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Casas da memória - Légua & meia

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A formação na comuni<strong>da</strong>de de origem se dá entre o microcosmo familiar e<br />

protegido <strong>da</strong>s casas-útero e as mora<strong>da</strong>s abertas para os dramas do ofício humano e as<br />

questões do cosmos, entre a Juiz de Fora como imago mundi materna e a ci<strong>da</strong>de converti<strong>da</strong><br />

no gran teatro del mundo. Do salão azul <strong>da</strong> baronesa ao gabinete do professor Almei<strong>da</strong><br />

Queirós, dos sobrados consangüíneos aos chalés mais distantes, a <strong>memória</strong> refaz o<br />

trânsito <strong>da</strong> métra-pólis, conforma<strong>da</strong> pelas casas <strong>da</strong>s mulheres, à métron-pólis, onde o<br />

étimo delira para dizer <strong>da</strong>s leis e dos limites que o Pai impõe ao tempo-espaço e ao<br />

homem – e assim “boxear com a eterni<strong>da</strong>de” e a morte. Em A i<strong>da</strong>de do serrote, tal<br />

trânsito é reiterado pela própria ordenação dos textos, na medi<strong>da</strong> em que a predominância<br />

<strong>da</strong>s figuras femininas, infantis ou filia<strong>da</strong>s à casa “materna” declina ao final <strong>da</strong><br />

obra, onde prevalecem a vi<strong>da</strong> exterior (“A rua Halfeld”, IS, p. 961) e as personagens<br />

professorais e masculinas, sendo que o penúltimo texto refere-se, sintomaticamente,<br />

ao pai de Murilo.<br />

Extensão <strong>da</strong> casa familiar, obra do homem coletivo, a ci<strong>da</strong>de mítica e fraterna<br />

oferece ao poeta a eterni<strong>da</strong>de na forma de infância, mas também a visão <strong>da</strong> tesoura de<br />

Átropos:<br />

A infância vem <strong>da</strong> eterni<strong>da</strong>de.<br />

Depois só a morte magnífica<br />

— Destruição <strong>da</strong> mor<strong>da</strong>ça:<br />

[...]<br />

Só vemos o céu pelo avesso.<br />

(PL, p. 437)<br />

Embora gênese, a ci<strong>da</strong>de prenuncia a letra do apocalipse; embora corpo-origem<br />

e lugar <strong>da</strong> paideia pessoal, também lembrança-aguilhão do exílio do “homem solto no<br />

mundo” (P, p. 99); embora ville-mémoire, um inventário de per<strong>da</strong>s. No teatro heraclitiano<br />

<strong>da</strong> <strong>memória</strong>, “o tempo é uma criança, criando, jogando o jogo de pedras; vigência <strong>da</strong><br />

criança” (Anaximandro, Parmênides & Heráclito, 1991, p. 73) que, na verbum-fania <strong>da</strong><br />

prosa, opera a convergência entre a Eterna Ci<strong>da</strong>de (porque originária e fecha<strong>da</strong> às<br />

avances <strong>da</strong> morte) e a Ci<strong>da</strong>de Eterna (conquanto città aperta ao “enorme roer” do verme),<br />

entre “as ro<strong>da</strong>s dos arcos <strong>da</strong>s meninas de Juiz de Fora ro<strong>da</strong>ndo numa praça em<br />

1910” (Cv, p. 736) e “as on<strong>da</strong>s redon<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s ro<strong>da</strong>s de Roma” (Cv, p. 716), lugar de<br />

memorar nas ruínas do passado as colunas <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de e do tempo. “Porque Roma,<br />

L ÉGUA ÉGUA & & MEIA EIA EIA: EIA : R EVISTA EVISTA DE DE LLLITERATURA<br />

L ITERATURA E D DDIVERSIDADE<br />

D IVERSIDADE C CCULTURAL<br />

C ULTURAL ULTURAL,<br />

ULTURAL , V. . 4, 4, N O ° 3 , 20 2005 20 05 —<br />

— 103 103<br />

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