VIOLÊNCIA E SOMBRA Violence and Shadow Maria da Graça ... - IDC
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<strong>VIOLÊNCIA</strong> <strong>VIOLÊNCIA</strong> E E <strong>SOMBRA</strong><br />
<strong>SOMBRA</strong><br />
<strong>Violence</strong> <strong>and</strong> <strong>Shadow</strong><br />
<strong>Maria</strong> <strong>da</strong> <strong>Graça</strong> Serpa *<br />
Resumo: Resumo: Uma reflexão acerca do problema <strong>da</strong> violência em<br />
nossas vi<strong>da</strong>s e de como a psicologia analítica vem contribuindo<br />
com seus conceitos <strong>da</strong> relação consciente/inconsciente e com o<br />
estudo do complexo <strong>da</strong> sombra, para que possamos encontrar na<br />
análise e desenvolvimento <strong>da</strong> consciência um modo de viver<br />
melhor.<br />
Palavras-chave: Palavras-chave: violência – consciência - inconsciente – sombra.<br />
Abstract: Abstract: Abstract: Abstract: Abstract: This article discusses the problems caused by violence<br />
in our lives. It also covers what analytical psychology can<br />
accomplish through the concepts of conscious <strong>and</strong> unconscious<br />
<strong>and</strong> the shadow complex. It is possible to find a better way of life<br />
by using the analysis <strong>and</strong> development of consciousness.<br />
Keywords: Keywords: Keywords: Keywords: Keywords: violence – consciousness – unconscious – shadow.<br />
Nosso objetivo é refletir acerca do fenômeno <strong>da</strong> violência<br />
que atinge nosso planeta e nossas vi<strong>da</strong>s. A ca<strong>da</strong> dia vemos mais<br />
e mais pessoas toma<strong>da</strong>s pelo medo: medo de sair à rua, medo de<br />
contrair gripe, medo de ser assaltado ou de receber um novo<br />
golpe por telefone e assim por diante. Medo de viver. No apogeu<br />
<strong>da</strong> civilização tecnológica o homem começa a se encolher e a<br />
recuar para dentro do seu casulo, acossado que está por diferentes<br />
formas de medo: do futuro, de não ter trabalho, de não ser<br />
reconhecido, de não ser amado, deter ou não ter filhos etc.<br />
A par <strong>da</strong>s ditas facili<strong>da</strong>des <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> moderna, surgiram tantas<br />
dificul<strong>da</strong>des a serem venci<strong>da</strong>s para que se possa estar in, isto é,<br />
no contexto social a que pertence ou pretende pertencer, que o<br />
homem do século XXI se encontra paralisado pelo medo ou<br />
* <strong>Maria</strong> <strong>da</strong> <strong>Graça</strong> Serpa, é psicóloga gradua<strong>da</strong> pela PUCRS, psicoterapeuta<br />
há 25 anos, de crianças, adolescentes, adultos e casais. Especialista em<br />
Psicologia Clínica Junguiana. Membro do Instituto Junguiano do Rio<br />
Gr<strong>and</strong>e do Sul e aluna <strong>da</strong> graduação em Filosofia <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de <strong>IDC</strong>.<br />
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identificado com uma atitude compensatória, isto é, encastelado<br />
em uma posição de defesa agressiva.<br />
A vi<strong>da</strong> humana sempre foi extremamente frágil, mas como<br />
nunca antes na história temos tanta consciência disso e em tão<br />
gr<strong>and</strong>e escala. Hoje, qu<strong>and</strong>o o sonho de 40 anos atrás, <strong>da</strong> aldeia<br />
global, se concretizou, mais do que nunca, estamos cônscios <strong>da</strong><br />
nossa mortali<strong>da</strong>de e fragili<strong>da</strong>de. Brincamos durante milhares de<br />
anos, como crianças, na superfície deste planeta; na inconsciência<br />
<strong>da</strong>s crianças, acredit<strong>and</strong>o que o tempo não passaria e que nossas<br />
atitudes não nos trariam as conseqüências que hoje nos avassalam.<br />
A contribuição <strong>da</strong> psicologia analítica nesse contexto pode<br />
ser valiosa. Já não nos é possível entender a vi<strong>da</strong> humana e os<br />
seus fenômenos, tanto sociais quanto individuais, sem apelar para<br />
o conceito de inconsciente, tanto pessoal quanto coletivo. Se<br />
nos perguntarmos quem é o homem, como se constitui; o que o<br />
constitui; o que afinal, o caracteriza essencialmente; vamos nos<br />
deparar com uma gr<strong>and</strong>e dificul<strong>da</strong>de, a de explicar à luz <strong>da</strong> lógica<br />
estrita, na cultura iluminista do Logos, como pode ter acontecido<br />
o que temos aí diante de nós - este gr<strong>and</strong>e Caos - que atinge a<br />
todos em todos os níveis: social, cultural, financeiro, e que é de<br />
natureza tanto material quanto espiritual.<br />
A nossa maior dificul<strong>da</strong>de é a de compreender o que se<br />
passa, tanto dentro de ca<strong>da</strong> um de nós, quanto na socie<strong>da</strong>de<br />
complexa que construímos, e isso ocorre graças aos nossos<br />
conceitos lineares. Devemos isso à idéia de que somos um só<br />
indivíduo, quer dizer, de que na<strong>da</strong> mais somos do que o<br />
consciente, o ego. Eu sou isso e somente isso que está aqui: esta<br />
janelinha aberta para o mundo externo e na<strong>da</strong> mais. Esta<br />
concepção chapa<strong>da</strong> do ser humano, como se fôssemos seres<br />
bidimensionais, sem profundi<strong>da</strong>de, sem um “dentro”, um inside,<br />
impede - simplória que é - que possamos compreender o paradoxo<br />
que as nossas atitudes através dos séculos causaram e a razão<br />
pela qual funcionamos assim.<br />
Ain<strong>da</strong> que os conceitos de consciente e inconsciente sejam<br />
dos mais vulgarizados pela psicologia, sua compreensão pode<br />
lançar uma luz sobre os problemas humanos em geral e o <strong>da</strong><br />
violência – nosso tema aqui – em particular. Qu<strong>and</strong>o falamos em<br />
consciência nos referimos à nossa consciência comum, que<br />
centra<strong>da</strong> para todos nós no ego coordena e controla os processos<br />
psíquicos conferindo-lhes aquilo que podemos chamar de coesão<br />
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lógica e que se nos afigura a nossa identi<strong>da</strong>de habitual. Jung 1 nos<br />
diz que a consciência individual ou do eu, é um produto bem<br />
tardio <strong>da</strong> evolução, havendo uma forma ain<strong>da</strong> mais primitiva,<br />
que é a consciência grupal, a consciência, diríamos nós hoje, <strong>da</strong>s<br />
massas.<br />
Diz ele que a consciência grupal primitiva continua a existir<br />
na consciência moderna <strong>da</strong> família de tal forma que muitas vezes<br />
não conseguimos dizer na<strong>da</strong> a respeito dos membros dessas<br />
famílias a não ser o seu nome o que lhes parece suficiente. Este<br />
nível de indiferenciação <strong>da</strong> consciência nos diz o autor em um<br />
texto de 1939 - onde fala <strong>da</strong> importância <strong>da</strong> psicologia - pode<br />
existir em um nível ain<strong>da</strong> mais primitivo:<br />
Mas a consciência grupal em que os indivíduos são<br />
totalmente intercambiáveis não é o grau mais baixo<br />
<strong>da</strong> consciência, pois já apresenta diferenciação. No<br />
primitivismo mais baixo temos uma espécie de<br />
consciência global, com inconsciência total do sujeito.<br />
Neste grau só existem acontecimentos, mas não<br />
pessoas que agem... Nossa suposição de que aquilo<br />
que me agra<strong>da</strong> também agra<strong>da</strong> ao outro é evidente<br />
resíduo <strong>da</strong>quela noite primordial <strong>da</strong> consciência, onde<br />
não havia qualquer diferença perceptível entre o eu e<br />
o tu, e onde todos pensavam, sentiam e queriam a<br />
mesma coisa. Mas se acontecesse que o outro não<br />
estava realmente de acordo, surgia uma perturbação. 2<br />
Estaremos nós regredindo em termos de consciência?Até<br />
que ponto a socie<strong>da</strong>de em que vivemos nos reduziu a um<br />
funcionamento ca<strong>da</strong> vez mais regressivo e inconsciente;<br />
progressivamente mais automático, normatizado pelos “valores”<br />
do coletivo, orientados tão somente para a satisfação de<br />
necessi<strong>da</strong>des artificiais, cria<strong>da</strong>s pela mídia em benefício do ganho<br />
de grupos de elite? Quem somos nós hoje? Estaremos perdendo<br />
consciência em vez de ganhar?<br />
O que acontece na violência senão isso, de não estarmos<br />
mais capacitados a reconhecer a alteri<strong>da</strong>de, o outro, como<br />
reali<strong>da</strong>de diferente e fora de nós? Será que estamos regredidos a<br />
um estágio tão mais primitivo, justamente agora que estamos tão<br />
1 JUNG, C.G. Civilização em Transição. Petrópolis: Vozes, 1993. v. 10/3.<br />
2 Idem, § 281, 282.<br />
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orgulhosos <strong>da</strong> soberania do eu e do poder <strong>da</strong> vontade humana?<br />
Mas, para que possamos falar de consciência é preciso que antes,<br />
consideremos o conceito de inconsciente, já que tudo que ocorre<br />
no campo <strong>da</strong> consciência não pode ser considerado isola<strong>da</strong>mente.<br />
Consciência e inconsciente são uma díade inseparável.<br />
Na topografia junguiana <strong>da</strong> psique, o inconsciente apresenta<br />
duas gr<strong>and</strong>es regiões: o inconsciente pessoal e o inconsciente<br />
coletivo. O primeiro constitui-se de conteúdos decorrentes <strong>da</strong>s<br />
experiências individuais, sendo também denominado de psique<br />
subjetiva. Convém lembrar aqui, que o termo psique para Jung<br />
refere-se à totali<strong>da</strong>de dos processos psíquicos: conscientes e<br />
inconscientes.<br />
O inconsciente pessoal é aquela parte <strong>da</strong> psique que<br />
também contém elementos que poderiam aflorar à<br />
consciência... Há pessoas que se encontram acor<strong>da</strong><strong>da</strong>s<br />
para quase to<strong>da</strong>s as coisas de que se possa ter<br />
consciência. Obviamente existe uma inconsciência<br />
espantosa em nossa civilização, mas ao observarmos<br />
outras raças, outros países, como a Índia e a China,<br />
descobriremos que estes povos estão despertos para<br />
coisas que obrigariam os psicanalistas de nossos países<br />
a sofrerem durante meses antes de conseguirem captálas.<br />
3<br />
O segundo, o inconsciente coletivo ou psique objetiva<br />
constitui-se de conteúdos transpessoais comuns a to<strong>da</strong> a<br />
humani<strong>da</strong>de. Trazem o processo evolutivo <strong>da</strong> história <strong>da</strong><br />
humani<strong>da</strong>de para dentro do indivíduo, sendo formado pelos<br />
arquétipos e pelo Self, mais tarde denominado por ele de Arquétipo<br />
Central ou Personali<strong>da</strong>de Maior, ou seja, a totali<strong>da</strong>de em nós.<br />
Para a psicologia analítica – foi assim que Jung denominou a sua<br />
teoria - o inconsciente é paradoxal, não linear, não estruturado,<br />
de infinitas possibili<strong>da</strong>des. Criativo, se representa criativamente<br />
a ca<strong>da</strong> nova experiência, seja ela positiva ou negativa, pois para<br />
o inconsciente não existem as conveniências do mundo externo.<br />
A cama<strong>da</strong> mais profun<strong>da</strong> que conseguimos atingir na<br />
mente do inconsciente é aquela em que o homem<br />
3 JUNG, C.G. Fun<strong>da</strong>mentos de Psicologia Analítica. Petrópolis: Vozes, 1985.<br />
v. 18, § 91.<br />
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“perde” a sua individuali<strong>da</strong>de particular, mas onde a<br />
sua mente se alarga mergulh<strong>and</strong>o na mente <strong>da</strong><br />
humani<strong>da</strong>de – não a consciência – mas, o inconsciente,<br />
onde somos todos iguais... A esse nível não somos<br />
mais enti<strong>da</strong>des separa<strong>da</strong>s, somos um. 4<br />
Mais ain<strong>da</strong>, o inconsciente não se submete aos nossos<br />
desejos, ou aos nossos caprichos e muitas vezes, comparece para<br />
nos fazer passar vergonha, qu<strong>and</strong>o nos leva a ter atitudes que<br />
não condizem com a moral ou as conveniências do ambiente. É<br />
o mecanismo <strong>da</strong> projeção, que nos dá a possibili<strong>da</strong>de constante<br />
de podermos ver no outro aquilo que ain<strong>da</strong> não somos capazes<br />
de ver em nós mesmos, que aos poucos nos leva a uma<br />
consciência maior de quem somos. Por isso, para os desavisados,<br />
para aqueles que não conhecem a si mesmos, vale a máxima de<br />
Sartre: o inferno é o outro.<br />
Os elementos do inconsciente coletivo não se<br />
encontram sujeitos a nenhuma intenção arbitrária, nem<br />
são manejáveis pela vontade. Na ver<strong>da</strong>de agem como<br />
se não existissem na pessoa – conseguimos vê-los em<br />
nosso próximo, mas não em nós mesmos. 5<br />
Ao caracterizar melhor o inconsciente coletivo diz Jung: “o<br />
inconsciente é comum a todos os indivíduos em grau infinitamente<br />
maior do que os conteúdos do consciente individual, pois é a<br />
condensação do historicamente médio e freqüente.” 6 O fenômeno<br />
<strong>da</strong> violência - conseqüência do nosso desconhecimento <strong>da</strong> relação<br />
consciente/inconsciente - ocorre pela irrupção no campo <strong>da</strong><br />
consciência dessas energias desconheci<strong>da</strong>s e por isso mesmo fortes<br />
e incontroláveis.<br />
Via de regra, qu<strong>and</strong>o o inconsciente coletivo se torna<br />
ver<strong>da</strong>deiramente constelado em gr<strong>and</strong>es grupos sociais,<br />
a conseqüência será uma quebra pública, uma epidemia<br />
mental que pode produzir revoluções, guerra ou coisa<br />
semelhante. Tais movimentos são tremen<strong>da</strong>mente<br />
4 Idem, § 87.<br />
5 Idem, § 92.<br />
6 JUNG, C.G. Símbolos <strong>da</strong> Transformação. Petrópolis: Vozes, 1989. v. 5, §<br />
75.<br />
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contagiosos ... pois qu<strong>and</strong>o essa esfera humana é<br />
ativa<strong>da</strong>, ninguém mais é a mesma pessoa.Você não<br />
está apenas no movimento, mas você é o próprio<br />
movimento. 7<br />
Podemos observar isso nos gr<strong>and</strong>es fenômenos de massa,<br />
de surgimento mais ou menos agressivo e de conseqüências mais<br />
ou menos violentas. Em seu livro, História <strong>da</strong> Origem <strong>da</strong><br />
Consciência, escrito na déca<strong>da</strong> de 60, Erich Neumann nos diz<br />
que nestas situações, psicologicamente reina uma situação coletiva<br />
primitiva, em que dominam as antigas leis <strong>da</strong> participation<br />
mystique, num grau muito maior do que no desenvolvimento<br />
ocidental anterior, dos últimos séculos. 8<br />
Em sua obra C. G. Jung – seu mito em nossa época, Marie-<br />
Louise Von Franz, nos diz que para Jung:<br />
Não é apenas o indivíduo isolado quem está sujeito à<br />
enfermi<strong>da</strong>de psíquica como resultado de uma atitude<br />
errônea para com o inconsciente: a mesma coisa pode<br />
acontecer a nações inteiras... Tudo que se possa<br />
descobrir acerca dessas leis naturais que se aplicam à<br />
psique humana também terá vali<strong>da</strong>de com relação a<br />
todos os aspectos <strong>da</strong> existência do homem...Tanto o<br />
valor que imprimimos à nossa cultura como os valores<br />
que nela vemos e, talvez, a sua própria sobrevivência,<br />
dependem de modo direto de uma compreensão “certa”<br />
ou ‘erra<strong>da</strong>” do inconsciente. 9<br />
Poderíamos dizer que antes mesmo de termos uma<br />
concepção “erra<strong>da</strong>” do inconsciente, não temos nenhuma idéia<br />
clara do que seja e <strong>da</strong> importância que tem em nossas vi<strong>da</strong>s,<br />
tanto o nosso inconsciente pessoal quanto aqueles conteúdos <strong>da</strong><br />
ordem do inconsciente coletivo que compartilhamos com o resto<br />
<strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de; o nosso substrato humano – independente de<br />
raça, cor, religião, classe social ou grau de instrução. Von Franz<br />
no mesmo texto pergunta:<br />
7 JUNG, C.G. Fun<strong>da</strong>mentos de Psicologia Analítica, § 93.<br />
8 NEUMANN, E. História <strong>da</strong> Origem <strong>da</strong> Consciência. 10. ed. São Paulo:<br />
Cultrix, 1995, p. 272.<br />
9 VON FRANZ, M-L. C. G. Jung - seu mito em nossa época. São Paulo:<br />
Círculo do Livro, (s.d.), p. 12.<br />
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Mas o que é de fato esse inconsciente que teve um<br />
papel tão amplo e imprevisível na vi<strong>da</strong> e obra de Jung?<br />
Na reali<strong>da</strong>de, trata-se apenas de uma moderna<br />
expressão técnica para uma experiência interior que<br />
nasceu com a humani<strong>da</strong>de, a experiência que ocorre<br />
qu<strong>and</strong>o algo estranho e desconhecido toma conta de<br />
nós a partir de dentro de nós mesmos; qu<strong>and</strong>o as ações<br />
de forças interiores mu<strong>da</strong>m subitamente nossa vi<strong>da</strong>;<br />
qu<strong>and</strong>o sonhamos, temos inspirações e vislumbres que<br />
sabemos não terem sido “construídos por nós, mas<br />
que vieram a nós a partir de uma psique “exterior” e<br />
abriram seu caminho até a consciência. 10<br />
A experiência do surgimento na consciência desses<br />
conteúdos, geralmente inexplicáveis é comum a todos nós, apenas<br />
não relacionamos esses conteúdos com o que se passa em nossas<br />
vi<strong>da</strong>s pessoais nem aos eventos coletivos de que hoje, todos nós<br />
participamos direta ou indiretamente. Então, se considerarmos<br />
para fins didáticos, a idéia de que temos em nós bem mais do<br />
que aquilo de que nos <strong>da</strong>mos conta a nível consciente, de que<br />
somos motivados e até - em função do nosso alto grau de<br />
inconsciência quanto ao que se passa em nosso mundo interno -<br />
dirigidos pelo inconsciente; talvez possamos começar a pensar<br />
de modo diferente tudo o que está acontecendo neste momento<br />
histórico.<br />
Neumann 11 nos diz que o inconsciente determina a vi<strong>da</strong> de<br />
um homem, mais fortemente do que sua consciência, sua vontade<br />
e intenção. Vamos aqui, examinar mais deti<strong>da</strong>mente uma <strong>da</strong>s<br />
instâncias do nosso inconsciente, a saber: aquela que Jung<br />
denominou de sombra. A sombra resume to<strong>da</strong>s as possibili<strong>da</strong>des<br />
de desenvolvimento rejeita<strong>da</strong>s por um indivíduo. É o nosso lado<br />
reprimido, tudo aquilo com que não nos identificamos<br />
conscientemente. Pode ser aplicado a qualquer fenômeno com<br />
características psicológicas: instituições, fatos, história, cultura,<br />
ou seja, a to<strong>da</strong>s as criações humanas, porquanto tudo que<br />
construímos – consciente ou inconscientemente - leva a nossa<br />
marca.<br />
10 Idem, p. 13.<br />
11 NEUMANN, E. Psicologia Profun<strong>da</strong> e Nova Ética. São Paulo: Paulinas,<br />
1991, p. 71.<br />
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Sombra é tudo aquilo que é incompatível com aquilo que<br />
o ego escolheu como seu. A sombra é o “outro”, tanto dentro de<br />
nós, quanto qu<strong>and</strong>o projeta<strong>da</strong>. Pode ser positiva ou negativa,<br />
pois é tudo aquilo com que não nos identificamos. Na ver<strong>da</strong>de a<br />
projeção é mais uma forma de aproximação do que uma atitude<br />
defensiva. Tudo que é desconhecido tende a ser projetado. A<br />
nossa sombra pode aparecer de várias maneiras: imagens de<br />
estranheza, do mal, do desconhecido, do inimigo, do estrangeiro,<br />
do diferenciado etc.<br />
Se as tendências reprimi<strong>da</strong>s <strong>da</strong> sombra fossem<br />
totalmente más, não haveria qualquer problema. Mas,<br />
de um modo geral, a sombra é simplesmente vulgar,<br />
primitiva, inadequa<strong>da</strong> e incômo<strong>da</strong>, e não de uma<br />
maligni<strong>da</strong>de absoluta. Ela contém quali<strong>da</strong>des infantis<br />
e primitivas que, de algum modo poderiam vivificar e<br />
embelezar a existência humana; mas o homem se choca<br />
contra as regras tradicionais. 12<br />
Como entender então a presença <strong>da</strong> sombra, tanto na nossa<br />
vi<strong>da</strong> pessoal (uma doença inespera<strong>da</strong> e injusta, um relacionamento<br />
que nos fere, uma experiência que nos humilha), quanto na vi<strong>da</strong><br />
<strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des a que pertencemos (no local de trabalho, no<br />
clube, na Igreja, na família)? Podemos entender a presença<br />
inespera<strong>da</strong> <strong>da</strong> sombra em nossas vi<strong>da</strong>s como algo que vem quebrar<br />
a unilaterali<strong>da</strong>de do ego: é o desconhecido – a alteri<strong>da</strong>de - que<br />
vem e pede para ser reconhecido, para ser integrado ao campo<br />
<strong>da</strong> consciência.<br />
A sombra torna-se negativa qu<strong>and</strong>o é negligencia<strong>da</strong>, e a<br />
prova disso aí está nos problemas individuais e sociais que<br />
enfrentamos hoje: as drogadições, os preconceitos religiosos, as<br />
guerras; a pobreza e ignorância <strong>da</strong>s gr<strong>and</strong>es populações. A sombra<br />
age de forma maligna dentro de nós, qu<strong>and</strong>o a negamos, lhe<br />
tiramos o valor e a negligenciamos. Com a sombra não se brinca<br />
e a repressão tão somente, não funciona.<br />
O gr<strong>and</strong>e perigo é nos identificarmos com ela, com a<br />
sombra: acreditarmos que somos aquilo e apenas aquilo, com<br />
exclusão de todo resto. Este é o gr<strong>and</strong>e risco, cairmos na<br />
unilaterali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> consciência. Temos que nos conscientizar de<br />
12 JUNG, C.G. Psicologia e Religião. Petrópolis: Vozes, 1990. v. 11/1, §<br />
134.<br />
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que somos um todo, de que o foco <strong>da</strong> consciência – tal como a<br />
luz principal em um palco, focaliza uma coisa mais claramente<br />
que as outras, mas que ele é móvel e não pode perder tal<br />
mobili<strong>da</strong>de, pois isso nos reduziria e empobreceria demasiado,<br />
reduzindo-nos a quase na<strong>da</strong>. Para li<strong>da</strong>r com a sombra é preciso<br />
tomar consciência, é preciso que todos nós, sem exceção, façamos<br />
uma mea culpa. É preciso assumir responsabili<strong>da</strong>de pelo que está<br />
acontecendo no mundo e nisso está a nossa gr<strong>and</strong>e dificul<strong>da</strong>de,<br />
por que para isso: o autoconhecimento é indispensável o contato<br />
com a nossa própria sombra.<br />
Por que é difícil? Por que é mais fácil projetar no outro: em<br />
Deus, nas instituições sociais, nas Igrejas, no cristianismo ou<br />
qualquer outra corrente religiosa, no Estado, nos políticos, no<br />
meu pai, na tua mãe, no marido, na esposa, no filho etc. Não há<br />
quem esteja isento <strong>da</strong>s projeções <strong>da</strong> sombra. Todos nós<br />
projetamos, os mais conscientes menos; os menos conscientes,<br />
mais. Logo, todos sem exceção, temos algo a ver com isso, com a<br />
situação de violência que assola o planeta. Mas, enquanto<br />
estivermos nessa atitude escapista, de negação compulsiva,<br />
ach<strong>and</strong>o que somos inocentes no paraíso, e que o que acontece<br />
fora de nós na<strong>da</strong> tem a ver com o que acontece dentro de nós,<br />
vai ser difícil mu<strong>da</strong>r. Se não conseguimos lembrar, de levar ao<br />
supermercado a sacola retornável; se alimentamos a fantasia de<br />
que o “nosso lixo” não vai fazer diferença ou se não nos dispomos<br />
a separar o lixo por comodismo, por que deveríamos nos<br />
responsabilizar pelo mal que campeia o mundo?<br />
Melhor continuarmos como até agora: vamos deixar que os<br />
filósofos se ocupem com a sua discussão interminável e inconclusa<br />
sobre a origem do chamado “problema do mal”. Se não<br />
conseguimos ver o que fazemos, por que iríamos ver aquilo que<br />
julgamos que não fazer? Se eu não roubo, não mato, não uso<br />
drogas, não exploro a infância, ou a miséria do outro, por exemplo,<br />
por que deveria me ocupar com isso? Criticamos, mas não nos<br />
dispomos a agir. Porque ação pressupõe assunção de<br />
responsabili<strong>da</strong>de. Dizem, aliás, que o mal <strong>and</strong>a à solta porque os<br />
ditos ‘bons’ não se dispõem a agir.<br />
Vivemos em uma cultura em que é lindo ser inocente.<br />
Consideramos, em função de uma interpretação errônea, infantil<br />
e totalmente esotérica e superficial do cristianismo que o mundo<br />
material e tudo que ele envolve, é feio, sujo e deletério. Este,<br />
aliás, o motivo que muita gente inteligente e instruí<strong>da</strong> oferece<br />
para seu afastamento <strong>da</strong>s práticas religiosas e de seu agnosticismo<br />
que pensam ser ateísmo.<br />
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Nós nos dizemos cristãos, mas não buscamos conhecer o<br />
cristianismo mais a fundo. Não lemos, não estu<strong>da</strong>mos, não<br />
buscamos o conhecimento a respeito dos valores que regem as<br />
nossas próprias vi<strong>da</strong>s. Pelo contrário, vivemos na mais absoluta<br />
inconsciência tent<strong>and</strong>o mesmo, de modo consciente, viver de<br />
forma a não nos contaminarmos com o mundo circun<strong>da</strong>nte. Como<br />
se houvesse tal possibili<strong>da</strong>de! Não educamos as nossas crianças<br />
para aprenderem a julgar com clareza e discernimento e para<br />
serem fortes para enfrentar a vi<strong>da</strong> com os seus problemas, e o<br />
que é pior, lhes <strong>da</strong>mos o exemplo do avestruz. Diante deste<br />
quadro, o que nos espera?<br />
Neumann diz que é preciso sacrificar a inocência, descer<br />
ao Hades e experimentar a mu<strong>da</strong>nça que o mundo inferior oferece<br />
para ser “salvo” isto é, para chegar ao Si-mesmo e a uma visão <strong>da</strong><br />
vi<strong>da</strong> que por ser redimi<strong>da</strong>, abarca o claro e o escuro, o puro e o<br />
impuro, o bem e o mal. 13 Mais do que isso, é preciso desenvolver<br />
um alto grau de consciência e de autocontrole. É preciso estar<br />
consciente de onde estamos amarr<strong>and</strong>o o nosso burro, isto é,<br />
onde estamos investindo a nossa libido, a nossa energia psíquica?<br />
O que estamos projet<strong>and</strong>o e onde estamos projet<strong>and</strong>o, porque<br />
tudo tem um preço. Por mais confortável que seja projetarmos,<br />
nos outros, aquilo que não nos agra<strong>da</strong> e discriminarmos esta ou<br />
aquela pessoa ou grupo, não há como fugir para sempre dos<br />
nossos próprios conteúdos inconscientes.<br />
Já nos aconteceu de mu<strong>da</strong>rmos de idéia quanto a uma<br />
pessoa ou situação, que antes valorizávamos muito. Na projeção<br />
que fizemos anteriormente, uma gr<strong>and</strong>e quanti<strong>da</strong>de de energia<br />
psíquica foi investi<strong>da</strong> e agora que nos decepcionamos, a forma<br />
de recapturar pelo menos parte desta energia e conseguirmos<br />
nos afastar desta pessoa ou situação depende de a rebaixarmos e<br />
desvalorizarmos, tanto quanto antes a estimávamos. Como li<strong>da</strong>r<br />
com isso sem que nos tornemos pessoas amargura<strong>da</strong>s e ressenti<strong>da</strong>s,<br />
com o mal que nos fizeram ou àqueles que amamos? Tomar<br />
consciência do conteúdo projetado é a solução, mas para isso é<br />
preciso compreender o conteúdo simbólico <strong>da</strong>quele vínculo. Para<br />
isso devemos nos perguntar: qual o valor simbólico desta<br />
experiência? O que ela representou para nós, qual o seu significado<br />
em nossa vi<strong>da</strong>? Vamos acabar descobrindo que tipo de<br />
aprendizado esta experiência – por mais dolorosa que tenha sido<br />
– trouxe para o nosso desenvolvimento como seres humanos.<br />
13 NEUMANN, E. Op.cit., p. 88.<br />
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Para nos apropriarmos do conteúdo simbólico inerente às<br />
vivências que a vi<strong>da</strong> nos traz, ain<strong>da</strong> que difíceis, é necessário<br />
aprender que a pessoa é uma coisa e que a imagem (imago) que<br />
tenho dela é outra completamente diferente a maior parte <strong>da</strong>s<br />
vezes. 14 É preciso aguçar o nosso espírito crítico para que possamos<br />
nos <strong>da</strong>r conta que a nossa percepção do mundo circun<strong>da</strong>nte é<br />
filtra<strong>da</strong> pela nossa psique com seu torvelinho de sentimentos,<br />
crenças, idéias e emoções. A imagem que eu tenho de uma pessoa<br />
ou grupo não corresponde – como ingenuamente pensamos - à<br />
reali<strong>da</strong>de desta mesma pessoa ou grupo. Por quantas vezes, já<br />
passamos pela experiência oposta? Desconfiávamos de alguém<br />
ou de um grupo e, depois de um momento em que as<br />
circunstâncias nos aju<strong>da</strong>ram a deixar de lado as reservas,<br />
descobrimos que estávamos errados e que a nossa impressão<br />
anterior se devia a um erro de percepção?<br />
Não podemos mu<strong>da</strong>r o mundo, mas podemos mu<strong>da</strong>r a nós<br />
mesmos, desenvolvendo um grau de consciência mais acurado;<br />
ilumin<strong>and</strong>o não apenas os defeitos e dificul<strong>da</strong>des do outro, mas<br />
os nossos próprios, com o objetivo de aprendermos mais sobre<br />
eles, isto é, sobre nós mesmos. O bem e o mal não são duas<br />
substâncias opostas e fora de nós: o mal, presente apenas nos<br />
outros, e o bem, um privilégio nosso; mas sim tendências do<br />
nosso ego/personali<strong>da</strong>de; infelizmente mal-informado e inábil no<br />
sentido de li<strong>da</strong>r com este mundo interior que nos permeia, rico,<br />
mas ain<strong>da</strong> desconhecido.<br />
Estamos fal<strong>and</strong>o <strong>da</strong> sombra, tanto <strong>da</strong> nossa sombra pessoal<br />
quanto <strong>da</strong> sombra <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de, presente nos grupos de que<br />
participamos, no dia a dia. Jung escreveu em 1946, algo que<br />
pode re-colocar para nós o nosso tema:<br />
ela [a psicologia] descobriu onde estão atualmente<br />
alojados aqueles demônios que em tempos antigos<br />
dominavam a natureza e conseqüentemente o destino<br />
<strong>da</strong>s pessoas, e descobriu também que o iluminismo<br />
não lhes fez mal algum. Ao contrário, estão ativos e<br />
bem dispostos como outrora, e sua ativi<strong>da</strong>de ampliouse<br />
inclusive a ponto de reportar-se a to<strong>da</strong>s as realizações<br />
<strong>da</strong> mente humana”... Qu<strong>and</strong>o aju<strong>da</strong>dos de qualquer<br />
maneira a irromper na consciência, e esta não é capaz<br />
14 JUNG, C.G. A Natureza <strong>da</strong> Psique. Petrópolis: Vozes, 1991. v. 8/2,<br />
§521.<br />
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de interceptá-los por meio de formas igualmente<br />
eleva<strong>da</strong>s, eles arrebentam tudo como um rio cau<strong>da</strong>loso<br />
e transformam as pessoas em criaturas para as quais o<br />
nome de “besta” é bom demais... A antiga possessão<br />
não se tornou obsoleta, só mu<strong>da</strong>ram os nomes:<br />
antigamente o nome era “espírito maligno”, hoje é<br />
“neurose” ou “complexos inconscientes”... O fato é que<br />
uma pequena causa inconsciente basta para destruir<br />
um destino humano, arruinar uma família e atuar<br />
durante gerações como uma maldição dos atri<strong>da</strong>s. 15<br />
Esta a razão <strong>da</strong> nossa reflexão, por que o pensamento –<br />
mágico - de que a violência não vai nos atingir ou aos que amamos,<br />
não é suficiente para exorcizar o mal de nossas vi<strong>da</strong>s. Enquanto<br />
finalizo este texto, ouço no jornal do meio-dia, que a campanha<br />
contra as drogas promovi<strong>da</strong> pelo governo do estado reduziu<br />
significativamente o número de homicídios, roubos etc. Donde<br />
se conclui que fazer vista “grossa” não vai solucionar nenhum<br />
dos problemas humanos. É preciso primeiro tomar consciência;<br />
depois agir, tanto no plano social quanto no plano individual.<br />
Neste, ca<strong>da</strong> um responde por si mesmo. E aqui a ansie<strong>da</strong>de é um<br />
obstáculo. Vivemos em uma cultura do fazer, e do fazer com<br />
pressa. Queremos tudo “para ontem”. Diante <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de de<br />
tomar consciência, as pessoas logo perguntam: e o que eu devo<br />
fazer?<br />
Na<strong>da</strong> e ao mesmo tempo, tudo. O trabalho no nosso mundo<br />
interno, ou se preferirem o trabalho com a alma, é totalmente<br />
diferente de tudo que conhecemos até agora e não obedece de<br />
forma alguma aos critérios conhecidos de rapidez, produtivi<strong>da</strong>de<br />
e lucro. A alma – a nossa alma individual, bem como a alma do<br />
Mundo – é doce e fugidia; terna e plástica. Não pode ser domina<strong>da</strong><br />
com violência e, não se submete aos caprichos do ego. Ela anseia<br />
por liber<strong>da</strong>de e aconchego; por segurança e possibili<strong>da</strong>de de<br />
expressão. É paradoxal e é preciso encantá-la, com doçura e<br />
paciência. Para “fazer alma,” é preciso estar com ela, longamente,<br />
sem pressa, prest<strong>and</strong>o atenção ao que se passa dentro de nós,<br />
tanto quanto prestamos atenção aquilo que está fora de nós.<br />
Jesus disse: onde está o teu tesouro aí está também o teu coração.<br />
Onde está o teu coração? Onde está o meu? Por que até lá, até<br />
que descubramos, violência é sombra.<br />
15 JUNG, C.G. A Vi<strong>da</strong> Simbólica. Petrópolis: Vozes, 2000. v. 18/2, § 1374.<br />
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