Marcelo Meira Amaral Bogaciovas - UFRB
Marcelo Meira Amaral Bogaciovas - UFRB
Marcelo Meira Amaral Bogaciovas - UFRB
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Tive o prazer de conversar pessoalmente com o Professor Salvador em algumas<br />
oportunidades. Em uma delas, nos idos de 1980, sobre cristãos-novos e sobre sua já<br />
vasta produção intelectual. 14 Elogiei seus livros, de viva voz, fazendo pequenas<br />
ressalvas sobre a maneira como ele chegava a algumas conclusões. Assim, um<br />
indivíduo com determinado apelido, ou sobrenome, como se diz no Brasil, em sua<br />
opinião poderia ser cristão-novo, por simples suposição ou semelhança. 15 Após algumas<br />
páginas de seus livros, em um crescendo, o mesmo transformava-se em suspeito de ser<br />
cristão-novo e depois em judeu ou hebreu. Tudo sem a menor prova...<br />
Perguntei-lhe o motivo de seu interesse pelo assunto. Sua resposta foi assaz<br />
interessante e esclarecedora quanto a seu propósito. Disse que pretendia provar ao seu<br />
orientador, o Professor Dr. Sérgio Buarque de Holanda, que Paulo Prado estava correto<br />
em afirmar ter sido significativa a presença de cristãos-novos em São Paulo. Tal<br />
afirmação é confirmada em sua autobiografia. 16<br />
Uma das mais interessantes teses sobre a Inquisição, defendida pelo historiador<br />
António José Saraiva, era de que “a função do tribunal do Santo Ofício não era destruir<br />
os judaizantes, mas fabricá-los”. 17 Ou seja, a instituição precisava da ‘existência’ de<br />
pessoas praticando o judaísmo para justificar a ‘necessidade’ de existência do próprio<br />
tribunal. Analogamente, pode-se afirmar que o Professor Salvador foi um dos grandes<br />
fabricantes de judeus e de cristãos-novos em São Paulo: ele precisava exibir um número<br />
apreciável de cristãos-novos em São Paulo para comprovar sua tese. Mostrar de forma<br />
cabal ou não, isso não importava para ele naquele momento. Mesmo porque ele<br />
percebeu que, naquela ocasião, ninguém do meio acadêmico teria conhecimento para<br />
contestá-lo.<br />
Deve-se ressaltar, entretanto, que a obra de Salvador traz um grande número de<br />
informações que serviram enormemente para todos que estudam o tema. E que cabe a<br />
14 José Gonçalves Salvador foi autor das seguintes obras, além das citadas acima:. Os Cristãos-<br />
Novos e o Comércio no Atlântico Meridional: com enfoque nas Capitanias do Sul: 1530-1680. São<br />
Paulo: Pioneira; Brasília: INL, 1978. Os Magnatas do Tráfico Negreiro: séculos XVI e XVII. São<br />
Paulo: Pioneira/EDUSP, 1981. Vozes da História. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 2001. A<br />
Capitania do Espírito Santo e seus engenhos de açúcar (1535-1700)- a presença dos cristãos-novos.<br />
Vitória: Secretaria de Produção e Difusão Cultural: UFES/ Departamento Estadual de Cultura, 1994.<br />
15 Este caso será tratado em meu livro, sob o título “A questão onomástica”.<br />
16 SALVADOR, José Gonçalves. Do amanhecer ao pôr-do-sol: autobiografia resumida. São<br />
Paulo: Opus Libri Edições, 1995. p. 86.<br />
17 SARAIVA, António José Saraiva. A Inquisição Portuguesa. Lisboa: Publicações Europa-<br />
América/ Coleção SABER, 1956. p. 121.<br />
Simpósio Internacional de Estudos Inquisitoriais – Salvador, agosto 2011<br />
4