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14 Tema de capa: Leishmaniose canina<br />
Prevenção é a resposta<br />
Há indicações de que a tão esperada vacina pode chegar ainda este ano mas, para já, a prevenção é a melhor<br />
forma de travar a Leishmaniose canina e nela os médicos veterinários desempenham um papel crucial.<br />
Simultaneamente há fármacos mais eficazes que permitem uma melhor qualidade e esperança de vida de<br />
muitos animais infecta<strong>do</strong>s.<br />
O estu<strong>do</strong> epidemiológico, "Semana da Leishmanio-<br />
se", realiza<strong>do</strong> no ano passa<strong>do</strong> pelo Observatório Na-<br />
cional das Leishmanioses (ONLeish) não deixou mar-<br />
gem para dúvidas: a leishmaniose canina (LCan) é<br />
endémica em Portugal continental, com uma seropre-<br />
valência média de 6%, estiman<strong>do</strong> -se assim que exis-<br />
tam cerca de 110 mil cães infecta<strong>do</strong>s. Nos distritos de<br />
Beja, Portalegre e Castelo Branco (o que tem maior in-<br />
cidência com 16%), situa -se entre 10% e 16%.<br />
É, por isso, fundamental travar o seu avanço e a<br />
única ‘arma’ existente é a prevenção, já que não exis-<br />
te no merca<strong>do</strong> europeu uma vacina anti -leishmaniose<br />
para o tipo que afecta a região mediterrânica, Norte<br />
de África, Turquia, Israel, Grécia, Balcãs, Irão, algumas<br />
regiões da China e Ásia central, onde a infecção é cau-<br />
sada por protozoários da espécie Leishmania infan-<br />
tum sen<strong>do</strong> a <strong>do</strong>ença transmitida por pequenos insec-<br />
tos <strong>do</strong> género Phlebotomus.<br />
Em Portugal, Espanha, Grécia, Itália e França, que<br />
são os países mais afecta<strong>do</strong>s na Europa devi<strong>do</strong> ao cli-<br />
ma mediterrânico que propicia a existência <strong>do</strong> vec-<br />
tor, estima -se que haja cerca de 2,5 milhões de cães<br />
infecta<strong>do</strong>s.<br />
Há vários grupos de investiga<strong>do</strong>res (inclusive em<br />
Portugal) a trabalhar nesta vacina e diversas fontes<br />
confirmaram ter informações de que o pedi<strong>do</strong> de au-<br />
torização pode chegar ainda este ano à Autoridade<br />
Europeia <strong>do</strong> Medicamento mas, por enquanto, são<br />
conjecturas.<br />
A investiga<strong>do</strong>ra Gabriela Santos -Gomes, <strong>do</strong> Institu-<br />
to de Higiene e Medicina Tropical (IHMT/UNL), afirma<br />
que "diversos laboratórios estão a trabalhar numa va-<br />
cina" e explica -nos que há várias investigações pro-<br />
missoras no nosso País, como a "Análise <strong>do</strong> potencial<br />
imunoprotector de diferentes proteínas de Leishma-<br />
nia infantum" que Ana Maria Luís Ramos Tomás <strong>do</strong><br />
Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC/UP)<br />
tem vin<strong>do</strong> a desenvolver nos últimos anos. "Tem ti<strong>do</strong><br />
Emília Freire<br />
resulta<strong>do</strong>s muito satisfatórios em roe<strong>do</strong>res, com índi-<br />
ces de protecção de cerca de 90% e com indicação de<br />
que se estabeleceu memória celular, mas o trabalho<br />
em cães é muito mais exigente e oneroso e ainda há<br />
muito trabalho pela frente".<br />
A também co -autora coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> livro "Leish-<br />
maniose Canina", publica<strong>do</strong> há um ano em Portugal,<br />
adianta que no IHMT, em colaboração com a Faculda-<br />
de de Farmácia da Universidade de Lisboa, "estamos<br />
a fazer testes laboratoriais com um fármaco já exis-<br />
tente a trifluralina, que tem efeito ao nível <strong>do</strong>s mi-<br />
crotúbulos das leishmanias, produzin<strong>do</strong> deriva<strong>do</strong>s<br />
através de alterações químicas e tivemos resulta<strong>do</strong>s<br />
positivos em modelo roe<strong>do</strong>r. Agora, com um novo fi-<br />
nanciamento vamos fazer ainda mais algumas altera-<br />
ções com nanopartículas e testar em ratinhos, para<br />
depois poder avançar para os cães".<br />
DR<br />
"Mas to<strong>do</strong>s estes tipos de estu<strong>do</strong>s demoram mui-<br />
tos anos a desenvolver", frisa Gabriela Santos -Gomes.
No Brasil existem já duas vacinas, embora a "Leish-<br />
mune" <strong>do</strong>s laboratórios Fort Dodge seja a mais utili-<br />
zada, com resulta<strong>do</strong>s ainda não totalmente compro-<br />
va<strong>do</strong>s. Além disso, são indicadas para outro tipo de<br />
leishmaniose, causada por protozoários da espécie L.<br />
brasiliensis (sen<strong>do</strong> os parasitas transmiti<strong>do</strong>s por pe-<br />
quenos insectos da família <strong>do</strong>s flebótomos mas <strong>do</strong><br />
género Lutzomyia) e não há estu<strong>do</strong>s que permitam di-<br />
zer que a vacina de lá teria bons resulta<strong>do</strong>s cá.<br />
Lucília Mendes da Divisão de Gestão e Autoriza-<br />
ção de Medicamentos e Produtos Veterinários da<br />
Direcção -Geral de <strong>Veterinária</strong> (DGV) garante: "sabe-<br />
mos ser desenvolvida a partir de promastigotas de L.<br />
<strong>do</strong>novani. No entanto, não podemos avalizar da sua<br />
qualidade, segurança e eficácia porquanto nunca tive-<br />
mos acesso ao seu <strong>do</strong>ssier nem nunca fomos aborda-<br />
<strong>do</strong>s pela Fort Dodge, no senti<strong>do</strong> de obterem qualquer<br />
tipo de autorização para a “Leishmune”".<br />
A responsável salienta ainda que "estes medica-<br />
mentos veterinários imunológicos são desenvolvi<strong>do</strong>s<br />
toman<strong>do</strong> em linha de conta as diferenças entre as di-<br />
versas leishmanias e o género <strong>do</strong> vector hematófago e<br />
que as diferenças fisiológicas e bioquímicas das leish-<br />
manias podem condicionar a resposta imunitária".<br />
Neste momento, na Europa não se encontram au-<br />
toriza<strong>do</strong>s medicamentos veterinários imunológicos,<br />
contra a leishmaniose.<br />
Prevenir é possível<br />
"Semana da Leishmaniose", resulta<strong>do</strong>s preliminares, ONLeish.<br />
"É fundamental que os médicos<br />
veterinários informem correctamente<br />
os <strong>do</strong>nos <strong>do</strong>s animais sobre a <strong>do</strong>ença<br />
e as formas de prevenção", Isabel<br />
Pereira da Fonseca, FMV/UTL<br />
Por isso, enquanto não se desenvolve uma vaci-<br />
na, a prevenção impõe -se. A única forma de prevenir<br />
a <strong>do</strong>ença é através da prevenção da picada <strong>do</strong> insec-<br />
to transmissor da leishmaniose. Médicos veterinários<br />
e <strong>do</strong>nos de cães (LCan é uma zoonose parasitária vec-<br />
torial pode infectar vários mamíferos, inclusive o ho-<br />
mem embora o hospedeiro vertebra<strong>do</strong> preferencial<br />
para L. infantum seja o cão) têm ao seu dispor pro-<br />
dutos insecticidas (apresenta<strong>do</strong>s em coleira, unção<br />
punctiforme, entre outros) que garantem uma certa<br />
protecção contra a picada <strong>do</strong> flebótomo. Mas a me-<br />
lhor opção é a utilização de coleiras impregnadas de<br />
deltametrina, como é recomenda<strong>do</strong> pela Organização<br />
DR<br />
<br />
<br />
15
16 Tema de capa: Leishmaniose canina<br />
Luís Madeira de Carvalho, FMV/UTL<br />
As Leishmanioses, em Portugal, são causadas pelo protozoário, Leishmania infantum<br />
transmitida, de cão a cão ou de cão ao Homem, através da picada de um insecto. Formas<br />
promastigotas da leishmania (à esq.) e leishmanias dentro de macrófagos (à dir.).<br />
Mundial de Saúde. Estas chegam a conseguir preve-<br />
nir 95% das picadas <strong>do</strong>s flebótomos transmissores da<br />
LCan e, quan<strong>do</strong> utilizadas em condições ideias, prote-<br />
gem o animal durante vários meses.<br />
Todavia, estu<strong>do</strong>s desenvolvi<strong>do</strong>s sobre o aqueci-<br />
mento global indicam que há uma tendência para o<br />
aumento da transmissão da leishmaniose canina, de-<br />
vi<strong>do</strong> ao aumento <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de actividade <strong>do</strong>s insec-<br />
tos transmissores. Estima -se que em Portugal este<br />
perío<strong>do</strong> possa prolongar -se até Novembro.<br />
"Devi<strong>do</strong> às alterações climáticas, a época da acti-<br />
vidade <strong>do</strong>s vectores tem aumenta<strong>do</strong> e os cães ficam<br />
mais susceptíveis e durante mais tempo a contrair<br />
infecções, transmitidas pelas pulgas, carraças e pe-<br />
los flebótomos. É essencial estar atento e prolongar<br />
no tempo a aplicação <strong>do</strong>s produtos anti -parasitários,<br />
como por exemplo as coleiras impregnadas de delta-<br />
metrina recomendadas pela Organização Mundial de<br />
Saúde", alertava em Outubro <strong>do</strong> ano passa<strong>do</strong>, Ro-<br />
<strong>do</strong>lfo Neves, médico veterinário da Intervet Schering-<br />
-Plough e secretário da direcção <strong>do</strong> ONLeish.<br />
E, já em Julho de 2009, Claúdio Mendão da Divi-<br />
são Saúde Animal da Bayer HealthCare, salientava,<br />
em comunica<strong>do</strong>, que "infelizmente em Portugal con-<br />
tinua a fazer -se mais tratamento e menos prevenção.<br />
Apesar da maioria <strong>do</strong>s <strong>do</strong>nos dizer que faz prevenção<br />
e ter até consciência da perigosidade que constituem<br />
os parasitas externos, ainda existe um valor eleva<strong>do</strong><br />
que só o faz demasia<strong>do</strong> tarde, ou seja quan<strong>do</strong> vê os<br />
parasitas nos animais. Este é um cenário que tem de<br />
ser altera<strong>do</strong>, uma vez que actualmente já existem pro-<br />
dutos com propriedades repelentes e acaricidas efica-<br />
zes à disposição de to<strong>do</strong>s, que permitem proteger ani-<br />
mais e o Homem durante os perío<strong>do</strong>s de risco".<br />
Em Portugal estima -se que apenas 33% <strong>do</strong>s <strong>do</strong>-<br />
nos de animais que visitam com regularidade as clí-<br />
nicas veterinárias façam prevenção mensal. A grande<br />
maioria <strong>do</strong>s <strong>do</strong>nos utiliza ectoparasitários com pou-<br />
ca frequência abrin<strong>do</strong> caminho a resulta<strong>do</strong>s deficien-<br />
tes e contribuin<strong>do</strong> para a disseminação <strong>do</strong>s parasitas,<br />
bem como a transmissão de <strong>do</strong>enças vectoriais como<br />
a leishmaniose, de acor<strong>do</strong> com o mesmo comunica<strong>do</strong>.<br />
A prevenção é cada vez mais um aspecto essencial<br />
na medicina veterinária. O papel <strong>do</strong> médico veteriná-<br />
rio, ao elucidar os <strong>do</strong>nos <strong>do</strong>s animais de companhia<br />
das <strong>do</strong>enças e riscos das mesmas, bem como de re-<br />
comendar a utilização regular de produtos com activi-<br />
dade repelente e acaricida é pois fundamental e cada<br />
vez mais necessário.<br />
"Há muita informação contraditória, na Internet<br />
por exemplo, por isso é fundamental que os médi-<br />
cos veterinários informem correctamente os <strong>do</strong>nos<br />
A leishmaniose em Portugal é, geralmente, víscero -cutânea e os sintomas mais<br />
frequentes são emagrecimento, queda de pêlo, feridas persistentes na pele que não<br />
cicatrizam, lesões oculares, fraqueza geral e apatia, febres irregulares, crescimento<br />
exagera<strong>do</strong> das unhas, aumento <strong>do</strong> fíga<strong>do</strong> e baço.<br />
DR<br />
<strong>do</strong>s animais sobre a <strong>do</strong>ença e as formas de preven-<br />
ção", salienta Isabel Pereira da Fonseca, da Facul-<br />
dade de Medicina <strong>Veterinária</strong> da Universidade Téc-<br />
nica de Lisboa. "E há formas muito simples, de<br />
eliminar cria<strong>do</strong>uros <strong>do</strong>s flebótomos reduzin<strong>do</strong> o nú-<br />
mero destes insectos, tal como evitar a acumulação<br />
de lixos nos jardins e, no que se refere à prevenção<br />
da picada é conveniente manter o animal dentro de<br />
casa desde o anoitecer ao amanhecer, perío<strong>do</strong> pre-<br />
ferencial para a alimentação das fêmeas de flebó-<br />
tomos, embora nas cidades a iluminação artificial<br />
esteja a introduzir algumas alterações a este com-<br />
Vigiar a <strong>do</strong>ença:<br />
LEISHnet<br />
Encoraja<strong>do</strong> pela forte adesão à "Semana da<br />
Leishmaniose" (estu<strong>do</strong> já referi<strong>do</strong>) o ONLeish está<br />
a promover mais uma iniciativa pioneira em Por-<br />
tugal e na Europa, que permitirá gerar informação<br />
relevante sobre a LCan e para a qual precisa da co-<br />
laboração de to<strong>do</strong>s os médicos veterinários.<br />
É o projecto LEISHnet, Rede de Vigilância Epide-<br />
miológica da Leishmaniose Canina, cujo "objecti-<br />
vo é criar uma base de da<strong>do</strong>s, em tempo real, com<br />
o apoio <strong>do</strong>s laboratórios e médicos veterinários,<br />
<strong>do</strong>s casos de LCan que sejam diagnostica<strong>do</strong>s", ex-<br />
plica Lenea Campino, <strong>do</strong> IHMT/UNL e presidente<br />
da direcção <strong>do</strong> ONLeish.<br />
O ONLeish irá depois avaliar estatisticamente<br />
os da<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s, comunicar os resulta<strong>do</strong>s à co-<br />
munidade científica e informar o público em geral,<br />
contribuin<strong>do</strong> para o seu esclarecimento e, espera-<br />
-se, a comportamentos de prevenção da <strong>do</strong>ença.<br />
"À rede já se associaram os laboratórios de<br />
análises clínicas que realizam diagnóstico da LCan<br />
mas a LEISHnet só poderá desenvolver -se com o<br />
apoio de to<strong>do</strong>s os médicos veterinários", alerta<br />
Lenea Campino, afirman<strong>do</strong> que o ONLeish está a<br />
enviar um mailing a cerca de 300 clínicas, apelan-<br />
<strong>do</strong> à sua colaboração.<br />
E o que é preciso o médico fazer? Não muito!<br />
O ONLeish desenvolveu folhas de requisição de<br />
análises específicas para leishmaniose, no qual o<br />
médico veterinário inclui, para além da informa-<br />
ção comum, se há suspeita clínica de leishmanio-<br />
se, quais os sinais clínicos presentes e se a este<br />
animal já tinha si<strong>do</strong> diagnostica<strong>do</strong> leishmaniose<br />
anteriormente (nos casos de animais em acom-<br />
panhamento clínico) ou não. Submete depois<br />
o material a analisar e a folha de análise para o<br />
laboratório<br />
O laboratório realiza as análises e remete o re-<br />
sulta<strong>do</strong> para o médico veterinário e as folhas de<br />
requisição, com o resulta<strong>do</strong>, para o ONLeish.<br />
Com esta informação o Observatório poderá<br />
conferir quais são os novos casos de leishmaniose<br />
e os anteriormente diagnostica<strong>do</strong>s.<br />
To<strong>do</strong>s estes da<strong>do</strong>s serão depois inseri<strong>do</strong>s na<br />
LEISHnet e regularmente trata<strong>do</strong>s estatisticamen-<br />
te para emissão de relatórios, comunicações, etc.
18 Tema de capa: Leishmaniose canina<br />
portamento", diz a também co -autora coordena<strong>do</strong>-<br />
ra <strong>do</strong> livro "Leishmaniose Canina".<br />
Gabriela Santos -Gomes salienta, por seu la<strong>do</strong>, que<br />
"só as fêmeas <strong>do</strong>s flebótomos é que transmitem a <strong>do</strong>-<br />
ença porque fazem refeições sanguíneas para a ma-<br />
turação <strong>do</strong>s ovos, os machos alimentam -se de sucos<br />
de plantas. O cão é o reservatório porque o flebótomo<br />
infecta -se ao picar um animal infecta<strong>do</strong> e depois trans-<br />
mite a <strong>do</strong>ença quan<strong>do</strong> se vai alimentar noutro animal".<br />
Novas esperanças<br />
Nos últimos anos, também se têm desenvolvi<strong>do</strong> no-<br />
vos fármacos, ou a adaptação de alguns de medici-<br />
na humana para a veterinária, como a miltefosina que<br />
parece ser o mais ‘revolucionário’, até agora.<br />
A miltefosina é a base de um medicamento antigo<br />
para tratar o cancro e que foi repensa<strong>do</strong> para a leish-<br />
maniose "nomeadamente para a leishmaniose hu-<br />
mana, sen<strong>do</strong> já muito utiliza<strong>do</strong> na Índia, onde é en-<br />
démica com surtos epidémicos e não há reservatório<br />
animal conheci<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> a transmissão na mesma<br />
através <strong>do</strong>s flebótomos mas que se infectam em hu-<br />
manos", explica Gabriela Santos -Gomes <strong>do</strong> IHMT.<br />
A investiga<strong>do</strong>ra lembra que o antimoniato de me-<br />
glumina foi, e ainda é, o princípio activo mais usa<strong>do</strong><br />
no tratamento da leishmaniose mas que, "como o<br />
quinino para a malária, causou resistência e por isso<br />
era urgente arranjar um novo". A miltefosina tem vá-<br />
rias vantagens, tanto para a medicina humana como<br />
veterinária, porque é administrada por via oral e não<br />
causa lesões renais. Tem, no entanto, efeitos secun-<br />
dários ao nível <strong>do</strong> trato gastro -intestinal, pelo que por<br />
vezes tem de ser acompanha<strong>do</strong> por protectores gás-<br />
tricos. Este fármaco pode também ser administra<strong>do</strong><br />
em associação com o alopurinol.<br />
A única forma de prevenir<br />
a <strong>do</strong>ença é através da prevenção<br />
da picada <strong>do</strong> insecto transmissor<br />
da leishmaniose. A melhor opção<br />
é a utilização de coleiras<br />
impregnadas de deltametrina.<br />
"No entanto, a sua utilização requer que os pro-<br />
prietários tenham conhecimento das regras de boa<br />
utilização <strong>do</strong> produto. Devem ser tomadas diversas<br />
precauções, tais como o uso de luvas durante a ma-<br />
nipulação, evitar contacto com mucosas e evitar a sua<br />
manipulação por grávidas", alerta Catarina Pinheiro<br />
Rombert Pinhão, da FMV/UTL em "Leishmaniose Ca-<br />
nina – Estu<strong>do</strong> de 158 Casos da Região de Lisboa".<br />
O estu<strong>do</strong> salienta ainda que "deve ser administrada<br />
juntamente com o alimento, encontran<strong>do</strong> -se contra-<br />
-indicada em animais anorécticos" e que "a <strong>do</strong>se di-<br />
Diagnosticar<br />
e rastrear<br />
A altura da vacinação anti -rábica obrigatória anual é<br />
já usada para informar os <strong>do</strong>nos e diagnosticar a LCan<br />
em muitos animais, devi<strong>do</strong> a uma Portaria de 2002.<br />
"O que já é uma grande conquista em termos de ras-<br />
treio", defende Ro<strong>do</strong>lfo Neves, secretário da direcção<br />
<strong>do</strong> ONLeish.<br />
"A leishmaniose não é uma <strong>do</strong>ença de declara-<br />
ção obrigatória na União Europeia mas a Organização<br />
Mundial de Saúde Animal (OIE, ex -Office Internatio-<br />
nal des Épizooties) considera que deve ser uma <strong>do</strong>-<br />
ença de reporte, e isso foi um <strong>do</strong>s motivos que levou<br />
à alteração da Portaria n.º 81/2002, de 24 de Janei-<br />
ro, passan<strong>do</strong> a denominar -se “programa nacional de<br />
luta epidemiológica contra a raiva animal e outras zo-<br />
onoses”, entre as quais a leishmaniose", afirma Rita<br />
Ama<strong>do</strong>r, chefe da Divisão de Profilaxia e Polícia Sani-<br />
tária (Direcção de Serviços de Saúde e Protecção Ani-<br />
mal) da DGV. "Assim, demos suporte legal a várias<br />
acções de controlo que se fazem para a leishmanio-<br />
se", salienta.<br />
O anexo à referida Portaria explicita, resumidamen-<br />
te, que quan<strong>do</strong> os animais apresenta<strong>do</strong>s na campanha<br />
de vacinação anti -rábica exibam sintomas que permi-<br />
tam suspeitar de <strong>do</strong>ença infecto -contagiosa com po-<br />
tencial zoonótico nomeadamente leishmaniose, sar-<br />
na e dermatofitose, os detentores destes animais são<br />
notifica<strong>do</strong>s para realizarem testes de diagnóstico e<br />
apresentação <strong>do</strong>s respectivos resulta<strong>do</strong>s, ao médico<br />
veterinário municipal, no prazo de 30 dias, sob pena<br />
de instauração de procedimento contra -ordenacional.<br />
ária é de 2 mg/kg, mistura<strong>do</strong>s na ração, durante 28<br />
dias (Maynard, Woerly, Sanquer & Médaille, 2006;<br />
Vischer et al., 2007)". Catarina Pinhão refere também<br />
que "verificou -se que a administração de miltefosina<br />
associada ao alopurinol (Vischer et al., 2007), condu-<br />
zia a resulta<strong>do</strong>s idênticos aos obti<strong>do</strong>s com a conju-<br />
gação de antimoniato de Nmetil -glucamina e alopu-<br />
rinol. O alopurinol foi utiliza<strong>do</strong> na <strong>do</strong>se de 10 mg/<br />
kg, duas vezes por dia, e a miltefosina a 2mg/kg/dia.<br />
Embora alguns animais tenham apresenta<strong>do</strong> vómito<br />
e diarreia, esta sintomatologia foi transiente e auto-<br />
-limitante (Vischer et al., 2007), ten<strong>do</strong> os animais<br />
apresenta<strong>do</strong> uma evolução clínica favorável".<br />
Gabriela Santos -Gomes conclui que a miltefosina<br />
"consegue melhorar a saúde <strong>do</strong> animal, diminuin<strong>do</strong> a<br />
carga parasitária mas, tal como o antimoniato de me-<br />
glumina, não elimina o parasita. Em termos clínicos o<br />
animal melhora, deixa de ter lesões, come melhor, o<br />
pêlo recupera, as unhas deixam de crescer de forma<br />
anormal, etc. mas o parasita persiste e multiplica -se,<br />
pelo que o animal poderá voltar a ficar <strong>do</strong>ente e um<br />
segun<strong>do</strong> tratamento já não será tão eficaz".<br />
Além deste fármaco, há outros protocolos já há al-<br />
gum tempo no merca<strong>do</strong> e que podem ser combina<strong>do</strong>s<br />
para tratar os animais infecta<strong>do</strong>s com LCan, de acor<strong>do</strong><br />
com o seu esta<strong>do</strong>, nomeadamente a capacidade de<br />
resposta que ainda têm, e também, com as possibili-<br />
dades financeiras <strong>do</strong>s seus <strong>do</strong>nos. <br />
Após o conhecimento <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s testes os de-<br />
tentores de animais que tenham apresenta<strong>do</strong> resulta-<br />
<strong>do</strong> positivo à infecção por Leishmania são notifica<strong>do</strong>s,<br />
pelo médico veterinário municipal, para procederem<br />
ao tratamento médico <strong>do</strong> animal, no prazo de 30 dias,<br />
dan<strong>do</strong> conhecimento da realização <strong>do</strong> mesmo através<br />
de atesta<strong>do</strong> médico, apresenta<strong>do</strong> no prazo de 60 dias<br />
após a notificação <strong>do</strong> médico veterinário municipal. Os<br />
animais que não forem sujeitos a tratamento médico<br />
da <strong>do</strong>ença são eutanasia<strong>do</strong>s.<br />
Questionada sobre um papel mais interventivo da<br />
DGV em campanhas de informação e prevenção da<br />
leishmaniose, Rita Ama<strong>do</strong>r frisa que "as <strong>do</strong>enças de<br />
declaração obrigatória têm de estar na primeira linha<br />
de prioridades, mas claro que a LCan não pode ser des-<br />
curada. E há muita gente a fazer esse trabalho, como o<br />
ONLeish, os veterinários municipais e as próprias clíni-<br />
cas veterinárias".<br />
Além <strong>do</strong> diagnóstico feito anualmente em conjun-<br />
to com a vacinação anti -rábica, a presidente da direc-<br />
ção <strong>do</strong> ONLeish considera que "o ideal seria fazer -se<br />
um rastreio anual à <strong>do</strong>ença no início <strong>do</strong> Inverno, so-<br />
bretu<strong>do</strong> nas áreas onde a <strong>do</strong>ença tem maior seropre-<br />
valência". Lenea Campino salienta que o custo deste<br />
rastreio deverá rondar os 15 euros, não parecen<strong>do</strong>, por<br />
isso, muito difícil de implementar.<br />
Claro que, neste caso, estamos a falar de um grupo<br />
ainda reduzi<strong>do</strong> de animais, cujos <strong>do</strong>nos os levam com<br />
frequência ao veterinário.<br />
O maior problema em termos de saúde pública – já<br />
que o flebótomo infecta<strong>do</strong> pode picar humanos, sen<strong>do</strong><br />
os imunossuprimi<strong>do</strong>s ou crianças muito pequenas os<br />
principais grupos de risco – advém <strong>do</strong>s animais erran-<br />
tes que escapam a to<strong>do</strong>s os controlos. Mas também aí<br />
as autoridades, nomeadamente as municipais têm -se<br />
mostra<strong>do</strong> cada vez mais despertas para a LCan.