1 NATHALIA DA COSTA KING JORNALISMO DE MODA ... - EnModa
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<strong>NATHALIA</strong> <strong>DA</strong> <strong>COSTA</strong> <strong>KING</strong><br />
<strong>JORNALISMO</strong> <strong>DE</strong> MO<strong>DA</strong><br />
ANÁLISE DISCURSIVA DOS TEXTOS <strong>DA</strong> REVISTA VOGUE BRASIL E<br />
ESTADOS UNIDOS<br />
Trabalho de conclusão de curso<br />
apresentado como requisito parcial para<br />
obtenção do grau de bacharel em<br />
Comunicação Social, Habilitação em<br />
Jornalismo pela Escola de Comunicação<br />
Social da Universidade Católica de<br />
Pelotas.<br />
Orientadora: Margareth de Oliveira Michel<br />
Pelotas<br />
2007<br />
1
Autor:<br />
Título:<br />
Nathalia da Costa King<br />
<strong>JORNALISMO</strong> <strong>DE</strong> MO<strong>DA</strong><br />
Análise discursiva dos textos da Revista Vogue Brasil e Estados Unidos<br />
Natureza do trabalho:<br />
Objetivo:<br />
Instituição:<br />
Trabalho de Conclusão de Curso<br />
Monografia apresentada como parte dos requisitos para a obtenção do título<br />
de Bacharel – habilitação em Jornalismo, no curso de Comunicação Social<br />
sob a orientação da professora Margareth de Oliveira Michel<br />
Universidade Católica de Pelotas<br />
Ano / Semestre:<br />
2007/2<br />
2
3<br />
PENSAMENTO<br />
"Com a primeira folha de parreira surgiu o<br />
primeiro problema da moda feminina:<br />
onde colocá-la?" (Leon Eliachar)
4<br />
<strong>DE</strong>DICATÓRIA<br />
"Para a minha vó Lili, que essa hora deve<br />
estar encantando os anjos do céu com<br />
seu bom gosto, charme e elegância".
AGRA<strong>DE</strong>CIMENTOS<br />
Primeiramente, quero agradecer aos meus pais, Nadya e João Manoel, que<br />
sempre me apoiaram em todas as decisões da minha vida. Durante o curso de<br />
Jornalismo, pude sempre contar com seus elogios e críticas construtivas, fazendo<br />
com que, hoje, eu possa me formar uma profissional melhor.<br />
Obrigada aos meus colegas que fizeram esta jornada mais gostosa e<br />
agradável, meus companheiros da Tropa de Elite: Rebeca Recuero, Rafael Varela,<br />
Francisco Lima, Carolina Graziadei, Patrícia Mota, Hélen Albernaz, Wagner Oliveira<br />
e Marta Gentilini. Juntos conseguimos passar por todas as dificuldades e organizar<br />
uma formatura linda! Amo muito vocês! O QUE NÃO NOS <strong>DE</strong>RRUBA NOS<br />
FORTALECE!<br />
Vou sentir imensas saudades de todos os momentos que passamos juntos,<br />
nas reuniões da comissão, em meio a risadas, choros, brigas, dores de cabeça que,<br />
no fim, provaram que "a união faz força". Desejo para vocês o melhor caminho<br />
sempre e, espero nunca perder o contato.<br />
Às minhas amigas Luisa, Manuela, Rachel, Danielle, Luiza Monteiro, Paula e<br />
Rafaela, obrigada pelo apoio em todos os momentos que precisei. Pelas conversas<br />
e risadas que tivemos a fim de desopilar um pouco do T.C.C. Me desculpem pela<br />
pouca atenção que dei para vocês neste período, mas agora tudo vale a pena. "Não<br />
vem visitar a amiga?" "Ai, odeio esse teu T.C.C." Gurias, obrigada pela paciência e<br />
amizade.<br />
Ao meu querido amigo Henrique Viana, que me ajudou muito conseguindo a<br />
Vogue americana lá nos Estados Unidos por um preço bem mais em conta; à Cadija<br />
Souza, que, além de sempre demonstrar uma grande amizade, também me indicou<br />
bons sites sobre a Vogue; à Mabel Teixeira, minha colega-formanda que me deu<br />
uma das entrevistas usadas na análise.<br />
5
À TV UCPel, que, no início da faculdade e, agora no final, me proporcionou<br />
momentos de aprendizagem mesclados com muita diversão. Obrigada Michelle,<br />
Amanda, Max, Luysa, Marcelo, que me compreenderam neste final de semestre, nas<br />
minhas faltas ao Fora do Ar e, sempre me deram o maior apoio e confiança possível.<br />
Um agradecimento especial à Embrapa, ao programa Terra Sul, aos meus<br />
queridos amigos Rui Madruga e Sérgio Silva. Meus verdadeiros mentores nos dois<br />
anos que estive trabalhando lá. Com vocês pude aprender muito mais do que<br />
técnicas e reportagem, aprendi a dar valor às coisas simples da vida. Amo muito<br />
vocês!<br />
À TV Pampa que também meu deu uma grande oportunidade de trabalhar<br />
com o telejornalismo, com a correria do dia-a-dia de uma televisão. Obrigada aos<br />
amigos queridos que conquistei, por todos os momentos de aprendizagem e<br />
brincadeiras.<br />
À minha querida orientadora Margareth, que em todos os momentos, seja em<br />
nossas orientações, nos e-mails, pelo celular ou até mesmo nos corredores da<br />
ECOS, me acalmou, me incentivou para que eu pudesse fazer um bom trabalho.<br />
Marga, podes ter certeza de que tens um papel muito importante nesta minha<br />
conquista, afinal, és bárbara!<br />
Aos professores Fábio Cruz (Tela) e Antônio Heberlê, por terem me guiado<br />
nas disciplinas de Projeto Experimental e Pesquisa em Comunicação,<br />
respectivamente, quando iniciei meus primeiros passos no T.C.C.<br />
À Eni Zambrano, que carinhosamente corrigiu este trabalho. A minha querida<br />
amiga-irmã Rebeca Recuero que me ajudou a diagramá-lo.<br />
Agradecer a todos os meus colegas, que encerram comigo mais esta jornada,<br />
obrigada pela amizade, companheirismo, festas, reuniões e tudo que foi necessário<br />
para que a nossa formatura se concretizasse da melhor maneira possível.<br />
Enfim, a uma força superior que me deu garra, vontade e entusiasmo de<br />
produzir esta pesquisa, com todo o amor que dediquei a ela.<br />
E, a todos que sempre torceram por mim, muito obrigada!<br />
6
RESUMO<br />
Este trabalho tem como objetivo analisar os discursos da revista Vogue<br />
brasileira e americana. O estudo será realizado a partir dos textos das chamadas de<br />
capa e dos Editoriais de cada uma das revistas. Atualmente, a moda possui um<br />
papel extremamente importante na sociedade e no comportamento de cada<br />
indivíduo. Ela não dita apenas tendências, mas também estilos de vida. Os meios de<br />
comunicação têm sido utilizados, cada vez mais, como forma de dissipar a moda,<br />
sendo pela televisão, jornais, revistas ou Internet. Por isso, se pretende enumerar os<br />
principais conceitos do Jornalismo de Moda, traçando um paralelo com seus textos<br />
jornalísticos. A análise desse material será feita de acordo com os princípios da<br />
análise do discurso. O trabalho está ancorado teoricamente em Fairclough (2001),<br />
Pinto (2002), Lipovetsky (1989), Crane (2006), Scalzo (2004) e Marques de Melo<br />
(2006).<br />
Palavras-chave: Jornalismo - Moda - Análise lingüística. Revista Vogue: Brasil e<br />
Estados Unidos.<br />
7
SUMÁRIO<br />
INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 9<br />
CAPÍTULO I - <strong>JORNALISMO</strong> .................................................................................. 11<br />
1.1 Jornalismo Segmentado .................................................................................. 13<br />
1.2 Jornalismo em Revista..................................................................................... 16<br />
1.3 Jornalismo de Moda......................................................................................... 25<br />
CAPÍTULO II - A MO<strong>DA</strong>........................................................................................... 29<br />
2.1 Conceituação e contextualização histórica ................................................... 30<br />
2.2 A moda nos últimos séculos ........................................................................... 31<br />
2.3 A moda e seu destino nas sociedades modernas......................................... 37<br />
CAPÍTULO III - O DISCURSO <strong>DA</strong> MÍDIA ................................................................ 40<br />
3.1 A análise crítica do discurso ........................................................................... 40<br />
3.2 O discurso midiático e a mudança social ...................................................... 44<br />
3.3 Discurso e intertextualidade............................................................................ 47<br />
CAPÍTULO IV - REVISTA VOGUE (ANÁLISE) ....................................................... 51<br />
4.1 Histórico ............................................................................................................ 51<br />
4.2 Metodologia ...................................................................................................... 53<br />
4.3 Apresentação de dados ................................................................................... 53<br />
4.4 Análise............................................................................................................... 57<br />
CONSI<strong>DE</strong>RAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 65<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 67<br />
ANEXOS .................................................................................................................. 70<br />
8
INTRODUÇÃO<br />
O presente trabalho propõe-se a estudar e analisar os discursos dos textos<br />
jornalísticos da Vogue, principal revista de moda no mundo. Utilizar-se-ão, em<br />
primeiro momento, as chamadas de capa e quais seus principais apelos. Num<br />
segundo momento, a atenção será dada para os editoriais, ou seja, palavra do<br />
editor-chefe, falando diretamente com o seu leitor sobre os assuntos da revista.<br />
A relevância do projeto de pesquisa se deve ao fato de moda, tema central<br />
deste trabalho, possuir uma grande influência em diversas áreas da sociedade de<br />
nossa vivência, criando e modificando comportamentos. Além disso, é uma das<br />
indústrias que mais empregam no mundo e, é possível contar-se a história das<br />
décadas através das suas vestimentas.<br />
Paralelamente, o jornalismo de moda é uma área a crescer, mundial e<br />
nacionalmente. Oriundo do jornalismo cultural há muito tempo ele se tornou<br />
suficientemente capaz de tecer suas próprias teorias. Podendo ser considerado<br />
como um new journalism 1 , suas reportagens misturam informação e cultura.<br />
A partir dessa concepção, utilizando autores que dão suporte com as suas<br />
teorias, os dois primeiros capítulos deste trabalho tratam do jornalismo segmentado<br />
e a moda no passado, presente e futuro. A análise do discurso, relatada no capítulo<br />
III, encaixa-se nesta discussão, no momento que será utilizada para responder a<br />
pergunta-chave deste trabalho: quais as principais diferenças discursivas entre o<br />
1 O New Journalismo, ou "novo jornalismo" nascido nos Estados nas décadas de 60 e 70 do século<br />
XX, tem como objetivo dar um enfoque mais imaginativo e lírico à reportagem, permitindo ao jornalista<br />
inserir-se na narrativa sem alterar a realidade da notícia sobre a qual trabalha. Seus defensores<br />
postulam que o jornalista não seria um mero observador e transmissor dos fatos, mas uma verdadeira<br />
personagem nas situações que descreve. Sai de cena o repórter-realista e entra o repórter-escritor,<br />
que explora a sensibilidade do estilo próprio. Tendo como expoentes Truman Capote, Tom Wolfe e<br />
Gay Talese, o New Journalism espalhou-se por todo o mundo. (ELMAN e BENETTI, 2007)<br />
9
texto da Vogue brasileira e americana? A proposta é descobrir quais as diferenças e<br />
semelhanças através da teoria do discurso midiático.<br />
Assim, será possível diferenciar os profissionais de cada publicação,<br />
mostrando quais os tipos de discurso que cada um utiliza como formador de opinião.<br />
10
CAPÍTULO I - <strong>JORNALISMO</strong><br />
A comunicação social é um tema relevante no mundo contemporâneo. Como<br />
afirmou Pedro Gilberto Gomes 2 , com o desenvolvimento das modernas tecnologias<br />
de comunicação, o mundo ficou pequeno e aumentaram as possibilidades de inter-<br />
relação entre as pessoas. Por isso, todos os aspectos que envolvem este contexto<br />
devem ser pensados e analisados. Hoje, quem domina a comunicação, nas suas<br />
diversas formas, possui também o domínio sobre o mundo e a vida das pessoas.<br />
(GOMES, 1997, p. 7)<br />
Assim, atualmente, os Meios de Comunicação em Massa (MCM) assumiram<br />
um papel de liderança, dando explicações e interpretações da realidade. Neles se<br />
formulam e se debatem as principais questões da sociedade moderna e<br />
desenvolvida.<br />
A fim de introduzir este capítulo sem cair na repetição de transcrever teorias<br />
da Comunicação sobre o Jornalismo, as questões serão tratadas com ênfase<br />
diferente. O presente trabalho de conclusão de curso pretende – entre alguns dos<br />
seus objetivos – analisar, no momento - a linha editorial da revista Vogue brasileira e<br />
a da americana. O verdadeiro desafio desta primeira parte do capitulo está em<br />
resgatar as teorias de comunicação que avaliam a incidência das Escolas de<br />
Comunicação latino-americanas e norte-americanas.<br />
A pesquisa em comunicação na América Latina possui raízes no século XIX e<br />
no início do XX. O continente é cenário de uma série de acontecimentos que<br />
marcaram profundamente os estudos sobre comunicação. Em contrapartida,<br />
percebe-se a insuficiência de uma teoria da comunicação que continua tendo como<br />
ponto de partida a teoria da dependência e da manipulação. Ou seja, não se podem<br />
minimizar os efeitos da influência econômica, política e cultural dos Estados Unidos<br />
2 Doutor em Comunicação Social.<br />
11
na América Latina. Sendo assim, a teoria do Imperialismo cultural é incapaz de dar<br />
conta da situação latino-americana.<br />
O problema da comunicação, no entendimento de Luiz Ramiro<br />
Beltrán, envolve, no mundo contemporâneo, uma batalha feroz. Enquanto<br />
os países do chamado Terceiro Mundo rebelam-se contra as três classes de<br />
dependência a que se acham submetidos: dominação política, econômica e<br />
cultural, o Primeiro Mundo empenha-se em manter seus privilégios. A<br />
dependência cultural é a grande novidade das últimas décadas. Na década<br />
de 80, o reconhecimento de que a comunicação está a serviço das três<br />
classes de dominação neocolonialista apareceu definitivamente. (GOMES,<br />
1997, p. 76).<br />
Na sociedade americana, a manipulação do comportamento das pessoas por<br />
meio da comunicação sempre pareceu natural. Foi na América Latina, onde<br />
começaram a surgir críticas com mais força contra este modelo de persuasão, ou<br />
seja, uma alienação a partir de uma ideologia, a "ideologia capitalista, expressando<br />
uma comunicação vertical e autoritária 3 ".<br />
Por essas afirmações, é possível perceber que a suposta comunicação<br />
estabelecida mais parece um monólogo, no qual o receptor das mensagens é<br />
passivo e está submetido. "Tão vertical, assimétrica e quase autoritária relação<br />
social constitui uma forma antidemocrática de comunicação. Devemos ser capazes<br />
de construir um novo conceito de comunicação – um modelo humanizado, não<br />
elitista, democrático e não mercantilista". (GOMES, 1997, p. 79)<br />
Os estudos da escola na América Latina direcionam-se para dois lados: a<br />
análise do fenômeno da globalização e o estudo do relacionamento da cultura e da<br />
educação com o ato de comunicar.<br />
Em compensação, o funcionalismo norte-americano tem origem em um<br />
modelo "organicista spenceriano" 4 , isto é, num organismo vivo dotado de<br />
funcionamento próprio. Em uma visão sociológica e antropológica, o funcionalismo<br />
tem por função determinar o contributo de cada elemento social para a organização<br />
que participa. O seu postulado fundamental é a unidade funcional da sociedade,<br />
pensada em termos de equilíbrio interno.<br />
3 Gomes (1997)<br />
4 Gomes, 1997, p. 58<br />
A teoria funcionalista dos meios de massa constitui essencialmente<br />
uma abordagem geral dos meios de comunicação de massa no seu<br />
conjunto". Acentuam-se as funções em detrimento dos efeitos. Isto é, a<br />
grande questão de fundo é o estudo das funções que os meios de massa<br />
exercem na sociedade. Constata-se que há uma evolução na preocupação<br />
com os meios de massa. Começa-se com a manipulação, volta-se para a<br />
12
persuasão e, passando pela influência, chega-se às funções. (GOMES,<br />
1997, p. 60).<br />
A teoria funcionalista consiste na definição da problemática dos mass media 5<br />
a partir do ponto de vista da sociedade, da perspectiva do funcionamento do sistema<br />
social no seu conjunto e da contribuição que seus componentes dão a esse<br />
funcionamento.<br />
Ao tratar dos usos e satisfações dos mass media, as mensagens são<br />
captadas, interpretadas e adaptadas ao contexto subjetivo das experiências,<br />
conhecimentos e motivações. Nesta escola, o receptor é também um iniciador,<br />
originando mensagens de retorno e pondo em prática processos de interpretação<br />
com autonomia. "Ele age sobre a informação que está à sua disposição e a utiliza".<br />
(GOMES, 1997, p. 63)<br />
Por essas duas dimensões podemos ver notoriamente quais as funções e<br />
segmentos de cada uma das escolas. Interessa notar como a colonização dos<br />
diferentes países envolvidos influi nas idéias e atitudes dos indivíduos. A escola<br />
latino-americana, apesar da tentativa de repressão à funcionalista, ainda continua<br />
subordinada até hoje. O verdadeiro desafio está em pesquisar-se e analisar-se<br />
novas idéias, para se poder construir novos caminhos nas teorias latino-americanas<br />
e não precisar-se mais depender do autoritarismo funcionalista.<br />
1.1 Jornalismo Segmentado<br />
Atualmente a função atribuída aos jornalistas de informar os assuntos de<br />
relevância para a sociedade vem-se alterando ao longo do tempo. Mostrar o que o<br />
público precisa saber vem sendo substituído pelo que o público quer saber. Ou seja,<br />
a escolha de um assunto interessante para toda a sociedade está cada vez mais<br />
difícil de ser feita.<br />
Desta forma, as escolhas individuais prevalecem e faz sentido a informação<br />
procurar atender públicos distintos. Tal idéia explica a necessidade das mudanças<br />
do perfil do jornalista, pois as publicações passam a dedicar-se mais à informação<br />
personalizada, o que leva ao desenvolvimento do jornalismo especializado.<br />
5 São sistemas organizados de produção, difusão e recepção de informação. Estes sistemas são<br />
geridos, por empresas especializadas na comunicação de massas e exploradas nos regimes<br />
concorrenciais, monopolísticas ou mistos. As empresas podem ser privadas, publicas ou estatais.<br />
13
Isso está relacionado à lógica econômica que busca a segmentação do<br />
mercado com uma estratégia de atingir os grupos dissociados entre si. Muito além<br />
de ser uma ferramenta eficaz de lucro, o jornalismo especializado acaba sendo uma<br />
resposta a essa demanda por informações direcionadas, característica da formação<br />
de "audiências especificas". (ABIAHY, 2000)<br />
Nestes tempos de desintegração das ideologias e da ruptura com um<br />
projeto de modernidade que pregava a unidade, o jornalismo especializado<br />
demonstra uma mudança dos paradigmas informacionais. Na medida em<br />
que diferenças e divergências foram afrouxando os laços da coletividade, os<br />
indivíduos foram se fechando em seus interesses particulares e<br />
constatamos hoje o quanto a comunidade encontra-se dividida em nichos os<br />
mais diversos. (ABIAHY, 2000, p. 5).<br />
A jornalista Luana Pavani, disse, em seu artigo 6 , que hoje em dia,<br />
empresários, por exemplo, necessitam muito do jornalismo especializado, visto eles<br />
carecerem de informação para tomar algumas decisões. Eles devem levar em conta<br />
o ambiente interno, o macroeconômico e o da concorrência. E o jornalista está aí<br />
para isto. Uma notícia importante é saber que as demais empresas já estão<br />
exportando enquanto a sua mal definiu os mercados.<br />
Tais dados estão disponíveis na Internet, porém, não se pode perder tempo<br />
procurando-os. Os noticiários segmentados possuem, então, esta vantagem, já que<br />
o bom jornalismo setorial aborda os pilares estratégicos e ainda aponta tendências.<br />
No negócio jornalístico, o “furo” – divulgação da notícia em primeiramão<br />
– é a vantagem competitiva. No jornalismo segmentado, a agilidade é<br />
igualmente valiosa. Portanto, o diferencial é o conhecimento do repórter<br />
setorial, que rapidamente agrega ao conteúdo o possível desenrolar do fato,<br />
seu histórico e posicionamento de cada uma das partes envolvidas. A<br />
notícia aparece ao mesmo tempo - no noticiário aberto e no segmentado -,<br />
mas não com a mesma relevância. (PAVANI, 2004).<br />
O papel de coesão social no jornalismo especializado passa a cumprir a<br />
função de unir pessoas de acordo com suas afinidades, ao invés de tentar igualar a<br />
comunidade em torno de um padrão médio de informação e interesses, o que jamais<br />
atenderia os anseios de cada grupo.<br />
A busca pela identidade é um fator presente na vida dos indivíduos, dos<br />
receptores de informação, pois estão formando novas tribos ou focos de resistência<br />
à homogeneidade. A autora (PAVANI, 2004) esclarece "os produtos culturais<br />
passam a organizar-se segundo a ótica da diferenciação, portanto, a produção<br />
6 PAVANI, Luana. A diferença entre notícia e informação estratégica. Artigo escrito em 2004.<br />
Disponível em http://www.equifax.com.br/cmn_mat.asp?MAT_COD=77&MAT_ANO=2004 Acesso em<br />
14/11/2007<br />
14
informativa que atinge audiências segmentadas e as publicações especializadas faz<br />
parte do contexto de desmassificação e da personalização". (ABIAHY, 2000, p. 6)<br />
Aliados a outros fatores, estes novos parâmetros vêm resultando em alterações no<br />
campo do jornalismo.<br />
Quando o jornalismo se iniciou, cumpria uma espécie de expressão<br />
ideológica, mostrando os jornais como políticos, os jornalistas como articulistas e a<br />
informação como destinada a doutrinar o povo. No entanto, quando eles viraram<br />
"empresas", a informação adquiriu condição de "bem público, serviço à comunidade<br />
e o jornalista é o mediador, o repórter que presta essa função". (ABIAHY, 2000, p. 7)<br />
A especialização de cada função jornalística também contribuiu para<br />
delinear o atual patamar em que se encontra a profissão. A fase artesanal<br />
da profissão já está comprovadamente ultrapassada, o jornalismo, a partir<br />
da fase empresarial, assume sua condição orgânica, ou de sistema, os<br />
jornalistas são divididos de acordo com diferentes atribuições. (ABIAHY,<br />
2000, p. 7).<br />
Com o volume cada vez maior de informações a nos atingir, a tentativa de<br />
mostrar o que seria considerado mais importante no noticiário, acaba levando os<br />
telespectadores a uma desinformação. Essa atitude frenética de bombardear o povo<br />
com milhares de assuntos pode levar à exaustão pois, de acordo com Abiahy (2000),<br />
as matérias vêm sendo construídas numa linguagem rápida e supérflua.<br />
Na visão de José Marques de Melo 7 , a segmentação dos jornais e revistas no<br />
Brasil ocorre mais por seu apelo de utilidade do que em função do perfil ideológico<br />
destas publicações. O leitor busca escolher o veiculo capaz de atender suas<br />
necessidades de informação cotidiana, que o ajudem a tomar decisões tanto<br />
econômicas e políticas como de lazer.<br />
O autor destaca também possuir o jornalismo contemporâneo uma ideologia<br />
própria, manifestada por suas características básicas; o sensacionalismo, quando<br />
um jornalista quer vender a notícia e, portanto, dá emoção a mais na reportagem e a<br />
"atomização" 8 , significando que a realidade de uma sociedade não percebida ao<br />
todo e, sim nos seus fragmentos, como política, economia, esportes, ciência, entre<br />
outros.<br />
Uma última lição de José Marques de Melo é a comunicação social pressupor<br />
o manejo da linguagem e a codificação/decodificação das mensagens e, assim,<br />
7 Jornalista, professor universitário, pesquisador científico e consultor acadêmico. MELO, José<br />
Marques de. Teoria do Jornalismo: identidades brasileiras. São Paulo: Editora Paulus, 2006. 277p.<br />
8 MELO, 2006, p. 115.<br />
15
exigir cada vez mais uma formação especifica. O autor dá um exemplo: "ao cientista<br />
cabe produzir o conhecimento. Ao jornalista compete democratizá-lo, popularizá-lo".<br />
(MELO, 2006, p. 118)<br />
Mas, sem duvida, o jornalista é um profissional que estudou, pesquisou e<br />
deve ser capaz de compilar qualquer informação para o grande publico,<br />
independentemente da sua especificidade.<br />
1.2 Jornalismo em Revista<br />
Ao tratar de um assunto que ocupa um espaço enorme no país hoje em dia e,<br />
ao mesmo tempo, é tão pouco conhecido, esta é uma tentativa de explicar, orientada<br />
por teorias sobre Jornalismo em Revista, o passo-a-passo desta grande indústria.<br />
Uma revista é um veiculo de comunicação, um produto, uma marca, um<br />
objeto, um conjunto de serviços, uma mistura de jornalismo e entretenimento. De<br />
acordo com Marília Scalzo 9 (2004, p. 12), a revista é "uma história de amor com o<br />
leitor". E, como toda a relação, também precisa de confiança, credibilidade,<br />
expectativas, erros, pedidos de desculpas, brigas e reconciliações.<br />
Uma das diferenças entre uma revista e um jornal, por exemplo, fica na sua<br />
forma e no material utilizado na sua produção. Elas são fáceis de guardar sem sujar<br />
e podemos fazer coleções de várias revistas. Também são ótimas para quem quer<br />
copiar um vestido, um molde, uma decoração; para recortar e fazer pesquisas de<br />
escola.<br />
Revista é também um encontro entre um editor e um leitor, um<br />
contato que se estabelece, um fio invisível que une um grupo de pessoas, e,<br />
nesse sentido ajuda a construir identidade, ou seja, cria identificações, dá<br />
sensação de pertencer a um determinado grupo. Não é à toa que leitores<br />
gostam de andar abraçados às suas revistas – ou de andar com elas à<br />
mostra – para que todos vejam que eles pertencem a este ou àquele grupo.<br />
(SCALZO, 2004, p.12).<br />
Seguindo a sabedoria de Gabriel García Márquez 10 , citado por Scalzo (2004,<br />
p.13) "a melhor notícia não é a que se dá primeiro, mas a que se dá melhor". Esta,<br />
pode-se dizer, é a filosofia do jornalismo em revista, pois serve para explicar e<br />
9 Jornalista, consultora para projetos editoriais e professora de Jornalismo de Moda no Senac.<br />
10 Importante escritor colombiano, jornalista, editor e ativista político.<br />
16
aprofundar as histórias que acontecem, já vistas em outras mídias como televisão 11 ,<br />
rádio, jornal e Internet.<br />
As revistas vieram para ser um tipo de complemento na educação e no<br />
serviço utilitário oferecido a seus leitores. Elas unem entretenimento e interpretação<br />
dos acontecimentos, assim, fazendo crescer a duração do interesse do leitor, visto<br />
as notícias poderem ser consideradas atuais, mas, trazerem um conteúdo histórico-<br />
cultural maior. Possuem menos informação no sentido clássico do jornalismo – as<br />
notícias chamadas "quentes", acontecidas há momentos, porém, trazem mais<br />
informação pessoal – aquela que vai ajudar o leitor em seu cotidiano.<br />
Scalzo (2004) refere-se ao fato de geralmente, em jornais e televisões não se<br />
saber ao certo quem é o público leitor, seus rostos, gostos, tornando-se uma platéia<br />
heterogênea. Já a revista entra na intimidade, na casa de cada um. Há uma no<br />
quarto, outra na sala, outra no banheiro. No caso de uma revista semanal de<br />
informação, a platéia é mais selecionada, podendo ter-se uma idéia melhor do<br />
grupo, mesmo sem conseguir identificar um a um. É assim que, de fato, se conhece<br />
cada leitor e sabe-se exatamente com quem se está falando.<br />
Mira (2001, p. 149) dá outra contribuição ao dizer que, para compreender<br />
esse "emaranhado de novos títulos e novos leitores, duas variáveis mostraram-se<br />
muito importantes: a faixa etária e a classe socioeconômica do leitor. Não por acaso,<br />
essas variáveis são, depois do sexo do leitor, as mais importantes para traçar o seu<br />
perfil".<br />
Por meio de uma revista, podemos conhecer um país e suas culturas, pois ali<br />
estão seus hábitos, modas, personagens e assuntos que mobilizaram grupos de<br />
pessoas. Em diversas vezes, encontramos nela, como matéria principal, algo<br />
acontecendo na conjuntura atual do país. No Brasil, por exemplo, a política tem sido<br />
abordada. Ao mesmo tempo, encontramos no mesmo exemplar, fatos culturais em<br />
curso no país, assim como aspectos da economia, história de celebridades,<br />
reportagens sobre a novela das oito que podem refletir-se na realidade nacional. E<br />
assim por diante.<br />
O ponto de partida de todo este processo surgiu em 1663, data da primeira<br />
revista publicada de que se tem notícia. A Erbauliche Monaths-Unterredungen 12 , da<br />
Alemanha, tinha aspecto e jeito de livro, mas era considerada revista porque trazia<br />
11 A partir deste parágrafo, vou me dirigir à Televisão pela sua sigla, TV.<br />
12 Em português: Edificantes Discussões Mensais.<br />
17
vários artigos sobre teologia e era voltada para um público específico. Esta e as<br />
demais vindas um pouco depois, se pareciam com livros, mas deixavam bem clara a<br />
missão do novo tipo de publicação que surgia: aprofundar os assuntos – mais que<br />
jornais, menos que livros.<br />
Em 1731, em Londres, é lançada a primeira revista mais parecida<br />
com as que conhecemos hoje em dia, The Gentleman´s Magazine.<br />
Inspirada nos grandes magazines - lojas que vendiam um pouco de tudo –<br />
reunia vários assuntos e os apresentava de forma leve e agradável. O termo<br />
magazine, a partir de então, passa a servir para designar revistas em inglês<br />
e em francês. Na seqüência, em 1749, surge a Ladies Magazine, que lança<br />
mão da mesma receita para o público feminino. (SCALZO, 2004, p. 19-20).<br />
Ao longo do século XIX, as revistas cresceram e ditaram moda, abrindo<br />
caminho para outros estilos. Porém, a leitura só fazia parte dos hábitos de uma<br />
pequena elite culta e rica, cujos filhos eram educados em escolas na Europa.<br />
Somente aos homens eram permitido estudar, para as mulheres, que raramente<br />
saíam de casa, o analfabetismo era signo de nobreza e virtude, pois afastava do<br />
perigo dos "amores secretos por correspondência". (MIRA, 2001, p. 18)<br />
Com o aumento do índice de escolarização – principalmente por parte das<br />
mulheres - surgiu uma população alfabetizada e com desejo de instrução. Porém,<br />
não se interessavam pela profundidade dos livros, ainda eram considerados elitistas<br />
e de difícil alcance. Então, com o avanço técnico das gráficas, as revistas tornaram-<br />
se o meio ideal, reunindo vários assuntos num só lugar e trazendo belas imagens<br />
para ilustrá-los.<br />
Na história da imprensa talvez nada tenha contribuído tanto para o progresso<br />
do gênero como o surgimento da primeira revista semanal de noticias, em 1923 nos<br />
Estados Unidos. Times nasceu com o intuito de atender as necessidade de informar<br />
com concisão em um mundo onde já havia um caos de informações. "A idéia<br />
principal era trazer notícias da semana, do país e do mundo, organizadas por<br />
seções, sempre narradas de maneira concisa e sistemática, com todas as<br />
informações cuidadosamente pesquisadas e checadas". (SCALZO, 2004, p. 22)<br />
Ao contrário do usual, duas boas novas fórmulas para as revistas femininas<br />
surgiram e reforçaram o modelo. Logo depois da Segunda Guerra Mundial, em 1945,<br />
na França, aparece a Elle, revista feminina semanal com a intenção de restituir à<br />
18
mulher francesa o gosto pela vida 13 . Depois de anos de privação, a leitora encontrou<br />
nas páginas da revista idéias para se redescobrir. O sucesso foi imediato.<br />
A história das revistas no Brasil, assim como da imprensa em qualquer lugar<br />
do mundo, confunde-se com a história econômica no país. As revistas chegaram<br />
aqui no começo do século XIX junto com a corte portuguesa que vinha fugindo da<br />
guerra e de Napoleão.<br />
A primeira revista, As Variedades ou Ensaios de Literatura aparece<br />
em 1812, em Salvador, Bahia, e, segundo ela própria, propõe-se a publicar<br />
"discursos sobre costumes e virtudes morais e sociais, algumas novelas de<br />
escolhido gosto e moral, extratos de historia antiga e moderna, nacional ou<br />
estrangeiras, resumos de viagens, pedaços de autores clássicos<br />
portugueses – quer em prosa, quer em verso – cuja leitura tenda a formar<br />
gosto e pureza na linguagem, algumas anedotas e artigos que tenham<br />
relação com os estudos científicos propriamente ditos e que possam<br />
habilitar os leitores a fazer-lhes sentir a importância das novas descobertas<br />
filosóficas". (SCALZO, 2004, p. 27).<br />
Maria Celeste Mira 14 esclarece que a primeira revista surgiu por iniciativa do<br />
editor português estabelecido em Salvador, Antonio da Silva Serva, em 1812 e<br />
chamava-se As variedades ou Ensaios de Literatura. A revista tinha como objetivo<br />
defender os costumes e as virtudes morais, publicando romances, resumos de<br />
viagens, trechos de autores clássicos, algumas anedotas e boas respostas,<br />
conselhos domésticos, informações sobre navegação, instrução militar, política e<br />
ciências.<br />
Em 1813, no Rio de Janeiro, surge O Patriota, a segunda revista publicada no<br />
Brasil, propondo-se a divulgar autores e temas da terra. Em 1827, aponta O<br />
Propagador das Ciências Médicas, revista dedicada aos novos médicos que<br />
começam a atuar no país na época. Junto com ela, a pioneira entre as revistas<br />
femininas nacionais: Espelho Diamantino, sobre política, literatura, belas-artes,<br />
teatro e modas, tudo para deixar a mulher brasileira à frente do seu tempo.<br />
No início do século XX ocorre uma série de transformações científicas e<br />
tecnológicas, que se refletem na vida cotidiana das cidades. As revistas<br />
acompanham esta mudança, com diversos títulos lançados e inovações na indústria<br />
gráfica. Assim, proliferam publicações de todos os gêneros, a imprensa começa a se<br />
profissionalizar, acompanhando o evoluir da industrialização do país. Nesta época,<br />
as publicações dividem-se entre as variedades e as culturais. Porém, toda<br />
industrialização e pesquisa visavam atender a demanda da imprensa norte-<br />
13 Scalzo (2004)<br />
19
americana, que crescia muito no período. Também as imagens, antes coloridas à<br />
mão, podiam agora ser decompostas em cores por máquinas que começavam a ser<br />
importadas e difundidas nas primeiras décadas do século.<br />
Não se pode falar das revistas brasileiras sem citar alguns fenômenos<br />
editoriais que contaram a história do país ao longo dos anos. Em 1928, nasce O<br />
Cruzeiro, publicação que estabelece uma nova linguagem na imprensa nacional,<br />
através de grandes reportagens e uma atenção especial ao fotojornalismo. Na<br />
década de 1950, surge Manchete, uma revista ilustrada, também valorizando<br />
aspectos gráficos e fotográficos de uma maneira otimista. Hoje em dia, temos Veja<br />
que, após anos de censura conseguiu acertar a sua fórmula, tornando-se a revista<br />
mais vendida do Brasil, e a Época.<br />
A imprensa feminina nasceu com muita força quando as mulheres analfabetas<br />
aprenderam a ler. Com uma narrativa amorosa, a fotonovela se difundiu com grande<br />
sucesso na América Latina. Nos anos 50 e 60 vive sua época áurea no Brasil. Em<br />
termos de circulação, só perde para os quadrinhos Disney. Várias editoras se<br />
lançam neste mercado de publicações sentimentais.<br />
Do melodrama, com o cinema e suas congêneres no radio e na TV,<br />
ela herda quase tudo: temas (intrigas amorosas, traições, desencontros e<br />
mal-entendidos); personagens (o herói, o vilão e a vitima); a divisão do<br />
mundo entre ricos e pobres, a visão maniqueísta; o moralismo e o desfecho<br />
ditado pelo destino. (MIRA, 2001, p. 34).<br />
A partir dos anos 70, as revistas de fotonovela entram em declínio. Mesmo<br />
assim, no início da década de 80 ainda circulavam em torno de 20 títulos. Do lado do<br />
público foi havendo um certo desinteresse por esse tipo de narrativa, já então<br />
considerada ingênua pelas leitoras.<br />
Em 1959, nasce a primeira revista de moda brasileira, Manequim, que trazia e<br />
traz até hoje encartados, moldes de roupas para fazer em casa. Já em 1961, para<br />
acompanhar a vida da nova mulher e, também a indústria nascente de<br />
eletrodomésticos, surge Cláudia. A principio, falava sobre temas como novelas,<br />
moda, receitas, decoração e beleza. Aos poucos, começou a comentar assuntos da<br />
vida da mulher moderna, como consultas jurídicas, saúde, orçamento doméstico e<br />
sexo.<br />
14 Escritora.<br />
Com Cláudia nasce também a produção fotográfica de moda, beleza,<br />
culinária e decoração no Brasil. Fotos desse tipo até então (e no começo da<br />
vida de Cláudia também) eram todas importadas. Logo, a equipe da revista<br />
descobre que é necessário fazer uma publicação mais brasileira e, para<br />
20
isso, percebe que é preciso fotografar o estilo, a comida, a casa e,<br />
principalmente, a mulher brasileira. (SCALZO, 2004, p. 34).<br />
Nos anos 1970, com a mulher entrando com força para o mercado de<br />
trabalho, as revistas femininas, conseqüentemente, aumentaram as suas vendas. A<br />
partir disso, começam a aparecer revistas que já não tratam mais a mulher como<br />
simples dona-de-casa e mães, e sim como profissionais em busca de realização.<br />
Nova e Mais são um exemplo de publicações desta época.<br />
De acordo com Scalzo, (2004, p.37), hoje as grandes revistas femininas<br />
seguem modelos muito parecidos e, apesar de cada uma direcionar-se para um tipo<br />
específico de mulher, repetem fórmulas e cobrem mais ou menos o mesmo universo.<br />
Atualmente, o segmento feminino representa a maior fatia do mercado de revistas.<br />
Por essas afirmações, é possível perceber que a revista trata o leitor de uma<br />
maneira mais íntima, e, para isso, precisa saber ouvi-lo. São diversas as maneiras<br />
que permitem ocorrer esta troca: pesquisas qualitativas e quantitativas, telefonemas,<br />
cartas e e-mails enviados à redação. Um bom editor consegue manter uma relação<br />
estreita com determinado público e, muitas vezes, sabe antes do leitor o que tal<br />
segmento de mercado quer ou vai querer ler, pois, só assim a revista será capaz de<br />
adiantar e surpreender.<br />
O que vale para todo jornalista, sempre, é não perder a oportunidade,<br />
quando ela se apresenta, de observar um leitor folheando a revista em cuja<br />
redação trabalha. No aeroporto, no ônibus, na praia... Presta atenção no<br />
que ele lê ou não lê, quando ri, quando fica sério, quando pula páginas sem<br />
nenhuma piedade, quando pára, quando se surpreende. Esse tipo de<br />
observação silenciosa é, na verdade, a melhor bússola para quem escreve<br />
em revista. (SCALZO, 2004, p. 39).<br />
Discute-se muito, hoje, a relação entre jornalismo e entretenimento. Sabemos<br />
que o entretenimento é uma das vocações mais evidentes do veículo revista, a partir<br />
de sua própria origem. Somente no século XX, com o surgimento das revistas<br />
semanais de informação, elas incorporaram a função de informar e veicular notícias.<br />
Antes disso, não havia grandes preocupações jornalísticas.<br />
Entretanto, "todas as publicações ganharam consistência quando os<br />
procedimentos jornalísticos foram adotados pelas revistas semanais de informação.<br />
O rigor da apuração e a checagem das informações afetou o trabalho, mesmo nas<br />
revistas que não tinham o jornalismo como principal linha editorial". (SCALZO, 2004,<br />
p. 52) Porém, temos de ter em mente haver funções dentro da revista que não têm –<br />
21
nem nunca tiveram – a ver com o jornalismo propriamente dito, como palavras<br />
cruzadas, gravuras, histórias em quadrinhos, entre outras.<br />
O editorial consiste num texto que expressa a opinião de um meio de<br />
comunicação, que pode ser jornal ou revista, cujo conteúdo apresenta a opinião da<br />
empresa, da direção ou da equipe de redação, sem se ater a nenhuma<br />
imparcialidade ou objetividade. É enquadrado, segundo Bonini (2003) por muitos<br />
teóricos da comunicação como um gênero jornalístico 15 “são aqueles que estão<br />
presentes no ambiente de produção do jornal” e podem ser classificados ainda como<br />
“gêneros centrais presos – são aqueles que estruturam o jornal”. Em geral, grandes<br />
jornais e mais recentemente as revistas, reservam espaços predeterminados para os<br />
editoriais em duas ou mais colunas logo nas primeiras páginas internas.<br />
Conforme este autor, os editoriais são normalmente demarcados com bordas<br />
ou com tipologias diferentes, cujo objetivo é marcar claramente que aquele texto é<br />
opinativo, e não informativo. Segundo o Manual da Folha de São Paulo (2001, p.71),<br />
“Os editoriais não dirigem o noticiário, mas temas que neles aparecem com<br />
freqüência devem ser explorados pela reportagem”. Segundo Marques de Melo<br />
(1994, p. 95) o discurso do editorial, no contexto de empresa moderna, “constitui<br />
uma teia de articulações políticas e por isso representa um exercício permanente de<br />
equilíbrio semântico”.<br />
De acordo com os autores consultados, a linha editorial é uma política<br />
determinada pela direção do veículo de comunicação ou pela diretoria, que<br />
determina a lógica pela qual a empresa jornalística enxerga o mundo. O editorial<br />
indica seus valores, aponta seus paradigmas e influencia decisivamente na<br />
construção de sua mensagem, orientando o modo como cada texto será redigido, a<br />
hierarquia dos temas nas diferentes edições, e os termos que devem ou não ser<br />
usados.<br />
Bonini (2003) coloca ainda que a opinião de um veículo não é expressa<br />
exclusivamente nos editoriais, mas também na forma como organiza os assuntos<br />
15 São muitos os teóricos que abordam o tema Amaral (1978, 1982); Bahia (1990); Erbolato (1978);<br />
Sodré e Ferrari (1986), mas os principais trabalhos da área de comunicação quanto ao estudo dos<br />
gêneros do jornal são os de Melo (1985, 1992) e o de Chaparro (1998), embora o fundador desta<br />
discussão tenha sido Beltrão (1969, 1980, 1980). Os gêneros mais comumente citados (a partir dessa<br />
perspectiva de técnica de trabalho) são: a notícia, a reportagem, a entrevista e o editorial. Estes<br />
manuais mostram uma concepção de gênero como fixo, claramente delimitável e, por isso, passível<br />
de ser ensinado como técnica.(BONINI, 2003)<br />
22
publicados, pela qualidade e quantidade que atribui a cada um no processo de<br />
edição jornalística. Segundo Caldas (2005, p.137),<br />
O entendimento do papel do jornalista na construção coletiva da memória<br />
passa pela compreensão do contexto histórico dos fatos e do veículo em<br />
que está inserido, sua linha editorial e política. A análise do discurso<br />
jornalístico para a construção da história do cotidiano passa,<br />
necessariamente, pelo conhecimento da história de vida dos agentes<br />
envolvidos no processo de produção da informação (jornalistas e<br />
proprietários dos meios).<br />
Para tornar-se um bom jornalista de revista é prioritariamente necessário ser<br />
um bom jornalista. Seja qual for o meio onde irá trabalhar, este profissional deve<br />
preocupar-se em ampliar sua cultura geral, ter uma visão de mundo livre de<br />
preconceitos e um olhar crítico sobre o próprio trabalho.<br />
Os princípios básicos do jornalismo são iguais para qualquer tipo de<br />
veículo: o esforço para apurar os fatos corretamente, o compromisso com a<br />
verdade, ouvir todos os lados que envolvem uma questão, mostrar diversos<br />
pontos de vista na tentativa de elucidar histórias, o respeito aos princípios<br />
éticos, a busca constante da qualidade de informação, o bom texto.<br />
(SCALZO, 2004, p. 54).<br />
A partir da concepção de um texto de revista ser diferenciado dos demais, é<br />
válido, por mais bem escrito que ele esteja, ser sempre mais bem compreendido e<br />
atraente quando acompanhado de uma fotografia ou de um infográfico bem feito.<br />
Assim, dominar um pouco a linguagem visual também se torna basilar ao jornalista<br />
de revista.<br />
Ao analisar o trabalho na produção de uma revista, pode-se notar que o<br />
trabalho em equipe é essencial. A integração entre jornalistas, designers e<br />
fotógrafos é obrigatória para uma revista oferecer aos seus leitores páginas ao<br />
mesmo tempo "informativas e sedutoras". (SCALZO, 2004, p. 59) Além disso, é<br />
necessário entender um pouco de administração, pois as equipes geralmente são<br />
pequenas e cabe aos jornalistas controlar e administrar seu borderô 16 .<br />
Uma boa revista precisa de uma capa que a ajude a conquistar os leitores e<br />
os convença a levá-la para casa, sendo a vitrine da edição a fim de seduzi-lo. Isto<br />
porque ela é o primeiro elemento a prender a atenção do leitor, juntamente com o<br />
logotipo, principalmente se já for uma revista conhecida, com certa credibilidade.<br />
Além da capa, a escolha certa da pauta em uma revista é meio caminho<br />
andado. O jornalista tem de encontrar novos enfoques para os assuntos factuais, o<br />
"como" é fundamental. Pegando de exemplo uma notícia de moda: não adianta a<br />
23
evista noticiar tal desfile, pois, no dia seguinte, ele já terá recebido atenção da<br />
imprensa diária. Então, se essa informação é relevante para as suas leitoras, a<br />
publicação deverá dar um enfoque que ninguém lhe tenha dado, com informação<br />
complementada, analisada, interpretada e bem fotografada.<br />
É preciso também cuidar da diversificação e do equilíbrio entre as<br />
pautas de cada edição. A diversificação, afinal, é o que vai ditar o ritmo da<br />
revista e está na própria natureza do veículo. Nunca é demais lembrar que a<br />
mistura exata dos ingredientes, numa proporção equilibrada e bem dosada,<br />
é o segredo de qualquer boa fórmula. A cada edição o leitor deve encontrar,<br />
ao mesmo tempo, variedade e algumas marcas de identidade, que lhe<br />
permitem reconhecer e manter uma relação e familiaridade com sua revista<br />
predileta. (SCALZO, 2004, p. 64-65).<br />
Assim como a fotografia, os infográficos estão no primeiro nível de leitura de<br />
qualquer meio impresso. Ou seja, eles são, muitas vezes, as portas de entrada para<br />
os textos. Ali o leitor deposita, inicialmente, sua atenção e pode ser por meio deles<br />
que ele decida se vai ler ou não a matéria. É uma maneira de fornecer informações<br />
ao leitor, utilizando um conjunto de gráficos, tabelas, desenhos, fotos, legendas,<br />
mapas, maquetes, entre outras. O bom jornalismo é sempre tecnicamente bem feito<br />
e o jornalismo tecnicamente bem feito tende a ser um jornalismo necessariamente<br />
ético.<br />
"A fim de garantir ao leitor que as informações veiculadas sejam<br />
objetivas e independentes de interesses comerciais, governamentais,<br />
partidários, religiosos e outros, uma publicação e seus colaboradores<br />
devem, além de evitar conflitos de interesses, evitar dar ao leitor a<br />
impressão de que esses estejam ocorrendo, não basta, ao jornalista ser<br />
honesto, é preciso parecer honesto". (SCALZO, 2004, p. 79).<br />
O verdadeiro desafio está na concepção de jornalistas serem seres humanos<br />
e cidadãos com opções e convicções políticas, culturais, religiosas e sexuais. Assim<br />
sendo, a melhor forma de tratar desses assuntos é com honestidade e humildade,<br />
sabendo que não se é isento nem objetivo por natureza, embora seja esse o objetivo<br />
em cada reportagem.<br />
16 Dinheiro usado para as edições e reportagens.<br />
24
1.3 Jornalismo de Moda<br />
Depois de ter mostrado a importância do Jornalismo em revista, suas<br />
diferenças dos jornais e toda a sua trajetória histórica, entra-se agora em uma parte<br />
mais especializada deste tipo de publicação, o Jornalismo de Moda. Enquanto, nos<br />
jornais, a parte dedicada à moda não recebe status de editorias, permanecendo<br />
como uma seção, sem especialidade, nas revistas femininas, normalmente, existem<br />
as editorias de moda.<br />
Porém, de acordo com Ruth Joffily 17 , ambas as situações prejudicam o<br />
jornalista de moda, "por não ser reconhecido como integrante de uma editoria, seu<br />
salário é defasado em relação ao dos colegas jornalistas de outras especialidades".<br />
Ou seja, acaba assistindo a seu trabalho servir apenas como um espaço de<br />
divulgação ou para a publicar propagandas, perdendo a ligação com o leitor e<br />
curvando-se à outra, com o anunciante.<br />
O trabalho presente não pretende criticar a importância da publicidade dentro<br />
de revistas, principalmente nas de moda, pois tem consciência de ser ela que,<br />
muitas vezes, mantém a revista nas bancas. Porém, de acordo com leituras e<br />
experiências, pode-s dizer que afastar a cobertura jornalística de moda do jornalismo<br />
e entregá-la à publicidade só resolve o déficit de faturamento a curto prazo, pois o<br />
público sente (e ressente) quando a publicação transforma o editorial em mais um<br />
"cabide de anúncios". (JOFFILY, 1991, p.12)<br />
17 Jornalista, professora, redatora e produtora.<br />
O valor do editorial de moda está em manter o público atualizado em<br />
relação aos lançamentos e tendências. Está em realizar a crítica, buscando<br />
critérios estéticos e pragmáticos. Estéticos, pelo lado criativo e artístico da<br />
criação de moda. Pragmáticos, porque a roupa é para ser usada no<br />
cotidiano, porque há períodos em que o consumidor anda de bolso vazio.<br />
Está em acompanhar, pelo prisma da moda, a flutuação dos<br />
comportamentos, a mudança nas correntes socioculturais. Em outro dos<br />
seus ramos, o jornalismo de moda especializado em prestar serviço ao leitor<br />
– informação extremamente objetiva -, realiza-se, na minha opinião, a<br />
concretização do nosso papel junto ao público, qual seja o de adequar o<br />
sonho da moda à realidade da leitora... Dar a ela o direito de se apropriar do<br />
sonho no seu dia-a-dia. (JOFFILY, 1991, p. 12-13).<br />
25
A importante questão volta-se para o fato de o profissional realizar seu<br />
trabalho da melhor maneira possível. O jornalista que participa de uma publicação<br />
possui métodos mais fáceis de conhecer suas leitoras e seus principais perfis. Desta<br />
maneira, sigo o exemplo de Joffily (1991, p. 70) ao fala sobre o caso das fotos nos<br />
editorias de moda: "a modelo, na hora da foto, deve saber interpretar, colocar-se no<br />
papel da leitora da revista". É sabido que ela recebe orientações, mas a sua<br />
habilidade, além de ter um rosto e corpo bonito, é expressá-los através da sua<br />
postura, pois a foto é feita para as leitoras imaginarem-se usando aquela roupa.<br />
Outra questão a se pensar, ainda relativa à imagem da leitora, é sobre como<br />
a moda exposta na publicação é adequada à realidade da mulher brasileira. Na<br />
moda que estamos acostumados a ver nas revistas, os tipos físicos são muito<br />
fixados no padrão europeu, naturalmente estreitando o mercado consumidor. A cor<br />
da pele, por exemplo, não é devidamente levada em conta, pois, dificilmente se<br />
encontram propostas de cores que favoreçam a mulher negra ou de tez mais<br />
morena. Além disso, as medidas das brasileiras quanto aos quadris, busto etc.,<br />
fogem dos padrões europeus.<br />
Na realização de uma matéria de moda, são mobilizados inúmeros<br />
profissionais, e somente o produto final conta. Se este sair com imperfeições, não<br />
importa quem tenha errado, o trabalho de todos estará comprometido, visto o<br />
trabalho de equipe ser essencial na revista. O jornalista de moda não pode dar-se o<br />
luxo de "passar os olhos" na produção, ele tem de acompanhá-la o passo-a-passo.<br />
A pauta determina a cobertura das tendências – a notícia da moda -,<br />
de eventos – feiras, lançamentos -, dependendo da linha editorial, explora<br />
as ousadias de estilo, propõe estilo, sugere de maneira ampla opções para<br />
o seu público. Em termos jornalísticos, o centro da atenção é a leitora. Para<br />
ela, em seu favor, devem estar dirigidas as matérias – para informá-la.<br />
Nesse sentido – coisa ainda a se desenvolver com mais intensidade no<br />
jornalismo de moda – o editorial de moda poderia não apenas apresentar o<br />
que há à disposição no mercado mas também realizar a "crítica", apontar as<br />
ligações da moda num sentido mais amplo com a atualidade sociocultural,<br />
avaliar as propostas dos estilistas, funcionar até mesmo, em alguma<br />
medida, como uma defesa do consumidor, auxiliar a leitora a adequar a<br />
moda ao seu tipo físico e estilo de vida. (JOFFILY, 1991, p. 86-87).<br />
Dotado de um ambiente democrático, com muitas sugestões, a equipe possui<br />
mais chances de conseguir desenvolver os objetivos lidos na citação acima. Durante<br />
a reunião de pauta, dá-se início ao processo da publicação: são determinadas as<br />
matérias de texto, os assuntos e as fotos; assim, também o clima da produção, se<br />
26
será interna, no estúdio ou externa, na rua. Os prazos finais são fixados nesta<br />
reunião de pauta, muitas vezes as revistas estrangeiras sendo utilizadas como fonte<br />
de sugestões, tanto para o layout da revista como para a reportagem.<br />
Quando nos referimos ao jornalismo de moda, logo, pensamos que somente<br />
um jornalista propriamente dito pode realizar todo o trabalho. Mas a autora esclarece<br />
existirem diversos outros profissionais também fazendo parte desse trabalho. O<br />
produtor é um deles. "É aquele que tem todos os contatos com estilistas, modelos e<br />
fotógrafos. Ele organiza tudo para que a sessão de fotos saia perfeita. Só descansa<br />
quando as luzes do estúdio se acendem. Seu trabalho é no tocante à execução,<br />
braçal". (JOFFILY, 1991, p. 117)<br />
A editora de moda e a editora de arte fazem a seleção final das fotos a serem<br />
aproveitadas nas reportagens da revista. A partir daí, o trabalho final da edição<br />
passa para a fase da arte, como são chamadas nas redações a diagramação e a<br />
composição das fotos com textos nas páginas.<br />
A arte devolve a matéria à redação com a marcação do espaço que<br />
será ocupado pelas fotos, títulos, entretítulos, textos e legendas. A redatora<br />
escreve os textos, conforme o tamanho indicado, obviamente, dentro do<br />
espírito da matéria. Completada a primeira etapa da fase gráfica, uma prova<br />
de página é enviada à redação, para uma revisão final. É a última<br />
oportunidade de se mexer no texto. Depois disso, uma nova reunião de<br />
pauta para as matérias do mês seguinte, e assim sucessivamente.<br />
(JOFFILY, 1991, p. 91-92).<br />
Tecnicamente falando, de acordo com Joffily (1991), existem três tipos de<br />
matérias de moda: tendência, serviço e comportamento. A cada uma corresponde<br />
um enfoque tanto do texto quanto da foto ou ilustração. Entretanto, na maioria das<br />
vezes, esses três tipos de matéria se misturam. Nada é muito rígido na definição de<br />
uma pauta, pois boas idéias geralmente criam uma combinação dos "ingredientes"<br />
(JOFFILY, 1991, p. 95)<br />
Em resumo, matéria sobre tendência aborda o que se estará usando na<br />
estação seguinte, quais as peças e acessórios em que as leitoras poderão apostar<br />
para estar dentro da moda. Já matéria de serviço fala sobre alguma marca,<br />
apresenta lojas, locais relacionados com a moda, compara preços etc., tudo para<br />
facilitar a vida da leitora na hora de procurar tal peça ou os melhores preços.<br />
Uma publicação ganha notável "colorido" com matérias sobre comportamento,<br />
isto porque interessa a um público maior do que o público de moda. Em suma, esse<br />
tipo de reportagem na revista de moda a insere na atualidade, nas correntes sociais<br />
27
e culturais, resgata a moda como uma dessas correntes, com sua história,<br />
preocupação estética e sua simetria com os fatos.<br />
Tem-se como exemplo, a minissaia e o jeans, que nunca saem de moda e já<br />
atravessaram décadas. Envolve também mudanças de hábitos de consumo da<br />
sociedade, perfil de estilistas, mostrando propostas desenvolvidas ao longo de sua<br />
carreira Relembra figuras históricas da moda, situando sua importância na época. À<br />
medida que se enriquecem as matérias com depoimentos de pessoas de destaque<br />
da época, pesquisa e material de documentário, mais interessante se torna a sessão<br />
da revista.<br />
Na hora de montar a produção de moda de uma revista tem de saber compor<br />
os elementos com uma identidade própria, e não torná-la valida porque se parece<br />
com o real. Como toda ficção, ela busca expressar alguma coisa, dentro de diversos<br />
recursos que devem ser coerentes entre si, que devem dialogar na mesma língua.<br />
Texto e imagem devem ter sincronia em uma publicação. Cada matéria traz<br />
uma intenção e um estilo e, sem dúvida, um texto que acompanhe a vida da matéria<br />
é primordial. A partir da definição de um público para a revista, uma redação<br />
competente irá criar um bom texto. De acordo com Joffily (1991, p. 117),<br />
habitualmente, as publicações de moda procuram reduzir o espaço para o texto,<br />
destacando mais as fotos, pois é crença corrente que a leitora de moda lê pouco. No<br />
entanto, novas revistas femininas aparecidas no mercado desmentem esse<br />
preconceito, pois o texto dá um charme a mais à publicação. A moda interessa à<br />
leitora no seu cotidiano; mas esse cotidiano tem um contexto, do qual a leitora não<br />
está alheia.<br />
28
CAPÍTULO II - A MO<strong>DA</strong><br />
As teorias em torno da moda proliferaram entre o final do século XIX e o início<br />
do século XX. O tema ocupou um lugar central nas reflexões de artistas e<br />
intelectuais empenhados em desvendar a dinâmica da modernidade, compreendida<br />
como o novo modo de vida que despontava no fluxo da cultura urbana e da<br />
sociedade industrial.<br />
Segundo Crane 18 (2006), entre as décadas de 1970 e 1980, com a ocorrência<br />
da globalização, o mundo da moda tornou-se mais complexo e sua importância<br />
aumentou consideravelmente. O desenvolvimento de um novo mundo da moda<br />
gerou uma demanda de pesquisas, promovendo um crescimento de trabalhos<br />
acadêmicos na área.<br />
Assim como outras formas de cultura popular, ela emerge de um conjunto de<br />
organizações e redes que interagem e moldam esse conceito de várias maneiras.<br />
Os significados dos produtos culturais são afetados por relações entre criadores e<br />
públicos e entre administradores e mercados.<br />
De acordo com Solange Wajnman 19 em seu artigo no livro Moda,<br />
Comunicação e Cultura, existem diversos motivos para a Moda ter tido um grande<br />
crescimento. Entre eles, destaca-se o amadurecimento das indústrias de confecção<br />
e têxteis, a qualificação da mão-de-obra, os novos padrões de qualidade impostos,<br />
além da abertura do mercado internacional.<br />
Nesse sentido, a moda é um sistema de comunicação próprio, um<br />
vetor de organização social. A indústria da moda está sendo desenvolvida<br />
no sentido de configurar novas formas de relacionamento social que<br />
18<br />
Especialista em sociologia, artes e mídia, Diana Crane é professora emérita de sociologia na<br />
Universidade da Pensilvânia, Filadélfia.<br />
19<br />
Mestre em Psicologia Social da PUC – SP; doutora em Sociologia, Paris V. Sorbonne, professora<br />
do Programa de Mestrado em Comunicação da UNIP e da Graduação em Moda.<br />
29
superam os antigos, cunhando novas identidades dos indivíduos e dos<br />
grupos. (WAJNMAN, 2002 p. 29).<br />
Enquanto cada item do vestuário obedecer a um estilo especifico, nem todos<br />
os estilos estarão na moda, pois eles entram e saem da moda. E enquanto cada<br />
item do vestuário obedecerá a uma moda determinada, nem toda moda é elegante.<br />
Alguns tipos de moda se dispõem a ser "antimoda". Finalmente, pode-se dizer que,<br />
enquanto toda moda é estilizada, nem toda moda refere-se a um item de vestuário.<br />
Estilos de moda envolvem mudar a cor ou a forma do corpo.<br />
2.1 Conceituação e contextualização histórica<br />
Moda. De acordo com a Wikipedia 20 , é a tendência de consumo da<br />
atualidade. É composta de diversos estilos que podem ser influenciados por diversos<br />
aspectos. Acompanha o vestuário e o tempo e se integra ao simples uso das roupas<br />
no dia-a-dia. É uma forma passageira e facilmente mutável de se comportar e,<br />
sobretudo, de se vestir. Para criar estilo, os figurinistas utilizaram-se de cinco<br />
elementos básicos: cor, silhueta, caimento, textura e harmonia.<br />
É um sistema que acompanha o vestuário e o tempo, integrando o simples<br />
uso das roupas no dia-a-dia a um contexto maior, político, social, sociológico. Pode-<br />
se ver a moda naquilo escolhido de manhã para vestir; no visual de um punk, de um<br />
skatista e de um pop star; nas passarelas do mundo; nas revistas e até mesmo no<br />
terno de um político ou no vestido das avós.<br />
Assim, a etimologia da palavra fashion 21 , de acordo com o Oxford English<br />
Dictionary, remete ao latim factio (de facere) significando "o poder de fazer".<br />
Portanto, o sentido original de fashion referia-se a atividades; fashion era algo que<br />
uma pessoa fazia, diferentemente de hoje, talvez, quando a empregamos no sentido<br />
de algo que usamos". (BARNARD, 2003 p. 23)<br />
Fashion também pode ser entendida como fetiche, visto facere também<br />
fazer parte da raiz dessa palavra. Deste modo, podemos relacionar os itens de moda<br />
e de indumentária como produtos fetichizados, já que são fabricados e consumidos<br />
pela sociedade capitalista.<br />
20 http://www.wikipedia.org<br />
21 Fashion significa Moda em inglês.<br />
30
Ainda em sua obra, Moda e Comunicação, Barnard 22 dá outros sentidos para<br />
a palavra fashion, ou seja, moda. Como substantivo, a expressão significa um<br />
gênero ou uma forma de fazer específica, como uma maneira ou conduta. Fashion<br />
pode ser considerada um sinônimo da palavra "modo". Já como verbo, possui o<br />
sentido de atividade, o "fazer" e o "fabricar". Além disso, também pode ser utilizado<br />
como sinônimo de termos como "adorno", "estilo" e "vestimenta".<br />
A partir da concepção de Renata Pitombo 23 (2005), modus, palavra oriunda<br />
do latim, significa maneira, a moda é denominada como maneira, modo individual de<br />
fazer, ou uso passageiro que regula a forma dos objetos materiais, e<br />
particularmente, os móveis, e as vestimentas<br />
O sociólogo e teórico da moda Gilles Lipovetsky, escreve que a moda não<br />
pertence nem a todas as épocas nem a todas civilizações. Pois, somente a partir do<br />
final da Idade Média podemos reconhecê-la como sistema, com suas metamorfoses<br />
constantes, seus movimentos bruscos e suas extravagâncias, como veremos mais<br />
adiante neste capítulo.<br />
2.2 A moda nos últimos séculos<br />
Antes do início do capitalismo mercantil e do crescimento das cidades na<br />
Europa Medieval, a maioria dos historiadores do traje concordam quanto a,<br />
praticamente, não haver moda, "apesar de, nas cortes imperiais da China e do<br />
Japão existirem modas no que diz respeito às cores, aos enfeites e outros<br />
pormenores, mesmo que o formato das roupas fosse o mesmo", (WILSON, 1985 p.<br />
29)<br />
Até o século XIV são visíveis as mudanças ocorridas no Ocidente nas formas<br />
de vestir, devendo-se isso à expansão do comércio, ao crescimento da vida nas<br />
cidades e à sofisticação nas cortes reais e aristocráticas. Durante o período do<br />
Império Romano, poucas transformações aconteciam na vestimenta do povo –<br />
principalmente ou somente na vida dos ricos, investindo-se em penteados, perucas e<br />
cosméticos.<br />
22 Especialista em História e Teoria da Arte & Design da Universidade de Derby.<br />
23 Doutora em Comunicação.<br />
31
Bem recuado no tempo, já em 476, no Império Oriental ou Bizantino, cujo<br />
centro era Constantinopla 24 , o imperador, como um rei sacerdote, vestia trajes<br />
religiosos. Segundo Wilson (1985), tanto os homens como as mulheres da época<br />
usavam vestimentas largas, em estilos simples e permanentes. O vestuário<br />
distinguia pobres de ricos, dirigentes dos dirigidos; apenas pelo fato de as roupas<br />
dos trabalhadores serem feitas com lã, ao passo que as roupas da corte usavam<br />
seda em sua confecção, além de serem muito mais enfeitadas do que as vestes do<br />
povo. Com a passagem do tempo, propagaram-se estilos mais elaborados que<br />
aqueles existentes até o momento, tanto para os homens como para as mulheres.<br />
O gibão para os homens era usado muito curto e apertado. Os<br />
vestidos, também usados pelos homens e pelas mulheres, tornaram-se<br />
extravagantemente largos e compridos, com as mangas ou muito apertadas<br />
ou muito largas, as bainhas com cortes fantásticos, enquanto os chapéus e<br />
toucas passaram a ter as formas mais extravagantes e mudavam<br />
rapidamente de formato. Os sapatos passaram a ser exageradamente<br />
compridos à frente e bicudos. (WILSON, 1985, p. 32-34).<br />
Somente a partir dos séculos XV e XVI usar roupas ultrapassadas começou a<br />
ser motivo de vergonha. Assim, as classes mais baixas tentavam reproduzir as<br />
modas costumeiras daqueles com possibilidade de pôr de lado as roupas<br />
ultrapassadas. Porém, era praticamente impossível concluir essa tarefa com<br />
sucesso, já que as roupas eram caras e a classe não podia mudar o guarda-roupa<br />
com tanta rapidez em tão pouco tempo. Assim sendo, continuaram a vestir o que há<br />
tempos já não estava em voga.<br />
Sarja azul, sarja castanha avermelhada e pano de algodão branco eram os<br />
tecidos utilizados pelo povo da classe mais baixa, ou seja, panos baratos. Nessa<br />
época, diferenciavam-se os indivíduos pelo tipo de roupa usada.<br />
O mestre artesão das corporações medievais vestia uma roupa<br />
especial, ou pelo menos usava um capuz. No final da era Medieval, a classe<br />
dos mercadores vestia e copiava as modas dos nobres que vestiam peles,<br />
sedas e jóias, supostamente reservados aos proprietários de terras e aos<br />
cavaleiros. (WILSON, 1985, p.37).<br />
De acordo com Diana Crane, as roupas da moda para as mulheres no século<br />
XIX tinham elementos de controle social, pois exemplificavam a concepção<br />
dominante e restritiva dos papéis femininos, pois o ideal era que trabalhar nem<br />
dentro nem fora de casa, sendo suas roupas ornamentais e complicadas.<br />
A "ociosidade aristocrática" (CRANE, 2006) era considerada um modo de vida<br />
indicado para as mulheres de classe média e alta, assim se refletindo nas suas<br />
24 Atualmente conhecida como Istambul, maior cidade da Turquia.<br />
32
oupas. A composição nada prática incluía corpetes amarrados e crinolinas 25<br />
volumosas e de forma geral, prejudicava a saúde feminina. Se as mulheres de<br />
classe privilegiada utilizavam tal tipo de vestimenta, o mesmo era totalmente<br />
inapropriado para aquelas da classe operária, pois dificultava na realização das<br />
atividades diárias por serem roupas pesadas e apertadas.<br />
Na metade do século XIX, os itens do guarda roupa geralmente eram<br />
comprados. A industria parisiense prêt-à-porter 26 , produzia roupas baratas para<br />
serem vendidas em diversos lugares. (CRANE, 2006) Outra alternativa era mandar<br />
fazê-las em alfaiates, serviço digno naquela época, pois, atualmente, são poucos os<br />
alfaiates remanescentes, já que, não se é mais costume mandar fazer roupas para<br />
tal dia da semana ou ternos para inverno e verão.<br />
Dando continuidade à análise, de acordo com as teorias de Crane, as roupas<br />
das mulheres eram geralmente feitas em casa, pois, na época, era comum saber<br />
costurar, aprendendo tal serviço antes do casamento. Porém, notava-se a brusca<br />
diferença entre as vestimentas das mulheres de diferentes classes sociais. O<br />
verdadeiro símbolo de elegância de uma dama era a riqueza nos detalhes de cada<br />
traje em uma ocasião particular.<br />
Demonstrava-se que um traje era típico de classe média por diversas<br />
maneiras. Primeiro, por detalhes específicos do modelo de uma roupa,<br />
como mangas justas, as anquinhas ou a cauda de uma saia. Certos<br />
detalhes mudavam todos os anos, e pode-se precisar facilmente de quando<br />
são datados. Segundo, pelo uso de tecidos caros e delicados. Terceiro, pelo<br />
uso de cores claras e brilhantes; e quarto, pelos acessórios, entre os quais<br />
se encontravam chapéus, luvas, sombrinhas, leques e lenços, e peças de<br />
lingerie, como espartilhos e crinolinas. (CRANE, 2006, p. 109).<br />
Cabe ressaltar uma roupa íntima característica, em voga até o começo do<br />
século XX, o espartilho. "Um elemento essencial do vestuário feminino entre os<br />
ricos. Firmemente amarrado ao redor do peito, cintura e quadris, dificultando a<br />
respiração e atividades físicas em geral". (CRANE, 2006).<br />
É verdade que a natureza de um guarda roupa feminino era muito<br />
influenciada pelos tipos de acessórios usados. Para estar permanentemente na<br />
moda, a adição de alguns itens era essencial: xales, echarpes, chapéus, luvas e<br />
lenços são alguns deles. Mesmo as mais pobres possuíam lenços, ou seja,<br />
25 Criada na década de 1840 era uma pequena anquinha feita da união da crina do cavalo com fios<br />
de algodão. Servia para conquistar o efeito de roda desejado nas saias e, tinha, em média, um<br />
diâmetro de 3 metros. (Dicionário da Moda. 2007, p. 204)<br />
26 Expressão francesa que significa "pronto para vestir", ou seja, indica roupa que é comprada<br />
pronta. (Enciclopédia da Moda. 2007, p. 359)<br />
33
conseguiam seguir a risca alguns padrões da classe media quando podiam baratear<br />
o custo. A autora esclarece que, na maior parte do período, os xales mais elegantes<br />
eram os feitos de cashmere 27 e, em todas as classes sociais, era considerado<br />
impróprio uma mulher sair de casa sem chapéu.<br />
Em 1837, os chapéus, que também constituíam símbolos poderosos<br />
de identidade masculina, foram igualmente incorporados pelas mulheres<br />
durante este período. A cartola passou a ser usada com trajes femininos de<br />
montaria a partir da década de 1830 e permaneceu em uso ao longo do<br />
século. (CRANE, 2006, p. 206-208).<br />
O paletó combinado com saia para compor um conjunto foi chamado de<br />
"símbolo da mulher emancipada no século XIX". Na primeira metade deste, o vestido<br />
ainda dominava a moda mas, a partir da segunda metade do século, o paletó<br />
ressurgiu como parte do traje para se usar no campo ou no litoral. Casacos largos,<br />
semelhantes a modelos masculinos, usavam-se com blusas de colarinho masculino,<br />
gravata-borboleta e chapéu de palha. (CRANE, 2006)<br />
As normas rígidas da indumentária correta sugerem não sair sem chapéu,<br />
luvas e meias, mesmo no verão. A partir de 1930, as mulheres iniciaram o uso de<br />
calça, embora só em balneários e não nas ruas. Durante a Segunda Guerra<br />
Mundial 28 é que ela começou a ser usada com mais freqüência devido à escassez<br />
de roupas. Porém, somente em 1950 as calças para o sexo feminino passaram a<br />
fazer parte da vida urbana.<br />
Com a Revolução Industrial 29 do século XIX, relacionou-se a liberdade da vida<br />
citadina com o desenvolvimento do individualismo, e a moda como expressão do<br />
indivíduo. Em um mundo dominado pela primeira vez por máquinas, o capitalismo 30<br />
atingiu um novo nível, criando grandes centros turbulentos nas cidades, com novas<br />
características. (WILSON, 1985)<br />
Assim, a moda passou a ser mais importante do que antes. A diferença das<br />
alamedas calmas dos séculos anteriores para as ruas turbulentas da nova geração<br />
era assinalada pelas roupas, cada vez mais marcantes da distinção entre o "estar<br />
em casa" e o "estar em público". (WILSON, 1985)<br />
27<br />
Lã fina e macia obtida a partir do pêlo de cabras da região da Caxemira. (Dicionário da Moda.<br />
2007, p. 155)<br />
28<br />
Guerra que durou de 1939 a 1945 entre os países Aliados (China, França, Grã-Bretanha, União<br />
Soviética e Estados Unidos) e as Potências do Eixo (Alemanha, Itália e Japão).<br />
29<br />
Consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com profundo impacto no processo produtivo<br />
em nível econômico e social, iniciado na Grã-Bretanha.<br />
30<br />
Sistema de organização de sociedade baseado na propriedade privada e na liberdade de contrato.<br />
34
A regra de antigamente para o homem elegante (seda, rendas, veludo) hoje<br />
foi deixado para trás. O homem moderno evoluiu, usando roupas normais do dia-a-<br />
dia, acessórios e tecidos confortáveis e de acordo com as estações. As mulheres<br />
também acompanharam esse desenvolvimento, trocaram as saias exageradamente<br />
almofadadas, o pó e as perucas, pelo algodão, a chita e a mousseline 31 .<br />
Assim nasceram os estilos característicos do Império e da Regência<br />
para as mulheres, e pela primeira vez em várias centenas de anos, os<br />
espartilhos foram abandonados e as pernas mostradas, por vezes de forma<br />
bastante chocante. No entanto, nessa mesma altura os papéis sociais e<br />
econômicos dos homens e das mulheres na sociedade começaram a<br />
divergir mais profundamente; no início do século 19, o papel das mulheres<br />
na sociedade começava a diminuir, a maneira de vestir começava a<br />
distinguir os sexos de forma mais acentuada e a moda já não era mais, tal<br />
como fora nas cortes do século 17, apenas uma moldura sem preço para a<br />
beleza feminina. Aconteceu qualquer coisa de mais sutil; criou-se a<br />
feminilidade. (WILSON, 1985, p. 45).<br />
No final do século XX, a gravata virou um símbolo de emancipação feminina e<br />
uma maneira de desafiar o status social dos homens. "Possuía significados<br />
diferentes, que dependiam de onde e por quem era usada, permanecendo, assim,<br />
um marco de independência feminina na publicidade, em revistas de moda e filmes".<br />
(CRANE,2006)<br />
A essa altura, o objetivo da moda era mudar as proporções do corte, forma e<br />
cor das roupas, projetando imagens que atribuíam significados aos itens de<br />
vestuário. Sobre as tais condições, os estilos fluíam do centro para a periferia e vice-<br />
versa.<br />
De acordo com Elizabeth Wilson, o primeiro desenhador de modas<br />
verdadeiramente moderno foi Charles Frederick Worth, inglês que fez fama e fortuna<br />
em 1850 na corte de Napoleão III da França, quando desenhou os vestidos da<br />
princesa Pauline Metternick e da imperatriz Eugénia. A partir deste momento, as<br />
roupas femininas elegantes começaram a ser consideradas somente as de um<br />
estilista e a indústria do vestuário com a moda produzida em massa surgiram.<br />
Por outro lado, à medida que os velhos sinais da posição social<br />
desapareciam, surgia o uniforme 32 . Em decorrência, eles foram o primeiro tipo de<br />
vestuário produzido em massa. Simbolizavam o avanço do Estado Moderno na vida<br />
do indivíduo. Mas, até os próprios uniformes estão sujeitos à moda. O setor feminino<br />
da Marinha Americana tinha um corte elegante. Nos anos 1960 e 1970, até as freiras<br />
31 Palavra francesa que se refere a tecido de algodão muito fino, leve e transparente.<br />
32 Padrão de vestuário usado por membros de uma dada organização.<br />
35
modernizaram os seus hábitos. (WILSON, 1985) Simultaneamente, as mulheres<br />
elegantes e arrojadas desse século ainda cultivavam o lado romântico na hora da<br />
produção.<br />
Pode-se também argumentar que os elementos pré-modernistas da moda<br />
contemporânea contribuem para a existência de uma "hegemonia conflitante".<br />
(CRANE, 2006) "A moda pós-moderna, da maneira como é mostrada nas revistas de<br />
moda e personificada em produtos, não oferece às mulheres uma identidade<br />
específica. Pelo contrário, a heterogeneidade dos estilos contemporâneos permite<br />
às mulheres assumir uma variedade de identidades possivelmente contraditórias".<br />
Assim sendo, a moda acelerou seu processo e proliferou-se andando no ritmo<br />
da vida moderna. Trajes antigamente reflexos de status e conformismo social, com<br />
seus ricos tecidos, já foram deixados no passado. A roupa, agora, constitui o gosto<br />
da pessoa, seu estado de espírito e sua personalidade.<br />
A moda e o vestuário, como papel de tornassol, oferecem pistas para<br />
desvendar as ligações entre estrutura social e cultura para traçar os<br />
itinerários da cultura material em sociedades fragmentadas. Na sociedade<br />
cada vez mais multicultural do século XXI, os códigos de vestuário<br />
continuarão a proliferar como meio de expressar relações no interior dos<br />
grupos e segmentos sociais, e entre eles, e como indicadores de respostas<br />
a hegemonias ainda mais conflitantes. (CRANE, 2006, p. 474).<br />
A sociedade pós-moderna é uma sociedade de consumo. Portanto, a moda<br />
deve ser considerada como tendo uma afinidade especial com essa época. A julgar<br />
pelo compreendido com as teorias citadas no inicio desta fundamentação teórica<br />
comparadas às finais, atualmente, a industria da moda funciona de uma maneira<br />
muito rápida. Quando um item da vitrine não está mais em voga, rapidamente outro<br />
toma o seu lugar e assim por diante. E, de acordo com Barnard (2003), o ciclo de<br />
obsolescência internamente construído ou planejado é moda. Conseqüentemente, o<br />
desejo por outro modelo, o mais recente possível é instantaneamente satisfeito pelo<br />
ciclo da moda na pós-modernidade.<br />
Nesse momento, podemos considerar que: o vestuário como forma de<br />
comunicação tornou-se um conjunto de dialetos em vez de uma língua universal.<br />
36
2.3 A moda e seu destino nas sociedades modernas<br />
A moda não apareceu sozinha; paralelamente, em velocidades e graus<br />
diferentes, outros setores como decoração, linguagens, maneiras, gostos, idéias,<br />
artistas e obras culturais foram atingidos por todo o processo da moda. "Nesse<br />
sentido, é verdade que a moda, desde que está instalada no Ocidente, não tem<br />
conteúdo próprio; forma especifica da mudança social, ela não está ligada a um<br />
objeto determinado, mas é, em primeiro lugar, um dispositivo social caracterizado<br />
por uma temporalidade particularmente breve, por reviravoltas mais ou menos<br />
fantasiosas". (LIPOVETSKY, 1989)<br />
Entre 1340 e 1350 essa inovação espalhou-se por toda a Europa Ocidental e,<br />
a partir daí, várias mudanças começaram a ocorrer. As variações das vestimentas<br />
tornam-se mais freqüentes e arbitrárias, em um ritmo nunca visto antes. A<br />
mutabilidade da moda se impôs como fato evidente, transformando-se<br />
incessantemente.<br />
Com a moda, aparece uma primeira manifestação de uma relação social<br />
que encarna um novo tempo legitimo e uma nova paixão própria ao<br />
Ocidente, a do "moderno". A novidade tornou-se fonte de valor mundano,<br />
marca de excelência social; é preciso seguir "o que se faz" de novo e adotar<br />
as últimas mudanças do momento: o presente se impôs como o eixo<br />
temporal que rege uma face superficial, mas prestigiosa da vida das elites.<br />
(LIPOVETSKY, 1989, p.33).<br />
É certo ter sido no século XIX que a moda masculina começou a desaparecer<br />
diante da feminina. Os novos cânones da elegância dos homens, a discrição,<br />
sobriedade e rejeição à ornamentação, fizeram da moda e seus artifícios uma regalia<br />
feminina. E, por essas e outras razões, a moda não cessou de despertar a crítica, de<br />
chocar as normas estéticas, morais e religiosas dos contemporâneos.<br />
De maneira crescente, a moda trabalhou no refinamento e aguçamento da<br />
sensibilidade estética, "civilizando" o olho, a fim de saber distinguir pequenas<br />
diferenças. O vestuário já não é feito como antigamente, que passava de geração<br />
para geração e sim, de milhares de variações e opções que permitem ao indivíduo<br />
desprender-se das normas antigas, montando um gosto mais pessoal.<br />
37
Introduzindo continuamente novidades, legitimando o fato de tornar<br />
exemplo nos contemporâneos e não mais no passado, a moda permitiu<br />
dissolver a ordem imutável da aparência tradicional e as distinções<br />
intangíveis entre os grupos, favoreceu audácias e transgressões diversas<br />
não apenas na nobreza, mas também na burguesia. A moda deve ser<br />
pensada como instrumento da igualdade de condições. Ela alterou o<br />
princípio da desigualdade de vestuário, minou os comportamentos e os<br />
valores tradicionalistas em beneficio da sede das novidades e do direito<br />
implícito à "bela aparência" e às frivolidades. (LIPOVETSKY, 1989, p.41-42).<br />
Porém, a moda só pôde colaborar para a revolução democrática porque, junto<br />
com ela, mais dois fatores fundamentais ocorreram, mudando a história de nossas<br />
sociedades: a ascensão econômica da burguesia e o crescimento do Estado<br />
moderno, pois juntos puderam dar legitimidade aos desejos de promoção social de<br />
todas as classes inferiores 33 .<br />
Deve-se ter em mente que a moda impôs uma regra de conjunto, ou seja,<br />
simultaneamente a pessoa precisa ser como os outros, vestir-se dentro do padrão,<br />
mas também deve ter seu gosto particular. Assim, ao longo dos séculos tivemos<br />
diversos pioneiros ou, como Lipovetsky prefere chamar "ministros da elegância"<br />
capazes de lançar modas, às quais, às vezes, estão ligados seus próprios nomes.<br />
Normalmente tais "ministros da elegância" estão concentrados em Paris, a<br />
capital da moda, onde há hegemonia da Alta Costura. Com uma moda<br />
hipercentralizada mas, ao mesmo tempo, internacional, a cidade é habitada por<br />
milhares de mulheres up to date 34 do mundo. Por outro lado, temos manifestações<br />
de um consumo de massa homogêneo, indiferente às fronteiras.<br />
Centralização, internacionalização e, paralelamente, democratização<br />
da moda. O impulso da confecção industrial de um lado, o das<br />
comunicações de massa de outro, enfim a dinâmica dos estilos de vida e<br />
dos valores modernos acarretam, com efeito, não apenas o<br />
desaparecimento dos múltiplos trajes regionais folclóricos, mas também a<br />
atenuação das diferenciações heterogêneas no vestuário das classes, em<br />
beneficio dos toaletes ao gosto do dia para camadas sociais cada vez mais<br />
amplas. O fenômeno mais notável aqui é que a Alta Costura, industria de<br />
luxo por excelência, contribuiu igualmente para ordenar essa<br />
democratização da moda. (LIPOVETSKY, 1989, p. 74).<br />
33 Se não se deve superestimar o papel da moda nesse processo parcial de igualação das<br />
aparências, ela nele contribui incontestavelmente. Introduzindo continuamente novidades, legitimando<br />
o fato de tornar exemplo nos contemporâneos e não mais no passado, a moda permitiu dissolver a<br />
ordem imutável da aparência tradicional e as distinções intangíveis entre os grupos, favoreceu<br />
audácias e transgressões diversas não apenas na nobreza mas também na burguesia. A moda deve<br />
ser pensada como instrumento da igualdade de condições. Ela alterou o principio da desigualdade de<br />
vestuário, minou os comportamentos e os valores tradicionalistas em beneficio da sede das<br />
novidades e do direito implícito à "bela aparência" e às frivolidades. (O império do Efêmero, 1989,<br />
p.41-42)<br />
34 Mulheres que estão sempre na moda, vestindo as últimas tendências.<br />
38
A partir dos meios como revistas e jornais especializados, as massas foram<br />
preparadas para um código da moda, para as rápidas variações do que está em<br />
voga ou não, para inspirar-se nas estrelas. Existe uma controvérsia na moda<br />
atualmente: ao mesmo tempo há uma reivindicação da individualidade, mas<br />
permanece uma obediência uniforme às normas da Alta Costura.<br />
Isto se deve a uma cultura jovem, impulsionada a partir dos anos 50 e 60,<br />
com novos valores que contribuíram para dar nova fisionomia à tal reivindicação<br />
individualista. De acordo com Lipovetsky (1989, p.120); "Instalou-se uma cultura que<br />
exibe o não-conformismo, que exalta valores de descontração, de humor e<br />
espontaneidade livre". O autor afirma também que dever-se o sucesso deste estilo e<br />
da onda prêt-à-porter à tradução do sistema da moda, da ascensão desses novos<br />
valores modernos do rock, dos ídolos e estrelas jovens.<br />
Wajnman (2002, p.152) vai além e afirma: “Convencionalmente, a moda<br />
envolve toda a cadeia têxtil, os grandes criadores com os pequenos, os<br />
consumidores, as mais variadas mídias, histórias de vidas, os grandes centros<br />
urbanos, pequenas localidades, além de ser um sem-fim de outras áreas como a<br />
cultura, economia, psicologia e a parte mais intima deste universo: a natureza da<br />
contradição humana".<br />
Assim se instaura essa moda na qual se aceitam quase todos os trajes, na<br />
qual cada vez menos se julga o outro pelo que veste. A moda contemporânea não<br />
trabalha para eliminar as estratégias de sedução, mas sim, para torná-las mais<br />
discretas, quase invisíveis. Nada mais é proibido, todos os estilos têm direito de<br />
cidadania e se expandem em ordem dispersa. Já não há moda, há modas.<br />
39
CAPÍTULO III - O DISCURSO <strong>DA</strong> MÍDIA<br />
Discurso, como a própria palavra indica, origina-se do latim discurrere, que<br />
por sua vez vem do próprio latim currere e significa discorrer, atravessar. É termo<br />
com noção de continuidade, fluente 35 . O entendimento da palavra varia bastante<br />
dependendo do enfoque ou correntes que trabalham com ela.<br />
Para a corrente francesa, os discursos são produtos culturais, vistos como<br />
textos, como forma do uso da linguagem no interior de práticas sociais<br />
contextualizadas histórica e socialmente. Já para a corrente estruturalista anglo-<br />
americana, o conceito é formado entre discurso e frase e da linguagem verbal em<br />
contextos determinados.<br />
3.1 A análise crítica do discurso<br />
Na visão de Norman Fairclough (2001), o termo "discurso" significa um termo<br />
de ação, a maneira como as pessoas podem agir sobre o mundo e sobre os outros.<br />
"O discurso é moldado e restringido pela estrutura social no sentido mais amplo e<br />
em todos os níveis: pela classe e por outras relações sociais em um nível societário;<br />
pelas relações específicas em instituições particulares; por sistemas de<br />
classificação; por várias normas e convenções, tanto de natureza discursiva como<br />
não-discursiva, e assim por diante". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 91)<br />
São distinguidas três funções de linguagem e dimensões de sentido<br />
interagentes durante o discurso: a função identitária, aquela na qual as identidades<br />
sociais são estabelecidas no discurso; a relacional, mostrando como as relações<br />
sociais significam o mundo e seus processos e a função ideacional, criada através<br />
do pensamento e da reflexão.<br />
35 SERRA (2001)<br />
40
Como prática política, o discurso estabelece, mantém e transforma as<br />
relações de poder e as comunidades e/ou grupos possuidores dessas relações.<br />
Como prática ideológica, ele constitui, mantém e transforma os significados do<br />
mundo nas relações de poder. Acontece de eventos discursivos manifestarem uma<br />
orientação de elementos do código, ou seja, para se poder considerar como regra o<br />
chamado interdiscurso.<br />
A prática discursiva está alicerçada na linguagem, manifesta-se na forma<br />
lingüística. A prática social, ou seja, a política e a ideologia, é uma dimensão do<br />
evento discursivo, como o texto. Essas duas formas não se opõem, ao contrário, se<br />
preenchem. A análise de um discurso na prática discursiva focaliza processos de<br />
produção, distribuição e consumo textual e esses métodos são sociais exigindo<br />
referência aos ambientes econômicos, políticos e institucionais em que o discurso é<br />
gerado.<br />
A preocupação central é estabelecer conexões explanatórias entre os<br />
modos de organização e interpretação textual (normativos, inovativos, etc.),<br />
como os textos são produzidos, distribuídos e consumidos em um sentido<br />
mais amplo, e a natureza da prática social em termos de sua relação com<br />
as estruturas e as lutas sociais. Não se pode nem reconstituir o processo de<br />
produção nem explicar o processo de interpretação simplesmente por<br />
referência aos textos: eles são respectivamente trações e pistas desses<br />
processos e não podem ser produzidos nem interpretados sem os recursos<br />
dos membros. Uma forma de ligar a ênfase na prática discursiva e nos<br />
processos de produção, distribuição e consumo textual ao próprio texto é<br />
focalizar a intertextualidade do ultimo. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 99-100).<br />
A concepção tridimensional do discurso é uma tentativa de reunir três<br />
tradições analíticas. De acordo com o autor, cada uma delas é indispensável na<br />
análise de discurso. Para Fairclough (2001), é a tradição "macrossociológica" de<br />
análise da prática social em relação às estruturas sociais e à tradição interpretativa<br />
ou "microssociológica" de considerar a prática social como alguma coisa que as<br />
pessoas produzem ativamente e entendem com base em procedimentos de senso<br />
comum partilhados. (Figura 1)<br />
41
Figura 1: Concepção tridimensional do discurso<br />
A análise lingüística é uma esfera complexa e técnica que incorpora muitos<br />
tipos de análise. Quando se avaliam textos sempre se examinam simultaneamente<br />
questões de forma e questões de significado, isto é, signos, as palavras ou<br />
seqüências mais longas de texto que possuem um significado combinado com uma<br />
forma.<br />
A análise textual pode ser organizada em quatro itens: vocabulário, gramática,<br />
coesão e estrutura textual. "O vocabulário trata principalmente das palavras<br />
individuais; a gramática, das palavras combinadas em orações e frases; a coesão<br />
trata da ligação entre orações e frases e a estrutura textual trata das propriedades<br />
organizacionais de larga escala dos textos". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 103)<br />
O argumento do autor prossegue quando ele diz ainda existirem outros três<br />
itens usados na análise textual: "a 'força' dos enunciados, isto é, os tipos de atos de<br />
42
fala (promessas, pedidos, ameaças, etc.) por eles constituídos; a 'coerência' dos<br />
textos e a 'intertextualidade' dos textos". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 103-104) Esses<br />
sete itens juntos formam um quadro para a análise, abrangendo aspectos da<br />
produção, interpretação e as propriedades formais dos textos.<br />
A prática discursiva envolve processos de produção, distribuição e consumo<br />
textual, variando entre diferentes tipos de discurso, de acordo com fatores sociais.<br />
Um exemplo são os textos produzidos de maneira jornalística; eles possuem rotinas<br />
de natureza coletiva, um grupo cujos membros estão envolvidos indiferentemente do<br />
que façam, seja no acesso às fontes, agências de notícias, decisão do local da<br />
reportagem no jornal e na edição da mesma.<br />
De uma perspectiva diferente, Milton José Pinto 36 diz que o ponto de partida<br />
de qualquer análise de discursos é a necessidade do analista de dar uma atenção<br />
especial à "textura" dos textos, tanto na linguagem verbal como no uso de outras<br />
semióticas. Isso porque, na sua visão, "os discursos sempre são produtos culturais<br />
empíricos produzidos por eventos comunicacionais entendidos como textos".<br />
(PINTO, 2002, p. 26) O exercício do analista é, primeiramente, o de procurar e<br />
interpretar vestígios que permitem a contextualização.<br />
As teorias lingüísticas apropriadas são aquelas que não se limitam<br />
apenas a descrever a estrutura interna das frases, à maneira dos<br />
estruturalismos europeus e norte-americanos, mas que conceptualizam<br />
também os usos da linguagem em contextos, como a teoria da enunciação<br />
francesa. A análise de discursos que se propõe não se esgota na<br />
análise imanente dos textos, como algumas outras abordagens, pois ela só<br />
se completa com a fase de contextualização. (PINTO, 2002, p. 27).<br />
Para a análise do discurso, existe a problemática do sujeito, pois, o autor<br />
comenta às vezes, ser a responsabilidade por alguma representação reconhecida<br />
em um texto, atribuída erroneamente a alguém. Cada texto possui maneiras<br />
diferentes de construir a representação de determinada prática social ou área de<br />
conhecimento propostas pelos sujeitos. Tal idéia vai ao encontro das teorias de<br />
Foucault e Fairclough, que chamam estas posições enunciativas de discurso ou tipo<br />
de discurso.<br />
Sobre tais condições, há uma distinção entre os sujeitos, os autores de um<br />
texto. Inicialmente, tem-se o autor empírico, aquele produtor do texto fisicamente e o<br />
enunciador ou narrador em textos narrativos, ou emissor para textos orais,<br />
36 PINTO, Milton José. Comunicação e Discurso: introdução à análise de discursos. São Paulo:<br />
Hackers Editores, 2002. 128pgs.<br />
43
denominado locutor. Eles são representados pelo pronome "eu", ou seja, há um<br />
personagem agindo e falando nos textos e, no enunciado, aparece como<br />
responsável deste. Isto resulta em diálogos coincidentes, como em uma conversa<br />
cotidiana.<br />
A esses receptores ou, simplesmente, público que dialoga com o autor<br />
empírico, cabe interpretar o texto produzido. Certamente, irão se reconhecer no texto<br />
ou, pelo menos, em parte dele, pois ele trata o leitor por "tu", "você" e outras formas<br />
na segunda pessoa, assim como o sujeito é representado pelo "eu", explicado<br />
acima.<br />
No momento de Pinto (2002) especificar a análise do discurso, falando sobre<br />
texto e sujeitos, tanto o receptor como o emissor o argumento prossegue, desta vez<br />
falando de uma explicitação do dispositivo da enunciação: a imagem. Segundo o<br />
autor, são poucos os casos de só haver um texto em um sistema semiótico. O mais<br />
comum, na cultura midiática contemporânea, são os textos mistos, que reúnem texto<br />
verbal e imagens.<br />
Nas imagens encontramos intertextualidade, enunciadores e<br />
dialogismo, tal com nos textos verbais. As artes deste final de século,<br />
pintura, escultura, arquitetura, teatro e cinema, e a mídia, em peças<br />
publicitárias e charges encontrados em jornais e revistas em todo mundo,<br />
fazem um uso extensivo da citação e da paródia nas imagens. A mídia<br />
impressa, em especial nas capas de revistas e na primeira página dos<br />
jornais, utiliza diversas técnicas de tratamento de imagens e diagramação<br />
para definirem posições enunciativas. (PINTO, 2002, p. 37-38).<br />
3.2 O discurso midiático e a mudança social<br />
Segundo Serra (2001), uma das principais características do discurso<br />
midiático é o fato de ele se apresentar como um discurso acabado e de funcionar<br />
aparentemente sem intervalos, nem vazio. "Ele flui de maneira constante e<br />
ininterrupta, encadeia enunciados que se apresentam habitualmente de forma<br />
acabada, e esconde os seus processos de origem". (SERRA, 2001, p. 36)<br />
Todo esse processo é resultante da camuflagem da enunciação, visto se usar<br />
a terceira pessoa predominantemente, pois é a forma verbal da não-pessoa. Desta<br />
maneira, garante ao discurso midiático uma credibilidade da narração dos fatos<br />
independente do lugar da fala do enunciador, a fim de manter o contato contínuo<br />
com o público.<br />
44
O discurso midiático é unilateral, ou seja, um enunciador dirige a<br />
palavra a um público relativamente indiferenciado e ausente, que não tem<br />
possibilidade de tomar efetivamente a palavra, pelo menos no decurso da<br />
sua relação discursiva. Esta questão parece ser contornada quando se<br />
tenta aproximar os processos da enunciação midiática dos processos de<br />
enunciação do discurso face a face. (SERRA, 2001, p. 40).<br />
Não obstante, Fairclough (2001) ainda acopla os conceitos de ideologia e<br />
hegemonia dentro do discurso midiático e mudanças sociais, como práticas sociais.<br />
Ele diz serem as ideologias significações da realidade, contribuindo para a<br />
produção, reprodução ou transformação das relações de dominação. "Elas<br />
(ideologias) se tornam naturalizadas e atingem o status de 'senso comum'".<br />
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 117)<br />
Existe também uma concepção textual da localização da ideologia: ela está<br />
na lingüística crítica, ou seja, nos textos. Embora seja conhecido que as formas e os<br />
conteúdos trazem consigo as estruturas ideológicas de cada um, não é possível<br />
identificá-las, isto porque cada texto escrito pode ter mais de uma interpretação.<br />
Essa tendência, entretanto, já é familiar na sociologia da mídia, pois os receptores<br />
dos textos já estão suficientemente imunes aos efeitos das ideologias supostamente<br />
encontradas nos textos.<br />
Porém, nem todos os discursos são necessariamente ideológicos. As<br />
ideologias surgem nas sociedades caracterizadas por relações de dominação com<br />
base na classe, no gênero social, no grupo cultural, e assim por diante. E "à medida<br />
que os seres humanos são capazes de transcender tais sociedades, são capazes de<br />
transcender a ideologia". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 121)<br />
Juntamente com a ideologia, o autor também cita a hegemonia, significando o<br />
poder sobre a sociedade como um todo, a construção de alianças e a integração. A<br />
luta hegemônica inclui as instituições da sociedade (educação, sindicatos, família<br />
etc.), com possível desigualdade entre diferentes níveis e domínios.<br />
A prática discursiva, a produção, a distribuição e o consumo (como<br />
também a interpretação) de textos são uma faceta da luta hegemônica que<br />
contribui em graus variados para a reprodução ou a transformação não<br />
apenas da ordem de discurso existente (por exemplo, mediante a maneira<br />
como os textos e as convenções prévias são articulados na produção<br />
textual), mas também das relações sociais e assimétricas existentes.<br />
(FAIRCLOUGH, 2001, p. 123-124).<br />
O conceito de hegemonia ajuda a analisar a prática social à qual pertence o<br />
discurso em termos de relações de poder, isto é, se essas relações reproduzem,<br />
reestruturam ou desafiam as hegemonias já existentes. A mídia possui um<br />
45
importante papel hegemônico neste processo. Além de reproduzir, ela também<br />
reestrutura a relação entre os domínios público e privado, envolvendo a<br />
fragmentação da distinção, "de modo que a vida pública e a privada são reduzidas a<br />
um modelo de ação e motivação individual, e de relações baseadas em presumida<br />
experiência popular da vida privada". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 147)<br />
Textos do tipo "informação-e-publicidade" ou "falar-e-vender" (FAIRCLOUGH,<br />
2001) são comuns nos discursos que estamos acostumados a ver na mídia da<br />
sociedade contemporânea. Pode-se relacionar isto com uma tendência atual de<br />
incorporação de novos domínios no mercado e da ampliação do consumismo.<br />
Esses possíveis "consumidores" universais da publicidade e de suas<br />
extensões são versões do "eu", caracterizado pela capacidade para escolher. Essas<br />
tendências influenciam a constituição da subjetividade ou individualidade pelo<br />
discurso.<br />
Por "democratização" Fairclough (2001, p. 248) entende "a retirada de<br />
desigualdades e assimetrias dos direitos, das obrigações e do prestígio discursivo e<br />
lingüístico dos grupos de pessoas". Ela vem sendo um parâmetro de mudança social<br />
nas últimas décadas mesmo de maneira desigual, já que existem questões sobre o<br />
quando as mudanças têm sido reais ou superficiais.<br />
Línguas diferentes do inglês têm-se tornado mais aceitas ou toleradas<br />
mundialmente. De acordo com o autor, não se trata da tentativa de "proclamar o<br />
surgimento de uma utopia lingüística" 37 , mas sim, de conquistas advindas de lutas<br />
sociais que encontraram resistência.<br />
Prestando mais atenção à teoria, podemos dizer que a conversação está<br />
colonizando a mídia, o discurso está assumindo um caráter mais conversacional,<br />
fazendo parte de uma reestruturação importante dos limites entre o público e o<br />
privado. Os valores culturais contemporâneos dão um valor alto à informalidade e a<br />
mudança predominante está ligada a formas que lembram a fala na escrita.<br />
Há muito mais conversação para ouvir e assistir nesses meios (por<br />
exemplo, programas de entrevistas), o que reflete por si mesmo sua<br />
avaliação, mas é também o caso de apresentadores que 'conversam'<br />
largamente com sua audiência de massa, como se estivessem 'batendo<br />
papo' com alguns indivíduos. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 252).<br />
Outro também definidor do discurso como prática social é Pinto (2002).<br />
Conforme esse autor, ao conceituarmos os discursos como práticas sociais,<br />
46
significamos ser a linguagem verbal e as outras semióticas com que se constroem<br />
os textos partes integrantes do contexto sociohistórico e não alguma coisa de caráter<br />
puramente instrumental, externa a pressões sociais.<br />
Exercem, assim, papel fundamental na reprodução, manutenção ou<br />
transformação das representações desenvolvidas pelas pessoas e das relações e<br />
identidades com que se definem numa sociedade, pois por meio dos textos se<br />
travam as batalhas que, no nosso dia-a-dia, levam os participantes de um processo<br />
de comunicação a procurar dar a última palavra, isto é, a ter reconhecido pelos<br />
receptores o aspecto hegemônico do seu discurso.<br />
Ao nos assumirmos como emissores ou co-emissores de um evento<br />
comunicacional, desde aqueles primeiros momentos em que na primeira<br />
infância acordamos para a comunicação e a linguagem, estamos entrando<br />
no amplo mundo das representações (conhecimentos e crenças), das<br />
relações e identidades sociais, e aceitamos alguma forma de controle social.<br />
Aprendemos a ser o que nós somos por meio de regras e convenções<br />
subjacentes aos discursos que dominamos – cujo conjunto define o que foi<br />
denominado acima do gênero de discursos -, as quais não podemos ignorar<br />
e que só podemos alterar em situações de mudança social, mesmo que<br />
pensemos ser os senhores absolutos de nosso próprio arbítrio. (PINTO,<br />
2002, p. 43-44).<br />
Para ele, uma ideologia pode ser nomeada, mas nunca descrita, pois não<br />
temos total acesso aos seus fragmentos. O ideológico é uma dimensão necessária<br />
de todos os discursos, responsável pela produção de qualquer sentido social e o que<br />
define ideologia como um repertório de conteúdos, opiniões, atitudes ou<br />
representações.<br />
Por fim, Pinto (2002) afirma que a quantidade de gêneros de discursos<br />
denominada por uma pessoa e utilizada, na sua prática de produção e consumo de<br />
textos constitui uma espécie de "capital sociocultural, em tudo semelhante ao capital<br />
econômico-financeiro propriamente dito" (PINTO, 2002, p. 54), pois condiciona o<br />
reconhecimento do seu status em cada evento comunicacional de que participa e<br />
(re)define sua posição dentro das escalas de poder presentes na sociedade.<br />
3.3 Discurso e intertextualidade<br />
O termo "intertextualidade" foi cunhado por Kristeva 38 no final dos anos 1960,<br />
no contexto de suas influentes apresentações para audiências ocidentais do trabalho<br />
37 Fairclough, 2001, p. 248<br />
38 Julia Kristeva. Filósofa búlgara, crítica literária. É influente na análise crítica e nas teorias culturais.<br />
47
de Bakhtin 39 . O básico é: não pode haver enunciado que de uma maneira ou de<br />
outra não reatualize outros. Em termos mais específicos, para Fairclough (2001), os<br />
textos e os enunciados são moldados por textos anteriores pelos quais eles foram<br />
desenvolvidos e, por textos subseqüentes que eles antecipam. Cada enunciado é<br />
um elo na cadeia da comunicação. Eles são constituídos por pedaços de outros<br />
enunciados, mais ou menos explícitos ou completos.<br />
O conceito de intertextualidade aponta para a produtividade dos<br />
textos, para como os textos podem transformar textos anteriores e<br />
reestruturar as convenções existentes (gêneros, discursos) para gerar<br />
novos textos. Mas essa produtividade na prática não está disponível para as<br />
pessoas com um espaço ilimitado para a inovação textual e para os jogos<br />
verbais: ela é socialmente limitada e restringida e condicional conforme as<br />
relações de poder. A teoria da intertextualidade não pode ela própria<br />
explicar essas limitações sociais, assim ela precisa ser combinada com uma<br />
teoria de relações de poder e de como elas moldam (e são moldadas por)<br />
estruturas e práticas sociais. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 135).<br />
Existem relações "horizontais", consideradas como um monólogo, na opinião<br />
do autor, entre o texto e aqueles que o precedem. Um exemplo é uma carta,<br />
relacionada intertextualmente a cartas anteriores e subseqüentes. Por outro lado, há<br />
relações "verticais", ou seja, textos com seus contextos imediatos, textos sendo<br />
historicamente ligados em varias escalas temporais, até mesmo que sejam<br />
contemporâneos a eles.<br />
Além disso, a intertextualidade do texto tem uma relação estreita com<br />
algumas convenções textuais, como gêneros, discursos, entre outras. Sendo assim,<br />
não só recorrem a tais convenções como também as modificam, por exemplo,<br />
usando-as ironicamente, parodiando-as, ou mesmo mesclando-as de vários modos.<br />
A intertextualidade é fonte de muita ambivalência dos textos. Ou seja, pode<br />
dar-lhes diferentes sentidos. Fairclough (2001) esclarece: "se a superfície de um<br />
texto pode ser multiplamente determinada pelos vários outros textos que entram em<br />
sua composição, então os elementos dessa superfície textual não podem ser<br />
claramente colocados em relação à rede intertextual do texto, e seu sentido pode ser<br />
ambivalente". A fala de autores de outros textos pode ser representada no chamado<br />
discurso indireto, porém, podem-se cometer erros no momento de atribuir realidade<br />
à pessoa que fala ou ao autor do texto principal.<br />
No caso do discurso indireto, o texto representado tem a forma de uma<br />
oração gramaticalmente subordinada à oração que relata, ou seja, marcada pela<br />
39 Fairclough (2001)<br />
48
conjunção 'que'. "As vozes do relator e do relatado são menos claramente<br />
demarcadas, e as palavras usadas para representar o discurso podem ser as do<br />
relator e não as do relatado". (FAIRCLOUGH, 2001, p. 140-141). Já no discurso<br />
direto, as palavras representadas estão com aspas, pois são as do texto original, as<br />
palavras exatas do autor quando as relata. Quanto à voz, há uma diferença<br />
marcante entre a de quem relata e a do que é relatado.<br />
Dada a considerável variedade de textos, pode haver um número interminável<br />
de cadeias intertextuais entre eles, porém, o número de cadeias reais é limitado, já<br />
que as práticas sociais são proferidas de modos particulares, e esse aspecto limita o<br />
desenvolvimento dessas cadeias.<br />
As cadeias intertextuais podem ser muito complexas – por exemplo,<br />
aquelas em que entram textos de diplomacia e negociação internacional de<br />
armas. Um discurso importante do presidente Lula será transformado em<br />
textos da mídia de vários tipos em cada país do mundo, em reportagens,<br />
análises e comentários por diplomatas, em livros, artigos acadêmicos, em<br />
outros discursos que o parafraseiam, o elaboram, respondem a ele, e assim<br />
por diante. Por outro lado, uma contribuição a uma conversa informal<br />
provavelmente será transformada somente em formulações pelos coparticipantes,<br />
e talvez em relatos da mesma por outros. Assim, os diferentes<br />
tipos de textos variam radicalmente quanto ao tipo de redes de distribuição<br />
e cadeias intertextuais em que eles entram, e, portanto, quanto aos tipos de<br />
transformação que eles sofrem. (FAIRCLOUGH, 2001, p. 167).<br />
As relações intertextuais são o ponto central para compreender os processos<br />
de constituição do sujeito. Isto funciona como uma escala durante a vida do<br />
indivíduo, e para a constituição e reconstituição de grupos sociais e comunidades. A<br />
interpretação dos textos depende muito do conceito de "coerência", pois, desta<br />
maneira, é uma propriedade que os intérpretes impõem aos textos, porém não evita<br />
ambivalências. Os intérpretes são mais que sujeitos do discurso, eles também são<br />
sujeitos sociais, com experiências particulares acumuladas para múltiplas dimensões<br />
da vida social, afetando, assim, os modos de como vão interpretar os discursos dos<br />
textos.<br />
Simultaneamente, Pinto (2002), diz que para toda análise de discurso, o texto<br />
é híbrido ou heterogêneo quanto à sua enunciação, pois ele é um conjunto de<br />
citações cuja autoria fica explícita ou não, vindas de outros textos dos preexistentes,<br />
dos contemporâneos ou do passado.<br />
Alguns autores preferem chamar a intertextualidade de heterogeneidade<br />
mostrada (PINTO, 2001, p. 31) "caracterizada pela manifestação, localizável pelos<br />
receptores/intérpretes a partir do contexto situacional imediato, de uma<br />
49
multiplicidade de outros textos citados de maneira unívoca ou aludidos pelo texto<br />
presente; e a do plural do texto, heterogeneidade constitutiva ou interdiscurso,<br />
constituído pelo entrelaçamento no texto presente e vestígios de outros textos<br />
preexistentes, muitas vezes independentemente de trações recuperáveis de citação<br />
ou alusão e segundo restrições sociais e histórico-culturais sobre as quais o autor<br />
empírico do texto não tem controle".<br />
50
CAPÍTULO IV - REVISTA VOGUE (ANÁLISE)<br />
4.1 Histórico<br />
A Vogue é a principal revista de moda em todo o mundo. É publicada<br />
mundialmente pela editora Condé Nast 40 , com exceção da edição brasileira, a única<br />
do mundo controlada por outra, a Carta Editorial. Atualmente, existem dezessete<br />
diferentes edições no mundo, na Alemanha, Austrália, Brasil, China, Coréia, Estados<br />
Unidos, Espanha, França, Grécia, Índia, Itália, Japão, México, Portugal, Reino Unido,<br />
Rússia e Taiwan.<br />
No Brasil, publicadas pela Carta Editorial existem outras edições como a<br />
Casa Vogue, RG Vogue, Homem Vogue, Vogue Passarelas, Vogue Jóias, Vogue<br />
Kids e Vogue Noivas, cuja editora é Patrícia Carta.<br />
Na edição norte-americana, a editora da revista desde novembro de 1988 até<br />
a atualidade é Anna Wintour. Ela foi precedida por Edna Woolman Chase (1914-<br />
1951), Jessica Daves (1952-1962), Diana Vreeland (1963-Junho 1971), e Grace<br />
Mirabella (Julho 1971-Outubro 1988).<br />
A Vogue americana tinha pouco mais de 70 anos, quando Luis Carta lançou a<br />
Vogue Brasil em maio de 1975, provocando um impacto, pois o mercado achava<br />
impossível uma publicação desse porte sobreviver. Alegava-se não haver<br />
anunciantes interessados em uma classe sofisticada e de alta qualificação.<br />
40 Condé Nast Publications Inc. é o nome de um dos maiores grupos internacionais de edições de revistas,<br />
baseada na cidade de Nova Iorque, com subsidiárias em locais tão distantes como Sydney e Paris, entre outros.<br />
Fundado em 1909 por Condé Montrose Nast, com a publicação de sua primeira revista, Vogue, dedicada à<br />
moda, a empresa foi a criadora da estratégia de marketing, hoje universalizada, de lançar publicações dedicadas<br />
a assuntos específicos como moda, culinária, decoração, arquitetura e golf. Tem hoje uma circulação total de<br />
cerca de 13 milhões de exemplares diversos ao mês, com um universo de leitores cinco vezes superior a esse<br />
número, para 17 títulos de revistas. A sede do grupo em Nova Iorque é no famoso edifício Condé Nast Building.<br />
Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Revista_Vogue consultada em 03/09/2007.<br />
51
Esse primeiro número foi um assombro. Vogue apareceu nas bancas com um<br />
grande alarde publicitário. Tinha 178 páginas, sendo 80 de publicidade e o restante<br />
editorial. Os anunciantes tinham acreditado. Os 50 mil exemplares iniciais se<br />
esgotaram.<br />
Em poucos anos, Vogue se tornou referencial. Fundamentalmente uma<br />
revista de moda, ela acompanhou a trajetória das indústrias da moda e têxtil no<br />
Brasil, o aparecimento de grande números de estilistas e de confecções, a<br />
profissionalização das modelos, dos produtores e maquiadores. Entre o número 1,<br />
publicado há 32 anos e o 351, nas bancas em novembro de 2007, a revista passou<br />
por diversos ciclos.<br />
O primeiro ocorreu em 1986, quando Luis Carta, o fundador, deixou o Brasil e<br />
se mudou para a Espanha, onde criou a Vogue Espanha. O segundo, quando o filho<br />
de Luis, Andrea assumiu a revista e a conduziu até 2003, quando morreu<br />
prematuramente, depois de ter alçado a revista a um patamar privilegiado na mídia<br />
brasileira. Naquele ano, Patrícia, filha de Luis e até então diretora de moda da<br />
Vogue, iniciou a terceira fase, que dura até hoje.<br />
Com tiragem média mensal de 50 mil exemplares, Vogue descreve seu leitor<br />
como um sujeito de classes A e B, de idade entre 18 e 45 anos, 70% mulheres e<br />
30% homens. Além da circulação nacional, também possui 7.700 assinantes 41 .<br />
Vogue é moda, beleza, comportamento, saúde, gente, cultura e expoente<br />
social. "Ela traduz os estilos de vida na sociedade contemporânea em seus editoriais<br />
fotográficos, colunas e reportagens sobre os principais eventos e lançamentos do<br />
mercado de arte, livros, e moda". (ELMAN e BENETTI, 2007, p. 9)<br />
Ao atravessarmos suas edições, vemos como sempre teve um olhar atento<br />
para os acontecimentos, para o Brasil e o mundo, para as mudanças de<br />
comportamento e atitudes; como pode ser hoje pesquisada por qualquer historiador<br />
que deseje escrever a historia dessas décadas, fixando-se na maneira de se vestir,<br />
agir no trabalho, na diversão, nos sonhos de consumo.<br />
41 Histórico e dados retirados do site da Vogue Brasil. Disponível em http://www.vogue.com.br<br />
52
4.2 Metodologia<br />
Para atingir os objetivos propostos, o trabalho baseia-se no estudo das teorias<br />
da análise do discurso francesa e anglo-americana aplicado à revista Vogue<br />
brasileira de julho de 2007 e à edição correspondente americana. O objetivo do<br />
trabalho é analisar o texto jornalístico da revista – aqui representado nos editoriais<br />
de moda - atentando às diferenças entre a brasileira e a americana.<br />
Busca-se saber se o padrão de linguagem textual da Vogue EUA é igual ao<br />
da Vogue Brasil; se a técnica utilizada é padrão. Este objetivo será buscado por<br />
meio da análise da teoria histórica e conceitual da moda e do entendimento de como<br />
o Jornalismo de Moda é definido hoje em dia, traçando um paralelo com a história da<br />
moda.<br />
Para isso, foram escolhidas teorias de autores com idéias sobre a moda<br />
antigamente, no mundo contemporâneo e nas sociedades modernas. Sob tais<br />
condições, com as idéias expostas a partir da leitura e construção teórica realizadas,<br />
pôde-se relacioná-las com a prática, ou seja, o Jornalismo de Moda propriamente<br />
dito.<br />
Inicialmente, serão analisados os discursos das capas de cada uma das<br />
revistas, comparando seus textos e chamadas, estilos de discursos e apelo visual.<br />
Logo após, estudar-se-a o editorial de cada uma ou, como é preferivelmente<br />
chamado na Vogue americana: letter from the editor.<br />
O método de pesquisa escolhido é o da Análise de Discurso pelas teorias de<br />
Norman Fairclough (2001), Milton José Pinto (2002) e com subsídio dos estudos de<br />
Giane Amaral Serra (2001). Simultaneamente, Pedro Gilberto Gomes (1997) auxilia<br />
na comparação com suas teorias sobre as Escolas de Comunicação funcionalista e<br />
latino-americana.<br />
4.3 Apresentação de dados<br />
De acordo com o método escolhido serão descritas as capas com suas<br />
chamadas que destacam as reportagens, buscando entender a linha editorial.<br />
VOGUE BRASIL Edição 347 (julho de 2007)<br />
53
1. "SEXY E COOL"<br />
2. "Saiba já as peças que serão best-seller no inverno europeu"<br />
3. "Alerta fashion – Encontrou seu clone na festa? Como as grifes de luxo<br />
evitam a saia justa"<br />
4. "Bebida anticelulite – Águas que aceleram drenagem viram mania na<br />
França"<br />
5. "Férias na neve – Três experts montam a mala certa para dias de esqui"<br />
6. "Inverno quente – Brilhos, tecidos hi-tech e cores fortes em looks para<br />
qualquer estação"<br />
As chamadas são distribuídas em toda a volta da capa e da modelo,<br />
localizada no centro dela. São usadas três fontes diferentes divididas nas seis<br />
chamadas de capa. As cores utilizadas são preto e branco, contrastando com o rosa<br />
velho do fundo da capa, de maneira limpa e de fácil leitura. O tamanho das fontes<br />
também varia. (ANEXO 1)<br />
VOGUE EUA (julho 2007) 42<br />
As chamadas citadas a partir de agora, já estão traduzidas. O texto original<br />
encontra-se nos anexos 43 . (ANEXO 2)<br />
1. "SEDUÇÃO <strong>DE</strong> VERÃO – A volta da Beleza Megawatt – lábios<br />
envolventes, cabelo altamente brilhoso"<br />
2. "20 DICAS QUENTES <strong>DE</strong> EMAGRECER & TONIFICAR SEU CORPO"<br />
3. "Como se vestir bem quando está quente – 3 fashionistas revelam seus<br />
segredos"<br />
4. "O PO<strong>DE</strong>ROSO PENN – Celebrando o Maior Fotógrafo Vivo da América"<br />
5. "'SEM ARREPENDIMENTOS' – Elizabeth Edwards – na Maternidade,<br />
Lutando contra o Câncer e a Corrida pela Casa Branca"<br />
6. "Superbabá! Por que uma babá masculina é o acessório chique da<br />
temporada?"<br />
7. "Uma vez queimada, envergonhada em dobro! Um conto da mulher que<br />
teve abstinência de bronzeamento"<br />
42 A revista não informa o número da edição.<br />
43 Tendo em vista o grande volume de textos em inglês, optou-se por transcrever aqui somente o<br />
traduzido. Porém, os dois textos em inglês utilizados estarão disponíveis para consulta na parte dos<br />
Anexos.<br />
54
As chamadas também se localizam em volta da capa e da modelo, são<br />
usadas apenas duas fontes divididas entre as sete chamadas de capa. As cores<br />
predominantes são dourado, branco, vermelho e preto, fazendo o texto tornar-se um<br />
pouco confuso com o fundo da revista, que é o cenário da foto. Como na Vogue<br />
Brasil, o tamanho da fonte também varia.<br />
O segundo foco da análise serão os editoriais de cada revista, ou seja, o<br />
espaço onde o editor-chefe, a direção ou a equipe de redação expressa a opinião da<br />
revista, sem a obrigação de se ater a alguma imparcialidade ou objetividade. É como<br />
uma conversa com o leitor.<br />
VOGUE BRASIL Edição 347 (julho de 2007)<br />
MO<strong>DA</strong> HOJE E SEMPRE (ANEXO 3)<br />
"Se a princípio o frio começa agora, nas lojas o inverno está<br />
chegando ao fim. Tempo de liquidação, hora certa para arrematar peças<br />
que poderão ser usadas na próxima estação. A nossa aposta é o jeans,<br />
curinga de todas as horas, desde que tenha a silhueta certa.<br />
Recomendamos macaquinhos (que ganham ainda mais força na primavera),<br />
calças skinnies e tons de cinza – confira tudo isso no editorial Invista no<br />
Índigo. Ainda pensando em vida real, fotografamos nas ruas de Paris os<br />
looks do momento: a calça colada ao corpo, com jaquetas à la Chanel,<br />
camisetas de algodão e acessórios de peso. Uma mistura hi-lo, hard-chic,<br />
que Vogue adora. Fazemos também uma leitura fashion de peças<br />
esportivas como parkas, jaquetas e capuzes, em editorial de Bob Wolfenson<br />
que une esses elementos a materiais high-tech, com um resultado<br />
absolutamente novo e vibrante. Nesse número damos destaque ainda às<br />
bolsas que, mais do que nunca, determinam o nosso visual. O que de fato<br />
importa nas coleções européias de inverno, você confere no View, a partir<br />
da página 82. Com a seção Visto, que mostra os novos estilistas que as<br />
'celebs' estão usando do outro lado do oceano, fechamos o panorama da<br />
moda hoje. Grosso modo falando. É claro que você não vai deixar de ler a<br />
coluna da Constanza, que fala sobre a influência de Poiret sobre dois jovens<br />
e promissores estilistas. Duvido também que você resista às dicas de estilo<br />
e à nova mania de usar armas de brinquedo como acessório. Só para<br />
mencionar algumas das páginas que podem ser deliciosamente vistas e<br />
lidas neste suposto mês de férias. Ideal se puder ser na montanha, num spa<br />
mágico ou na casa de campo. A do Sig Bergamin, que também está aqui,<br />
inspira qualquer um. Dá uma olhada."<br />
55
Patrícia Carta<br />
VOGUE EUA (julho 2007):<br />
MAJESTA<strong>DE</strong> <strong>DE</strong> PENN (ANEXO 4)<br />
"Este tema é uma festa surpresa de aniversário para Irving Penn, que<br />
faz 90 anos este mês. Eu digo isso praticamente de forma literal: Sr. Penn<br />
reluta em fazer publicidade pessoal, e qualquer conhecimento que tivesse<br />
de nós estarmos planejando uma homenagem de aniversário, o mandaria<br />
correndo para as colinas – armado, com certeza, com sua câmera Rolleiflex<br />
e sua lâmpada de cabeceira. Durante meses nós perguntamos a ele – sem<br />
contar a ele por quê – para dizer uma variedade de assuntos e nos deixar<br />
ter alguns trabalhos recentes e que não foram publicados. Vendo-os juntos,<br />
fui pega de surpresa novamente pelo nível extraordinário de versatilidade e<br />
engenho que ele trouxe para a página. O seu trabalho hoje é tão requintado<br />
e eletrizante como era em 1943, quando ele começou a contribuir para a<br />
Vogue.<br />
Quando eu perguntei a ele, depois do almoço em fevereiro passado,<br />
para fazer rapidamente um retrato de Cate Blanchett, ele imediatamente<br />
desenhou um croqui de um filme que eu tinha trazido conosco. Este, eu<br />
imediatamente mandei, via Editor Executivo de Moda Phyllis Posnick<br />
(colaborador há um longo tempo de Penn na Vogue), para Nicolas<br />
Ghesquière, na Balenciaga. Penn sempre concebe fotos primeiro; Vogue<br />
facilita sua visão e os resultados são reaplicados nas páginas da revista.<br />
Não existe alguém que trabalhe com esse nível de intensidade<br />
imaginativa e economia. Ele é uma luz guiadora para cada fotógrafo que<br />
trabalha para Vogue, e a presença dele na revista todo mês é humilde e<br />
enobrecedora para seus jovens colegas, três deles mandaram numa foto e<br />
seus pensamentos como presente de aniversário. A encantadora fotografia<br />
de um campo com flamingos cor de rosa de Bruce Weber foi inspirada por<br />
uma fotografia de Penn de sua falecida esposa, Lisa Fonssagrives-Penn.<br />
Annie Leibovitz descreve o poder de Penn de transformar retratos em vida<br />
humana, e Mario Testino credita o uso, no seu trabalho, de luz natural no<br />
estúdio às influências de Penn.<br />
Meu próprio presente para Irvin Penn é simplesmente gratidão eterna.<br />
Ter sido colega e amiga de um dos melhores artistas do século vinte é um<br />
privilégio maior do que eu poderia imaginar, e eu sinto que a nossa longa<br />
colaboração nos trouxe a um lugar onde nossos pontos de vista estão<br />
deliciosamente em sintonia. Através do nosso trabalho conjunto, ele me fez<br />
uma editora melhor. Anos atrás, quando eu estive na revista por um curto<br />
tempo, ele me ligou para elogiar o assunto de julho. (Ele não é um homem<br />
56
que faz muitos elogios, então, quando isso vem, significa muito). Penn<br />
comentou tudo daquela edição da Vogue – o que funcionou, o que não<br />
funcionou e por quê. Ele finalizou nossa conversa dizendo, "agora esta é a<br />
sua revista". Eu sempre pensarei nela como nossa. Feliz aniversário, Sr.<br />
Penn."<br />
Anna Wintour<br />
A partir destes dados, será possível realizar a análise a que este trabalho<br />
objetiva, através das teorias de análise do discurso estudadas até então.<br />
4.4 Análise<br />
Olhando para ambas as edições da revista Vogue, a brasileira e a americana,<br />
pode-se notar possuírem um padrão estético parecido, condizente com o contexto<br />
da editora onde a revista foi criada para atender ao jornalismo segmentado, na área<br />
de moda e dirigido a determinadas categorias sociais. Por serem publicações<br />
veiculadas em diferentes países (Brasil e Estados Unidos), cabe lembrar a questão,<br />
conforme o referencial teórico, de, com o desenvolvimento das modernas<br />
tecnologias de comunicação, aumentarem as possibilidades de inter-relação entre as<br />
pessoas (GOMES,1997), e, através do discurso midiático serem mantidos e<br />
transformados os significados de mundo e as relações sociais entre os sujeitos, que<br />
se filiam a uma determinada ideologia (FAICLOUGH, 2001). A revista estudada<br />
representa tanto a inter-relação entre os jornalistas de moda, quanto entre os<br />
leitores. Seu discurso está filiado a um contexto maior, que é político, social,<br />
sociológico, constituindo-se em si mesma, de acordo com Wajnman (2002), num<br />
sistema de comunicação próprio e cuja indústria se desenvolve “no sentido de<br />
configurar novas formas de relacionamento social que superam os antigos,<br />
cunhando novas identidades dos indivíduos e dos grupos” (2002, p. 29).<br />
O nome da revista, estampado na parte superior da capa (VOGUE), chama a<br />
atenção nas bancas. A fim de dar um ar mais despojado a isto, a modelo (em ambas<br />
as edições), que ocupa todo o espaço da capa, geralmente fica "por cima" ou "por<br />
trás" do nome, para obter um design mais equilibrado e natural. De acordo com<br />
Lipovetsky (1989), a moda traz consigo a primeira manifestação de uma relação<br />
social que representa tanto um tempo novo e legítimo, quanto uma paixão pelo<br />
57
‘moderno’ e a novidade como um valor mundano. Isto se traduz na forma como a<br />
revista é trabalhada pois, de acordo com Joffily (1991), é necessário na produção de<br />
uma revista de moda, que os elementos tenham identidade própria e expressem em<br />
seus conteúdos, discursos coerentes e que dialoguem na mesma língua.<br />
Analisando-se cores e formas das chamadas de reportagens, pode-se dizer<br />
que, comparando estas duas publicações, a brasileira dá um ar mais neutro ao texto,<br />
imagens e modelo. Utilizando as cores branca e preta nos textos, enfatiza a roupa<br />
que a modelo está usando, dourada com um lenço colorido em volta do pescoço. Já<br />
na revista americana, a modelo está posando para uma foto que tem como tema<br />
"festa", ela está elegante, com vestido de noite, cabelo bem arrumado e maquiagem<br />
forte.<br />
Como citado na Apresentação de Dados, na americana, as chamadas para as<br />
reportagens estão em conflito com as cores de fundo da capa (que é a da foto da<br />
modelo), isso porque se utilizam quatro: dourado, branco, vermelho e preto. Pode-se<br />
dizer que estas cores, chamativas da atenção, fazem jus ao tema da capa da revista,<br />
que é festa, celebração, porém, dão um certo cansaço aos olhos dos leitores. Estes<br />
dados, analisados à luz do referencial teórico, comprovam afirmada por Joffily<br />
(1991), quando diz que texto e imagem devem apresentar sincronia e cada<br />
publicação ter uma intenção e um estilo a partir da definição do público da revista e<br />
ainda, a moda interessar à leitora em seu cotidiano inserido num determinado<br />
contexto que, neste caso, é diferente nos dois países nos quais as revistas circulam.<br />
A partir deste ponto, passa-se para o estudo do discurso das chamadas para<br />
as reportagens. Na Vogue brasileira, existem seis chamadas e, pode-se notar que<br />
quatro delas fazem uso de termos em inglês:<br />
"Sexy e Cool"<br />
"Alerta fashion"<br />
"(...) tecidos high-tech.."<br />
"Saiba já as peças que serão best-seller.."<br />
Este tipo de discurso mostra que, mesmo sendo constatado ter a moda tem<br />
como seu centro a rota Nova York – Paris – Milão, ainda existe uma hegemonia<br />
(FAIRCLOUGH, 2001) do uso da principal língua do mundo: o inglês. Apesar da<br />
moda brasileira já ter crescido muito nos últimos anos, ainda dependemos da<br />
utilização de alguns termos, talvez para possuir mais status ou pelo simples fato de<br />
58
não existir uma boa tradução. Ainda dentro deste contexto, pode-se analisar que três<br />
chamadas fazem referência a outros países ou a atividades que não são feitas no<br />
Brasil, como esquiar, pois aqui não neva:<br />
"Águas que aceleram drenagem viram mania na França"<br />
"Saiba já as peças que serão best-seller no inverno europeu"<br />
"Férias na neve – três experts montam a mala certa para dias de esqui"<br />
Pode dizer destas chamadas é a revista Vogue ter, como público-alvo, leitores<br />
da classe A e B, ou seja, pessoas com condições de passar as férias na Europa ou<br />
aproveitar as águas contra a celulite na França. Entretanto, mostra-se claramente a<br />
influência do exterior, pois, no Brasil existem milhares de lugares interessantes e<br />
bonitos de se mostrar e ir. Isso não significa a revista não lhes dar valor. Ao<br />
contrário, aborda diversos assuntos relacionados com o nosso país e nossas<br />
personalidades em reportagens interessantes e bem escritas. Aqui também está<br />
expresso o colocado no referencial teórico, segundo Joffily (1991), com relação às<br />
matérias de moda; uma publicação se destaca com matérias que abordam o<br />
comportamento, porque interessam a um público muito maior e esse tipo de<br />
reportagem insere a moda na atualidade, nas correntes sociais e culturais, resgatam<br />
a moda como uma dessas correntes. De forma sutil, a revista inicia, logo na sua<br />
capa, um diálogo com o leitor, uma conversação:<br />
"Encontrou seu clone na festa?"<br />
"Saiba já as peças..."<br />
Como observa Fairclough (2001) em suas teorias, discursos como esses,<br />
iniciam uma relação social do leitor com a revista. Naquele texto não está somente<br />
uma reportagem sobre tendências, mas sim, o estilo pessoal de cada um e como<br />
agir para fazê-lo durar. A prática discursiva envolve processos de produção,<br />
distribuição e consumo textual, variando entre diferentes tipos de discurso de acordo<br />
com os fatores sociais. Uma chamada que pede uma análise mais profunda é a<br />
seguinte:<br />
"Alerta fashion – Encontrou seu clone na festa? Como as grifes de luxo<br />
evitam a saia justa"<br />
Nesta segunda oração, nota-se que a revista não possui apenas o interesse<br />
de transmitir informações para os leitores, ela não está sendo produzida só para dar<br />
59
dicas de moda, tendências, saúde e comportamento, mas também para vender.<br />
Nesta reportagem da chamada em estudo, tem-se um exemplo, pois nela são<br />
mostradas marcas que fazem o leitor poder ir para uma festa ou qualquer outro lugar<br />
sem correr o risco de cruzar com alguém vestindo a mesma roupa. Assim, de acordo<br />
com o estudado no capítulo III, nas teorias de Fairclough (2001), nota-se, com a<br />
força dos enunciados, esta atitude da revista estimular o consumismo, processo já<br />
comum na sociedade contemporânea.<br />
Ao analisar a Vogue americana, percebe-se que as chamadas para as<br />
reportagens são um pouco diferentes. A revista brasileira traz muito assunto de fora,<br />
dos Estados Unidos e Europa, já no discurso daquelas da revista americana, os<br />
assuntos não especificam um lugar, sendo mais gerais. Tendências, cabelo, saúde<br />
do corpo, babás, fotógrafos, bronzeamento e personalidades, são todos assuntos da<br />
revista estampados na sua capa. De acordo com Gomes (1997), aqui se pode<br />
encontrar um bom exemplo do funcionalismo norte-americano, afinal, eles produzem<br />
textos para eles mesmos, ou seja, partem do princípio de cada um na sociedade<br />
possuir o dever de tornar-se um receptor aberto e interpretar a informação da<br />
maneira que lhe parecer melhor.<br />
Mesclando-se isso com as teorias de Fairclough (2001), diga-se que o leitor<br />
da revista Vogue americana acaba desenvolvendo uma identidade social através do<br />
discurso, pois eles possuem uma mesma ideologia:<br />
"SEM ARREPENDIMENTOS – Elizabeth Edwards – na Maternidade,<br />
Lutando contra o Câncer e a Corrida pela Casa Branca"<br />
"Superbabá! Por que uma babá masculina é o acessório chique da<br />
temporada?"<br />
"O PO<strong>DE</strong>ROSO PENN – Celebrando o Maior Fotógrafo Vivo da América"<br />
Juntamente com esses processos, a revista utiliza diversas expressões e<br />
jogos de palavras, como se realmente estivesse dialogando com a(o) "melhor<br />
amiga(o)", discursos utilizados diariamente pelas mulheres e pelos homens leitores<br />
de Vogue. É a prática social gerando a prática discursiva que, conseqüentemente,<br />
gera o texto.<br />
"SEDUÇÃO <strong>DE</strong> VERÃO – A volta da Beleza Megawatt – lábios envolventes,<br />
cabelo altamente brilhoso"<br />
"20 DICAS QUENTES <strong>DE</strong> EMAGRECER & TONIFICAR SEU CORPO"<br />
60
"Uma vez queimada, envergonhada em dobro! Um conto da mulher que<br />
teve abstinência de bronzeamento"<br />
Acha-se em comum nas chamadas da Vogue brasileira e da americana é o<br />
fato de sempre existir alguma com um contexto de capitalismo, do consumo<br />
propriamente dito, embutido nas reportagens, como se analisou nas chamadas da<br />
capa brasileira. Exemplo:<br />
"Como se vestir bem quando está quente – 3 fashionistas revelam seus<br />
segredos"<br />
Estes "fashionistas" citados no discurso são as pessoas que ditam<br />
tendências, lançam moda. Assim, se eles revelarem seus segredos de estilo,<br />
certamente falarão de marcas favoritas, lojas de que mais gostam e assim por<br />
diante; fazendo os leitores se identificarem e consumirem. Estas tendências<br />
influenciam a constituição da subjetividade ou individualidade pelo discurso e vão ao<br />
encontro ao que Fairclough (2001), no referencial teórico, chama de textos do tipo<br />
"informação-e-publicidade" ou "falar-e-vender", comuns nos discursos que estamos<br />
acostumados a ver na mídia da sociedade contemporânea.<br />
A julgar pelo já se analisou nas capas das duas edições da revista Vogue<br />
Brasil e Estados Unidos, pode-se dizer que os editoriais analisados a seguir, não<br />
fogem desta linha editorial do discurso. A fim de continuar com a mesma linha de<br />
raciocínio, examinar-se-á o Editorial da Vogue americana primeiramente . Intitulado<br />
como "letter from the editor" (carta do editor), ele é formado por três paginas<br />
intercaladas por publicidade.<br />
O texto discursivo deste editorial é totalmente diferente do visto, em geral<br />
nestes espaços. A editora-chefe Anna Wintour não fala sobre os principais assuntos<br />
da revista ou de tendências para a estação. O foco principal é sobre o aniversário de<br />
90 anos do fotógrafo Irving Penn que, para ela, é um dos melhores do mundo. Nota-<br />
se isso pois o discurso está em primeira pessoa, ou seja, Anna Wintour está dando a<br />
sua opinião e contando a sua experiência.<br />
"Não existe alguém que trabalhe com esse nível de intensidade imaginativa<br />
e economia. Ele é uma luz guiadora para cada fotógrafo que trabalha para<br />
Vogue, e a presença dele na revista todo mês é humilde e enobrecedora<br />
para seus jovens colegas..."<br />
61
"Meu próprio presente para Irvin Penn é simplesmente gratidão eterna.Ter<br />
sido colega e amiga de um dos melhores artistas do século vinte é um<br />
privilégio maior do que eu poderia imaginar, e eu sinto que a nossa longa<br />
colaboração nos trouxe a um lugar onde nossos pontos de vista estão<br />
deliciosamente em sintonia. Através do nosso trabalho conjunto, ele me fez<br />
uma editora melhor."<br />
Durante seu discurso no editorial, ela relata alguns fatos já acontecidos no<br />
passado e já descritos na revista. Aqui, pode-se achar o conceito de<br />
intertextualidade, dado por Fairclough (2001) no capítulo III deste trabalho. Isto<br />
porque ela revive alguns textos do passado sobre o mesmo assunto e, certamente<br />
terá um feedback em textos subseqüentes a esse.<br />
Fica explícita a ideologia da revista, na palavra de sua editora-chefe. Ela<br />
acredita neste fotógrafo, considera-o um dos melhores da atualidade. Assim, conclui-<br />
se que, na opinião de Anna, se ele trabalha na Vogue e é um dos mais poderosos<br />
fotógrafos, conseqüentemente a revista também é.<br />
Ao longo do discurso midiático nas três paginas da publicação, são expostas<br />
cinco imagens coincidentes com o texto: fotos tiradas por Penn, pinturas e retratos<br />
inspirados no trabalho do fotógrafo. De acordo com Pinto (2002), na cultura midiática<br />
contemporânea, este tipo de discurso é comum, pois se usam textos mistos, que<br />
reúnem a parte verbal e as imagens, a fim de definir uma força extra ao enunciado.<br />
O discurso da editora-chefe e jornalista de moda Anna Wintour já traz consigo<br />
as marcas do profissional de comunicação. É um discurso estimulante, que chama a<br />
atenção dos leitores para a historia, faz o receptor da mensagem se interessar por<br />
mais e ler a matéria.<br />
Contrariando isto, o editorial da Vogue Brasil é, de certo modo, linear. Porque<br />
usa um mesmo discurso do início ao fim, sem usar a característica do "eu", citada<br />
por Fairclough (2001). O texto está dialogando com o leitor, chama a atenção e é<br />
convidativo. Porém, não se arrisca demais. A diretora responsável, Patrícia Carta<br />
prefere usar a 3ª pessoa, dando a opinião de toda a equipe e não somente a dela:<br />
"A nossa aposta é o jeans..."<br />
"Recomendamos..."<br />
"Fazemos também uma leitura fashion..."<br />
"Nesse número damos destaque.."<br />
62
Prestando mais atenção, pode-se notar que no final, ela se arrisca em 1ª<br />
pessoa em uma única oração:<br />
"Duvido também que você resista às dicas de estilo e à nova mania de usar<br />
armas de brinquedo como acessório"<br />
O discurso da diretora possui força de enunciado, porém, ao lê-lo, é difícil<br />
haver uma identidade social logo no começo. Para haver uma maneira de interação,<br />
é necessário que o discurso se mostre e seduza, e isso depende diretamente de<br />
quem anuncia o discurso.<br />
A revista possui uma ideologia, porém, não consegue desprender-se<br />
totalmente da edição americana, existe uma certa hegemonia, notado ao folhear as<br />
páginas da Vogue Brasil. O discurso dos jornalistas envolvidos na publicação<br />
brasileira é ótimo, gostoso de se ler, porém, ainda não conseguiram criar uma linha<br />
própria de discurso na moda.<br />
Aqui, cita-se a moda, mas isso acontece em diversos segmentos do<br />
jornalismo no Brasil e acaba tornando-se cansativo. Segundo Gomes (1997), é<br />
assim que a escola latino-americana sempre funcionou: com grandes possibilidades<br />
de seguir seu próprio caminho, mas com dificuldades em dar os passos sozinha.<br />
Em entrevista via e-mail (ANEXO 5), a editora de moda da Vogue Brasil Maria<br />
Prata, diz que a escolha das pautas é feita por toda a redação e, ao fim de uma<br />
edição, eles sentam e discutem as idéias de cada um, até chegar às pautas ideais.<br />
Quanto ao padrão Vogue de que se vem falando durante esta análise, Maria<br />
diz ter a Vogue Brasil o "padrão Vogue", sem focalizar em um país específico. A<br />
Carta Editorial responde à Conde Nast International e, assim, deve seguir alguns<br />
padrões pois é um título internacional. Ela não detalhou, na entrevista quais padrões<br />
seriam esses. Fica para o receptor das informações distingui-los.<br />
A fim de ilustrar a análise feita neste trabalho, pesquisou-se no site Jornalistas<br />
da Web 44 uma entrevista (ANEXO 6) com a jornalista de moda Iesa Rodrigues, na<br />
qual ela fala um pouco sobre a moda no Brasil e como os discursos são utilizadas na<br />
mídia.<br />
Confirmando o dito nesta discussão, Iesa afirma que o colonialismo é o<br />
culpado desta cópia entre revistas de moda nacionais e internacionalmente. Ela fala<br />
44<br />
http://www.jornalistasdaweb.com.br/index.php?pag=displayConteudo&idConteudoTipo=2&idConteudo<br />
=509 Acesso em 21/08/07<br />
63
especialmente sobre as publicações brasileiras, diz serem muito bonitas, mas, um<br />
"patchwork" não só de tendências, mas de matérias também. São (as publicações<br />
brasileiras de moda) uma mistura de todas as outras revistas de moda do mundo.<br />
Uma frase interessante de Iesa que pode ser comparada com tudo que foi<br />
estudado e analisado neste trabalho é que a moda ainda sofre muito preconceito,<br />
pois é muito comercial. Pois bem, a moda é comercial porque vende roupa, mas o<br />
cinema cobra o ingresso, o teatro também. O CD do Caetano Veloso é vendido e,<br />
assim, sucessivamente. Este lado do jornalismo, a parte comercial, é o serviço,<br />
comentado no capítulo I deste projeto, que fala sobre jornalismo de moda.<br />
Portanto, após ter realizado a análise e discussão através de seus dados e<br />
entrevistas obtidas, seria equivocado dizer que os discursos estudados buscam<br />
apenas informar e entreter os leitores. Além disso, pôde-se perceber que o<br />
jornalismo de moda é sim, diferente entre os dois países analisados, já que as<br />
escolas de comunicação ainda possuem grande influência na imprensa mundial.<br />
64
CONSI<strong>DE</strong>RAÇÕES FINAIS<br />
A proposta do presente trabalho era analisar o discurso midiático entre a<br />
revista Vogue do Brasil e dos Estados Unidos. Isto foi possível através do estudo<br />
lingüístico das chamadas de reportagens de ambas as capas e, os editoriais, cujo<br />
texto define a linha editorial da publicação.<br />
Durante todo o trabalho foi possível reunir diversas teorias sobre os principais<br />
assuntos tratados neste estudo. Constatou-se que o jornalismo especializado está<br />
totalmente fixado hoje em dia, praticamente todos os jornalistas saídos das<br />
faculdades, especializam-se em alguma área. A moda foi tratada em diversos<br />
ângulos. Mostrou-se sua importância a nível histórico, diferenciando cada momento,<br />
na vida antiga e na sociedade contemporânea. Como se pôde constatar, a moda<br />
também é um tipo de discurso, com seus termos, suas ideologias e diferenciações.<br />
Ao analisar o discurso das duas publicações (revista Vogue), foram traçadas<br />
as diferenças e semelhanças entre elas. O discurso midiático brasileiro na moda<br />
ainda engatinha, talvez por falta de mercado, por necessidade de profissionais<br />
qualificados para tal ou, até mesmo, pelo simples fato de ainda existir um grande<br />
preconceito sobre esse tema. Deve-se considerar também o estudo das Escolas de<br />
Comunicação, a latino-americana que, possui grandes possibilidades de encontrar<br />
um caminho e, criar suas próprias teorias, fazendo a imprensa brasileira tomar novos<br />
rumos.<br />
Já quanto à análise da revista americana, pode-se constatar que o discurso é<br />
totalmente direto, é um diálogo que acontece, onde o emissor dá a idéia e o receptor<br />
a recebe, aceitando-a e interpretando-a da maneira que lhe for benéfica. Ou seja,<br />
foi-se possível estudar as diferenças discursivas através do método proposto: a<br />
análise do discurso e, também se constatou que as escolas ainda influenciam, e<br />
muito, o trabalho realizado na imprensa mundial atualmente.<br />
65
Considerou-se também que a moda por si só já atrai as pessoas através dos<br />
discursos transmitidos com suas roupas e tendências. Muitas vezes é taxada como<br />
"vilã" no mundo capitalista, porém, o que realmente incita as pessoas ao consumo<br />
da moda é a mídia. O poder de persuasão dos meios de comunicação foi também se<br />
constatado com a análise das revistas.<br />
Por outro lado, também se teve a chance de discutir as perspectivas do<br />
jornalismo de moda no mercado de trabalho atual e alguns dos reais problemas<br />
enfrentados pelo profissional de comunicação em moda. O deve-se discutir é que o<br />
jornalismo de moda possui uma formação técnica e cultural como principal e única<br />
arma contra a desvalorização que lhe é imposta. Acredita-se que ele possui a<br />
mesma capacidade de qualquer outro jornalista especializado, pois passou pelas<br />
mesmas provações e desafios para trabalhar. Então, deve-se reagir contra essa<br />
tendência preconceituosa. Ou será por simples acaso que não existe algum Prêmio<br />
Esso para o jornalismo de moda? Ou será apenas descuido o fato de o jornalismo<br />
de moda ser sempre esquecido sem seminários sobre jornalismo ou até mesmo em<br />
currículos de faculdade?<br />
Partindo desse pressuposto, por fim, deixa-se a expectativa de trabalhos<br />
subseqüentes a este, a fim de mostrar a importância deste estudo com moda e, que<br />
o jornalista de moda brasileiro ainda tem muito a aprender e crescer, juntamente<br />
com as teorias comunicacionais latino-americanas.<br />
66
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WILSON, Elizabeth. Enfeitada de sonhos. Lisboa: Edições 70, 1985. 342pgs.<br />
69
ANEXOS<br />
70
Anexo 1<br />
71
Anexo 2<br />
72
Anexo 3<br />
73
Anexo 4<br />
74
Anexo 5<br />
75
Por Geiza Rocha (*)<br />
Anexo 6<br />
Um papo sobre moda<br />
Postado por mcavalcanti<br />
Quando a jornalista Iesa Rodrigues viu que faltava espaço na grande imprensa para<br />
falar sobre moda ela chegou a desanimar. Na procura por uma solução, ela foi<br />
aconselhada por um amigo a fazer uma página na internet. Deu certo. Com cinco<br />
anos de existência o site www.estiloiesa.com.br se tornou uma referência para quem<br />
procura informações sobre o mundo fashion na Rede. Neste bate-papo, num café do<br />
Leblon, Rio de Janeiro, conversamos sobre a Semana Barrashopping, a descoberta<br />
da internet como possibilidade de falar sobre moda no sentido mais amplo do termo<br />
e sobre o jornalismo de moda, que como o jornalismo econômico é muito específico.<br />
JW - Onde você busca suas fontes, para saber as tendências da moda?<br />
Iesa Rodrigues - Eu viajo, não muito, mas pelo menos uma vez por ano<br />
JW - Você costuma ler jornais, revistas e sites sobre moda?<br />
IR - Eu evito. Eu acho que jornalismo é um só no mundo inteiro. Então quando a<br />
gente faz uma análise de um desfile, fazemos uma análise a partir do nosso ponto<br />
de vista. A análise da minha colega da Elle francesa é uma análise do ponto de vista<br />
dela. A análise da Vogue também será diferente. Então eu acho que se você quer<br />
fazer jornalismo de moda você não tem que seguir o que os outros falam, o que as<br />
outras revistas fazem. Tem que descobrir uma maneira sua de reportar e de<br />
trabalhar esta informação. Um problema que nós temos aqui no Brasil é que a<br />
informação de moda internacional ainda não é muito grande, porque é difícil viajar e<br />
porque o jornalista brasileiro nem sempre tem convite para todos os desfiles. Mas<br />
não é por isso que você vai abrir uma revista, ver a produção que a Elle fez em cima<br />
da coleção Yves Saint Laurent, esperar que a confecção brasileira tenha aquelas<br />
roupas, e fazer a mesma produção. Não tem sentido.<br />
JW - Essa mania de copiar é constante entre as revistas de moda. Se observarmos,<br />
não há muita diferença entre elas. É falta de criatividade?<br />
IR - É colonialismo. As pessoas acham um pouco radical, mas é. Uma revista<br />
italiana é completamente diferente da francesa, que é diferente da inglesa. A revista<br />
brasileira o que é? Um mix de todas. A revista japonesa tem personalidade, todas<br />
têm. A brasileira é muito bonita mas é um patchwork não só de tendências, mas de<br />
matérias mesmo, acho que é um hábito, não sei. Então eu acho que a gente precisa<br />
de fotógrafos originais, e de matérias originais. Você pode até aprender a técnica<br />
76
olhando a foto, mas não é pegar a foto e fazer igualzinha, como a maioria faz. Isso<br />
não é jornalismo.<br />
JW - A que você atribui isso? É um problema só dos jornalistas?<br />
IR - Os grandes veículos, acho que isso é uma coisa que acontece no mundo inteiro,<br />
não têm mais espaço para análise de moda. Quando você faz um perfil de um<br />
estilista você fala de quase tudo menos da moda dele. O editor-chefe acha que não<br />
vale a pena falar que foi o cara que inventou a manga não sei como, que ele fez um<br />
xadrezinho diferente. Isso não interessa. Primeiro porque o editor é homem, e<br />
homem ainda não se interessa por moda, acha que tem outros assuntos prioritários.<br />
Então isso vai sumindo na grande imprensa. Hoje, todas as grandes editoras de<br />
moda brasileiras estão indo para a internet, que é onde elas podem realmente fazer<br />
análise e reportar o que elas viram, a opinião delas, o que acontece. A Érica<br />
(Palomino) tem um site, a Glorinha Khalil tem um site, a Regina Martelli tem site,<br />
todas têm um site. Isso foi o que me levou a ir também para a internet. Chegou a um<br />
ponto no jornal que eu via aquele monte de papel, de notícia, de telefonema<br />
chegando, telex (porque naquela época ainda tinha telex) na minha mesa e eu me<br />
perguntando, "Meu Deus, onde é que eu vou colocar tudo isso?" Aí eu pensei em<br />
fazer um jornalzinho e um amigo me disse: "que jornalzinho nada, você já está num<br />
jornalzão, vai para a internet". Aí eu fui.<br />
JW - E qual foi a experiência que você teve nesses cinco anos escrevendo para o<br />
seu site?<br />
IR - É interessante, porque como é um meio global, você tem todos os tipos de<br />
faixas de leitores. A moda ela têm as suas subdivisões: ele é a tendência, a criação,<br />
que é esta coisa inteiramente louca, inusável, biruta, que você nem pode achar feio.<br />
Tem a parte de lançamento que são os desfiles, as coberturas. Tem a parte de uso e<br />
a parte de comportamento. A grande tendência da imprensa escrita é o<br />
comportamento, o que é uma maluquice. Comportamento é o fim, é a coisa já na<br />
rua, e aquilo saiu de onde? Na internet eu tenho desde a pessoa que me escreve<br />
um e-mail querendo saber das tendências do verão de 2003 até a menina que quer<br />
saber como vai se vestir em uma festa num rodeio lá em Ribeirão Preto. Tem até<br />
uma menina cubana, que me escreve todas as semanas e mandando notícias de<br />
Cuba. Outro dia mesmo ela disse que vamos ficar sem nos falar por um mês porque<br />
ela vai entrar de férias e em casa ela não tem acesso à internet.<br />
JW - Além da falta de espaço não tem ainda o problema do preconceito?<br />
IR - É, ele continua. Também existe um conceito de que a moda é muito comercial, o<br />
que eu sempre contra-argumento. Tudo bem, a moda é comercial porque vende<br />
roupa, mas o cinema não cobra ingresso? O teatro não cobra ingresso? O CD<br />
maravilhoso do Caetano Veloso não é vendido? O jornal não é vendido na banca?<br />
Pelo amor de Deus, tudo é comercial. Existe o lado comercial deste jornalismo que é<br />
o serviço. Você fala que o Adam Mendes faz uma roupa assim assado, com<br />
semente, e agora já está vendendo esta roupa na Barra, na loja tal. Você tem que<br />
dizer, isso é informação. O que adianta falar que o cara tem uma roupa maravilhosa<br />
se a gente não tem acesso à ele? Jornalismo não é informação? Agora se você só<br />
fala de um determinado estilista, aí é esquisito, perde a credibilidade.<br />
JW - E a rua, é um bom lugar para descobrir a moda?<br />
77
IR - A rua é comportamento, é o ponto final. Ela é uma versão do que se pode fazer<br />
no jornalismo de moda. Eu acho que já temos uma roupa de qualidade de uns 30<br />
anos, já temos um armário de avó bom, então muito jovem pode pegar isso e recriar.<br />
É engraçado ver o que aconteceu com esta roupa. Mas isso não é novidade, é uma<br />
maneira nova de usar, é um re-uso. É claro que ninguém vai vestir Levi´s dos pés a<br />
cabeça. As pessoas pegam a sua Levi´s enjoativa botam um bordadinho diferente,<br />
sempre foi assim. Agora era preciso que tivesse um estoque de qualidade para isso<br />
acontecer. Antigamente a gente tinha roupa sem qualidade. A roupa acabava,<br />
desbotava, puía, encolhia, não tinha qualidade. Mas se olharmos para os anos 80 já<br />
tem muita roupa legal. Então é engraçado ver isso ressuscitando. O que foi uma<br />
novidade nos anos 80 agora é uma re-novidade Cai em comportamento. Mas fazer<br />
só isso não pode. Fica faltando o original, a maluquice, fica faltando o serviço, onde<br />
você encontra aquela roupa, a nova ou a velha, e ainda tem liquidação.<br />
JW - O Plano Real influenciou positivamente o mercado da moda?<br />
IR - No princípio foi muito bom, porque o real estava mais ou menos equiparado ao<br />
dólar então facilitou a importação. Muita marca boa chegou aqui. Porque uma coisa<br />
é copiar, outra coisa é ver o que é o mundo, e a gente não pode ficar eternamente<br />
isolado numa ilha, sem saber o que existe. Se lá fora eles têm uma tecnologia uma<br />
indústria, uma cultura isso tudo leva à uma qualidade de trabalho que a gente aqui<br />
não tinha porque não tinha como comparar. Comparar é importante. Você tem que<br />
ver o que todos fazem para poder fazer o seu. E moda é uma coisa muito frágil,<br />
muito dependente de pesquisa e, principalmente, de informação - mais até do que<br />
dinheiro. Aqui sempre teve muita criatividade, mesmo quando era uma ilha fechada<br />
e sem dinheiro. Então o princípio do Plano foi muito bom. Agora, as coisas se<br />
adaptam, não sei como, mas acho que é um caminho sem volta.<br />
JW - E a Semana Barrashopping, como foi este ano?<br />
IR - Foi boa principalmente porque teve público. Porque o Rio tem uma preguiça<br />
incrível de ir à Barra da Tijuca. E desta vez não, era uma multidão, era gente cult,<br />
adepta, não era cliente. Era aquela turma doida. Domingo não estava legal, na<br />
Segunda estava muito legal e aí, na saída, o túnel estava fechado. Todos tiveram<br />
que pegar o Joá e eu pensei: "Pronto! Amanhã não vai ter ninguém neste evento",<br />
mas o pessoal foi do mesmo jeito, subiu o Joá, tudo. Achei muito legal.<br />
JW - Teve alguma coisa diferente? Fora o Ciro Darlan, que foi destaque em todos os<br />
jornais?<br />
IR - Isso não é moda, não vou comentar porque isso é bastidor. E eu acho que<br />
evento não é bastidor.<br />
JW - Mas todos os jornais só noticiaram os bastidores...<br />
IR - Um dia era bastidor, outro dia eram os penetras, outro dia era a área de<br />
convivência. Meu Deus do céu, você não pode fazer uma análise do evento pela<br />
área de convivência. Tinham quatro salas, cada uma de 300 a mil lugares e você<br />
falar daquele barulho que estava ali fora, não tem nada a ver. Aquilo ali é o ponto<br />
final da moda. É o comportamento. É engraçado, mas não é uma matéria, senão não<br />
tem evento. E isso me desanima. Eu penso eu não vou mais para lá, ninguém fala<br />
de moda, vou para a internet (risos).<br />
78
JW - E o tempo real, dá para fazer tempo real na moda?<br />
IR - Dá, se descrever o desfile. Mas eu já tentei fazer isso e não deu muito certo. Na<br />
verdade já experimentei vários tipos de cobertura. Nem botei no ar a minha<br />
cobertura ainda. Quando cheguei no desfile, meu filho tinha instalado um programa<br />
que eu não consegui entrar com meu login. Aí dei um ataque e decidi fazer em casa<br />
porque enquanto eu estava lutando para entrar no programa, perdi o desfile não<br />
consegui ver a Água de Coco. Ou você faz uma coisa ou outra. Normalmente eu<br />
bato as matérias no intervalo.<br />
JW - De quanto em quanto tempo você atualiza o site?<br />
IR - Eu tento atualizar sempre. Semanalmente ele tem coisas novas. Não mudo ele<br />
inteiro porque é muito grande. Sempre tento reduzir, decido que não vou mais falar<br />
de gastronomia e aí vem alguém de moda falando de um restaurante, aí eu tenho<br />
que colocar este restaurante em algum lugar e pronto, volta a sessão de<br />
gastronomia. Eu não consigo resumir. O que a gente está tentando fazer é<br />
disponibilizar coberturas antigas. Por que os desfiles de outubro são válidos para o<br />
nosso verão. Então quem quer se inspirar naquilo ali vai querer ver, eu sou contra a<br />
tal da inspiração, mas se as pessoas querem, eu não vou proibir o acesso.<br />
JW - Em relação aos sites de moda, tem algum que seja uma referência para você?<br />
IR - A Elle francesa ainda é a melhor revista, e o site reflete isso, porque trata de<br />
todos os assuntos: de evolução da sociedade, de erotismo, cinema, cultura, de<br />
maneiras de viver, de consumo, tudo que cerca a moda. Porque ninguém se veste e<br />
fica em frente ao espelho o dia inteiro. Você se veste, vai para a rua e está sujeito a<br />
tudo que a rua tem, que a casa e que o escritório tem. Existe uma ambientação para<br />
a moda que tem que ser feita também numa revista. É claro que eu não sei escrever<br />
sobre teatro e cinema tão bem quanto uma pessoa especializada. Mas tenho que ter<br />
informação sobre aquilo. Se tem uma peça legal com um figurino bom, tenho que<br />
ver. Então isso é o que a Elle faz com tudo: ela vai buscar a maneira de viver que<br />
pode desencadear uma moda. Comida, existe uma comida da moda, não existe?<br />
Existe.<br />
JW - O que é preciso ter para ser um bom jornalista de moda?<br />
IR - Tem que ter aquela curiosidade de Feira hippie, tem que ir à umas coisas assim.<br />
Um dos melhores caras que eu vi ultimamente no Rio, eu achei num desfile<br />
completamente mambembe na Galeria da Fórum, em Ipanema, às 7h da noite,<br />
numa segunda feira, um negócio maluquíssimo. As roupas atrasaram, o desfile<br />
estava marcado para as 18h começou às 21h, eu já indócil, pensando no que eu<br />
estava fazendo ali, tentando assistir aquele desfile completamente mambembe. Aí<br />
as modelos começaram a fazer protesto, ameaçaram desfilar nuas, acabaram<br />
entrando na passarela de calcinha e sutiã. Aí eu pensei: Bem isso aí já dá uma<br />
primeira página, é engraçado. Quando elas entraram no camarim, as roupas<br />
chegaram. E foi maravilhoso. Entrou a primeira modelo, eu pensei: Ué? O que é<br />
isso? Entrou a segunda, eu disse: Poxa, bem cortadinho, legal, interessante. Depois<br />
eu conheci, um menino maravilhoso, alfaiate. Inteiramente novo, sabe tudo de<br />
alfaiataria. Então não pode ficar só no circuito, tem que descobrir o que há de novo,<br />
não pode ter preconceito.<br />
79
JW - No Brasil temos grandes nomes no jornalismo de moda. Na sua opinião, está<br />
surgindo mais alguém ou faltam jornalistas de moda?<br />
IR - Eles não aparecem por que não tem espaço, não tem veículo. A internet é muito<br />
legal por causa disso. Mas você consegue guardar o nome de alguém legal que<br />
tenha um site na internet? Você guarda o nome do site. Se num jornal você demora<br />
pelo menos cinco anos para as pessoas gravarem o seu nome, imagina na rede?<br />
Mas no jornalismo impresso poderia estar aparecendo muito mais gente. Mas no<br />
espaço que tem, as pessoas não conseguem falar de moda. Elas têm que falar da<br />
modelo que está com o Leonardo di Caprio. Mas eu acho que tem gente boa. A<br />
Adriana Bechara é boa, a Jussara Romão, da Elle, não é nova, mas tem uma visão<br />
jornalística legal. Mas, você conhece a Jussara?<br />
JW - Conheço.<br />
IR - Ah, que bom. Eu acho estas duas boas, mas tinha que ter mais.<br />
JW - E como é a relação entre as produtoras de moda e as jornalistas?<br />
IR - Aqui no Brasil é muito complicado porque, em geral, a editora de moda tem que<br />
trabalhar com produção. O legal seria ter uma editora de moda que fizesse a malha<br />
de texto, a reportagem, e a produtora. Mas no meu caso é tranquilo porque eu<br />
trabalho com a Rita Moreno desde 1983, é muito tempo já. Eu odeio produção.<br />
Aquele negócio de a roupa não vir do jeito que eu quero é muito frustrante. Por isso<br />
eu não me meto. Eu faço um storyboard, com todas as posições que eu quero,<br />
mostro para o fotógrafo, mostro para a modelo, mostro para a produtora e daí por<br />
diante é um deus nos acuda, cada um com seu trabalho. Senão é um desgaste<br />
muito grande. Isso aí a análise me ensinou direitinho. Um dia eu estava numa das<br />
sessões reclamando e o analista disse peraí: "então vc quer fazer a pauta, o<br />
desenho, escolher a roupa, escolher a modelo, fazer a foto, paginar no fim e de<br />
preferência comprar todas as revistas da banca?". Nesse ponto a internet é ótima,<br />
porque dá uma sensação de onipotência e a impressão de que estou dominando<br />
tudo. Não domino nada, mas dá a impressão de que pelo menos ali eu faço o que eu<br />
quero do jeito que eu quero.<br />
Iesa Rodrigues começou a trabalhar em 1967 como desenhista de moda no Jornal<br />
do Brasil. Em 1969, ela começou a fazer desenhos para a Riográfica também. Em<br />
1971, ela iniciou uma curta carreira de um ano como produtora, na revista Desfile,<br />
até virar a mão por causa de uns cabides cheios de ternos masculinos. Isso tudo<br />
paralelamente ao JB, onde continuava a ser desenhista. Em 1980 ela foi ser editora<br />
de moda da Abril na sucursal do Rio e em 1981 voltou para o JB, onde continua até<br />
hoje.<br />
*Geiza Rocha é jornalista e redatora Web.<br />
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