A crítica social e a escrita em Vidas Secas - UFRRJ
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A <strong>crítica</strong> <strong>social</strong> e a <strong>escrita</strong> <strong>em</strong> <strong>Vidas</strong> <strong>Secas</strong><br />
desta, <strong>em</strong>penhava-se <strong>em</strong> efetuar, a cada experiência literária,<br />
um estudo da modernidade brasileira e suas conseqüências<br />
mais graves e profundas para a vida cotidiana.<br />
Nos seus romances, o escritor transporta para o interior do personag<strong>em</strong><br />
os dramas de uma existência vivida entre humilhações<br />
e misérias, assim como os mecanismos de sobrevivência de<br />
uma sociedade dividida entre os horrores do progresso e as<br />
vergonhas do atraso (Schwarz, 1992: 23). Falando especialmente<br />
de uma região onde a pobreza e o atraso eram uma constância<br />
normal, Graciliano destacaria as maneiras como esse progresso<br />
e essa modernidade se sobrepunham a uma realidade<br />
radicalmente construída e sedimentada sobre os patamares do<br />
latifúndio e da escravidão. É importante l<strong>em</strong>brar que o escritor<br />
falava precisamente dos anos 1930, período no qual se intensifica<br />
o processo de modernização do país. Graciliano assistiria à marcha<br />
dos acontecimentos com um olhar inquisidor radical e desconfiado.<br />
Tratava-se de “descascar os fatos”, de examiná-los cuidadosamente<br />
e de procurar-lhes um sentido. Era com o propósito de<br />
interpretar o mundo que conhecia, b<strong>em</strong> como de chamar a atenção<br />
para as incoerências, que realizava seu ofício de escritor,<br />
como Paulo Honório <strong>em</strong> São Bernardo, personag<strong>em</strong> que, através<br />
da tentativa de escrever, procurava compreender sua vida. Era<br />
este o entendimento que Graciliano teria da <strong>escrita</strong>: para ele esta<br />
seria uma forma de conhecimento e análise da realidade e do<br />
hom<strong>em</strong>. A intransigência que marcara sua atividade política<br />
como prefeito ou diretor de Instrução Pública seria a mesma<br />
que pautava sua <strong>escrita</strong> e a visão que nela inscrevia. A secura e<br />
a intransigência eram parte de um comportamento e de um<br />
modo de perceber a realidade que ia de encontro à chamada<br />
cultura da malandrag<strong>em</strong> (Candido, 1970).<br />
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Estud.soc.agric., Rio de Janeiro, vol. 13, no. 2, 2005: 369-398.