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XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ-<br />

ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI<br />

GT 21: Recomposição Espacial, Políticas Públicas e Superação da<br />

Pobreza<br />

O Algodão no Contexto Sócio-histórico do Nordeste<br />

Dr. Ranonildes Alves Gomes – UFCG – e-mail: rnildes@hotmail.com<br />

Luan Pabllo Silva Oliveira - UFCG – email: luanpabllo@gmail.com


Introdução<br />

Esse artigo constitui-se basicamente da primeira parte da pesquisa, realizada no âmbito<br />

do projeto PIBIC, intitulado: RECONVERSÕES PRODUTIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS<br />

NO CARIRI PARAIBANO: O RETORNO DO BINÔMIO ALGODÃO-PECUÁRIA. Neste<br />

primeiro momento da pesquisa o objetivo central foi analisar mais precisamente o papel<br />

do algodão, com intuito de compreender a relevância econômica e social que esta<br />

espécie desempenhou naquilo que historicamente formou o binômio algodão-pecuária.<br />

Para alcançar este objetivo utilizamos basicamente técnicas como a pesquisa bibliográfica<br />

e documental.<br />

Nas últimas décadas observa-se que há certo consenso em torno da ideia de repensar o<br />

modelo de desenvolvimento rural adotado no Brasil. Esta ideia rebate diretamente no<br />

campo das políticas públicas no sentido de impingir uma reorientação dos diversos<br />

agentes.<br />

A análise que pretendemos fazer neste projeto de pesquisa tem como centralidade de um<br />

lado evidências empíricas – ou seja, os agricultores voltam a plantar e a combinar<br />

algodão e pecuária -; e de outro lado,um certo movimento das agências científicas,<br />

impulsionando as pesquisas voltadas para o algodão, ora geneticamente modificado, ora<br />

orgânico. No caso da pecuária, constata-se um esforço voltado para à sanidade e a<br />

nutrição dos animais. É nesse sentido que estamos analisando a retomada da estratégia<br />

produtiva, que associa a atividade produtiva da pecuária à atividade agrícola do algodão.<br />

Para conhecer a dinâmica ensejada pelo algodão no período mais recente recorremos a<br />

pesquisa sócio-histórico a fim de compreender os elementos, atores e discursos que<br />

compunham a estratégia denominada e conhecida como binômio algodão-pecuária. Este<br />

processo converge também para movimentos de reconversão produtiva inseridos no<br />

contexto de modernização agrícola produto de políticas públicas de crédito,<br />

financiamento, incentivos fiscais, tecnologias desenvolvimentistas, a partir da crise do<br />

sistema algodoeiro e do insucesso das políticas de combate à seca.


O Algodão no Contexto de uma economia agro-exportadora colonial<br />

O algodão foi durante o fim dos séc. XIX e a primeira metade do séc. XX, uma<br />

cultura de suma importância para o desenvolvimento do Nordeste brasileiro, contudo<br />

desempenhando um papel significativo desde o período colonial, quando o Brasil<br />

assentava sua economia sobre uma base agro-exportadora, estabelecido como uma<br />

colônia de Portugal. O algodão, junto às culturas da cana e da pecuária, inseriu o<br />

Nordeste na lógica da exploração colonial e o lançou no contexto internacional como uma<br />

fonte de matérias primas. Através dele se desenvolveram relações de poder, arranjos<br />

políticos e sociais que repercutiram seus efeitos até os dias de hoje.<br />

O primeiro boom algodoeiro a surtir efeitos no Nordeste, data do período colonial<br />

em fins do séc. XVIII e tem como foco a província do Maranhão, é causado pela<br />

demanda da fibra pela então nascente indústria têxtil britânica que coincidia com a Guerra<br />

de Independência dos EUA, e que eram até aquele momento o maior produtor e<br />

fornecedor de algodão para o mercado britânico , já naquele momento fica demonstrada a<br />

relação de extrema dependência dos fatores e flutuações do mercado externo, o que<br />

torna o desenvolvimento dessa cultura peculiarmente suscetível á eventos e causas<br />

externas.<br />

O Nordeste, neste caso precedido e encabeçado pela província do Maranhão, é<br />

alçado ao posto de maior produtor de algodão da colônia já em princípio do séc. XIX.<br />

Ao comentar a ascensão e causas da elevação da província do Maranhão a esse<br />

posto, Moreira e Santos afirmam:<br />

“Os agentes responsáveis por este aumento das exportações de<br />

algodão nesta fase foram, primeiramente, a Guerra de Independência<br />

norte-americana que impediu o fornecimento de algodão dos Estados<br />

Unidos a Inglaterra, logo depois a revolução industrial. (…) Portanto a<br />

nova conjuntura, aliada às facilidades advindas da criação da<br />

Companhia do Grão Pará e Maranhão,foi suficiente para enorme<br />

expansão que experimentou a lavoura algodoeira maranhense,<br />

mesmo após a extinção da Companhia, em 1798. A expansão foi


tamanha que o Maranhão, no período de 1760 a 1818 ocupou a<br />

posição de maior produtor de algodão do Brasil”. (MOREIRA e<br />

SANTOS apud COSTA, 1996:50)<br />

O potencial econômico da cultura era tão extraordinário que enquanto no último<br />

quartel do séc. XVIII a colônia passava por dificuldades, a capitania do Maranhão<br />

desfrutava de uma incomum prosperidade econômica, o Nordeste então seguindo seu<br />

exemplo começava a dedicar recursos para a produção de algodão. (FURTADO,<br />

2007:140-141)<br />

O Algodão na Paraíba<br />

Mesmo após o primeiro surto da procura pelo algodão e seu respectivo<br />

arrefecimento, os demais estados do Nordeste continuaram a destinar mais recursos em<br />

favor da cotonicultura e consequentemente uma maior estrutura que daria suporte ao<br />

futuro crescimento da demanda, durante toda a extensão que se situava entre as décadas<br />

de 1820 e 1860 eixo de produção e distribuição do algodão sofre um lento e gradual<br />

deslocamento do estado do Maranhão em direção aos estados da Bahia, Pernambuco,<br />

Paraíba e Rio Grande do Norte.<br />

A Paraíba que partilhava dos fatores geoclimáticos com os demais, se destacava<br />

por técnicas mais apuradas e por um maior histórico de familiaridade com a cultura devido<br />

a uma pequena, mas relevante produção de algodão do tipo mocó, uma variedade<br />

arbórea endógena da região do Seridó que abrangia os estados da Paraíba e do Rio<br />

Grande do Norte, além disso, contava com Campina Grande, cidade que veio a se tornar<br />

em uma das maiores praças de comércio e distribuição de algodão no mundo. Tal<br />

configuração, fez com que o estado da Paraíba pudesse aproveitar imensamente o<br />

próximo boom na demanda, que ocorreria agora em função da Guerra de Secessão nos<br />

EUA que durou de 1861 a 1865, e que mais uma vez privava o mercado de seu maior<br />

fornecedor, fazendo com que o preço do algodão se elevasse exponencialmente. Esse<br />

contexto fez com que a Paraíba experimentasse influxos de renda sem paralelos em sua<br />

história, e subverteu até mesmo as posições na balança de exportações, desbancado a<br />

cultura canavieira de seu tradicional posto de maior atrativo de divisas para o estado, do<br />

começo da década de 1860 ao começo de 1870. Tal movimento pode ser conferido no<br />

quadro 1:


Quadro 1<br />

Província da Paraíba: evolução das exportações de algodão, açucar e couro -<br />

1862/1871<br />

Anos Algodão<br />

(arrobas)<br />

Índice Açúcar<br />

(arrobas)<br />

Índice Couros<br />

(arrobas)<br />

1862 216.468 100 683.081 100 9.600 100<br />

Índice<br />

1863 197.505 91,2 574.274 84 21.377 222,6<br />

1864 397.728 183,7 432.318 63,2 22.259 231,8<br />

1865 446.937 206,4 269.885 39,5 13.258 138,1<br />

1866 542.133 250,4 400.047 58,5 19.938 207,6<br />

1867 398.620 184,1 320.275 46,8 12.877 134<br />

1868 569.897 263,2 300.937 44 27.817 289,7<br />

1869 533.609 246,5 448.445 65,6 30.126 313,8<br />

1870 377.178 174,2 268.205 39,2 17.212 179,1<br />

1871 681.355 314,7 230.481 33,7 45.495 437,9<br />

Fonte: VASCONCELLOS, 1980:71<br />

Percebe-se através da tabela que o período abrangido entre 1862-1871 conteve<br />

um aumento de mais de 200% no volume de algodão exportado, isso em grande parte<br />

decorrente da Guerra de Secessão que contribuiu sobremaneira para a expansão<br />

algodoeira no interior do Nordeste e Paraíba.<br />

Tal movimento não ocorreu sem convulsões e modificações profundas no eixo de poder, o<br />

capital agrário que antes se encontrava concentrado no litoral e na zona da mata devido a<br />

cana, agora de se deslocara de forma muito substancial e relativamente rápida para o seu<br />

interior. Como um simples exercício de comparação, imagine a capital de qualquer estado<br />

brasileiro nos dias de hoje, perder o seu posto de importância política e industrial para o<br />

seu interior em um espaço de apenas dez anos, que transformações não acompanhariam<br />

essa mudança?<br />

O Eixo Político Das Mãos da Elite Canavieira Litorânea Para as Mãos da Elite<br />

Latifundiária do Interior


Um dos efeitos de que maneira alguma pode ser desconsiderado, é o que ocorreu<br />

no cenário político do Estado. Os conflitos ocorridos em torno das questões políticas que<br />

vieram no encalço da mudança do eixo econômico do litoral para o interior foram tão<br />

consistentes, que ainda hoje se pode observar a animosidade guardada entre as elites<br />

políticas do litoral e do interior do Estado.<br />

A violenta e abrupta mudança ocorrida no cenário econômico transferindo<br />

importância para o interior, não ocorreria na mesma intensidade no que tocava o status<br />

quo político da Paraíba, a elite política do litoral ofereceu bastante resistência ao<br />

enfraquecimento do seu poder frente a afluência econômica do interior.<br />

A luta política se centrava principalmente em torno das divisas econômicas que<br />

significavam as exportações do algodão, de fins do séc. XIX até a década de 1930, o<br />

algodão além da maior fonte de renda para o Estado, era a principal fonte de poder e<br />

dinheiro para os coronéis da região. Tal fato não deixou de despertar nos políticos da<br />

Capital seus próprios interesses, aliados a burguesia pessoense, comerciantes e médios<br />

beneficiadores, eles em mobilizaram a máquina estatal na tentativa de obter ganhos,<br />

obrigando que o algodão aqui produzido, fosse comercializado e exportado pelo porto de<br />

Cabedelo, garantindo reserva de mercado aos comerciantes e beneficiadores locais,<br />

como também obtendo verbas mediante a taxação do produto. Esse conflito foi efetuado<br />

pela tentativa de se obrigar que os cotonicultores despachassem sua mercadoria pelo<br />

porto de Cabedelo ao invés do Recife, não contavam que o capital internacional<br />

dificultaria seus planos, ainda que de maneira incidental através da figura da Great<br />

Western Brasil Railway, companhia de trem responsável por levar a estrada de ferro ao<br />

interior da Paraíba, por conveniências geográficas e estruturais acabou conectando o<br />

ramal ferroviário de Campina Grande a cidade de Recife, notadamente esse era um<br />

projeto que datava desde o Império, a burguesia comercial da cidade de Campina<br />

Grande, se antes do trem os grandes proprietários já preferiam a capital pernambucana<br />

para o escoamento do “ouro branco”, com o trem conectando Campina e Recife o volume<br />

e intensidade do comércio entre as duas cidades só aumentou de intensidade. A capital<br />

paraibana foi constantemente preterida frente a pernambucana, Campina Grande, que se<br />

situava entre as maiores rotas de comércio que ligavam os sertões dos estados do Ceará,<br />

Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba.


A ostensividade da relação entre as elites interioranas e o capital sediado na<br />

Capital de Pernambuco fez com que Campina Grande fosse chamada de “a mais<br />

pernambucana das cidades da Paraíba” (ARANHA)<br />

Essa situação fica mais clara ao se observar o quadro 2, contendo as exportações<br />

de algodão que passavam pela cidade de Campina Grande:<br />

Quadro 2<br />

Destino do Algodão Comercializado em Campina Grande:<br />

Ano Algodão comercializado em C. Grande (em<br />

toneladas)<br />

João Pessoa % Recife %<br />

1919 5210 1793 34,5 3417 65,5<br />

1920 10316 3443 33,3 6873 66,7<br />

1921 8976 3899 43,4 5077 55,6<br />

1922 10529 2643 25 7886 74,9<br />

1923 14053 1245 8,8 2808 91,2<br />

1924 9104 6039 66,3 3065 33,7<br />

TOTAL 58189 19063 32,8 39126 67,2<br />

Fonte: VASCONCELLOS 1980 p.71<br />

Todo esse volume de algodão comercializado em Campina a tornava a terceira<br />

maior praça de negociação de algodão no mundo, além da produção de praticamente<br />

todo estado, Campina operava como um hub de escoamento da produção de algodão do<br />

Ceará e do Rio Grande do Norte.<br />

Condições e arranjos de trabalho em torno da cultura do algodão na Paraíba<br />

Deve-se levar em conta que o enorme progresso e influxo de capital por meio do<br />

algodão não foi feito senão através de um rígido esquema de exploração do trabalho, a<br />

“sujeição”. Entre 1870 e 1930 às novas configurações de uso da terra engendradas pela<br />

cotonicultura modificaram drasticamente às relações de trabalho, Linda Lewin relatando a


situação do “'novo' campesinato” faz a seguinte colocação:<br />

“O mais forte impacto do algodão nas zonas interioranas resultou na<br />

reorganização da população rural num novo sistema de trabalho.<br />

Embora legalmente livres, os moradores agrícolas do Nordeste foram<br />

incorporados num arranjo subordinado ao que eles próprios se<br />

referiam como sujeição literalmente, submissão ou subjugação. Mais<br />

recentemente, este sistema tornou-se universalmente familiar como<br />

trabalho cambão, nome derivado da peça de madeira que se<br />

dependura ao pescoço das reses bravias para impedi-las de correr e,<br />

assim, controlar a boiada.”(LEWIN, 1993:63-4)<br />

Lewin ainda destaca que, ironicamente, esse recrudescimento das relações de<br />

trabalho se deu enquanto o regime escravocrata já cedia lentamente através do país, e<br />

ainda acrescenta sobre as configurações de trabalho impostas pela cultura do algodão<br />

sublinhando duas de suas características:<br />

“Seja através de partilha da colheita ou de arranjos de quase<br />

arrendamento, o sistema de sujeição predominou por todo o interior<br />

do Nordeste depois do auge do algodão da década de 1860. Um meio<br />

de exploração que assegurava trabalho barato e submisso para os<br />

proprietários, o sistema da sujeição divergia em dois aspectos das<br />

relações anteriores entre proprietário e morador. Em primeiro lugar,<br />

sua existência dependia do desaparecimento ou da obliteração<br />

deliberada do campesinato médio e da conversão daquele estrato de<br />

proprietários livres num grupo de moradores agrícolas sem terra.”<br />

(LEWIN, 1993:64)<br />

A desapropriação da terra do pequeno agricultor e sua consequente sujeição se<br />

deu de maneira mais enfática a partir da década de 1870, após o primeiro surto do<br />

algodão, o proprietário de grandes extensões de terra, fazendo uso de seu poderio<br />

econômico concedia empréstimos ao pequeno proprietário, que com a queda sucessiva<br />

nos preços após a queda da demanda ou devido a reveses na própria safra, não<br />

conseguia saldar seus débitos, e como sua pequena propriedade fora dada como<br />

garantia, o grande proprietário logo a anexava ao seu latifúndio, deste modo, um enorme


contingente de pequenos proprietários viu-se destituída e lançada ao esquema de<br />

sujeição tornando-se então meeiros, posseiros ou foreiros.<br />

Em situação ainda mais precária encontrava-se o trabalhador assalariado, o braço<br />

alugado, este além de destituído de quaisquer garantias, tinha uma situação bastante<br />

instável ligada ao regime de safras, era de longe “o mais miserável dentre os<br />

trabalhadores sertanejos” e ainda era marcado pelo estigma, disseminado até mesmo<br />

entre os pequenos trabalhadores do regime de sujeição, que tal trabalhador estava<br />

reduzido a nada, fica fácil entender o porquê de tal estigma se tentarmos enxergar como o<br />

trabalhador do regime de sujeição encarava à sua própria situação, Aranha salienta esse<br />

aspecto:<br />

“(...)o que é curioso é que, no imaginário dos trabalhadores que se<br />

submetiam à 'morada', eles não se viam a si próprios como categoria<br />

explorada. Eles não percebiam, por exemplo, que a relação de<br />

'morada' encerrava, em si, um determinado grau de exploração, haja<br />

vista que ela colocava ao dispor do proprietário toda uma capacidade<br />

de força de trabalho, por um baixo custo de reprodução.”(ARANHA,<br />

1991:213)<br />

Inserido nesse contexto de exploração, estava o fato que o algodão se apresentava<br />

como uma excelente cultura para o consórcio, esta era a principal estratégia produtiva<br />

tanto entre pequenos como entre grandes, entre grandes, o algodão era relegado muitas<br />

vezes como segunda cultura, tendo o primeiro lugar a pecuária, é interessante notar, que<br />

a pecuária muitas vezes deficitária era encarada como principal atividade do grande<br />

proprietário tendo o seu déficit coberto pelo excedente da produção de algodão (ARAÚJO,<br />

2006).<br />

Porém devemos notar que tal situação não deve ser observada somente pelo<br />

prisma da exploração, esse arranjo, embora altamente questionável por nossos padrões,<br />

representava sim, algumas vantagens para os pequenos agricultores que a ele se<br />

submetiam, nesse aspecto devemos tentar enxergar com os olhos do pequeno agricultor,<br />

situado em uma região de adversidade climática, sujeito às mais diversas intempéries que<br />

estavam sujeitos os trabalhadores do campo, essa relação de clientelismo e<br />

patriarcalismo, acabava por representar um refúgio para ele.


Fitossanidade e Histórico da Pesquisa Cientifica e Desenvolvimento Tecnológico<br />

em Torno do Algodão<br />

Com o desempenho do algodão fazendo-se notar de tal maneira na economia, era<br />

de se esperar que, seguindo um fluxo natural dentro do sistema capitalista, meios para<br />

uma maior produtividade fosse logo adicionados a sua cadeia de produção e cultivo. De<br />

maneira que o algodão sofreu um grande aporte de recursos no seu desenvolvimento<br />

enquanto cultura de interesse para o mercado.<br />

Outra característica peculiar à cultura do algodão, era que como uma planta<br />

cultivada em clima tropical, a ocorrência de pragas era algo praticamente inerente ao seu<br />

cultivo. No Nordeste, os registros das primeiras pragas a atingir o algodão, datam de<br />

1587, Alberto da Silva Rêgo cita Gabriel Soares de Souza sobre uma “lagarta que<br />

destroçava plantações de algodão”. Em 1794, Manoel de Arruda Câmara relata uma série<br />

de doenças e pragas que afligem o Algodão no estado do Pernambuco, entre 1848 e<br />

1852 a safra cearense é duramente atingida pela proliferação do “mofo”. A partir do séc.<br />

XX o registro se faz mais apurado:<br />

Em 1916, Iglesias, na Estação Experimental de Coroatá, no<br />

Maranhão é quem primeiro divulga informações acerca da broca-<br />

gasterocercodes gossypii Pierce(...)<br />

Em 1917, relatado por Green e A. M. Costa Lima(1918-1919) têm-se<br />

as primeiras referências da lagarta rosada como pragas dos<br />

algodoeiros do Nordeste Brasileiro.<br />

Em 1921, Pearse, em seu Brazillian Cotton, reitera a existência de<br />

lagarta rosada e curuquerê como as pragas de maior importância nos<br />

algodoeiros nordestinos. (REGÔ, 1971:8)<br />

A lagarta rosada, sendo uma praga de extrema gravidade para cultura algodoeira<br />

no Nordeste, introduzida no país ainda no séc. XIX segundo registro:<br />

Ainda sobre a lagarta rosada, dados coligidos por A. M. Costa Lima e


Green, permitem afirmar que em 1882 é que houve a introdução<br />

dessa praga no País.(REGÔ, 1971:9)<br />

Praticamente toda melhoria em torno da cultura do algodão se fez na tentativa de<br />

se obter uma maior robustez frente às pragas e o clima árido. A pesquisa cientifica se<br />

concentrou em torno do cruzamento entre diversas espécies exógenas e o algodão mocó,<br />

com fins a se atender o mercado externo e, como de praxe, a necessidade por maior<br />

produtividade da indústria capitalista. Rêgo (1971:09-10) afirma que a introdução de<br />

variedades exógenas começou já a partir do século XVIII, em fins do séc. XIX começam<br />

experimentações com o cruzamento de variedades, e no séc. XX a vinda de especialistas<br />

ingleses traz um maior aporte cientifico a cultura. A tradição e responsabilidade sobre a<br />

pesquisa e melhoramento genéticos cairão por fim sobre a EMBRAPA.<br />

Do auge ao declínio<br />

O cenário aqui tratado esboça o início e algumas características que marcaram o<br />

ciclo do algodão na Paraíba, que durou de forma substancial das décadas de 1860 a<br />

1930, esse ciclo comportou todo um conjunto de mudanças e situações definidoras de<br />

uma série de relações sociais que estenderam seus efeitos até o dia presente. O algodão<br />

representa, de fato, a inserção do Nordeste e da Paraíba em uma nova conjuntura, que<br />

ultrapassa o mercantilismo representado pela cana de açúcar e apresenta um novo<br />

paradigma da divisão do trabalho e da produção alocando o Brasil e o Nordeste como um<br />

fornecedor de matérias primas às potências industriais. Embora tal processo tenha<br />

desencadeado desenvolvimento tecnológico e social para às nações industrializadas,<br />

aqui ela representou atraso e um recrudescimento nas relações sociais, como pode ser<br />

observado no caso da sujeição.<br />

No entanto é patente que do ponto de vista econômico o algodão representou um<br />

importante avanço para o Nordeste e Paraíba. A partir de 1860, atrelado ao panorama<br />

internacional, esse mercado trouxe renda e recursos que foram mais do que necessários<br />

ao desenvolvimento do estado e da região, ainda que pálido face às mudanças ocorridas<br />

em outros locais, esses avanços formaram às bases do que viriam a ser às relações<br />

sociais que se mostram presentes até o dia de hoje. O mercado de algodão, com seus<br />

sucessivos ciclos de expansão e retração, configuraram um dos maiores influxos de renda


para o estado até os anos 1930, quando mudanças no mercado externo, a<br />

industrialização do sudeste, a mudança do eixo de produção do algodão para o sudeste e<br />

centro-oeste, e o aparecimento de pragas, começaram a fragilizar e por fim destituir o<br />

algodão de seu posto de extrema importância para a economia do Nordeste, fatores<br />

esses que contribuíram para o fenômeno do grande êxodo de trabalhadores nordestinos<br />

em direção ao sudeste do país.<br />

A possível retomada<br />

O algodão ensaia agora, no séc. XXI, uma retomada do seu papel de extrema<br />

importância para a vida e o desenvolvimento dos setores rurais da Paraíba, e em especial<br />

da agricultura familiar. Em 1970 é criada no estado à EMBRAPA ALGODÃO, que tem por<br />

fim o desenvolvimento de tecnologias capazes de modernizar e adaptar a cultura a uma<br />

estratégia produtiva galgada sob o paradigma da sustentabilidade. O algodão orgânico e<br />

o naturalmente colorido representam um avanço nessa direção, focado agora na<br />

agricultura familiar, tida como ator capaz de fomentar um avanço sustentável não só<br />

ambientalmente, mas socialmente de acordo com às diretrizes pretendidas pela<br />

EMBRAPA. Nesse novo cenário, onde o foco é o agricultor familiar, é notável que a<br />

cultura tenha aumentado sua complexidade não só no que se refere a tecnologia e o<br />

cultivo, mas sobretudo em sua cadeia de distribuição, envolvida em uma série de laços<br />

discursivos e institucionais que englobam o discurso sustentável. Essa complexidade, em<br />

contraste com o histórico da cultura do algodão e seus traços de patriarcalismo e sujeição<br />

são fatores que a fazem demandar políticas públicas para o seu sucesso.<br />

O binômio Algodão Pecuária no Cariri Paraibano<br />

O Cariri<br />

O Cariri Paraibano é uma microrregião do estado da Paraíba, subdividida em duas<br />

partes, Oriental e Ocidental, o Cariri Oriental fica localizado na porção central do estado, o<br />

Cariri Ocidental na margem oeste da planície da Borborema. Contém 26 municípios e<br />

uma população de 177.323 habitantes segundo o censo IBGE de 2000.* Localizada no<br />

eixo das secas, é a região com a menor densidade pluviométrica do país. “A vegetação é<br />

constituída pela caatinga, a mais xerófila, apresentando-se geralmente com fisionomia de<br />

estepe arbustiva, deixando aparecer, durante a estiagem, um solo geralmente desnudo –


sem recobrimento herbáceo – e, portanto, não passível de incorporar matéria<br />

orgânica.(...)” (Duqué e Caniello 2004)<br />

A Agricultura no Cariri<br />

Apesar da adversidade climática, o Cariri sempre teve na agricultura e pecuária a<br />

sua atividade primária. Sua história está intimamente ligada a história da ocupação do<br />

solo, os eventos ocorridos na região formam um paralelo típico com o que ocorreu em<br />

outras regiões agrárias do país. A microrregião apresenta em si uma série de<br />

características daquilo que é a história rural do Nordeste. Com uma distribuição de terras<br />

majoritariamente latifundiária, com uma estrutura social marcada pelo, coronelismo, a<br />

amplo e indiscriminado uso dos sistemas de parceria e morada reforçando ainda mais a<br />

relação patriarcal e a hierarquia da sujeição. Esses elementos sem dúvida, formam uma<br />

imagem do que é o Nordeste Rural. A pecuária extensiva, cotonicultura e agricultura de<br />

subsistência formam o tripé de ocupação da terra na região.<br />

Êxodo Rural e Retorno<br />

Após o arrefecimento do ciclo do algodão, a cultura serviu basicamente para a<br />

manutenção do gado através da torta do algodão que servia de ração. Após a depressão<br />

ciclo algodoeiro e a exaustão do sistema de pecuária extensiva com baixa produtividade<br />

sujeita a peculiaridade climática da região. A região foi abruptamente atingida pelo êxodo<br />

rural. Vendo sua população economicamente ativa partir em busca de oportunidades de<br />

emprego e renda nos grandes centros urbanos do país a partir da década de 1950, um<br />

movimento que perdurou de maneira significativa até o último quartel do séc. XX,<br />

situação essa do êxodo rural compartilhada por boa parte do interior do Nordeste.<br />

Muito desses trabalhadores tento suas expectativas frustradas, e até mesmo por<br />

um movimento natural, agora retornam a sua terra natal impulsionados por um novo ciclo<br />

de desenvolvimento marcado pelo paradigma da sustentabilidade. O retorno do binômio<br />

algodão-pecuária, através do gado de pequeno porte e do algodão orgânico, como<br />

estratégia produtiva no Cariri Paraibano se apresenta como uma alternativa de renda e<br />

melhoria de vida para uma boa parte desses trabalhadores e famílias.<br />

No entanto dada a complexidade do mercado atual e da cultura em si, demandam-


se políticas públicas capazes de instrumentalizar o sucesso desse novo ciclo do algodão<br />

na região. Observando se o objetivo proposto pelas agências de uma maior<br />

responsabilidade social e de fato cumprido.<br />

Às informações aqui dispostas visam fornecer dados para que políticas públicas<br />

sejam implementadas de maneira mais eficiente e abrangente no que se trata do retorno<br />

do algodão como uma chave de desenvolvimento, apresentando o contexto sócio-<br />

histórico do qual o algodão fez parte e onde desempenhou seu papel de catalisador<br />

social. Agora mais uma vez o algodão se apresenta no horizonte como um veículo de<br />

transformações e progresso, porém desta vez sob um prisma de responsabilidade social e<br />

ambiental.<br />

BIBLIOGRAFIA:<br />

ARAÚJO, Jair Barbosa. O algodão de Campina Grande: Uma discussão acerca dos livros<br />

didáticos de história. Campina Grande: Agenda, 2006.<br />

ARANHA, Gervácio Batista. Campina Grande No Espaço Econômico Regional: Estrada<br />

de Ferro, Tropeiros e Empório Comercial Algodoeiro (1907 – 1957). Campina Grande:<br />

UFPB, 1991. Dissertação de mestrado em Sociologia Rural<br />

COSTA, José Jonas Duarte da. A Crise do Sistema de Produção algodoeiro Paraibano:<br />

(uma análise das causas). Campina Grande: UFPB, 1996. Dissertação de mestrado.<br />

DUQUÉ, Guislaine e CANIELLO, Márcio. Agrovila ou casa no lote: a questão da moradia<br />

nos assentamentos da reforma agrária no Cariri Paraibano, 2004<br />

DUQUÉ, Guislaine. “Estrutura fundiária e pequena produção: um estudo de caso no Cariri<br />

Paraibano”. Raízes: Revista de Ciências Sociais e Econômicas, no 4-5<br />

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Das Letras,<br />

2007.


LEWIN, Linda. Política e parentela na Paraíba: um estudo de caso da oligarquia de base<br />

familiar. Rio de Janeiro: Record, 1993.<br />

RÊGO, Alberto da Silva. Algodão. Recife: Superintendência Do Desenvolvimento do<br />

Nordeste, 1971.<br />

VASCONCELLOS, Silvano Alberto de. Ascensão e Queda da economia algodoeira de<br />

Campina Grande (1907-1940): um estudo de caso. Campina Grande: UFPB, 1980.<br />

Dissertação de mestrado em Engenharia de Produção.

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