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A crítica social e a escrita em Vidas Secas - UFRRJ

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A <strong>crítica</strong> <strong>social</strong> e a <strong>escrita</strong> <strong>em</strong> <strong>Vidas</strong> <strong>Secas</strong><br />

Por esses mecanismos, Graciliano Ramos conseguiria o efeito<br />

desejado, s<strong>em</strong> que caísse no exagero de explicações. É a própria<br />

estrutura do romance que melhor d<strong>em</strong>arca os probl<strong>em</strong>as levantados.<br />

Seria precisamente o silêncio o el<strong>em</strong>ento mais expressivo<br />

do livro (Candido, 1984). Todos os viventes estariam nivelados<br />

como bichos numa vida que se repetia desde o t<strong>em</strong>po de seu<br />

avô e de seus pais, determinada pela natureza e por um poder<br />

que pairava como d<strong>em</strong>iurgo acima de todos, determinando os<br />

destinos da cada um. O patrão, os fiscais ou o soldado eram todos<br />

poderes desconhecidos de uma sociedade injusta que condenava<br />

o sertanejo a morrer ou a ser forte como bicho.<br />

O <strong>em</strong>brutecimento que a realidade impunha a esses seres, a sua<br />

desumanização se apresentaria ainda pela linguag<strong>em</strong>. Ao nomear<br />

as coisas o hom<strong>em</strong> essencialmente se apropria da realidade<br />

e lhe dá algum sentido (Almeida, 1999: 304). A linguag<strong>em</strong>,<br />

dessa forma, distingui-lo-ia dos d<strong>em</strong>ais seres vivos. Em <strong>Vidas</strong><br />

<strong>Secas</strong> o probl<strong>em</strong>a é apresentado de diversas maneiras. Surge<br />

com a zoomorfização dos personagens, com a aproximação polarizada<br />

entre bicho/hom<strong>em</strong> e hom<strong>em</strong>/bicho. Fabiano era quase<br />

bicho, sentia-se forte como bicho, mas também humilhado<br />

como bicho. A idéia e as imagens são quase s<strong>em</strong>pre duplas:<br />

384<br />

Vivia longe dos homens, só se dava b<strong>em</strong> com os animais. Os<br />

seus pés duros quebravam espinhos e não sentiam a quentura<br />

da terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-se<br />

a ele. E falava uma linguag<strong>em</strong> cantada, monossilábica e gutural,<br />

que o companheiro entendia. A pé, não se agüentava<br />

b<strong>em</strong>. Pendia para um lado, para o outro lado, cambaio, torto<br />

e feio. Às vezes utilizava nas relações com as pessoas a<br />

mesma linguag<strong>em</strong> com que se dirigia aos brutos – exclamações,<br />

onomatopéias. Na verdade falava pouco. Admirava as<br />

palavras compridas e difíceis da gente da cidade, tentava<br />

reproduzir algumas, <strong>em</strong> vão, mas sabia que elas eram inúteis<br />

e perigosas. (Ramos, 1981: 19).<br />

Estud.soc.agric., Rio de Janeiro, vol. 13, no. 2, 2005: 369-398.

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