Antonio Moreira Maués e Alexandre Pinho Fadel - Conpedi
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CIRCUITOS INTERROMPIDOS: AS ADINS DOS PARTIDOS POLÍTICOS NO<br />
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (1999-2004)<br />
CIRCUITOS INTERRUMPIDOS: LAS ADINS DE LOS PARTIDOS POLÍTICOS EN EL<br />
RESUMO<br />
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (1999-2004)<br />
<strong>Antonio</strong> <strong>Moreira</strong> <strong>Maués</strong> *<br />
<strong>Alexandre</strong> <strong>Pinho</strong> <strong>Fadel</strong> **<br />
o trabalho analisa as ADIns ajuizadas pelos partidos políticos contra normas federais, no<br />
período de 1999 a 2004, visando identificar se os parâmetros normativos estabelecidos pelo<br />
STF no julgamento dessas ações são utilizados pelos poderes legislativo e executivo como<br />
base de suas deliberações. Para isso, parte do conceito de judicialização da política como<br />
um processo dividido em dois momentos. No primeiro deles, ocorre a "politização da<br />
justiça constitucional”: o controle de constitucionalidade é acionado para modificar os<br />
resultados do processo legislativo ou a interpretação da Constituição, o que coloca o<br />
tribunal constitucional na posição de árbitro final dos conflitos políticos. No segundo,<br />
ocorre a "judicialização do processo legislativo": ao solucionar as demandas, a justiça<br />
constitucional produz um discurso no qual se elaboram normas que regem o exercício do<br />
poder legislativo, as quais passam a orientar os legisladores. No período objeto de estudo,<br />
os partidos políticos ajuizaram 148 ADIns contra normas federais, dentre as quais somente<br />
18 tiveram o pedido cautelar deferido integral ou parcialmente, e 3 foram julgadas<br />
procedentes no mérito. Após a análise dos acórdãos de várias dessas ADIns, o trabalho<br />
conclui que nelas há pouca produção de parâmetros normativos pelo STF, tendo em vista,<br />
principalmente, a ausência de decisões de mérito na maioria dessas ações e o caráter não<br />
exaustivo da fundamentação do julgamento das cautelares. Apesar dos partidos<br />
incentivarem a politização do judiciário no Brasil, a atuação do STF tem objetivamente<br />
imposto limites à judicialização da política.<br />
* Professor Adjunto da Universidade Federal do Pará. Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo<br />
** Professor da Universidade Cândido Mendes e da Fundação Educacional Serra dos Órgãos. Mestre em<br />
Ciências Jurídicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
PALAVRAS-CHAVE: JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA - CONTROLE DE<br />
CONSTITUCIONALIDADE - SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.<br />
RÉSUMEN<br />
El trabajo analiza las ações diretas de inconstitucionalidade (ADIns) promovidas por los<br />
partidos políticos contra normas federales, en el período de 1999 a 2004, con el propósito<br />
de identificar si los parámetros normativos establecidos por el Supremo Tribunal Federal<br />
(STF) en el enjuiciamiento de esas acciones se utilizan por los poderes legislativo y<br />
ejecutivo como base de sus deliberaciones. Para eso, se parte del concepto de<br />
judicialización de la política como un proceso que se divide en dos momentos. En el<br />
primer, ocurre la "politización de la justicia constitucional”: se utiliza el control de<br />
constitucionalidad para cambiar los resultados del proceso legislativo o la interpretación de<br />
la Constitución, lo que pone el tribunal constitucional en la condición de árbitro final de los<br />
conflictos políticos. En el segundo, ocurre la "judicialización del proceso legislativo": al<br />
solucionar las demandas, la justicia constitucional produce un discurso en el cual se<br />
elaboran normas que regulan el ejercicio del poder legislativo, las cuales pasan a orientar<br />
los legisladores. En el período objeto del estudio, los partidos políticos promovieron 148<br />
ADIns contra normas federales, de entre las cuales sólo 18 han tenido la medida cautelar<br />
admitida integral o parcialmente, y 3 han sido estimadas. Después del análisis de las<br />
sentencias de muchas de esas ADIns, el trabajo concluye que en ellas hay poca producción<br />
de parámetros normativos por el STF, teniendo en cuenta, principalmente, la ausencia de<br />
decisiones de mérito en la mayoría de esas acciones y el carácter no conclusivo de los<br />
fundamentos del juicio de las cautelares. Pese a los partidos incentivaren la politización del<br />
judiciario en Brasil, la actuación del STF viene objetivamente imponiendo límites a la<br />
judicialización de la política.<br />
PALABRAS-CLAVE: JUDICIALIZACIÓN DE LA POLÍTICA - CONTROL DE<br />
CONSTITUCIONALIDAD -SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL<br />
2
I - Introdução<br />
Nos últimos anos, o conceito de "judicialização da política" conheceu uma notável<br />
popularidade, ultrapassando as esferas acadêmicas para converter-se em expressão de uso<br />
comum (Maciel e Koerner, 2002). No Brasil, desde o importante trabalho de Vianna et alli<br />
(1999), o tema passou a integrar cada vez mais a agenda de cientistas sociais e juristas,<br />
orientando estudos de caráter empírico (Arantes, 1997 e 2002; Vianna, 2002) e análises da<br />
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (Vieira, 1994; Castro, 1997; <strong>Fadel</strong>, 2004;<br />
<strong>Maués</strong> e Leitão, 2004). Apesar dos diferentes enfoques desses trabalhos, seu ponto de<br />
partida comum é o reconhecimento da participação do judiciário no processo de tomada de<br />
decisões políticas nas democracias contemporâneas, decorrente do aumento de seu poder de<br />
fiscalização sobre as decisões do legislativo e do executivo.<br />
De modo mais amplo, o conceito de judicialização da política chama a atenção para<br />
um conjunto de transformações que levaram ao surgimento do Estado Social (Vianna et<br />
alli, 1999; Przeworski, 1989; Faria, 1991). Essa forma de Estado implica uma regulação<br />
crescente da vida social pelo direito, o que leva à ampliação da esfera de atuação do<br />
judiciário para garantir a observância das normas estatais em áreas que, no Estado Liberal,<br />
eram deixadas à "auto-regulação", tais como as relações de trabalho, o direito contratual e<br />
as atividades econômicas. Além disso, o Estado Social também se caracteriza pela<br />
expansão dos poderes do executivo, o que diminui a possibilidade de controle de seus atos<br />
pelo legislativo e reclama a intervenção do judiciário para reequilibrar o exercício das<br />
funções do Estado, protegendo os direitos violados por decisões da maioria (Cappelletti,<br />
1984). Note-se, ainda, que a legislação torna-se cada vez mais incerta, acentuando as<br />
controvérsias sobre sua aplicação e as possibilidades de atuação do judiciário em demandas<br />
coletivas, que expressam os conflitos distributivos da sociedade.<br />
Esses desdobramentos são mais nítidos naqueles países que optaram por regimes de<br />
democracia constitucional, nos quais a adoção da regra de maioria e das instituições da<br />
democracia representativa é baseada em uma Constituição rígida, que encarrega ao<br />
judiciário sua proteção e estabelece limites formais e materiais ao exercício do poder<br />
legislativo. No ápice desse sistema encontra-se um tribunal com competência exclusiva ou<br />
de última instância para julgar a compatibilidade das leis com a Constituição. Assim, é a<br />
3
existência do controle de constitucionalidade que consolida a competência do judiciário 1<br />
para rever decisões coletivas vinculantes, convertendo-o em árbitro dos conflitos entre<br />
maioria e minoria políticas ou entre governo e sociedade.<br />
Dadas essas características, o marco para a análise da judicialização da política no<br />
Brasil é a Constituição de 1988. Ainda que o início do desenvolvimento do Estado Social<br />
no Brasil, na década de 30, houvesse sido acompanhado de novos mecanismos de defesa<br />
judicial, notadamente o mandado de segurança, os períodos autoritários de 1937-1945 e<br />
1964-1985 limitaram o envolvimento do judiciário na esfera política. Por outro lado, ainda<br />
que o país conhecesse o controle de constitucionalidade desde a primeira Constituição<br />
republicana, vários direitos fundamentais eram caracterizados como normas cuja eficácia<br />
dependia de regulamentação pela legislação ordinária, o que dificultava sua proteção pelo<br />
judiciário.<br />
Com a democratização do final do século passado, as relações entre judiciário,<br />
legislativo e executivo conheceram notável alteração. Em primeiro lugar, a Constituição de<br />
1988 devolveu e ampliou as garantias do Poder Judiciário, atribuindo-as também ao<br />
Ministério Público, que foi constitucionalmente reconhecido como protetor dos direitos<br />
difusos e coletivos. No campo do controle de constitucionalidade, a Constituição de 1988<br />
manteve o controle difuso e ampliou de modo expressivo a legitimidade ativa do controle<br />
concentrado, criando ainda a inconstitucionalidade por omissão e a argüição de<br />
descumprimento de preceito fundamental. A garantia judicial da Constituição também seria<br />
incrementada com a adoção de novos institutos, como o mandado de injunção, o habeas<br />
data e o mandado de segurança coletivo e, para encerrar com chave de ouro, foi<br />
reconhecida a aplicabilidade direta dos direitos fundamentais, extensamente enunciados na<br />
Constituição a fim de não deixá-los à disposição do legislador ordinário.<br />
Essa série de decisões do poder constituinte abriu caminhos para a judicialização da<br />
política no Brasil. Com efeito, em nenhum outro momento de nossa história a participação<br />
dos tribunais na vida do país foi tão forte. O número de demandas judiciais cresceu<br />
exponencialmente desde 1988, levando ao reconhecimento da "crise" do poder judiciário<br />
que, menos de um lustro após a promulgação da Constituição, já se via objeto de proposta<br />
1 Embora o tribunal constitucional não costume integrar organicamente o poder judiciário nos países que<br />
adotam o controle concentrado de constitucionalidade, essa distinção não é relevante aqui, tendo em vista o<br />
caráter judicial de sua função.<br />
4
de reforma constitucional. A sociedade organizada também "descobriu" o judiciário como<br />
uma arena para suas demandas, solicitando-lhe de modo crescente a proteção de direitos<br />
sociais não efetivados e desenvolvendo estratégias de litigância nas ações judiciais. No<br />
quadro de crise econômica e descontrole inflacionário, os diferentes planos adotados por<br />
sucessivos governos foram submetidos à apreciação dos juízes, deixando a sociedade em<br />
suspenso até sua manifestação. Com base no direito adquirido, o judiciário invalidou<br />
medidas que tinham um considerável impacto financeiro, e matérias sensíveis das políticas<br />
públicas, tal como a reforma agrária e as privatizações, foram questionadas junto aos<br />
tribunais. Mesmo as lideranças políticas não hesitaram em recorrer ao judiciário para<br />
solucionar divergências internas dos partidos.<br />
Boa parte desse quadro deve-se ao caráter analítico da Constituição de 1988. Como<br />
rapidamente aprenderam os operadores do direito, não é difícil encontrar no texto<br />
constitucional princípios que fundamentem as mais variadas demandas, ou identificar<br />
conflitos entre suas disposições, ampliando as incertezas sobre a correta aplicação da Carta<br />
Magna. Contudo, a inegável constitucionalização do direito que vem ocorrendo no Brasil<br />
não é suficiente para afiançar o grau de judicialização da política em nosso país. O alto<br />
número de respostas judiciais a demandas que envolvem políticas públicas aparece como<br />
um elemento fundamental do processo de judicialização, mas não exaure suas<br />
características.<br />
Se o controle judicial sobre os atos do poder público confunde-se com a própria<br />
idéia do Estado Constitucional, não cabe dúvida de que esse controle é maior quanto se<br />
exerce sobre a função legislativa. Ainda que um judiciário atuante possa, ao exercer a tarefa<br />
de aplicação-interpretação das leis, colaborar na definição das políticas públicas, esse poder<br />
é notadamente acentuado quando o judiciário também é competente para invalidar leis<br />
contrárias à Constituição, o que o leva a editar decisões coletivamente vinculantes. No caso<br />
do controle concentrado, as decisões do tribunal constitucional possuem efeitos erga<br />
omnes. No caso do controle difuso, ainda que as questões constitucionais estejam<br />
vinculadas a um litígio particular, um conjunto de decisões judiciais desfavoráveis ao<br />
governo em um mesmo assunto pode inviabilizar determinada política, especialmente<br />
quando esses litígios adquirem o caráter de ações coletivas. Acrescente-se a isso que os<br />
5
textos constitucionais costumam ser mais indeterminados do que os demais textos<br />
normativos, o que amplia o espaço para a construção judicial do direito.<br />
O reforço do controle de constitucionalidade também integra o quadro pós-88. Um<br />
dos principais indicadores dessa condição é o número de ações diretas de<br />
inconstitucionalidade, que superou o terceiro milhar em 2003. A constante provocação do<br />
STF pelos agentes e partidos políticos, além das entidades de classe e confederações<br />
sindicais, demonstra que sua condição de árbitro dos conflitos políticos se incorporou na<br />
cultura constitucional do país. Paralelamente, o crescimento exponencial dos recursos<br />
extraordinários ajuizados desde 1988 indica que se intensificou o exercício do controle<br />
difuso no país: em 1990, o STF recebeu 10.780 REs, número que se elevou a 44.478 no ano<br />
de 2003.<br />
O exercício do controle de constitucionalidade oferece o ponto de partida para o<br />
processo de judicialização. Ao declarar inconstitucional uma lei, a justiça constitucional<br />
inevitavelmente interfere no processo político, mas é preciso identificar como os demais<br />
poderes reagem a essas decisões para saber em que medida o judiciário orienta a política.<br />
Trata-se, portanto, de abordar a judicialização como um processo de interação da justiça<br />
constitucional com o legislativo e o executivo, no qual as decisões judiciais,<br />
particularmente aquelas emanadas do tribunal constitucional, produzem parâmetros<br />
normativos que são tomados como base das deliberações dos demais poderes.<br />
Para fins analíticos, podemos dividir o processo de judicialização da política em<br />
dois momentos (Stone Sweet, 2000). No primeiro deles, ocorre a "politização da justiça<br />
constitucional”: o controle de constitucionalidade é acionado para modificar os resultados<br />
do processo legislativo ou a interpretação da Constituição, o que coloca o tribunal<br />
constitucional na posição de árbitro final dos conflitos políticos. No segundo deles, ocorre a<br />
"judicialização do processo legislativo": ao solucionar as demandas, a justiça constitucional<br />
produz um discurso no qual se elaboram as normas que regem o exercício do poder<br />
legislativo, normas essas que são cumpridas pelos legisladores.<br />
A distinção mostra-se útil porque nos permite entender que a "politização" não<br />
produz inevitavelmente a "judicialização". Em diferentes campos do direito podem ser<br />
observados diferentes níveis de judicialização, que variam de acordo com a intensidade da<br />
interação da justiça constitucional com o legislativo e o executivo em cada campo. Essa<br />
6
interação depende não apenas de um arcabouço institucional que possibilite e incentive a<br />
solução de conflitos políticos pela justiça constitucional, mas também do desenvolvimento<br />
de uma jurisprudência constitucional que oriente a produção legislativa.<br />
Sob esse ponto de vista, o estudo da judicialização da política não deve limitar-se à<br />
identificação quantitativa do fenômeno, por mais que essa seja a porta de entrada da<br />
investigação. A análise do impacto que as decisões judiciais provocam no sistema político é<br />
que tem a virtude de identificar em que medida as ações do executivo e do legislativo são<br />
regidas por essas decisões e, portanto, em que medida a política encontra-se judicializada.<br />
Assim, a judicialização implica o funcionamento de um circuito no qual as demandas<br />
trazidas pelo sistema político ao sistema judicial retornam a ele como um conjunto de<br />
orientações a serem cumpridas: as decisões da justiça constitucional não apenas resolvem<br />
casos presentes, mas também estabelecem parâmetros para a solução de casos futuros.<br />
Deve-se observar, ainda, que essa abordagem também contribui para as reflexões de<br />
caráter normativo sobre a judicialização da política. Se é possível afirmar que existe um<br />
amplo consenso sobre a legitimidade da justiça constitucional, o debate sobre seus limites<br />
permanece muito vivo (Brito et alli, 1995; Souza Neto, 2006), enfatizando o respeito que os<br />
tribunais devem às decisões tomadas pelo legislador democrático. Assim, o conhecimento<br />
de como as decisões judiciais influenciam as decisões políticas é fundamental para analisar<br />
em que medida elas devem exercer essa influência.<br />
Esse conceito de judicialização implica que sua análise busque identificar os<br />
mecanismos que possibilitam a passagem da politização para a judicialização, ou seja, de<br />
que modo a justiça constitucional é acionada e toma suas decisões, e como o legislativo e o<br />
executivo reagem a essas decisões. O processo pode ser dividido em quatro estágios: 2<br />
- Estágio 1: como vimos, o ponto de partida da judicialização é a adoção de um regime de<br />
democracia constitucional que, limitando a vontade da maioria por meio de uma<br />
Constituição rígida, regule formal e materialmente a produção legislativa e estabeleça um<br />
sistema de controle de constitucionalidade das leis. Entrando em funcionamento esse<br />
arcabouço institucional, passa a interessar aos legisladores prever a posição do tribunal<br />
constitucional acerca da constitucionalidade de suas decisões, a fim de evitar que elas sejam<br />
invalidadas. Nesse primeiro estágio da judicialização, no entanto, os limites impostos ao<br />
2 Adapta-se, aqui, o modelo proposto por Stone Sweet (2000: 194-204).<br />
7
legislador são bastante amplos, tendo em vista que o tribunal constitucional ainda não<br />
desenvolveu sua jurisprudência, o que abre espaço para que a maioria política interprete a<br />
Constituição a sua maneira.<br />
- Estágio 2: nos países que adotam o controle abstrato, processo legislativo e controle de<br />
constitucionalidade encontram-se articulados. Na prática, o controle de constitucionalidade<br />
torna-se o último estágio do processo legislativo, no qual compete ao tribunal<br />
constitucional rever a decisão do legislador do ponto de vista de sua compatibilidade com a<br />
Constituição. Como o controle abstrato é um mecanismo bastante eficaz de censura às<br />
decisões legislativas, já que pode levar a uma decisão irrecorrível de declaração de<br />
inconstitucionalidade, a minoria política tem um grande incentivo para acionar o tribunal<br />
constitucional. Ao contrário do que ocorre na arena legislativa, a oposição pode vir a ser<br />
vitoriosa na arena judicial, reduzindo a influência da maioria sobre a legislação. Se o<br />
tribunal constitucional exerce suas funções com independência, o controle abstrato retira<br />
poder do governo e o obriga a participar de um processo que ele não pode controlar nem<br />
deter e no qual há igualdade entre as partes. 3 Além disso, nos países de controle difuso e<br />
nos países de controle concentrado que contam com a via incidental, os demais juízes<br />
tampouco estão rigidamente subordinados à lei, podendo encaminhar questões de<br />
inconstitucionalidade ao tribunal constitucional ou exercer diretamente a fiscalização da<br />
constitucionalidade. Em conseqüência, as partes de um processo podem argüir a<br />
inconstitucionalidade das leis em seu benefício, fazendo com que o exercício da jurisdição<br />
"ordinária" também interfira na elaboração das políticas públicas.<br />
- Estágio 3: a politização da justiça aumenta a necessidade de motivação das decisões da<br />
justiça constitucional. Tendo em vista o caráter polêmico das matérias e a possibilidade de<br />
críticas acentuadas dos setores políticos que venham a se sentir prejudicados, o tribunal<br />
constitucional deve desenvolver amplamente os fundamentos jurídico-constitucionais de<br />
sua sentença, excluindo o contexto político que pode tê-lo orientado. No entanto, de modo<br />
mais aparente que em outros campos do direito, a aplicação do direito constitucional<br />
implica um trabalho de construção judicial das normas, a partir das disposições amplamente<br />
3 Esse incentivo à provocação do controle concentrado pela oposição, no entanto, pode ter maiores custos no<br />
longo prazo, quando a minoria se torna governo e pode vir a se defrontar com a mesma rede de limitações<br />
constitucionais que ajudou a construir. Por outro lado, o tribunal constitucional pode decidir a favor do<br />
governo, estabelecendo normas constitucionais opostas àquelas desejadas pela oposição.<br />
8
ambíguas, vagas, controversas e colidentes do texto constitucional (Ferreres Comella,<br />
1997). Assim, quanto mais o juiz constitucional esforça-se para motivar suas decisões,<br />
torna-se mais patente que as soluções para os litígios constitucionais são estabelecidas após<br />
um longo e complexo processo argumentativo, em que o magistrado busca balancear os<br />
diferentes princípios e regras envolvidos na questão. Para o processo de judicialização, a<br />
principal conseqüência desse esforço é o desenvolvimento de fundamentações complexas,<br />
cujo grau de abstração favorece a criação de parâmetros para a decisão de casos<br />
semelhantes no futuro.<br />
- Estágio 4: o juízo sobre a constitucionalidade implica a interpretação do ato questionado e<br />
a determinação do sentido da própria Constituição. Assim, no exercício do controle de<br />
constitucionalidade, o tribunal constitucional não apenas resolve uma demanda como<br />
também elabora a Constituição, gerando um duplo impacto no processo legislativo. Em<br />
primeiro lugar, a decisão do tribunal sobre a constitucionalidade de uma lei possui um<br />
impacto retrospectivo e direto, pois o tribunal resolve um conflito já existente e declara<br />
uma determinada lei constitucional, inconstitucional ou a interpreta conforme a<br />
Constituição. Em segundo lugar, ao oferecer as razões que fundamentam sua decisão, o<br />
tribunal (re)constrói as normas que regem o processo legislativo e indica aos legisladores<br />
como casos semelhantes deverão ser resolvidos. Esse impacto é prospectivo e indireto, pois<br />
a fundamentação do tribunal estabelece parâmetros normativos para a atividade legislativa<br />
futura.<br />
Ao completar-se o circuito da judicialização, o legislador encontra-se em uma<br />
situação distinta do seu ponto de partida. Provocada pelos próprios agentes políticos, a<br />
justiça constitucional produziu uma jurisprudência sobre as normas constitucionais que não<br />
pode ser desconsiderada pelo legislador, sob pena de ter suas decisões invalidadas. Estando<br />
presentes duas condições, o processo de judicialização tende a se aprofundar: a justiça<br />
constitucional deve continuar a ser acionada para que possa prosseguir na elaboração<br />
judicial da Constituição, e o tribunal constitucional deve conferir valor de precedente às<br />
suas próprias decisões, aplicando seus fundamentos aos casos semelhantes.<br />
Dessa forma, os legisladores são levados a ajustar seu comportamento às normas<br />
constitucionais, tal como interpretadas pelo tribunal constitucional, buscando prever sua<br />
posição em determinada matéria antes de tomar uma decisão sobre ela. Com a<br />
9
judicialização, o processo político é modificado pela incorporação do discurso<br />
constitucional às deliberações do executivo e do legislativo, os quais também passam a<br />
utilizar argumentos jurídico-constitucionais para justificar suas propostas e ações.<br />
Sob esse ponto de vista, a análise da judicialização da política em um dado país<br />
requer tanto o exame das decisões tomadas pelo tribunal constitucional quanto de seus<br />
fundamentos, bem como sua repercussão nos planos legislativo e executivo. Neste trabalho,<br />
pretendemos identificar as características da politização da justiça e da judicialização da<br />
política no contexto das ações diretas de inconstitucionalidade propostas pelos partidos<br />
políticos contra normas federais no período de 1999 a 2004. O recorte justifica-se por uma<br />
série de razões. As ADIns apresentadas pelos partidos constituem um ponto de observação<br />
privilegiado do processo acima exposto, pois colocam o STF como árbitro dos conflitos<br />
políticos. A delimitação das ADIns contra normas federais, por sua vez, visa dirigir a<br />
atenção para os conflitos mais importantes em torno do sentido da Constituição, apesar do<br />
alto número de ADIns contra normas estaduais (Chagas, 2006). Por fim, o recorte temporal<br />
parte da existência de dados já analisados sobre o período de 1988 a 1998 (Vianna et alli,<br />
1999), bem como do aumento da litigiosidade constitucional provocada pelos partidos<br />
políticos no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso e do interesse em identificar<br />
o comportamento dos partidos e do STF após a alternância no governo federal ocorrida em<br />
2003.<br />
Seguindo a lógica acima exposta, o artigo divide-se em duas partes. Na seção<br />
seguinte, iremos identificar as principais características da politização do STF ocorrida a<br />
partir de 1988. Posteriormente, o período objeto de estudo será analisado tanto em termos<br />
quantitativos quanto qualitativos, por meio da análise de casos exemplares que ajudam a<br />
identificar o grau de judicialização da política decorrente das ADIns dos partidos.<br />
II – Politizando o Judiciário<br />
Como vimos na seção anterior, a Constituição de 1988 criou um conjunto de<br />
mecanismos que favoreciam a intervenção do STF no processo político, estabelecendo as<br />
bases da judicialização da política. Pela via do controle difuso e do controle concentrado de<br />
constitucionalidade, o STF poderia invalidar leis e atos normativos; o mandado de injunção<br />
10
permitia ao STF opor-se à inação do legislador na regulamentação da Constituição; a ampla<br />
legitimidade ativa garantia à sociedade civil acesso ao controle concentrado.<br />
No entanto, nos primeiros anos após a promulgação da Constituição o STF elaborou<br />
uma jurisprudência que limitou os canais pelos quais as decisões ou omissões do legislador<br />
poderiam ser por ele revistas. No que se refere ao objeto das ADIns, o STF excluiu de sua<br />
apreciação o direito anterior à Constituição (ADIn nº 2), leis de efeitos concretos (ADIn nº<br />
767) e os regulamentos do poder executivo (ADIn nº 264). Os legitimados foram divididos<br />
entre universais (Presidente da República, Mesas da Câmara e do Senado, Procurador-Geral<br />
da República, Conselho Federal da OAB e partidos políticos) e parciais (Governadores e<br />
Assembléias Legislativas dos Estados, confederações sindicais e entidades de classe de<br />
âmbito nacional), exigindo-se desses a demonstração da “relação de pertinência temática”<br />
entre o objeto da ação e as atribuições do autor. As entidades de classe só foram admitidas<br />
como legitimadas caso representassem uma associação de pessoas físicas 4 de mesma<br />
categoria profissional ou econômica (ADIn nº 34) e estivessem presentes em pelo menos<br />
nove Estados da Federação, esta última exigência, feita a partir de uma interpretação<br />
analógica com a Lei Orgânica dos Partidos Políticos (ADIn nº 386).<br />
Isso explica o elevado número de ADIns não conhecidas pelo STF. De acordo com<br />
os dados coletados por Vianna et alli (1999: 116), 21% das ADIns foram extintas por não<br />
conhecimento até 1998, a maior parte delas ajuizadas pelos partidos políticos e entidades de<br />
classe. Outro dado relevante do período diz respeito às normas objeto de questionamento:<br />
dentre as medidas cautelares concedidas total ou parcialmente pelo STF, 77% suspenderam<br />
normas emanadas do legislativo ou do executivo estadual.<br />
Apesar da tentativa do STF limitar seu envolvimento nos conflitos políticos, uma<br />
série de inovações aprovadas a partir da entrada em vigor da Constituição de 1988 teve<br />
sentido contrário. A primeira delas foi a criação da Ação Declaratória de<br />
Constitucionalidade (ADC), acompanhada do efeito vinculante atribuído às suas decisões<br />
definitivas de mérito (EC nº 3), o qual foi posteriormente estendido para as decisões em<br />
ADIn (Lei nº 9.868/99 e EC nº 45) e para a Súmula do STF (EC nº 45). A Argüição de<br />
4 Esta exigência foi eliminada pelo STF na ADIn nº 3.153, na qual, por maioria, foi deferido o agravo<br />
regimental interposto pela Federação Nacional das Associações dos Produtores de Cachaça de Alambique –<br />
FENACA, contra decisão do Min. Celso de Mello, relator, que, por ausência de legitimidade da autora,<br />
julgara extinto o processo.<br />
11
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) foi regulamentada pela Lei nº 9.882/99<br />
de forma a possibilitar ao STF o julgamento concentrado da constitucionalidade de normas<br />
e outros atos do Poder Público que não poderiam ser objeto de ADIn, sendo suas decisões<br />
também dotadas de efeito vinculante. Portanto, ainda que essas inovações viessem limitar o<br />
exercício do controle difuso de constitucionalidade (Scaff e <strong>Maués</strong>, 2005), elas ampliavam<br />
a competência do STF para solucionar conflitos políticos.<br />
Não cabe dúvida, portanto, que já no primeiro decênio após a promulgação da<br />
Constituição de 1988 ocorreu a politização do judiciário no Brasil, havendo um constante<br />
recurso à justiça constitucional das decisões tomadas pelo legislativo e o executivo. Além<br />
dos dados quantitativos, vale a pena destacar algumas decisões relevantes tomadas pelo<br />
STF em sede de ADIn. O Supremo Tribunal considerou contrários à Constituição<br />
dispositivos de emenda constitucional, nas ADIns nºs 926 e 939, vedando a cobrança do<br />
IPMF sobre Estados e Municípios e sua exação no mesmo ano de sua criação; julgou nulos<br />
vários dispositivos da Lei nº 8.177/91, que tratava da desindexação da economia (ADIns<br />
nºs 493 e 959, ajuizadas pelo Procuradoria-Geral da República); e, apesar de não ter<br />
interferido na execução das medidas do Plano Collor, no julgamento da ADIn nº 293,<br />
apresentada pelo Procuradoria, o STF firmou jurisprudência que vedava a reedição de<br />
medida provisória rejeitada pelo Congresso Nacional.<br />
No campo da competição política, o STF também atuou de modo forte no primeiro<br />
decênio, concedendo cautelares nas seguintes ações: ADIn nº 958, do PRONA, contra a<br />
Lei nº 8.713/93, que vinculava a indicação de candidatos ao desempenho do partido no<br />
pleito anterior; ADIn nº 1.063, do PSC, contra a Lei nº 8.713/93, que definia o órgão<br />
partidário competente para efeito de recusa da candidatura nata; ADIn nº 1.355, do PDT,<br />
contra a Lei nº 9.100/95, que condicionava o número de candidatos às Câmaras Municipais<br />
ao número de representantes na Câmara Federal; ADIn nº 1.382, do PL, contra a Lei nº<br />
9.100/95, que erigiu o dia imediato como termo final para a renúncia do prefeito, vice ou<br />
vereador pretendentes à transferência de domicílio.<br />
Vale destacar, por fim, o caráter majoritariamente liminar dos julgamentos do STF.<br />
Segundo Vianna et alli (1999: 116), ao final de 1998 havia 1.052 ADIns aguardando o<br />
julgamento do mérito. Dentre as 338 ADIns apresentadas pelos partidos políticos, 87 não<br />
12
haviam sido conhecidas e 158 aguardavam julgamento do mérito (Vianna et alli, 1999:<br />
129).<br />
III – Judicializando a política?<br />
O período objeto de análise deste trabalho compreende o segundo governo de<br />
Fernando Henrique Cardoso, no qual, além da manutenção do ritmo de aprovação de<br />
emendas constitucionais (EC nºs 21 a 39), houve um incremento da prática da reedição de<br />
medidas provisórias, que atingiu o seu ápice no ano de 2000, com uma média mensal de<br />
90,67 reedições. Assim, o Governo Federal dava continuidade às reformas que havia<br />
iniciado em seu primeiro mandato e propunha novas alterações importantes no<br />
ordenamento jurídico, provocando o aumento do recurso dos partidos de oposição ao STF.<br />
Note-se que o uso acentuado de medidas provisórias diminuía consideravelmente a<br />
possibilidade da oposição influenciar a produção legislativa, tornando as ADIns o único<br />
meio disponível para combater a ausência de deliberação do Congresso Nacional (<strong>Fadel</strong>,<br />
2004).<br />
Esse quadro, caracterizado pela edição de uma legislação reformista radical e a<br />
existência do controle concentrado, cria um ambiente favorável à judicialização da política<br />
(Stone Sweet, 2000: 50). Contudo, é necessário identificar de que modo o STF respondeu a<br />
essas ações para aferir o grau de judicialização, isto é, se o Supremo Tribunal desenvolveu<br />
sua jurisprudência de modo a gerar um impacto não só retrospectivo mas também<br />
prospectivo sobre a atividade legislativa.<br />
Além disso, tendo em vista a alternância no governo ocorrida em 2003, é válido<br />
analisar como os partidos políticos que antes compunham a maioria passaram a se<br />
comportar no ajuizamento de ADIns, bem como se ocorreu alguma eventual mudança na<br />
orientação do STF. Com esse fim, serão analisados os dois primeiros anos do Governo<br />
Lula.<br />
13
No período de 1999 a 2002, os partidos políticos saíram do quarto lugar, que<br />
ocuparam no primeiro decênio da Constituição de 1988, para o primeiro posto entre os<br />
legitimados para a propositura de ADIn, tal como se vê a seguir: 5<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 1999<br />
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Mesa de Assembléia Legislativa 1 2 3<br />
Governador de Estado ou do DF 45 4 49<br />
Procurador-Geral da República 3 15 18<br />
Conselho Federal da OAB 7 5 12<br />
Partidos políticos com representação no CN 31* 30 61<br />
Confederação sindical ou entidade de classe 21 24 45<br />
Outros 1<br />
* A ADIn nº 2.070 foi proposta conjuntamente pelo Conselho dos<br />
Eleitores Pró-Emancipação, Autonomia e desenvolvimento de Itaoca e<br />
pelo PSL<br />
ADIns de partidos políticos – 1999 6<br />
ADIns<br />
Partidos<br />
de Direita<br />
Partidos<br />
de Centro<br />
Partidos<br />
5 Na coleta de dados foram utilizadas duas fontes: a página eletrônica do Supremo Tribunal Federal<br />
(www.stf.gov.br), consultada durante o mês de maio de 2006, e o Banco de Dados Jurídicos Datadez (CD-<br />
ROM Datadez. Rio Grande do Sul: Notadez Informação, 2005).<br />
6 Neste trabalho, foi utilizado o agrupamento ideológico dos partidos políticos (direita, centro e esquerda)<br />
feito por Vianna et alli (1999, p. 97-99). sendo considerados de direita: o Partido da Frente Liberal (PFL), o<br />
Partido Progressista Brasileiro (PPB) e o Partido de Reedificação da Ordem Nacional (PRONA); de centro: o<br />
Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), o Partido Liberal (PL), o Partido da Social<br />
Democracia Brasileira (PSDB), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), o Partido Social Trabalhista (PST), o<br />
Partido Democrata Cristão (PDC), o Partido Social Democrático (PSD), o Partido da Mobilização Nacional<br />
(PMN) e o Partido Social Cristão (PSC); e de esquerda: o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido<br />
Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Socialista Brasileiro (PSB), o Partido Popular Socialista (PPS), o<br />
Partido Comunista do Brasil (PC do B), o Partido Verde (PV) e o Partido Comunista Brasileiro (PCB). Dentre<br />
os partidos que não constam no trabalho acima citado, o Partido Social Liberal (PSL), o Partido Humanista da<br />
Solidariedade (PHS), o Partido Trabalhista Nacional (PTN) e o Partido Social Democrata Cristão (PSDC)<br />
foram classificados como partidos de centro, e o Partido Progressista (PP) foi classificado como de direita.<br />
de<br />
189<br />
14
Partidos<br />
políticos<br />
61<br />
(32,28%*)<br />
-<br />
19<br />
(31,14%)<br />
* Percentual em relação ao total das ADIns de 1999.<br />
ADIns de Partidos de Centro – 1999<br />
Esquerda<br />
42<br />
(68,86%)<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PSL 11 10 1<br />
PST 3* 2 2<br />
PSD 1 1 -<br />
PMDB 3 3 -<br />
PMN 1 - 1<br />
Total 19 16 (84,21%) 4 (21,05%)<br />
*Uma ADIn incidiu simultaneamente sobre norma federal e estadual.<br />
ADIns de Partidos de Esquerda – 1999<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PT* 21 13 8<br />
PDT 6 3 3<br />
PC do B 4 - 4<br />
PSB 1 - 1<br />
Conjuntas** 10 - 10<br />
Total 42 16 (38,1%) 26 (61,90%)<br />
* Uma ADIn do Partido dos Trabalhadores foi interposta em<br />
conjunto com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na<br />
Agricultura, Confederação Nacional dos Trabalhadores em<br />
Educação e Central Única dos Trabalhadores.<br />
** PC do B/PT/PDT/PSB: 2; PT/PDT/PSB/PCB: 1; PT/PV:<br />
2; PDT/PT: 3; PC do B/PSB: 2.<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 2000<br />
15
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Mesa de Assembléia Legislativa - 4 4<br />
Governador de Estado ou do DF 65 3 68<br />
Procurador-Geral da República 16 4<br />
Conselho Federal da OAB 11 8 19<br />
Partidos políticos com representação no CN 44 30<br />
Confederação sindical ou entidade de classe 29 34<br />
Outros 2<br />
* A ADIn nº 2.224 foi proposta contra norma estadual e federal<br />
** ADIns propostas contra norma municipal.<br />
Partidos<br />
políticos<br />
ADIns de partidos políticos – 2000 7<br />
ADIns<br />
74<br />
(29,24%)<br />
Partidos de<br />
Direita<br />
1<br />
(1,35%)<br />
Partidos de<br />
Centro<br />
43<br />
(58,10%)<br />
ADIns de Partidos de Direita – 2000<br />
Partidos de<br />
Esquerda<br />
30<br />
(40,55%)<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PPB 1 1 -<br />
ADIns de Partidos de Centro – 2000<br />
20 +<br />
(1)*<br />
74 +<br />
(1)**<br />
63 +<br />
(1)**<br />
7 Quanto ao total de ADIns, caso fossem descontadas as 23 ações propostas pelo Partido Humanista da<br />
Solidariedade (PHS), sobre o mesmo tema, os partidos de esquerda teriam, com as suas 30 ações, mais de<br />
55% do total. As ações do PHS foram ajuizadas contra normas dos Tribunais Regionais Eleitorais que<br />
proibiam a divulgação do voto eletrônico com urnas similares à oficial, sendo que todas elas tiveram sua<br />
cautelar indeferida e, no mérito, foram julgadas improcedentes ou tiveram negado seu seguimento.<br />
253<br />
16
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PSL 8 5 3<br />
PST 1 - 1<br />
PTB 3 3 -<br />
PMDB 1 1 -<br />
PTN 2 - 2<br />
PHS 23 23 -<br />
PL 5 2 3<br />
Total 43 34 (79,06%) 9 (20,94%)<br />
ADIns de Partidos de Esquerda – 2000<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PT 10 3 7<br />
PDT 5 2 3<br />
PC do B 4 1 3<br />
PSB 4 2 2<br />
PPS 1 1 -<br />
Conjuntas* 6 - 6<br />
Total 30 9 (30%) 21 (70%)<br />
* PC do B/PT/PDT/PSB: 3; PT/PSB/PC do B: 1; PT/PDT: 1;<br />
PC do B/PT: 1<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 2001<br />
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Mesa de Assembléia Legislativa 1 2 3<br />
Governador de Estado ou do DF 56 2 58<br />
Procurador-Geral da República 9 2 11<br />
Conselho Federal da OAB 2 4 6<br />
Partidos políticos com representação no CN 54 24 78 +<br />
17
Confederação sindical ou entidade de classe 25 27 52<br />
Outros 1<br />
* ADIn proposta contra norma municipal.<br />
Partidos<br />
políticos<br />
ADIns de partidos políticos – 2001<br />
ADIns<br />
78<br />
(37,14%)<br />
Partidos de<br />
Direita<br />
-<br />
Partidos<br />
de Centro<br />
56<br />
(71,79%)<br />
ADIns de Partidos de Centro – 2001<br />
Partidos de<br />
Esquerda<br />
22<br />
(28,21%)<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PSL 38 33 5<br />
PST 2 2 -<br />
PTB 5* 3 3<br />
PMDB 2 2 -<br />
PSDC 2 1 1<br />
PHS 2 2 -<br />
PL 5 3 2<br />
Total 56 46 (82,14%) 11 (19,64%)<br />
* Uma ADIn recaiu sobre norma federal e estadual.<br />
ADIns de Partidos de Esquerda – 2001<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PT 8 5 3<br />
PDT 4 2 2<br />
PC do B 4 2 2<br />
PSB 1 - 1<br />
Conjuntas* 5 - 5<br />
Total 22 9 (40,90%) 13 (59,10%)<br />
(1)*<br />
210<br />
18
* PC do B/PT/PL/PPS: 1; PT/PC do B/PDT/PSB/PPS: 1;<br />
PT/PC do B//PDT/PSB/: 1; PC do B/PSB/PDT: 1; PSB/PC<br />
do B: 1.<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 2002<br />
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Mesa de Assembléia Legislativa 2 1 3<br />
Governador de Estado ou do DF 71 4 75<br />
Procurador-Geral da República 6 2 8<br />
Conselho Federal da OAB 10 5 15<br />
Partidos políticos com representação no CN 24 15 39 + (21)*<br />
Confederação sindical ou entidade de classe 28 16 44<br />
Outros 1<br />
* As 21 ações foram protocoladas por um representante do PDT contra<br />
atos normativos municipais. Ocorre, contudo, que o impetrante não possuía<br />
mandato para fazê-lo em nome do partido e normas municipais não podem<br />
ter sua constitucionalidade questionada em ADIn perante o Supremo<br />
Tribunal Federal.<br />
Partidos<br />
políticos<br />
ADIns de partidos políticos – 2002<br />
ADIns<br />
39<br />
(18,93%)<br />
Partidos<br />
de Direita<br />
1<br />
(2,56%)<br />
Partidos de<br />
Centro<br />
22<br />
(56,41%)<br />
ADIns de Partidos de Direita – 2002<br />
Partidos de<br />
Esquerda<br />
16<br />
(41,03%)<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PFL 1 - 1<br />
Total 1 - 1 (100%)<br />
ADIns de Partidos de Centro – 2002<br />
206<br />
19
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PSL 12 6 6<br />
PSDB 2 2 -<br />
PTB 3 1 2<br />
PMDB 2 2 -<br />
PSDC 1 1 -<br />
PL 3 2 1<br />
Total 23 14 (60,87%) 9 (39,13%)<br />
ADIns de Partidos de Esquerda – 2002<br />
PARTIDOS ADIns Norma Estadual Norma Federal<br />
PT 4 1 3<br />
PDT 1 1 -<br />
PPS 3 3 -<br />
PSB 5 4 1<br />
Conjuntas* 2 1 1<br />
Total 15 10 (66,67%) 5 (33,33%)<br />
* PC do B/PT/PL/PPS/PSB: 1; PT/PL: 1.<br />
Do ponto de vista dos resultados, o êxito dos partidos é pequeno no que se refere às<br />
normas federais: das 99 ADIns ajuizadas de 1999 a 2002, somente 17 tiveram o pedido<br />
cautelar deferido integral ou parcialmente (17%) e somente 3 ADIns (3%) foram julgadas<br />
procedentes no mérito, conforme se verifica nas tabelas abaixo:<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (1999)<br />
ADIns Cautelar Mérito<br />
20
contra<br />
normas<br />
federais<br />
Deferida<br />
Deferida em<br />
parte<br />
30 3 (10%) 5 (16,66%)<br />
Total Deferida<br />
8<br />
(26,66%)<br />
Deferida em<br />
parte<br />
- 3 (10%)<br />
Total<br />
3<br />
(10%)<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (2000)<br />
ADIns<br />
contra<br />
normas<br />
federais<br />
30<br />
Deferida<br />
4<br />
(13,33%)<br />
Cautelar Mérito<br />
Deferida em<br />
parte<br />
2 (6,66%)<br />
Total Deferida<br />
6<br />
(20%)<br />
Deferida em<br />
parte<br />
Total<br />
- - -<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (2001)<br />
ADIns<br />
contra<br />
normas<br />
federais<br />
Deferida<br />
Cautelar Mérito<br />
Deferida em<br />
parte<br />
24 - 2 (8,33%)<br />
Total Deferida<br />
2<br />
(8,33%)<br />
Deferida em<br />
parte<br />
Total<br />
- - -<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (2002)<br />
ADIns<br />
contra<br />
normas<br />
federais<br />
Deferida<br />
Cautelar Mérito<br />
Deferida em<br />
parte<br />
Total Deferida<br />
Deferida em<br />
parte<br />
15 1 - 1 - - -<br />
Total<br />
21
(6,67%) (6,67%)<br />
O pequeno número de decisões de mérito do STF indica um baixo desenvolvimento<br />
de sua jurisprudência a partir das ADIns dos partidos. Como vimos, a judicialização da<br />
política depende de que o tribunal constitucional ofereça parâmetros normativos nos<br />
fundamentos de suas decisões, os quais possam orientar as deliberações do legislativo e do<br />
executivo. Considerando ainda que a ampla maioria das cautelares não foi deferida,<br />
podemos concluir que, nessas ações, é limitado o impacto retrospectivo das decisões do<br />
STF sobre o processo legislativo, o que inevitavelmente afeta seu impacto prospectivo.<br />
Diante disso, as pistas da judicialização da política no Brasil devem ser buscadas<br />
nas conseqüências do deferimento das cautelares. Tendo havido manifestação, ainda que<br />
liminar, do STF sobre a matéria, podemos identificar as reações do Executivo e do<br />
Legislativo a essas decisões.<br />
Nas ADIns apresentadas contra medidas provisórias, observa-se que o Legislativo e<br />
o Executivo acatam a decisão cautelar do STF ao não incluir o dispositivo suspenso na<br />
reedição da medida ou quando de sua conversão em lei, como nos seguintes exemplos:<br />
a) ADI nº 1.975 e nº 1.984, ajuizadas, respectivamente, pelo PT e pelo PC do B e PSB<br />
contra a MP nº 1.815, cuja cautelar foi deferida em relação ao art. 1º, que mandava<br />
desconsiderar um ano do tempo de serviço dos servidores públicos para fins de promoção e<br />
progressão por antigüidade, excetuando diplomatas, militares e funcionários do Legislativo<br />
e do Judiciário. No entendimento do STF, essa alteração implicava violação do princípio da<br />
isonomia. Na reedição de nº 1.909-15, o dispositivo suspenso pelo STF foi revogado.<br />
Observe-se que o outro pedido de cautelar, referente à extinção do adicional por tempo de<br />
serviço, foi indeferido, mantendo-se a norma até hoje, por força da EC nº 32, como art. 15<br />
da MP nº 2.225-45/01;<br />
b) ADIn nº 2.005, ajuizada pelo PC do B e o PSB contra a MP nº 1.819-1/99, que<br />
disciplinava questões referentes ao setor elétrico. A cautelar foi deferida pelo STF em<br />
relação aos artigos que tratavam da privatização do setor, considerando que o art. 246 da<br />
CF veda a adoção de medida provisória para regulamentação de artigo da Constituição cuja<br />
redação tenha sido alterada por meio de emenda promulgada a partir de 1995. A EC nº 6,<br />
que permitia a autorização ou concessão para o aproveitamento dos potenciais de energia<br />
22
hidráulica, havia sido aprovada nesse ano. A MP não foi reeditada, levando à<br />
prejudicialidade da ação.<br />
c) ADIn nº 2.125, ajuizada pelo PT contra o art. 2º da MP nº 2.006/99, que permitia a<br />
contratação, por tempo determinado, de servidores para o Instituto Nacional de Propriedade<br />
Industrial (INPI). A cautelar foi deferida pelo STF, por entender plausível a argumentação<br />
de violação do art. 37, II, da CF. O referido artigo deixou de constar nas reedições<br />
posteriores à decisão do STF, levando à prejudicialidade da ação;<br />
d) ADIn n° 2.290, ajuizada pelo PSL contra o art. 6º da MP nº 2.045, que proibia o registro<br />
de arma de fogo até 31 de dezembro de 2000. O referido dispositivo foi suspenso pelo STF<br />
por ofensa ao devido processo legal substantivo, não constando nas reedições posteriores da<br />
MP nem na lei de conversão dela originada (Lei nº 10.201/01), tendo sido a ação julgada<br />
prejudicada; 8<br />
e) ADIn nº 2.380, ajuizada pelo PT contra dispositivos da Lei nº 9.849/99, tendo o STF<br />
deferido a cautelar para suspender a contratação temporária de servidores para atividades de<br />
análise e registro de marcas e patentes pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual<br />
(INPI), por violação do art. 37, IX. O dispositivo impugnado foi revogado pela Lei nº<br />
10.667/03, tendo sido a ação julgada prejudicada;<br />
f) ADIn nº 2.473, ajuizada pelo PT, PC do B, PDT e PSB contra a MP nº 2.152-2/01, que<br />
tratava de medidas de racionamento de energia elétrica. O STF deferiu a cautelar em<br />
relação ao art. 24, que alterava competência da Justiça Federal estabelecida na<br />
Constituição, e também suspendeu parte do art. 26, que permitia às decisões da Câmara de<br />
Gestão da Crise de Energia Elétrica afastarem a aplicação de textos legais. Ambos os<br />
dispositivos foram alterados quando da reedição da medida (MP nº 2.198-5/01).<br />
Também podemos falar de uma resposta positiva do legislador em relação ao<br />
julgado da ADIn nº 2.061, proposta pelo PDT, PT e Confederação dos Servidores Públicos<br />
do Brasil, na qual o STF reconheceu a omissão do Presidente da República no<br />
encaminhamento do projeto de lei de revisão geral anual da remuneração dos servidores da<br />
União, prevista no art. 37, X, da CF, com a redação dada pela EC nº 19/98. Apesar do STF<br />
8 No período, somente duas outras ações ajuizadas por partidos de centro obtiveram deferimento da cautelar:<br />
ADIn n° 2.175, proposta pelo Partido Social Trabalhista (PST) contra Resolução Administrativa do Tribunal<br />
Superior do Trabalho, nº 665, de 10 de dezembro de 1999 e ADIn nº 2.568, interposta pelo Partido Social<br />
Liberal (PSL) contra LC nº 110/01, que teve dispositivos suspensos por violação do princípio da<br />
anterioridade.<br />
23
não poder fixar prazo para o suprimento da omissão, por tratar-se de medida legislativa, a<br />
Presidência encaminhou a proposta de reajuste geral, no valor de 3,5%, que resultou na Lei<br />
nº 10.331/01.<br />
Em alguns casos, mesmo que a ADIn não tenha sido julgada pelo STF, seu<br />
ajuizamento pode ter contribuído para a retirada dos dispositivo questionados, tendo em<br />
vista a alta probabilidade de êxito da ação, como nos seguintes casos:<br />
a) ADIn nº 2.001 e nº 2.002, ajuizadas, respectivamente, pelo PDT e o PT, contra o art. 56<br />
do Decreto nº 3.048/99, que vinculava a concessão de aposentadoria no regime geral de<br />
previdência social à idade mínima de 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher. Essa<br />
proposta havia sido derrotada na votação dos destaques da EC nº 20, que promovera a<br />
reforma da previdência. O decreto foi republicado antes do julgamento da cautelar pelo<br />
STF, eliminando aquela vinculação;<br />
b) ADIn nº 2.385, ajuizada pelo PDT contra dispositivos da MP nº 2.088-35/00, que<br />
possibilitavam a sanção do agente do Ministério Público que viesse a propor ação de<br />
improbidade administrativa manifestamente improcedente, os quais deixaram de constar na<br />
reedição da medida.<br />
Apesar dos exemplos acima, metade das ADIns dos partidos foram julgadas<br />
prejudicadas. Isso se explica, em parte, pelo número de ações propostas contra medidas<br />
provisórias, em que a prejudicialidade decorreu da falta de aditamento da inicial pelo<br />
partido autor após a reedição da medida, ou da perda superveniente do objeto provocada<br />
pela alteração ou revogação da norma.<br />
Essa situação, contudo, pode indicar que o STF absteve-se de julgar determinadas<br />
matérias, tal como exemplificam as ADIns apresentadas contra as medidas provisórias que<br />
estabeleciam o valor do salário mínimo. Na ADIn nº 1.996, ajuizada pelo PT, PDT, PSB e<br />
PC do B contra MP nº 1.824/99, o pedido da cautelar foi indeferido, sendo a ação julgada<br />
prejudicada por decisão monocrática, considerando que os autores haviam aditado a inicial<br />
tão somente em relação a cinco reedições da medida provisória, deixando de fazê-lo diante<br />
de suas outras sete reedições, além de que a MP impugnada já havia sido revogada pela MP<br />
nº 2.019/00, que estabelecia novo valor do salário mínimo. O mesmo ocorreu com a ADIn<br />
nº 2.162, do PT, contra a MP 1.933-10/00. Assim, prevendo que no ano seguinte haveria a<br />
24
evogação da norma pelo estabelecimento de novo valor para o salário mínimo, o STF evita<br />
o julgamento do mérito da questão.<br />
Em outros casos, verificamos que o não conhecimento da ação e a demora no<br />
julgamento pelo STF também diminui sua interferência nos conflitos políticos, tal como<br />
ocorreu com a ADIn nº 2.484, proposta pelo PC do B contra a Lei nº 10.266/01, de<br />
diretrizes orçamentárias, não conhecida por tratar-se de lei “com efeitos concretos”; a<br />
ADIn nº 2.135, de autoria do PDT, contra a EC nº 19, que não teve ainda seu julgamento<br />
concluído; e a ADIn nº 2.199, ajuizada pelo PC do B, PSB, PT, PDT contra a EC nº 27,<br />
que não teve julgamento.<br />
No que se refere às ações contra emendas constitucionais, duas delas tiveram<br />
julgamento favorável pelo STF: ADIn nº 1.946, proposta pelo PSB contra o art. 14 da EC<br />
nº 20, na qual o STF deu interpretação conforme à Constituição ao referido dispositivo para<br />
excluir o salário da licença gestante do limite máximo dos benefícios pagos pelo regime<br />
geral de previdência social; e ADIn nº 2.031, proposta pelo PT contra a EC nº 21/99, na<br />
qual o STF acatou o pedido em relação ao dispositivo (art. 75, § 3º) que autorizava a União<br />
a emitir títulos da dívida pública para custeio da saúde e da previdencia social, tendo em<br />
vista que a Câmara dos Deputados havia alterado o texto sem que o mesmo retornasse ao<br />
Senado Federal para apreciação. 9<br />
Além da observância da decisão cautelar do STF por meio da alteração de medida<br />
provisória pelo Executivo, há quatro ADIns no período que demonstram a incorporação dos<br />
parâmetros normativos estabelecidos pelo STF nas deliberações do legislador. Nesses<br />
casos, ao contrário da maioria das ADIns ajuizadas pelos partidos políticos, todo o circuito<br />
da judicialização pode ser identificado: a provocação da minoria política ao STF em face de<br />
uma decisão da maioria, a anulação dessa decisão pelo STF e a promoção de uma reforma<br />
constitucional para atender aos fundamentos jurídicos do Tribunal.<br />
a) ADIns nºs 2.223 e 2.244, ajuizadas, respectivamente, pelo PT e o PC do B contra a Lei<br />
nº 9.932/99, que dispunha sobre a transferência de atribuições da IRB-Brasil Resseguros<br />
S.A. para a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP. O STF deferiu a cautelar por<br />
9 Duas outras ações contra emendas constitucionais, ADIns nºs 2.046 e 2.047, ambas apresentadas pelo PC do<br />
B contra dispositivos da EC nº 19, não foram conhecidas, por entender o STF que o autor havia formulado<br />
uma consulta ao tribunal acerca da interpretação a ser dada às novas disposições da emenda constitucional. A<br />
ADIn nº 2.159, ajuizada pelo PSL contra o artigo 7º da EC nº 19 foi julgada prejudicada pelo advento da EC<br />
nº 41 e a ADIn nº 2.666, do mesmo partido contra o art. 3º da EC nº 37, foi julgada improcedente.<br />
25
identificar inconstitucionalidade formal na lei, tendo em vista que, com base no então<br />
vigente inciso II do art. 192, a regulamentação dos estabelecimentos de seguro e resseguro,<br />
bem como do órgão oficial fiscalizador seria matéria reservada a lei complementar. Por<br />
meio da EC nº 40, o dispositivo constitucional acima citado foi revogado;<br />
b) ADIn nº 2.016, ajuizada pelo PT, PDT, PSB, PC do B. Essa ADIn tratava da mesma<br />
matéria que a ADIn nº 2.010, proposta pela OAB, na qual o STF deferiu cautelar<br />
suspendendo a cobrança de contribuição previdenciária dos servidores inativos e<br />
pensionistas, estabelecida pela Lei nº 9.783/99. 10 O STF entendeu que, apesar das<br />
mudanças introduzidas pela EC nº 20, a Constituição não autorizava a instituição de<br />
contribuição dos aposentados e pensionistas da União. Com base em informações do<br />
processo legislativo, o STF afirmava que "o Congresso Nacional absteve-se,<br />
conscientemente, 11 no contexto da reforma do modelo previdenciário, de fixar a necessária<br />
matriz constitucional, cuja instituição se revelava indispensável para legitimar, em bases<br />
válidas, a criação e a incidência dessa exação tributária sobre o valor das aposentadorias e<br />
das pensões. O regime de previdência de caráter contributivo, a que se refere o art. 40,<br />
caput, da Constituição, na redação dada pela EC nº 20/98, foi instituído, unicamente, em<br />
relação "Aos servidores titulares de cargos efetivos...", inexistindo, desse modo, qualquer<br />
possibilidade jurídico-constitucional de se atribuir, a inativos e a pensionistas da União, a<br />
condição de contribuintes da exação prevista na Lei nº 9.783/99." (RTJ 181/75)<br />
Posteriormente, o Governo Lula enviou proposta de emenda constitucional que,<br />
entre outras matérias, constitucionalizava a cobrança da contribuição previdenciária de<br />
inativos e pensionistas. 12 No parecer aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da<br />
Câmara dos Deputados, de autoria do Dep. Maurício Rands (PT-PE) é explícita a<br />
adequação à orientação do STF na ADIn nº 2.010: "O principal fundamento do voto do<br />
10 Anteriormente, no julgamento da ADIn nº 790, proposta pela Procuradoria-Geral da República, o STF<br />
havia julgado inconstitucional o art. 9º da Lei nº 8.162/91, que estabelecia alíquotas progressivas para a<br />
contribuição dos servidores, considerando que não havia causa suficiente para essa majoração, pois o art. 231,<br />
§ 2º, da Lei nº 8.112/90 dispunha que as aposentadorias e pensões dos servidores públicos seriam custeadas<br />
integralmente pelo Tesouro Nacional. O legislador respondeu a essa decisão instituindo constitucionalmente a<br />
contribuição previdenciária dos servidores, por meio da EC nº 3/93.<br />
11 Na votação da EC nº 20, os líderes partidários haviam aprovado um destaque supressivo, excluindo a<br />
cláusula destinada a introduzir, no texto da Constituição, a necessária previsão de cobrança, aos pensionistas e<br />
aos servidores inativos, da contribuição de seguridade social.<br />
12 Outro efeito do deferimento da cautelar na ADIn nº 2.010 foi a revogação do art. 2º da Lei nº 9.783/99, que<br />
estabelecia adicionais da contribuição previdenciária dos servidores, pelo art. 7º da Lei nº 9.988/00.<br />
26
elator, Min. Celso de Mello, foi o de que a matriz constitucional vigente não estabelecia as<br />
bases para que a lei ordinária criasse a exação tributária. Não deixou de reconhecer o STF<br />
naquela ocasião, todavia, que uma nova matriz constitucional pode colocar o problema em<br />
novas bases". O parecer lembrava ainda que o mesmo acórdão indicava que "Se, em<br />
determinado momento histórico, circunstâncias de fato ou de direito reclamarem a alteração<br />
da Constituição, em ordem a conferir-lhe um sentido de maior contemporaneidade, para<br />
ajustá-la, desse modo, às novas exigências ditadas por necessidades políticas, sociais ou<br />
econômicas, impor-se-á a prévia modificação do texto da Lei Fundamental, com estrita<br />
observância das limitações e do processo de reforma estabelecidos na própria Carta<br />
Política."<br />
Assim, o relator propôs emenda saneadora, incluindo no caput do art. 40 as<br />
expressões "solidário" e "inclusive mediante contribuição dos servidores inativos e<br />
pensionistas", de modo a deixar mais claro que a mudança constitucional introduzia uma<br />
nova matriz constitucional no tratamento do regime previdenciário dos servidores,<br />
atendendo à orientação do STF.<br />
Promulgada a EC nº 41, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público<br />
(CONAMP) ingressou com a ADIn nº 3.105, pedindo a declaração da<br />
inconstitucionalidade da contribuição previdenciária dos inativos, dentre outros dispositivos<br />
da reforma da previdência. Por maioria, o STF julgou constitucional essa contribuição,<br />
ratificando o entendimento do Congresso Nacional: "não há, em nosso ordenamento,<br />
nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da<br />
aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de<br />
ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a<br />
respeito, direito adquirido com o aposentamento" (RTJ 193/137).<br />
c) ADIn nº 2.626, ajuizada pelo PC do B, PL, PT e PSB, contra a Instrução nº 55 do TSE<br />
(Resolução nº 20.993), pela qual os partidos políticos eram obrigados a manter nos Estados<br />
as mesmas coligações estabelecidas para a eleição de Presidente da República. Como o<br />
dispositivo impugnado resultava de uma interpretação do art. 6º da Lei nº 9.504/97, o STF,<br />
por maioria, não conheceu da ação, aplicando sua jurisprudência de que ato regulamentar<br />
não pode ser objeto de ADIn. Ainda em 2002, o Congresso Nacional iniciou o processo<br />
legislativo para incluir no texto constitucional dispositivo que garantisse a autonomia dos<br />
27
partidos políticos para decidirem suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de<br />
vinculação entre as candidaturas dos diferentes pleitos. Essa emenda foi finalmente<br />
aprovada em março de 2006, sob o número 52, ainda que o STF tenha decidido, na ADIn<br />
nº 3.685, que ela não se aplicaria às eleições desse ano, tendo em vista a vedação do art. 16<br />
da CF.<br />
No período de 2003 a 2004, como se podia prever, houve uma inversão na autoria<br />
das ADIns, passando a predominar aquelas apresentadas por partidos de centro e direita,<br />
destacando-se os principais partidos de oposição: PSDB e PFL. Se no ano de 2003 o<br />
número de ADIns ajuizadas por partidos contra normas federais não se elevou de modo<br />
significativo, já em 2004 o número de ADIns nessa categoria praticamente igualou o nível<br />
máximo alcançado em 1999 e 2000.<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 2003<br />
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Governador de Estado ou do DF 81 4 85<br />
Procurador-Geral da República 97 21 118<br />
Conselho Federal da OAB 6 3 9<br />
Partidos políticos com representação no CN 24 20 44<br />
Confederação sindical ou entidade de classe 37 15 52<br />
Partidos<br />
políticos<br />
ADIns de partidos políticos – 2003<br />
ADIns<br />
44<br />
(14,28%)<br />
Partidos<br />
de Direita<br />
13<br />
(29,54%)<br />
Partidos de<br />
Centro<br />
24<br />
(54,54%)<br />
ADIns de Partidos de Direita – 2003<br />
Partidos de<br />
Esquerda<br />
7<br />
(15,90%)<br />
PARTIDOS ADIns Norma Norma Federal<br />
308<br />
28
Estadual<br />
PFL 8 2 6<br />
PPB 1 1 -<br />
PP 3 2 1<br />
PRONA 1 - 1<br />
Total 13 5 (38,46%) 8 (61,54%)<br />
PARTIDOS ADIns<br />
ADIns de Partidos de Centro – 2003<br />
Norma<br />
Estadual<br />
Norma Federal<br />
PSL 7 7 -<br />
PSDB 9 4 5<br />
PTB 1 - 1<br />
PMDB 1 - 1<br />
PSC 1 1 -<br />
PL 5 5 -<br />
Total 24 17 (70,83%) 7 (29,17%)<br />
PARTIDOS ADIns<br />
ADIns de Partidos de Esquerda – 2003<br />
Norma<br />
Estadual<br />
Norma Federal<br />
PV 2 - 2<br />
PDT 5 2 3<br />
Total 7 2 (28,57%) 5 (71,43%)<br />
Ações Diretas de Inconstitucionalidade – 2004<br />
NORMA<br />
ESTADUAL FEDERAL TOTAL<br />
Governador de Estado ou do DF 52 2 53<br />
Procurador-Geral da República 83 9 92<br />
29
Conselho Federal da OAB 6 1 7<br />
Partidos políticos com representação no CN 12 29 41<br />
Confederação sindical ou entidade de classe 39 37 75<br />
Outros 3 6 9<br />
Partidos<br />
políticos<br />
ADIns de partidos políticos – 2004<br />
ADIns<br />
41<br />
(14,80%)<br />
PARTIDOS ADIns<br />
Partidos<br />
de Direita<br />
14<br />
(34,14%)<br />
Partidos de<br />
Centro<br />
14<br />
(34,14%)<br />
ADIns de Partidos de Direita – 2004<br />
Norma<br />
Estadual<br />
Partidos de<br />
Esquerda<br />
13<br />
(31,70%)<br />
Norma Federal<br />
PFL 10 - 10<br />
PP 1 - 1<br />
PRONA 2 - 2<br />
PFL/PSDB 1 - 1<br />
Total 14 - 14 (100%)<br />
PARTIDOS ADIns<br />
ADIns de Partidos de Centro – 2004<br />
Norma<br />
Estadual<br />
Norma Federal<br />
PSL 3 1 2<br />
PSDB 5 - 5<br />
PTB 5 3 2<br />
PL 1 - 1<br />
Total 14 4 (28,57%) 10 (71,43%)<br />
277<br />
30
ADIns de Partidos de Esquerda – 2004<br />
PARTIDOS ADIns<br />
Norma<br />
Estadual<br />
Norma Federal<br />
PT 2 2 -<br />
PV 1 - 1<br />
PDT 10 6 4<br />
Total 13 8 (61,54%) 5 (38,46%)<br />
Sem embargo, o número de ADIns cuja cautelar foi deferida limita-se a 1 ADIn.<br />
Isso se explica pelo alto número de ações aguardando julgamento da liminar (10 ações<br />
ajuizadas em 2003 e 18 ações ajuizadas em 2004) e também pelo significativo número de<br />
ações cujo medida cautelar foi julgada prejudicada (8 em 2003, 9 em 2004). Portanto,<br />
apesar dos partidos que passaram à oposição terem mantido a politização do STF, não se<br />
verifica alteração na conduta do tribunal em relação ao período anterior.<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (2003)<br />
ADIns<br />
contra<br />
normas<br />
federais<br />
15<br />
Deferida<br />
1<br />
(6,67%)<br />
Cautelar Mérito<br />
Deferida em<br />
parte<br />
-<br />
Total Deferida<br />
1<br />
(6,67%)<br />
Deferida em<br />
parte<br />
Total<br />
- - -<br />
Cautelar e Mérito deferidos ou deferidos em parte<br />
nas ADIns dos partidos políticos que incidiram sobre normas federais (2004)<br />
ADIns Cautelar Mérito<br />
31
contra<br />
normas<br />
federais<br />
Deferida<br />
Deferida em<br />
parte<br />
Total Deferida<br />
Deferida em<br />
parte<br />
29 - - - - - -<br />
Total<br />
A única cautelar, deferida monocraticamente, incidiu na ADIn nº 3.068, ajuizada<br />
pelo PFL contra a MP nº 136/03, que autorizava a contratação temporária de pessoal para o<br />
CADE, tendo sido, contudo, julgada improcedente no mérito. Observa-se ainda que boa<br />
parte das ADIns prejudicadas decorre da regulamentação das medidas provisórias pela EC<br />
nº 32, a qual, limitando sua reedição, acelera a conversão em lei. Nesses casos, a não<br />
apresentação de nova ação pelos partidos pode significar que o processo legislativo<br />
permitiu à oposição modificar a proposta original do Executivo, deixando de ser necessário<br />
o recurso ao judiciário para a solução do conflito político.<br />
IV – Considerações Finais<br />
De acordo com o ponto de vista adotado neste trabalho, a judicialização da política<br />
caracteriza-se como um processo que se completa com a utilização das decisões da justiça<br />
constitucional como base das deliberações do legislador. Assim, a provocação do tribunal<br />
constitucional para a solução de conflitos políticos conduz à elaboração de uma<br />
jurisprudência que passa a influenciar o processo legislativo.<br />
A análise das ADIns apresentadas pelo partidos políticos no período estudado indica<br />
que há pouca produção de jurisprudência pelo STF nessas ações. Um conjunto de fatores<br />
explica essa interrupção do circuito politização-judicialização:<br />
a) na maioria das ADIns, não há decisão do STF sobre o mérito. Seja em razão da<br />
prejudicialidade, do não conhecimento ou mesmo da demora no julgamento, o Tribunal<br />
deixa de se manifestar sobre várias questões, incluindo algumas de cunho altamente<br />
conflitivo;<br />
b) o caráter provisório do julgamento da cautelar impõe limites à produção de<br />
jurisprudência constitucional por essa via. Na maioria dos casos, a apreciação da matéria é<br />
assumidamente limitada, deixando o STF de fundamentar de modo exaustivo sua<br />
32
interpretação da Constituição e, portanto, oferecendo poucos parâmetros normativos para a<br />
deliberação do legislador em casos futuros. Observe-se ainda que o indeferimento da<br />
cautelar não necessariamente significa que o STF esteja convencido da constitucionalidade<br />
do dispositivo (<strong>Maués</strong> e Leitão, 2004), o que pode confundir, mais do que esclarecer, o<br />
legislador;<br />
c) a recorrente prejudicialidade nas ADIns apresentadas contra medidas provisórias também<br />
dificulta a elaboração de jurisprudência constitucional. No caso de deferimento da cautelar,<br />
a ausência de julgamento do mérito coloca os mesmos problemas apontados no item<br />
anterior. Mais grave, contudo, mostra-se o caso em que a cautelar não chega a ser<br />
apreciada, deixando o STF de fornecer parâmetros que poderiam ser de grande utilidade no<br />
processo de conversão da medida provisória em lei.<br />
A análise aqui apresentada não exclui a possibilidade de que, em outros campos, o<br />
processo de judicialização da política esteja mais desenvolvido. Em matéria tributária, por<br />
exemplo, várias decisões do STF levaram à aprovação de emendas constitucionais, tal<br />
como nos casos das EC nºs 33 e 39. Contudo, no âmbito das ADIns ajuizadas pelos<br />
partidos, o STF tem deixado de julgar o mérito da maioria das questões que a ele são<br />
levadas, havendo poucos casos em que se pode identificar o circuito completo da<br />
judicialização. Apesar dos partidos de oposição incentivarem a politização do judiciário no<br />
Brasil, a atuação do STF tem objetivamente imposto limites à judicialização da política,<br />
não lhe permitindo dar a volta completa na Praça do Três Poderes.<br />
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