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Episódios de uma “guerra”

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EPISÓDIOS DE UMA “GUERRA”<br />

Fui um dos que teve a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comandar <strong>uma</strong> unida<strong>de</strong> naval, no caso a FF “Comandante Sacadura<br />

Cabral”, entre Setembro <strong>de</strong> 1989 e 1991.<br />

Esperava-­‐me <strong>uma</strong> intensa ac?vida<strong>de</strong> operacional. Terminados os fabricos e o aprontamento, com a par?cipação<br />

em diversos exercícios nas águas do Con?nente, o navio rumou à Escócia (Edinburgh), com o objec?vo <strong>de</strong> par?cipar<br />

no “Joint Mari?me Course” (JMC), no âmbito da preparação para a integração na “Standing Naval Force<br />

Atlan?c” (SNFL). Esta ocorreu na Noruega (Bergen) e prolongou-­‐se <strong>de</strong>pois até Outubro <strong>de</strong> 1990.<br />

No final, em Plymouth, faziam-­‐se os prepara?vos para o regresso a Lisboa, quando chegaram instruções rela?vas<br />

a nova missão atribuída ao navio. Tal implicava que, nas duas semanas seguintes à chegada a Lisboa, o navio ?vesse<br />

<strong>de</strong> ser aprontado para seguir para o Mediterrâneo, a fim <strong>de</strong> ren<strong>de</strong>r a FF “Comandante Roberto Ivens” (então<br />

comandada pelo nosso camarada Santana <strong>de</strong> Mendonça).<br />

A missão consis?a basicamente na patrulha das linhas <strong>de</strong> navegação do Mediterrâneo, com seguimento dos<br />

navios interceptados, reportando em par?cular os que, pelo porto <strong>de</strong> origem ou <strong>de</strong> <strong>de</strong>s?no, ou respec?va carga, se<br />

cons?tuíssem como suspeitos <strong>de</strong> ac?vida<strong>de</strong>s contrárias ao <strong>de</strong>senrolar das previstas operações. As “regras <strong>de</strong><br />

empenhamento” para mais não davam!<br />

É fácil imaginar a azáfama que a logís?ca do aprontamento impôs. Suce<strong>de</strong>ram-­‐se a ritmo frené?co as<br />

indispensáveis reparações, a rendição <strong>de</strong> parte da guarnição e a integração do pessoal em acréscimo para passagem<br />

da “lotação normal” à “lotação completa”, a faina <strong>de</strong> munições, com embarque das em falta para a “dotação<br />

completa” e, naturalmente, o reabastecimento nas várias áreas para <strong>uma</strong> prevista permanência no mar <strong>de</strong> 30 dias.<br />

Enquanto isto, os meios <strong>de</strong> comunicação social faziam-­‐se eco <strong>de</strong> <strong>uma</strong> muito provável invasão do Iraque a curto<br />

prazo e eram explorados, à exaustão, os possíveis cenários e os meios neles empregues.<br />

E quanto aos meios disponibilizados por Portugal? Seriam os a<strong>de</strong>quados, teriam capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa própria<br />

para fazer face a eventuais ataques com mísseis, qual o estado <strong>de</strong> espírito das guarnições? Eram perguntas sobre<br />

perguntas e não havia respostas que sa?sfizessem as almejadas “caixas” jornalís?cas.<br />

Faltava mesmo, e aconteceu, o embarque <strong>de</strong> jornalistas (um do Diário <strong>de</strong> Nofcias e outro da Rádio Renascença),<br />

“disfarçados <strong>de</strong> correspon<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> guerra”, com o presumível objec?vo <strong>de</strong> a transmi?rem em directo.<br />

navio.<br />

Estava criado o “caldo” para a intranquilida<strong>de</strong> da guarnição e dos familiares que, no cais, assis?ram à largada do<br />

Mal saída a barra <strong>de</strong> Lisboa, ainda à vista do Cabo Espichel, eis-­‐me confrontado com <strong>uma</strong> guarnição perplexa,<br />

pedindo esclarecimentos e reclamando a atribuição <strong>de</strong> “suplemento <strong>de</strong> combate”.<br />

senso!<br />

Explicada, <strong>uma</strong> vez mais, a natureza da missão, ao que íamos, os ânimos foram-­‐se acalmando. Imperou o bom


No porto <strong>de</strong> Taranto (Itália) a Sacadura era ansiosamente aguardada pela guarnição da Ivens. Realizada a<br />

“entrega”, rumou a Roberto Ivens a Lisboa, passando então a Sacadura, com mais uns <strong>de</strong>z navios <strong>de</strong> diferentes<br />

nacionalida<strong>de</strong>s, a integrar a “Naval On Call Force Mediterranean” (NAVOCFORMED).<br />

Nada <strong>de</strong> invasão entretanto. Os navios que integravam a força foram mandados regressar aos portos <strong>de</strong> origem<br />

no período das festas natalícias, ficando em pron?dão <strong>de</strong> 48 horas.<br />

Após merecido e curto <strong>de</strong>scanso em Lisboa, em meados <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> 1991 veio a or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> reac?vação da<br />

Força. Tinha começado a <strong>“guerra”</strong>.<br />

De Lisboa seguiu-­‐se directamente para as imediações <strong>de</strong> Creta e, sem mais, iniciou-­‐se um período <strong>de</strong> vinte dias<br />

seguidos <strong>de</strong> patrulha na box <strong>de</strong>finida. Exceptuaram-­‐se os reabastecimentos no cais NATO <strong>de</strong> Creta, pelo período <strong>de</strong><br />

tempo estritamente indispensável para o efeito, ou as idas ao “posto <strong>de</strong> abastecimento” (petroleiro grego<br />

estrategicamente fun<strong>de</strong>ado e abrigado n<strong>uma</strong> das ilhas).<br />

Como “parceiro” <strong>de</strong> patrulha nesses 20 dias calhou-­‐me um contra-­‐torpe<strong>de</strong>iro grego o qual, provavelmente<br />

<strong>de</strong>vido à sua provecta ida<strong>de</strong>, em cada 2/3 dias <strong>de</strong> patrulha se impunha <strong>uma</strong> ida ao porto, <strong>de</strong> pelo menos 24 horas, por<br />

mo?vo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> qualquer avaria.<br />

Entretanto, a guerra <strong>de</strong>senrolou-­‐se noutras paragens.<br />

Por Abril <strong>de</strong> 1991 regressámos a Lisboa, felizmente sem percalços.<br />

Para trás ficaram recordações inesquecíveis <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>“guerra”</strong>, que o não foi, e <strong>de</strong> <strong>uma</strong> excepcional guarnição que<br />

soube sempre estar à altura do que lhe era exigido.<br />

António Be,encourt

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