16.04.2013 Views

Maria das Graças Moreira de Sá - Eduardo Lourenço

Maria das Graças Moreira de Sá - Eduardo Lourenço

Maria das Graças Moreira de Sá - Eduardo Lourenço

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Em 1978, sente ainda <strong>Eduardo</strong> <strong>Lourenço</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nar as<br />

simplificações abusivas com que amiú<strong>de</strong> se tem lido a experiência poética <strong>de</strong> Teixeira<br />

<strong>de</strong> Pascoaes, acusado, muitas vezes, para quem nunca o leu a sério – diz o ensaísta –, <strong>de</strong><br />

abundância, aparentemente informe, do seu verbo, <strong>de</strong> utilizar um reportório <strong>de</strong> imagens<br />

estereotipa<strong>das</strong>, <strong>de</strong> se <strong>de</strong>ixar levar pelas suas obsessões imagísticas constantemente<br />

reitera<strong>das</strong>, <strong>de</strong> se abandonar à inspiração mais difusa, enfim, <strong>de</strong> «sofrer <strong>de</strong> pouca arte»,<br />

como apontou o próprio Pessoa. Como sublinha <strong>Eduardo</strong> <strong>Lourenço</strong>, noutro contexto,<br />

para além do facto <strong>de</strong> Pascoaes e Fernando Pessoa nunca se terem amado nem<br />

compreendido, talvez «porque visassem a mesma coisa <strong>de</strong> maneira diversa e, no fundo,<br />

dialecticamente convergente» 12 , as ditas simplificações abusivas da obra pascoaesiana<br />

resultam inoperantes enquanto não se compreen<strong>de</strong>r o sentido da verda<strong>de</strong>ira<br />

mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pascoaes, intrínseca e não aleatória. Como o próprio ensaísta refere,<br />

«Em poesia alguma portuguesa se encontra encarnada e operante a intuição mo<strong>de</strong>rna<br />

por excelência que faz do homem (ser imaginante e imaginário) a substância mesma da<br />

Realida<strong>de</strong>» 13 . É por essa osmose constante entre o homem e a Realida<strong>de</strong>, que, para<br />

Pascoaes, só o absolutamente irreal é real e é em consonância com esta visão que o<br />

poeta <strong>das</strong> Sombras evoca a realida<strong>de</strong> pátria como Pátria-Sauda<strong>de</strong>. Na interpretação <strong>de</strong><br />

<strong>Eduardo</strong> <strong>Lourenço</strong>, é <strong>de</strong>ssa mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> peculiar que <strong>de</strong>rivam dois aspectos<br />

fundamentais do imaginário pascoaesiano: o primeiro, é o da elevação ao universal da<br />

particularida<strong>de</strong> – a tonalida<strong>de</strong> saudosa – com que somos supostos viver a nossa relação<br />

com o Tempo; a segunda, é o do pendor «futurizante» <strong>de</strong>ssa mesma Sauda<strong>de</strong>, visão <strong>de</strong><br />

fogo que nega a interpretação simplista da Sauda<strong>de</strong> como passadista. Para sublinhar este<br />

último aspecto, cita <strong>Eduardo</strong> <strong>Lourenço</strong> o célebre aforismo do Verbo Escuro: «o futuro é<br />

a aurora do passado». É com estes pressupostos que Pascoaes pô<strong>de</strong> mitificar a Pátria<br />

como criadora Sauda<strong>de</strong>, outorgando-nos o estatuto <strong>de</strong> Povo-Saudoso.<br />

Uma outra forma <strong>de</strong> reabilitar o nome <strong>de</strong> Teixeira <strong>de</strong> Pascoaes é a consi<strong>de</strong>ração<br />

da sua obra como uma <strong>das</strong> raras que, entre nós, escapa à envenenada tentação do<br />

ressentimento cultural, com o consequente complexo <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong>, facilmente<br />

transmutável no seu contrário, sistema <strong>de</strong> extremos opostos que parece caracterizar a<br />

nossa cultura. Não há, no autor <strong>de</strong> Marânus, segundo o ensaísta, nenhuma obsessão <strong>de</strong><br />

comparativismo: «Na sua evocação incan<strong>de</strong>scente, <strong>de</strong>lirada do Universo, as nossas<br />

coisas – paisagem ou gesta humana, Marão ou Nuno Álvares – têm o seu lugar próprio,<br />

12 In Portugal como Destino seguido <strong>de</strong> Mitologia da Sauda<strong>de</strong>, p. 75.<br />

13 In O Labirinto da Sauda<strong>de</strong>, Psicanálise Mítica do Destino Português, p. 108.<br />

4

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!