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CAPÍTULO 1
Era o intervalo da manhã. O João levou
a mão ao bolso para apanhar a sua arma
secreta. Uma lesma pegajosa. Ao contrário
da maioria das pessoas, o João gostava de
lesmas. Gostava da cor lesmosa delas e do
seu toque frio e escorregadio. Olhou em
volta para o pátio do recreio. Quem iria
ser a sua primeira vítima? O Rogélio Rico?
O Rogélio estava sempre a gabar-se de que
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João Porcalhão
não havia nada que o assustasse. Ou o
Nicolau Sabe-Tudo? O João iria adorar
meter-lhe uma lesma pelo pescoço abaixo.
Mas o Nicolau ia logo fazer queixa à
professora Vespásia. Teve uma ideia melhor.
Que tal a Ângela Graciosa? A Ângela vivia ao
lado do João e estava apaixonada por ele há
séculos. Andava sempre a dizer a toda a
gente que ele era o namorado dela. Pois
agora é que o João ia acabar com isso.
Era só esperar que a Ângela visse a lesma
gorda e escorregadia que lhe tinha arranjado.
Ia fartar-se de berrar e pedir-lhe que tivesse
pena dela!
A Ângela estava sentada num banco, a fazer
um jogo com as suas amigas, a Laura e a Mizé.
– Agora és tu, Laura – disse a Mizé. –
Verdade, Desafio, Beijo ou Promessa?
– Verdade – respondeu a Laura.
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João Porcalhão
– É verdade… que sou eu a tua Melhor
Amiga para Sempre? – perguntou a Mizé.
A Laura pensou, muito concentrada, e
respondeu: – Não. A Ângela é que é.
A Mizé amuou.
– Agora eu, agora eu! – cantarolou a
Ângela muito animada.
– Está bem – disse a Laura. – Verdade,
Desafio, Beijo ou Promessa?
A Ângela sorriu. – BEIJO! – disse ela.

João Porcalhão
– ÂNGELA! – guincharam a Laura e a
Mizé. – Vais ter de beijar um rapaz!
– Não me importa! – declarou a Ângela.
– Está bem, mas vais ter de beijar quem a
gente quiser – disse a Mizé.
– São essas as regras – apoiou a Laura. –
Ou então perdes o jogo.
A Mizé olhou em volta do recreio em
busca de uma boa vítima. Tinha de ser alguém
revoltante, algum rapaz bem porco e ranhoso.
– OLÁ, ÂNGELA! – berrou o João, mos -
trando a lesma. – Olha o que eu tenho aqui!
A Mizé fez um sorriso maroto e,
apontando o João, disse: – ELE!
– Sim, o João, beija o João! – gritou logo a
Laura.
O João empalideceu e caiu-lhe o queixo. –
Q-q-quê?
– A ÂNGELA QUER DAR-TE UM BEIJO!
– cantarolaram as raparigas.
– Não quer nada! – arquejou o João.
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João Porcalhão
– Quero, pois! – animou-se a Ângela,
pondo-se em pé dum salto. – Tem de ser.
São as regras!
O João fez-se vermelho. Recuou. Quais
regras? Estavam todas
malucas?
– Não te aproximes!
– gritou ele. – Olha que
eu tenho uma lesma!
– Não me
importa! – declarou
a Ângela, aproxi -
mando-se mais.
– Uma grande
lesma, toda húmida
e pegajosa – disse o João, mostrando-lha. –
Olha que eu ponho-ta no cabelo!
Mas a Ângela continuou a aproximar-se. –
Vou dar-te um beijo! – entoou ela.
– Não! – arquejou o João.
– Vou, pois!
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João Porcalhão
– Vá lá, Ângela! – incitou a Laura.
– Não te aproximes! – berrou o João,
desesperado. – Não te chegues ao pé de
mim!
A Ângela não ligou. Franziu os lábios e
inclinou-se para ele.
– IAAAAAQUE! – gritou o João.
Deixou cair a lesma e fugiu dali para fora.
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