A Cartomante - Unama
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telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes<br />
aumentava do que destruía o prestígio.<br />
A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as<br />
costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de<br />
Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas.<br />
Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo<br />
dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com<br />
grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:<br />
— Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto...<br />
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.<br />
— E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma cousa ou não...<br />
— A mim e a ela, explicou vivamente ele.<br />
A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez<br />
das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas;<br />
baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas. Três vezes; depois começou a<br />
estendê-las. Camilo tinha os olhos nela. Curioso e ansioso.<br />
— As cartas dizem-me...<br />
Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe<br />
que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o<br />
terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam<br />
invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita... Camilo<br />
estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na<br />
gaveta.<br />
— A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por<br />
cima da mesa e apertando a da cartomante.<br />
Esta levantou-se, rindo.<br />
— Vá, disse ela; vá, ragazzo innamorato...<br />
E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como<br />
se fosse a mão da própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda,<br />
sobre a qual estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a<br />
despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as<br />
unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso<br />
por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço.<br />
— Passas custam dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer<br />
mandar buscar?<br />
— Pergunte ao seu coração, respondeu ela.<br />
Camilo tirou uma nota de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante<br />
fuzilaram. O preço usual era dois mil-réis.<br />
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