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PRÓLOGO
O QUE LEMBRO de quando era prostituta?
Lembro da ternura, do tédio, dos sorvetes que tomava às três da
manhã na frente da televisão; do cheiro de pau, de homens tímidos
com pele sedosa, das risadas; das ruas escuras reluzindo; de garotos de
boné esparramados na sala de apresentações, de barrigas gordas em
cima de mim; das conversas, de pegar cigarros enquanto retocava a
maquiagem.
Lembro que as outras garotas eram como irmãs, e de saber que era
perigoso contar a elas meu nome verdadeiro. Lembro de abrir o coração
para homens estranhos e acariciar seus rostos, sorrindo. Lembro de ser
fodida tão forte que meu rosto ficava branco de dor. Lembro de ser prostituta,
e ter orgulho disso, gostar disso.
Mas o que fiz não é normal. Não? Eu ficava nua, eu tocava o corpo das
pessoas, elas tocavam o meu, ficávamos sozinhos num quarto. Como um
massagista, como um dentista, como uma esteticista. Sim, mas eu abria
meu corpo, eles me tocavam lá. Como um médico. Sim, mas lá dentro.
Sim.
Às vezes me perguntava, com as pernas abertas na cara de um sujeito
excitado, se me arrependeria pela invasão de meus lugares mais secretos.
Um homem que nunca vira antes está olhando minha vagina. Mas o que
isso significa? É só pele. Fico com vergonha de ter a parte de trás do joelho
examinada? Meu ouvido? O interior da minha boca? Olhos não deixam
cicatrizes, não sou diminuída pelo olhar de ninguém. Meu corpo é bonito,