Anotações sobre Direito insurgente - Centro de Ciências Jurídicas ...
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C<br />
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aptura<br />
Revista Discente do Curso <strong>de</strong> Pós-Graduação em <strong>Direito</strong><br />
ríptica Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina<br />
mesmo para todas as épocas e lugares, <strong>de</strong>vendo ser aplicado indistintamente,<br />
sem levar em conta as gran<strong>de</strong>s diferenças sociais, econômicas e culturais <strong>de</strong><br />
classe, tanto aos interesses dos possuidores como aos dos <strong>de</strong>spossuídos. Pois ao<br />
romper com a I<strong>de</strong>ologia jurídica dominante, o direito <strong>insurgente</strong> nega, além da<br />
i<strong>de</strong>ologia mesma, os sistemas legais <strong>de</strong>la <strong>de</strong>rivados, e nesse sentido será contra<br />
a lei ou condicionante da aplicação da lei. Na primeira hipótese, quando pela<br />
prática política dos subalternizados obstar-se ao <strong>de</strong>spejo <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong>; na<br />
segunda, ao lograr-se o amoldamento da lei às lutas espedficas do trabalhador,<br />
por exemplo a sujeição do direito <strong>de</strong> posse ao estado social <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> ou à<br />
função social da proprieda<strong>de</strong>.<br />
Com a prática das abstrações, o direito burguês, dogmatizado, elaborou,<br />
pela imaginária da universalização e generalização da norma, no conceito <strong>de</strong><br />
vonta<strong>de</strong> da lei, a equalização político-jurídica que, unificando as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s<br />
concretas em formulações abstratas, veio a garantir, no concreto, os<br />
mecanismos <strong>de</strong> dispersão das contradições sociais e <strong>de</strong> acumulação<br />
indispensáveis à reprodução e ampliação do capital. É pela abstração da<br />
realida<strong>de</strong>, confinada nos conceitos fundamentos <strong>de</strong> sujeito jurídico, contrato e<br />
proprieda<strong>de</strong> privada, que o direito burguês reduz a conflitos individuais os<br />
confrontos sociais <strong>de</strong> classe. Boaventura <strong>de</strong> Souza Santos (O Discurso e o<br />
Po<strong>de</strong>r, Fabris, 1988, pg. 93) toca com precisão no ponto: "o fato <strong>de</strong> o cidadão<br />
isolado ser o único sujeito reconhecido dos conflitos juridicamente relevantes<br />
coloca fora da prática oficial as relações <strong>de</strong> classe não só aquelas que<br />
eventualmente contribuíram para a criação do litígio mas também as que<br />
interce<strong>de</strong>m na resolução <strong>de</strong>ste – e <strong>de</strong>sta forma contribui para a invisibilização<br />
do conteúdo classista da dominação jurídica". No mesmo texto Boaventura<br />
ressalva que a mistificação não é total "pois que os litígios, na sua estrutura <strong>de</strong><br />
superfície, são realmente protagonizados por indivíduos. Só que – prossegue –<br />
esta dimensão não é a única e, na maioria esmagadora <strong>de</strong> casos, não é sequer a<br />
mais importante, e é nesta sonegação das restantes dimensões (supraindividuais)<br />
que resi<strong>de</strong> o caráter i<strong>de</strong>ológico da construção jurídica-capitalista".<br />
Assim, por exemplo, o contrato <strong>de</strong> trabalho, ajustado entre sujeitos<br />
jurídicos individuais (o trabalhador e a empresa), serve para escon<strong>de</strong>r a<br />
contradição entre o capital e o trabalho (dimensão supra-individual); a<br />
proprieda<strong>de</strong> privada e o contrato <strong>de</strong> compra e venda (relações individuais entre<br />
sujeitos jurídicos) impe<strong>de</strong>m que o trabalhador, sem acesso ao dinheiro<br />
(mercadoria monopolizada pelas camadas privilegiadas através <strong>de</strong> mecanismos<br />
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CAPTURA CRÍPTICA: direito, política, atualida<strong>de</strong>. Florianópolis, n.3., v.1., jul./<strong>de</strong>z. 2010