19.04.2013 Views

Download Revista Louis Braille nº0. (.pdf, 563 KB) - acapo

Download Revista Louis Braille nº0. (.pdf, 563 KB) - acapo

Download Revista Louis Braille nº0. (.pdf, 563 KB) - acapo

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

Internacional<br />

União Mundial de Cegos<br />

Emprego<br />

Grupo Jerónimo Martins<br />

Ciência<br />

Oftalmologia nos últimos<br />

20 anos<br />

Educação<br />

O aluno com deficiência<br />

visual<br />

Acessibilidades<br />

Um termo abrangente<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011<br />

Todos os direitos reservados, ACAPO


Editorial<br />

Carlos Manuel C. Lopes<br />

Presidente da Direção Nacional da Associação dos<br />

Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO)<br />

É com grande satisfação que escrevo as primeiras<br />

linhas deste número da <strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong>, agora que 20<br />

anos passaram da sua primeira edição e que 10 anos<br />

decorreram após a publicação do seu último exemplar.<br />

Esta satisfação deve-se ao facto de, no meu entender<br />

partilhado pelos restantes elementos da Direção<br />

Nacional da ACAPO – a nova <strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong>, embora<br />

ancorada em princípios ligeiramente diferentes dos<br />

adotados nas suas primeiras edições, continuar a<br />

assumir a relevância de outros tempos, colmatando a<br />

lacuna que se vem sentindo no que concerne à<br />

produção e difusão de conhecimento relacionado com<br />

a deficiência visual, nas suas múltiplas vivências e<br />

contextos.<br />

É pois nossa intenção que a revista <strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong>, que<br />

agora surge com periodicidade trimestral e em suporte<br />

digital, venha a desempenhar um papel de estímulo à<br />

produção de conteúdos técnico-científicos sobre a<br />

deficiência visual, promovendo a sua sistematização e<br />

difusão e, sobretudo, contribuindo para educar e formar<br />

a comunidade em geral. Estamos convictos de que<br />

pessoas mais bem esclarecidas e formadas tenderão a<br />

adotar comportamentos, atitudes e medidas mais<br />

ajustadas, responsáveis e concernentes com o modelo<br />

de sociedade inclusiva que todos alegadamente<br />

preconizamos, mas que nem todos praticamos.<br />

“É pois nossa intenção que a revista <strong>Louis</strong><br />

<strong>Braille</strong>, que agora surge com periodicidade<br />

trimestral e em suporte digital, venha a<br />

desempenhar um papel de estímulo”<br />

Indubitavelmente, ao longo dos últimos 60 anos, foram<br />

alcançadas importantes conquistas, em especial no<br />

que se refere à adoção e ratificação de convenções<br />

internacionais, à produção de alguma legislação de<br />

âmbito geral e setorial e à adoção de cartas de<br />

princípios ou de boas intenções, documentos estes<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |<br />

2<br />

que de um modo mais ou menos explícito consagram e<br />

garantem o direito a uma plena cidadania as pessoas<br />

com deficiência. Todavia, não é menos verdade a<br />

existência, ainda hoje, de inúmeros e sérios obstáculos<br />

que diariamente impedem ou limitam a tão almejada<br />

igualdade de oportunidades das pessoas cegas e com<br />

baixa visão, quando comparadas com a restante<br />

população. Poderia, portanto, e com certeza precisaria<br />

de muitas páginas, abordar ao longo deste texto as<br />

carências e os constrangimentos que tantas vezes<br />

impedem os alunos com deficiência visual de ter uma<br />

educação e uma formação de qualidade; poderia determe,<br />

e por certo teria «pano para mangas», na grande<br />

dificuldade sentida pelas pessoas cegas ou com baixa<br />

visão no acesso, manutenção e progressão no<br />

mercado de trabalho, dificuldades estas tantas vezes<br />

explicadas por atitudes mais ou menos encapotadas de<br />

discriminação e que se traduzem em taxas de<br />

desemprego muito superiores às da população em<br />

geral; poderia mencionar os inúmeros entraves<br />

sentidos no acesso à informação, à cultura, ao lazer ou<br />

ao desporto, porque em todas estas áreas, sendo certo<br />

que alguns avanços foram alcançados, não é menos<br />

verdade que muito há ainda a fazer de modo a<br />

cumprirmos, por exemplo, o estipulado na Convenção<br />

sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.<br />

“Indubitavelmente, ao longo dos últimos 60 anos,<br />

foram alcançadas importantes conquistas”<br />

Gostaria, no entanto, ainda, de partilhar convosco um<br />

convite, uma recomendação e, por fim, uma<br />

preocupação.<br />

Começo pelo convite que, ao fim ao cabo, nada traz de<br />

inovador, mas que, no meu entender, a ser aceite por<br />

todos, evitará muitas (se não todas) as situações de<br />

discriminação negativa a que as pessoas com<br />

deficiência visual estão sujeitas. Julgo ser consensual o<br />

facto de todos aceitarmos que a deficiência visual traz<br />

consigo algumas limitações, umas quantas<br />

ultrapassáveis mediante a introdução de adaptações<br />

específicas, o que só por si não impede que estas<br />

pessoas desenvolvam e possuam capacidades<br />

suscetíveis de serem expressas em diferentes<br />

contextos pessoais, sociais e profissionais. Convidovos<br />

pois a um esforço consciente de perceção realista<br />

das pessoas com deficiência visual, esforço esse que<br />

abra espaço para a criação de oportunidades de<br />

demonstração de competências e que permita evitar ou<br />

atenuar o preconceito de que, de certo modo, a<br />

deficiência visual contamina todas as outras<br />

capacidades da pessoa, tornando-a globalmente inapta<br />

ou menos válida.<br />

Mas este modo de olhar as pessoas com deficiência<br />

tem, em primeira instância, de ser assumido por elas<br />

próprias e por aqueles que com elas diretamente se<br />

relacionam, pelo que considero de importância<br />

primordial a necessidade de todos nós, quer sejamos


decisores políticos, educadores, formadores,<br />

encarregados de educação ou alunos, mantermos e<br />

exigirmos padrões elevados de qualidade na educação<br />

de crianças e de jovens com deficiência visual. A<br />

cegueira não pode, só por si, justificar a introdução de<br />

medidas facilitadoras do processo de estudo do aluno,<br />

medidas estas que, se nuns casos tentam encobrir<br />

carências da escola ao nível dos recursos técnicos e<br />

humanos especializados, em outros se explicam tãosomente<br />

pelo facto de professores, pais e até mesmo<br />

os próprios alunos estarem imbuídos da crença<br />

explicitada nos parágrafos anteriores, e que segundo a<br />

qual, a deficiência visual contamina outras<br />

capacidades, tornando o aluno menos preparado para<br />

acompanhar as aprendizagens da turma em que está<br />

inserido. A introdução destas medidas de discriminação<br />

positiva, desnecessárias e descabidas, tem vindo a<br />

comprometer seriamente o ingresso destes alunos com<br />

êxito em cursos de nível superior e no mercado de<br />

trabalho. Mais, estamos, no meu entender, a educar<br />

uma geração de alunos que, salvo boas e felizmente<br />

ainda umas quantas exceções, se encontra nivelada<br />

por baixo, acomodada, sem ter por referência padrões<br />

de exigência, de rigor e de perseverança.<br />

Sou da opinião que este não é um problema que afete<br />

apenas os alunos com deficiência visual, mas sim que<br />

se estende a todos os alunos quer tenham ou não<br />

algum tipo de necessidades especiais. Unicamente, e<br />

pelo facto das oportunidades de estudo e de trabalho<br />

disponíveis para as pessoas com deficiência visual<br />

serem substancialmente mais reduzidas, o impacto de<br />

uma cultura de menor exigência tem sobre elas<br />

maiores repercussões negativas.<br />

Por último, deixo-vos uma preocupação mas também<br />

um alerta que se prende com a difícil situação<br />

Ficha Técnica<br />

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

económico-financeira que o País atravessa e que, no<br />

meu entender, não pode servir de pretexto para a não<br />

adoção de medidas tendentes à construção de uma<br />

sociedade verdadeiramente inclusiva, na qual as<br />

pessoas cegas ou com baixa visão participem de pleno<br />

direito, de forma autónoma e com igualdade de<br />

oportunidades. Tornar-se-á muito fácil, mas no meu<br />

entender de todo inaceitável, que se utilize a crise<br />

económica para justificar a não introdução de medidas<br />

e de soluções que tantas vezes não acarretam sequer<br />

quaisquer custos financeiros acrescidos. Estou certo de<br />

que todos nós, pessoas com deficiência, queremos dar<br />

o nosso melhor contributo para auxiliar Portugal a<br />

enfrentar e a superar este momento difícil, mas não<br />

podemos aceitar que se cave ainda mais o foço que<br />

nos separa da restante população no que concerne a<br />

nossa participação social.<br />

Ao longo deste editorial optei por me referir a três<br />

aspetos que, apesar de aparentemente avulsos,<br />

concorrem para a melhoria da qualidade de vida das<br />

pessoas com deficiência visual. Estou em crer que se<br />

adotarmos padrões de exigência elevados, de rigor, de<br />

empreendedorismo, de capacitação, se olharmos para<br />

as pessoas com deficiência como cidadãos de pleno<br />

direito, com algumas limitações mas também com<br />

muitas capacidades, se criarmos as condições que<br />

garantam a igualdade de oportunidades, nesse<br />

momento sim, estaremos a caminhar para uma<br />

sociedade verdadeiramente inclusiva.<br />

É esse caminho que <strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong>, ainda que de forma<br />

humilde, pretende ajudar a desbravar. O restante,<br />

como disse acima, caberá a cada um de nós,<br />

individualmente ou em conjunto fazer. LB<br />

EDIÇÃO E SEDE ACAPO, Avenida D. Carlos I, n.º 126 9º andar 1200-651 Lisboa<br />

CONTACTO GERAL Telefone: 213244500 Fax: 213244501 Website: www.<strong>acapo</strong>.pt E-mail: louisbraille@<strong>acapo</strong>.pt<br />

DIRETOR Carlos Manuel C. Lopes (carloslopes@<strong>acapo</strong>.pt)<br />

COORDENAÇÃO Rúben Portinha (rubenportinha@<strong>acapo</strong>.pt)<br />

COORDENAÇÃO ADJUNTA Pedro Velhinho (pedrovelhinho@<strong>acapo</strong>.pt), Rodrigo Santos (rodrigosantos@<strong>acapo</strong>.pt)<br />

REDAÇÃO Cláudia Vargas Candeias (claudiavargas@<strong>acapo</strong>.pt), Pedro Velhinho, Rodrigo Santos, Rúben Portinha<br />

LAYOUT Think High<br />

PAGINAÇÃO Think High<br />

@ <strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong> – <strong>Revista</strong> especializada para a área da deficiência visual 2011. Todos os direitos reservados. Todo o conteúdo desta revista não<br />

pode ser replicado, copiado ou distribuído sem autorização prévia. Os artigos de opinião publicados na revista são da inteira responsabilidade dos<br />

seus autores. Se pretende deixar de receber a nossa revista, envie-nos um e-mail por favor para o endereço louisbraille@<strong>acapo</strong>.pt<br />

Os conteúdos desta revista foram escritos segundo as regras do novo acordo ortográfico.<br />

APOIO FINANCEIRO<br />

Instituto Nacional para a Reabilitação I.P.<br />

3<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |


Internacional<br />

Maryanne Diamond<br />

Presidente da União Mundial de Cegos<br />

Entrevista: Rodrigo Santos<br />

Tradução: Maria do Rosário Cunha*<br />

“Não será esta crise a impedir-nos<br />

de cumprir o nosso objetivo”<br />

Ao longo do seu percurso já ocupou diversos cargos<br />

em organizações de defesa dos direitos das pessoas<br />

com deficiência. Atualmente é Diretora de Relações<br />

Internacionais e Institucionais da Vision Australia, uma<br />

instituição, sem fins lucrativos, que presta serviços a<br />

pessoas com deficiência visual. Mas até 2012, a<br />

principal prioridade de Maryanne Diamond é a<br />

presidência da União Mundial de Cegos.<br />

Pergunta: Quais são as expetativas da União<br />

Mundial de Cegos relativamente aos Objetivos de<br />

Desenvolvimento do Milénio (ODMs), agora que<br />

estes abrangem questões especificamente<br />

relacionadas com a deficiência?<br />

Resposta: Que todos os Estados garantam ativamente<br />

o cumprimento dos ODMs e incluam as pessoas com<br />

deficiência, em mais do que uma declaração geral de<br />

inclusão. Questões como a educação, a igualdade de<br />

género, a participação no trabalho são temas nucleares<br />

do trabalho da União Mundial de Cegos e estão<br />

espelhadas no nosso Plano de Ação 2009-2012.<br />

P: Atendendo aos objetivos estratégicos definidos<br />

até 2012 pela UMC, quais considera serem as<br />

maiores conquistas que conseguiram atingir até à<br />

data, e quais serão os próximos passos da UMC<br />

para a construção de uma sociedade totalmente<br />

inclusiva?<br />

R: Se nos reportamos ao presente período do<br />

mandato, nós, seguramente, já acedemos à informação<br />

da agenda mundial. Com a nossa proposta de tratado à<br />

WIPO [Organização Mundial da Propriedade<br />

Intelectual] existe um acordo universal sobre a<br />

necessidade de melhorar o acesso à informação por<br />

parte das pessoas cegas. Falta apenas chegar a um<br />

acordo mais detalhado ou encontrar um instrumento<br />

que possibilite torná-lo uma realidade. Com a<br />

“Educação para Todos”, uma iniciativa do ICEVI<br />

[Conselho Internacional para a Educação das Pessoas<br />

com Deficiência Visual] e da UMC, já alcançámos<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |<br />

4<br />

grandes resultados. Graças a esta iniciativa centenas<br />

de crianças frequentam hoje o sistema de<br />

ensino.Também já colocámos o <strong>Braille</strong> na agenda.<br />

Celebrámos 2009 olhando para trás 200 anos. Com o<br />

Congresso Mundial <strong>Braille</strong>21, celebrámos o braille de<br />

olhos no futuro. O nosso trabalho em colaboração e<br />

parceria com várias organizações tem sido um grande<br />

sucesso para a UMC. O trabalho com os outros é o<br />

garante de que os educamos não só a eles, como a<br />

nós próprios. Um exemplo disto é a constituição da<br />

Vision Alliance. Trata-se do reconhecimento da<br />

importância de questões como a prevenção, tratamento<br />

e reabilitação educacional/funcional.<br />

P: Como encara a UMC o papel de blocos e<br />

parcerias internacionais de associações de<br />

pessoas cegas e amblíopes que partilham a mesma<br />

língua, assim como, a possível constituição de um<br />

grupo de membros da UMC de língua (oficial)<br />

portuguesa?<br />

R: A UMC já integra esses grupos como membro<br />

internacional. Foi constituída a União Francófona de<br />

Cegos e mais recentemente a União Árabe de Cegos.<br />

Pensamos que grupos como estes têm um papel muito<br />

importante a desempenhar, na defesa dos direitos das<br />

pessoas com deficiência visual, e podem apoiar-se<br />

mutuamente, independentemente da sua área<br />

geográfica.<br />

P: Perante os cenários de crise financeira dos<br />

governos, como pensa que estas situações<br />

poderão afetar os direitos das pessoas cegas e<br />

amblíopes? Em geral, pensa que a limitação dos<br />

recursos financeiros constituirá um sério obstáculo<br />

para a prossecução de uma sociedade plenamente<br />

inclusiva?<br />

R: Esta crise financeira teve repercussões a nível<br />

mundial e a União Mundial de Cegos não foi excluída.<br />

Sentimos, tal como muitas outras organizações,<br />

dificuldades em encontrar recursos para desempenhar<br />

o nosso trabalho. Alcançar um mundo plenamente<br />

inclusivo é um objetivo a longo prazo e esta crise não<br />

vai perdurar para sempre no tempo. Por isso, não será<br />

esta crise a impedir-nos de cumprir o nosso objetivo.<br />

Podemos sim atuar de uma forma distinta, temos de<br />

nos tornar mais criativos e inovadores. Ou seja,<br />

encarar o nosso trabalho de uma perspetiva diferente.<br />

P: Quais são, na sua opinião, as prioridades-chave<br />

para os próximos anos para todos os membros da<br />

UMC e para a própria UMC?<br />

R: Desde logo, dotar as pessoas com deficiência visual<br />

de ferramentas necessárias para que possam, elas<br />

próprias, defender os seus direitos (self-advocacy);<br />

oferecer-lhes uma educação de qualidade; promover a<br />

igualdade de acesso ao mercado de trabalho; e<br />

possibilitar a sua participação na comunidade, como<br />

qualquer outro cidadão. LB<br />

* Responsável pelo Departamento de Relações<br />

Internacionais da ACAPO


Acessibilidades<br />

Acessibilidade,<br />

um termo abrangente<br />

Por Joana Afonso, Paula Azevedo e Peter Colwell *<br />

Para o público em geral, a acessibilidade é um assunto<br />

ligado à deficiência motora: uma rampa que permite o<br />

acesso a um edifício público ou uma casa de banho<br />

com barras de apoio. Esta opinião é compreensível<br />

porque ambos os exemplos têm um grande impacto<br />

visual, em particular, quando a rampa é algo que foi<br />

construído depois da conclusão do edifício e não se<br />

enquadra esteticamente com a fachada original. Por<br />

outro lado, o símbolo internacional de acessibilidade é<br />

a representação de uma pessoa numa cadeira de<br />

rodas, o que reforça esta noção redutora sobre o tema.<br />

A própria legislação (nacional e internacional) dedica<br />

mais normas técnicas às necessidades dos utilizadores<br />

de cadeira de rodas do que das pessoas com outras<br />

incapacidades.<br />

Contudo, o conceito de acessibilidade é muito mais<br />

abrangente. É, sem dúvida, necessário garantir o<br />

acesso aos locais públicos a todos. Mas o assunto<br />

começa ainda antes da entrada em determinado local<br />

público porque os potenciais utilizadores têm de ter a<br />

possibilidade de identificar o local, os serviços ali<br />

prestados e o horário de funcionamento. Ou seja, tem<br />

de ser fornecida sinalética que comunique com o maior<br />

número de pessoas possível, através de letras<br />

convencionais bem legíveis, braille e som.<br />

E, naturalmente, antes de usufruir de um serviço ou<br />

espaço, o utente tem de chegar até lá, o que pode<br />

acontecer apenas se os transportes e a via pública<br />

forem livres de barreiras. No campo dos transportes<br />

tem de se assegurar a legibilidade dos horários e<br />

bilhetes, a usabilidade das máquinas de venda e a<br />

evacuação de passageiros com mobilidade reduzida<br />

em situações de emergência, entre outros aspetos.<br />

Efetivamente, a questão da acessibilidade surge em<br />

todas as áreas onde alguém desenha algo para ser<br />

5<br />

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

usado por outros. Alguns autores defendem que<br />

acessibilidade é simplesmente uma questão de «bom<br />

design»: quando criam um produto, um manual de<br />

instruções ou uma página da Web, pretendem que todo<br />

o público possa usar a sua criação.<br />

“A questão da acessibilidade surge sempre<br />

quando alguém desenha algo para ser usado<br />

por outros”<br />

Para outros, é uma questão de direitos: pretendem que<br />

todas as pessoas, quaisquer que sejam as suas<br />

capacidades e dificuldades, possam viver de um modo<br />

independente e participar plenamente na sociedade.<br />

Consequentemente, tem de ser garantido o acesso à<br />

educação, habitação, serviços de saúde, informação e<br />

comunicações, e permitir plena participação na vida<br />

política e cultural do país. E há um longo caminho a<br />

percorrer – qualquer cidadão consegue facilmente<br />

identificar barreiras, desde o tamanho de letra usado<br />

numa lista de ingredientes até aos carros estacionados<br />

no passeio.<br />

Vão demorar alguns anos e teremos de contar com<br />

muita vontade por parte dos projetistas para equipar o<br />

país com passeios livres de barreiras. E, neste caso<br />

em particular, vai ser necessária uma mudança de<br />

atitude por parte de alguns condutores, que têm de<br />

aceitar que o tempo que poupam estacionando em<br />

cima de um passeio é traduzido em tempo perdido,<br />

transtorno e acidentes evitáveis para dezenas de<br />

peões.<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |


Formação insuficiente<br />

Regra geral, a formação dos arquitetos, designers,<br />

gestores urbanos e informáticos não os prepara para<br />

projetar espaços, serviços e produtos para pessoas<br />

com mobilidade reduzida. Ainda que sem intenção,<br />

excluem pessoas, pois imaginam que o público em<br />

geral pode subir escadas, manipular comandos e ler<br />

instruções. Esta lacuna nos seus conhecimentos pode<br />

ser ultrapassada através da participação de pessoas<br />

com mobilidade reduzida na conceção e avaliação das<br />

suas criações. Estas pessoas conhecem, pela sua<br />

experiência, as barreiras e muitas vezes conhecem as<br />

soluções. Com este novo input, os projetistas podem<br />

desenhar espaços, serviços e produtos que respondam<br />

às necessidades e expetativas do maior número<br />

possível de pessoas.<br />

Vão demorar alguns anos para equipar o país<br />

com passeios livres de barreiras<br />

Reconhecemos que não é fácil assegurar a<br />

acessibilidade porque tem de ser respeitada a<br />

diversidade da população e a eliminação de uma<br />

barreira pode criar uma nova barreira para cidadãos<br />

com outras necessidades.<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |<br />

6<br />

Por exemplo, o rampeamento do passeio nas<br />

imediações das passagens de peões facilita a<br />

circulação das pessoas com carrinhos de bebé e das<br />

pessoas em cadeira de rodas mas, dificulta a distinção<br />

entre o final do passeio e o princípio da estrada por<br />

parte das pessoas com deficiência visual, aumentando<br />

o risco de entrarem na estrada sem se aperceberem.<br />

Contudo, a introdução de pavimentos táteis nas<br />

imediações das passadeiras (o que inclui a zona<br />

rampeada) oferece a informação que os peões com<br />

deficiência visual necessitam, sem incomodar os outros<br />

peões, sendo uma solução que responde a<br />

necessidades aparentemente incompatíveis. No<br />

entanto, algumas barreiras necessitarão da criação de<br />

um serviço alternativo, como é o caso dos<br />

supermercados, onde a disponibilidade de um serviço<br />

de acompanhamento personalizado e gratuito para os<br />

clientes com deficiência visual ultrapassa melhor os<br />

problemas de orientação e a identificação dos produtos<br />

dentro da loja do que qualquer sistema de sinalética.<br />

2004<br />

Ano definido pelo decreto-lei nº123/97 como<br />

data limite para garantir a acessibilidade dos<br />

edifícios públicos<br />

É de salientar que o conceito de acessibilidade não é<br />

defendido apenas pelas pessoas com mobilidade<br />

reduzida e os seus representantes mas também por<br />

muitos projetistas em todo o mundo, que defendem as<br />

correntes do Design Universal (ou do Design Inclusivo<br />

ou do Design para Todos). Estes projetistas conhecem<br />

bem os argumentos morais, que por si só justificam a<br />

adoção do conceito mas também conhecem as<br />

preocupações estéticas dos seus colegas e as<br />

vantagens comerciais de produtos e serviços que<br />

respondam às necessidades e expetativas do maior<br />

número de pessoas possível.<br />

Afinal, espaços, serviços e produtos que respeitam a<br />

diversidade são seguros, saudáveis, funcionais,<br />

compreensíveis e estéticos. LB<br />

* Membros do Núcleo de Estudos e Investigação para as<br />

Acessibilidades (NEIA) da ACAPO


Emprego<br />

Empregar sem barreiras<br />

“Se a nossa sociedade é heterogénea, os nossos colaboradores<br />

também refletem essa diversidade”,<br />

afirma Susana Correia de Campos<br />

Por Cláudia Vargas Candeias<br />

Em 2006, o Grupo Jerónimo Martins e a ACAPO<br />

estabeleceram uma parceria que abriu portas a mais de<br />

30 pessoas com deficiência visual.<br />

“O trabalho é o fator mais forte e determinante de<br />

inclusão social”. A afirmação pertence a Susana<br />

Correia de Campos, Diretora de Relações Laborais e<br />

Responsabilidade Social Interna do Grupo Jerónimo<br />

Martins, e fundamenta a parceria que o Grupo<br />

estabeleceu, em 2006, com a ACAPO, com vista à<br />

integração profissional de pessoas com deficiência<br />

visual.<br />

Começando por integrar 15 colaboradores, o Grupo<br />

emprega hoje, ao abrigo desta parceria, 31 pessoas<br />

com deficiência visual, nas diferentes Companhias e<br />

em diversas funções. “Não sendo nós especialistas<br />

nesta matéria, o protocolo com a ACAPO serve para<br />

garantir que o fazemos bem”, justifica Susana Correia<br />

de Campos.<br />

A ACAPO, recorrendo às candidaturas rececionadas no<br />

Departamento de Apoio ao Emprego e Formação<br />

Profissional (DAEFP), assume o papel de mediador no<br />

processo de recrutamento, apresentando para cada<br />

oportunidade, os candidatos adequados. Tal função<br />

permite dar a conhecer um universo desconhecido<br />

pois, segundo a experiência do Grupo Jerónimo<br />

Martins, “nem sempre as pessoas com deficiência se<br />

dirigem aos processos de recrutamento. O que parece<br />

é que estas pessoas pensam que estão arredadas das<br />

condições normais de trabalho”, refere a responsável.<br />

E é neste domínio que a ACAPO intervém, dando a<br />

conhecer ao mercado que existem candidatos<br />

qualificados, e às pessoas com deficiência visual, uma<br />

7<br />

oportunidade de trabalho.<br />

Cinco anos decorridos, a parceria não podia ser mais<br />

bem sucedida. “Esta é uma experiência muito<br />

enriquecedora, não só para a empresa, mas para todas<br />

as equipas que trabalharam com estes colaboradores”,<br />

reforça Susana Correia de Campos. No entanto, recusa<br />

que o recrutamento de pessoas com deficiência se<br />

insira na política de responsabilidade social do Grupo,<br />

“Se a nossa sociedade é heterogénea, os nossos<br />

colaboradores também refletem essa diversidade. Por<br />

isso, isto é, simplesmente, política de recursos<br />

humanos. É uma atitude que qualquer empresa deve<br />

ter, numa sociedade evoluída e democrática, que não<br />

quer excluir”.<br />

“Motivados e Motivadores”<br />

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

É deste modo que a Diretora de Relações Laborais e<br />

Responsabilidade Social Interna do Grupo Jerónimo<br />

Martins descreve os colaboradores com deficiência.<br />

“São pessoas que, uma vez criadas as condições para<br />

trabalharem, agarram a oportunidade de uma forma<br />

muito motivada”.<br />

Sónia Santos, 39 anos, é um desses exemplos. Entrou<br />

para o Grupo Jerónimo Martins, em 2006, na “altura<br />

certa”, conforme revela. Os horários exigentes e as<br />

deslocações constantes a que o anterior emprego a<br />

obrigavam, tornaram-se “inconciliáveis com a vida<br />

pessoal”. Por isso, este recrutamento não podia ter<br />

sido mais oportuno.<br />

Tal como 80% dos colaboradores integrados ao abrigo<br />

da parceria, foi colocada numa loja Pingo Doce, para<br />

exercer funções de atendimento telefónico com o<br />

objetivo de “auscultar as dúvidas, sugestões e<br />

reclamações dos clientes”.<br />

Porém, a sua elevada capacidade de trabalho foi<br />

reconhecida em pouco tempo. Bastaram pouco mais<br />

de dois meses para que a estas funções fossem<br />

acrescidas outras. “Tendo em conta que levei o meu<br />

computador portátil e tinha todas as ferramentas<br />

necessárias para trabalhar, foram começando a testar<br />

o meu potencial”.<br />

Assim, gradualmente, foi-lhe atribuída a<br />

responsabilidade de controlar algum economato e as<br />

reclamações dos clientes, passou a dar apoio em<br />

diversos serviços administrativos, ao nível da<br />

transcrição de documentos para suporte informático e<br />

pesquisa de conteúdos na Internet, e começou a ter<br />

também a seu cargo a gestão diária da distribuição de<br />

donativos alimentares por diversas instituições de<br />

solidariedade. Progressos que Sónia atribui a “alguma<br />

sorte” e ao “empenho que aplica em todos os projetos”<br />

mas sobretudo ao facto de “no Grupo não serem<br />

criadas barreiras, nem vedadas oportunidades”.<br />

Uma ideia partilhada e experienciada por Eduardo<br />

Sanca, 32 anos. Natural de Guiné-Bissau, Eduardo<br />

chegou a Portugal, em 2001, com um propósito:<br />

estudar.<br />

Com este objetivo no topo das suas prioridades,<br />

procurou formação na Associação Promotora de<br />

Emprego de Deficientes Visuais (APEDV) como<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |


Natural de Guiné-Bissau, Eduardo Sanca chegou a Portugal<br />

em 2001 e em 2006 entrou para o Grupo Jerónimo Martins<br />

telefonista e rececionista, e matriculou-se numa escola<br />

para, em regime noturno, completar o ensino<br />

secundário. Terminada esta formação, um estágio<br />

depois, e sem quaisquer perspetivas de emprego,<br />

Eduardo recorreu ao Departamento de Apoio ao<br />

Emprego e Formação Profissional (DAEFP) da ACAPO<br />

e aguardou por uma oportunidade. Esta chegou em<br />

setembro de 2006. “Recebi um telefonema da Dra.<br />

Anabela Miranda [Psicóloga na Delegação de Lisboa<br />

da ACAPO] a perguntar se tinha disponibilidade para ir<br />

a uma entrevista para o Grupo Jerónimo Martins”,<br />

recorda.<br />

Pouco tempo depois, iniciava funções de rececionista e<br />

telefonista no Centro de Distribuição da Azambuja. Um<br />

cargo que ocupou até ao dia em que lhe perguntaram:<br />

“Sabe trabalhar com SAP [um software de gestão<br />

empresarial]?”.<br />

Uma resposta positiva a esta questão fê-lo ser<br />

promovido a técnico de dados mestre. Hoje, tem como<br />

principal responsabilidade, acompanhar,<br />

informaticamente, o circuito dos produtos de vestuário<br />

das lojas Pingo Doce. “Aqui o papel não circula, o que,<br />

para mim, constitui uma vantagem devido à baixa<br />

visão”, confessa.<br />

Aliás, Eduardo não consegue apontar quaisquer<br />

barreiras à sua integração na empresa e essa é uma<br />

das razões pelas quais não se “imagina a trabalhar<br />

noutro sítio”. Por agora, a sua ambição passa por<br />

Londres. Atleta na modalidade de lançamentos (dardo,<br />

disco e peso), aspira atingir os mínimos que lhe<br />

permitam competir nos Jogos Paralímpicos de Londres,<br />

em 2012.<br />

86<br />

Número de pessoas com deficiência a trabalhar<br />

no Grupo Jerónimo Martins<br />

Abrir portas, criar oportunidades<br />

No Centro de Distribuição da Azambuja, dois pisos<br />

abaixo de Eduardo, encontramos o escritório de Sara<br />

Tadeu, 31 anos. Tem deficiência visual, trabalha no<br />

Grupo Jerónimo Martins, todavia, o seu recrutamento<br />

não decorreu ao abrigo da parceria com a ACAPO.<br />

“Nós sempre empregámos pessoas com deficiência.<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |<br />

8<br />

Sempre que rececionamos um curriculum tentamos<br />

encontrar para aquele perfil uma oportunidade de<br />

trabalho”, explica Susana Correia de Campos<br />

E foi o que sucedeu com Sara. Natural do Porto,<br />

embora criada em Vila Flor, Trás-os-Montes, passou<br />

por várias experiências antes de conseguir atingir a<br />

estabilidade de hoje: licenciou-se em psicologia clínica,<br />

frequentou um curso de massagista – uma profissão<br />

que também desempenhou – deu formação na área do<br />

treino de competências de atividades da vida diária, a<br />

uma adolescente com deficiência visual e chegou<br />

mesmo a cantar em bares. Em 2008, numa tentativa de<br />

contornar o desemprego – uma fase que também<br />

conheceu – e face ao historial da empresa da<br />

contratação de pessoas com deficiência, procurou uma<br />

oportunidade no Grupo Jerónimo Martins.<br />

Um ano depois, conseguiu alcançá-la. Foi colocada,<br />

como auxiliar de ação educativa, no jardim de infância<br />

do Centro de Distribuição da Azambuja, que tem como<br />

destinatários os filhos dos colaboradores do Grupo.<br />

“Gostei imenso da experiência. Ainda hoje recebo<br />

visitas dos «garotos» no meu gabinete”. Sara fala no<br />

passado porque, em 2009, os pais desses mesmos<br />

«garotos», tendo conhecimento da sua licenciatura em<br />

psicologia, tentaram persuadi-la a implementar um<br />

projeto inovador. “Diziam-me que podia ser mais útil se<br />

exercesse psicologia no Centro”.<br />

“Não é qualquer empresa que nos dá a oportunidade de crescer”,<br />

diz Sara Tadeu<br />

Ainda que reticente, Sara aceitou o desafio.<br />

“Apresentei um projeto onde expus a importância dos<br />

psicólogos na dinâmica das organizações”. A proposta<br />

foi aceite e em janeiro de 2010 chegaram os primeiros<br />

consulentes: “Comecei por acompanhar 4<br />

colaboradores, ao fim de três meses já eram 10 e hoje<br />

são 17, com tantos outros em lista de espera”. Com<br />

mais projetos em carteira, os horizontes de Sara<br />

mantêm-se em aberto.<br />

“Não é qualquer empresa que nos dá a oportunidade<br />

de crescer e acredita das nossas potencialidades,<br />

ainda mais quando se trata de pessoas com<br />

deficiência”. Uma constatação que a Diretora de<br />

Relações Laborais e Responsabilidade Interna do<br />

Grupo sublinha: “Aqui têm a oportunidade de crescer,<br />

de criar valências. Depois de entrarem no Grupo,<br />

podem ser o que quiserem. A integração é só abrir a<br />

porta. Essa mesma porta depois é a primeira para<br />

muitas outras oportunidades”. Uma porta pela qual,<br />

desde 2006, já passaram 34 associados da ACAPO.<br />

Mas se atendermos aos casos de sucesso desta<br />

parceria, espelhados nos percursos de Sónia, Eduardo<br />

e Sara, de certo que este número não ficará por aqui.<br />

LB


Ciência<br />

Prevenção, diagnóstico e tratamento<br />

das doenças oftalmológicas<br />

O que mudou nos últimos 20 anos?<br />

Por Florindo Esperancinha<br />

Médico Oftalmologista/ Presidente do Colégio da Especialidade de<br />

Oftalmologia da Ordem dos Médicos<br />

Prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças<br />

oftalmológicas.<br />

O que mudou nos últimos 20 anos?<br />

Prevenção<br />

Quando falamos de avanços na prevenção em<br />

oftalmologia, ressaltam alguns aspetos que as<br />

modernas sociedades e as novas tecnologias de<br />

informação e comunicação (TIC) trouxeram e que muito<br />

têm contribuído para o combate à cegueira.<br />

A Medicina do Trabalho impondo regras que previnem<br />

traumatismos oculares de consequências desastrosas,<br />

uma maior cobertura oftalmológica nacional e os<br />

rastreios de doenças, como o glaucoma, que, como<br />

não dá queixas pode levar à cegueira, sem que o<br />

doente se aperceba, e a diabetes, em que uma<br />

intervenção muito mais precoce quer no controlo<br />

metabólico, quer na intervenção terapêutica impedem a<br />

progressão da doença, levam a obter enormes ganhos<br />

de saúde que permitem aos doentes ficarem a ver<br />

durante muitos mais anos.<br />

A consciência da necessidade de intervenção precoce<br />

em doenças como a Degenerescência Macular da<br />

Idade (DMI) em que o aparecimento de distorções das<br />

imagens com perda súbita de visão ou a prevenção de<br />

descolamentos da retina quando há sinais como o<br />

aparecimento de “moscas “ ou “cabelos”<br />

acompanhados de luzes como se fosse um raio de luz,<br />

no campo de visão, consciência esta adquirida quer por<br />

uma maior informação quer por maior acesso a ela<br />

através da internet, tem sido nos últimos tempos<br />

responsável por haver menos doentes com problemas<br />

graves de visão provocados por estas situações.<br />

Diagnóstico<br />

A área do diagnóstico tem sido a que mais evoluiu nos<br />

9<br />

últimos 20 anos, quer por ter havido evoluções em<br />

exames já existentes, como a Angiografia<br />

Fluoresceínica, em que o mesmo exame feito com<br />

outros produtos (verde de indocianina) permitiu<br />

diagnosticar, caraterizar e controlar doenças como a<br />

DMI; mas sendo este exame invasivo por obrigar à<br />

injeção de produtos de contraste, nos últimos 10 anos<br />

apareceu um novo método de estudo de muita<br />

patologia da retina, que vai desde a DMI, ao edema<br />

macular (líquido na retina) e ao glaucoma, que se<br />

chama Tomografia Ótica de Coerência (OCT) e que<br />

sendo não invasivo e de fácil execução dá um conjunto<br />

de informações que são capitais para o diagnóstico e<br />

prognóstico.<br />

A Cirurgia Refrativa, mais conhecida por cirurgia laser<br />

da miopia, mas que também trata a hipermetropia e o<br />

astigmatismo está completamente implantada e com<br />

enorme sucesso; diga-se que nem todos os doentes<br />

são elegíveis para esta cirurgia e que deve sempre<br />

solicitar toda a informação ao seu médico<br />

oftalmologista, porque além do laser há outras<br />

abordagens, como seja a introdução de lentes<br />

intraoculares; o desenvolvimento desta área só foi<br />

possível porque apareceram exames como a<br />

Topografia Corneana e a Paquimetria além de outros<br />

como o Pentacam, que criaram condições para que a<br />

programação destas cirurgias seja eficaz quanto aos<br />

resultados que se pretendem obter.<br />

Na área do Glaucoma, além do OCT já referido, outros<br />

apareceram para melhor caraterizar e estudar a<br />

evolução de uma doença com tão dramáticas<br />

repercussões na visão e estamos a falar da<br />

Polarimetria Laser (mais conhecida por GDX), do ORA<br />

para estudo da histerese corneana (elasticidade da<br />

córnea) e dos Campimetros Computorizados (PEC)<br />

com novos softwares; toda esta parafernália de<br />

exames foi e é uma mais-valia para se elaborarem<br />

propostas terapêuticas mais eficazes.<br />

A Ecografia Ocular como técnica já antiga adaptou-se<br />

aos novos tempos e o aparecimento da UBM ao<br />

permitir estudar o segmento anterior do olho veio dar<br />

informação que por vezes era difícil de obter; também a<br />

ecografia a 3 dimensões pode nalguns casos ser<br />

importante na ajuda ao diagnóstico.<br />

284 milhões<br />

Número de pessoas com deficiência visual<br />

no mundo<br />

Tratamento<br />

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

“A área do diagnóstico tem sido a que mais<br />

evoluiu nos últimos 20 anos”<br />

Em todas as estruturas oculares e anexos novas<br />

abordagens/inovações terapêuticas surgiram que vão,<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |


entre outros, desde a múltipla utilização do laser aos<br />

transplantes de córnea; o laser pode ser usado em<br />

praticamente todas as estruturas oculares desde as<br />

pálpebras até à retina e coroideia e, quando falamos de<br />

laser, temos que ter noção dos vários tipos de laser,<br />

cada um com caraterísticas e indicações específicas;<br />

sendo tão vasta a sua utilização informe-se junto do<br />

seu oftalmologista.<br />

“Os transplantes de córnea tiveram nos últimos<br />

anos grandes desenvolvimentos técnicos”<br />

Os transplantes de córnea pela sua importância no<br />

contexto da visão, tiveram nos últimos anos grandes<br />

desenvolvimentos técnicos, que levou a passar de<br />

transplantes totais da córnea para lamelares ou mesmo<br />

só de cercas camadas, como o endotélio, que é a<br />

camada mais importante para manter a transparência<br />

da córnea.<br />

A façoemulsificação da catarata transformou esta<br />

cirurgia num dos maiores sucessos terapêuticos dos<br />

últimos 20 anos, ao permitir rápidas recuperações e em<br />

Educação<br />

A integração educativa do aluno<br />

com deficiência visual<br />

Por Graça Pegado<br />

Professora especializada na área da deficiência visual<br />

Independentemente da sua natureza, a existência de<br />

um défice visual significativo condiciona o processo de<br />

aprendizagem dos alunos que o manifestam. A inclusão<br />

sócio-educativa exige um trabalho concertado por parte<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 | 10<br />

cirurgia de ambulatório.<br />

A vitrectomia (substituição do vítreo e/ou remoção de<br />

membranas, corpos estranhos ou cristalinos) tornou-a<br />

uma cirurgia salvadora de muitos olhos, anteriormente<br />

considerados perdidos; também aqui novas aberturas<br />

cada vez mais pequenas do globo ocular associados a<br />

novos equipamentos vieram facilitar a ambulatorização<br />

e a recuperação.<br />

Na terapêutica do glaucoma, o aparecimento de novos<br />

medicamentos e novas técnicas cirúrgicas associados<br />

a um melhor diagnóstico, modificaram o prognóstico de<br />

uma doença, que evoluindo silenciosamente, pode<br />

levar à cegueira total (é o ladrão silencioso).<br />

Os antiangiogénicos e os corticoides intravitreos vieram<br />

modificar o prognóstico de doenças para as quais a<br />

nossa capacidade de intervenção era limitada, como na<br />

DMI e nos edemas diabéticos ou inflamatórios, com<br />

resultados muito positivos. Este é um dos maiores<br />

avanços dos últimos tempos na Oftalmologia porque<br />

nos permitiu tratar e controlar doenças graves para as<br />

quais não tínhamos tratamentos suficientemente<br />

eficazes.<br />

É um mundo novo o que as novas tecnologias<br />

trouxeram e continuam a trazer para a Oftalmologia. LB<br />

da família, dos professores ou educadores e outros<br />

agentes educativos que possam, de uma forma ou de<br />

outra, encontrar-se envolvidos no contexto escolar dos<br />

alunos, no sentido de verem minimizadas as<br />

consequências decorrentes dos problemas de visão<br />

que lhes possam vir a limitar as oportunidades de um<br />

desempenho académico desejável.


Em Janeiro de 2008 foi publicado um decreto-lei<br />

que regulamenta a organização da Educação<br />

Especial nas escolas portuguesas<br />

Com o objetivo de regulamentar a organização da<br />

Educação Especial nas escolas portuguesas, teve<br />

lugar a publicação do Decreto-Lei nº 3/2008 de 7 de<br />

janeiro. O diploma em vigor dedica um artigo à<br />

Educação de alunos cegos e com baixa visão, onde é<br />

consagrado um conjunto de medidas aplicáveis aos<br />

alunos estariam, à partida, habilitadas a oferecer,<br />

sendo múltiplos os fatores que para esse fim<br />

concorrem. Os recursos humanos e materiais que são<br />

colocados à disposição, a constituição das turmas, a<br />

adaptação do currículo e as atitudes, as práticas e as<br />

competências do pessoal docente constituem aspetos<br />

que condicionam a eficácia das medidas enunciadas,<br />

na promoção do sucesso escolar e inclusão social.<br />

Fazendo uma retrospetiva relativamente ao<br />

acompanhamento de alunos com deficiência visual na<br />

última década, é-nos dado a perceber que a<br />

modernização das tecnologias em muito beneficiou o<br />

esforço que o Ministério da Educação tem vindo a<br />

desenvolver, no sentido de proporcionar aos alunos<br />

que a escola em si acolhe, as respostas mais<br />

adequadas às suas especificidades. Por outro lado,<br />

através de uma desconstrução criteriosa da realidade<br />

que os nossos alunos vivem nas escolas da Grande<br />

Lisboa, concluímos que esse investimento não é, de<br />

todo, suficiente para assegurar que princípios como a<br />

promoção da igualdade de oportunidades pelos quais<br />

se rege a Escola Inclusiva estejam a ser respeitados.<br />

Com efeito, é do conhecimento comum que um número<br />

significativo de medidas enunciadas na lei não<br />

encontra, frequentemente, a correspondência desejada<br />

na escola pública. É este o caso da sobejamente<br />

conhecida falta de equipamentos informáticos e<br />

materiais didáticos adequados, bem como a total<br />

ausência de preocupação com a acessibilidade dos<br />

alunos dentro da escola e nas suas imediações. De<br />

facto, a conceção arquitectónica da maioria dos<br />

espaços escolares que integram a rede de escolas de<br />

referência em nada difere dos demais<br />

estabelecimentos de ensino, não se verificando sequer<br />

a utilização de recursos alternativos, tais como pisos<br />

tácteis, placas sinalizadoras em braille, etc.<br />

“A oferta formativa na área da deficiência visual<br />

é extremamente escassa na zona da<br />

Grande Lisboa”<br />

Ainda no vasto campo das acessibilidades, um outro<br />

aspeto que importa aqui sublinhar, é a escandalosa<br />

falta de acesso que os alunos cegos têm aos manuais<br />

escolares quando os mesmos são disponibilizados em<br />

11<br />

<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

formato digital, à luz de um protocolo que o M.E.<br />

celebrou com um número considerável de editoras. O<br />

formato que os alunos recebem via e-mail não é<br />

compatível com os leitores de ecrã que utilizam.<br />

E, mesmo após várias chamadas de atenção junto das<br />

entidades competentes, nenhuma posição foi ainda<br />

tomada no sentido de resolver uma situação inaceitável<br />

que compromete seriamente a garantia da igualdade<br />

tão apregoada pelo referido diploma. Por outro lado, a<br />

abordagem das questões que se relacionam com os<br />

recursos humanos e sua preparação para o<br />

desempenho das funções que lhes estão designadas<br />

obriga, irremediavelmente, à análise refletida da sua<br />

formação.<br />

“Mesmo um professor especializado no domínio<br />

da visão chega à escola com uma preparação<br />

deficitária”<br />

Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que a oferta<br />

formativa na área da deficiência visual é extremamente<br />

escassa na zona da Grande Lisboa. Acresce ainda o<br />

facto de os programas curriculares dos cursos de<br />

especialização se encontrarem, regra geral,<br />

desajustados relativamente às necessidades da prática<br />

educativa. Áreas de importância central como a<br />

orientação e mobilidade, a avaliação visual e funcional,<br />

a aplicação de programas de estimulação visual, a<br />

utilização de meios informáticos específicos, o treino de<br />

atividades de vida diária e a promoção de<br />

competências sociais estão, habitualmente, ausentes<br />

do currículo. Mesmo um professor especializado no<br />

domínio da visão, sem ter ainda acumulado alguns<br />

anos de experiência, chega à escola com uma<br />

preparação deficitária, uma vez que os conhecimentos<br />

adquiridos não satisfazem, em larga medida, as<br />

necessidades das suas funções.<br />

52<br />

Número de escolas de referência para educação<br />

bilingue para alunos cegos ou com baixa visão<br />

Tendo em conta o atual cenário acerca do qual nos foi<br />

possível enunciar apenas um número reduzido de<br />

situações exemplificativas, parece-nos fundamental<br />

deixar claro que a melhoria da qualidade dos serviços<br />

prestados pelo sistema educativo depende, em<br />

primeira instância, de um processo de<br />

consciencialização coletiva, em que o respeito<br />

inadiável pelo aluno com deficiência visual se impõe de<br />

forma perentória. Trata-se de uma realidade que<br />

implica, essencialmente, uma outra conceção de<br />

organização escolar, ultrapassando a via da<br />

uniformidade e reconhecendo o direito à diferença. LB<br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011 |


<strong>Louis</strong> <strong>Braille</strong><br />

OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO | N.0 | 2011

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!