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ROTEIRO CAMILIANO EM RIBEIRA DE PENA

Untitled - Câmara Municipal de Ribeira de Pena

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Ao avistar as poldras que alvejavam poídase resvaladiças ao lume de água, teve vertigense disse: “Eu vou morrer.” Pôs o berço à cabeça,esfregou osolhos turvos de pavor, e esperou queas pancadas do coração sossegassem. Depois,benzendo-se, pisou com firmeza as quatroprimeiras pedras; mas daí em diante ia comoque cega; a corrente parecia-lhe caudal e negra.Quis sentar-se numa das poldras; e, naprecipitação com que o fez para não cair,escorregou ao rio. A água era pouca e a quedade nenhum perigo; mas o berço caiu na veia dacorrente que era bastante forte para o derivar.Quando ela estendeu o braço já o não alcançou.Arremessou-se então ao rio; mas os altoschoupos da margem, encobrindo a baçaclaridade das estrelas, escureceram o berço.Neste lance, perdido o tino, a desgraçada correude través para a margem, onde umclaro de areiase lhe afigurou o berço.Quando aí chegou, caiu; e, na queda,agarrou-se ao esgalho do salgueiro em que opastor e o Luís moleiro a encontrarammoribunda.Camilo Castelo Branco, em “Maria Moisés”,uma das Novelas do MinhoEm 1832, um ricaço doAlto Douro, de nomeBernardo Pires, fugia à perseguição que ocorregedor de Vila Real lhe faziapor ódio político.Em parte alguma pudera ele furtar-se àespionagem dos aguazis. De terra em terra,umas vezes fiado nos amigos, outras com falsonome, fora parar a Ribeira de Pena, terra situadanas fronteiras do Minho e Trás-os-Montes.Como a justiça de mouro aí mesmo o lobrigasse,resolveu transpor o Tâmega, ganharas Alturas de Barroso, e entornar-se na Galizapor Chaves. Encaminhou-se por isso ao primeiroponto de passagem, que era aqueleonde eu viera ter à margem oposta, e que melembra agora chamar-se Viela.Estava do lado de além a barca. BernardoPires chamou algumas vezes o barqueiro.Ninguémo ouvia; mas dera porele uma rapariga,irmã do dono da barca e da azenha. A correntedo Tâmega ia grossa demais para o pulso demulher; mas Teresa era atrevida, e o irmão só adesoras viria acudir à ansiedade do passageiro.Desatracou o barco, arremangou a camisa,cuspiu nas mãos áridas do trabalho, travou avara, sondou com ela o vau, deu o primeiroimpulso à barca, e daíaté à margem oposta maisde três vezes se afigurou a Bernardo Pires quea torrente a ia arrastando ao açude, que sedespenhava, cem passos abaixo, com fragormedonho. Decada vez queTeresafincava o peitoà ponta da vara, a barca resistia à torrente quemarulhava, e rebentava para dentro dela emtufos de espuma; depois, apertada entre a ondae a vara, gemia pelas junturas; e a possantebarqueira, brincando com a morte, ou ignorantedo perigo, a cada guinada que a barca davagalgando a torrente, exclamava com alegria:«Salta minha andorinha»!Abicando à margem fronteira viu que opassageiro, com o chapéu na mão, seaproximava dela. Não afeita a cerimónias, quasenão deu fé do cortejo. Estava Bernardo Piresdizendo palavras de sincera gratidão ao denodoe humanidade com que ela se arriscara aosperigos, quando Teresa, passando-lhe para amão uma celha de pau, lhe disse:- Ajude-me a despejar o barco que, semete mais água, podemos ir ambos ao fundo.Camilo Castelo Branco no Sexto dos Doze CasamentosFelizes

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