nº 6 - ano 4 - Colégio de Aplicação - UFRJ
nº 6 - ano 4 - Colégio de Aplicação - UFRJ
nº 6 - ano 4 - Colégio de Aplicação - UFRJ
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<strong>nº</strong> 6 - <strong>ano</strong> 4
Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />
Reitor<br />
Aloísio Teixeira<br />
Vice-reitora<br />
Sylvia da Silveira <strong>de</strong> Mello Vargas<br />
Pró-reitor <strong>de</strong> Graduação<br />
Belkis Valdman<br />
Pró-reitoria <strong>de</strong> Pós-Graduação e Pesquisa<br />
Angela Uller<br />
Pró-reitor <strong>de</strong> Planejamento e Desenvolvimento<br />
Carlos Antonio Levi da Conceição<br />
Pró-reitor <strong>de</strong> Pessoal<br />
Luiz Afonso Henriques Mariz<br />
Pró-reitor <strong>de</strong> Extensão<br />
Laura Tavares Ribeiro Soares<br />
Centro <strong>de</strong> Filosofia e Ciências Humanas<br />
Dec<strong>ano</strong><br />
Marcelo Macedo Corrêa e Castro<br />
<strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong><br />
Diretora Geral<br />
Celina Maria <strong>de</strong> Souza Costa<br />
Vice-Diretora<br />
Miriam Abduche Kaiuca<br />
Diretores Adjuntos <strong>de</strong> Ensino<br />
Angela Alves da Fonseca<br />
Marcelo da Silva Bueno<br />
Mario Jacinto Ferraro Junior<br />
Rowilson Aparecido da Silva<br />
Diretores Adjuntos <strong>de</strong> Licenciatura, Pesquisa e Extensão<br />
Fábio Garcez <strong>de</strong> Carvalho<br />
Maria Luiza Mesquita da Rocha
JORNALISTA RESPONSÁVEL<br />
Juliana Ennes<br />
EDITORA CHEFE<br />
Teresa Coutinho Andra<strong>de</strong><br />
VICE-EDITORA<br />
Cristiana Madanêlo<br />
PRODUÇÃO GRÁFICA<br />
Juliana Montenegro<br />
Raphael Borges<br />
FOTOGRAFIA<br />
Silmar Marques<br />
REVISÃO<br />
Ana Beatriz Muniz<br />
Maria Luiza Rocha<br />
APOIO<br />
Fábio Garcez<br />
Maria Luiza Rocha<br />
Tiago Lisboa Bartholo<br />
ENTREVISTA<br />
Ana Crélia Dias<br />
FOTOLITOS E IMPRESSÃO<br />
Stamppa Gráfica e Editora<br />
TIRAGEM<br />
1.000 exemplares<br />
ILUSTRAÇÃO<br />
Cora Ribeiro<br />
Juliana Montenegro<br />
BOLSISTA DE INICIAÇÃO<br />
ARTÍSTICA E CULTURAL<br />
Juliana Montenegro<br />
CONSULTORES TÉCNICOS<br />
Armando Gens (Português)<br />
Isabel Cunha (Inglês)<br />
Rosza Vel Zoladz (Artes)<br />
3<br />
6<br />
12<br />
15<br />
18<br />
23<br />
26<br />
29<br />
30<br />
Entrevista<br />
Professora Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda<br />
Língua portuguesa<br />
Leitura no ensino fundamental<br />
Luciana Ferreira, Marise Leite, Natália Fernan<strong>de</strong>s,<br />
Raquel Fonseca, Vanessa Barbosa<br />
Artes plásticas<br />
Ensino em artes: um outro mundo é possível?<br />
Sandra Martins<br />
Sem fronteiras<br />
Uma atitute sem pressa: antídoto para a ansieda<strong>de</strong><br />
improdutiva<br />
Isabel Cristina <strong>de</strong> Moura Carvalho<br />
Construindo pontes<br />
Do you speak “français” ou parlez-vous “English”?<br />
Eliane Cardoso Tibogue, João Carlos Teixeira <strong>de</strong> Mello,<br />
Maria Aparecida Gomes Ferreira e Raquel Souza <strong>de</strong> Oliveira<br />
Como e porque ler José <strong>de</strong> Alencar<br />
Ana Crélia Dias e Antônio Carlos Secchin<br />
Memória<br />
Memórias <strong>de</strong> um colégio<br />
Teócrito Abritta<br />
Resenha<br />
A mitologia africana em sala <strong>de</strong> aula<br />
Claudio Lorenço <strong>de</strong> Oliveira<br />
Notas<br />
Aconteceu no 1° semestre <strong>de</strong> 2009
Caro Leitor<br />
Chegamos ao sexto número <strong>de</strong> PERSPECTIVA CAPIANA cuja capa homenageia alguns <strong>de</strong> nossos gran<strong>de</strong>s<br />
escritores – Aluísio <strong>de</strong> Azevedo, Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Casimiro <strong>de</strong> Abreu, Castro Alves, Cecília Meireles,<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira, Monteiro Lobato, Mario <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Mário Quintana, Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e José <strong>de</strong> Alencar.<br />
A homenagem relaciona-se à questão da sobrevivência do livro impresso em meio ao avanço tecnológico, tratada<br />
na entrevista com Heloisa Buarque <strong>de</strong> Holanda, assim como à questão da leitura, apresentada em dois artigos que<br />
tratam do tema– sua prática no ensino fundamental e a importância <strong>de</strong> se ler José <strong>de</strong> Alencar.<br />
Em seguida, o artigo <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> professores <strong>de</strong> Francês e <strong>de</strong> Inglês propõe a cooperação entre os setores <strong>de</strong><br />
tais línguas estrangeiras em nosso colégio. Trata-se <strong>de</strong> uma proposta inovadora e instigante no que diz respeito à<br />
reflexão lingüística por parte do aprendiz.<br />
Depois nos <strong>de</strong>paramos com dois textos que em comum apresentam novas maneiras <strong>de</strong> se viver. O primeiro, “O<br />
ensino <strong>de</strong> arte: um outro mundo possível” relata uma experiência vivenciada por uma educadora preocupada<br />
com o preparo <strong>de</strong> seu próprio material, tal como se fosse uma requintada, no sentido <strong>de</strong> acurada, refeição, com<br />
todas suas implicações prazerosas. O segundo, por sua, vez, “Uma atitu<strong>de</strong> sem pressa: antídoto para a ansieda<strong>de</strong><br />
improdutiva” propõe uma nova maneira <strong>de</strong> se comportar em um mundo em que a pressa impregna o cotidi<strong>ano</strong><br />
até na alimentação.<br />
Finalmente, fecha-se o número com algumas saudosas memórias do irmão <strong>de</strong> um ex-aluno capi<strong>ano</strong>, Guilhermino<br />
Abritta, e com uma resenha <strong>de</strong> um livro <strong>de</strong> histórias da mitologia africana.<br />
É com alegria, então, que já começamos a nos animar para colocar mãos às letras para o sétimo número.<br />
Teresa Coutinho Andra<strong>de</strong><br />
Editora-chefe<br />
perspectiva@cap.ufrj.br
Profª Heloísa<br />
Buarque<br />
<strong>de</strong> Hollanda<br />
Muito se tem falado sobre o futuro<br />
do livro impresso em meio ao avanço<br />
tecnológico e ao consequente aparecimento<br />
<strong>de</strong> novas mídias. Conversamos com a Profª<br />
Heloísa Buarque <strong>de</strong> Hollanda, que fez<br />
mestrado e doutorado em Literatura<br />
Brasileira na <strong>UFRJ</strong> e pós-doutorado em<br />
Sociologia da Cultura na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Columbia, Nova York. Ela é coor<strong>de</strong>nadora<br />
do Programa Avançado <strong>de</strong> Cultura<br />
Contemporânea, diretora da Aeropl<strong>ano</strong><br />
Editora e Consultoria e curadora do<br />
Portal Literal. Seu campo <strong>de</strong> pesquisa<br />
privilegia a relação entre cultura e<br />
<strong>de</strong>senvolvimento, <strong>de</strong>dicando-se às áreas<br />
<strong>de</strong> poesia, relações <strong>de</strong> gênero e étnicas,<br />
culturas marginalizadas e cultural digital.<br />
PERSPECTIVA: Livro, para Arlindo Machado, é “todo<br />
e qualquer dispositivo através do qual uma civilização<br />
grava, fixa, memoriza para si e para a posterida<strong>de</strong> o<br />
conjunto <strong>de</strong> seus conhecimentos, <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>scobertas, <strong>de</strong><br />
seus sistemas <strong>de</strong> crenças e os voos <strong>de</strong> sua imaginação”.<br />
Essa <strong>de</strong>finição transcen<strong>de</strong> a própria i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> registro<br />
escrito. O que está em crise: o paradigma sequencial<br />
e linear do livro impresso ou o livro propriamente<br />
segundo a concepção <strong>de</strong> Machado?<br />
Heloísa Buarque De Hollanda: Acho que os dois.<br />
De um lado o texto , cada vez mais, se faz na forma <strong>de</strong><br />
hiperlinks, não linear, e não sequencial. Essa tendência,<br />
você po<strong>de</strong> inclusive aferir na própria escrita dos autores<br />
mais jovens que foram criados sob a égi<strong>de</strong> da internet. É<br />
um comportamento que está estruturando a percepção<br />
e a escrita das novas gerações, e o livro começa a<br />
acompanhar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novos mo<strong>de</strong>los não<br />
lineares. De outro, o registro da memória e o registro<br />
<strong>de</strong> práticas culturais cada vez mais se dá em suportes<br />
vários, inclusive o livro, mas não apenas no papel<br />
impresso do livro. Existem ainda experiências cada vez<br />
mais frequentes <strong>de</strong> utilização <strong>de</strong> convergência <strong>de</strong> mídias,<br />
ou seja, da utilização simultânea <strong>de</strong> suportes diversos.<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
entrevista<br />
3
entrevista<br />
4<br />
Arquivo Pessoal<br />
PERSPECTIVA: A redução <strong>de</strong> custos po<strong>de</strong> levar os<br />
meios digitais e os sistemas <strong>de</strong> hipertextos a substituírem<br />
o livro impresso?<br />
Heloísa: Acho que não. O livro impresso se torna<br />
certamente obsoleto como referência, como suporte<br />
para a divulgação técnica e científica e para outros<br />
nichos da produção outrora confinada às editoras. Mas<br />
certamente o livro impresso encontrará seu novo perfil<br />
e seus novos usos no caso do crescimento <strong>de</strong>sse sistema<br />
editorial <strong>de</strong> base digital.<br />
PERSPECTIVA: A velocida<strong>de</strong> da geração <strong>de</strong><br />
informações é muito diferente do tempo do<br />
conhecimento. Essa velocida<strong>de</strong> torna obsoletas i<strong>de</strong>ias<br />
recentes, isto é, informações tecnológicas, por exemplo,<br />
têm data <strong>de</strong> valida<strong>de</strong>. Alguns especialistas afirmam que<br />
é quase impossível dar conta <strong>de</strong> editar essa produção<br />
frenética <strong>de</strong> informação sem correr o risco <strong>de</strong> retificação<br />
e perda <strong>de</strong> material impresso. Isso vai <strong>de</strong> encontro à<br />
publicação <strong>de</strong> livros “<strong>de</strong> papel”?<br />
Heloísa: Acho que sim. As publicações marcadas<br />
pela urgência <strong>de</strong> informação e divulgação encontrarão<br />
melhor canal nas mídias digitais.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
“<br />
O livro impresso se<br />
torna certamente<br />
obsoleto como<br />
referência, como<br />
suporte para a<br />
divulgação técnica<br />
e científica...<br />
Mas certamente<br />
encontrará seu novo<br />
perfil e seus novos<br />
usos no caso do<br />
crescimento <strong>de</strong>sse<br />
sistema editorial<br />
”<br />
<strong>de</strong><br />
base digital.
PERSPECTIVA: Os escritores cujas obras são<br />
divulgadas na internet (sites, blogs, etc) sofriam, a<br />
princípio, certo preconceito, por serem rotulados como<br />
aqueles que não conseguiram atrair editores. Como está<br />
essa situação?<br />
Heloísa: Acho que o preconceito é mais em torno da<br />
qualificação <strong>de</strong> “ literário” para os textos hospedados<br />
na internet. Porque, em termos <strong>de</strong> visibilida<strong>de</strong>, todos já<br />
concordam que a internet é um ambiente extraordinário<br />
para divulgar novos autores, estimular a vida literária e<br />
mesmo para ajudar o editor a encontrar novos títulos.<br />
PERSPECTIVA: Apesar da crescente publicação <strong>de</strong><br />
obras digitais, há autores que tentam restringir o acesso<br />
a suas obras por esses meios. Essa resistência tem dias<br />
contados, na sua opinião?<br />
Heloísa: Essa é uma questão comandada unicamente<br />
pelo mercado. E o mercado está dando mostras <strong>de</strong><br />
que o acesso <strong>de</strong> obras na internet vem induzindo a<br />
compra <strong>de</strong>sses textos. Paulo Coelho, por exemplo,<br />
tem disponibilizado sua obra na íntegra para download<br />
gratuito. E não se po<strong>de</strong> dizer que Paulo Coelho não sabe<br />
ven<strong>de</strong>r...<br />
PERSPECTIVA: Como fica a questão da autoria em<br />
tempos <strong>de</strong> produção digital?<br />
Heloísa: Fica irreversivelmente mais aberta a<br />
experiências <strong>de</strong> criação compartilhada e novas formas<br />
não proprietárias <strong>de</strong> criação. O que é novo e promete<br />
um longo caminho pela frente.<br />
PERSPECTIVA: A tão divulgada facilida<strong>de</strong> digital<br />
<strong>de</strong> ser compartimentada e transportada po<strong>de</strong>, como<br />
anunciam alguns especialistas, promover a leitura?<br />
Heloísa: Po<strong>de</strong> sim. Se você olhar em volta, a divulgação<br />
e o consumo da música e do cinema, por exemplo, dão<br />
provas disso. Por que não a literatura?<br />
PERSPECTIVA: Na sua opinião, o surgimento <strong>de</strong> um<br />
pequeno equipamento como o kindle redimensiona o<br />
conceito <strong>de</strong> aquisição <strong>de</strong> livros impressos? A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ter<br />
uma biblioteca pessoal po<strong>de</strong> dar lugar, no futuro, a um<br />
acervo digital?<br />
Heloísa: Depen<strong>de</strong> apenas do seu projeto <strong>de</strong> leitura.<br />
Ou a rapi<strong>de</strong>z e a agilida<strong>de</strong> do acesso aos textos e sua<br />
portabilida<strong>de</strong>, e os leitores estão cada vez mais móveis<br />
e migrantes, ou se você quer o livro como fruição e<br />
contato físico. Acho que o livro do futuro vai ter que<br />
aten<strong>de</strong>r aos dois tipos <strong>de</strong> consumo.<br />
“<br />
a internet é<br />
um ambiente<br />
extraordinário<br />
para divulgar<br />
novos autores,<br />
estimular a<br />
vida literária<br />
e mesmo para<br />
ajudar o editor a<br />
encontrar novos<br />
”<br />
títulos.<br />
PERSPECTIVA: Como fica a literatura diante <strong>de</strong><br />
todas essas mudanças?<br />
Heloísa: Fica super feliz. Ela vai ganhar mais espaço,<br />
mais visibilida<strong>de</strong>, mais leitores e mais facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
criação. Se ela não gostar disso, estará vivendo um<br />
problema sério....<br />
Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda é coor<strong>de</strong>nadora do Programa<br />
Avançado <strong>de</strong> Cultura Contemporânea, diretora da<br />
Aeropl<strong>ano</strong> Editora e Consultoria e curadora do Portal<br />
Literal. Fez Mestrado e Doutorado em Literatura Brasileira<br />
na <strong>UFRJ</strong> e pós doutorado em Sociologia da Cultura na<br />
Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Columbia, Nova York.<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
entrevista<br />
5
língua portuguesa<br />
6<br />
Leitura no ensino<br />
fundamental<br />
uma prática mediada<br />
“EU NÃO TENHO TEMPO PARA LER”<br />
A frase acima po<strong>de</strong>ria ser dita por<br />
qualquer um <strong>de</strong> nós. Afinal, a falta <strong>de</strong> tempo<br />
é uma <strong>de</strong> nossas principais reclamações<br />
ao longo <strong>de</strong> nossos turbulentos dias. Mas,<br />
como ficamos nós educadores diante <strong>de</strong><br />
tal afirmativa? Será que a velocida<strong>de</strong> dos<br />
tempos mo<strong>de</strong>rnos é incompatível com<br />
a leitura?<br />
Segundo matéria publicada no Jornal Folha <strong>de</strong> São Paulo,<br />
<strong>de</strong> 29/05/08, a pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”,<br />
revelou que 45% dos brasileiros dizem que não gostam <strong>de</strong><br />
ler. Segundo o balanço, realizado pelo Ibope (Instituto<br />
Brasileiro <strong>de</strong> Opinião Pública e Estatística), a pedido do<br />
Instituto Pró-Livro, o brasileiro lê, em média, 4,7 livros<br />
por <strong>ano</strong>, e compra ainda menos, média <strong>de</strong> 1,2 exemplar<br />
a cada 12 meses. Diante <strong>de</strong> tais dolorosas informações<br />
não basta a constatação. Saber as causas <strong>de</strong>sta situação<br />
e promover intervenções é mais do que necessário<br />
e cabem algumas reflexões. O que leva o brasileiro a<br />
não gostar <strong>de</strong> ler? Será que o avanço da tecnologia e o<br />
aparecimento <strong>de</strong> novas mídias são os vilões prováveis<br />
<strong>de</strong>sta histórias? Qual é a responsabilida<strong>de</strong> da escola e<br />
o nosso papel, enquanto professores em relação a esta<br />
situação? Será mesmo que o brasileiro não gosta <strong>de</strong> ler?<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Luciana Ferreira<br />
Marise Leite<br />
Natália Fernan<strong>de</strong>s<br />
Raquel Fonseca<br />
Vanessa Barbosa<br />
Para que Literatura?<br />
Para termos o direito ao sonho e<br />
a garantia da realida<strong>de</strong>.<br />
Olga <strong>de</strong> Sá<br />
Tão urgente quanto a superação do <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> formar<br />
leitores, talvez seja a tarefa anterior <strong>de</strong> romper,<br />
principalmente no meio escolar, com a aceitação <strong>de</strong><br />
tal constatação que parece constituir-se em um dogma<br />
que apregoa <strong>de</strong> forma permanente o dissabor e a<br />
incompatibilida<strong>de</strong> dos jovens <strong>de</strong> hoje em relação à leitura.<br />
Constatação esta que, por sua simples aceitação, muitas<br />
vezes paralisa os trabalhos, fazendo com que não reste<br />
nada mais à escola a não ser conformar-se e lamentar<br />
o trágico <strong>de</strong>sta situação. Tal como o personagem grego<br />
Sísifus em sua trágica rotina, a escola encontra-se em<br />
um círculo vicioso <strong>de</strong> não exercitar a leitura porque os<br />
alunos não gostam <strong>de</strong> ler e, por conseguinte, os alunos<br />
não gostam <strong>de</strong> ler porque não exercitam a leitura.<br />
Trágico realmente!
ilustração por Juliana Montenegro<br />
Entretanto, sendo a escola o espaço privilegiado <strong>de</strong><br />
educação, a ela cabe, com certeza, o esforço e a aceitação<br />
do <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> formar leitores .<br />
Sem dúvidas, é tempo <strong>de</strong> repensar. É tempo <strong>de</strong><br />
abandonar o que não <strong>de</strong>u certo, abandonando também<br />
i<strong>de</strong>ias viciosas; é tempo <strong>de</strong> buscar novos caminhos e<br />
novas práticas que absorvam o novo, para que ao longo<br />
do trajeto escolar nossas crianças e jovens possam<br />
perceber a fundamental importância da leitura e, se<br />
possível, enxergar os livros com os mesmos olhos <strong>de</strong><br />
Sartre para quem “Os livros foram os meus pássaros e os meus<br />
ninhos, meus animais domésticos, meus estábulos, meu campo.<br />
A biblioteca era o mundo fixado num espelho, tinha o tamanho<br />
infinito <strong>de</strong>le, sua varieda<strong>de</strong>, sua imprevisibilida<strong>de</strong>”.<br />
De todos os <strong>de</strong>safios a superar, o <strong>de</strong> ultrapassar práticas<br />
docentes <strong>de</strong>sgastadas parece ser um dos maiores.<br />
A mediação da leitura, uma prática a ser<br />
exercitada<br />
Aqui, novamente é um personagem clássico que nos<br />
sugere o caminho a ser seguido. Como observa o<br />
professor Marcos Bagno, tal como Ariadne que oferece<br />
a Teseu um novelo <strong>de</strong> lã para que ele não se perca<br />
no labirinto do monstruoso Minotauro, o papel do<br />
professor é o <strong>de</strong> mediador, é o <strong>de</strong> “ensinar a apren<strong>de</strong>r,<br />
e não apenas mostrar os caminhos”, mas também<br />
orientar o aluno para que <strong>de</strong>senvolva um olhar crítico<br />
que lhe permita reconhecer, em meio ao labirinto, as<br />
trilhas que conduzem à compreensão .<br />
Portanto, ser mediador <strong>de</strong> leitura é oferecer mais do<br />
que um caminho seguro e confortável. Este caminho<br />
tem um atalho que passa pela leitura compartilhada, na<br />
qual o professor como leitor-guia promove o uso e o<br />
exercício <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> leitura como as previsões, as<br />
antecipações, as inferências, a observação <strong>de</strong> pistas num<br />
diálogo permanente com o texto, mostrando ao aluno,<br />
leitor em formação, que ler é mais do que <strong>de</strong>codificar<br />
ou ir do início ao fim do texto <strong>de</strong> forma passiva<br />
esperando que este se autorrevele como se fosse algo a<br />
ser consumido em largos goles.<br />
Nessa tarefa <strong>de</strong> mediação da leitura, é <strong>de</strong> suma importância<br />
que a interlocução com o texto, promovido e mediado<br />
pelo professor, conduza a uma leitura comentada do<br />
texto. A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mediação prossegue com o professor<br />
levantando questões, problematizando as situações<br />
temáticas ou discursivas apresentadas pelo texto,<br />
estimulando as várias leituras, os múltiplossentidos,<br />
o <strong>de</strong>bate, a reflexão, lançando luzes sobre as pistas<br />
que a todo momento transpassam o texto, <strong>de</strong>safiando<br />
o leitor a percebê-los e a <strong>de</strong>cifrá-los, antecipando<br />
situações futuras que levam o leitor a querer confirmar<br />
as hipóteses apresentadas no processo <strong>de</strong> leitura em um<br />
jogo <strong>de</strong> “<strong>de</strong>cifra-me ou te <strong>de</strong>voro”.<br />
Importante lembrar que esta construção não se dá<br />
instantaneamente, mas <strong>de</strong>manda longo tempo e<br />
persistência através <strong>de</strong> um trabalho permanente, que<br />
tem no prazer da <strong>de</strong>scoberta e na superação <strong>de</strong> <strong>de</strong>safios<br />
que os próprios textos oferecem a chave da compreensão<br />
e do sucesso como leitor.<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
língua portuguesa<br />
7
língua portuguesa<br />
8<br />
O que você está lendo?<br />
Para que o professor possa realizar essa mediação <strong>de</strong><br />
leitura, <strong>de</strong> certo modo, <strong>de</strong>ve ter um conhecimento dos<br />
caminhos que seus alunos vêm trilhando como leitores.<br />
Em uma pesquisa feita com os alunos do Ensino<br />
Fundamental do <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong> da <strong>UFRJ</strong>, po<strong>de</strong>se<br />
perceber bem quem é o público leitor com o qual os<br />
docentes vêm trabalhando. Em muitas das colocações<br />
dos estudantes, percebemos uma curiosa relação.<br />
Quando os alunos afirmam que não gostam <strong>de</strong> ler<br />
associam esse “ler” a textos tidos como “chatos”, “com<br />
vocabulário difícil”, “com histórias longe da atualida<strong>de</strong>”. Para os<br />
alunos, um livro chato é aquele em que eles não veem<br />
nenhuma aplicabilida<strong>de</strong> imediata em suas vidas. Nessa<br />
mesma enquete lançamos a vários alunos a seguinte<br />
questão: O que você está lendo agora? As respostas vêm<br />
transcritas nos quadros que se seguem:<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Não estão lendo nenhum<br />
livro<br />
Estão lendo algum livro<br />
Gênero textual Porcentagem Livros e periódicos mais citados<br />
Revistas em quadrinhos 11,20% . Mangás (Naruto, Hunter X Hunter), gibis<br />
da Turma da Mônica.<br />
Revistas <strong>de</strong> adolescentes<br />
Jornais<br />
Ficção<br />
contemporânea<br />
brasileira<br />
Ficção<br />
contemporânea<br />
estrangeira<br />
Literatura clássica<br />
1%<br />
2,4%<br />
20%<br />
55,2%<br />
7,2%<br />
. Revista Capricho, Revista Atrevida.<br />
. Lance, Meia Hora<br />
. Fala sério, mãe, <strong>de</strong> Talita Rebouças<br />
. Fala sério, pai, <strong>de</strong> Talita Rebouças<br />
. Tudo por um feriado, <strong>de</strong> Talita Rebouças<br />
. Querido diário otário, <strong>de</strong> Jim Benton<br />
. O diário da princesa, <strong>de</strong> Meg Cabot<br />
. Goosebumps, <strong>de</strong> R. L. Stine<br />
. Só Zoando, <strong>de</strong> Andy Griffiths<br />
. Desventuras em série, <strong>de</strong> Lemony Snicket<br />
. Formaturas infernais, <strong>de</strong> Meg Cabot,<br />
Stephenie Meyer, Michele Jaffe,<br />
Kim Harrison e Lauren Myracie<br />
. série Harry Potter, <strong>de</strong> J. K. Rowling<br />
. série Crepúsculo (Twilight), <strong>de</strong> Stephenie<br />
Meyer<br />
. O diário <strong>de</strong> Bridget Jones, <strong>de</strong> Helen Fielding<br />
. Gossip Girl, <strong>de</strong> Cecily von Ziegesar<br />
. Marley e eu, <strong>de</strong> Jahn Grogan<br />
. Dom Carmurro, <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
Porcentagem<br />
22,40%<br />
77,60%
Essas respostas nos fornecem exatamente a visão da<br />
relação que os alunos mantêm com a leitura. Um dado<br />
importante é o <strong>de</strong> que entre os livros mais lidos estão<br />
obras que se encaixam na nova tendência editorial <strong>de</strong><br />
produzir histórias em série (como as séries Crepúsculo,<br />
Harry Potter e as histórias criadas pela brasileira Thalita<br />
Rebouças). Dessa constatação po<strong>de</strong>mos tirar algumas<br />
reflexões: essas leituras <strong>de</strong> séries como as <strong>de</strong> Stephenie<br />
Meyer cerceiam a busca <strong>de</strong> outros gêneros da literatura?<br />
Os livros da escritora carioca Thalita Rebouças não são,<br />
na verda<strong>de</strong>, uma reduplicação do universo <strong>de</strong> nossos<br />
alunos? Qual o <strong>de</strong>safio para esses leitores que essas<br />
obras propõem? Há <strong>de</strong> fato um <strong>de</strong>safio nessas leituras?<br />
Nesse momento, a presença <strong>de</strong> um professor como<br />
mediador <strong>de</strong> leitura é necessária. A orientação ao aluno<br />
para que ele analise sua “estrada <strong>de</strong> leitura” é um bom<br />
caminho. Mostrar aos alunos a importância <strong>de</strong> se refletir<br />
sobre o que eles estão lendo e a varieda<strong>de</strong> ou não <strong>de</strong><br />
gêneros é <strong>de</strong> fundamental importância para a construção<br />
da criticida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses leitores.<br />
Trabalhar com os clássicos no ensino<br />
fundamental é possível?<br />
Mais do que possível, é necessário!<br />
Na enquete anterior, poucas obras clássicas foram<br />
citadas em nossa pesquisa. É indiscutível a importância<br />
da leitura dos clássicos na formação dos jovens, não<br />
apenas por abordarem temas universais que exploram<br />
as várias vertentes humanas, mas também por permitir<br />
o contato dos alunos, leitores em formação, com<br />
linguagens e estruturas discursivas mais elaboradas,<br />
que extrapolam a linguagem do cotidi<strong>ano</strong>, abrindo<br />
um mundo <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s linguísticas, temáticas<br />
e culturais. No dizer <strong>de</strong> Ítalo Calvino, “Os clássicos são<br />
aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas<br />
das leituras que prece<strong>de</strong>ram a nossa e atrás <strong>de</strong> si os traços que<br />
<strong>de</strong>ixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais<br />
simplesmente na linguagem ou nos costumes.)”<br />
Entretanto, por suas próprias características, os clássicos<br />
não primam pela obvieda<strong>de</strong>, não nos dizem tudo <strong>de</strong><br />
pronto, necessitando <strong>de</strong> um leitor experiente para<br />
interlocutar com o texto, assumindo-se como co-autor ,<br />
abrindo as várias possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> leituras e <strong>de</strong> sentidos<br />
que o texto oferece. Para tal, é necessário o exercício<br />
permanente da leitura que pela sua constância vá do<br />
estranhamento inicial promovido pelo distanciamento<br />
da linguagem do cotidi<strong>ano</strong> ao prazer das <strong>de</strong>scobertas.<br />
O papel da escola e do professor como promotores <strong>de</strong><br />
leituras é, portanto, maior do que o <strong>de</strong> avaliar as leituras<br />
indicadas eventualmente através <strong>de</strong> provas e testes; é o<br />
<strong>de</strong> construir este leitor que extrapola a <strong>de</strong>codificação e<br />
enten<strong>de</strong> o ato <strong>de</strong> ler como um exercício <strong>de</strong>safiador <strong>de</strong><br />
construção <strong>de</strong> sentidos .<br />
Uma proposta para trabalhar com<br />
Machado <strong>de</strong> Assis<br />
Sendo consi<strong>de</strong>rado um dos mais importantes autores<br />
da literatura universal, Machado <strong>de</strong> Assis geralmente<br />
é indicado para a leitura no Ensino Médio quando a<br />
carga <strong>de</strong> trabalho escolar é bastante ampliada. Neste<br />
cenário, o primeiro contato com este autor, na maioria<br />
das vezes, longe <strong>de</strong> ser o início <strong>de</strong> uma longa e agradável<br />
convivência, promove um divórcio <strong>de</strong>finitivo. Antes <strong>de</strong><br />
indicar a leitura <strong>de</strong>ste e <strong>de</strong> outros autores clássicos, é<br />
necessário que ao longo dos <strong>ano</strong>s escolares formemos<br />
leitores que sejam capazes <strong>de</strong> ler e <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r tais<br />
obras. Mas como é possível oferecer Machado <strong>de</strong> Assis,<br />
por exemplo para o 6º <strong>ano</strong>? Terão condições <strong>de</strong> lê-lo,<br />
saberão interlocutar com seus textos? E a linguagem,<br />
não é muito distante da usada por alunos nesta faixa<br />
etária? Sem dúvidas os questionamentos proce<strong>de</strong>m, mas<br />
há caminhos nem tão dolorosos!<br />
“<br />
é necessário<br />
o exercício<br />
permanente da<br />
leitura que pela<br />
sua constância vá<br />
do estranhamento<br />
inicial promovido<br />
pelo distanciamento<br />
da linguagem do<br />
cotidi<strong>ano</strong> ao prazer<br />
das <strong>de</strong>scobertas.<br />
”<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
língua portuguesa<br />
9
língua portuguesa<br />
10<br />
Desmistificando Machado...<br />
Ir construindo leitores para Machado <strong>de</strong> Assis a partir<br />
do 6º <strong>ano</strong>, <strong>de</strong>svendando aos poucos aspectos da obra do<br />
autor, po<strong>de</strong> ser uma sugestão <strong>de</strong> trabalho no caminho <strong>de</strong><br />
formação <strong>de</strong> leitores para este autor. Nesta proposta, os<br />
textos a serem trabalhados nos diversos <strong>ano</strong>s escolares<br />
no Ensino Fundamental são escolhidos e lidos <strong>de</strong> forma<br />
compartilhada em sala <strong>de</strong> aula, permitindo pela mediação<br />
do professor e contribuições dos colegas a superação<br />
das possíveis dificulda<strong>de</strong>s que o texto possa oferecer<br />
em relação à linguagem, ao vocabulário, à temática, às<br />
referências intertextuais, aos valores e comportamento<br />
dos personagens entre outras. A proposta sugere:<br />
Ano<br />
escolar<br />
Textos<br />
sugeridos<br />
ReCAptulando algumas i<strong>de</strong>ias...<br />
O texto literário clássico é visto por muitos alunos<br />
com repulsa. No processo <strong>de</strong> aproveitamento dos<br />
textos <strong>de</strong> literatura para fins didáticos, algumas práticas<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
“<br />
”<br />
Aspectos a serem abordados Trabalhos sugeridos<br />
6º Conto <strong>de</strong> escola . A época <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
. Produção textual (Exemplo: contos<br />
sobre a escola);<br />
Um apólogo<br />
. Roda <strong>de</strong> leitura com o conto “Um apólogo”;<br />
. Trabalho com vocabulário através <strong>de</strong> jogos<br />
didáticos;<br />
. Debates sobre “mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> escolas”.<br />
7º<br />
8º<br />
9º<br />
Noite <strong>de</strong> almirante<br />
A cartomante<br />
Uns abraços<br />
A causa secreta<br />
O enfermeiro<br />
O alienista<br />
. O Rio <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
. Os valores na época <strong>de</strong><br />
Machados <strong>de</strong> Assis<br />
. Os personagens <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
são escolhidos e lidos <strong>de</strong><br />
forma compartilhada em<br />
sala <strong>de</strong> aula, permitindo<br />
pela mediação do<br />
professor e contribuições<br />
dos colegas a superação<br />
das possíveis dificulda<strong>de</strong>s<br />
que o texto possa oferecer<br />
. Trabalho iconográfico: comparação entre<br />
o Rio <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
com o atual;<br />
. Produção textual: contos sobre o bairro<br />
on<strong>de</strong> os alunos vivem.<br />
. Juri simulado sobre o conto “Uns abraços”;<br />
. Debate sobre o conto “A cartomante”.<br />
. Dramatização dos contos.<br />
ina<strong>de</strong>quadas <strong>de</strong> trabalho fazem com que o aluno<br />
relacione estas leituras a tarefas maçantes e esvaziadas<br />
<strong>de</strong> sentido. Por isso, é essencial que o professor não<br />
se esqueça que a leitura <strong>de</strong> textos literários precisa se<br />
relacionar ao prazer, pois é o prazer da leitura que
vai abrir as portas do fantástico mundo imaginário e<br />
permitir o rompimento das barreiras que separam o<br />
mundo real daquelas muitas outras realida<strong>de</strong>s possíveis<br />
criadas pela imaginação.<br />
É fundamental, portanto, que o trabalho com o texto<br />
literário privilegie o contato direto do aluno com a obra,<br />
fazendo com que ele se relacione com a escrita literária<br />
e ganhe familiarida<strong>de</strong> com o po<strong>de</strong>r “mágico” do texto<br />
poético, sempre em um processo livre <strong>de</strong> imposições e<br />
cobranças relacionadas a avaliações.<br />
Indicações bibliográficas:<br />
BAMBERGER, Richard. Como incentivar o hábito<br />
da leitura. 6ª ed. São Paulo: Editora Ática, 1995.<br />
BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos <strong>de</strong><br />
fadas. Tradução <strong>de</strong> Arlene<br />
Caet<strong>ano</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Paz e Terra, 1980.<br />
CALVINO, Ítalo. Por que ler os clássicos.<br />
São Paulo: Schwarcz Ltda., 2005.<br />
MACHADO, Ana Maria. Contracorrente –<br />
conversas sobre leitura e política.São Paulo:<br />
ABDR, 1999.<br />
Para isso, como mediador <strong>de</strong> leitura, o professor tem<br />
o importante papel <strong>de</strong> orientar os alunos a perceberem<br />
que eles também são produtores <strong>de</strong> um discurso. Desse<br />
modo, leitor e obra se completam, já que a “Leitura<br />
ultrapassa a última página <strong>de</strong> um livro” (PONDE e YUNES,<br />
1988). Daí a importância <strong>de</strong> o professor exercitar a<br />
leitura compartilhada. Afinal, é na vivência do texto<br />
literário que a literatura ganha vida.<br />
Dramatização dos alunos da turma 18-A a partir <strong>de</strong> contos do livro “Sete ossos e uma maldição”.<br />
____________________ Como e por que ler os<br />
clássicos universais <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo. Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />
Objetiva, 2002.<br />
PONDÉ, Glória e YUNES, Eliana. Leitura e<br />
literatura infantil. São Paulo: FTD, 1988.<br />
SANTOS, Joel Rufino dos. Quem ama literatura<br />
não estuda literatura: ensaios indisciplinados.<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro: Rocco, 2008.<br />
SARTRE, J.P. Que é a literatura? Tradução <strong>de</strong><br />
Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Ática, 2004.<br />
SÁ, Olga <strong>de</strong>. Introdução a Contos <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>zinha<br />
<strong>de</strong> Ruth Guimarães. Centro Cultural Teresa D’<br />
Ávila, 1996.<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
língua portuguesa<br />
11
artes plásticas<br />
12<br />
O ensino em Arte:<br />
um outro mundo<br />
é possível?<br />
Outro dia acor<strong>de</strong>i assustada no meio da noite,<br />
preocupada com o que faremos com todo o lixo que<br />
acumulamos à nossa volta. Diria que, se fosse há algum<br />
tempo atrás, provavelmente atribuiria tal preocupação<br />
a um <strong>de</strong>sses típicos ataques <strong>de</strong> TPM que costumam<br />
atemorizar as mulheres quando se encontram nessa fase<br />
em que quase tudo é motivo para <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar medos,<br />
tensões, preocupações e mau humor. Após refletir<br />
melhor, percebi que provavelmente a culpa era da minha<br />
recente menopausa. Portanto tentei me convencer <strong>de</strong><br />
que eram só peripécias dos benditos hormônios que<br />
<strong>de</strong> vez em quando costumam atazanar as mulheres.<br />
Qual nada... Acho que a preocupação era e é real. E<br />
a pergunta que me faço é: o que faremos quando não<br />
<strong>de</strong>r mais para fingir que não vemos o lixo que vem se<br />
acumulando, principalmente nas últimas décadas, para<br />
as novas gerações? Diremos apenas, como na gíria, ih,<br />
foi mal?<br />
Recentemente, foi noticiado em todos os meios <strong>de</strong><br />
comunicação, que encontraram o tal lixo <strong>de</strong>baixo do<br />
tapete:<br />
Foi durante uma alegre competição <strong>de</strong> barco a vela<br />
que o oceanógrafo americ<strong>ano</strong> Charles Moore se <strong>de</strong>parou com algo<br />
trágico: um gigantesco <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> lixo em pleno mar. “Fiquei<br />
impressionado, <strong>de</strong> repente estava no meio daquilo. Para on<strong>de</strong> eu<br />
olhava, via lixo”, diz ele. A 500 milhas náuticas (cerca <strong>de</strong> 920<br />
quilômetros) da costa da Califórnia, no oeste dos EUA, esse<br />
<strong>de</strong>pósito estava e ainda está lá. A primeira e mais importante<br />
questão é saber como essa mancha se formou e cresceu. A primeira<br />
e mais importante resposta, impressionante e assustadora, é que<br />
a gran<strong>de</strong> sujeira que muitas vezes se tenta escon<strong>de</strong>r <strong>de</strong>baixo do<br />
imenso tapete <strong>de</strong> mar é fruto da falta <strong>de</strong> consciência ambiental - um<br />
dia ela aparece e bóia, um dia a atitu<strong>de</strong> predatória vem à tona,<br />
ainda que seja em meio a uma tranquila regata.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Sandra Martins<br />
Ilustração por Cora Ribeiro<br />
Nesse preciso momento, mesmo que queiramos, não dá<br />
mais para tentar escon<strong>de</strong>r.<br />
Então a questão que se coloca é o quanto estamos<br />
imbricados no modo <strong>de</strong> vida e produção atual a ponto<br />
<strong>de</strong> não sermos capazes <strong>de</strong> alertar as novas gerações, <strong>de</strong><br />
modo contun<strong>de</strong>nte, que esse mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> tem<br />
nos levado à beira <strong>de</strong> um precipício.
“<br />
estamos imbricados no<br />
modo <strong>de</strong> vida e produção<br />
atual a ponto <strong>de</strong> não<br />
sermos capazes <strong>de</strong> alertar<br />
as novas gerações, que<br />
esse mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong><br />
tem nos levado à<br />
”<br />
beira <strong>de</strong><br />
um precipício.<br />
Há pouco tempo tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrar<br />
em contato com o trabalho <strong>de</strong> Zygmund Bauman,<br />
um sociólogo que tenta enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> que maneira a<br />
socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna vem lidando com os problemas que<br />
estão colocados em nosso cotidi<strong>ano</strong>. Ele <strong>de</strong>senvolve<br />
uma interessante e instigante teoria em que analisa a<br />
passagem <strong>de</strong> uma remota mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> a qual <strong>de</strong>fine<br />
como “pesada” e “sólida” para uma mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong><br />
mais recente que qualifica como “leve” e “líquida”, em<br />
<strong>de</strong>senfreado dinamismo. Já no prefácio <strong>de</strong> seu livro<br />
somos brindados com uma epígrafe <strong>de</strong> Paul Valéry,<br />
poeta francês do século XIX, que nos <strong>de</strong>ixa entrever<br />
o caminho pelo qual Bauman irá <strong>de</strong>senvolver seus<br />
argumentos.<br />
Interrupção, incoerência, surpresa são as condições<br />
comuns <strong>de</strong> nossa vida. Elas se tornaram mesmo necessida<strong>de</strong>s reais<br />
para muitas pessoas cujas mentes <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> ser alimentadas...<br />
por outra coisa que não mudanças repentinas e estímulos<br />
constantemente renovados ... Não po<strong>de</strong>mos mais tolerar o que<br />
dura. Não sabemos mais fazer com que o tédio dê frutos.<br />
Assim toda a questão se reduz à mente humana<br />
dominar o que a mente humana criou?<br />
Ao analisar o modo pelo qual o indivíduo em sua versão<br />
contemporânea se instaura, Bauman irá recorrer à<br />
história <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>senlace que ocorrerá com as relações<br />
sólidas, permanentes, compromissadas, na socieda<strong>de</strong><br />
do início da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, e a passagem para o estágio<br />
líquido, <strong>de</strong> flui<strong>de</strong>z, do <strong>de</strong>scompromisso e do <strong>de</strong>scartável<br />
nas atuais relações vigentes entre as pessoas e <strong>de</strong>stas<br />
com seu ambiente. Insistentemente ele chamará a<br />
atenção para a mudança do paradigma relacionado a<br />
espaço-tempo numa socieda<strong>de</strong> interligada em re<strong>de</strong>.<br />
Imbuída <strong>de</strong> tais reflexões, remeto-me logo para o<br />
meu ofício: professora <strong>de</strong> Artes Visuais do Ensino<br />
Fundamental e Médio, chegando ao fim <strong>de</strong>ssa etapa<br />
produtiva. Em que contribuí para atenuar um pouco<br />
esse <strong>de</strong>spencar la<strong>de</strong>ira abaixo <strong>de</strong> tudo que é sólido e<br />
parece que ten<strong>de</strong> a se <strong>de</strong>smanchar embaixo do tapete da<br />
calmaria do Oce<strong>ano</strong> Pacífico?<br />
Ao longo <strong>de</strong> quase 30 <strong>ano</strong>s <strong>de</strong> carreira, vi e tentei fazer<br />
coisas que me pareceram, <strong>de</strong> algum modo, propor outro<br />
campo possível nos afetos, no contato com a natureza e<br />
<strong>de</strong>ssa com a arte, para mim mãe <strong>de</strong> todos os princípios,<br />
sejam eles éticos, estéticos ou teleológicos.<br />
Resolvi então recuperar uma experiência observada por<br />
mim e que aguçou minha imaginação; uma experiência<br />
<strong>de</strong> uma professora do Cap que, a meu ver, reúne um<br />
pouco <strong>de</strong>ssas condições para as quais a Arte e os<br />
educadores em Arte, <strong>de</strong>vem estar voltados.<br />
Os artistas, todos eles, ao longo do percurso <strong>de</strong> tempo<br />
no qual estão inseridos - o tempo <strong>de</strong> sua história - se<br />
manifestam <strong>de</strong>ntro da tensão existente entre a realida<strong>de</strong><br />
e o imaginário (pessoal e coletivo), realizando em sua<br />
arte a síntese possível entre esses dois pólos. Esse é um<br />
tempo antropológico, antropo-estético e antropo-ético,<br />
consolidado e permeado pela natureza em todas as suas<br />
possíveis dimensões.<br />
Tendo a achar que só nos conectamos com a essência<br />
mesma da Arte quando penetramos nos ritos, nos cultos<br />
e na sacralida<strong>de</strong> das coisas como aparições do mundo<br />
no qual vivemos. As imagens na TV são ritualizações<br />
diárias <strong>de</strong> frascos <strong>de</strong> shampoos, sabões, bebidas<br />
refrescantes e efervescentes. Como vivermos sem<br />
nos curvarmos aos templos do consumo, ao culto das<br />
imagens reificadas? Dessa maneira, é possível que a mais<br />
banal das ações cotidianas possa <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar um universo<br />
<strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s estético-cognitivas e afetivas, recebendo<br />
ressignificações na própria esteira do consumo.<br />
O relato a seguir parte da experiência vivenciada por uma<br />
Educadora em Arte, em uma turma <strong>de</strong> primeira série do<br />
Ensino Fundamental, que vem trilhando esse caminho<br />
há algum tempo. Uma <strong>de</strong> suas maiores preocupações é<br />
fazer com que os alunos vivenciem os espaços próprios<br />
da Arte, gerando possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> questionamentos<br />
da obra nos espaços a elas consagrados: os museus, os<br />
centros culturais, as galerias. Porém existe uma outra<br />
coisa que a fascina. Como artista plástica, ela produz seus<br />
próprios pigmentos, selecionando as melhores rochas e<br />
minérios do terreno, observando as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
gamas <strong>de</strong> cores ali obtidas, seu brilho, sua transparência,<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
artes plásticas<br />
13
artes plásticas<br />
14<br />
sua opacida<strong>de</strong>. Depois, cuidadosamente ela os tritura,<br />
moe, peneira. À semelhança dos procedimentos típicos<br />
do ato <strong>de</strong> cozinhar. Pois justamente ali, na cozinha,<br />
também estão os seus <strong>de</strong>vaneios.<br />
Como passar impunemente pelo aguçamento dos<br />
sentidos que representa uma cozinha: paladares, cheiros,<br />
formas e cores, texturas, chiados e repiques? Pois vai daí<br />
que ela resolve perguntar aos pequeninos em sala, como<br />
acontece a refeição em suas casas. Deveriam observar,<br />
conversar com as pessoas envolvidas na situação e<br />
trazer, posteriormente, os seus relatórios. Conclusão da<br />
tarefa: muitos se alimentavam <strong>de</strong> comidas do tipo “fast<br />
food” e, invariavelmente, comiam sozinhos em frente à<br />
televisão.<br />
Pois, com a mesma base <strong>de</strong> comida empregada nas<br />
refeições aligeiradas dos alunos, ela promove, na<br />
pequena cozinha improvisada da escola, um pitéu<br />
com cheiros e gostos dos mais variados temperos.<br />
Em sala, sobre uma linda mesa enfeitada com papéis<br />
coloridos pelos próprios alunos, é servido e <strong>de</strong>gustado<br />
coletivamente aquele lauto “banquete”. Os pequenos se<br />
regalam e lambem os beiços. Cumpre-se a oferenda do<br />
alimento. Os <strong>de</strong>uses po<strong>de</strong>m se aquietar.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Cabe dizer ainda, que esse momento sagrado <strong>de</strong>sdobrouse<br />
em ativida<strong>de</strong>s e conversas que envolveram um longo<br />
processo criativo discutido e compartilhado por todos.<br />
Esta singela experiência transcorreu em uma turma<br />
da professora <strong>de</strong> Arte e artista Plástica Anita Fiszon e<br />
<strong>de</strong>monstra, no meu enten<strong>de</strong>r, como tudo po<strong>de</strong> ter um<br />
novo olhar, um sopro criativo, que se faz presente <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
os bisontes nas cavernas <strong>de</strong> Lascaux, passando pelo Le<br />
Déjeuner sur l’Herbe <strong>de</strong> Edouard Manet até o banquete com<br />
as crianças sobre as mesas “peripatéticas” (conforme<br />
nossas necessida<strong>de</strong>, elas se <strong>de</strong>slocam pela sala <strong>de</strong> aula)<br />
das salas <strong>de</strong> artes do <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong>.<br />
Indicações bibliográficas:<br />
www.terra.com.br/istoe/edições/artigo71923-1.htm<br />
BAUMAN, Zyngmunt. Mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> Líquida. Trad.<br />
Plínio Dentzien. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Zahar, 2001. p.7
Uma atitu<strong>de</strong><br />
sem<br />
pressa:<br />
antídoto<br />
para a ansieda<strong>de</strong><br />
improdutiva Isabel Cristina <strong>de</strong> Moura Carvalho<br />
Slow food é um movimento social que<br />
se inicia na Itália em 1986, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Bra na região <strong>de</strong> Piemonte, tendo como<br />
símbolo o caracol. O evento fundador<br />
foi a mobilização em reposta à abertura<br />
<strong>de</strong> um Mc Donald’s na Piazza Di Spagna,<br />
em Roma. Neste momento o manifesto<br />
<strong>de</strong> lançamento do movimento <strong>de</strong>clarava<br />
que um firme empenho na <strong>de</strong>fesa da<br />
tranquilida<strong>de</strong> é a única forma <strong>de</strong> se opor<br />
à loucura universal da Fast Life.<br />
Você já ouviu falar <strong>de</strong> um movimento social voltado<br />
para a <strong>de</strong>saceleração do estilo <strong>de</strong> vida baseado na<br />
comida rápida, a chamada “fast food” (aquela das re<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> lanches rápidos, comida industrializada, pré-pronta<br />
entre outras)? Este movimento chama-se Slow Food e<br />
tem ganho maior visibilida<strong>de</strong> nos últimos <strong>ano</strong>s entre<br />
os chamados movimentos sociais que lutam por um<br />
outro mundo possível, e se articulam globalmente em<br />
iniciativas como os Fóruns Sociais Mundiais, evento<br />
mundial que começou muito perto <strong>de</strong> nós, em Porto<br />
Alegre nos <strong>ano</strong>s 2000.<br />
Pois bem, <strong>de</strong>ntro da esfera do movimento Slow uma<br />
expressão particular, a Slow Atittu<strong>de</strong> ou uma atitu<strong>de</strong> sem<br />
pressa, começou a chamar minha atenção, <strong>de</strong>stacandose<br />
das centenas <strong>de</strong> informações, frases e imagens que<br />
circulam na internet. E aqui <strong>de</strong>vo reconhecer que, do<br />
ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> uma ecologia mental, a internet, ao lado<br />
<strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>r difusor <strong>de</strong> uma infinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> senso comum,<br />
também tem sido um espaço <strong>de</strong> articulação e difusão<br />
<strong>de</strong> novas idéias, re<strong>de</strong>s e movimentos contribuindo para<br />
uma “globalização virtuosa”. Evi<strong>de</strong>ntemente, para o<br />
cidadão da socieda<strong>de</strong> da informação, um tipo <strong>de</strong> catador<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
sem fronteiras<br />
15
sem fronteiras<br />
16<br />
digital, o difícil e dispendioso em tempo e músculos (em<br />
geral atrofiados) é filtrar esses fluxos, separar, reciclar,<br />
<strong>de</strong>scartar e selecionar o que vale a pena. Foi assim a<br />
minha garimpagem da expressão slow atittu<strong>de</strong>. Depois<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>scartada algumas vezes, a sedutora expressão<br />
reaparecia aqui e ali, e terminei por seguir suas pistas.<br />
O estilo slow <strong>de</strong> ser movimento<br />
Pu<strong>de</strong> verificar, então, que as referências à expressão slow<br />
atittu<strong>de</strong> ou atitu<strong>de</strong> sem pressa integravam o i<strong>de</strong>ário do<br />
Slow Food, movimento que tem se firmado como parte <strong>de</strong><br />
um movimento ambiental altermundista (<strong>de</strong>nominação<br />
conferida aos novos movimentos mundiais por um<br />
‘outro mundo possivel’). O ponto <strong>de</strong> partida do slow é<br />
a valorização do alimento como cultura e a <strong>de</strong>fesa dos<br />
saberes, modos <strong>de</strong> vida, formas <strong>de</strong> produzir e estilos <strong>de</strong><br />
consumir relacionados a uma comida saudável, limpa<br />
e justa. o movimento slow conjuga alimentação e gosto,<br />
mudança social e bem viver. A afirmação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />
alimentares contra a padronização ganha materialida<strong>de</strong><br />
nas chamadas “comunida<strong>de</strong>s do alimento”. Trata-se <strong>de</strong><br />
promover re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> agricultores, criadores, pescadores<br />
e produtores artesanais ao redor do mundo em torno<br />
<strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ias produtivas alimentares boas, justas e limpas.<br />
Cartaz do evento Slow Food Nation <strong>de</strong> 2008, em São Francisco, EUA<br />
Slow attitu<strong>de</strong> ou “atitu<strong>de</strong> sem pressa” é parte <strong>de</strong>sse estilo<br />
<strong>de</strong> viver, produzir e consumir que valoriza a bio e a<br />
sócio diversida<strong>de</strong>, bem como um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> bem viver<br />
que consi<strong>de</strong>ra o direito ao tempo e aos prazeres <strong>de</strong><br />
uma vida simples, recusando a i<strong>de</strong>ologia que associa<br />
aceleração, eficiência e consumo ilimitado como i<strong>de</strong>al<br />
<strong>de</strong> uma vida bem sucedida. Ao <strong>de</strong>nunciar os dispositivos<br />
<strong>de</strong> sequestro do tempo e do empobrecimento da<br />
experiência humana, o movimento Slow critica um<br />
dos motores da socieda<strong>de</strong> da produção e consumo<br />
acelerados que eu chamaria <strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong> improdutiva. Uma<br />
espécie <strong>de</strong> combustível <strong>de</strong>ssa socieda<strong>de</strong>, esse sintoma<br />
psicossocial é a contrapartida psíquica da urgência e do<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
“<br />
o movimento Slow<br />
critica um dos motores<br />
da socieda<strong>de</strong> da<br />
produção e consumo<br />
acelerados que eu<br />
chamaria <strong>de</strong> ansieda<strong>de</strong><br />
”<br />
improdutiva.<br />
clima persecutório que nos envolvem, produzindo uma<br />
patologia social que tem feito das fobias e <strong>de</strong>pressões<br />
um traço quase epidêmico dos tempos que vivemos.<br />
No contraponto, o movimento Slow <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> ambientes<br />
<strong>de</strong> trabalho e <strong>de</strong> convivência menos coercitivos e,<br />
portanto, mais produtivos e criativos, bem como uma<br />
atitu<strong>de</strong> reflexiva e serena face às nossas<br />
expectativas <strong>de</strong> aquisição e consumo.
Uma educação para uma vida sem<br />
pressa é possível?<br />
Por tudo isso, penso que esse movimento e seus<br />
<strong>de</strong>sdobramentos merecem nossa atenção enquanto<br />
educadores, na medida em que po<strong>de</strong>m ser tomados como<br />
uma experiência social e pedagógica com potencial para<br />
contribuir na formação <strong>de</strong> uma orientação saudável,<br />
não apenas na alimentação, mas também nas relações<br />
<strong>de</strong> trabalho, <strong>de</strong> convivência e nos nossos pl<strong>ano</strong>s e<br />
expectativas <strong>de</strong> uma vida boa. O Slow nos alerta para<br />
todo um estilo <strong>de</strong> vida sereno e criativo que valoriza o<br />
convívio hum<strong>ano</strong> e resiste ao imperativo do “do it now”.<br />
Em português, o equivalente seria “faça isso agora”, ou<br />
ainda pior: “faça isso para ontem!”. Assim, partindo da<br />
premissa <strong>de</strong> que a educação tem algo a apren<strong>de</strong>r com este<br />
movimento, não seria interessante o exercício <strong>de</strong> pensar<br />
uma “educação sem pressa”, ou ainda, uma “educação<br />
para uma vida sem pressa”?<br />
Ilustração por Juliana Montenegro<br />
O que a escola po<strong>de</strong> fazer para<br />
incentivar uma atitu<strong>de</strong> sem pressa?<br />
Não se trata <strong>de</strong> dar receitas, embora estejamos falando<br />
<strong>de</strong> um movimento eco-gastronômico, o Slow Food.<br />
Mas se a escola quiser contribuir para questionar<br />
a pressa, a velocida<strong>de</strong> tão valorizada pelos tempos<br />
contemporâneos, po<strong>de</strong> abrir um espaço <strong>de</strong> reflexão<br />
e constituição <strong>de</strong> posições críticas em relação ao<br />
imperativo que associa eficiência e rapi<strong>de</strong>z. Esta<br />
reflexão po<strong>de</strong> voltar-se para os próprios processos<br />
pedagógicos e administrativos da gestão escolar, a vida<br />
dos professores, as relações <strong>de</strong> trabalho. Essa busca por<br />
um ponto <strong>de</strong> fuga da correria do dia a dia po<strong>de</strong> ter os<br />
alunos como companheiros. Afinal, <strong>de</strong>sacelerar é uma<br />
atitu<strong>de</strong> ecológica. Se o professor quiser, junto com seus<br />
alunos, saber mais sobre este movimento social e munirse<br />
<strong>de</strong> argumentos para a <strong>de</strong>fesa da idéia <strong>de</strong> <strong>de</strong>sacelerar<br />
a vida, po<strong>de</strong> aventurar-se começando pelos caminhos<br />
da atitu<strong>de</strong> diante da alimentação <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o conceito <strong>de</strong><br />
slow food. A tradução <strong>de</strong>sta i<strong>de</strong>ia seria algo como “comer<br />
lentamente” e, como vimos, fazer do preparo da comida<br />
uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuidado com a vida, e do momento<br />
das refeições um tempo <strong>de</strong> encontro e convivência.<br />
Tudo isto está em oposição à cultura do fast food, comida<br />
rápida, industrializada, solitária.<br />
Isabel C. M. Carvalho é<br />
psicóloga (PUCSP); mestre em<br />
Psicologia da Educação (IESAE/RJ) e doutora<br />
em Educação (UFRGS). Tem trabalhado com<br />
educação e meio ambiente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> meados dos<br />
<strong>ano</strong>s 80, em São Paulo e no Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />
Mora atualmente em Porto Alegre on<strong>de</strong><br />
trabalha como professora universitária na<br />
PUCRS. É autora <strong>de</strong> livros e artigos sobre<br />
educação ambiental e psicologia social.<br />
www.isabelcarvalho.blog.br<br />
Para saber mais, visite o site brasileiro Fundação<br />
Slow Food: http://www.slowfoodbrasil.com<br />
Se você leitor/a se interessou pelo assunto,<br />
pesquise mais. Por exemplo, vá ao verbete<br />
Slow Food na Wikipedia e leia o artigo da<br />
Revista Vida Simples sobre o mesmo tema<br />
http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/006/01.shtml<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
sem fronteiras<br />
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construindo pontes<br />
18<br />
Do you speak “français”<br />
ou parlez-vous “English”?<br />
Um diálogo possível entre os<br />
setores <strong>de</strong> língua inglesa e<br />
francesa no CAp-<strong>UFRJ</strong><br />
Na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> professores <strong>de</strong> línguas<br />
estrangeiras, avaliamos os encontros<br />
interdisciplinares envolvendo os nossos<br />
setores curriculares e como eles po<strong>de</strong>m<br />
proporcionar a consciência linguística<br />
e o <strong>de</strong>senvolvimento educacional dos<br />
alunos <strong>de</strong> educação básica. Assim sendo,<br />
<strong>de</strong>cidimos realizar, com nossas turmas do<br />
6º <strong>ano</strong>, um trabalho integrando o inglês e<br />
o francês por meio <strong>de</strong> palavras cognatas.<br />
Apesar <strong>de</strong> ter sido uma experiência<br />
embrionária, ela se mostrou bastante<br />
fértil na construção do aluno <strong>de</strong> língua<br />
estrangeira como aprendiz mais autônomo<br />
e reflexivo sobre a linguagem e seus usos.<br />
Apesar <strong>de</strong> o ensino <strong>de</strong> língua estrangeira ser um direito<br />
legalmente assegurado na educação básica a partir do<br />
6º <strong>ano</strong> do ensino fundamental (Cf. a Lei <strong>de</strong> Diretrizes e<br />
Bases da Educação <strong>de</strong> 1996), alguns estudos <strong>de</strong>nunciam<br />
o <strong>de</strong>sprestígio que essa disciplina continua a ter em<br />
muitas comunida<strong>de</strong>s escolares brasileiras, como bem<br />
sinalizam vários pesquisadores brasileiros (<strong>de</strong>ntre<br />
eles, Moita Lopes, 1996 e Paiva, 2003). Isso significa<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Eliane Cardoso Tibogue<br />
João Carlos Teixeira <strong>de</strong> Mello<br />
Maria Aparecida Gomes Ferreira<br />
Raquel Souza <strong>de</strong> Oliveira<br />
que, a <strong>de</strong>speito do inquestionável respaldo legal ao<br />
ensino das línguas estrangeiras no contexto escolar,<br />
ainda é imperativo para o trabalho docente cotidi<strong>ano</strong><br />
preencher <strong>de</strong> significado educacional e social o ensino<br />
das línguas estrangeiras nas escolas. Não raramente<br />
professores <strong>de</strong>ssa disciplina são questionados – direta<br />
ou indiretamente – por alguns membros da comunida<strong>de</strong><br />
escolar (alunos, pais ou pares) quanto à pertinência <strong>de</strong><br />
sua disciplina no currículo da educação básica. No<br />
caso particular dos professores <strong>de</strong> língua inglesa, existe<br />
ainda o fato <strong>de</strong> muitos <strong>de</strong> seus alunos serem igualmente<br />
aprendizes <strong>de</strong>ssa língua no contexto <strong>de</strong> cursos<br />
livres, o que, inevitavelmente, provoca comparações.<br />
Infelizmente, estes cotejos entre o ensino-aprendizagem<br />
<strong>de</strong> inglês na escola e o <strong>de</strong> cursos livres costumam atuar<br />
a partir <strong>de</strong> uma lógica binária, ou seja, enquanto um é<br />
entendido como bom, o outro é visto como ruim (e é<br />
recorrente o trabalho <strong>de</strong> ensino-aprendizagem do inglês<br />
na escola ocupar o pólo <strong>de</strong> menor autorida<strong>de</strong>). Por essa<br />
razão, enten<strong>de</strong>mos que é, <strong>de</strong> fato, uma das tarefas dos<br />
professores <strong>de</strong> língua estrangeira tornar os processos<br />
<strong>de</strong> ensino-aprendizagem <strong>de</strong> sua matéria <strong>de</strong> maneira<br />
relevante social e educacionalmente para seus alunos e<br />
para sua comunida<strong>de</strong> escolar como um todo.
Foto por Maria Aparecida Gomes Ferreira<br />
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais:<br />
“terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua estrangeira<br />
(1998), o ensino <strong>de</strong> uma língua estrangeira nas escolas po<strong>de</strong><br />
oferecer ao aprendiz muito além da aquisição das quatro<br />
habilida<strong>de</strong>s referentes a uma língua (ler, escrever, ouvir e falar)”.<br />
Uma das prerrogativas que o ensino <strong>de</strong> outra língua na<br />
escola po<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicar ao aluno do ensino fundamental é<br />
fazer com que ele se torne um aprendiz-usuário mais<br />
consciente e crítico da linguagem. A compreensão dos<br />
mecanismos <strong>de</strong> funcionamento da linguagem beneficia<br />
não só os processos <strong>de</strong> ensino-aprendizagem da<br />
própria língua estrangeira, como, igualmente, favorece<br />
o incremento <strong>de</strong> seu conhecimento em língua materna.<br />
Em face disso, é possível perceber que o documento<br />
acima citado encaminha a proposta <strong>de</strong> um trabalho em<br />
sala <strong>de</strong> aula que, sempre que possível, compare a língua<br />
estrangeira e a língua materna do aluno, porque enten<strong>de</strong><br />
que há ganhos pedagógicos para os participantes <strong>de</strong>sse<br />
contexto quando essa estratégia é abraçada. De fato,<br />
isso já marca um diferencial entre o trabalho <strong>de</strong> ensinoaprendizagem<br />
<strong>de</strong> uma língua estrangeira em contexto<br />
escolar e aquele <strong>de</strong>senvolvido usualmente em cursos<br />
Painel introdutório da exposição “Do you speak “français” ou parlez-vous “English”?”<br />
livres. É comum, em muitos cursos livres <strong>de</strong> inglês,<br />
por exemplo, a proibição do uso da língua do aprendiz<br />
em contexto <strong>de</strong> sala <strong>de</strong> aula, por se acreditar que a<br />
língua materna prejudicaria o processo <strong>de</strong> “aquisição”<br />
da língua estrangeira e por se crer que apren<strong>de</strong>r uma<br />
língua estrangeira é meramente um processo <strong>de</strong> se<br />
adquirir hábitos linguísticos na língua alvo por meio da<br />
automação. O objetivo do ensino acaba se restringindo<br />
a fazer do aluno um simples (e passivo) usuário <strong>de</strong> uma<br />
língua estrangeira, sem que haja a preocupação <strong>de</strong><br />
familiarizá-lo ao exercício da reflexão crítica sobre essa<br />
outra língua (e também sobre a sua própria).<br />
Por <strong>de</strong>sdobramento ao trabalho <strong>de</strong> interface entre uma<br />
língua estrangeira ensinada na escola e a língua materna<br />
dos alunos, muitos são os melhoramentos educacionais<br />
advindos do trabalho interdisciplinar entre as equipes<br />
<strong>de</strong> língua estrangeira. Ativida<strong>de</strong>s conjugadas por esses<br />
setores curriculares po<strong>de</strong>m ajudar a tornar explícitas<br />
para os alunos as relações que <strong>de</strong>terminadas línguas<br />
estrangeiras mantêm entre si. Além disso, é necessário<br />
grifar que uma educação linguística plural é, sobretudo,<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
construindo pontes<br />
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construindo pontes<br />
20<br />
Aluno Matheus (turma 19A) prestigiando os painéis da exposição.<br />
uma ferramenta po<strong>de</strong>rosa para que esses alunos se<br />
engajem nas negociações discursivas, inclusive em escala<br />
global. Buscando dar os passos iniciais na construção<br />
<strong>de</strong>ssas prerrogativas linguísticas e educacionais na<br />
formação dos alunos <strong>de</strong> 6º <strong>ano</strong> do CAp-<strong>UFRJ</strong>, concebeuse,<br />
no 2º semestre <strong>de</strong> 2009, um trabalho interdisciplinar<br />
entre os setores <strong>de</strong> língua inglesa e francesa, sob a<br />
orientação das professoras Maria Aparecida Gomes<br />
Ferreira e Raquel Souza <strong>de</strong> Oliveira (setor <strong>de</strong> língua<br />
inglesa) e os professores Eliane Cardoso Tibogue e João<br />
Carlos Teixeira <strong>de</strong> Mello (setor <strong>de</strong> língua francesa).<br />
Na realida<strong>de</strong> do CAp-<strong>UFRJ</strong>, ao ingressarem no 6º <strong>ano</strong>, os<br />
alunos começam a ter aulas <strong>de</strong> duas línguas estrangeiras:<br />
inglês e francês. Trata-se, portanto, <strong>de</strong> duas expressivas<br />
novida<strong>de</strong>s a um só tempo em sua gra<strong>de</strong> escolar. É<br />
possível se verificar que, para alguns aprendizes (e<br />
alguns <strong>de</strong> seus respectivos responsáveis), esse contato<br />
formal com essas línguas estrangeiras se dá por meio <strong>de</strong><br />
certa ansieda<strong>de</strong>, não só porque o novo é frequentemente<br />
visto como amedrontador, mas também porque se receia<br />
que a aprendizagem concomitante <strong>de</strong> duas ou mais<br />
línguas estrangeiras possa embaraçar o aprendizado <strong>de</strong><br />
uma ou <strong>de</strong> ambas, em virtu<strong>de</strong> das interferências. Com a<br />
finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apresentar prontamente ao corpo discente<br />
ingressante no 6º <strong>ano</strong> algumas estratégias das quais<br />
um aprendiz <strong>de</strong> uma língua estrangeira po<strong>de</strong> se valer<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
para construir significado nessa língua, as professoras<br />
<strong>de</strong> inglês, já no 1º semestre <strong>de</strong> 2009, discutiram<br />
com seus alunos o conceito <strong>de</strong> “cognato”. Convém<br />
esclarecer que um cognato é habitualmente <strong>de</strong>finido<br />
como uma palavra <strong>de</strong> uma língua que é parecida com<br />
outra em um idioma diferente, havendo, em ambas as<br />
línguas, uma equivalência <strong>de</strong> significado (um exemplo<br />
<strong>de</strong> palavras cognatas em inglês e português são,<br />
respectivamente, April e abril). Uma vez ambientados<br />
com esse conceito, os alunos e as professoras analisaram<br />
diversas palavras cognatas em português e inglês.<br />
Enten<strong>de</strong>mos que um trabalho <strong>de</strong> língua estrangeira<br />
que busque criar autonomia do aluno em relação à sua<br />
própria aprendizagem precisa, igualmente, ajudar esses<br />
discentes a enten<strong>de</strong>r o que eles estão fazendo (e o modo<br />
como efetuam esses usos em outra língua). Por isso, esse<br />
conceito foi antecipado no currículo <strong>de</strong> língua inglesa<br />
do colégio, para que os jovens aprendizes <strong>de</strong>ssa língua<br />
estrangeira já tomassem ciência <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas pistas<br />
(no caso, os cognatos) que nos norteiam na negociação<br />
<strong>de</strong> significados nas práticas discursivas.<br />
O segundo momento <strong>de</strong>sse trabalho se <strong>de</strong>u a partir da<br />
integração <strong>de</strong>ssa prática das professoras <strong>de</strong> inglês com a<br />
dos professores <strong>de</strong> francês do 6º <strong>ano</strong>. Com o propósito<br />
<strong>de</strong> fazer com que os nossos alunos operacionalizassem<br />
esse conceito <strong>de</strong> cognato em sua aprendizagem do inglês<br />
e do francês, apresentamos, brevemente, o contexto<br />
histórico <strong>de</strong> intercâmbio entre essas duas línguas,<br />
sobretudo a partir do século XI, cujo marco foi a<br />
conquista da Inglaterra pelos Normandos. Em seguida,<br />
elegemos 12 grupos <strong>de</strong> palavras em inglês (temas) <strong>de</strong><br />
aproximadamente 15 vocábulos, dos quais alguns eram<br />
cognatos com o francês. Para 11 <strong>de</strong>sses 12 temas, adotouse<br />
como critério <strong>de</strong> seleção vocabular a existência <strong>de</strong><br />
um vínculo entre as palavras <strong>de</strong> cada grupo balizado a<br />
partir <strong>de</strong> um significado mais abrangente em comum.<br />
Assim sendo, os 11 temas foram os seguintes (com suas<br />
<strong>de</strong>nominações em inglês e francês, respectivamente):<br />
1.animais (animals/animaux); 2.profissões (occupations/<br />
professions); 3. esportes (sports/sports); 4.membros da<br />
família (family/famille); 5.comida (food/nourriture);<br />
6.formas geométricas (geometric shapes/ figures géométriques);<br />
7.instrumentos musicais (musical instruments/instruments <strong>de</strong><br />
musique); 8.meios <strong>de</strong> transporte (means of transportation/<br />
moyens <strong>de</strong> transport); 9.edifícios (buildings/bâtiments);<br />
10.nacionalida<strong>de</strong>s (nacionalities/nationalités) e 11.matérias<br />
escolares (school Subjects/matières du collège). Propusemos<br />
que as duas turmas do 6º <strong>ano</strong> se organizassem em grupos<br />
<strong>de</strong> 5 componentes e que os alunos buscassem as palavras<br />
em francês equivalentes àquelas em inglês do tema pelo<br />
qual cada grupo estava responsável. Já quanto ao tema<br />
12, nomeado ‘outras palavras’ (other words / d’autres
Um dos doze painéis expostos: tema “buildings/bâtiments”<br />
mots), o <strong>de</strong>safio ao grupo se mostrou ainda maior. Isso<br />
porque cabia às alunas que sortearam esse tema resgatar,<br />
<strong>de</strong> suas aulas <strong>de</strong> inglês e francês até aquela data, palavras<br />
aleatórias que eram cognatas nessas duas línguas. Após<br />
toda essa empreitada, os 12 grupos tiveram que sinalizar<br />
quais eram os cognatos em inglês e francês daquele tema<br />
a que se <strong>de</strong>dicaram. Para a consecução <strong>de</strong>ssa tarefa, o<br />
conhecimento sobre cognato teve que, outra vez, ser<br />
mobilizado. Cabe ressaltar que alguns <strong>de</strong>sses vocábulos<br />
representaram novo aprendizado para os alunos durante<br />
o processo, <strong>de</strong> forma que, antes <strong>de</strong> sinalizarem a relação<br />
cognata dos vocábulos entre inglês e francês, houve<br />
também um momento <strong>de</strong> tradução <strong>de</strong>sses vocábulos<br />
para o português.<br />
Por enten<strong>de</strong>r que os proveitos <strong>de</strong>ssa integração entre os<br />
trabalhos dos setores <strong>de</strong> língua inglesa e <strong>de</strong> língua francesa<br />
com o 6º <strong>ano</strong> não <strong>de</strong>veriam ficar restritos apenas a nós,<br />
professores e alunos <strong>de</strong>ssa série, <strong>de</strong>cidimos expor, sob a<br />
forma <strong>de</strong> painéis, o produto <strong>de</strong>ssa nossa aprendizagem<br />
em um evento anual do colégio, intitulado Semana <strong>de</strong><br />
Arte, Ciência e Cultura. No <strong>ano</strong> <strong>de</strong> 2009 – <strong>ano</strong> esse<br />
quando tal evento completava sua 15º edição – os painéis<br />
foram apresentados sob o título Do you speak “français”<br />
ou parlez-vous “English”? Um estudo comparativo<br />
entre palavras francesas e inglesas. Para elaboração dos<br />
painéis, os alunos foram orientados, então, a escolher<br />
6 das palavras <strong>de</strong>scobertas cognatas (em inglês e<br />
francês) e buscar ilustrações que representassem aqueles<br />
vocábulos. Outra estratégia muito usada na leitura em<br />
língua estrangeira é a exploração <strong>de</strong> recursos visuais que<br />
possam compor o texto em questão. Sabendo, portanto,<br />
que confeccionamos significados a partir das imagens e<br />
que, para a construção <strong>de</strong> sentido em língua estrangeira,<br />
<strong>de</strong>vemos extravasar o estritamente linguístico, nessa<br />
ativida<strong>de</strong>, os alunos estariam colocando em prática,<br />
mais uma vez, outro saber bastante trabalhado em sala<br />
<strong>de</strong> aula para leitura <strong>de</strong> textos: o uso <strong>de</strong> pistas visuais para<br />
a compreensão daqueles.<br />
Em sala <strong>de</strong> aula, passeando por momentos <strong>de</strong> maior<br />
enfoque teórico e outros <strong>de</strong> maior enfoque prático e <strong>de</strong><br />
ludicida<strong>de</strong>, várias ativida<strong>de</strong>s foram <strong>de</strong>senvolvidas com<br />
nossos alunos. Porém, partindo-se da premissa <strong>de</strong> que<br />
a aprendizagem está longe <strong>de</strong> se restringir ao espaço<br />
da sala <strong>de</strong> aula, e que ela se efetua na interação que<br />
mantemos com o outro, a divulgação <strong>de</strong>sse trabalho na<br />
Semana <strong>de</strong> Arte, Ciência e Cultura, por um lado, possibilitou<br />
a socialização dos nossos ganhos <strong>de</strong> aprendizagem<br />
graças à integração <strong>de</strong>ssas duas línguas estrangeiras.<br />
Um saber, portanto, que procuramos compartilhar<br />
com outros membros da comunida<strong>de</strong> escolar. Por outro<br />
lado, essa exposição buscou também explicitar que a<br />
conjugação dos processos <strong>de</strong> ensino-aprendizagem<br />
<strong>de</strong> diferentes línguas estrangeiras po<strong>de</strong> convergir na<br />
formação <strong>de</strong> uma maior consciência linguística e crítica<br />
do aprendiz diante das línguas que ele está apren<strong>de</strong>ndo,<br />
mesmo se tratando <strong>de</strong> um jovem aprendiz.<br />
Ao término <strong>de</strong>sse trabalho integrado entre os setores<br />
<strong>de</strong> língua inglesa e língua francesa, ajuizamos, na<br />
qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> docentes, que houve o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />
nossas práticas pedagógicas graças ao diálogo fecundo<br />
mantido entre nós ao longo <strong>de</strong>sse período. Tendo em<br />
vista que essa ativida<strong>de</strong> mobilizou vários saberes,<br />
estratégias e aprendizagens, igualmente apreciamos que<br />
os benefícios que os alunos po<strong>de</strong>riam <strong>de</strong>la <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>r<br />
são os seguintes:<br />
1- o aprendizado <strong>de</strong> que as línguas estrangeiras po<strong>de</strong>m<br />
ter origens em comum e que os cognatos lançam luz<br />
quanto a essa i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> entre elas;<br />
2- o estudo dos vocábulos cognatos em inglês e francês<br />
– e, portanto, o próprio conceito <strong>de</strong> cognato – confirma<br />
que a aprendizagem do inglês po<strong>de</strong> auxiliá-los na<br />
aprendizagem do francês (e vice-versa);<br />
3- a compreensão <strong>de</strong> que o conceito <strong>de</strong> cognato é caro<br />
para o aprendizado <strong>de</strong> uma língua estrangeira (quer seja<br />
comparando-a a outra língua estrangeira ou à língua<br />
materna);<br />
4- o exercício <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver habilida<strong>de</strong>s para trabalhar<br />
em conjunto, reconhecendo na interação o lugar fértil<br />
para a construção <strong>de</strong> conhecimento;<br />
5- o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sua autonomia no uso <strong>de</strong>ssas<br />
estratégias para leitura e construção <strong>de</strong> significado nos<br />
dois idiomas.<br />
Confiamos que um olhar mais primoroso que incida na<br />
educação multilíngue, sobretudo em uma escola pública<br />
brasileira, po<strong>de</strong>rá enxergar ali uma diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ganhos<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
construindo pontes<br />
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construindo pontes<br />
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Três dos sessenta alunos que participaram da elaboração do trabalho: Laura, Maria Clara e Isabella (turma 16A)<br />
não só para os processos <strong>de</strong> ensino-aprendizagem<br />
das línguas em tela, mas para a formação educacional<br />
dos alunos como um todo. Ratificamos, assim, não<br />
só a importância do ensino <strong>de</strong> línguas estrangeiras<br />
no currículo escolar, como também a relevância <strong>de</strong><br />
trabalhos interdisciplinares que busquem a construção<br />
<strong>de</strong> “pontes” entre as disciplinas, que favoreçam o<br />
aprendizado <strong>de</strong> nossos alunos e que os levem à sua<br />
autonomia como aprendizes. E, sob a perspectiva<br />
docente, sublinhamos o gran<strong>de</strong> valor profissional <strong>de</strong>,<br />
por meio <strong>de</strong> projetos e trabalhos que atravessem as<br />
fronteiras disciplinares, apren<strong>de</strong>rmos com os nossos<br />
pares <strong>de</strong> outros setores.<br />
Maria Aparecida Gomes Ferreira é professora <strong>de</strong><br />
inglês do CAp-<strong>UFRJ</strong>. Graduou-se pela <strong>UFRJ</strong> e é<br />
mestre em Linguística Aplicada pela <strong>UFRJ</strong>.<br />
Raquel Souza <strong>de</strong> Oliveira é professora <strong>de</strong> inglês do<br />
CAp-<strong>UFRJ</strong>. Graduou-se pela <strong>UFRJ</strong> e é mestre em<br />
Linguística Aplicada pela <strong>UFRJ</strong>.<br />
Eliane Cardoso Tibogue é professora <strong>de</strong> francês do<br />
CAp-<strong>UFRJ</strong>. Graduou-se pela <strong>UFRJ</strong>.<br />
João Carlos Teixeira <strong>de</strong> Mello é professor <strong>de</strong> francês<br />
do CAp-<strong>UFRJ</strong>. Graduou-se pela <strong>UFRJ</strong> e é mestre<br />
em Literaturas Francófonas pela UFF.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Sugestões <strong>de</strong> leitura:<br />
BRASIL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO<br />
FUNDAMENTAL. Parâmetros curriculares<br />
nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino<br />
fundamental: língua estrangeira. Brasília: MEC/<br />
SEF, 1998.<br />
MOITA LOPES, L. P. da. Oficina <strong>de</strong> Linguística<br />
Aplicada: a natureza social e educacional dos<br />
processos <strong>de</strong> ensino/aprendizagem <strong>de</strong> línguas.<br />
Campinas, SP. Mercado <strong>de</strong> Letras, 1996.<br />
PAIVA, V. L. M. O. A LDB e a legislação vigente<br />
sobre o ensino e a formação <strong>de</strong> professor <strong>de</strong><br />
língua inglesa. In: STEVENS, C. M. T. e CUNHA,<br />
M. J. Caminhos e Colheitas: ensino e pesquisa na<br />
área <strong>de</strong> inglês no Brasil. Brasília: UnB, 2003. p.<br />
53-84. http://www.veramenezes.com/ensino.htm<br />
Acesso em: 06/11/2009.
Como e por que ler<br />
José <strong>de</strong> Alencar<br />
“este gran<strong>de</strong> império, que a previdência<br />
rasga infindos horizontes, é uma nação oca;<br />
não tem poesia nativa, nem perfume seu.”<br />
ALENCAR, J. Edição crítica <strong>de</strong> Iracema.<br />
Ana Crelia Dias<br />
Antônio Carlos Secchin<br />
Há muito se fala em dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> atrair<br />
os jovens para a leitura. Entretanto, hoje<br />
essa dificulda<strong>de</strong> precisa ser analisada sob<br />
outra perspectiva, uma vez que, ligados à<br />
re<strong>de</strong> mundial <strong>de</strong> computadores, eles lêem<br />
muito. Por isso, o impasse se <strong>de</strong>slocou para<br />
a relação <strong>de</strong>les com a leitura <strong>de</strong> livros.<br />
Outro senão se aponta: como afirmar que<br />
os jovens não lêem livros, se as listas dos<br />
mais vendidos mostra o contrário? Há<br />
ou não uma juventu<strong>de</strong> ávida por Harry<br />
Potter, Crepúsculo e tantos outros bestsellers?<br />
Delimitando ainda mais nossa<br />
questão, chegamos a um ponto talvez<br />
mais preciso – lê-se muito pouco boa<br />
literatura. Como aproximar esse público<br />
dos gran<strong>de</strong>s textos literários?<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
opinião<br />
23
opinião<br />
24<br />
Se isso já é difícil quando se trata <strong>de</strong> autores<br />
contemporâneos, mais complexo se mostra o painel<br />
quando tratamos dos clássicos. O encontro <strong>de</strong> alunos do<br />
Ensino Médio com textos do século XIX, por exemplo,<br />
mostra-se quase sempre como “enfadonho”, “pouco<br />
útil para a vida prática”, como argumentam eles. Essa<br />
temática se torna mais passível <strong>de</strong> discussão quando<br />
o aluno percebe que o vestibular vai fazer o acerto <strong>de</strong><br />
contas, isto é, cobrará intimida<strong>de</strong> com a leitura <strong>de</strong> textos<br />
clássicos. Enfim, são muitas as variáveis a serem listadas<br />
quando o assunto é aproximar leitores jovens <strong>de</strong> uma<br />
literatura tão distante temporalmente <strong>de</strong> seus valores e<br />
expectativas.<br />
Entretanto, reconhecer essa dificulda<strong>de</strong> não significa<br />
endossar a ausência <strong>de</strong> bons livros literários na formação<br />
<strong>de</strong> nossa juventu<strong>de</strong>. Enten<strong>de</strong>r a relação imediatista<br />
<strong>de</strong>les com a informação não po<strong>de</strong> significar a<strong>de</strong>rir à<br />
sistematização <strong>de</strong> uma cultura enlatada, pronta para o<br />
consumo entre um reality show e outro. À escola – nem<br />
entremos no mérito das famílias – cabe o papel <strong>de</strong><br />
formação. Apresentar o jovem aos textos que constituem<br />
o pilar <strong>de</strong> sua literatura é tarefa <strong>de</strong>la. A leitura <strong>de</strong> bestsellers<br />
não precisa <strong>de</strong> promoção.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Tratemos <strong>de</strong> José <strong>de</strong> Alencar. A leitura <strong>de</strong> suas obras,<br />
geralmente, representa um gran<strong>de</strong> obstáculo para<br />
os alunos; isso quando o projeto não é evitado pelo<br />
próprio professor, que não sustenta a tarefa <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r<br />
a importância do escritor.<br />
O romancista foi dono <strong>de</strong> um dos maiores projetos<br />
político-i<strong>de</strong>ológico-literários <strong>de</strong> nossa literatura. Em<br />
toda a Europa, o Romantismo – movimento em que ele<br />
se insere – lançou-se à busca das origens da nação, a fim<br />
<strong>de</strong> exaltar-lhe um passado <strong>de</strong> glória. O crítico Silvio Elia<br />
assim <strong>de</strong>fine esse movimento: “a generalização <strong>de</strong> um<br />
sentimento <strong>de</strong> fuga à realida<strong>de</strong> social, em busca <strong>de</strong> um<br />
refúgio solitário, em colóquio com a natureza, capaz <strong>de</strong><br />
nos conduzir às fontes puras que nos haviam gerado em<br />
nossa autenticida<strong>de</strong> primitiva.” O nacionalismo, aliado à<br />
atitu<strong>de</strong> romântica <strong>de</strong> i<strong>de</strong>alização, requeria história a ser<br />
cantada. E nosso escritor, tomando para si a tarefa <strong>de</strong><br />
cantar o Brasil, encontra um país sem registro histórico,<br />
sem passado nem glória. Funda então o mito <strong>de</strong> nação<br />
tendo o índio como símbolo maior, para aten<strong>de</strong>r ao<br />
propósito <strong>de</strong> busca nostálgica <strong>de</strong> um passado mítico.<br />
O conceito <strong>de</strong> brasilida<strong>de</strong> inaugura-se como sinônimo<br />
da busca do realce da “cor local”, por meio do relevo<br />
das peculiarida<strong>de</strong>s e torna-se compromisso necessário à<br />
projeção do país por meio da literatura.<br />
José Maria <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros, A personagem Iracema do romance <strong>de</strong> José <strong>de</strong> Alencar, RJ, Museu Nacional e Belas Artes, 1881.
Fac-simile do Jornal do Comércio <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1865.<br />
O projeto indianista do escritor – composto da tría<strong>de</strong><br />
O guarani, Iracema e Ubirajara, foi a experiência mais<br />
radical na tentativa <strong>de</strong> fundação do mito brasileiro,<br />
pois, ao retratar a paisagem, a alma e as lendas, o<br />
escritor enfrentou muitas críticas, que se dirigiam,<br />
principalmente, a uma suposta perspectiva colonizadora,<br />
ignorando-lhe o primoroso trabalho linguístico e o<br />
propósito <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> em uma nação<br />
vazia, projeto que o autor <strong>de</strong>clara ser sua “missão” na<br />
obra Como e porque sou romancista.<br />
A a<strong>de</strong>são do autor aos anseios românticos <strong>de</strong> rebeldia<br />
e aos i<strong>de</strong>ais libertários mostrou-se no projeto <strong>de</strong><br />
construção <strong>de</strong> contorno e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> para um país<br />
recente, e a promoção da natureza exuberante tornouse<br />
material para exaltar peculiarida<strong>de</strong>s brasileiras em<br />
contraponto com as características da metrópole.<br />
Mapeou o Brasil em termos geográficos: escreveu obras<br />
que têm como cenário diferentes realida<strong>de</strong>s do país.<br />
Vale ressaltar o apuradíssimo trabalho linguístico.<br />
Alencar entendia que a <strong>de</strong>fesa da língua era a mais<br />
genuína forma <strong>de</strong> afirmação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Seus<br />
romances empreen<strong>de</strong>ram sofisticadas construções<br />
– Iracema, sem dúvida, é resultado <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> lavor<br />
linguístico e literário, com forte veia poética.<br />
Os escritos alencari<strong>ano</strong>s encontraram leitores ávidos e<br />
seus textos espalhavam-se em folhetins nos salões <strong>de</strong><br />
leitura. Quando escreveu seu primeiro romance, Cinco<br />
minutos, encontrou um público já costumado à leitura<br />
<strong>de</strong> romances. O guarani, publicado inicialmente em<br />
folhetim, conferiu-lhe gran<strong>de</strong> notorieda<strong>de</strong>. Foi, assim,<br />
consi<strong>de</strong>rado o fundador do romance nacional <strong>de</strong> caráter<br />
“épico”. Seu percurso <strong>de</strong>ixou, sem dúvidas, caminho<br />
aberto para escritores como Machado <strong>de</strong> Assis, Aluísio<br />
Azevedo, Artur Azevedo, entre tantos outros que o<br />
suce<strong>de</strong>ram.<br />
Além disso, nosso romancista foi exímio contador <strong>de</strong><br />
histórias. Suas peripécias narrativas exibem inteligência<br />
e excelente capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> imaginação. Os romances<br />
urb<strong>ano</strong>s encenam flashs da vida social da corte; os rurais<br />
e indianistas trazem curiosida<strong>de</strong>s dos viventes daquelas<br />
localida<strong>de</strong>s; os históricos capturam episódios do<br />
passado para dar visibilida<strong>de</strong> a episódios que enaltecem<br />
a heroicida<strong>de</strong> do nosso povo. Tudo isso composto <strong>de</strong><br />
modo a que, inesperadamente, os fatos tomem rumos<br />
diferentes, pren<strong>de</strong>ndo o leitor ao texto.<br />
Os alunos <strong>de</strong>sgostam <strong>de</strong> Alencar porque não se<br />
reconhecem nos seus romances, ou sequer enten<strong>de</strong>m<br />
o que ali é dito. Certos autores merecem tratamento<br />
suplementar, para além do literário. Uma boa<br />
compreensão do Brasil do século XIX facilitaria muito<br />
a aceitação do autor. Na falta <strong>de</strong>sse referencial, todo<br />
escritor é automaticamente lido como “contemporâneo”,<br />
quando bem poucos o são.<br />
José <strong>de</strong> Alencar, “O Guarani”, 1º edição, 1857 e Capa do livro “A Confe<strong>de</strong>ração<br />
dos Tamoios”, da coleção imperial, com <strong>de</strong>dicatória <strong>de</strong> Gonçalves Magalhães,<br />
MG, Museu Mari<strong>ano</strong> Procópio, 1836.<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
opinião<br />
25
opinião<br />
26<br />
O lapso temporal existente entre obra e leitores requer<br />
mediação. É preciso que os professores leiam a obra<br />
do nosso romancista e acompanhem seus alunos nesse<br />
projeto <strong>de</strong> formação por meio da literatura. Associar a<br />
obra ao contexto em que ela está inserida e ao projeto<br />
do autor po<strong>de</strong> ser uma forma <strong>de</strong> diminuir essa distância<br />
e promover um encontro com um escritor <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
importância para a construção da história literária e<br />
cultural do nosso país.<br />
Na escola, a leitura dos clássicos torna-se obrigatória.<br />
E como ler Alencar com alunos <strong>de</strong> Ensino Médio, em<br />
tempos <strong>de</strong> era digital e leitura esquemática <strong>de</strong> blogs?<br />
I<strong>de</strong>al é que, em termos <strong>de</strong> leitura, nada fosse obrigatório,<br />
ou, se o fosse, que ao menos não se seguisse a linearida<strong>de</strong><br />
cronológica. Intuir o momento (e o modo) <strong>de</strong> “lançar”<br />
um autor em sala é qualida<strong>de</strong> do bom professor.<br />
Ana Crelia Dias é professora do <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong><br />
<strong>Aplicação</strong> da <strong>UFRJ</strong>; professora do Curso <strong>de</strong><br />
Especialização em Literatura Infantil e Juvenil<br />
da <strong>UFRJ</strong>; doutora em Letras.<br />
Antônio Carlos Secchin é membro da Aca<strong>de</strong>mia<br />
Brasileira <strong>de</strong> Letras, professor titular <strong>de</strong><br />
literatura brasileira da <strong>UFRJ</strong>, doutor em letras,<br />
poeta e ensaísta, com <strong>de</strong>z livros publicados.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Obras <strong>de</strong> José <strong>de</strong> Alencar:<br />
I Romances urb<strong>ano</strong>s:<br />
Cinco minutos (1857);<br />
A viuvinha (1860);<br />
Lucíola (1862);<br />
Diva (1864);<br />
A pata da gazela (1870);<br />
Sonhos d’ouro (1872);<br />
Senhora (1875);<br />
Encarnação (1893, póstumo).<br />
II Romances históricos e/ou indianistas:<br />
O Guarani (1857);<br />
Iracema (1865);<br />
As minas <strong>de</strong> prata (1865);<br />
Alfarrábios (1873);<br />
Ubirajara (1874);<br />
Guerra dos mascates (1873).<br />
III Romances regionalistas:<br />
O gaúcho (1870);<br />
O tronco do ipê (1871);<br />
Til (1872);<br />
O sertanejo (1875).
Ao abrir o jornal, lá estava a fotografia e<br />
reportagem. Guilhermino parecia esquecido<br />
e perdido, saindo da fotografia no canto<br />
esquerdo. Mas ele foi lembrado pelos seus<br />
colegas (ver Figuras 1 e 2). A última vez<br />
que vi aquela turma, tinha <strong>de</strong>zessete <strong>ano</strong>s e<br />
foi para levar a triste notícia do falecimento<br />
<strong>de</strong> meu irmão, na noite anterior, por coma<br />
diabético, quando cursava o 1º Clássico (ver<br />
Figura 3).<br />
Para falar <strong>de</strong> Guilhermino Abritta, com<br />
sua vida tão breve, falarei um pouco <strong>de</strong> seu<br />
tempo e <strong>de</strong> seu colégio, como incentivo,<br />
não só aos jovens estudantes <strong>de</strong> hoje,<br />
como aos professores que continuam<br />
trabalhando por um melhor ensino e<br />
educação em nosso país<br />
A década <strong>de</strong> 60 testemunhou uma das<br />
mais fantásticas experiências educacionais<br />
brasileira, que foi o <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong>,<br />
da antiga Faculda<strong>de</strong> Nacional <strong>de</strong> Filosofia<br />
da Universida<strong>de</strong> do Brasil. Neste colégio,<br />
conhecido como CAp, os estudantes não<br />
só tinham um ensino <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, como<br />
eram <strong>de</strong>spertados para a <strong>de</strong>mocracia<br />
e cidadania com gran<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência intelectual.<br />
Para isto, eram incentivados a participar <strong>de</strong> clubes<br />
Memórias<br />
<strong>de</strong> um colégio<br />
Teócrito Abritta<br />
Figura 1 – Ginasial B. O Globo, 27 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2008<br />
Figura 2 – Ginasial B. O Globo, 27 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 2008<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
memória<br />
27
memória<br />
28<br />
Figura 3 – Estudantes do <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong>. Guilhermino Abritta é o primeiro aluno em pé à esquerda.<br />
<strong>de</strong> ciências, história e geografia. Tinham o apoio<br />
<strong>de</strong> excursões culturais, contavam com serviço <strong>de</strong><br />
orientação educacional com psicólogos que os assistiam,<br />
participavam <strong>de</strong> palestras com personalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> nossa<br />
cultura, recebendo uma educação a mais completa<br />
possível neste colégio público.<br />
Neste ambiente intelectualmente estimulante, Clarice<br />
Lispector falava sobre o conto mo<strong>de</strong>rno e apresentou<br />
seu livro, ainda inédito, A Maçã no Escuro. Adonias<br />
Filho falou sobre seu livro recém lançado na época,<br />
Corpo Vivo. Outros escritores e pessoas<br />
atuantes em nossa cultura sempre<br />
davam sua colaboração a estes jovens,<br />
como Fernando Sabino, Jorge Amado,<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira, jornalistas como<br />
Jânio <strong>de</strong> Freitas e Zuenir Ventura e<br />
vários músicos, artistas, cientistas e<br />
historiadores da época.<br />
Esta efervescência cultural lhes dava<br />
gran<strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência intelectual,<br />
com os estudantes se manifestando<br />
em seu jornal A Forja. Isto fazia com<br />
que estes jovens não se filiassem<br />
facilmente a partidos ou grupos<br />
políticos, por consi<strong>de</strong>rarem as análises<br />
e interpretações da socieda<strong>de</strong> brasileira<br />
por eles produzidas, insuficientes e<br />
fracas do ponto <strong>de</strong> vista teórico e<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
conceitual (Alzira Alves <strong>de</strong> Abreu, Intelectuais e Guerreiros:<br />
O <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong> da <strong>UFRJ</strong> <strong>de</strong> 1948 a 1968 – Editora<br />
da <strong>UFRJ</strong>, Rio <strong>de</strong> Janeiro – 1992, ver Figura 4).<br />
Infelizmente experiências educacionais como esta,<br />
juntamente com o pl<strong>ano</strong> <strong>de</strong> alfabetização <strong>de</strong> adultos <strong>de</strong><br />
Paulo Freire e todas as contribuições e experiências <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
Anísio Teixeira a Darcy Ribeiro, foram abortadas pela<br />
ditadura e mantidas soterradas por muitos governos, que<br />
preferem uma geração passiva, obe<strong>de</strong>cendo as palavras<br />
<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m dos partidos <strong>de</strong> sua chamada base política, e<br />
Figura 4 – Celeiro <strong>de</strong> Rebel<strong>de</strong>s
Arquivo pessoal família Abritta<br />
um povo comandado pelos big brothers televisivos.<br />
Os golpistas <strong>de</strong> 1964 também lançaram suas campanhas<br />
populares, como “Ouro Para o Bem do Brasil”. Como<br />
em um filme <strong>de</strong> piratas, os organizadores <strong>de</strong>sta coleta,<br />
achando-se mais necessitados do que o Brasil, sumiram<br />
com o ouro arrecadado, inclusive com as alianças do<br />
Marechal Castelo Branco, doadas como um gran<strong>de</strong><br />
exemplo <strong>de</strong> patriotismo. Guilhermino preparou uma<br />
sátira a esta campanha, que não chegou a ser enviada ao<br />
jornal A Forja (ver Figura 5).<br />
Com estas poucas palavras, <strong>de</strong>ixando as imagens falarem<br />
mais, avivo as pegadas <strong>de</strong> Guilhermino, lembrando-me<br />
também <strong>de</strong>ste colégio, que <strong>de</strong> uma maneira ou outra<br />
muito me influenciou.<br />
Teócrita Abritta é Físico e<br />
Escritor, Professor aposentado do<br />
Instituto <strong>de</strong> Física da <strong>UFRJ</strong><br />
Figura 6 - foto do dia <strong>de</strong> formatura da turma no ginásio em 1963<br />
Figura 5 “Ouro para o bem do Brasil”<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
memória<br />
29
esenha<br />
30<br />
A mitologia<br />
africana em<br />
sala <strong>de</strong> aula<br />
Claudio Lourenço <strong>de</strong> Oliveira<br />
Resenha dos livros, Ifá, o adivinho (2002), Xangô, o Trovão<br />
(2003) e Oxumarê, o Arco-Íris (2005), <strong>de</strong> Reginaldo Prandi<br />
Companhia das Letrinhas.<br />
“O rei que punha fogo pela boca” é apenas uma <strong>de</strong> tantas<br />
outras narrativas da mitologia africana encontradas<br />
na trilogia para crianças e jovens leitores do escritor<br />
Reginaldo Prandi, também sociólogo que estuda a<br />
preservação da memória cultural afro-brasileira, com<br />
ilustrações <strong>de</strong> Pedro Rafael, artista plástico e restaurador.<br />
Ifá, o adivinho (2002), Xangô, o Trovão (2003) e Oxumarê,<br />
o Arco-Íris (2005) fazem parte <strong>de</strong>ssa trilogia publicada<br />
pela Companhia das Letrinhas com média <strong>de</strong> R$ 39,00<br />
cada livro. As duas primeiras obras foram laureadas<br />
com o certificado do “Livro Altamente Recomendável”<br />
pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil em<br />
2003, entre outras premiações.<br />
Todas as histórias presentes nessas obras são adaptações<br />
para o jovem leitor do livro Mitologia dos Orixás (2001),<br />
também <strong>de</strong> Prandi, voltado para o público adulto. Essas<br />
narrativas fazem parte do patrimônio cultural que o<br />
Brasil herdou <strong>de</strong> África. Embora possam ser lidos como<br />
livros in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, esses três volumes apresentam,<br />
no conjunto, a mitologia básica dos principais orixás<br />
cultuados no Brasil.<br />
Nos contos, apesar <strong>de</strong> um mesmo tema ser tratado,<br />
ou seja, os orixás e a relação <strong>de</strong>les com o hum<strong>ano</strong><br />
e o universo, há quebra <strong>de</strong> narrativa <strong>de</strong> uma história<br />
para outra. Dessa maneira, os textos po<strong>de</strong>m ser lidos<br />
separadamente em sala <strong>de</strong> aula e, assim, como uma<br />
possível proposta <strong>de</strong> trabalho, dividir a turma em<br />
grupos, cada grupo com um conto. Os alunos po<strong>de</strong>rão<br />
apresentar trabalhos, exposições e pesquisas sobre cada<br />
um dos orixás, aproximando-os, <strong>de</strong>ssa forma, da cultura<br />
e das tradições do povo yorubá.<br />
Além <strong>de</strong> o texto se dividir em partes unitárias, o autor<br />
utiliza o texto imagético, ou seja, a recurso não-verbal,<br />
como forma <strong>de</strong> criar uma coerência textual e referenciar<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
os personagens. Assim, a narrativa que relata as aventuras<br />
do rei <strong>de</strong> Oió, Xangô, recebem como fundo <strong>de</strong> página a<br />
cor vermelha, que representa simbolicamente o orixá, e<br />
sua imagem, que é transportada do imaginário oralizado<br />
das histórias para uma forma concreta. No que se refere<br />
à ilustração <strong>de</strong> Xangô, além da figura imponente, há<br />
outros elementos que a compõem, como vestimenta,<br />
cores e os a<strong>de</strong>reços. O principal símbolo do <strong>de</strong>us do<br />
trovão é o machado <strong>de</strong> dupla ponta, o oxé, que, segundo<br />
o próprio autor, representa a justiça. Dessa forma, esses<br />
elementos passam a fazer parte da construção narrativa<br />
<strong>de</strong> maneira a acrescentar informações.<br />
O autor da trilogia para a literatura infantil e juvenil,<br />
Prandi, no final da obra, apresenta aos leitores um<br />
glossário. Nele, o autor, explicita todas as características<br />
dos orixás citados na obra, como o elemento<br />
representativo (terra, fogo, água, etc.), arquétipo,<br />
cor, símbolo, saudação, dia da semana e o número <strong>de</strong><br />
cada um dos <strong>de</strong>uses afric<strong>ano</strong>s. Esse aspecto textual,<br />
sem dúvida, colabora para um melhor entendimento<br />
das histórias, principalmente para aqueles leitores que<br />
estão tendo pela primeira vez contato com a cultura e a<br />
tradição africana.<br />
Todos os livros da trilogia retratam <strong>de</strong> maneira bem<br />
sistematizada o povo e a cultura afro-brasileira.<br />
Abordam e resgatam a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural <strong>de</strong> uma<br />
minoria marcada pela <strong>de</strong>svalorização <strong>de</strong> sua etnia e<br />
sempre vista por um olhar europeizante. Esses contos,<br />
além <strong>de</strong> serem recheados <strong>de</strong> elementos que mexem com<br />
a imaginação do pequeno leitor, conduzem ao resgate e<br />
registro da tradição oral <strong>de</strong> contar histórias. Além disso,<br />
é importante ressaltar o papel da literatura infantil e<br />
juvenil nesse caso, pois, <strong>de</strong> certa forma, alicerça e<br />
ratifica, com obras que retratam o povo afric<strong>ano</strong>, um<br />
momento histórico e a preservação cultural <strong>de</strong> África.<br />
Assim, essas narrativas míticas adaptadas para o público<br />
infanto-juvenil são uma maneira <strong>de</strong> manter viva a<br />
memória, cultura e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> afro-brasileira.
Aconteceu<br />
no 1º semestre <strong>de</strong> 2009<br />
Aconteceu no NIC Jr.<br />
I Foi realizada no CAp nos dias 01 e 02 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2009<br />
a IX Jornada <strong>de</strong> Iniciação Científica Jr. Neste evento,<br />
24 trabalhos (painéis) foram apresentados por 38 alunos<br />
que <strong>de</strong>senvolveram ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciação científica<br />
júnior em 2008.<br />
II Neste semestre, 48 (quarenta e oito) alunos foram<br />
selecionados e encaminhados pelo Núcleo para<br />
realizarem ativida<strong>de</strong>s iniciação científica júnior nos<br />
laboratórios <strong>de</strong> diversas Unida<strong>de</strong>s da <strong>UFRJ</strong>. Também<br />
foram selecionados 2 (dois) alunos para realizarem<br />
estágio na Fiocruz e 1 (um) para o CBPF.<br />
III Foram inscritos na sessão “O Jovem e a Ciência no<br />
Futuro” da XXIV Reunião Anual da FeSBE 15 (quinze)<br />
painéis, resultados da pesquisa <strong>de</strong> 25 (vinte e cinco)<br />
alunos.<br />
Festa Junina<br />
No dia 4 <strong>de</strong> julho, houve a tradicional festa<br />
junina do CAp <strong>UFRJ</strong>.<br />
CESPEB<br />
No 1º semestre 2009, aconteceu o fechamento do<br />
curso <strong>de</strong> Educação Física Escolar, e eles <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram<br />
monografia <strong>de</strong> conclusão em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2009. Todos<br />
os outros cursos terminaram no 2º semestre houve<br />
<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> monografia em fevereiro <strong>de</strong> 2010. No 2º<br />
semestre também começou o CESPEB-EJA no Fundão.<br />
NIC Jr.<br />
No 1º semestre tem sempre a jornadinha, que este <strong>ano</strong><br />
aconteceu em abril; no 2º semestre, tem sempre a ida à<br />
FeSBE, que acontece em agosto.<br />
SACC<br />
Aconteceu no 1º semestre <strong>de</strong> 2009 o concurso <strong>de</strong><br />
logotipo para a SACC.<br />
Minicurso <strong>de</strong> grafos<br />
O setor curricular <strong>de</strong> Matemática convidou professores,<br />
servidores tecnico-administrativos a participarem <strong>de</strong> um<br />
minicurso <strong>de</strong> grafos, os dias 6 e 8 <strong>de</strong> julho no Auditório<br />
com o professor Msc. Ivail Muniz (FAETEC - CPII -<br />
Zaccaria)<br />
março <strong>de</strong> 2010 Perspectiva CApiana <strong>nº</strong>6<br />
notas<br />
31
notas<br />
32<br />
Aconteceu no Ensino Fundamental<br />
I Na 1ª semana <strong>de</strong> aula (fev./09), o 2º <strong>ano</strong> trabalhou<br />
com o tema Carnaval. Conversou-se com as crianças<br />
sobre o que conheciam <strong>de</strong>ssa gran<strong>de</strong> festa popular.<br />
Foram resgatadas as marchinhas antigas que alguns já<br />
ouviram e produziram-se máscaras com o formato <strong>de</strong><br />
mãos. No final da semana, aconteceu o gran<strong>de</strong> baile<br />
e todo mundo caiu na folia: alunos, professores, direção<br />
e funcionários.<br />
I I O 2o <strong>ano</strong> escolheu trabalhar com o livro “O tesouro<br />
do pirata pão-duro” para a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> integração com<br />
o 1º <strong>ano</strong>. O livro permitiu explorar conteúdos em<br />
Matemática como o espaço, i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> posições<br />
e noções <strong>de</strong> lateralida<strong>de</strong> e em História e Geografia<br />
como a localização orientada por mapas e legendas.<br />
A proposta em seguida, foi a dramatização da história.<br />
As professoras Ana Letícia, Carmen e Lucia Fernanda<br />
dividiram os papéis entre as crianças, criaram o cenário<br />
e ensaiaram até chegar o gran<strong>de</strong> dia da apresentação.<br />
Finalizaram a ativida<strong>de</strong> com os grupos (1º e 2º <strong>ano</strong>)<br />
integrados na caça aos tesouros pelo CAp, encaminhada<br />
por uma série <strong>de</strong> pistas e enigmas.<br />
O tesouro, porém, não estava vazio como o do pirata<br />
pão-duro, mas continha surpresa: alegria, carinho<br />
e muitas balas.<br />
III O 2º <strong>ano</strong> trabalhou com a história do João e Maria.<br />
Ouviu mais <strong>de</strong> uma versão, conheceu o conto peru<strong>ano</strong><br />
“Achiqué” e comparou as histórias. Depois produziu<br />
o texto, recontando a história. E quanta história ren<strong>de</strong>u!<br />
Encerrou-se o 1º semestre, aproveitando esse contexto,<br />
com uma festa surpresa. As professoras Ana Letícia,<br />
Carmen e Lucia Fernanda prepararam para as crianças<br />
uma mesa farta <strong>de</strong> guloseimas e um bolo coberto <strong>de</strong><br />
chocolate e jujubas. Nessa história, não podia faltar<br />
a bruxa que foi tão bem representada pela querida<br />
inspetora do 2º <strong>ano</strong>, a Bárbara.<br />
www.cap.ufrj.br/perspectiva.html<br />
Festa no Olimpo – 13/7<br />
Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida com as turmas do 4º <strong>ano</strong><br />
do Ensino Fundamental. O evento marcou o ponto<br />
culminante da Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Trabalho sobre Mitologia<br />
Grega, oferecendo vários ambientes: jogos tradicionais,<br />
um espaço reservado para dança, mesa com comidas<br />
típicas gregas e outra com elementos representando os<br />
<strong>de</strong>uses olímpicos.<br />
Esta ativida<strong>de</strong> foi realizada pelo professor <strong>de</strong> Oficina da<br />
Palavra, a bibliotecária do <strong>Colégio</strong> e com a colaboração<br />
<strong>de</strong> bolsistas (PIBIAC).
COMO PUBLICAR EM PERSPECTIVA CAPIANA<br />
Perspectiva capiana é uma revista <strong>de</strong> divulgação que publica<br />
prioritariamente resultados <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> ensino, <strong>de</strong> pesquisa e <strong>de</strong><br />
extensão feitos no <strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong> da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<br />
do Rio <strong>de</strong> Janeiro (CAp-<strong>UFRJ</strong>), em todas as disciplinas, para<br />
um público amplo e heterogêneo. Os leitores da revista são, em<br />
geral, professores <strong>de</strong> ensino fundamental e médio da instituição;<br />
professores <strong>de</strong> outras escolas; licenciandos e alunos <strong>de</strong> graduação;<br />
professores universitários; pessoas que se interessam por educação<br />
e pelas disciplinas escolares, mas não dominam necessariamente<br />
conceitos básicos <strong>de</strong> todas as áreas. Os textos da revista exigem,<br />
portanto, clareza e simplicida<strong>de</strong>.<br />
Os textos submetidos à publicação como artigos <strong>de</strong>vem conter a<br />
contribuição original do(s) autor(es) para o tema tratado e <strong>de</strong>vem<br />
ser inéditos – não po<strong>de</strong>m ter sido publicados anteriormente em<br />
outro veículo <strong>de</strong> divulgação para o público em geral (mas po<strong>de</strong>m<br />
ter sido veiculados em revistas especializadas, por exemplo). Sempre<br />
que possível, os resultados <strong>de</strong> pesquisa ou do projeto do(s) autor(es)<br />
<strong>de</strong>vem ser expostos no texto.<br />
AVALIAÇÃO<br />
Consultores técnicos indicados pelos setores curriculares são<br />
consultados quando da submissão <strong>de</strong> um texto e orientam a equipe<br />
editorial da revista quanto ao que sugerir aos autores para corrigir<br />
ou a<strong>de</strong>quar o texto do ponto <strong>de</strong> vista técnico, quanto à qualida<strong>de</strong> do<br />
trabalho, à linguagem adotada e à conveniência <strong>de</strong> sua publicação.<br />
Os textos aprovados são selecionados para publicação <strong>de</strong> acordo<br />
com a avaliação dos editores, levando em conta a programação<br />
editorial e as especificida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada edição da revista. Os textos<br />
enviados pelos autores são ainda concomitantemente editados pela<br />
redação para a<strong>de</strong>quá-los à linha editorial da revista e <strong>de</strong>volvidos<br />
aos autores para aprovação. Em caso <strong>de</strong> não-aprovação, os editores<br />
buscarão aten<strong>de</strong>r às solicitações dos autores, <strong>de</strong>ntro do razoável do<br />
ponto <strong>de</strong> vista editorial. A revista não publicará nenhum texto não<br />
aprovado por seus autores em sua forma final. Títulos, subtítulos e<br />
chamadas <strong>de</strong> capa ficam a critério dos editores, embora as sugestões<br />
do(s) autor(es) sejam levadas em consi<strong>de</strong>ração.<br />
SEÇÕES DA REVISTA<br />
Os textos em perspectiva capiana estão divididos em seções. Para<br />
favorecer a edição, pe<strong>de</strong>-se que os autores avaliem previamente e<br />
indiquem a qual seção o seu texto melhor se a<strong>de</strong>qua:<br />
Entrevista: (a cargo da redação) relato <strong>de</strong> perguntas e respostas em<br />
bate-papo com figuras <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque sobre temas relevantes para a<br />
escola, para o ensino <strong>de</strong> disciplinas ou para a educação em geral.<br />
Artigos por setor curricular: Devem apresentar trabalhos <strong>de</strong>ntro do<br />
quadro da disciplina do(s) autor(es), e <strong>de</strong>vem conter título, nome(s)<br />
do(s) autor(es) e pequena apresentação pessoal, abertura (resumo),<br />
setor curricular (Geografia, Música, SOE, etc.), sugestões para leitura<br />
e ilustrações/fotos <strong>de</strong>vidamente legendadas e com créditos. Não<br />
<strong>de</strong>vem exce<strong>de</strong>r 15.000 caracteres com espaço (aproximadamente<br />
2.400 palavras).<br />
Construindo Pontes: artigos publicados por dois ou mais autores <strong>de</strong><br />
diferentes setores curriculares, com temática interdisciplinar.<br />
Seguem a formatação dos artigos.<br />
Na Prática: textos <strong>de</strong>stacando os trabalhos realizados no quadro<br />
das Práticas <strong>de</strong> Ensino. Devem conter abertura (resumo), título,<br />
ilustrações e pequena apresentação do(s) autor(es). Tamanho máximo<br />
<strong>de</strong> 11.000 caracteres com espaço (~1.800 palavras).<br />
Opinião: consi<strong>de</strong>rações pessoais sobre temas relacionados à educação<br />
ou com o ensino na escola. É importante que os fatos e argumentos<br />
sejam <strong>de</strong>scritos com objetivida<strong>de</strong>, permitindo ao leitor contrastar e<br />
evoluir sua própria opinião sobre o assunto. Os textos <strong>de</strong>vem conter<br />
abertura (resumo), título, nome e breve apresentação do(s) autor(es).<br />
Tamanho máximo <strong>de</strong> 11.000 caracteres com espaço (~1.800<br />
palavras).<br />
Sem Fronteiras: textos encomendados pelos editores a autores <strong>de</strong> fora<br />
do CAp-<strong>UFRJ</strong> para enriquecer as reflexões em curso na escola.<br />
Devem conter título, abertura (resumo) e nome, foto e pequena<br />
apresentação do(s) autor(es). Tamanho máximo <strong>de</strong> 11.000 caracteres<br />
com espaço (~1.800 palavras).<br />
Memória: textos sobre aspectos pouco difundidos da história<br />
do CAp-<strong>UFRJ</strong> ou da educação. Devem ser pouco técnicos,<br />
<strong>de</strong>stacando o contexto da época e as personagens envolvidas.<br />
Devem conter abertura (resumo), nome e breve apresentação<br />
do(s) autor(es), título e ilustrações. Tamanho i<strong>de</strong>al: 7.500<br />
caracteres com espaço (~1.200 palavras).<br />
Resenhas: apresentação crítica <strong>de</strong> um livro ou outro produto cultural<br />
<strong>de</strong> interesse. Não <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>screver a obra em <strong>de</strong>talhes, mas apontar<br />
sua relevância no contexto do ensino. Os textos <strong>de</strong>vem conter os<br />
dados da obra analisada (título, autor, custo, etc.), bem como o nome<br />
e ocupação do(s) autor(es). Tamanho i<strong>de</strong>al: 3.800 caracteres com<br />
espaço (~600 palavras).<br />
Notas: eventos <strong>de</strong> interesse ocorridos ao longo dos seis<br />
meses prévios à edição da revista. Devem ser sintéticas e<br />
informativas (~90 palavras).<br />
OUTRAS INFORMAÇÕES<br />
As opções <strong>de</strong> formatação adotadas pela revista para a edição dos<br />
textos e outros <strong>de</strong>talhes (p. ex., envio <strong>de</strong> imagens), po<strong>de</strong>m ser<br />
obtidas pelo e-mail: perspectiva@cap.ufrj.br.<br />
Os autores ce<strong>de</strong>m automaticamente os direitos autorais <strong>de</strong> seus<br />
textos para sua publicação na edição correspon<strong>de</strong>nte da revista e<br />
em eventuais coletâneas posteriores. Após a publicação, sugerese<br />
que quando veiculados em outros meios o(s) autor(es) cite(m) a<br />
publicação em perspectiva capiana como fonte primária: ‘Este artigo<br />
foi publicado originalmente em perspectiva capiana (v. n, n° n, p. n)’.<br />
Todos os autores <strong>de</strong> artigos e da seção Construindo Pontes recebem<br />
8 edições da revista em que foram publicados seus artigos para<br />
distribuição própria. Autores <strong>de</strong> outras seções recebem 5 edições.<br />
ENVIO DE TEXTOS<br />
Todos os textos e anexos <strong>de</strong>vem ser enviados por e-mail para a<br />
redação (perspectiva@cap.ufrj.br) <strong>de</strong>ntro dos prazos <strong>de</strong> fechamento<br />
das edições (até 30/04 para as edições ímpares; até 31/09 para as<br />
edições pares).<br />
Textos recebidos após a data <strong>de</strong> fechamento ou fora do formato<br />
requerido para publicação possivelmente só serão consi<strong>de</strong>rados para<br />
publicação na edição seguinte.
<strong>Colégio</strong> <strong>de</strong> <strong>Aplicação</strong><br />
CAp-<strong>UFRJ</strong><br />
Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro – <strong>UFRJ</strong>