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Capítulo 2

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Evolução das Espécies Cultivadas<br />

Mesmo não se sabendo exatamente quando o homem começou a agir<br />

como melhorista de plantas, certamente a natureza vem procedendo como tal<br />

através do tempo, apesar de o sentido da seleção praticada pela natureza<br />

divergir, quase sempre, dos objetivos dos melhoristas. Segundo Allard (1971),<br />

as variações herdáveis ocorreram antes e depois do início do cultivo.<br />

Eventualmente, raças portadoras de tais variações cresciam ao lado de outras,<br />

produzindo-se, assim, híbridos naturais, o que aumentava o número de<br />

combinações genéticas. Algumas apresentavam vantagens, enquanto tipos não<br />

adaptados a certos ambientes eram eliminados, aumentando assim as<br />

oportunidades para os melhores cruzamentos.<br />

Os melhoristas atuais receberam os produtos finais de um longo período<br />

de seleção natural e artificial. Sem dúvida, a ajuda do homem nesse processo<br />

foi significativa, inclusive, em alguns casos, atuando contra a seleção natural<br />

para preservar os tipos variantes que lhe interessavam. Portanto, a atuação<br />

conjunta da seleção natural e artificial proporcionou ao melhorista moderno um<br />

formidável acervo botânico.<br />

2.1. FORMAS DE EVOLUÇÂO<br />

As maneiras pelas quais se processou a evolução das espécies de plantas,<br />

com certas variações, limitam-se a três categorias principais: mutação, hibridação<br />

interespecífica e poliploidia, as quais não são mutuamente exclusivas.<br />

2.1.1. Mutação<br />

A diversificação mendeliana é proveniente, basicamente, das mutações<br />

gênicas. As recombinações que resultam da hibridação entre formas que<br />

carregam mutações diferentes proporcionam maior diversidade genética sobre<br />

a qual pode atuar a seleção, natural ou artificial. Por vezes, uma única mutação<br />

pode aumentar o valor de uma espécie para o homem. Sabe-se que o repolho,<br />

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos<br />

a couve-flor, brócolis e a couve-de-Bruxelas, todas da família das Crucíferas,<br />

derivaram-se bem diretamente da couve selvagem, planta que ainda vegeta<br />

nas costas da Europa e no Norte da África. As grandes diferenças morfológicas<br />

que distinguem estes tipos são resultado de diferenças num pequeno número<br />

de genes.<br />

As mutações gênicas, admite-se, vêm ocorrendo a uma razão mais ou<br />

menos constante e têm sido a base para a seleção natural, mas na sua grande<br />

maioria são deletérias e recessivas. Por essas razões, à medida que um pequeno<br />

grupo delas se expõe ao ambiente, têm que submeter-se às forças seletivas.<br />

Este fato deve ocorrer, com maior probabilidade, em populações geneticamente<br />

heterogêneas, ou seja, em indivíduos heterozigotos, que carregam e segregam<br />

alelos recessivos. Na condição selvagem a grande maioria das plantas<br />

reproduzem-se por cruzamento e, por isso, são altamente heterozigotas.<br />

Muitas cultivares de importância sócio-econômica foram originadas por<br />

mutações dentro de uma única espécie. São exemplos cultivares de centeio,<br />

cevada, feijão, linho, milho e tomate.<br />

2.1.2. Hibridação interespecífica<br />

Consiste no cruzamento entre diferentes espécies afins, com a manutenção<br />

de certos tipos produzidos a partir dos produtos da segregação. O grande<br />

número de diferenças genéticas que podem ser obtidas a partir de cruzamentos<br />

interespecíficos, além de diferenças na organização cromossômica, resultam<br />

geralmente numa grande complexidade nas gerações segregantes. Por outro<br />

lado, muitas das recombinações não são equilibradas e, assim, não passam<br />

pelo crivo da seleção natural. Por isso é difícil encontrarem-se exemplos em<br />

que duas ou mais espécies tenham contribuído conjuntamente para a formação<br />

de uma série de cultivares, a não ser em casos de plantas que podem ser<br />

reproduzidas por métodos vegetativos.<br />

A multiplicação assexuada conserva o vigor que caracteriza muitos híbridos<br />

interespecíficos. Cultivares de videiras, rosáceas, como pereiras e cerejeiras,<br />

ornamentais, como lírios e rosa, e outras, foram originadas da hibridação<br />

interespecífica. Antes do descobrimento da América, os horticultores europeus<br />

cultivavam espécies selvagens de moranguinho, sem obterem progressos<br />

satisfatórios no seu melhoramento, talvez por falta de variabilidade necessária<br />

no germoplasma até então disponível. Em princípios do século XIX, quando os<br />

ingleses fizeram cruzamentos entre Fragaria virginiana, americana e Fragaria<br />

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Evolução das Espécies Cultivadas<br />

chiloensis, européia, começaram a aparecer resultados satisfatórios. Os<br />

cruzamentos entre essas duas espécies, retrocruzamentos e produtos<br />

segregantes, possibilitaram a combinação de seus caracteres desejáveis, como<br />

tamanho grande dos frutos de F. chiloensis com a fertilidade alta, melhor sabor<br />

e outras qualidades do fruto de F. virginiana.<br />

Outra forma de hibridação interespecífica, chamada hibridação<br />

introgressiva ou introgressão, parece ter tido importância em certos casos. Tratase<br />

de uma hibridação seguida de retrocruzamentos com uma das espécies<br />

parentais, de modo a se transferirem algumas características de uma espécie<br />

para outra, sem perda da identidade taxonômica desta. Na realidade, ocorre<br />

um ligeiro enriquecimento de uma espécie com genes provenientes da outra.<br />

Isto torna mais ampla a variabilidade da espécie recorrente , aumentando o<br />

número de recombinantes. A hibridação interespecífica, neste caso, é difícil de<br />

detectar-se, principalmente quando a introgressão tenha sido pouco expressiva.<br />

Há, pois, necessidade de maiores estudos sobre o assunto. O exemplo clássico<br />

e que parece evidente, é o cruzamento do milho com planta de Tripsacum,<br />

gênero silvestre da América Central, taxonomicamente próximo de Zea mays.<br />

Provavelmente houve contaminação de milho sul-americano com genes de<br />

Tripsacum. Resumindo, esta teoria pressupõe que uma variedade de milho<br />

começou a ser cultivada na região andina da Bolívia e Peru e, estendendo-se<br />

para o norte, chegou à América Central. Aí encontrou outra variedade que havia<br />

sido cultivada exclusivamente no México, semelhante aos tipos norte-americanos,<br />

mas com características diferentes das do milho sul americano. Em algumas<br />

dessa regiões teriam ocorrido os cruzamentos em questão. Tripsacum é<br />

semelhante ao milho norte-americano e o produto de seu cruzamento com o<br />

milho é estéril. Portanto, se Tripsacum for um dos genitores do milho atual, os<br />

descendentes férteis do cruzamento, semelhantes ao milho, devem ter se<br />

originado de sucessivos retrocruzamentos com plantas de milho.<br />

Estudos citogenéticos elucidaram a origem do trigo cultivado Triticum<br />

aestivum. O gênero Triticum consiste numa série de espécies diplóides (2n=14),<br />

tetraplóides (2n=28) ou hexaplóides (2n=42), sendo, portanto, o número básico<br />

de cromossomos n=7. O relacionamento das espécies diplóides, tetraplóides e<br />

hexaplóides foi determinado principalmente a partir da comparação do<br />

comportamento dos cromossomos durante o pareamento nos híbridos entre<br />

essas espécies. Esses estudos permitiram demonstrar que as espécies podiam<br />

ser diferenciadas pelos seus genomas, simbolizados por A, B e D. Diplóides<br />

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos<br />

são AA, tetraplóides AABB e hexaplóides AABBDD. Os tetraplóides originaramse<br />

da hibridação entre espécies diplóides que contribuíram com os genomas A<br />

e B, seguida de duplicação cromossômica, resultando nas formas AABB.<br />

Posteriormente houve hibridação entre tetraplóides AABB e uma terceira espécie<br />

diplóide, doadora de D, seguida de duplicação dos cromossomos e, finalmente,<br />

originando as espécies hexaplóides AABBDD. A Figura 2.1. mostra as espécies<br />

envolvidas na evolução do trigo.<br />

FIGURA 2.1. Filogenia do trigo T. aestivum (Riley, 1965).<br />

2.1.3. Poliploidia<br />

Maiores detalhes sobre a poliploidia podem ser vistos no capítulo<br />

específico sobre o assunto. Procura-se estudar aqui apenas a contribuição<br />

desse fenômeno citológico sobre a evolução das plantas cultivadas. Indivíduos<br />

haplóides, triplóides, tetraplóides, ou com níveis mais altos de ploidia, podem<br />

ser obtidos, normalmente, por erros nos processos de reprodução dos diplóides.<br />

Autopoliplóides e alopoliplóides são resultantes, respectivamente, da<br />

união de genomas idênticos duplicados e de genomas ou espécies diferentes.<br />

A autopoliploidia não tem contribuído muito para a evolução natural, por induzir<br />

um comportamento anormal de cromossomos, que geralmente produz alto grau<br />

de esterilidade. A limitada produção de sementes faz com que espécies<br />

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Evolução das Espécies Cultivadas<br />

autopoliplóides se reproduzam assexuadamente. Com freqüência têm partes<br />

da planta maiores do que nos diplóides, como flores, frutos, etc. A triploidia é a<br />

forma mais simples da poliploidia; originados por desequilíbrio nos jogos<br />

cromossômicos, os triplóides são altamente estéreis e reproduzem-se por via<br />

assexuada. Calcula-se que aproximadamente 25% das cultivares americanas<br />

de maçãs são triplóides, o mesmo acontecendo com as peras européias. As<br />

cultivares de bananas comerciais têm 33 cromossomos, enquanto os tipos<br />

diplóides possuem 22. A triploidia na banana é importante porque resulta na<br />

falta de produção de sementes, indesejáveis no fruto. Produz, ainda, aumento<br />

do tamanho e vigor da planta e tamanho do fruto.<br />

Existem cultivares diplóides e tetraplóides de batata, todas da espécie<br />

Solanum tuberosum, além de alguns tipos triplóides. É provável que as espécies<br />

tetraplóides originaram-se por autopoliploidia, principalmente.<br />

Segundo Allard (1971) foram descobertas pelo menos 15 variedades de<br />

uvas tetraplóides espontâneas, formadas a partir de plantas diplóides. Entretanto,<br />

esses novos tipos apresentavam, paralelamente, características indesejáveis.<br />

Portanto, nem sempre a autopoliploidia produz tipos superiores e sua contribuição<br />

para a evolução das plantas foi realmente limitada, conforme o autor.<br />

Ao contrário, a alopoliploidia foi mais eficiente no processo de evolução<br />

das plantas cultivadas. Consiste na hibridação entre espécies afins, com<br />

posterior duplicação do número de cromossomos. Verificou-se que os híbridos<br />

estéreis tornavam-se férteis pela duplicação dos genomas, fator de especial<br />

importância na hibridação interespecífica. Esses tipos, chamados anfidiplóides,<br />

são férteis e geralmente produzem descendentes férteis. Segundo muitos<br />

autores, os anfidiplóides constituem os próprios F 1 s do cruzamento entre<br />

diferentes espécies. O produto da duplicação dos genomas desses anfidiplóides<br />

são também férteis e constituem os alopoliplóides, sem um termo específico<br />

para designá-los. Há quem considere os dois termos sinônimos. Provavelmente,<br />

a metade das plantas cultivadas e 70% das gramíneas forrageiras são<br />

alopoliplóides (Allard, 1971).<br />

A poliploidia foi importante no desenvolvimento de plantas como o trigo,<br />

fumo, algodão e café. O fumo comercial (Nicotiana tabacum) tem 48<br />

cromossomos, e originou-se do cruzamento de duas espécies silvestres, N.<br />

sylvestris x N. tomentosa, ambas com 24 cromossomos.<br />

O gênero Coffea, por exemplo, é constituído por aproximadamente 100<br />

espécies. Dessas, apenas a espécie Coffea arabica L. é alotetraplóide, com 44<br />

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Melhoramento Genético de Plantas: Princípios e Procedimentos<br />

cromossomos, sendo autofértil e predominantemente autógama. As demais<br />

espécies são diplóides, com 22 cromossomos, todas autoincompatíveis e,<br />

portanto, alógamas. Estudos de quimiotaxonomia, evolução e hibridação<br />

interespecífica evidenciaram que a espécie C. arabica deve ter se originado do<br />

cruzamento de duas espécies diplóides (C. eugenioides com C. canephora, C.<br />

congensis ou C. liberica), seguida da duplicação do número de cromossomos.<br />

A espécie C. arabica é hoje explorada comercialmente em todas as regiões<br />

cafeeiras e cerca de 75% de todo o café comercializado no mundo é oriundo de<br />

cultivares dessa espécie.<br />

Importante contribuição da poliploidia foi produzir maior potencial de<br />

variação, aumentando o número de alelos idênticos e, conseqüentemente, as<br />

possibilidades de ocorrerem mutações, resultando em aumento da variabilidade<br />

genética.<br />

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