que

isso. Vale a pena, eu me pergunto.

Já que o que vi me deixou foi de cabelo em

pé: rolava de tudo naquela suíte em chamas!!!

Eu que achava que tinha presenciado de tudo

trampando, porém a diversidade, as

excentricidades naquelas pessoas, suas

existências em tão comunhão de corpos...

QUE ISSO........ EU AINDA NEM TINHA

PRESENCIADO TANTO... quanta doidera

NAQUELA SUÍTE....!

Resumidamente, pra num perder tempo,

anotem as palavras: cunilíngua, tribadismo,

brachio procticus, cumfart, creampie,

sodomia, sadismo, ssss... etc etc, além de pó

em sacos e espalhados feito montanhas em

miniatura naquela sala de espelhos. E mais

Black Label, muito pó, nunca vi nada igual,

essa galera gosta de cheirar pó mermo! Pensei

48

Enrolação


que isso fosse lance de antigamente. Bem,

além de criatividade pacas, os movimentos

eram muito violentos, não consigo explicar,

pessoalmente. E tinha algo como uma

bajulação por parte do empresário,

incentivando, falando sem nexo — não sei,

acho que ele tava é chei de outras fumaças na

cabeça. Será um filme, e eu não sabia

também? Mesmo assim odeio essa gente

“Papa-Tudo Por Dinheiro!!” Uma tinha a cara

da perfeita Mulherzinha Sonsa, eita... a outra

parecia a Poção do Amor em pessoa! Não

sabia como alguém podia juntar-se a tantos ao

mesmo tempo!!! Os enlaces pareciam não ter

fim; a maior sinuca registrada por estes olhos.

Pauso. Fiquei tentando juntar as peças, revi

cada tomada, pensei na minha vida, mas

dormi porque de ferro não sou. Imaginei uma

melhor explicação pra depois. Podem

imaginar! Mas o cochilo só durou até o vídeo

travar. É tudo arruaça! Pensara. Nem bem

tinham enchido o pííí de dinheiro e já tavam

torrando, destruindo-se. Infelizmente, a

melodia delas ainda azucrinava minha cabeça.

Nisso, recebo um telefonema:

— Alô, Pechincha? Quem fala, POR FAVOR?

49

Enrolação


— É o Tonio, desembucha.

— Pechincha, suspende a missão, volta.

— Hã?? Mas tem pra fazer, espera um pouco.

— Tu sempre diz isso, volta, terminou, cara. Vai

descansar(...)

— Cachorro é que deita, sai fora! (Pausa)

Hunnnnf. Tá certo, vou juntar as peças e vazar.

— Nos vemos no bloco!

Carnaval não é pra mim. Esperei a cambada

dormir. Esperei sair aquela muntueira de

macho & fêmea. Esperei. Era a minha tocaia

também! Enquanto isso, peguei os remédios

da bolsa prata da vovó e pensei num coquetel

adicionando um pouco de álcool. Era uma

profusão de nomes doidos os dos remédios:

Marevan, Neosemid, Diovan, Selokok,

Ancoron, Aldactone etc. Fiz uma farinha

daquela miscelânea, molhei com o álcool e

derreti com açúcar numa colher. E misturei.

Esperei secar, raspei até ficar só pó branco. O

resultado foi um total sucesso. Seria um

trabalho desgraçado pros canas descobrirem

que substâncias foram usadas na intoxicação.

Embrulhei nuns plásticos coloridos de bala, e

botei num saquinho tipo de Cosme & Damião

pro serviço de quarto. Essa galera entende

50

Enrolação


quando mandam esse tipo de pacote, é a

união das seitas. A camareira nem deu bola, só

entregou.

“ACHO QUE VÔ MORRÊ, VACA!!!”, Keite

gritou para Kélly. A amiga já meio que sabia.

Você é muito sabida, garota. “É TETO, É SÓ

TETO PRETO, BURRA, É MUITA

SUBSTÂNCIAS.” Eu num previa quais reações

iam dar, só que iam tossir pra caramba, meio

de agonizar e ter ataques, soltar espuma pela

boca ou cair duro. E passaram maus bocados

mesmo, delirando e se debatendo. Por fim,

choraram. É incrível como eu conto com a

sorte e ela me ri, morreram só os três, não

havia ninguém mais! É linda a poesia! “Pessoas

pequenas lá longe & caminhando/ ooohmn/

cháááá/ a espuma é amarela, suja como areia

amarela/ quebra-mar/ mar vazio/ peixes

solitários dando lições aos filhotes/”

Queria que fosse uma lambança braba... pra

geral ficar revoltado. Ei, qual foi? Tinha

categoria na coisa. Refinamento, apesar de

tudo. Nem devo me chamar Tonio. Que lixo

de nome, podia trocar essa zoação!

Levei coisa de duas horas para chegar à saída

do hotel. O aviso de NÃO PERTURBE ainda

tava na porta do quarto delas. Conveniências.

51

Enrolação


Adoro essas ironias. Assim como um vinho

que ninguém quer. Mas fiz por elas! Isso faço

questão de deixar claro. Palmas pro Funk das

Pombita!!!

Alguns minutos após tudo isso, andando

rápido pra pegar o carro... antes que eu possa

chegar ao estacionamento, sinto

SSSSSSSSSSSSSSSSSSSIL. TUF. TUF. Dois

solavancos, meu sangue voltando pro chão,

dois tiros nas costas. Abro a mão, vermelha,

tremeu a visão, caralllll

AHHHHHHHHHHHHHH A ganância nem

sempre é necessária. Por que tem que ser

rápido demais?!!! Merda.... fui peg(!)

No final, percebi o quanto esta noite foi

trágica. Nem os animais poderiam se ferir

tanto.

52

Enrolação


Rogerin ou o destino, uma história oriemental

A desgraça de Rogério Sincero do

Nascimento, o Rogerin, teve origem na

própria sorte, e, principalmente, de seu

mérito. Estava todos os dias com o rei e Tati,

digamos, só ‘Tati’, sua magnífica esposa. A

esposa do mandão. O encanto da

conversação do primeiro ministro era

redobrado por esse desejo de agradar que

está para o espírito como o ornamento para a

beleza; sua juventude e graça causaram

insensivelmente em Tati uma impressão de

que esta a princípio não se ligou. Sua paixão

crescia no seio da inocência. Tati entregava-se

sem escrúpulo e sem temor ao prazer de ver e

escutar a um homem tão caro a seu esposo e

ao Estado; não cessava de o elogiar perante o

rei; falava dele às amigas, que ainda

acrescentavam ciuminhos; tudo concorria

para lhe aprofundar no coração a faca que ela

não sentia. Dava presentes a Rogerin, nos

quais entrava mais pedidos de desculpas do

que supunha; julgava falar já como rainha

satisfeita de seus serviços, e suas expressões

eram, algumas vezes, as de uma mulher

53

Enrolação


sensível.

Tati era muito mais bonita do que aquela

Nicolinha que tanto odiava, e do que aquela

outra mulher que quisera cortar a vez do

esposo — não se surpreenderia se dissesse

que estamos em um tipo de “conjunto

habitacional”!? A familiaridade de Tati, suas

ternas frases, de que começava a corar, seus

olhares, queria desviar vermelhando, e que se

fixavam nos dele, acenderam no coração dele

uma chama que o espantou. Lutou; pediu

socorro aos amigos, que sempre lhe davam

essa força; mas só obteve dicas, não

recebendo em troca nenhum alívio. O dever, a

gratidão, a soberana majestade violada,

apresentavam-se aos olhos deste homem

como deuses vingativos; lutava e triunfava;

mas essa vitória que era preciso renovar a todo

momento, custava desconforto e tiques. Não

mais ousava falar à rainha com aquela doce

liberdade que tais encantos tivera para

ambos; seus olhos cobriam-se de uma nuvem;

suas palavras eram constrangidas e

incoerentes; baixava as pálpebras; e quando,

sem querer, o seu olhar se voltava para Tati,

encontrava o da rainha turvo de lágrimas, de

onde partiam raios; pareciam dizer um ao

54

Enrolação


outro: “Nós nos adoramos, e temos medo do

amor; ardemos os dois num fogo que

condenamos.”

Rogerin retirava-se desvairado da sua

presença, com um peso no coração, que não

mais podia suportar; na violência da sua

agitação, não pode evitar que o amigo

professor lhe descobrisse o segredo, como

um homem que, tendo aguentado por muito

tempo uma dor profunda, deixa enfim revelar

o seu mal, por um grito que lhe arranca um

acesso mais agudo e pelo suor que empesteia

a cara.

— Já saquei — lhe disse o professor — os

sentimentos que de você mesmo procurava

ocultar; as paixões com seus sinais que não

enganam, rapá. Por aí vai ver, meu caro, já que

eu li no teu coração, que se o próprio rei não

irá descobrir um relacionamento que o

ofende. Vai proclamar a traição sem saber da

ternura! Não tem ele outro defeito senão o de

ser o mais ciumento dos homens, que droga.

Acho melhor sumir daqui! Ou resiste à paixão

com mais força do que a rainha combate a

dela, porque tu é sujeito homem e porque é

Rogerin, matador. Esqueceu? Tati é mulher;

deixa falar seus olhares com mais imprudência

55

Enrolação


por ainda não se julgar culpada. Elas são

assim! Infelizmente tranquilizada por uma

inocência estranha, negligencia as aparências

necessárias. Você vai tremer por ela enquanto

não tiver nada que se censurar, meu amigo. Se

estivessem ambos no mesmo esquema,

saberiam enganar todos os olhos: uma paixão

nascente e combatida logo se revela; um amor

satisfeito sabe esconder.

Rogerin cagou-se diante da ideia de trair o rei

seu chefe, já que nunca foi tão fiel ao

comandante como agora, quando se viu

culpado de um crime involuntário. Contudo,

tantas vezes pronunciava a rainha o nome de

Rogerin, tal vergonha lhe cobria a cara ao dizêlo;

ora se mostrava tão animada, ora tão

interdita, quando lhe falava na presença do

rei; caía em tão profundas cismas depois que

ele se retirava, que o rei se sentiu inquieto.

Acreditou em tudo o que via, e imaginou tudo

que não via. Observou principalmente que as

sandálias de sua mulher eram azuis, e que os

chinelos de Rogerin eram azuis, que as

xuxinhas de sua mulher eram amarelas, e que

o boné de Rogerin era amarelo: indícios

terríveis para um príncipe suscetível. No seu

espírito envenenado, transformaram-se as

56

Enrolação


suspeitas em certezas.

Os escravos dos reis são outros tantos espiões

de seus corações. Danados, descobriram logo

que Tati amava Rogerin e quem sentia ciúmes.

Um invejoso fez uma invejosa enviar ao rei

uma fita, incriminando a rainha. Azar, essa fita

era azul. O pretendente a corno não pensou

senão na maneira de vingar-se. Resolveu uma

noite mandar envenenar a rainha, e enforcar

Rogerin de manhãzinha. A ordem foi

transmitida a um impiedoso fogueteiro,

executor das suas vinganças. Achava-se então

na câmara do rei um anãozinho que era mudo,

mas não surdo. Toleravam este sempre em

toda parte: era testemunha de tudo o que se

passava de mais secreto, como um animal

doméstico, o bobo da corte. Esse pequeno

mudo era muito devotado à rainha e ao

Rogerin — costumava dizer serem mais

humanos. Ouviu com tanta surpresa quanto

horror a sentença de morte dos seus

chegados. Mas como prevenir essa terrível

ordem, que em poucas horas seria executada?

Escrever, não sabia; mas aprendeu a desenhar

e fazia retratos parecidos. Passou uma parte

da noite rabiscando o que desejaria dizer. O

desenho representava o rei furioso, num canto

57

Enrolação


do quadro; uns riscos azuis e um vaso sobre

uma mesa, com detalhes também azuis e fitas

amarelas; a rainha, no meio do quadro,

batendo as botas entre os braços de suas

meninas, e Rogerin estrangulado a seus pés.

O horizonte representava um sol nascente,

para indicar que a horrível execução se

efetuaria rapidamente. Logo que terminou o

trabalho, correu a uma conhecida de Tati,

despertou a pobre, e deu a entender que era

preciso levar imediatamente o quadro à

rainha. Que figura boa.

No meio da noite, batem na porta dele;

acordam o rapaz; entregam-lhe um bilhete da

sua amada; pensa que está sonhando; abre o

papel com a mão nervosa. Qual não foi a sua

surpresa, e quem lhe poderia exprimir

tamanho abatimento e desespero, ao ler as

seguintes palavras: “Foge imediatamente,

senão te arrancam a vida. Foge, Rogerin,

ordeno em nome do nosso amor e das minhas

xuxinhas amarelas. Eu não era culpada; mas

sinto que vou morrer criminosa.”

Mal teve forças para falar. Suou frio. Mandou

chamar o professor e, sem palavras na boca

seca, mostrou o bilhete.

O professor lhe forçou a obedecer e tomar

58

Enrolação


logo o caminho da Zona Oeste. “Se você se

atrever a ir falar com a rainha, apressará ambas

as mortes; e se falar com o rei, da mesma

forma prejudicará ela. Vou te dar uma moral;

segue o teu rumo. Vou espalhar o boato de

que partiu para outra facção. Já já estarei

contigo e te comunico o sucedido aqui na

Babilônica.”

O amigo, didático, no mesmo instante

mandou trazer duas motos das mais rápidas a

uma porta secreta do palácio; fez com que

Rogerin montasse tendo até de ampará-lo,

pois parecia prestes a entregar a alma pelas

pernas. Um só comparsa o acompanhou; em

breve o professor, varado de espanto e

angústia, perdeu de vista o amigo. Mesmo

assim, sentia-se bem consigo.

O ilustre fugitivo, chegando ao alto de uma

colina de onde se avistava bem a favela da

Babilônica, voltou o olhar para o “palácio da

rainha”, e desfaleceu; só recuperou os

sentidos para chorar mais e desejar o inferno

pra geral.

Enfim, depois de se haver ocupado do

deplorável destino da mais amável entre as

mulheres e a primeira rainha do seu mundo,

voltou o pensamento para si mesmo e

59

Enrolação


exclamou: “Que coisa é então a vida humana?

De que me serve ser bonzinho, porra? Tantas

mulheres me enganaram indignamente nessa

vida antes da Tati; e ela, que não é culpada, e

mais gostosa que as outras, vai perder a vida!

Todo o trabalho que pratiquei foi sempre para

mim munição de maldições, e só fui elevado

ao cúmulo da grandeza para tombar no mais

horrível precipício do infortúnio. Se eu tivesse

sido mau como tantos outros, seria hoje feliz

como eles, talvez abusado também.”

Humilhado por essas brabas reflexões, na mão

pendendo uma pistola, a palidez da morte na

face, e a alma azucrinada no mais sombrio

incerto, dirige-se ele novamente a caminho de

onde veio.

Adaptação do Capítulo “VIII. O CIÚME”, do

livro “ZADIG OU O DESTINO, Uma história

oriental”, do famoso filósofo Voltaire.

60

Enrolação


Gato e rato!

Este puto sonho eu achei muito estranho,

diferente. Veio à parte dos outros. Até acho

melhor procurar um especialista dos infernos,

alguém que saiba diagnosticar ou pelo menos

dizer o significado dessa coisa tão bizarra.

Foi uma noite comum, anterior a um dia

comum, estupidamente comum, como se

sabe, daí eu tive um sonho. Vou descrever pro

senhor, vô. Desculpa a franqueza e o tom;

denso é apelido. Lá vai:

Havia uma casa; não, na verdade um prédio,

cheio de janelas, como um hotel que parecia

ter saído dum filme, com madeira mofada,

ambientes cinzas e várias dessas janelas

quadradas e vermelhas, com arbustos

ressecados por todo lado. Tudo muito velho e

com aspecto degradante. Nele, tinha um

tesouro, e esse era guardado por um segredo

que duas mulheres lindas queriam minha

ajuda pra desvendar e ficarem riconas — mas

sem mim, claro. É sempre assim, o senhor

sabe. Elas me pediam pra pegar utensílios

estranhos que ajudariam a encaixar no enigma

61

Enrolação


desse tesouro desconhecido; coisas em

árvores, aparelhos eletrônicos nos cantos dum

quintal, papéis, um controle remoto e outras

coisas sem nexo de que eu nem recordo.

Pô, depois de um intervalo sem coesão,

consegui despistar as piratinhas enquanto

conversavam sem me ver e tranquei num

cômodo duma casa perto do prédio onde, de

repente, esses utensílios estavam. Tirei os

troços de lá rápido e deixei as tais putinhas

desesperadas no local — sem o que queriam e

presas. Então, reapareci no comecinho do

sonho. E lá, no prédio, tinha um labirinto onde

fui deixado. Nesse labirinto me deram este

controle remoto, de um jogo de videogame

onde fui largado que nem boneco — eu

controlava um ratinho de brinquedo feito de

papelão e pano cinza — acho que era feltro,

bombril, tipo esses que se vendem no camelô

—, com olhinhos de feijão vermelho e antenas

pra guiar, e eu tinha que encaixar pecinhas e

abrir portinhas pra outro jogo que, acho eu,

tinha relação com o tesouro. Mas aí apareceu

um gato horroroso, negro e com orelhas de

morcego, que queria matar o rato e,

consequentemente, eu. Porra, sempre fudido!

Parecia um demônio defeituoso, trash.

62

Enrolação


O ratinho — eu! — merda! — também usava uma

pistola que atirava uma água ácida que

derretia as grades dumas passagens onde eu

achava umas saídas, mas, infelizmente, o gato

sempre me encontrava; saía em câmera lenta

donde eu supunha estar a verdadeira saída e

me perseguia enquanto outra cena se

desenrolava: a de dois irmãos que se

reencontram e percebem que um ficou tanto

tempo longe doutro, que um buraco foi

colocado nos sentimentos. Onde os irmãos

estavam era tipo um colégio para recuperação

do irmão mais novo, com problemas

emocionais, talvez pela ausência do... outro.

Eu num sei. Era tudo tão confuso e rápido,

cacete!

Eles tentavam se ajudar, enquanto outros

buracos abriam na outra cena — do gato

aparecendo de todos os lados e o rato, já

muito cansado, fugindo. Ainda assim, o rato

matou o gato com uma corda enroscada

tirada de não sei onde, fato é que passou no

pescoço e o girou pelo alto, tipo boiadeiro, e

o espatifou na parede, onde o gato ficou todo

despedaçado como pasta, encharcado de

sangue e em pedaços de carne viva e

brilhante, tão vermelho, vermelho forte, forte,

63

Enrolação


fodasse. Mas ele logo voltou; não sei como se

refez, Jesucristo! E voltou pior com a

aparência dum demônio mais! deformado

ainda, colado com superbonder e tentava

mais e mais vezes detonar o pequenino rato. E

eu, assistindo a tudo em sonho e frenético na

briga, me remexia suando pacas. Tudo muito

nítido e louco; boa parte da noite. Era algo

embolado, repetitivo.

Ah, as mulheres ficaram a esperar naquele

lugar onde deixei — que depois me foi

mostrado ser um aquário gigante. Estavam

atônitas por saberem que morreriam se eu

morresse, pois só eu conhecia seu paradeiro.

Sabia que elas também eram ruins por

tentarem roubar o tesouro que ninguém sabia

o que era.

Alguma voz do alto desse aquário dizia: “Nada

é pior do que a consciência humana; e eu sou

a tua consciência, sei o que vocês são e

fizeram.” Acaba aí a cena.

É confuso, eu sei, mas então foi mostrado o

começo: um lugar... uma loja, onde eu

encostei minha bicicleta e a dona desse local

não queria por perto a bicizinha, porque me

achava estranho àquele lugar e eu num iria

consumir nada, por, visivelmente, não ter

64

Enrolação


dinheiro. Então, ela mandou me expulsarem,

como um rato — que coincidência!? —, mas

uma mulher linda apareceu e me ajudou a

fugir — coincidência de novo!, caramba...?

Eu queria retribuir a gentileza da mulher,

então ela disse que tinha uma coisa em que eu

podia ajudar: um tesouro que ninguém

conhecia, melhor que milhões de “dinheiros

humanos”, algo mágico e sem aparência

definida.

Bom... acordei, só me resta deduzir o final.

Minha nuca estava suada e eu fedia. Ainda

nem sei que tipo de riqueza é essa. A mulher,

ela ainda deve estar lá com a comparsa. Os

irmãos talvez voltaram pra casa juntos,

reconciliados, e a eterna briga de gato e rato

ainda continua no diabo que os carregue —

ainda lá, seguramente, cegos e atravessando

paredes que não existem e cuspindo sangue

um no outro, exatamente como na doidera do

sonho. É idiota.

Que pesadelo maluco! O que achou disso

tudo, vô? Mostra esta carta pra Vâninha —

talvez ela me ajude achando sentido neste

65

Enrolação


bagulho escabroso. Confio na sabedoria de

vocês. Saudades.

A propósito: só pode o tesouro ser algo como

minha sanidade, ou minha inocência se

esvaindo. Hahaha brincadeira!

Olha, é chato pedir isso, mas, hum, podem me

emprestar um troco? Tô na merda. Viver só é

ruim, mas tenho que aguentar, né? Pendura na

minha conta. Eu vou me erguer, vão ver. Não

me arruíno de novo! Amo vocês. Brigado. Até

a próxima (Nicolas)

66

Enrolação


Luz verde no quarto escuro (Cena de de

rapazes semigreguiados estendidos)

Aconteceu uma puta vez, numa fila de

pagamento de contas de telefone no meu

banco. Passou que eu estava sendo olhado, e

realmente olhado! enquanto não percebia.

Depois saquei... O QUE ERA.

Um rapaz do meu estilo, na certa, de

aproximadamente 20 e tantos aninhos de

idade, me secava enquanto esperava na fila —

ele sempre olhando querendo parecer

despercebido quando havia uma

oportunidade. E eu, depois de um tempo,

enfim acabei por entender, é que travo às

vezes. E achei interessante ser analisado com

tanta curiosidade. Não entendia o porquê,

mas até fiquei lisonjeado e, por algum tempo,

me imaginei um ser narcisista — mesmo que

este presente tenha vindo de outro

machucado. Eu só deveria estar alto pra

suportar bem isso, só altinho. Não tomem por

exemplo, eu sou único em minha realidade.

Desse jeito torto são os pioneiros.

Depois de quase ficar encabulado com a

dedicação do rapaz, também olhei de um

67

Enrolação


todo, e por umas duas vezes até que o garotão

percebeu que suas iniciativas também haviam

sido correspondidas — pois é, resolvi sacanear

também, deve viver em todo lugar a gente

que quer o que quer. E nesse flerte sacal

ficamos por uns dois gigantescos minutos, nos

distraindo de propósito como crianças numa

praça. Diante disso, atentem que estávamos

num banco! Ninguém na fila realmente estava

vendo e era como se eu estivesse sozinho e

moralmente despido para ele; e o rapaz

tentando me passar algo, sorrindo. E nem

percebeu que eu estava tirando uma me

ajeitando pra partir pro meu cotidiano regular

— a fila já tinha andado. Paga o que deve e

bendiz voltar pra casa. A feiosa da caixa

chamou. Contudo esse momento atípico em

minha vida típica ficou registrado, como um

carimbo de pensamentos, meus sentimentos

hipocritamente mancos; tanto que apenas nos

aproximados dois minutos eu me senti uma

pessoa interessante, desejada. Pude sentir

uma luz no meu campo de visão. Mas e daí, eu

não sou atirado mesmo. Quanta esquisitice!

Ainda andei pelo shopping onde ficava o

banco e dei umas voltas à toa. Pensei em

procurar o infeliz rapaz, revê-lo mas não tive

68

Enrolação


essa felicidade. Os segundos de surpresas se

foram, tiveram sua validade, eu sei, mas não

importa, o momento que tive foi tão

gratificante que já valeu a pena. O mundo

mudou, não está mais mudando. Olhei lojas e

fiquei passeando sem fazer nada. Era uma

manhã de sexta-feira e como não trabalho,

não sei o que fazer, nem por onde começar.

Talvez passear sem rumo definido seja uma

boa pedida. Vou vagabundeando devagar,

tudo pago. Ouço uma música.

Andava olhando para as fachadas dos edifícios

e pessoas nas ruas; seus semblantes cansados,

suas frustrações entrando nos prédios. Existe

algo, alguma fórmula para realizar algo

facilmente? Ser olhado me fez pensar em

como é bom um sonho. Ah, a situação do

‘ainda desejo’ a ser atingido. Do que é feito

um sonho? É alguma matéria, aquele desejo?

Tanto que se priva, você, para realizar os seus

anseios. Até mesmo perde-se a juventude e

deixa de lado sua essência, parecendo mais

vivido, a pele seca. Há algo que te deixa triste

e pensativo no quanto você sente-se menor

quando ainda está tentando. E esse meio

termo, entre o começo e o fim, é marcado

sempre por desilusões, perdas, resto,

69

Enrolação


preguiça, diminuição perante os que já

conseguiram etc.

Daí, quando você revisa tudo sozinho, na sala,

à noite, palavras sem palavras difíceis, tenta

cutucar a sensibilidade, brincando consigo

mesmo que quer dizer tantas coisas. E eu

quero — e poderia! — dizer tantas coisas boas

às pessoas. Mas há a barreira do

desconhecido, o preconceito. O sexo de

todas as formas é ambíguo.

São tempos também difíceis, só resta pensar e

atualizar-se. Mas não é fácil quando vem

alguém até você? Na prática sai diferente, é

mais penoso e solitário realizar. Ah... já não é

tão engraçado quanto na ficção. Peca na

impulsividade e você também erra? Ninguém

é mais humano que ninguém.

Acontece que há uma recompensa para os

infortúnios da vida.

O espaçamento faz desaparecer as coisas. Por

exemplo, quando acontece de me distanciar

de algumas pessoas, o isolamento cuida da

parte física e emocional. Os parentes, amigos

e mais vão e só fico eu, pois não me apego

com a mesma facilidade dos outros humanos

normais — sou autossuficiente e descolado. Há

algo em mim que faz sair das mesmices e

70

Enrolação


emoções da vida em sociedade, como um

freio antes. É como julgar dia a dia minha

insistência para ver se estou evoluindo, saindo,

indo além. Claro, não quero cair em amores,

ficar embabacado: seria um fim, porém outro

é negar.

Não quer dizer que não tenho ainda amigos e

entes queridos, paixões. Não, eu os tenho sim,

mas eu seleciono muito, quase como numa

chamada relação\perigo. Não sou uma

pessoa antissocial. Eu silencio e sou silêncio às

vezes... como a proteção de mãe; e essa mãe

morre com a família: a família é uma prisão.

Ah, como adoro andar pelas ruas pensando —

estou dizendo isso para anunciar alguns fatos

que acho relevantes no decorrer do

monólogo que tento repassar aqui. É um papo

meio de viado, mas como eu não sou mesmo

totalitário, olho pra frente. Ai, sou Carlos!

Ocorreu uma vez que, quando cheguei em

casa e logo depois fui ao meu quarto

passando pelos cômodos e fui iluminando, eu

vi uma luz verde — a noite fluía e as luzes da

casa estavam apagadas quando vim. Era uma

fagulha que aparecia ao lado da cama. Fui ver

o que havia e saquei que se tratava de um

celular ligado que há pouco recebera uma

71

Enrolação


mensagem, provavelmente mandada pelo

meu amigo — já falei dele, né? É o do banco,

bobinhos!!!! Naquela visão profética não era

só um celular ou uma simples mensagem de

texto, mas sim uma luz na percepção, sem

ambiguidades: luz nos meus pensamentos,

cacetada de doideira, aquela luz verde no

quarto escuro sem um complexo movimento,

apenas a oração da paz. Aí deu... Oração do

Rapaz!

A mensagem era dele para o próprio celular,

pois sabia que estava na minha casa. O tonto

esquece até onde enfia a cabeça! A

mensagem dizia que ele estava descontente.

Eu não entendi, fiquei gelado. Quase me

matei de tanto auto horror aquela vez, mas

algo me diz ainda pra colar um anúncio do

tipo: “Desculpe, mas eu faço cocô, xixi, solto

peido, arroto, tenho catarro, meu nariz escorre

quando estou resfriado; sou gay,

heterossexual, sensível e amante. Vou e volto!

Remeto à minha infância para solucionar

alguns tipos de problemas, portanto, tenho

ainda alguma inocência.” Queria revidar. Mas

não acabou, esperem. O que é bonito ou feio,

senão uma questão de padrão, modismo

imposto?

72

Enrolação


Tanta formalidade não nos levará a nada. Será

que ainda gosto dele? Queria poder dizer: “Se

você ainda me quer, apesar de ser instável

demais, seja como eu: sincero, porra.”

Há vida na simplicidade e cumplicidade da

vida? Eu não sei. Ele é uma pessoa tão

dramática — também sou um pouco

dramático, mas ele é pior! Será que é um tipo

de ciúme? E essa carta aqui, que achado. Ah,

cara... O que é? Qual foi??

Dizia,

““Aquele amor:

Te odeio como te amo, eles se mandavam. Ou

“Às vezes o que nos diferencia dos animais é

só o conceito!” Nossa, não sei se vou

conseguir, já é muito difícil falar desta história

para os outros, já que estive próximo desse

casal. São pessoas com experiências de vida

comuns, mas traumáticas. Seus nomes são

irrelevantes.

Durante vários dias eles se encontravam

ocasionalmente. Eram passantes que se viam

na rua e ignoravam mutuamente a banalidade

de seus rostos. Teriam outras vidas se o

“destino” não lhes tivesse “pregado uma

peça..” Tosco.

73

Enrolação


Suas relações sempre serão desse jeito: nunca

haverá fim, ou solução, pois está toda a graça

da coisa aí, mas sempre irão juntos

comunicando-se normalmente. Comentavam:

“Gostaria de poder encaixotar você e todas as

nossas lembranças na embalagem decorativa

que deu de presente só para abrir daqui a 50

anos, para, então, poder voltar a te amar e

recomeçar e lembrar do nosso jeito jovem de

ser, mas já maduros com nossos 80 e varada

anos”““

Que isso? Tem alguém me zoando? Foi ele.

Com certeza, está mal. Deve ter ido pro bar de

novo. Eu aqui egoísta e ele sofrendo pedindo

atenção. O que faz no bar de novo, meu caro?

Toda vez que te reencontro, querido, sinto

nosso vazio podre. Precisamos preencher. Já

tenho até vontade de te matar, quem dera.

Nossa história sem fim demorou a acabar. Mas

somos nós os vencedores e perdedores. Já

temos liberdade, libertinagem e linguagem.

É que te prefiro bem longe do meu corpo e

ainda perto do meu carinho. Já nos

escrevemos cartas idiotas, mas não demos

flores, nem cedemos ao pesar. Tudo está

como somos: duas tartarugas egoístas!

Lembro da frase “Somente por você faço

74

Enrolação


idiotices e não preciso de um namorado, e sim

duma mãe.” Tuas teorias, as piores.

Há algo de comum em suas tragédias; até os

cães sentem medo. São como andarilhos

desgarrados das matilhas. Isso sim eles

portam: inveja, medo e insegurança somados

a proteção mútua.

Este deveria ser um poema de tendência, mas

está cheio de imperfeições em todos os

sentidos. Olha... acontece. O corpo humano é,

na realidade, uma máquina imperfeita. Ele

prega peças, doenças, vícios.

Se me ouve, se ficou com dores de cabeça,

nem sei. Não sei amar! Aquele amor; te odeio

como te amo. Se você se divertiu, legal. É o

que importa. Seria melhor ignorar, pra gente

ficar melhor. Vê só esse nosso mundo, tem

tanta coisa a ser discutida, que fico com

vertigens. Pede outra breja, querido. Pede

“Por favor”. P-OOOO-R FAVOR. Você acha

que tenho um romance moderno nos bolsos?

É sina... critique.

Vejam! Por que isso aqui na minha casa? No

final nem vem escrito nada melhor que:

“História feita por duas pessoas.” Esse diálogo,

ele tem partes comuns, muito parecido; os

atores foram treinados sei lá por quem! Ele

75

Enrolação


que deixou de propósito? Só pode ser.

Vida insípida. Morto eu não produziria mais

nada. O rapaz quer isso? É preciso tanto pra se

dar valor a algo? Ferrei tudo, né?! Ainda que

como uma estátua em minhas preces e até

projetos, sou usurpado. Um pensamento por

cada fim de semana é pago; passa a vida e a

vida depara-se igualmente insípida.

Transcender, estar superior, exceder meu

vigor, minha função na cadeia alimentar. Há

um campo gigantesco no mundo da

imaginação e, posteriormente, no das letras. A

besteira da escuridão do fechar de olhos é o

canal vazio que nos faz ver como é na cabeça

tola! Ele não sabe disso, é uma pena. Olha pra

luz, mais uma vez ela é verde.

Andar é bom. Ah, aquela fagulha: será que

alguém vê, ou lê como eu? Posso até sentir a

tristeza de galinha d’angola. Que pesado.

Ouça a música, de todas, a música. Force a

música, crie, dentro dela. Ouçam você, a

cadência, ritmo. Desliza nela, vai

impulsionado. Eu sei, é por causa da claridade

que a luz traz nas nossas mentes, como uma

verdade. Percebe, somente assim podemos

realmente ver que entre o passado e o

presente, vence o lado obscuro. Andar é bom.

76

Enrolação


Amanhã formulo uma outra desculpa. Eu não

sou santo! É difícil entender a liberdade? Tô

fudido.

77

Enrolação


Tião Bocanegra (As presepagens desse infeliz

gozador)

I

Minha garota me largou e cá estou de volta ao

bar, pra unir a cachaça e o pito nessa

brincadeira do destino! Corpo fechado

húuuuuuu-úh-úh! ê ê bebolê á, vai dar merda!

“Água do mar, água salgada, alivia meu corpo,

limpa minha mente e afasta as angústias que

eu posso ver agora.” Segura essa lá do

passadão!

Ah, sim, não me condena, cara, eu voltei a

fazer piadinhas com os outros, sabe, soltar a

língua. Ai, ai ainn eu não tenho pena de

ninguém, nem mesmo eu sei o porquê! A

diferença é que agora tenho um emprego

FICHADOO! “Ah mas você não vai debochar

disso, tem é que agradecer por ser mais um

ferrado quando arruma carteira assinada.”

Seria pra pagar pensão ou disfarçar a

tornozeleira? E fui mesmo! eu arranjei. Nada

de papai, mamãe, quem indica. Apenas mais

um quebra-cabeças dessa lata com soldo, falo

diante de uma garrafa de cana!

Como o estacionamento do Hotel M contratou

78

Enrolação


logo a mim, isso é um mistério da decisão

deles. E vou contar um pouco do que se

passou naqueles tempos, entre frescos e

marginais, homens e bestas. Mas vamos nos

divertir sem pretensão!

Já sabem, tá ligado que... eu TRABALHO

MESMO! E NÃO SOU BAJULADOR, MAS

TAMBÉM NÃO SAÍ ILESO!! Essa é uma

descrição sumária desse aqui pobre

guardador de carros que vai de bicicleta e

ônibus ao serviço.

O estacionamento é um recanto cheio de

manias. E puxadores de sacos, tem que frisar!!

Se liga!!! Na entrevista de emprego dentro da

repartição, o carinha do RH pergunta:

O senhor já sofreu algum acidente grave? — E

deu pinta de sério. Por dentro eu já gastava!

Sim. Quando servia ao exército, participei

duma batalha simulada e um tiro atingiu os

meus tes..tículos. Ô Deus. Tive que extraí-los!

— Disse, segurando meu riso. É difícil pra mim

mas tive que aguentar esse tipo de vida.

Meu Pai amado! — Exclamou o entrevistador,

sem conseguir disfarçar a piedade e a

preferência.

Bem, o emprego é seu! É isso, está feito. Nós

chegamos sempre às 8 da manhã, mas você

79

Enrolação


pode chegar às 10, se quiser. Tudo bem.

Mas por que eu vou ter esse privilégio,

senhor?

É que, todos sabemos... então, é... — E olha pro

lado disfarçando o suor derretendo a cara de

asco. E continua do jeito que conseguia: — O

pessoal fica sempre a pelar o saco duas horas

antes de começar a trabalhar! Cafezinho vai,

cafezinho vem. Não faz diferença, só tem que

manter a ordem, tem mistério não.

Ah é, deixa comigo. Eu só coço o bigode!

Viram? Foi moleza. A gente até riu do

embaraço.

SOU EMPREGADO, AI, MEU SALÁRIO, QUE

VALE REFEIÇÃO! COMER TODO DIA!! Assim

eu sou. Que charada dá? Se na sequência para

cada palavra existisse uma letra, então eu vou

contar essa história também nos eteceteras.

Que seja tão mais real do que a minha! Tenho

que florear, te falar que a minha é chata pra

caralho!!! Pelo menos eu acho algum troço.

Vou chamá-la de espelho desajustado. Ouvi

com uma música legal, feita por meus ídolos —

a INQUIETUDE fracassa no refrão. Gostaria

que fosse a trilha sonora aqui na cabine, essa

tal canção; chamamos de Ogum baridão.

Saudaremos de novo, tomaremos mais umas

80

Enrolação


cervas e fumaremos cigarrins menos vagabas.

E assim que terminar, vou olhar pro meu lado:

lá vai tá AQUILO QUE TUDO QUERO! Relaxa

ô! Tudo que é ímpar é mais simples!! “Ó meu

andar todo em poesia, da pouco pedante,

entretanto benigna.”

Ahhhh, as velhas abobrinhas, os finais

conhecidos, ofícios. Espero muitas vezes o

inesperado, coisas que nem podemos saber.

Cara descorada, vô dá uma guinada nessa

parada. Quando termina a atividade, o

trabalho saúda o ócio, bêbado de café. Mas eu

sou o de sempre: o cara do humor seco, o

tímido da zona pobre da Blumbléindblag. Ali

tem barriga roncando, sinfônica, famigerada.

Alguém aí já ouviu falar da minha cidade??

Mas lá pertin das bandas de chão de barro! Eu

vou indo ô, e volto todo santo dia. Castigo da

porra! Mas é isso ou a esmola, auxílio.

Devo dizer que Tião abaixa a cabeça meio que

zonzo, lascado pelos drinkes e tuuuuúmm

Talagada! E levanta algum copo.

II

Brilhou nova manhã, cantou um canário, tomei

meu café. Logo zanzei até a portaria 3 pela

corrente de sempre e trabalhei do jeito que

81

Enrolação


dava. Só por esse dia fiz o sacrifício, quisera

fosse feliz! “Ando vivo. Meio que na pindaíba,

mas cafajeste.” Só quem fala essas bobagens

é os Zorratoral.

Eu vou contar essas histórias, agora vai! São

minhas e de todos, com certeza um de vocês

já se lascou nessa linha. A soma dá sei lá o quê,

o número um, uma bosta! Ou melhor, a

apresentação, resumão da cola de tantas

vidinhas. São cenas de Blumbléindblag, esse

lugar que vai lá e cá e rodopia na ida ao

trampo. Balança a condução, vira geleia nós

tudo, transbooorda

A) Veio de carroça o infeliz, veio da ruela de

terra batida, barro até as canela. E gritou, a

língua presa, meio que como o Romário

passando no ponto de ônibus: “BLUMBLÉIN-

CENTRORIO 2REAU!!” Todos desataram a rir

do comédia. “Meu buzunzum é o que nunca

vem, eu gritei, ônibus todo rebentado, lata de

sardinha na mão do Diabo, ô Ô!”

B) Jagunço cabeça oca brigando com

caçadora na entrada do centro comercial

lance evangélico durante o louvor do

entusiasta pé de chinelo, o pastor Seu Moacy.

Quem tem razão? O do livrinho ou o

arrependidinho?

82

Enrolação


C) Contrabando e pirataria debaixo das patas

do menino-peixe queixoso. Lek camelô,

alguém quer a bananada dos teus desejos??

Partiu comer lixo?

D) Marginais, imprudência, imperícia ou

negligência, a porra toda voltando pra casa

saídos da estação do terminal Rodoviária,

geral vindo do presídio da Central do Brasil,

esse que conduz as almas pra outro dia no

Jardim Paraíso. Aqui é Nova Iguaçu, porraaa

E) Pipas cruzando, cortando-se no céu do

município descalço chei de rachaduras nos

pés, enquanto o guardinha de frente da escola

da Prefeitura passa um trote no orelhão da

Telemar. De repente a plateia faliu e os

aplausos continuaram

F) Vanderlei, furúnculo da família, meteu o

bedelho na zona do meretrício!! E arrumou

filho lá mermo e não pode mais sair, a pensão

tá no app!

G) Caminhoneiros buzinando na estrada pra

adolescente feliz e proeminente — ela no sol

de 40 graus, sensação térmica suando o

bigodinho. Tou chegando, tou passando.. o

circo dos doidos me acompanha, desfruto a

passagem. Sô um filho de Blumbléindblag!!

Crateras, buracos, furos e desocupados que

83

Enrolação


esqueceram como se escreve o nome do

Beco. Ahhh.. um filho de bléindblag; índios

esmolando, índio vendendo miçanga em

Itacuruçá! Ô!! Aii.

Nisso, em meio a essa loucura, relembro do

Tonhão junto da minha tia, minha ex, tudo

bolado né, meu braço. Quem lembra dele, do

Tonhão chapa, heim??? Porra, que tapa na

cara e bandão o safado levou!

“QUAL FOI, TIO??”

VEM JEQUE TCHAN, QUE BATALHA! Waldir

Vs. Tonhão. Waldir, o PM. Tonhão, o

delinquente... correndo pra caceta, subindo a

estação de trem pós Tonhão ter metido o

bedelho no “celular” da Luzinete, aquele “cel”

maneiro. O objetivo do Tonhão é chegar a

Cosme, fugir pacas e chegar na Vila. Waldir tá

ventando.

— Ô ELEMENTO! — Berrou Waldir. Tonhão

mudo mas ofegante, correndo. Súbito um

trabalhador estica a perna e Tonhão cai igual

uma jaca velha, o visor do celular trinca;

Tonhão emputece pacas e espatifa o aparelho

no chão, a merda voou por todos os lados.

“Nem fudendo..”, resmungou em

pensamentos. “Olha essa porra!” Nisso, Waldir

chega. Vem logo dando um tapa na cara e um

84

Enrolação


bandão, ao mesmo tempo, coisa que nem

Bruce Lee sonhou em fazer. Tonhão

destrambelhou igual boneco de posto de

gasolina. E esquivou-se o que pôde! Sim!! É

milagre ô. E nem foi à lona, se balançou do

jeito que dava. Um misto de riso e

preocupação entre os que esperavam na

estação. “Alguém bota no Face, vai.”

— CÊ É VALENTE, É? — Gritou Waldir, altão. E

continuou: “BÓRA, CARAiii, DESEMBUCHA!!”

Tonhão ergueu o que tinha, depois tomou

mais chuva de saliva do guardinha. Nem

percebeu se pôs ou não a mão no rosto.

Ofendido, limpou a lata, só que leva mais um

bandão. “Pra ficar esperto”, zoou o

trabalhador que ajudou o Waldir. “Esse

merda”, agora todos gritavam.

— Ê, CIDADÃO!! GAROTO LEVADO,

ROUBOU, NÉ? TÁ FISGADO. — Falou Waldir

mirando os olhos do Tonhão. “VAMO LEVAR

UM LERO, LERO-LERO, ENTENDEU???”,

completou, num tom mais intimista.

“CACHORRADA TUA, HEIM.”, falou mais o

Waldir pro sufocado Tonhão. Tonhão lascado.

Atmosfera de caçoação. Tonhão já se

imaginou sendo zoado, sacaneado na viatura,

ou tudo ao mesmo tempo. “Vão me amaciar

85

Enrolação


na viatura.

Daí Waldir algemou o Tonhão na grade e foi

chamar o camburão. Não deu nem tempo de

reagir a nada e já tinham formado um

formigueiro duns 20 em cima do Tonhão, todo

mundo fuxicando. Tudo embolado, um

batendo e saindo, um esbarrando no outro,

loucos pela oportunidade. Tinha cachorro

latindo e mordendo, feno, poeira, velha

jogando chinelo. O som dos grunhidos

rolando, e no meio disso ouve-se um perdido

gritar “Vô botar na Net, rapá!!!” Pobre

paçoquita humana, nessas horas, suplica um

abraço! Foi fotografado de todas as formas

possíveis com tudo o que se via na frente.

Depois só se veriam câmeras e mais

postagens, sem ter tido ele oportunidade de

se defender na hora da crucificação.

Pipocavam no Zap. Também levou chutes,

socos, pauladas, pedradas, e desmaiou. A

loucura toda ao mesmo tempo. Arrastaram,

cuspiram, mijaram, organizaram o ódio que

tinham que extravasar!!!!! Pena, tem gente

que parece que só passa por esse mundo,

nem desfruta dele, vira chacota. Nunca se

sabe o que se passa nas estrelas, tá foda. “Esse

rapaz teria que ter acompanhamento

86

Enrolação


psicológico, depois, na cama”, refletia uma

senhora que estudou, mas quem disse que

isso aqui é um conto de fadas, pô? Vocês

querem é o sangue dos outros.

Bambambãs, os transeuntes, seguiram

sorrindo, papeando enquanto o trem

estacionava. Eu era um deles. Aquilo me

inspirou. Li até um pouco deste “O Macaco e

a Essência”! Esse livro chato, ah é. Waldir,

quieto, somente mais um PM, o bocal do

telefone virando pro lado, “ESQUECE,

REPITO, ESQUECE, MANDA O SAMU,

DEPOIS EU TENTO EXPLICAR.”

A seguir eu falo junto da galera ali:

— Ei, coé, mais uma dessa daqui, um corpo cai.

— Um copo cai??

— Isso, preá.

— Ah tá, achei que não tinha na estante.

— É que tem que virar a página, temos, hunnf.

— Eu hein. Fala troncho.

— Na boa, já viu aquele filme, Dranquem

Maste?

— Macha o quê??? Sai fora, macho véi, te

respeita.

— Caganomato, Bil

— É japoneso, tchaina partida ao contrário?

— Cê doido, mano ahahhaha

87

Enrolação


III

“Se eu já fui pobre, nunca nem lembro”, né

bacanado? Os lascados que se enfiem nas

latas, tá certo. Engarrafamento de 2 horas

desde o Joá pra chegar do HM, depois e

depois, sei lá. Agora chega de falar de patrão;

teu chefe te mastiga e cospe na mesma

velocidade que coloca outro besta no nosso

lugar!!! Eu imagino é o Tonhão fugindo da

polícia. Podia ser num momento desses de

deslize, com um pneu furado, mensagem de

áudio da patroa. Tonhão sai pra ajudar e corre!

Dá certo?

O cerco tá fechando, assim como fechou pro

açúcar mascavo, no passado, aniquilado pelo

açúcar com refino. Uma merda puxa a outra e

belisca a seriedade do lazer alheio, se um dia

a caça tá em pé, no outro entra na bandeja e

papel filme do Guanabara – se liga nas

remarcações e etiquetas vermelhas, vai tomar

volta.

Pra variar, agora eu posso ver na mente.

Peguei minha tia na cama com outro, fazendo

um malabarismo muito do cabalístico, toda

despenteada, durante o jogo do FLA x FLU;

não tinha mais Tonhão, kkk, e descobri que

sou filho dela, é que temos uma pinta na

88

Enrolação


nádega esquerda, daí né. O lance é que

também descobri que ela é avoada. Todo o

tempo enganado, TUDO DE CABEÇA PRA

BAIXO NESSA ZONA!!! É só pedrada essa

vidinha, todo dia é uma graça nova pra lidar;

seria isso o dedo zombeteiro da evolução me

forçando a arriscar?! Existe cirurgia pra trocar

de genes? ? Engambelado pelas evidências,

resolvi então me vingar.

Logo parti pra cima dela, me deixei levar

totalmente pela raiva enquanto atacava.

QUESTIONEI TUDO!! Enquanto isso o cara

foge, claro. Valeu, padre, ela vai te ligar!

Arriei minha mãezinha no chão, ela, meretriz,

mãe, mulher, ativa, mas e eu, como fico???? A

mãe dos outro vale não, pô! Me abraça, me

beija no rosto, suplica que eu entenda o lado

dela, sinta teu suor. A saudade me consumiu

mermo! Era uma ausência de vida, as

aventuras alheias, o complô que tinha sido

essa tal de vidinha, esmolando carinho que

num vinha. Personagem secundário da minha

estirpe, ahhh!!! Olhei em seus olhos. Enfiei

minha língua naquela boca sei lá por quê.

Beijei mãezinha ela até tombar e dei o último

presente: Disse “tchau”.

— Comeu meleca, ô doença? ?

89

Enrolação


— Eu não, isso é pra tu ficar esperta com essas

muxiba aí.

— Te rasca daqui!

— O progresso não pode parar, minha Seora,

só não se deixa no perigo.

— Eu que te fiz, já deu ruim.

— Querem me encarcerar, dar prisão

domiciliar e me emputecer todos os dias. É

incrível como a imaginação das populações se

deturpa, como as pessoas se tornam

comediantes delas mesmas. Personagens de

si mesmos, diria! Mas quem sabe quem sou???

Quem vai me fazer pôr o rabinho entre as

pernas e me mandar? A última piada é minha

mesmo, assim como grátis.

— Taca o pau, doido.

— É sobre isso kkkkkkkk

— É nois ou os outro. #VazaMitinga

IV

“Outra coisa, Tião, sossega o facho e fala

menos que tagarela tu é poeta!”

Depois que passou a maré veio a saudade,

aquela caganeira fantasiosa... lembrei de

quando eu era menino e fomos numa viagem

de barco não sei pra onde na Costa Verde, e

eu, tonto, sabe-se lá como, entrei debaixo da

90

Enrolação


saia de uma jovem a fim de me esconder. A

saia era grandona e eu me enfiei lá, abraçado

à perna dela. Era tudo vermelho, huuumm. A

visão, os cheiros, não lembro bem. Lembro

mais de como aconteceu ligeiro. Parece até

sonho, e minha “mãezinha”, “tia”, não sei ao

certo, correndo atrás de mim, envergonhada,

pedindo desculpas a todos. Por quê? Acho

que a garota da saia nem ligou, serin. Tava

com cara de que ia pra igreja não! Não ia

demorar muito pra ficar de bikini na praia; as

pessoas se fazem de pudoradas mas umas

ficam secando as outras na praia. A água sim é

democrática, e sensual, as pessoas querem se

ver na bagaça.

Assim de pileque, com o bafo de pinga

incomodando a galera, queria falar com

alguém real, esquecer tudo papeando. “Vai ter

que andar com olho nas costas”, ecoava nas

minhas feridas. As menina não perdoa! Depois

de trucidar em abraços e beijos de beliscões

minha mâmi, por que num esvaziei o

refrigerador que tenho ao lado da

churrasqueira e enfiei lá a maior quantidade

de mais cerva que se pode comprar nos

botequins da Existência? Sorte que agora vivo

sozinho, tipo um papai que nos abandonou

91

Enrolação


faz tempo, os répteis fazem o mesmo, tá

ligado né.

“Fala, trouxa!! Te deram habeas corpus, tava

fedendo já na geladeira??”

“É de família, seu animal!”

“Bora, feipa, tu não é estranho não, só não dá

muito pra ficar perto.”

“Então vai pra casa, tosco, fala comigo na rua

não que me envergonha.”

Meu primo é gente boa, ao ser questionado

pelo barbeiro como queria o seu corte de

cabelo, respondeu “Em silêncio.” Mané

saudosista! E resignado fico eu também

relembrando toda essa lambança!!!

Levanto mais uma vez o copo já que a barriga

ruge e desarma procurando o que comer,

pensando em como seria a próxima vítima.

Vou é lá no Risca.

O ambiente em si tinha a depressão pra

satisfazer, olha******** pelo menos não te

enchem o saco até você se atirar pra lá. Numa

dessas viradas então me deparei com o

inusitado, o que logo depois apelidei

artisticamente de Ode na Garrulitas vulvae.

Uhhh xaxahh, agora é sério, é porque uma

ricona lá do hotel que queria me comer tava

bem ali secando sem balde. Ah, a piada me

92

Enrolação


escapa, opa, ajuda aê, tá lisow!! Vou fazer que

nem pescador enrolando tudo quando o

peixe tá molhado e escurrega.

Ela veio com aquele papinho, começando por

pedir uma informação que eu nem entendi,

ahhh tola, dessas que se a pessoa parar pra

pensar logo descobre, mas precisa, PRECISA,

perguntar prum funcionário. Toma aqui meu

crachá. E ela gosta da criadagem pra dindar,

e eu faço parte da criadagem. Eram sutilezas.

Dinda lelê, faca no meu pescoço!!! Mas na

hora de casar, ter os filhotes, ela prefere pegar

um ricaço como ela. Ladra! Isso sim é uma

ofensa grave!

Logo disso, a gente escapuliu pra casa dela,

chegamos de moto.

Eu na sala, véiiii. Pelos miados de cio e pela

roupa que a dona chegou exibindo,

compreendi que se tratava de uma

dominadora, huhhh..

“Mas fala aí, oi, que disse mesmo?”

“É a música alta né, benhê.”

“Isso, é me excita de verdade!”

A gente riu porque já tinha se ligado. Nem sei

se vou arrancar desse mundo uma doida

dessas, o ser humano precisa, PRECISA, EU

DISSE, DISSO Ó. SE PEGARR. Levantou a saia

93

Enrolação


e fez aquela cara de gata miau, quase uma

caricatura dela merma, falando sussurrando,

arrastando por onde conseguia. “O pecado é

uma invenção!!”

“Blau-blau”

“Ajustadinho, hãrran.”

“Que beleza tá fazendo aquee.”

Huhhh, vestida toda de couro preto, o elástico

ao vácuo no corpo. Parou e se entortou como

fazem as modelos quando chegam ao final da

passarela mostrando o quadril, e voltam,

rebolando. Linda, maravilhosa, mandona. A

pura mordomia. Uma mulher de verdade, não

os tribufus que se encontram por aí. Acima de

tudo, ela tinha um tipo de classe, sabia o que

fazia e por quê para estarmos ali. Esse tipo de

mulher não perde tempo, me encheu logo de

cordas, eu parecia um porquinho

descontrolado que a sociedade não pode ver

livre, mas de jeito nenhum! As coisas foram

controladas lá fora, vocês é que não sabem.

Outra cena, eu tô com a cabeça erguida, olho

pra cima. “Eu decido as regras do jogo”, ela

disse no meu ouvido, rude, doidinha pra dá

um cruza chei de polêmicas. Só faltou eu

babar, hahahahah! Tava pronto pra latir e sair

correndo por aí despretensioso! Ahhh toma

94

Enrolação


Me açoitou com chicotes e uma tal de xibata,

tamerda que me deixou foi o corpo vermelho

igual tomate da estação. Cuspia na minha fuça

essas verdades, e dói. Fica mais vermelho.

“Como pede perdão, benzinho? Fala pra

mim.”

“Éééé”

Depois se banhou inteira de goma, pintou e

bordou comigo, uma melecasi boa — no outro

dia veria chupões que se formavam — ia ser

notado, os maluco perturba. Ahhh.. o M é um

clube de swingue pra todas as modalidades,

mas você ainda não sabe o detalhe! Eu me

sentia naqueles labirintos desses clubes, KY

pelo chão, mas nem tinha saído do lugar, e já

me deparava com as pequenas surpresas que

vinham sem pedir, era só estar ali. O ambiente

era saliente. As coisas já foram mais fáceis, era

só passar a mão na barba e olhar através da

gente.

“Eeeu sou uma dedicada, sem limites, apenas

prazer e dor. E você é escravo rastejando.”

“Quero. Era eu, leva na coleira, rumo à cruz

improvisada. Cacete, o que o conchavo num

paga, cara?”

“Shiii, eu na cruz de San Andrés, olha porra!!”

“Como ela arrumou um troço desses aqui???”

95

Enrolação


“É minha casa.”

“Saí mermo com uma dondoca. Tinha que ser,

realizando as taras da presunçosa com o

proletariado que na terra dela NUNCA se

misturaria.”

“Anilingus ni mim!”

“Agora confirmo mesmo que esse pardieiro

de hotel é um clube sádico, masmorra

anti++cotidiano!”

“Você tá vendo.”

Ela tateia e acha uma caixa de fósforos.

“Acende logo isso, bafora na minha caraa. “

“Fuúuússsss”

V

“Apaguei, vem cá amor.” Aí, vi quando ela

FICOU ALUCINADA, ARRANCOU AS

ROUPAS, RETALHOS, NÉ. ME TIROU DO

CATIVEIRO E ME OBRIGOU A COSQUIÁ-LA,

NÃO SEM ANTES ENFIAR RAPIDAMENTE NO

CORPITCHO UMA ROUPA DE ONÇINHA.

Esse troço era engraçado, é que além do

rabinho vinha com uma máscara de raposa,

como o olhar, má! Também não entendi. Mas

rimos demais, tava valendo.

“Tomei um negocinho que funcionou mermo

foi como um afrodisíaco pra gente ahahaha”

96

Enrolação


“Então é minha vez, eu com o motor possante

de jovem, ahhh garoto!!!”

“Idiota.”

“Manda aqui.”

“Glutiglépglép.”

Pra coroar a noite dos deuses, ela pediu o

constrangimento na garganta.

“Uma rainha merece o melhor!”

“Sou funda, sabe!?”

“Oxxi tô esvaziado.”

“Depois peço comida chinesa. Mas tudo fino.”

“Alguém me ajuda a entender, porque não é

sempre assim?!”

“Pega aqueles copos ali, vamos beber mais.”

Na segunda garrafa a gente ventava muito.

“Tô chumbado!!!”

“Eu também, aqui ó, no caminho.”

“Passei aí.”

“Hahhahaha, babava, babaca, ba-ba, isso”

“Se liga, se o cachorro tivesse religião, qual

seria? Cão-domblé.”

“Comigo também.”

Ela senta no sofá, eu ainda estou de pé

zanzando.

“Sabe, um anão pentelho queria me vender

bugigangas, na minha solidão essa semana lá

no HM, quetin, quetin, enquanto tava

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Enrolação


querendo é ir na praia do L. Me infernizou o

moleque. Puxou assunto, coisa que me mata,

puxar assunto assim sem mais nem menos.”

“Nem te conheço, pou!”

“Disse que era Idalécio, que a mãe gritou

“Menino, cuidado com a biciclet..” PÁFT! e foi

assim que ficou com aquela cara torta e

murcha e sem sal; disse também que já foi

pedreiro. E ria sei lá de quê.”

“Provável que tivesse se lamentando da vida

que tem, ou te sensibilizando.”

“Varaio, logo comigo???”

“MAS, PUTA JACA QUE ME PARIU, TENHO EU

CULPA DA SUA DÍVIDA???”

“Pra você é fácil, só balançar que chove

macaco velho ostentando as notas.”

“Eu faço o que dá. Se manter na academia

custa, tá, eu sou esforçada.”

“Eu vi, mas ouve. Os pobres coitados são

assim. Soma o fantasma do consumismo de

domingo, gringo desavisados, e o cara

mendiga na praia. Quer que as pessoas

ajudem purificando eles seus pecados. Dose

pra leão!”

“E tu fez o quê, fez o difícil?”

“Dei um berro mesmo também com motivo,

nem sei o que me deu.. Acho que foi estresis,

98

Enrolação


pode ser. Pura vaidade. Hoje não teve

glamour, foi só aquela coisa “Uh!!! Grito

abominável!” Hunf. Onde foi, a hora, essas

coisas de detalhes, num vô revelar.”

“O bom sarro é um mistério até o fim. Ou não?

Ele fugiu?”

“Sim.”

“A agitação denunciava o medo de partir.”

“Idalécio encheu os olhinhos, irrompeu a

choramingar; eu tava com saco plástico do

sacolão da esquina lá de casa, aquela

espelunca da dona Xepa. Entreguei minhas

compras do mês pro menino e corri que nem

queniano! Silencioso e besta como um chifre

de boi na cabeça do maridão! Fiquei roxo,

zero fôlego. Sem o saco plástico, onde vou

colocar meus chinelos??

“Cara, você tá muito doido.”

“Achou que eu ia fazer isso? Foi a piada.”

“Que merda, aff.”

“Eu vou continuar romantizando.”

“Vai, Rolando.”

“Boa!”

“Heh.”

“As lembranças ficam nítidas na minha cabeça.

Eu me pulverizo, eles se pulverizam. Só não

queria ser interrompido, só isso.

99

Enrolação


Incrível como, na hora, enquanto executava as

peripécias da fuga, lembrava toda hora da

cena dum filme podre em que um matuto lá,

Zé da roça, sei lá, cagava no mato e limpava o

rego com folha de espiga de milho.”

“Hilário, foi a analogia do povo brasileiro.”

“Sei lá, vai que mudam de postura.”

“Só nunca.

“Enfim. Acho que era lá nos confins do interior

do Espírito Santo. Acontece contigo? A

bostalhada toda era siiiiiinistra, ops, falei foi

palavrão demais!!”

“Se lamenta não, já tô me alisando com tudo

isso. Tu curte uma visão escrota né!”

“É meu lar, fiiia.”

“Vi também nessa mesma ocasião a mosca

varejeira dos meus sonhos pousar na minha

marmita, ahahah. Gostou?”

“A mosquinha bailava na carne fresca e

retalhada que vai ficar verde. Foi-se o orgulho

do açougueiro!! As larvinhas logo crescerão

fortes e desprezadas pelas redes de

supermercado.”

“Coloca no Insta.”

“O Idalécio? Pobre rapaz, vítima da vontade

pura e simples de viver e trampar. Somos

parecidos? Talvez. Que loucura! Nem foi por

100

Enrolação


maldade, cara, foi porque aconteceu

marromenos.”

“Esse guri era o mosquito dengue da

sociedade! Vesguinho da silva, cegueta,

mirolha, a porra toda mais.”

“Vai nessa. Um dia ele voa mais que a gente.”

“Nesse estado? Ah vai, pode ser.”

“É. Saí pra andar e esfriar os miolos, fui pra

outro lado. Parecia como aquela vez em que

ganhei a aposta e fugi logo do centro da

cidade, queriam minha cabeça na panela pra

cozinhar, ia ter nada que eu falasse pra

suavizar não.”

“Devorar teus miolos no sábado.”

“Tá, mas já deu isso de discurso, volta pra

cama. Só te digo que a teimosia vem de

família!”

VI

Em algum dos vigésimo andares do edifício,

aqui no parapeito, ponto cego.

Pensei bem. A pegadinha causa! Planejo

agora uma viagem de férias pra Bahia, é! Tá na

hora de conhecer minha família, os

antepassados!!! Vou dá um tempo longe, pra

ter novas ideias. Pintei e bordei pra caceta, ôxi.

Olha só, eu sou um cara cheio de manias. Uma

101

Enrolação


delas é fazer coisas pra mim que não sei

direito se terão utilidade nem lucro real.

Lembro das tarefas. Eu sou um especulador,

mas também posso trabalhar sendo chamado

de dedutor, tomara que não estranhem essas

coisas a mais aí que eu digo. Estou a trabalho

e isso é o fim. Me tranquei em pensamentos e

cheguei a essa conclusão:

“Na verdade, tudo o que fiz ou senti, enquanto

Ser — e, logo após, disse ou registrei — é mero

devaneio de não saber nada, droga nenhuma,

acerca de nada do mundo físico que me cerca,

nem do depois da morte. Aqui mesmo, o que

acabo de escrever é um chute — inventemos

mais, putada! —, na mesma linha — que ridículo

— quem sabe quantos antes de mim da mesma

forma chegaram a tal ponto.”

Gostei desse troço de disfarces. Acabaram-se

os meses de tortura, doença desconhecida,

alergia, radiação, de monstro ocultado!! Uma

pensão pro funcionário escondido e

observando!!!

Eu me largo dali, desço e chego ao vestiário

pra tirar esse uniforme. Da minha baia ouço os

outros caras da firma:

— Tava uma coceira chata.

— Qual foi?

102

Enrolação


— ISSO É PRAGA DE EX-MULÉ, SÓ PODE!!!!!!

— Deu ruim aí, mano loco?

— Digo isso porque, é, te falar hein, eu peguei

uns pélassaco

— Compra aquela para que vende no trem, é,

gincobiloba não

— Arnica.

— Manocu, tá osso.

— Foi por causa devida da impotência, medo

de mulher, nerlvoso pra num falhar na hora H.

— Nada a ver isso.

— É, trouxaa, te falano.

— Cara aqui é médico, aqui ele tá como

infiltrado, né não, detetive?

— Tsic. Deixa que eu explico melhor: comecei

a sair com uma vendedora de camisas de

estampas de pagode tipo Rassa Negra,

Moleju, Catingueulê, essas paradas.

— Rita, tu é velho, tem uns pagode novo.

— Queeeto.

— Na época em que eu me refugiei de licença

lá no morro do Dendê tinha essa Eva, linda,

colorida, estilosa, cheia de tatuagens de

estrelinhas e com um sorriso macio, a ruivinha

da farmácia do Povo. Eva ela!

— As mina rabiscada é da hora!

— Tamo ligado.

103

Enrolação


— Eu tinha há pouco terminado um

relacionamento de três anos e varada e queria

mermo é me divertir, sair com uma mulher que

fosse mais viva, agitada, sem não-me-toques e

que não ligasse.

— Como eu.

— Quem te come?

— Kkkkkkkkkk

— É igual que eu, animal!

— Pras trivialidade.

— Vida é zoada mermo às vez.

— Odeio velhinhas, sacou!

— Parece as barraqueira lá da rua. Dá uns

tranco nos filho

— Hahahahah, Junio é muito engraçado.

— Aí, papo vai, papo vem, e chega o momento

de bimbarmos.

— Tá falando da recente?

— É.

— Claro hihihihii

— O lance é que assim fazem os vivos, né. Eu,

com medo de me distrair, odiava colocar

camisinha, já que com esse troço eu não sinto

a pipa na carne, e então num estimula o

necessário.

— Eu também, bagulho é na pele.

— Por isso tá ae com bicheira.

104

Enrolação


— Daí, depois dos amassos, beijos, mordidas,

porrada de beliscadas.

— E dedadinhas!

— Ahahahhahhahahh

— Guenta, ouve o mano.

— Insisti, e ela, já cega de fogo e duma mistura

doida que eu fiz, vinho Canção.

— Ah, o tinto suave.

— Pronto. Coloquei vodca Natasha e Montilla,

chamei de licor de Petrói; quer provar o licor

de petról?? Porque dou uma de barman de

vez em quando. Daí, ela roçou pra mim na

pele com pele, desenfreada. Gozamos

portada de vez.

— Horrores.

— Hihihihihiii tu é um pepeca mermo.

— Ainda que no começo tivesse é meia bomba.

— Te acalma, tonto.

— Mas quem vai desconfiar que a minha nova

menininha tava já infectada, sabe lá como?

— Onde será que passam essas gentes, ô

Deus?

— Atividade.

— Logo ela, nem aparentava treco nenhum.

— E é isso.

— Esquenta não, mano, vai passar.

— No ruim passa creolina.

105

Enrolação


— Boa!

— Agora só dois caçadores rumo às portas do

inferno na Terra!

— Mas deve ter válido à pena, fala tu.

— Coçamos o dia todo. Mas a gente num tá

nem aí

“Purrummm, fóinn”

— Lazarento! Pediram da baía, vai feder bem!

— Tá ruim teus primos, mano, nem terminou a

frase. Pior que nem dá pra ver o meliante.

— Vai empestear. Tampa os nariz e abaixa a

cabeça.......

— Pó já deu a hora de passar o cartão, boa.

—Já é, partiu.

— Bora, seus chora no banhoow

E saem rapidamente, rindo uns dos outros. Já

ouviram falar de peito alemão? Várias gaitada.

Depois que eles se mandam eu ainda dou

uma olhada nessa bosta de lugar, aqui tiram

os dias das pessoas! Já deu, tem só ainda que

esvaziar o meu armário.

Saio pelo beco, tem uma garrafinha no bolso,

água com gás, cê é doido

Eu canto “Água de coco, uma maminha, beira

do laaaar.”

É isso, um brinde, dois brindes, dá-lhe!

106

Enrolação


Perdoem a confusão, smailey de riso nas

lágrimas


Fogo

“Os animais mais selvagens e os mais solitários

saem de suas tocas quando o amor os chama e

sentem-se ligados durante alguns meses por

cadeias invisíveis às fêmeas e aos filhotes que

nascem deles. Depois esquecem essa família

passageira e retornam à ferocidade de sua solidão

até que o aguilhão do amor os force de novo a sair

dela”

(Voltaire, “Tratado de Metafísica”)

Confusão dentro de filme pornô. Segue o

diálogo

— Não para não, seu desgraçado. Mais, mais,

mais, porra!

— Ahhhahhhhhhhhhhh, ahhhh — Ele berra

doido.

— Fode essa xereca! Vai! Ai! — Ela completa,

em tom artístico! Somente olhos atentos

perceberiam.

— Sua Piranha — tá! (Tapa na bunda)

— Ai.

— Gostou é? — tá! Tá!

— Ã, ã — tá!

108

Enrolação


— Tá bom, merda! — Ela percebe que o cara

abusou e tenta cortar o mal pela raiz.

— Agora aguenta — pá! (Tapa na cara.)

— Para, seu escroto, viado!!!

— Puf! (Soco na cabeça)

— Ficou maluco, merda??? — Reclama, mira nos

olhos dele e pergunta: “O que foi que eu fiz?

Não consegue se controlar?? Diretor???”

— Piranha você, hein!!! — Ele, sádico e burro, faz

pouco caso. O que sabe de “Libertar da

ordem a chegada ao caos!?” Assim, recebe o

troco:

Tum! (Soco no queixo dele)

Tá! tá! tá! tá! rá! puf! (Caíram na porrada!)

— Ô, idiota, é só um filme!

— Caralho, que porra é essa? Que merda!

— Puta que pariu! Ficou surdo também? Você

não quer se ajudar, né amiguinho?

— Ihhh, qual foi?? — Nem ele sabe ao certo o

que provocou.

— Quem é você pra falar assim comigo?? Vai se

fuder, babaca!

— Eu tava gostando, droga.

— “Viciadinho em filmes vira ator e surta”,

gostaria que fosse a notícia, seu mané!?

109

Enrolação


— Que disse???

Tão volátil o fogo e eles! Então ela saiu do pau

dele e foram se limpar, ofegantes, suados em

meio a essa energia rara.

— Onde cê arrumou esse imbecil? — perguntou

a atriz, bolada, de novo ao diretor, já branco

de susto. Quem convida pode interferir. “Por

que não faz?”

Já na segunda cena***

— Vai, cavalão!!! Mais rápido!

— Ã, ã, ã, ã, ahhhh!

— Mete mais fundo, me dá essa rola! — Fez com

uma atitude confiante ainda que mentalmente

controversa. Ela sabe exatamente o que quer,

mas “testa” a situação para ver até onde pode

chegar!

— Ahhhhah!

— Cê não gosta de bater, é? Bate nessa bunda,

bate, porra — sussurrou junto ao rosto do cara,

depois tá! tá! tá!

— Ai, ui!

Tá! puf! (Ela dá um socão que deixa zonza a

110

Enrolação


mulher.)

— Seu merda filho-da-puta!!!! Cê não sabe

nada mesmo, né? Seu mixaria!

Então a atriz avança nele como uma gata

selvagem, total enraivecida. (Sons de

pancadaria) Que menina...! pega um

banquinho e espatifa na cabeça de cima do

atorzinho — “Mexer com puta é foda”, foi o que

ele estava pensando pouco antes de levar

essa. “Se eu sou puta, ao menos fiz de mim

alguém!”, ela fala, talvez tenha ouvido os

pensamentos do ator, e desembucha ainda

mais: “Por que a seta se só consegue atingir

com as patas, otário??? Enfim, ah ah ah”

(Caçoando.) Ele não morre, mas a cabeça já

estava jorrando sangue no set de filmagem.

“Aí eu pego agora um cacete de plástico e

coloco na boca do mané. Dorme com esse

barulho”, resmunga. E diz aos atônitos

presentes na sala, completando:

— Gravem isso agora, imbecis.

Tinha mais sinceridade nas expressões agora.

Não lhe caem lágrimas; pra isso seria

necessário outro tipo de esforço. Tal quem

111

Enrolação


necessita provar algo.

— Que mundo é esse onde ninguém se

entende? Existirá equilíbrio?? Ou cada vez

mais “os” problemas pessoais afastarão os

irritados seres? Paciência! Esse foi mais um

que tentou me ganhar e não conseguiu. Tão

ruim é a felicidade criticada.

Sai e ri com classe e esperança a atriz.

112

Enrolação


Incipt ou Ligações profundas

No começo eram maravilhas, extasiados,

enamorados. Começa como uma fumaça, um

incenso branco e desce e desce até chegar

nos corpos. Há uma cortina de veludo ao

fundo, e móveis de motel. Corta pra ela

chupando o pau dele, depois é a vez dum

outro cara que enraba ele. Ela vai e vem e alisa

a rola da ponta pra baixo, fazendo um manejo

da direita pra esquerda. A rola e a boca dala

estão úmidos e macios. Já o cara, tá

segurando na cintura dele e enfiando até o

talo no cu, pois os pentelhos encostam na

bunda. Logo muda a cena e enquadra a todos

os três no ato. Juntos, meio colados, em pé.

Um cara botando fundo o pau no outro e ela

chupando o da frente, e todos sorrindo e

encenando. Mas um sai, e foto aqui, porra,

fotosfotos, clic, click, já caímos na net!

113

Enrolação


Conversa de zap com a Maluca

23h21 Maluca: Fala tuuu !!!

8h09 Catatão: Coe. Teve trampo ontem.

Fiquei

ocupadao

Tu sumiu na sexta. Tudo bem contigo?

19h01 Catatão: mta chuva ae? Ta nadando?

14h24 Maluca: Mais iai cm foi o flair?

14h25 Catatão: Foi maneiro. Foi o terceiro

14h25 Maluca: Hum foi onde?

14h25 Catatão: Tamo ficando afiados, os

operário

14h25 Catatão: Na lapaya

14h25 Catatão: \o/

14h26 Maluca: Q bom!

14h26 Catatão: Tem umas fotos ja

14h26 Catatão: Pelo menos na foto tamos

bem kkk

14h26 Maluca: Q boom!

14h27 Catatão: E tu ta fazendo o q?

14h27 Catatão: Sumiu aquele dia po

14h27 Maluca: Sumi nada

14h28 Maluca: Sai do salão era 1 e poca

14h28 Catatão: Ah ta. Pensei q vc ia ligar

14h28 Maluca: Nn vim direto p casa

14h29 Catatão: Queria t ver po

114

Enrolação


14h29 Catatão: Comprei ate uma bebidinha.

Ta la na geladeira

14h30 Maluca: To cm uns problemas ai..

Tenho q esperar p resolver.

14h30 Maluca: Cm vai ficar!

14h30 Catatão: Ihhh

14h30 Catatão: Eh grave?

14h30 Maluca: Nn

14h32 Catatão: Vc resolve. Vc eh bem esperta

Se precisar d alguma coisa

14h32 Catatão: Avisa

14h32 Maluca: Mais vai dar td certo!

14h32 Maluca: Okkkk

14h32 Catatão:


bom?!


passando no ponto. Era tu?

0h24 Maluca: Nnn

0h25 Catatão: Ahhahaha parecia. Devo ta

sonhando contigo

0h26 Maluca: É RS..

0h27 Catatão: Vamo qdo la no bodegao

naquele bar?

0h27 Catatão: Vc eh mto gostosa. Me deixou

c

lembrancas

0h27 Maluca: Neeem tão cedo

0h29 Catatão: Ihhh ta bolada. Nao podem t

ver la?

0h30 Maluca: N tô bolada , eu namoro

esqueceu?

0h31 Catatão: Hahaah eu tb Maluca

0h32 Catatão: So no sapatinho ne

0h34 Maluca: Ta namorando cm quem ? Que

bom q vc seja MT feliz !!

0h34 Maluca: Nem no sapatinho e MT menos

na bota.

0h35 Catatão: Ahaahhahah

0h35 Catatão: Fica c ciume nao. Eh so

namorico

0h35 Catatão: To doido p te comer

0h36 Catatão: Mto bom. Relembrar vc

0h36 Catatão: A gente se divertia la naquela

casa

117

Enrolação


0h37 Maluca: Vai ficar querendo , Querido

gosto MT d vc sou sua amiga mais n vai rolar

mais nada entre eu i vc , quero q vc m respeite

0h38 Catatão: Kkkkk eu te reapeito. Vc sabe.

Mas tenho tesao po

0h38 Maluca: Assim cm respeito vc. Tem um

carinho especial por vc mais só vai ficar na

lembrança!

0h38 Maluca: Td be

0h39 Maluca: Bem , guarde isso p vc pq nem

sua namorada e MT menos meu namorado n

vai gostar dessa conversa

0h39 Maluca: Se vc for fala besteira melhor

nem falar CMG!

0h40 Catatão: Apaga a conversa

0h40 Catatão: Ela nao olha meu celular. Nem

me ve mto ela. Nao sei se gosta d mim. Tamos

ficando

0h41 Catatão: Guarda na sua memoria ai:

Cata-tâo ta c saudade d vc. Queria t ver mais

pq gosta d vc

0h41 Maluca: Pois bem meu namorado esta

ao meu lado !

0h42 Catatão: Tranquilo. Vai la. Bjo

0h42 Maluca: Faça cm que ela goste de vc , vc

é a pessoa boa de um coração enorme. Gosto

de vc cm pessoa

118

Enrolação


0h43 Catatão: Vc tb doida. Bjo

0h44 Maluca: Eu sei q vc gosta de mim , mais

infelizmente não temos certos ! Somos NT

diferentes

0h44 Maluca: Gostamos d coisas diferentes

0h45 Maluca: Tendeu ?!

0h45 Catatão: Tranquilo. Vc q sabe. Eh

desculpa mas tudo bem. Vou meter o pe. Se

cuida

0h47 Maluca: OK vc tbm bjo!

119

Enrolação


Razão de sexo

“Diálogo entre amigas diante de uma mesa

farta de cerveja e aperitivos inusuais”, a

primeira começa a ler.

“Anedotas e comentários sobre artigos de Sex

shop.”

“E se a peça fosse encenada em 1 ato”,

complementa a segunda, “nossas personas

seriam 2 protótipos feministas, barra

partidário, barra safadinhas. E esses caras que

apareceram nas vidas da gente, só 2 homens

tidos por diminuídos, usados apenas para

entretenimento.”

“Aí, te adoro! Que realista!!” sorri a primeira.

“Em ato permeado de trejeitos dos atores.”

“Uma delas, eu, a segunda, comenta a

intensidade da voz do tal cativo e reclama do

fato de ter conhecido tantos outros imaturos,

e ser uma busca meio que em vão.”

“Ei, eu tenho o quê, que listar mais zoações

sobre defeitos e caras fracos? ?”

“Sei lá”

“Como assim sei lá!?”

“Outra fala que engravidou de propósito e

nunca mais viu o #reprodutor. Enviou foi um e-

120

Enrolação


mail!?”

“Ah tá. Dizendo que amar é latente. Mas

finaliza você a primeira que vier pela frente de

novo e vai ver.”

“Olha só, sem forma, equivocado. Mas não é

que dá certo!?”

“Um humano mais e você não participa,

caaara!”

121

Enrolação


Racha, miniroteiro (Peça)

Os personagens são

Diana (Principal)

Mustafá

Giovana

Tereza (As amigas)

(Pélassaco Xato, esse é o nome dele.)

Nguyenm (O bruto)

ATO PRIMEIRO- Imigrante ilegal Marroquinho

chega ao Rio de Janeiro através das fotos das

bundas e praias Brasileiras. Tem até um

contato na cidade, antigo amigo que

trabalhava com ele em um restaurante na

Espanha. O amigo pode até descrever o

serviço no trabalho. Ênfase no ato desgastante

de lavar pratos, água, luvas, sabão, sujeira e

mãos enrugadas. “Agorrá no, despois! Tá

bón?”, é seu jargão. Primeiro os pratos e

copos, depois outros copos e pratos, na

sequência. Termina cena com Mustafá

fumando seu cachimbo e refletindo sobre o

que deve ou não dizer. E como não aguenta

mais lavar coisas.

122

Enrolação


ATO SEGUNDO- Este amigo refugiado vem

ganhando a vida de copeiro e vendedor de

haxixe em casas noturnas. No momento em

que chega Mustafá, o amigo acaba por atrair

mais atenção do que imaginava. Quase morre.

Mustafá e e passantes afastam. Mustafá

namora Diana, menina, espevitada. É perto

tudo. Vários Pélassacos sorriam para a Diana.

ATO TERCEIRO- Corta para a cena final de

Giovana e Tereza (As amigas) juntas, depois

mostra Diana observando. Chegam Nguyenm

e Mustafá, Diana e uma das amigas gritam.

123

Enrolação


Março fechado

ANÚNCIO, CLASSIFICADO: Solteirona casa com

amigo homossexual. Esquecidos pelas cobranças

da sociedade hipócrita, afundam-se em seus

esconderijos. Alopram suas cenas. Usam os

corpos, se atiram como num bacanal à dois.

Subitamente, há um surto de bebês pela

cidade. As pessoas comentam que faltam

explicações à todos. Estranhamente, alguns

fofoqueiros relatam que a causa foram as tais

das surubas! O hábito se espalha. Espelhamse

mais uma vez nas civilizações antigas

curtidas na cultura do vinho e dos excessos

múltiplos.

O que fazer com essas crianças? Existe família

assim? Mesmo no meio da bagunça e do

acaso? Se passa em março, é claro.

124

Enrolação


Pé na porta

Pááa. Eu digo, o personagem, sou eu aquele

Jobson Americano dos Santos

Uma pessoa sugerida, dei um calote no país

chamado Br! Fui eu mesmo, e depois lá nas

redes sociais que eu confessei, nem aí

“Só aquece quem tá fogoso, bora”, o cara diz,

depois sou execrado pelas feministas, as do

face e tal, o corretor sacaneou

Mas só endurece o pau quem quer fuder de

verdade, com força. Ela sabem. Ou isso ou não

teriam nascido de pais com tesão.

125

Enrolação


Te falar, vi Inês

Te falar, vi Inês a primeira vez assim que

levantei a cabeça e olhei pra frente. Simples,

certo? Ela estava encostada no balcão do bar,

olhando a galera da banda, se ligando no

cenário que montávamos; ao seu lado o

colega de trabalho. A princípio até achei que

fosse o cara dela, só que logo não teria mais

esse equívoco. Uma pessoa é uma pessoa ao

lado de alguém as vezes, já sei que muitas

vezes não passa disso.

Mas ela, olhaa, te falar, deixa eu voltar para o

assunto! Vi que tinha o cabelo curto, e que de

longe poderia ser confundida com uma

estranheza. Pura fissura.

Com o transcorrer da montagem de palco, eu

e o resto da banda fomos nos dispersando.

Saí, parei para fumar, isso depois de mais de

seis meses — É, é, eu estava empolgado.

Vaguei pelo térreo do bar, algo nas ruas da

cidade, mas eu só queria voltar lá na parte de

cima, pro andar onde estava tudo. Então

quando me sento no pufe e comento sobre

ela com ela, lá ao fundo, discotecando,

folheando seu catálogo de CDs intermináveis,

126

Enrolação


e dançantes, só ela devia conhecer, foi ali que

adormeci. Sonhei momentaneamente com os

ruídos da música, o gosto do que havia feito e

com o que teria que fazer depois da

apresentação, ou durante. Um pouco tenso,

não conhecia aquele público, tanta gente com

um ar a mais que eu, só o músico. Olha,

funciona meio que como um bônus aos

jogadores, não é que seja no modo trapaça,

acho que hoje paramos e vemos o amor entre

nós(...)

Acordei com meu amigo dizendo que aquela

mulher, a DJ, tinha ido ali e dado a dica da

gente se misturar e chamar quem estava lá

embaixo no térreo subir e ver a banda tocar.

Acho que ele falou como era hora, já estava

tudo pronto mesmo. O cara riu de mim, eu

que dormia e adormecia o ambiente. Fiquei

foi com cara de bunda mas continuei pelo que

viemos, a apresentação!

Eu tô falando isso porque já tenho alguma

namorada, ela só não veio. Pode parecer

bobo, mas temos lá nossos dilemas. Por isso,

quando eu ainda olhei muito para Inês, não

era a minha, eu sei. Foi difícil lidar, olhei seus

vultos apressados, sua calça magrinha, sua

postura torta. Putz, vi o rosto; parei e olhei

127

Enrolação


mesmo, aquela atípica, a diferente do meu

mundo. É que venho de muito longe, lugar tal,

atrasado, caipira. Pelo menos as coisas que

chegam são novidade.

Tudo desaba quando eu fico assim em foco,

eu me impressionei. P*** merda, como me

encantei, como era televisiva, fotogênica.

Parecia ter saído daquele filme, é, é! dos anos

sessenta com aquele penteado réplica, Mia

Farrow, Elis, algo nessa pilha retrô, magra mas

não esquelética. A pele era branca pacas e

bem lisa, bem formada e complexa a

desgraçada.

Vão me crucificar, o homem anda sendo

mesmo, por isso eu confesso já de cara, eu fiz,

foi eu, me deixei levar por mais essas ilusões

masculinas, e duas vezes minha garota foi

traída, por mim e pelo ambiente. Só posso

pedir desculpas, e pelo instinto que me

dilacera, a carne que me manda. Mesmo

assim, não foi o mundo feito na hora do

desejo? Ou não somos mais sentimentais? ?

Incompleta, deixada de lado, minha antiga

relação.

Já disse o quanto reparei nela? Já falei que

pude ver algo, fosse o susto? Com as músicas

que colocava pra tocar ela dançava, dava

128

Enrolação


pulos em si — acho que de alegria, ou talvez

ajudada pelos drinques. Caaara! Já falei que

parei de pensar nas coisas à minha volta?

Meus amigos podem confirmar, ainda falei

muito dela depois, esse tipo de lance quando

acontece é meio que um talvez nessa vida

recente. Eu pelo menos acho, se nos fazer

repensar; induz com outras possibilidades.

Eles também a acharam bonita; eu achei semiperfeita,

no laço — Até porque eu não acho

que o perfeito exista, é mais pela intenção de

existir. Mas era meu tipo, com certeza e

intrigante.

Quando eu estava no palco, tocando, essa

garota me olhava atentamente; desviava o

olhar pro resto da banda quando eu notava. E

e notei muito, tanto que já era sem graça. Virei

a guitarra pro outro lado, tinha uma caixa atrás

de mim. Precisa de novo, olhar, filha de la

madre linda pra caraca. Desci do palco, era a

jovem Tróia. O ideal.

Como meu gosto pra mulheres é estranho, um

só detalhe me arrebata. E ela tinha muitos,

contudo a imagem dela daquela noite eu não

posso descrever, incrível, só jogar uns

pedacinhos aqui. Lembro das sobrancelhas

finas em ^ e o cabelo que sabia ser cacheado,

129

Enrolação


mas estava curto. Me subjetiva. Foi simpática

com todos, até comigo, até que cresci, puxei

mais assunto, falei de rock alternativo e nos

empolgamos. Falei do meu gosto por Velvet e

no final do nosso show ela pôs pra tocar

Sunday morning. Hahaha, o final da minha

noite; ela, o meu ganho, cassino com ganho

de moedas e pequenos olhares ― o que para

mim é vantagem!

Por fim, acaso, quando guardávamos os

instrumentos, ela pediu um CD nosso, disse

que outro colega meu de banda e comprou

um exemplar.

Ela passava, eu olhava, eu via que ela também

olhava, largava ela em tributo, ao que ainda

privilegia.

Hunf, ããh, ok, passando para parte do

finalmente. Voltei porque tinha que buscar a

mala dos pedais. Que coincidência, esqueci e

Inês ainda estava lá. Disse para ela: ― Vou

indo. Ela comenta algo que não me lembro,

mais parecia um tipo de “então tá, tchau”.

Ah, antes ela disse “Mas já vai?” Eu vibro

lembrando, huuu!

Ia saindo para definitivamente enterrar minha

virilidade, o caminho ia aumentando devagar,

apertado, e olhos de saída. É, é linda, caminhei

130

Enrolação


de volta, e me olhou fixamente — sem palavras

nas caras — e a beijei, mystery girl, caminhei de

volta e a beijei com força e a apertei pela

cintura, e nos beijamos como novos

namorados em final de temporada: ― A gente

se fala. Inês... incrível, tudo parou — É idiota

dizer isso mas é o que me pareceu, foi em

outra época, então, ahh, quem liga??

E daí se economizei muitos fatos, pulei

bastante? E embolei essa, bobeeera de conto.

Um dia vão me repudiar por isso,

principalmente minha segunda mulher. A

realidade fiel é difícil de ser mantida, e, claro,

descrita.

Perfeição ao matar estrelas do rock.

A tal da Inês acabou comigo, cegou minha

certeza. Dali para frente fiquei mais zoeiro. Foi

tão rápida, grudou no meu dia, no meu

cotidiano que veio depois. Estava é um saco.

Acho que ela foi uma ruptura, isso, uma parte

quebrada, uma casca com um conteúdo

louvável de ser obtido. Ou isso ou suportar

qualquer desgaste.

Eu lembro, a face muito doce em relação ao

clima de velho da madeira do sótão onde

rolou a festa. Apesar da poeira de trilhões de

mata-ratos me fazer doer os olhos, aquela

131

Enrolação


cigarrada, eu tinha um motivo pra pensar.

Poderia ser um romance e eu só eu sairia

perdendo, o único auto... estragador,

acabando com meu corpo; só quero a volta.

Ah sim, que tenho mais vida do que achava.

Ela me trouxe de volta à bebida, às noturnas,

ao cinema vazio, ao eu de leve. Não que seja

alguém ruim e/ou que se encaminha para trás,

muito pelo contrário, ela apenas me olhou. Eu

sou um homem livre! Reaprendi o empurrão

chamado vontade, eu não quero ser o marido

apaixonado dela, apenas mais um.

Mais dela, outro tiro! Volto pra casa como um

zumbi, dormindo no ônibus, fedendo à rua,

sonhando com sorriso orelha a orelha. Inês me

trouxe de volta, até que foi tranquilo. E como

já disse, tudo parou. Nada de luv songs, mas

isso foi em 2006, estrangeirismo era onda, e as

pessoas ainda se pegavam com uma oooutra

vontade

132

Enrolação


A volta da outra Marie

Sem mais perguntas, agora esquece tudo o

que eu falei, é como uma história de filme

pode acontecer. Uma saída de cinema e todos

passando o olhar pela gente. Eu sou feio? Ela

é bonita? O nome dela era o do poema antigo,

algo como Maria, não, Marie, certo. A Vampira

das telas mutantes.

Se sairmos da cabine, eu mostro o lugar, as

ruas centrais, tudo induzido. É o que ninguém

ouve, e ela, a armadilha. Grande fonte, onde

está a grande. Vem como um affair, incrível e

especial disputa. Podem responder, a gente

que vê. Ou acham que só eu sei algo do tipo?

Eu lá devo algo? Eu sou um músico? Meu

instrumento está em quarto? E eu não ligo? Ela

é a música? Aquela pra juntar rostos e se

envergonhar e dançar e esperar a condução e

ela, a mulher, ela quer ser uma mulher e eu

penso ―como eu faço se nunca fiz? E ela é

perdição prima e pedal de tremolo e ―a

gente se fala‖. Foda é que virgem não dá fácil

o chá que te prende e enlaça com as pernas;

frívola por fora, ela quer ser amada só por

dentro. Beijinhos e só... isso.

133

Enrolação


A nova música já no final, o dia, é bom estar de

volta ao comando. Sim.

Cara, vou te contar uma história que tinha

ficado enterrada na memória de uma ou outra

vida!

ALGUÉM VAI FICAR MUUUITO PUTA

COMIGO! !

134

Enrolação


Que uma nova paixão não possa levar

Uma data no espaço e algo novo? Ou todos

esses anos passaram e realmente ainda me

sinto como uma Astarté criminosa? Aquela

que não era culpada mas sentia que ia morrer

assim? Estou fazendo um livro sobre uma Julia

que não existe mais totalmente — eu nem

existo!? Sou pura ficção da minha própria

cabeça? Tudo isso, mais, e estou aqui,

apresentando um corpo literário e nem um

pouco conceitual — de lado com os esquemas,

Julia sem subtítulos! É minha vida, meu lado

pessoal, meu olhar para dentro, eu mesma. A

desordem me atrai, intimidade jogada ao

vento; sou muito mais mulher do que tantas

piratas por aí! Nem se conhecem.

Não preciso e nem tenho disponibilidade para

ficar aqui enriquecendo muito, não sou

nenhuma profissional. As coisas são, fatos

existem. Somente falo o necessário; aquilo

que veio do jeito bobo que é fica como tal.

Analisar é bom, surpreender é, sei lá,

interessante. Sei que poderia dar alguns

caminhos, contudo, vai… deixar pistas é mais

revelador. Sei também que vou deixar muitos

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Enrolação


fatos, pessoas e tal de lado, mas isso é normal,

são acidentes do subconsciente — quem liga

para tanto? Quem… não mais? Quem não

considerou então os homens como eles na

realidade são, são insetos se devorando uns

aos outros em um átomo de… lama?

Ler não é criar uma expectativa? Qual o

porquê de se escrever este livro? Uma

resposta pessoal ou coisa de mulher

interativa? E meu nome é Julia! Parando aqui,

mostrando tantas páginas sobre uma Julia

que não existe mais totalmente — eu nem

existo! Vinte anos se passam, sou pura ficção

da minha própria, cabeça moderninha. Mas

ando aqui, me apresentando, esmagando

dedinhos, literária e nem um pouco

conceitual; de lado com os esquemas

descritos, escritivos, de novo. É minha vida, o

lado pessoal, olhar para dentro, por eu

mesma, já que a desordem atrai. Não preciso,

ué. É história, impressão, biografia, é

quotidiano e mentalidade. E logo é a

concentração bastarda; nada do que disse

realizei no total, fica ainda faltando um cado.

Espalho Julia em várias formas e ações, hunf,

para aí colher uma mulher tentando abraçar o

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Enrolação


mundo, e ele é claro e vazio. Tipo você, Lari.

Como um rio, tem dificuldades; é história, é

narração, é o que há de momento. No canto,

entre quatro paredes sujas à base de

seduções e psicotrópicos, é pelo silêncio dos

intervalos de fluxo mental seguido do jorrar

que desenvolvo. Daí vem a composição, o

mosto vale!

Dançar sobre mim? Nesse desejo, durante o

tratamento? Escrevo, um dia alguém vai ver ou

ouvir as cartas de amor rasgadas e picadas em

pedacinhos que foram jogadas no bolso;

roubos, furtos, mentiras, reflexos, hábitos

litigiosos, alguma adolescência cambaleando

nas ruas. Às vezes, muitas vezes, roubo e minto

coisas imateriais, mas porque é boa a

adrenalina nas veias. É... de propósito, moças.

Julgar as pessoas, autocrítica, perfeccionismo,

mau humor, autoritarismo etc. “Ela é realista

demais. Ela é frágil e tácita”, diziam. Tácita?

Não pode ser real. Mas escondo, secreta,

senhora de mim, tenho coisas a dizer… acho

demasiado relevantes, fortes, feministas.

Não pensem que eu sou esquisita ou má

pessoa. Muito pelo contrário, sou apenas

sincera e emotiva, adoro a vida e novos ares, a

música que sai aleatória. Sou simples, mais do

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Enrolação


que pensam. Apenas pensativa um tanto, um

óleo entre dedos me surpreendendo, cheiros,

corpos, ahhh.

Óleo, as juntas renovadas e penso, vivo.

Amante em todos, Julia conflituosa, louca, e

não escondo; quem é que pode me proibir?

Em que lugar que não vemos referências? Não

viemos do nada, Lispector também não! Deus

na figura de um homem ou um homem na

figura de um deus, quem veio do nada? Não

adianta camuflar o instrumento, a curiosidade

e a teimosia humana fazem mostrar o

contrário. Vejam só as crianças, e crianças

precisam de estrutura familiar, a positiva, para

se tornarem adultos sem problemas. Mas vem

a adolescência e aí... desculpem as crianças.

Desculpem também as adolescentes, não é

para atingir ninguém. Desculpa, claaro. Os

sonhos da juventude devem ser cultivados e

concretizados enquanto há tempo, porque

quando se é adulta eles não voltam, sim,

porque já foram esquecidos. Por isso, tento

dizer tudo agora; por isso os dualismos, é

necessário. No final das contas, humana

demais. É da minha natureza ser assim; já sei

até que “egoísmo é coisa da essência da

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Enrolação


gente, humanos sedentos por carne, devendo

este mesmo egoísmo ser controlado e

subjugado o mais rapidamente.” Que

conceito! Também não é só atual ser

dramática, tudo deve é deixar de ser tabu, e

de ser chato. Eu sou jovem, sinto isso, posso

voltar ao Cosmos, voltar para tudo!

Nessa continuação de algo, estou realmente

suada. É assim que converso comigo mesma

e chego à conclusão de que vou ser o que

quero, porque não tenho mais limite, foi o

último desjejum do tipo sociedade, família.

Ainda suada, muito mesmo! Mas e meu

cérebro? Nossa, neste negócio já vou para me

explodir, eu que dito as regras, sério, até parei

de pensar nas roupas de gola branca e casa

mobiliada. Vou ter poucas coisas,

intensamente suada. Serei a vergonha da

sociedade em pessoa! Por exemplo, comer

com colher e cuspir na mesa do patrão

enquanto digo que me demito! Hahaha, e ter

uma sanidade inventada, fazer tudo que

anseio dar certo, como planejei, como é para

ser. Já vejo até no meu delírio a sala aberta e

a mulher que eu teria parecido, tudo

embolado entre passado e futuro. Eis que vejo

também que sou pura ânsia de liberdade, de

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Enrolação


ser arredia, feminista ou machista quando for

a hora, mas um pouco sólida. A humana

integral! Quero o conforto da emoção

suprível, e alcançável é minha organização.

Quero ser a imagem em um filme que admiro

e minha consciência no livro que me

identifico. Afundo a cara que tenho em mim e

em mais ninguém, muitas vezes e muitas vidas

em um só corpo encarnado. Voltei ao meu

tempo, agora e nexo. Folheio! Tudo nestas

folhas de caderno são impressões e a gaveta

é bem restrita, não acham?

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Enrolação


Cada dia é uma eternidade

Cada dia é uma eternidade se você pensa nele

como especial, único. Se tudo que havia feito

fosse entendido e discutido, haveria uma

solução proposta, seguramente.

No começo, dormíamos abraçados em

posição de conchinha. Mas eu sempre ficava

danado por ela, sentia um desejo inominável

e ao mesmo tempo pouco tolerável. Meu...

negócio... ficava terrivelmente duro; era uma

pedra o existir. Ela me perguntava o que era,

o que estava passando; eu respondia que a

amava mais que tudo nesse Universo. E que

era muito novinha pra certas necessidades dos

homens. Ela ria e deixava pra lá.

Até que um dia aconteceu de eu sacar meu

negócio da bermuda, porque estava me

matando! Caramba, era um crime hediondo

com meus instintos!! Parecia que ia rasgar o

tecido e minha coisa sair correndo por aí(...)

Abracei minha Maria, da mesma forma de

concha. Pus ele entras as perninhas macias

dela. Caramba, eu nem enfiei. Era macio e

terno e bom demais. Eu sabia que ela não

estava preparada ainda. Só ficou meio que

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Enrolação


sarrando, ela apertou entre, segurou a cabeça

e alisou como a menina que era. Aquilo era a

mão da ‘Deusa’. Nada podia ser melhor. E

senti um molhadinho por parte dela. Ainda

acredito ter sido suor e nada mais. Eu gozei

um litro, acho. Nem precisou friccionar nem

nada, saiu de maduro! Maria ria e ria, já

entendia tudo. Nos beijamos, abraçamos

mais, frente a frente. Dormimos, e pela manhã

ela me fez um café da manhã — café forte ou

com leite, biscoitos, balas de forno com grãos

integrais dentro — que tinha o melhor sabor de

todos os tempos! A melhor coisa que me

disse, o melhor de tudo que já havia recebido;

como um café da manhã com os Deuses!!

Claras manhãs do deserto sem fim. Esteja ao

meu lado, querida, nada mais importa ou se

presta lá fora, apenas sermos um para o outro;

só assim atingimos certo limite. Sabe, entre a

sanidade e o progresso! À tarde, falávamos ao

vento:

− Alguma vez pensou que sua vida seria

assim? — e sorrio.

− Sinceramente, não. Mas o que posso fazer,

reclamar?? — ao que respondeu prontamente,

mirando fundo nos meus olhos:

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Enrolação


− Serviu.

− O único que adianta é extravasar.

− Isso já fazemos, querido! − Eu sei, nunca

paro.

E recordei a frase de um conhecido, dita em

uma outra ocasião, mas de valor insubstituível:

“Tudo tem um preço, de certa forma. Pra tudo

há um preço, não é!? E para a verdade, o que

necessita?”

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Enrolação


Propriedades

p\ Memê

Mais linda do que quando nos conhecemos, tá

num tipo de paz de espírito, que legal isso! /

Os sons do mundo vão no carinho pelas

pessoas, é isso mesmo, bom viver nesse

pensamento, cara. / Ser artistas criando ou

melhorando os poemas, arranjando então

nessas músicas! / Partiu espantar qualquer

passividade por aí, dizer onde está a coragem

nos olhares que se desviam. / Ou nas lutas,

sempre nos dias que passam, mas por quê,

quêê? Memee

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Enrolação


Sobre o autor

Grossi é escritor e músico, publicou entre

outros títulos a novela “Obarro”, além do

argumento de “Desculpe, seu tempo acabou”.

Pela Poesia, lançou “Cura”, “Servidão”, “A

Conferência”. “Cabezada”, “Esencias”,

“Maneja” e “En las eras” são suas obras em

espanhol. Participou como guitarrista e

vocalista das bandas Alice, íO, Instrumental

Vox, Ummantra, SAEM e A ras del suelo

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Enrolação


Colabore para que o autor tenha os meios

necessários para a produção de suas obras

literárias. Ao financiar, você recebe material

impresso ou algum dos títulos completos!

Acesse

www.catarse.me/obras_completas_grossi_

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Tiragem limitada de acordo com a demanda

2023 #EditorialPresente

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