DIREITO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO
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<strong>DIREITO</strong> <strong>AMBIENTAL</strong> E <strong>DESENVOLVIMENTO</strong><br />
José Eduardo de Alvarenga<br />
Mestre em Direito Político e Econômico.<br />
Procurador do Estado de S. Paulo, aposentado.<br />
Palestrante e Professor da FGV-Direito-Rio.<br />
(Homepage: Alvarenga.adv.br)<br />
SUMÁRIO: I. Introdução.II. A crise da teoria econômica neoclássica e o desenvolvimento<br />
sustentável. III. Constituição Brasileira e Direito Ambiental. IV. A Declaração de<br />
Estocolmo. V. A Declaração do Rio de Janeiro, de 1992 (ECO92). VI. O Protocolo de<br />
Kioto, de 1997. VII – A RIO + 10, de 2002. VIII - A Agenda 21. IX – A legislação<br />
infraconstitucional brasileira. X. Conclusões<br />
I. Introdução.<br />
As agressões ao meio-ambiente estão na ordem do dia. Às tantas, descobriu-se que os<br />
recursos hídricos não são infinitos, que a camada de ozônio não pode ser destruída, que os<br />
alimentos transgênicos não são maravilhosos como se apregoava de início, que a poluição<br />
gerada pelos resíduos sólidos é problema de todos, que a clonagem (de animais e humana)<br />
não é tão simples nem tão salvadora quanto se afirmava.<br />
Hoje, a preocupação com o meio ambiente caminha ao lado do desenvolvimento<br />
científico e tecnológico, quando não o confronta. O que gera tensões.<br />
O direito, em todos os ramos, tem dois objetivos: tornar obrigatórios ou proibidos<br />
comportamentos de acordo com padrões éticos pré-definidos e aliviar tensões – antes ou<br />
depois que elas se transformem em conflitos.<br />
O Direito ambiental pertence ao novo grande ramo do direito que - dizem alguns<br />
autores - não é público nem privado 1 , que é o ramo dos direitos difusos. Direito de terceira<br />
geração, segundo Edis Milaré. 2<br />
É da natureza do interesse difuso não ser a sua titularidade ser atribuída a ninguém em<br />
particular. Também é da sua natureza não pertencer a nenhuma pessoa jurídica, pública ou<br />
1 “Nesse sentido, o Direito Ambiental não pertence ao Direito Público, nem tampouco ao<br />
privado, tal como ocorre, pouco mais ou menos, com o Direito do Trabalho” (COPOLA, Gina.<br />
Elementos de Direito Ambiental. Rio de Janeiro: Temas e Idéias, 2003, p. 26).<br />
2 In Direito do Ambiente, 2a. ed., São Paulo: RT, 2001, p. 131.
privada e nem mesmo a um Estado em particular, já que se refere a bens pertencentes a toda<br />
a humanidade. O fato, entretanto, não autoriza a afirmar que o Direito correspondente a esse<br />
interesse não pertença ao ramo do Direito Público. Justamente pelo fato de pertencer a todos,<br />
sem exceção, há de ser tutelado pelos Estados.<br />
Só para relembrar, um ramo do Direito é público quando presentes, em conjunto ou<br />
separadamente, uma das seguintes características: 1. O Estado é parte na relação jurídica; 2.<br />
O interesse protegido é o do Estado; 3. As normas são coercitivas, obrigatórias. Em qualquer<br />
das normas de Direito Ambiental encontramos pelo menos uma destas características.<br />
Não o descaracteriza o fato de que compõem o seu conceito um conjunto de técnicas,<br />
regras (estas tiradas das condições, leis naturais, influências e interações de ordem física,<br />
química e biológica 3 ) e princípios. De resto, todos os ramos do Direito se servem de outras<br />
ciências para criar o seu arcabouço normativo.<br />
Assim, podemos concluir esta introdução apresentando, para reflexão, dois conceitos:<br />
um restrito e um amplo. O restrito é o de Toshio Mukai: “O Direito Ambiental é um conjunto de<br />
normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do Direito, reunidos por sua função<br />
instrumental para a disciplina do comportamento humano.<br />
Outro, mais amplo, é o de Gina Copola 4 : conjunto de normas jurídicas, técnicas,<br />
regras e princípios tendentes a assegurar o equilíbrio ecológico, o desenvolvimento<br />
sustentável, e a sadia qualidade de vida de toda a coletividade, e de todo o ecossistema.”<br />
II. A crise da teoria econômica neoclássica e o desenvolvimento sustentável.<br />
Como já mencionamos em outra oportunidade 5 , em 1969, um grupo de cientistas,<br />
através de um manifesto denominado Blueprints for survival, logo seguidos pelo Clube de<br />
Roma, fizeram trouxeram o debate que fazia uma projeção catastrófica para o século XXI: os<br />
recursos naturais explorados indiscriminadamente se esgotariam. Assim, a questão natural<br />
passou a fazer parte da economia.<br />
Isso produziu reflexos no mercado. Todas as matérias primas básicas sofreram fortes<br />
aumentos de preços. Nos países de economia de mercado, em conseqüência, cada vez que<br />
3<br />
Cf. inc. I, do art. 3º da lei federal nº 6.938/91.<br />
4<br />
Ob.cit.,p.29<br />
5<br />
Desenvolvimento: um enfoque jurídico. Disponível para download gratuito em<br />
http://www.direitonet.com.br/doutrina/textos/x/28/22/282/
se tentava acionar mecanismos de estímulo do tipo keynesiano 6 (capacidade produtiva + pleno<br />
emprego = crescimento), o resultado não era crescimento, mas inflação. A alternativa: cortar<br />
custos de material, energia e mão de obra. Assim, na prática, ironicamente, a fórmula<br />
resultante foi: capacidade produtiva + pleno emprego = inflação + desemprego. A opção “cortar<br />
custos” suprimiu o componente “pleno emprego”. O exemplo brasileiro é emblemático: gerar<br />
emprego significa gerar encargos tributários cada vez maiores. A solução mais fácil e mais<br />
barata, a médio e longo prazos, é substituir mão de obra por tecnologia.<br />
Em resumo, a economia mundial passou de uma crise keynesiana para uma crise<br />
ricardiana 7 (elevação dos custos de produção + degradação da riqueza social global =<br />
empobrecimento).<br />
Essa crise engendrou o fortalecimento duas teorias concorrentes: o neoliberalismo, que<br />
prega a contenção de custos nas diversas economias e a do desenvolvimento sustentável, que<br />
busca combinar correção econômica com controles administrativos e decisões negociadas<br />
entre os diversos setores da sociedade civil envolvidos. É claro que as forças econômicas<br />
dominantes que se aglutinam em torno da teoria neoliberal, capturando inclusive governos, e<br />
que são ao mesmo tempo as detentoras dos maiores avanços tecnológicos, não se conformam<br />
com os postulados do desenvolvimento sustentável: o questionamento das desigualdades dos<br />
modos de consumo das diversas economias nacionais diante da impossibilidade material e<br />
energética de se estender os modos de consumo dos países ricos para os países pobres.<br />
Coube mais uma vez ao Direito tentar resolver o que a teoria econômica e o livre jogo<br />
de mercado não foram capazes.<br />
Não bastando a tentativa de inclusão de valores éticos no raciocínio econômico, que<br />
implica a rejeição da busca exclusiva do auto-interesse como critério de avaliação das<br />
utilidades individuais 8 , esses valores éticos devem se materializar em normas jurídicas.<br />
As normas de Direito Ambiental tentam encontrar, de modo forçado, o equilíbrio entre a<br />
atividade econômica e a preservação do meio ambiente, para sobrevivência da geração atual e<br />
das futuras.<br />
6 John Mainard Keynes, economista inglês – 1883 – 1946.<br />
7 David Ricardo, economista inglês - 1772 – 1823.<br />
8 Sen, A ., ob. cit., pp. 94 e segs., apud SALOMÃO FILHO, Calixto, ob. cit. p. 30
III. Constituição Brasileira e Direito Ambiental.<br />
Antes da Constituição de 1988, o artigo 1º da Declaração sobre o Direito ao<br />
Desenvolvimento, da Organização das Nações Unidas, de 1986, afirmava que:<br />
“Art. 1º - O direito ao desenvolvimento é inalienável direito humano, em virtude<br />
da qual toda pessoa humana e todos os povos têm reconhecido seu direito de participar<br />
do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a dele desfrutar, e ao qual<br />
todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente<br />
realizados”.<br />
A Constituição brasileira de 1988 expressa alguns princípios de direito ambiental, via<br />
de regra vinculados ao desenvolvimento.<br />
O preâmbulo da Constituição afirma o compromisso do Estado Democrático,<br />
literalmente destinado a assegurar o exercício dos direito sociais e individuais, a liberdade, a<br />
segurança, o bem estar, o desenvolvimento...<br />
O artigo 149 faculta à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio<br />
econômico.<br />
O artigo 170 afirma que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho<br />
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os<br />
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:<br />
(...).<br />
VI – defesa do meio-ambiente.”<br />
Expressa, assim, a Constituição o princípio da ordem econômica vinculada ao meioambiente.<br />
Está clara a opção da Constituição brasileira pelo desenvolvimento como direito social<br />
e individual. Mas também a referência ao meio-ambiente está adiantada, como condição, neste<br />
artigo 170, que vem de ser mais detalhado no artigo 225, a que nos referiremos a seguir.<br />
O artigo 174 trata o Estado como agente normativo e regulador da atividade<br />
econômica, a quem compete exercer, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e<br />
planejamento... e estabelecerá (§ 1º)... diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento<br />
econômico nacional equilibrado...
Entendemos que a Lei Maior deixa suficientemente claros os princípios da doutrina<br />
econômica mais recente, inclusive incorporando linguagem de desenvolvimento sustentável<br />
(art. 170, VI).<br />
O artigo 225 assevera que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente<br />
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”.<br />
A educação ambiental está prevista no mesmo artigo (§ 1º inciso VI)<br />
“Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público (...).<br />
VI – promover a educação ambiental e todos os níveis de ensino e a conscientização<br />
pública para a preservação do meio ambiente.”<br />
As contribuições de intervenção no domínio econômico geram ônus adicional para<br />
empresas especialmente beneficiadas pela atividade econômica e responsabilidade para o<br />
Estado de utilizar esses recursos para compensar os desequilíbrios que essas atividades<br />
possam causar.<br />
Desenvolvimento sustentável consiste em crescimento econômico sem afetar (ou<br />
afetando minimamente, com os recursos da técnica) o meio-ambiente, mantendo-o<br />
ecologicamente equilibrado para uma sadia qualidade de vida para a geração presente e para<br />
as futuras.<br />
O texto da Constituição Federal, ao exigir meio-ambiente ecologicamente equilibrado<br />
encontra antecedentes em declarações, tratados e convenções internacionais.<br />
IV. A Declaração de Estocolmo<br />
A “Declaração sobre o ambiente humano”, da Organização das Nações Unidas para o<br />
Meio Ambiente – UNEP “, resultado da Assembléia Geral da ONU, que se reuniu em<br />
Estocolmo, de 5 a 16 de junho de 1972, estabeleceu um marco histórico para o trato da<br />
matéria. Para que se não perca uma só das suas palavras, entendemos interessante<br />
transcrevê-la por inteiro.<br />
“A Assembléia Geral das Nações Unidas reunida em Estocolmo, de 5 a 16 de junho de 1972,<br />
atendendo à necessidade de estabelecer uma visão global e princípios comuns, que sirvam de<br />
inspiração e orientação à humanidade, para a preservação e melhoria do ambiente humano<br />
através dos vinte e três princípios enunciados a seguir, expressa a convicção comum de que:
O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de<br />
vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna,<br />
gozar de bem-estar; e é portador da solene obrigação de proteger e melhorar esse meio<br />
ambiente, para as gerações presentes e futuras. A esse respeito, as políticas que promovem<br />
ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras<br />
formas de coerção e de dominação estrangeira permanecem condenadas e devem ser<br />
eliminadas.<br />
Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente,<br />
parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das<br />
gerações atuais e futuras, mediante um cuidadoso planejamento ou administração adequados.<br />
A capacidade da Terra de produzir recursos renováveis vitais deve ser mantida e, sempre que<br />
possível, restaurada ou melhorada.<br />
O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o<br />
patrimônio representado pela flora e pela fauna silvestres, bem assim o seu habitat, que se<br />
encontram atualmente em grave perigo por combinação de fatores adversos. Em conseqüência<br />
ao planejar o desenvolvimento econômico, deve ser dada a devida importância à conservação<br />
da natureza, incluídas a flora e a fauna silvestres.<br />
Os recursos não renováveis da Terra devem ser utilizados de forma a evitar o perigo do seu<br />
esgotamento futuro e a assegurar que toda a humanidade participe dos benefícios de tal uso.<br />
Deve-se pôr fim à descarga de substâncias tóxicas e de outras matérias e à liberação de calor,<br />
em quantidades ou concentrações tais que não possam ser neutralizadas pelo meio ambiente,<br />
a fim de se evitar danos graves e irreparáveis aos ecossistemas. Assim deverá ser apoiada à<br />
justa luta de todos os povos contra a poluição.<br />
Os países deverão tomar todas as medidas possíveis para impedir a poluição dos mares por<br />
substâncias que possam pôr em perigo a saúde do homem, prejudicar os recursos vivos e da<br />
marinha, causar danos às possibilidades recreativas ou interferir em outros usos legítimos do<br />
mar;<br />
O desenvolvimento econômico e social é indispensável para assegurar ao homem um<br />
ambiente de vida e trabalho favoráveis, bem como para criar na terra as condições necessárias<br />
à melhoria da qualidade de vida.<br />
As deficiências do meio ambiente em decorrência das condições de subdesenvolvimento e de<br />
desastres naturais ocasionam graves problemas, sendo a melhor maneira de atenuar suas
consequências a promoção do desenvolvimento acelerado, mediante a transferência maciça de<br />
recursos consideráveis de assistência financeira e tecnológica que complementem os esforços<br />
internos dos países em desenvolvimento, além da ajuda oportuna, quando necessária.<br />
Para os países em desenvolvimento, a estabilidade dos preços e o pagamento adequado para<br />
produtos primários e matérias-primas são essenciais à administração do meio ambiente, uma<br />
vez que se deve levar em conta tanto os fatores econômicos como os processos ecológicos.<br />
As políticas ambientais de todos os países devem melhorar e não afetar negativamente o<br />
potencial desenvolvimentista atual e o futuro dos países em crescimento, nem obstar o<br />
atendimento de melhores condições de vida para todos, cabendo aos Estados e organizações<br />
internacionais a adoção de providências adequadas, que visem a chegar a um acordo, a fim de<br />
fazer frente às possíveis consequências econômicas nacionais e internacionais resultantes da<br />
aplicação de medidas ambientais.<br />
Deveriam ser destinados recursos à preservação e melhoria do meio ambiente, levando-se em<br />
conta as circunstâncias e as necessidades especiais dos países em desenvolvimento e<br />
quaisquer outros custos que lhes possam resultar da inclusão de medidas de conservação do<br />
meio ambiente em seus planos de desenvolvimento, assim como a necessidade de lhes ser<br />
prestada, quando solicitada para esse fim, maior assistência técnica e financeira internacional.<br />
A fim de se obter um ordenamento mais racional dos recursos e, assim, melhorar as condições<br />
ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado de planejamento<br />
de seu desenvolvimento, de modo que fique assegurada a compatibilidade desse crescimento<br />
com a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente humano em benefício de sua<br />
população.<br />
O planejamento racional constitui um instrumento indispensável para conciliar às diferenças<br />
que possam surgir entre as exigências do desenvolvimento e a necessidade de proteger e<br />
melhorar o meio ambiente.<br />
Deve-se usar o planejamento nos agrupamentos humanos e na urbanização, objetivando evitar<br />
efeitos prejudiciais ao meio ambiente e visando à obtenção do máximo de benefícios sociais,<br />
econômicos e ambientais para todos, devendo ser abandonados a esse respeito, os projetos<br />
destinados à dominação colonialista e racista.<br />
Nas regiões em que exista o risco de que a taxa de crescimento demográfico ou as<br />
concentrações excessivas de população prejudiquem o meio ambiente ou o desenvolvimento,<br />
ou em que a baixa densidade populacional possa impedir o melhoramento do meio ambiente<br />
humano e obstar o desenvolvimento, deveriam ser aplicadas políticas demográficas que
espeitassem os direitos humanos fundamentais e contassem com a aprovação dos governos<br />
interessados.<br />
Deve ser confiada às instituições nacionais competentes a tarefa de planejar, administrar e<br />
controlar a utilização dos recursos ambientais dos países, a fim de melhorar a qualidade do<br />
meio ambiente.<br />
Como parte de sua contribuição ao desenvolvimento econômico e social, devem ser utilizadas<br />
a ciência e a tecnologia para descobrir, evitar e combater os riscos que ameaçam o meio<br />
ambiente, visando às soluções dos problemas ambientais e ao bem comum do homem.<br />
É indispensável um trabalho de educação em questões ambientais, visando tanto às gerações<br />
jovens como aos adultos, dando atenção especial às populações menos privilegiadas, a fim de<br />
criar as bases de uma opinião pública bem informada e de uma conduta responsável dos<br />
indivíduos, das empresas e das comunidades, inspiradas no sentido de sua responsabilidade<br />
em relação à proteção e melhoria do meio ambiente em toda a sua dimensão humana.<br />
Devem ser fomentadas, em todos os países, especialmente naqueles em desenvolvimento, a<br />
investigação científica e medidas desenvolvimentistas em relação aos problemas ambientais,<br />
tanto nacionais como multinacionais. A esse respeito, o livre intercâmbio de informações e de<br />
experiências científicas atualizadas deve constituir objeto de apoio e assistência a fim de<br />
facilitar a solução dos problemas ambientais, assim como as tecnologias ambientais devem ser<br />
colocadas à disposição dos países em desenvolvimento, nas condições que favoreçam sua<br />
ampla difusão, sem que constituam carga econômica excessiva para eles.<br />
Tendo em vista a Carta das Nações Unidas e os princípios do Direito Internacional, as nações<br />
têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos, de acordo com a sua política<br />
ambiental, desde que as atividades levadas a efeito dentro de sua jurisdição ou sob seu<br />
controle, não prejudiquem o meio ambiente de outros países ou de zonas situadas fora da<br />
jurisdição nacional.<br />
As nações devem cooperar no aperfeiçoamento e melhoria do Direito Internacional, quanto à<br />
responsabilidade e à indenização das vítimas da poluição e de outros danos ambientais<br />
provocados por atividades que, realizadas dentro de sua jurisdição, ou sob seu controle,<br />
causem danos a zonas situadas fora de seu espaço territorial ou de sua jurisdição.<br />
Sem prejuízo dos princípios gerais que possam ser estabelecidos pela comunidade<br />
internacional e dos critérios e níveis mínimos a serem definidos em âmbito nacional, será<br />
indispensável sempre considerar os sistemas de valores predominantes em cada país e o limite
de aplicabilidade de padrões válidos para os países mais avançados, mas que possam ser<br />
inadequados e de alto custo social para os países em desenvolvimento.<br />
V. A Declaração do Rio de Janeiro, de 1992 (ECO 92).<br />
O princípio 16 da Declaração do Rio de Janeiro reza:<br />
“Tendo em vista que o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo decorrente da<br />
poluição, as autoridades nacionais devem esforçar-se para promover a internalização<br />
dos custos de proteção de meio-ambiente e o uso dos instrumentos econômicos,<br />
levando-se em conta o conteúdo de que o poluidor deve em princípio, assumir o<br />
custo da poluição, tendo em vista o interesse do público, sem desvirtuar o comércio e<br />
os investimentos internacionais.<br />
Embora se trate apenas de uma declaração, o princípio do poluidor pagador já foi<br />
previsto anteriormente na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, lei federal 6.938, de 31<br />
de agosto de 1981.<br />
O princípio da prevenção, ou princípio da precaução, também constante da ECO 92<br />
gerou norma jurídica brasileira, através do decreto legislativo federal nº 1, de 3 de fevereiro de<br />
1994 (art. 3º, inciso 3º):<br />
“As partes devem adotar medidas de precaução para prever, evitar ou minimizar as<br />
causas da mudança do clima e mitigar seus efeitos negativos. Quando surgirem<br />
ameaças de danos sérios ou irreversíveis, a falta de plena certeza científica não deve<br />
ser usada como razão de postergar essas medidas”.<br />
VI. O Protocolo de Kioto, de 1997.<br />
O Protocolo de Kioto é um acordo internacional que estabelece metas de controle dos<br />
gases causadores do efeito estufa.<br />
Quando adotaram a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima,<br />
em 1992, os governos reconheceram que ela poderia ser a propulsora de ações mais<br />
enérgicas no futuro. Ao estabelecer um processo permanente de revisão, discussão e troca de<br />
informações, a Convenção possibilita a adoção de compromissos adicionais em resposta a<br />
mudanças no conhecimento científico e nas disposições políticas.
O protocolo complementa a convenção da ONU sobre mudança do clima no planeta,<br />
assinada na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento no Rio de<br />
Janeiro em 1992, a Eco-92.<br />
Pelo acordo internacional, os países integrantes da União Européia (UE) têm meta<br />
conjunta de 8% em relação a 1990. Os Estados Unidos, que respondem por quase 25% das<br />
emissões, abandonaram o protocolo. O presidente norte-americano George W. Bush alegou<br />
que o acordo seria prejudicial à economia do país.<br />
Para que o protocolo entre em vigor, é preciso que ele seja ratificado por pelo menos<br />
55 países --entre eles, os países desenvolvidos responsáveis por 55% das emissões.<br />
O Protocolo de Kioto não prevê compromissos de redução de emissões de gases para<br />
países em desenvolvimento, como o Brasil.<br />
Com a presença de 10.000 delegados, observadores e jornalistas foi realizado esse<br />
evento de alto nível em Kioto, Japão, em dezembro de 1997. A conferência culminou na<br />
decisão por consenso de adotar-se um Protocolo segundo o qual os países industrializados<br />
reduziriam suas emissões combinadas de gases de efeito estufa em pelo menos 5% em<br />
relação aos níveis de 1990 até o período entre 2008 e 2012. Foi aberto para assinaturas me 16<br />
de março de 1998. Ele só entra em vigor depois que os responsáveis por pelo menos 55% das<br />
emissões de dióxido de carbono (medidas em 1990) o tiverem ratificado. Até agora 120 países<br />
assinaram, dos quais 34 ratificaram o Protocolo. Os EUA, um dos principais emissores de<br />
gases de efeito estufa, se recusam a ratificar o Protocolo. Estados Unidos e Rússia<br />
representam, juntos 53% das emissões mundiais.<br />
VII – A RIO + 10, de 2002.<br />
O Jornal Folha de São Paulo, de 5 de setembro de 2002, sob o título “Saiba o que a<br />
Rio + 10 conseguiu decidir” publicou interessante matéria resumindo as constatações e<br />
decisões dessa Convenção. A constatação primeira é de que há mais problemas que medidas<br />
concretas para deslanchar o desenvolvimento sustentável em escala global.<br />
1. A questão da energia<br />
Decisão:<br />
• Ampliar acesso a formas modernas de energia, mas sem prazos nem metas<br />
específicas.
• Derrotada proposta do Brasil e da União Européia para fixar meta global de 10% -<br />
15% de fontes renováveis de energia<br />
• Anunciadas parcerias com países pobres no valor de US$ 769 milhões<br />
Problema:<br />
• Um terço da população, ou 2 bilhões de pessoas, não têm acesso à energia moderna,<br />
como eletricidade e combustíveis fósseis.<br />
2. A questão da mudança climática<br />
Decisão:<br />
• Canadá, Rússia e China anunciaram que deverão ratificar o Protocolo de Kioto<br />
(tratado para conter o efeito estufa)<br />
Problema:<br />
• Temperatura média da atmosfera global deve subir até 5,8ºC até o ano 2100, se nada<br />
for feito para conter emissão de CO2<br />
3. A questão da água.<br />
Decisão:<br />
• Cortar a metade, até 2015, número de pessoas sem acesso a água potável e esgotos<br />
• Anunciados projetos e parcerias que somam US$ 1,5 bilhão para alcançar esses<br />
objetivos<br />
• Desse total, US$ 970 milhões virão dos EUA, em três anos<br />
Problema:<br />
• Em 2025, se nada for feito, 4 bilhões de pessoas (metade da população mundial)<br />
estarão sem acesso a saneamento básico<br />
4. A questão da biodiversidade.<br />
Decisão:<br />
• Reduzir perda de espécies até 2004, mas sem meta específica<br />
• Reconhecimento de que países pobres precisarão de ajuda financeira cumprir o<br />
objetivo<br />
• Reconhecimento do princípio da repartição de benefícios obtidos com espécies de<br />
países pobres
Problema:<br />
• Até 50% das espécies poderiam desaparecer ou ficar em risco de extinção, até o final<br />
do século<br />
• Um quarto das espécies de mamíferos já ameaçadas<br />
5. A questão da pesca.<br />
Decisão:<br />
• Restaurar estoques pesqueiros a níveis sustentáveis até 2015, onde for possível<br />
• Estabelecer áreas de proteção marinha até 2012<br />
Problema:<br />
• Regiões tradicionais de pesca, como a do bacalhau no Atlântico Norte, já entraram<br />
em colapso, com perda de 40 mil empregos no Canadá<br />
6. A questão da agricultura.<br />
Decisão:<br />
• Apoio à eliminação de subsídios agrícolas que afetam exportações de países pobres,<br />
mas sem metas nem prazos<br />
Problema:<br />
• Países ricos subsidiam seus agricultores com mais de US$ 300 bilhões por ano<br />
7. A questão da ajuda ao desenvolvimento<br />
Decisão:<br />
• Reafirmado compromisso da Eco-92 de destinar 0,7% do PIB de países ricos para<br />
ajuda ao desenvolvimento<br />
• Fundo Ambiental Global (GEF) recebe injeção de US$ 2,9 bilhões<br />
Problema:<br />
• Meta não só não foi cumprida como caiu para 0,22% desde 1992
VIII - A Agenda 21<br />
A Agenda 21 é a mais abrangente tentativa já feita de promover, em escala mundial,<br />
um novo padrão de desenvolvimento, conciliando proteção ambiental, justiça social e eficiência<br />
econômica.<br />
Foi consubstanciada em um documento de quarenta capítulos, do qual participaram<br />
governos e instituições da sociedade civil de 179 países, que por dois anos se prepararam para<br />
a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento – ECO-92. A<br />
Agenda 21 traduz em atitudes práticas o que se chama desenvolvimento sustentável.<br />
O documento “Nosso futuro comum”, também conhecido como Relatório Bruntland 9<br />
(Noruega, 1986), concebe desenvolvimento sustentável como “o desenvolvimento que satisfaz<br />
as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir<br />
suas próprias necessidades”. É este o conceito de desenvolvimento sustentável que tem sido<br />
adotado pelo Estado brasileiro.<br />
A questão não é de conceito, mas de aplicação prática dos conceitos. Na Assembléia<br />
Geral das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, de Johannesburgo (2.002), à<br />
qual compareceram mais de 22.000 pessoas, o próprio Secretário Geral da Conferência, Nitin<br />
Desai: “Quando a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou a realização da Conferência<br />
Mundial sobre o Desenvolvimento sustentável não era nenhum segredo – nem sequer uma<br />
questão que se deveria debater – que o avanço em direção ao desenvolvimento sustentável<br />
havia sido extremamente decepcionante desde a Conferência sobre a Terra, de 1992, já que a<br />
pobreza havia aumentado e a degradação do meio ambiente havia piorado. O que o mundo<br />
desejava, segundo afirmava a Assembléia não era um novo debate filosófico ou político, mas<br />
uma conferência de ações e resultados. 10 ”<br />
9 “O Relatório Bruntland – elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e<br />
Desenvolvimento, criada pelas Nações Unidas e presidida pela então Primeira-Ministra da<br />
Noruega, Gro-Bruntland – faz parte de uma série de iniciativas, anteriores à Agenda 21, as<br />
quais reafirmam uma visão crítica do modelo de desenvolvimento adotado pelos países<br />
industrializados e reproduzido pelas nações em desenvolvimento, e que ressaltam os riscos do<br />
uso excessivo dos recursos naturais sem considerar a capacidade de suporte dos<br />
ecossistemas. O relatório aponta para a incompatibilidade entre desenvolvimento sustentável e<br />
os padrões de produção e consumo vigentes.” Disponível na Internet:<br />
.Acesso em 13.4.04.<br />
10 Página oficial da Organização das Nações Unidas. Disponível na Internet:<br />
. Acesso em 13.04.04. Tradução livre do autor.
IX – A legislação infraconstitucional brasileira<br />
Como acontece também em outras matérias, em Direito Ambiental, a nossa legislação<br />
é abundante. A lei Federal n. 9.433, de 8 de janeiro de 1.997 institui a política nacional de<br />
recursos hídricos. A Lei 9.984, de 17 de julho de 2.000 dispõe sobre a Agência Nacional de<br />
Águas – ANA; a Lei federal n. 9.966, de 28 de abril de 2.000, dispõe sobre a prevenção,<br />
controle e fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias<br />
nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional. A Lei federal 9.605, de 12 de fevereiro<br />
de 1.998 é a Lei dos Crimes Ambientais, que define e estabelece penas para “poluição de<br />
qualquer natureza (O Decreto federal 73.030, de 30 de outubro de 1.973 define o que é<br />
poluição hídrica). A lei federal 7.990, de 28 de dezembro de 1.989 institui para os Estados,<br />
Distrito Federal e Municípios, compensação financeira pelo resultado da exploração de petróleo<br />
ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica, de recursos<br />
minerais em seus respectivos territórios, plataforma continental, mar territorial ou zona<br />
econômica exclusiva. A Lei federal 6.938, de 31 de agosto de 1981 e a Lei 6.902, de 27 de abril<br />
de 1981, estabelece a política nacional do meio ambiente. A lei federal 7.802, de 11 de julho de<br />
1989, regulamentada pelo Decreto 4.074, de 4 de janeiro de 2002, trata dos danos ambientais.<br />
A Lei federal 7.661, de 16 de maio de 1.988 institui o plano nacional de gerenciamento costeiro;<br />
o Decreto federal n. 24.643, de 10 de julho de 1934 institui o Código de Águas. O Decreto<br />
federal 94.076, de 5 de março de 1987 institui o Programa Nacional de Microbacias<br />
Hidrográficas; o Decreto-lei 221 de 28 de fevereiro de 1967 (alterado pelos Decretos<br />
3.978/2.001 e 4.174/2002) regulamenta o Conselho Nacional de Recursos Hídricos. As<br />
Resoluções CONAMA n. 20, de 29 de novembro de 2.000 e 274, de 29 de novembro de 2.000<br />
dispõem sobre a balneabilidade das águas doces, salobras e salinas. O Estatuto da Cidade<br />
(Lei 1.257, de 10 de julho de 2.001), que estabelece normas gerais de política urbana, afirma<br />
literalmente: “estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da<br />
propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem<br />
como do equilíbrio ambiental”.<br />
Há, ainda, outras normas mais específicas: Decreto-lei 25, de 30 de novembro de<br />
1937, sobre a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional; Lei 3.924, de 26 de julho de<br />
1.961, sobre monumentos arqueológicos e pré-históricos; lei 5.197, de 30 de janeiro de 1.967,<br />
sobre a proteção à fauna; Lei 7.802, de 11 de julho de 1.989, sobre agrotóxicos; Lei 7.805, de<br />
18 de julho de 1989, sobre permissão de lavra garimpeira; Lei 8.429, de 2 de junho de 1.992,<br />
sobre improbidade administrativa; lei 8.984, de 5 de janeiro de 1.995, que regulamenta a<br />
engenharia genética; lei 9.795,. de 27 de abril de 1999, sobre educação ambiental; lei 9.985, de<br />
18 de julho de 1.000, que institui o sistema nacional de unidades de conservação.
Como a competência para legislar sobre a defesa do solo e dos recursos naturais é de<br />
competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal (conforme artigo 24, VI,<br />
da Constituição), e suplementar dos municípios, conforme artigo 30, II e VIII da Constituição,.<br />
outras tantas normas foram geradas nos demais entes federativos.<br />
Como se vê, leis não nos faltam...<br />
X. Conclusões.<br />
1. Não há, nem nos compromissos internacionais do Brasil, nem na legislação brasileira,<br />
impedimento à conciliação entre a proteção ao meio-ambiente nem ao desenvolvimento<br />
econômico.<br />
2. As restrições da legislação ambiental não justificam nem explicam o aprofundamento das<br />
desigualdades sociais, seja entre países seja dentro de cada um dos países.<br />
3. Mesmo para aqueles que acreditam que todas as questões – e soluções para elas – se<br />
resumem ao aspecto econômico (no sentido de recursos financeiros) é fácil verificar que o<br />
desenvolvimento sustentável não só é possível como é mais barato, se considerados todos<br />
os custos diretos e indiretos da degradação do meio-ambiente, que são suportados<br />
indistintamente por toda a sociedade.<br />
Fonte: http://www.direitonet.com.br/textos/x/58/77/587/, em 30/06/2008