Manuel Picas de Carvalho, O Seminário, uma ... - Diocese de Braga
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O <strong>Seminário</strong>,<br />
<strong>uma</strong> escola <strong>de</strong> vida<br />
Oriundo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> família <strong>de</strong> 9 irmãos, era o<br />
2º mais velho, com espírito irrequieto e bastante<br />
traquina, foi “esse pedaço <strong>de</strong> barro” que o<br />
<strong>Seminário</strong> ajudou a moldar. Como o alicerce <strong>de</strong><br />
um edifício <strong>de</strong>ve ser bem estruturado, também o<br />
que recebi no <strong>Seminário</strong>, constituiu a base sólida<br />
da vida futura, que entretanto encetei.<br />
Fui para o <strong>Seminário</strong> pela mão e incentivo,<br />
do agora Padre Adélio Ferreira da Silva Loureiro,<br />
actual Pároco <strong>de</strong> Junqueira, Vila do Con<strong>de</strong>, ao<br />
tempo teólogo, que vivia na minha al<strong>de</strong>ia (Lama-<br />
Barcelos). Aliás, comemorando esse sacerdote,<br />
no corrente ano, as Bodas <strong>de</strong> Ouro Sacerdotais,<br />
<strong>de</strong>sejo, como preito <strong>de</strong> gratidão, virtu<strong>de</strong> por vezes<br />
tão esquecida, prestar-lhe a minha homenagem<br />
e agra<strong>de</strong>cer-lhe esse seu gesto, bem como as<br />
inúmeras atenções e ajudas, que me prestou. Bem<br />
haja Sr Padre Adélio e que o Senhor o recompense<br />
e retribua, cem por um.<br />
Depois do exame <strong>de</strong> admissão, ingressei<br />
no <strong>Seminário</strong> <strong>de</strong> Nª Srª da Conceição, em 1953,<br />
quando fazia 10 anos. Quando o meu pai me foi<br />
levar a <strong>Braga</strong>, bem como, à pequena mala que<br />
acondicionava o meu singelo enxoval, toda a<br />
roupa ia marcada com o nº393, número que me<br />
foi atribuido pelo <strong>Seminário</strong>, para as peças não<br />
se confundirem com a roupa dos colegas. Como<br />
não levava <strong>uma</strong> caneta, o meu pai <strong>de</strong>ixou-me no<br />
recreio do <strong>Seminário</strong> e foi à cida<strong>de</strong> comprar a<br />
caneta. Quando voltou, já me encontrou a jogar<br />
futebol, com um grupo <strong>de</strong> outros seminaristas.<br />
Tinham transigido que o fe<strong>de</strong>lho integrasse <strong>uma</strong><br />
das equipas, com a condição <strong>de</strong> ser guarda-re<strong>de</strong>s<br />
(já não recordo quantos golos sofri). Depois <strong>de</strong><br />
se <strong>de</strong>spedir <strong>de</strong> mim, o meu pai lá regressou a<br />
casa mais tranquilo, por verificar aquela minha<br />
“integração”. Contudo, não foi tão fácil assim,<br />
<strong>Manuel</strong> <strong>Picas</strong> <strong>de</strong> <strong>Carvalho</strong><br />
Coronel da GNR aposentado<br />
pois sentia muitas sauda<strong>de</strong>s dos meus pais e<br />
dos meus irmãos. Para atenuar essas sauda<strong>de</strong>s,<br />
a minha mãe, <strong>de</strong> 15 em 15 dias, vinha visitar-me<br />
e trazer os “mimos” possíveis. A vida era difícil<br />
e as dificulda<strong>de</strong>s eram muitas. Para pagar as<br />
mensalida<strong>de</strong>s e as outras <strong>de</strong>spesas, que se iam<br />
fazendo, os meus pais chegaram, com alg<strong>uma</strong><br />
frequência, a ter <strong>de</strong> pedir dinheiro a <strong>uma</strong> ou<br />
duas pessoas amigas. Dificilmente se aquilata,<br />
nos tempos <strong>de</strong> hoje, os sacrifícios que tiveram <strong>de</strong><br />
ser feitos, para me assegurar um futuro melhor.<br />
Por tudo e por este esforço hercúleo que fizeram,<br />
estou-lhes, também, eternamente grato.<br />
Nos primeiros anos, as <strong>de</strong>slocações que<br />
fazíamos <strong>de</strong> e para a capela, salão <strong>de</strong> estudos,<br />
refeitório, salas <strong>de</strong> aula, passeios, <strong>de</strong>slocações à<br />
Sé, etc..., tudo era feito em formatura, por alturas.<br />
Qual tropa, qual quê?! Comecei por ser o 3º ou<br />
4º par da forma, mas no 5º ano, por exemplo,<br />
ainda que franzino, passei a ser dos mais altos.<br />
Há, aliás, um facto curioso, que ocorreu nessa<br />
época. No final do 4º ano tínhamos <strong>de</strong> mandar<br />
fazer batina, pois no 5º já a usávamos. Assim<br />
suce<strong>de</strong>u, fui tirar as medidas para a batina e no<br />
início do 5º ano lá apareci, como os <strong>de</strong>mais, com<br />
a batina vestida. Suce<strong>de</strong>u, porém, que nesse ano<br />
<strong>de</strong>i <strong>uma</strong> “cresci<strong>de</strong>la” invulgar, pelo que, no final<br />
do 5º ano a batina já me dava pelos joelhos. Ora,<br />
como jogávamos Futebol, frequentemente, com a<br />
batina, essa circunstância funcionava como <strong>uma</strong><br />
mais valia, em relação aos meus colegas.<br />
Pelo que me conheço, julgo que teria<br />
vocação. Contudo, escrevendo Deus direito,<br />
por linhas tortas, enten<strong>de</strong>u o responsável do<br />
<strong>Seminário</strong> <strong>de</strong> Filosofia que, por ter contrariado<br />
alg<strong>uma</strong>s regras, <strong>de</strong>signadamente, por ter<br />
participado num jogo <strong>de</strong> futebol, na minha al<strong>de</strong>ia,
contra as orientações dadas, <strong>de</strong>veria <strong>de</strong>ixar o<br />
<strong>Seminário</strong> no final do Curso Filosófico. Assim<br />
suce<strong>de</strong>u, pelo que tive <strong>de</strong> equacionar <strong>uma</strong> nova<br />
prespectiva <strong>de</strong> futuro, enveredando pela vida<br />
castrense.<br />
Ainda que, com muita pena minha,<br />
acatei a <strong>de</strong>cisão e abracei então a vida militar,<br />
enveredando mais tar<strong>de</strong> pelo serviço polícial,<br />
que me ligou à GNR. A “recruta”, estava feita,<br />
tinha-a vivido no <strong>Seminário</strong>, on<strong>de</strong> aprendi a<br />
estruturar a minha personalida<strong>de</strong>, a cultivar a<br />
amiza<strong>de</strong> e camaradagem, a ser solidário, a criar<br />
hábitos <strong>de</strong> estudo e pontualida<strong>de</strong>, e, sem ter sido<br />
um estudante exemplar, era mediano, aprendi<br />
e <strong>de</strong>scobri a <strong>de</strong>senvolver <strong>uma</strong> cultura geral<br />
relativamente bem estruturada, e a explorar<br />
e dar relevo ao lado positivo das coisas e das<br />
dificulda<strong>de</strong>s. Houve, certamente, erros, alguns<br />
excessos, e até se cometeram alg<strong>uma</strong>s injustiças.<br />
On<strong>de</strong> há homens, há essa possibilida<strong>de</strong>. Contudo,<br />
o cômputo geral é, indubitavelmente, positivo,<br />
em larga margem, pelo que para mim e para<br />
muitos da minha geração, o <strong>Seminário</strong> foi <strong>uma</strong><br />
gran<strong>de</strong> ESCOLA, e, espero que, mutatis mutandis,<br />
continue a ser nos tempos <strong>de</strong> hoje, para os actuais<br />
seminaristas.<br />
Finalmente, o <strong>Seminário</strong> proporcionoume,<br />
ainda, <strong>uma</strong> maior e melhor consciência<br />
cristã, moral, social, profissional e <strong>de</strong> cidadania,<br />
<strong>de</strong> tal modo que, por exemplo, como marido e<br />
pai <strong>de</strong> um “regimento familiar”, ajudou-me a<br />
amadurecer o relacionamento com o Criador<br />
e com a comunida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> estamos inseridos<br />
e on<strong>de</strong> procuramos ser elementos activos,<br />
procurando pôr a ren<strong>de</strong>r os talentos com que<br />
Deus nos dotou.<br />
<strong>Braga</strong>, 05 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 2008 www.acaminho.net