1 Heurísticas Afetivas no Mercado de Ações Brasileiro: Um ... - Anpad
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<strong>Heurísticas</strong> <strong>Afetivas</strong> <strong>no</strong> <strong>Mercado</strong> <strong>de</strong> <strong>Ações</strong> <strong>Brasileiro</strong>:<br />
<strong>Um</strong> Estudo Quase-Experimental com Investidores<br />
Autoria: Ricardo Alonso Gonzalez, Adria<strong>no</strong> Leal Bruni<br />
O artigo investigou <strong>de</strong> que forma aspectos afetivos se manifestam <strong>no</strong>s julgamentos<br />
conduzidos por investidores do mercado <strong>de</strong> ações brasileiro relativos a riscos e benefícios<br />
percebidos. Adicionalmente, investigou se tais aspectos po<strong>de</strong>riam ser explicados por gênero,<br />
ida<strong>de</strong> ou conhecimento autopercebido sobre o mercado. A análise incluiu o uso do teste t, da<br />
regressão logística e da análise fatorial, aplicadas a uma amostra formada por 143<br />
investidores. Os resultados evi<strong>de</strong>nciam a presença <strong>de</strong> heurística afetiva, bem como a<br />
existência <strong>de</strong> associação negativa entre conhecimento autopercebido sobre o mercado e a<br />
manifestação da heurística.<br />
1. INTRODUÇÃO<br />
Este trabalho investiga <strong>de</strong> que forma as heurísticas (ou atalhos <strong>de</strong> julgamento) afetivas se<br />
manifestam nas <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> investimentos <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> ações <strong>no</strong> Brasil, i<strong>de</strong>ntificando <strong>de</strong><br />
que forma estímulos afetivo-emocionais <strong>de</strong> superavaliação ou subavaliação <strong>de</strong> benefícios e <strong>de</strong><br />
riscos associados a investimentos financeiros <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> ações conduzem os indivíduos a<br />
modificarem a sua percepção <strong>de</strong> risco e benefício <strong>de</strong> um investimento financeiro.<br />
Decisões envolvem pessoas, relações profissionais, aspectos financeiros e sentimentos. Como<br />
averiguar se essas <strong>de</strong>cisões estão sendo corretamente tomadas? A avaliação é difícil, já que os<br />
julgamentos que acompanham as <strong>de</strong>cisões po<strong>de</strong>m ser conduzidos pelas emoções, por juízos <strong>de</strong><br />
valor ou por impulsos, sendo afetados por estímulos exter<strong>no</strong>s ou inter<strong>no</strong>s que tornam a<br />
<strong>de</strong>cisão imperfeita, fugindo às prerrogativas do homo eco<strong>no</strong>micus, imune a interferências<br />
comportamentais ou afetivas.<br />
O lócus das <strong>de</strong>cisões e julgamentos tomados <strong>no</strong> âmbito das Finanças e dos investimentos<br />
financeiros, em particular, não teria espaço para a ausência da racionalida<strong>de</strong>. Decisões<br />
<strong>de</strong>veriam ser tomadas com a consi<strong>de</strong>ração e análise <strong>de</strong> todas as possibilida<strong>de</strong>s e mediante a<br />
avaliação <strong>de</strong> todas as interações possíveis entre risco e retor<strong>no</strong>. A alternativa maximizadora da<br />
utilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>veria ser escolhida.<br />
Contudo, a realida<strong>de</strong> tem <strong>de</strong>monstrado <strong>de</strong> maneira sistemática que as <strong>de</strong>cisões, mesmo as<br />
financeiras, são fortemente influenciadas por fatores comportamentais. Ackert, Church e<br />
Deaves (2003) trazem um rico conteúdo acerca da influência das emoções nas <strong>de</strong>cisões<br />
financeiras. Em artigo publicado, <strong>no</strong> Eco<strong>no</strong>mic Review, periódico <strong>de</strong> orientação<br />
eminentemente econômica, ligado ao Fe<strong>de</strong>ral Reserve, os autores discutem com extensa<br />
abordagem a influência das emoções <strong>no</strong>s julgamentos e nas <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> natureza financeira.<br />
Concluem que os fatores emocionais não necessariamente contaminam as <strong>de</strong>cisões (<strong>no</strong><br />
sentido negativo) e enfatizam a necessida<strong>de</strong> da incorporação do componente emocional.<br />
A presente pesquisa contribui com a discussão, analisando a presença <strong>de</strong> heurística afetiva em<br />
uma amostra formada por 143 investidores brasileiros. Estudou julgamentos associados a<br />
estímulos positivos e negativos relativos a riscos e benefícios. Adicionalmente, investigou<br />
quais variáveis po<strong>de</strong>riam explicar a manifestação, incorporando discussões sobre ida<strong>de</strong>,<br />
gênero e conhecimento.<br />
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA<br />
A palavra heurística <strong>de</strong>riva do grego heureka, que significa “<strong>de</strong>scobri” (FERREIRA, 2008).<br />
As heurísticas constituem-se em atalhos mentais utilizados pelos indivíduos com a finalida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> simplificar o processo <strong>de</strong>cisório. Para Bazerman e Moore (2010), as heurísticas<br />
1
simplificam o processo <strong>de</strong>cisório, mas às vezes po<strong>de</strong>m levar a erros graves. Esses erros<br />
<strong>de</strong>correm <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões enviesadas, quando a utilização das heurísticas é feita <strong>de</strong> forma<br />
ina<strong>de</strong>quada, levando o <strong>de</strong>cision maker a cair em uma das muitas armadilhas <strong>de</strong> julgamentos:<br />
os vieses.<br />
Kahneman e Tversky (1974) evi<strong>de</strong>nciaram a existência <strong>de</strong> três heurísticas: a<br />
representativida<strong>de</strong>, a disponibilida<strong>de</strong> e a ancoragem e ajustamento. De forma mais recente,<br />
trabalhos como os <strong>de</strong> Finucane et al. (2000) e Slovic et al. (2002) passaram a apresentar<br />
manifestações <strong>de</strong> heurísticas afetiva, em que os indivíduos se <strong>de</strong>ixam influenciar por fatores<br />
emotivos. A proposição central <strong>de</strong>stes estudos estaria centrada <strong>no</strong> fato do "afeto ser um<br />
componente essencial em muitas formas <strong>de</strong> julgamento e tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão.” Os autores não<br />
atribuem a influência das <strong>de</strong>cisões apenas a aspectos afetivos, mas <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que esses<br />
aspectos agem em conjunto com os aspectos cognitivos, sendo responsáveis, ainda que em<br />
parte, pelas <strong>de</strong>cisões.<br />
Na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> heurística afetiva dada por Finucane et al. (2000), o afeto po<strong>de</strong> servir <strong>de</strong><br />
atalho para muitos julgamentos importantes. Utilizando-se <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> sentimentos já<br />
disponível, po<strong>de</strong> ser muito mais fácil – e mais eficiente – do que pesar os prós e contras, ou<br />
resgatar da memória informações relevantes, especialmente quando a <strong>de</strong>cisão, ou o<br />
julgamento, é complexo, ou os recursos (tempo, informação, conhecimento) são limitados.<br />
Essa caracterização <strong>de</strong> atalho mental levou os autores a rotularem o uso do afeto como uma<br />
heurística.<br />
Slovic et al. (2002), tomando por referência o processo mental <strong>de</strong> construção do pensamento,<br />
reforça o framework teórico da heurística afetiva. Argumentam que a heurística afetiva<br />
<strong>de</strong>corre exatamente da confiança que as pessoas <strong>de</strong>positam em tais sentimentos, que por<br />
possuírem lugar privilegiado <strong>no</strong> processo mental <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão influenciam<br />
diretamente nas <strong>de</strong>cisões. Citam, por exemplo, as palavras tesouro e ódio. A primeira palavra<br />
transmite às pessoas, rapidamente, um estímulo, ou sensação positiva, ao passo que a segunda<br />
palavra remete as pessoas a sensações negativas. Essas sensações, que acometem as pessoas<br />
<strong>de</strong> maneira rápida e intuitiva, terminam por influenciar <strong>no</strong> julgamento em relação a situações<br />
<strong>de</strong> incerteza. Tome-se, por exemplo, um investidor em ações. Todo investidor, ao longo da<br />
sua história, já vivenciou situações <strong>de</strong> ganho e <strong>de</strong> perda. Esse investidor, ao se <strong>de</strong>parar com<br />
um estímulo que <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ie nele uma lembrança <strong>de</strong> perdas passadas, fará com que seja<br />
disparada uma sensação afetiva negativa em relação ao mercado <strong>de</strong> ações, ao passo que esse<br />
mesmo investidor, ao se <strong>de</strong>parar com um estímulo que o remeta a uma lembrança <strong>de</strong> ganho,<br />
fará disparar nele uma sensação positiva.<br />
Ferreira (2008) enten<strong>de</strong> a heurística afetiva como o mais importante <strong>de</strong>senvolvimento do<br />
estudo das heurísticas dos últimos tempos. O elemento afetivo, anteriormente <strong>de</strong>sprezado dos<br />
estudos relativos a <strong>de</strong>cisões em situações <strong>de</strong> incerteza, vem assumindo importante papel,<br />
fornecendo explicação para numerosas situações e atitu<strong>de</strong>s. A dimensão afetiva, prossegue<br />
Ferreira (2008), constitui-se <strong>de</strong> um atributo heurístico, reforçando a tese <strong>de</strong>fendida por<br />
Finucane et al. (2000) e Slovic et al. (2002), <strong>de</strong> que a <strong>de</strong>cisão é fortemente influenciada pelo<br />
afeto.<br />
Para Slovic et al. (2002), os recursos emocionais acessados pelas pessoas não são uniformes,<br />
eles variam <strong>de</strong> pessoa para pessoa em função das diferentes reações em relação às emoções e<br />
<strong>de</strong> sua predisposição em confiar na experiência. Também variam em função do contexto. Em<br />
virtu<strong>de</strong> das experiências e sentidos a elas associados, constrói-se o que os autores chamam <strong>de</strong><br />
2
“mapping of affective information”. Esse processo constrói um portfólio <strong>de</strong> sentimentos em<br />
cada indivíduo, com diferentes graus associados a diferentes contextos. Tal portfólio contém<br />
todas as imagens positivas e negativas, em diversos graus. A intensida<strong>de</strong> do afeto (positiva ou<br />
negativa) varia em função da imagem formada. É como disseram Fernán<strong>de</strong>z-Abascal et al.<br />
(2010): os afetos possuem valência – positiva ou negativa – e intensida<strong>de</strong> – alta ou baixa. Ao<br />
acessar tais imagens, a heurística afetiva (guiada pela sua valência e intensida<strong>de</strong>) funciona<br />
como um palpite da <strong>de</strong>cisão a ser tomada, conforme se resgate uma imagem positiva ou<br />
negativa. Tudo que agrada ou que induz a estados positivos (prazer) tem mais chance <strong>de</strong> ser<br />
consi<strong>de</strong>rado real (superestimação dos benefícios), e tudo que <strong>de</strong>sagrada tem mais chance <strong>de</strong><br />
ser <strong>de</strong>scartado (superestimação do risco).<br />
A concepção da heurística afetiva proposta por Finucane et al. (2000) fundamenta-se nessas<br />
proposições na medida em que consi<strong>de</strong>ra que as <strong>de</strong>cisões po<strong>de</strong>m ser enviesadas por estímulos<br />
que conduzam os indivíduos a estados positivos ou negativos.<br />
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS<br />
A pesquisa envolveu um quase-experimento, realizado com investidores usuários <strong>de</strong> home<br />
broker. O processo <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> dados envolveu três fases distintas, formadas por um pré-teste<br />
(feito com o objetivo <strong>de</strong> melhorar o instrumento <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> dados junto a alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> pósgraduação<br />
em Administração da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia), uma validação <strong>de</strong> cenários<br />
junto a investidores em ações (funcionários da Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia) e a<br />
pesquisa propriamente dita. As três fases ocorreram <strong>no</strong> segundo semestre <strong>de</strong> 2011.<br />
A amostra foi composta por investidores pessoas física da Bolsa <strong>de</strong> Valores que operam por<br />
meio <strong>de</strong> home broker. Dois escritórios <strong>de</strong> agentes autô<strong>no</strong>mos <strong>de</strong> investimentos sediados na<br />
cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Salvador, Bahia, se disponibilizaram para o envio dos instrumentos <strong>de</strong> coleta para<br />
os seus clientes, aleatoriamente distribuídos em quatro grupos que receberam quatro<br />
diferentes estímulos (risco alto e baixo, benefício alto e baixo). Foram coletadas 178<br />
respostas, seguidas da exclusão dos indivíduos que não investem por meio <strong>de</strong> home broker ou<br />
web banking e dos questionários incompletos. Os resultados po<strong>de</strong>m ser vistos na Tabela 1,<br />
que <strong>de</strong>staca um amplo predomínio do gênero masculi<strong>no</strong>, com 89%. A ida<strong>de</strong> média da amostra<br />
foi igual a 37 a<strong>no</strong>s. O tempo médio enquanto investidor foi igual a 4,57 a<strong>no</strong>s.<br />
Tabela 1:<br />
Composição da amostra.<br />
1-Alto risco 2-Baixo risco 3-Alto benefício 4-Baixo benefício Total<br />
Fi Fi% Fi Fi% Fi Fi% Fi Fi% Fi Fi%<br />
Gênero Femini<strong>no</strong> 5 16 2 3 2 5 7 21 16 11<br />
Masculi<strong>no</strong> 27 84 36 97 37 95 27 79 127 89<br />
Ida<strong>de</strong> Média 40 35 40 34 37<br />
Desvio 13 10 13 11<br />
A<strong>no</strong>s<br />
enquanto<br />
Média 5,59 3,29 4,21 2,82 3,94<br />
investidor Desvio 7,07 1,43 4,60 3,42 4,57<br />
N 32 38 39 34 143<br />
O mo<strong>de</strong>lo operacional da pesquisa po<strong>de</strong> ser visto na Figura 1, que também <strong>de</strong>staca as<br />
hipóteses testadas, apresentadas como H1 (associação entre estímulo e estado afetivo,<br />
subdividida, conforme o estímulo recebido, em H11, H12, H13 e H14), H2 (efeito da ida<strong>de</strong>),<br />
H3 (efeito do gênero) e H4 (efeito do conhecimento).<br />
3
ESTÍMULOS<br />
Alto Risco<br />
Alto Benefício<br />
Baixo Risco<br />
Baixo Benefício<br />
Ida<strong>de</strong><br />
Gênero<br />
Grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento do mercado<br />
<strong>de</strong> ações<br />
Figura 1. Mo<strong>de</strong>lo Operacional da Pesquisa.<br />
A primeira hipótese estabeleceu que estímulos po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar estados afetivos positivos<br />
ou negativos em relação a um objeto, influenciando na percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício<br />
associados a <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> investimento <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> ações. Conforme sugerido por Finucane<br />
et al. (2000), espera-se que a percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício dos investimentos em ações<br />
sofra alterações, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da natureza do estímulo. A hipótese foi subdividida em quatro<br />
situações (que também correspon<strong>de</strong>m às quatro divisões da amostra), segregadas em função<br />
do estímulo recebido e que po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong> benefício ou risco, apresentados como alto ou<br />
baixo. <strong>Um</strong>a caracterização dos grupos e dos estímulos po<strong>de</strong> ser vista na Figura 2.<br />
Os estímulos buscaram <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar <strong>no</strong>s pesquisados valências afetivas, <strong>de</strong> forma a modificar<br />
as suas percepções <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício sobre os investimentos. Para Fernán<strong>de</strong>z-Abascal et<br />
al. (2010, p. 95), os antece<strong>de</strong>ntes que põem em marcha o processo emocional representam a<br />
percepção <strong>de</strong> uma modificação nas condições, tanto externas quanto internas ao indivíduo e<br />
que po<strong>de</strong>m ser acessadas pelos sistemas perceptivos. Os textos apresentados buscaram<br />
<strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ar valência afetiva positiva ou negativa em relação aos investimentos em ações, em<br />
conformida<strong>de</strong> com Finucane et al. (2000), tentando provocar modificações <strong>de</strong> percepção <strong>de</strong><br />
riscos e benefícios. Schwartz (2000), ao estudar a influência <strong>de</strong> estados afetivos <strong>no</strong><br />
processamento <strong>de</strong> informações, utilizou o que o autor chamou <strong>de</strong> persuasive messages. Outros<br />
estudos também utilizaram mensagens <strong>de</strong> texto como estímulos, a exemplo <strong>de</strong> Bower (1981),<br />
Kuvaas e Kaufmann (2004), Johnson e Tversky (1983), Mittal e Ross (1998). Os textos<br />
utilizados como estímulos foram adaptados <strong>de</strong> informações disponíveis <strong>no</strong>s sites da BM&F<br />
Bovespa ou do Instituto Assaf Neto.<br />
Adicionalmente, outras três hipóteses testaram os efeitos <strong>de</strong> possíveis covariantes, como<br />
ida<strong>de</strong>, gênero e o grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações. Feng e<br />
Seasholes (2005) e Matsumoto et al. (2009), sugerem que pessoas <strong>de</strong> maior ida<strong>de</strong> sofrem mais<br />
influência dos vieses. Bazerman e Moore (2010) Barber e O<strong>de</strong>an (2001) Barsky et al. (1997) e<br />
Araújo e Silva (2006) <strong>de</strong>stacam reações diferentes a estímulos em homens e mulheres.<br />
Fre<strong>de</strong>rick (2005), Jensen (1998) Fleischhauer et al. (2010) e Pereira (2011) <strong>de</strong>stacam que<br />
indivíduos com maior grau <strong>de</strong> conhecimento (cognição) sofram me<strong>no</strong>s influência dos fatores<br />
afetivos nas suas percepções <strong>de</strong> risco e benefício.<br />
H11<br />
H12<br />
H2 H3 H13 H4<br />
H14<br />
Estado<br />
Afetivo<br />
Risco<br />
Benefício<br />
4
Grupo Estímulo recebido (segunda seção do instrumento <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> dados)<br />
Grupo 1<br />
Alto risco<br />
Valência<br />
(-)<br />
Grupo 2<br />
Baixo<br />
risco<br />
Valência<br />
(+)<br />
Grupo 3<br />
Alto<br />
benefício<br />
Valência<br />
(+)<br />
Grupo 4<br />
Baixo<br />
benefício<br />
Valência<br />
(-)<br />
No curto prazo, investir <strong>no</strong> mercado a vista <strong>de</strong> ações po<strong>de</strong> representar um gran<strong>de</strong> risco. A história<br />
do mercado inclui a quebra da Bolsa <strong>de</strong> Nova York em 1929, seguida da gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão, o bear<br />
market <strong>de</strong> 1972 a 1974 e a queda <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1987. Mais recentemente assistiu-se a quedas<br />
acentuadas em todo o mundo, principalmente <strong>no</strong> segundo semestre <strong>de</strong> 1998 e em 2009. As ações<br />
também po<strong>de</strong>m per<strong>de</strong>r valor por condições <strong>de</strong> negócios pobres ou má gestão das empresas, o que<br />
as torna incapazes <strong>de</strong> pagar divi<strong>de</strong>ndos e influencia negativamente <strong>no</strong> seu preço <strong>de</strong> mercado.<br />
No Brasil todos esses riscos são potencializados em virtu<strong>de</strong> da volatilida<strong>de</strong> dos mercados, da<br />
<strong>de</strong>pendência do cenário econômico exter<strong>no</strong> e <strong>de</strong> um ambiente financeiro inter<strong>no</strong> <strong>de</strong>sfavorável, com<br />
altas taxas <strong>de</strong> juros, fazendo com que o mercado a vista <strong>de</strong> ações seja altamente especulativo e<br />
arriscado.<br />
A longo prazo, investir <strong>no</strong> mercado à vista <strong>de</strong> ações po<strong>de</strong> ser um bom negócio, pois, geralmente, os<br />
retor<strong>no</strong>s compensam os riscos. Entre os riscos <strong>de</strong> se investir <strong>no</strong> mercado à vista <strong>de</strong> ações está o<br />
risco <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r uma ação por um valor me<strong>no</strong>r do que aquele que a ação foi comprada. Entretanto,<br />
ao se comprar ações <strong>de</strong> diversas empresas, <strong>de</strong> diversos segmentos <strong>de</strong> mercado, estar-se-ia<br />
minimizando o risco, pois seria improvável que todas as ações per<strong>de</strong>ssem valor ao mesmo tempo.<br />
Em nível internacional, o Brasil sofre influência dos mercados mais <strong>de</strong>senvolvidos, a exemplo dos<br />
Estados Unidos, Europa e Ásia. Historicamente, quando o mercado <strong>de</strong> ações dos Estados Unidos<br />
cai, os mercados da Europa e da Ásia caem me<strong>no</strong>s, ou até mesmo se valorizam. Dessa forma, em<br />
um mercado financeiro cada vez mais interligado, a Bolsa brasileira po<strong>de</strong> até se beneficiar, na<br />
medida em que é influenciada por vários mercados.<br />
No Brasil, o mercado à vista <strong>de</strong> ações conta com recursos tec<strong>no</strong>lógicos <strong>de</strong> ponta, sendo<br />
eficientemente fiscalizado pela Comissão <strong>de</strong> Valores Mobiliários (CVM) e pela própria Bolsa <strong>de</strong><br />
Valores. Os riscos operacionais são quase inexistentes, o que leva confiança e segurança aos<br />
investidores. Acrescente-se ainda que o investidor só incorre em perdas se ele ven<strong>de</strong>r as suas ações,<br />
assim sendo, mesmo com o mercado em queda, se o investidor mantém as suas ações ele continua<br />
com a proprieda<strong>de</strong> do ativo, que po<strong>de</strong>rá voltar a se valorizar.<br />
<strong>Um</strong> dos principais benefícios <strong>de</strong> se investir <strong>no</strong> mercado à vista <strong>de</strong> ações é a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />
obter maiores retor<strong>no</strong>s. Conforme as empresas crescem, o valor das suas ações também aumentam.<br />
Se o investidor escolhe as empresas certas para comprar ações, a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lucro é muito<br />
alta em razão da tendência ser <strong>de</strong> crescimento das empresas, e, por consequência, do mercado à<br />
vista. Outros gran<strong>de</strong>s benefícios são a acessibilida<strong>de</strong> e a liqui<strong>de</strong>z. Existem muitas ações <strong>de</strong> boas<br />
empresas disponíveis <strong>no</strong> mercado, e com o advento do home broker o mercado à vista ficou<br />
acessível a qualquer pessoa.<br />
As ações negociadas <strong>no</strong> mercado à vista também têm maior liqui<strong>de</strong>z do que outros tipos <strong>de</strong><br />
investimentos em ações, po<strong>de</strong>ndo ser facilmente convertidas em dinheiro e realizado o lucro.<br />
A expectativa <strong>de</strong> maiores retor<strong>no</strong>s proporcionada pelas ações nem sempre se confirmam. No<br />
cenário internacional os mercados dos Estados Unidos, Europa e Ásia não conseguem sustentar-se<br />
em alta, haja vista as dificulda<strong>de</strong>s econômicas que esses países enfrentam.<br />
No Brasil a expectativa <strong>de</strong> maiores rentabilida<strong>de</strong>s da Bolsa é prejudicada pelas altas taxas <strong>de</strong> juros,<br />
o que proporciona retor<strong>no</strong>s atraentes ao se investir em renda fixa, como por exemplo, títulos do<br />
gover<strong>no</strong>. Dados do Instituto Assaf Neto (2011) <strong>de</strong>monstram que entre 2001 e 2010 a rentabilida<strong>de</strong><br />
das Notas do Tesouro Nacional (NTN) foi <strong>de</strong> 164%, contra 139% da Bolsa. A diferença a favor dos<br />
títulos do gover<strong>no</strong> é significativa. Nesse cenário, as rentabilida<strong>de</strong>s obtidas por investimentos em<br />
ações po<strong>de</strong>m não compensar, haja vista que o investidor po<strong>de</strong> conseguir melhores resultados em<br />
outros tipos <strong>de</strong> investimento.<br />
Figura 2. Grupos pesquisados e estímulos recebidos.<br />
O instrumento <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> dados foi formado por três seções e treze perguntas. A primeira<br />
seção foi formada por três questões <strong>de</strong> filtro, permitindo consi<strong>de</strong>rar apenas os investidores que<br />
operavam <strong>no</strong> mercado à vista <strong>de</strong> ações por meio <strong>de</strong> home broker. A segunda seção foi<br />
composta por dois pares <strong>de</strong> questões a fim <strong>de</strong> se obter os dados necessários ao teste da<br />
primeira hipótese. Antes da apresentação do estímulo, o entrevistado julgava o benefício e o<br />
risco associado ao mercado <strong>de</strong> ações sem nenhum estímulo. A primeira pergunta indagou<br />
“Em geral, quão benéfico você consi<strong>de</strong>ra o mercado a vista <strong>de</strong> ações?”. O respon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>veria<br />
escolher um ponto entre 1 (nada benéfico) e 10 (muito benéfico). A segunda pergunta era<br />
quase idêntica, trocando apenas a palavra “benéfico” por “arriscado” tanto <strong>no</strong> enunciado<br />
5
como na resposta. A seguir, o estímulo era apresentado. Por fim, o respon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>veria<br />
respon<strong>de</strong>r <strong>no</strong>vamente a outras duas questões, idênticas às formuladas antes da leitura do<br />
estímulo. Os trabalhos <strong>de</strong> Alhakami e Slovic (1994), Finucane et al. (2000), Ganzach (2000),<br />
Slovic e Peters (2006) <strong>de</strong>stacam o uso <strong>de</strong> medidas similares <strong>de</strong> percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong><br />
benefício.<br />
A terceira seção coletou informações sobre ida<strong>de</strong>, gênero e grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações. Para a última informação, apresentou escala,<br />
posteriormente validada, que pedia ao respon<strong>de</strong>nte para avaliar seu conhecimento sobre o<br />
mercado <strong>de</strong> ações, escolhendo um ponto entre 1 e 7 para os pares <strong>de</strong> atributos: fraco – forte,<br />
incompleto – completo, muito baixo – muito alto, insatisfatório – satisfatório.<br />
As hipóteses foram validadas mediante o emprego <strong>de</strong> teste t para média (primeira hipótese) e<br />
regressões logísticas multivariadas para o teste das três hipóteses remanescentes.<br />
Adicionalmente, a análise fatorial foi empregada para a validação da escala grau<br />
autopercebido <strong>de</strong> conhecimento.<br />
4. ANÁLISE DE RESULTADOS<br />
Os resultados dos testes associados à manifestação da heurística afetiva estão apresentados na<br />
Tabela 2. As células em <strong>de</strong>staque representam as situações em que diferenças significativas<br />
foram encontradas. Os resultados <strong>de</strong>stacam uma manifestação significativa da heurística<br />
afetiva na percepção <strong>de</strong> risco e beneficio do grupo 2 (baixo risco) e na percepção do risco do<br />
grupo 4 (baixo benefício). Nestas situações, as diferenças encontradas foram consi<strong>de</strong>radas<br />
significativas, com nível <strong>de</strong> significância ou p-valor inferior a 5%. O resultado permite<br />
aceitar, ainda que parcialmente, a primeira hipótese. A situação com estímulo que salientou o<br />
baixo risco do investimento se mostrou associada a uma me<strong>no</strong>r percepção <strong>de</strong> risco e a uma<br />
maior percepção <strong>de</strong> benefício. Para Finucane et al. (2000), um estado afetivo positivo em<br />
relação a um objeto salienta o seu benefício, e <strong>de</strong> maneira oposta, um estado afetivo negativo<br />
salienta o seu risco.<br />
O grupo 2 foi submetido a estímulo que ressaltou o baixo risco dos investimentos <strong>no</strong> mercado<br />
<strong>de</strong> ações. Conforme já evi<strong>de</strong>nciado <strong>no</strong>s trabalhos <strong>de</strong> Bazerman e Moore (2010), Hallahan,<br />
Faff e Mckenzie (2004), Paixão, Bruni e Carvalho Júnior (2007), Ferreira e Yu (2003),<br />
Bengtsson e Matsumoto et al. (2009), o viés do excesso <strong>de</strong> confiança po<strong>de</strong> acometer os<br />
investidores do mercado <strong>de</strong> ações. Ao receber um estímulo que saliente o baixo risco em se<br />
investir <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> ações, o investidor ten<strong>de</strong>ria a reafirmar a sua posição, tornando-se<br />
ainda mais otimista em relação a esse mercado. Os resultados, ainda que parciais, <strong>de</strong>stacam a<br />
possível influência privilegiada <strong>de</strong> fatores comportamentais em julgamentos <strong>de</strong> investidores.<br />
A Psicologia Econômica <strong>de</strong>staca que tais manifestações comportamentais sobre <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong><br />
natureza econômica atestam e tornam robusta a tese da centralida<strong>de</strong> do componente<br />
emocional <strong>no</strong> processo <strong>de</strong>cisório.<br />
No campo das heurísticas <strong>de</strong> uma forma geral não se po<strong>de</strong> garantir que o indivíduo ao<br />
respon<strong>de</strong>r ao questionário <strong>de</strong> pesquisa pon<strong>de</strong>rou todos os prós e contras em se investir <strong>no</strong><br />
mercado <strong>de</strong> ações após a leitura do texto <strong>de</strong> estímulo. O tempo médio <strong>de</strong> resposta (controlado<br />
por meio da ferramenta eletrônica gerenciadora da aplicação dos questionários) foi <strong>de</strong> apenas<br />
quatro minutos, o que po<strong>de</strong> ser entendido como diminuto para uma avaliação <strong>de</strong>talhada.<br />
Estímulos alinhados à percepção do respon<strong>de</strong>nte sobre os riscos do mercado <strong>de</strong> ações serem<br />
maiores do que os benefícios po<strong>de</strong>riam induzi-lo a manter-se confiante na sua percepção<br />
inicial, relutando em alterá-la em razão do estímulo recebido. A primeira avaliação po<strong>de</strong>,<br />
também, funcionar como um ponto <strong>de</strong> ancoragem. A partir <strong>de</strong>sse ponto o indivíduo faz a sua<br />
6
avaliação seguinte, e quando combinado com o excesso <strong>de</strong> confiança po<strong>de</strong> conduzir o<br />
investidor a manter-se “ancorado” naquela sua primeira avaliação.<br />
Tabela 2.<br />
Resultados dos testes sobre a manifestação da heurística afetiva.<br />
Grupos Média N Desvio<br />
Padrão<br />
Média<br />
Desvio<br />
padrão<br />
t GL<br />
Nível<br />
<strong>de</strong><br />
signi-<br />
ficância<br />
Grupo 1 = Alto risco<br />
Par 1<br />
Risco sem<br />
Risco após<br />
6,03<br />
5,94<br />
32<br />
32<br />
2,335<br />
2,299<br />
0,094 ,689 ,770 31 ,477<br />
Par 2<br />
Benefício sem<br />
Benefício após<br />
7,25<br />
7,28<br />
32<br />
32<br />
2,000<br />
1,888<br />
-,031 ,474 -,373 31 ,712<br />
Grupo 2 = Baixo risco<br />
Par 1<br />
Risco sem<br />
Risco após<br />
7,47<br />
6,39<br />
38<br />
38<br />
1,688<br />
1,779<br />
1,079 1,746 3,810 37 ,001<br />
Par 2<br />
Benefício sem<br />
Benefício após<br />
7,16<br />
7,87<br />
38<br />
38<br />
1,868<br />
1,862<br />
-,711 1,769 -2,476 37 ,018<br />
Grupo 3 = Alto benefício<br />
Par 1<br />
Risco sem<br />
Risco após<br />
7,26<br />
7,36<br />
39<br />
39<br />
2,009<br />
1,967<br />
-,103 ,754 -,850 38 ,401<br />
Par 2<br />
Benefício sem<br />
Benefício após<br />
6,59<br />
6,82<br />
39<br />
39<br />
2,233<br />
2,235<br />
-,231 ,931 -1,548 38 ,130<br />
Grupo 4 = Baixo benefício<br />
Par 1<br />
Risco sem<br />
Risco após<br />
7,29<br />
7,41<br />
34<br />
34<br />
2,082<br />
2,148<br />
,559 1,501 2,170 33 ,037<br />
Par 2<br />
Benefício sem<br />
Benefício após<br />
7,59<br />
7,03<br />
34<br />
34<br />
2,047<br />
2,007 -,118 1,274 -,539 33 ,594<br />
Do processamento da informação em nível mental, conforme sugere Kahneman (2002), po<strong>de</strong>se<br />
inferir que a elaboração cognitiva da informação ocorreria em linha com Fernan<strong>de</strong>z-<br />
Abascal (2010), sobre os afetos, e com Slovic et al. (2002), que abordaram o portfólio <strong>de</strong><br />
imagens mentais. Em razão dos estímulos que foram oferecidos, o processo <strong>de</strong>cisório po<strong>de</strong> ter<br />
sido conduzido por atalhos (afetivos). Conforme propõe Ferreira (2008), modificar um<br />
julgamento pressupõe que o julgamento anterior foi ina<strong>de</strong>quado, e os indivíduos são avessos a<br />
reconhecer que “erraram”. Estaria aí, talvez, um argumento para justificar a não ocorrência da<br />
heurística afetiva <strong>de</strong> forma generalizada em todos os grupos. Em linha com esse<br />
entendimento, O<strong>de</strong>an (1998) cita a aversão ao arrependimento, e Brown e Kagel (2009)<br />
relatam o “Efeito Ostrich”, em que as pessoas evitam informações negativas.<br />
A comparação dos resultados aqui encontrados se torna importante. A heurística manifestouse<br />
em 23,7% dos indivíduos do grupo 2. Finucane et al. (2000) encontraram um percentual <strong>de</strong><br />
manifestação <strong>de</strong> 50%. Ressalte-se, entretanto, que o estudo <strong>de</strong> Finucane et. al (2000) avaliou a<br />
percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício em outro contexto, com amostra <strong>de</strong> perfil bastante<br />
diferenciado. O contexto foi o <strong>de</strong> tec<strong>no</strong>logias (nuclear, conservantes <strong>de</strong> alimentos e gás<br />
natural) e a amostra foi composta por estudantes, que necessariamente não possuem<br />
familiarida<strong>de</strong> (conhecimento) com os objetos em julgamento. Na pesquisa aqui aplicada, o<br />
contexto foi o <strong>de</strong> investimento <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> ações e a amostra foi formada por investidores,<br />
que possuem familiarida<strong>de</strong> (conhecimento) do objeto em julgamento. Nesse ponto vale<br />
resgatar os achados <strong>de</strong> Ganzach (2000). O autor pesquisou a percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício<br />
dos investidores em relação a ativos financeiros que sejam familiares e que não sejam<br />
familiares, concluindo que, para ativos financeiros que são familiares, a percepção <strong>de</strong> risco e<br />
7
<strong>de</strong> benefício se alinha com o mo<strong>de</strong>lo econômico tradicional, correlação positiva <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong><br />
benefício e avaliação <strong>de</strong> risco retor<strong>no</strong> por atributos não globais (percepção dos fatores <strong>de</strong> risco<br />
e dos fatores <strong>de</strong> benefício separadamente). Nesta pesquisa os indivíduos possuíam<br />
familiarida<strong>de</strong> com o mercado <strong>de</strong> ações, sendo todos eles investidores.<br />
Outro fator a ser consi<strong>de</strong>rado estaria na multicausalida<strong>de</strong> do processo <strong>de</strong>cisório. De acordo<br />
com Fishbein e Ajzen (1975), o afeto seria um dos <strong>de</strong>terminantes das <strong>de</strong>cisões, incluindo-se aí<br />
os julgamentos <strong>de</strong> risco e benefício. Assim sendo, existem outras causas que po<strong>de</strong>m ter levado<br />
os indivíduos a modificarem os seus julgamentos iniciais ou mantê-los. Fernan<strong>de</strong>z-Abascal<br />
(2010) falam da valência e do tom dos afetos. A valência po<strong>de</strong> ser positiva ou negativa, e o<br />
tom po<strong>de</strong> ser forte ou fraco. Os estímulos utilizados possuíam claramente uma valência,<br />
evi<strong>de</strong>nciada pelos seus próprios textos, que buscaram aumentar o benefício e reduzir o risco<br />
do mercado <strong>de</strong> ações (valência positiva), ou diminuir o benefício e aumentar o risco (valência<br />
negativa). Quanto ao tom, não se po<strong>de</strong> mensurar, pois para alguns indivíduos esse tom po<strong>de</strong><br />
ter sido fraco, enquanto para outros o tom utilizado po<strong>de</strong> ter sido forte.<br />
A etapa posterior da análise <strong>de</strong> dados buscou investigar quais os possíveis <strong>de</strong>terminantes para<br />
a manifestação da heurística afetiva, consi<strong>de</strong>rando ida<strong>de</strong>, gênero e grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações.<br />
A segunda hipótese (H2) estabeleceu que quanto maior for a ida<strong>de</strong>, maior será a sua<br />
influência na manifestação da heurística afetiva. Feng e Seasholes (2005) e Matsumoto et al.<br />
(2009) apresentam evidências <strong>de</strong> que pessoas <strong>de</strong> maior ida<strong>de</strong> sofrem mais influência <strong>de</strong> vieses<br />
comportamentais, fenôme<strong>no</strong> que seria explicado pelo efeito disposição. Em se tratando da<br />
heurística afetiva, on<strong>de</strong> inexistem pesquisas que investiguem tal relação, assumiu-se<br />
previamente que a relação entre ida<strong>de</strong> e heurística afetiva seguisse a mesma lógica. Esses<br />
resultados, entretanto, não são conclusivos. Outros autores, a exemplo <strong>de</strong> Bogea e Barros<br />
(2008), Borsato, Pimenta e Ribeiro (2009) e Gava e Vieira (2006) não encontraram<br />
significância na análise da variável ida<strong>de</strong>. Ressalte-se, entretanto, que não se po<strong>de</strong> afirmar que<br />
as diversas heurísticas e vieses comportamentais afetam a todos os indivíduos em contextos<br />
diversos <strong>de</strong> maneira linear.<br />
A terceira hipótese (H3) estabeleceu que a heurística afetiva não se manifestaria com a mesma<br />
magnitu<strong>de</strong> em indivíduos <strong>de</strong> gêneros diferentes. Estudos como os apresentados por Bazerman<br />
e Moore (2010), Barber e O<strong>de</strong>an (2001), Barsky et al. (1997), Araújo e Silva (2006),<br />
Hallahan, Faff e Mckenzie (2004) e Paixão, Bruni e Carvalho Júnior (2007) investigaram a<br />
variável gênero em contextos <strong>de</strong> investimentos financeiros. Os resultados costumam indicar<br />
que as mulheres são mais avessas à perda do que os homens, tem me<strong>no</strong>r tolerância ao risco e<br />
apresentam me<strong>no</strong>r nível <strong>de</strong> excesso <strong>de</strong> confiança.<br />
A quarta e última hipótese (H4) estabeleceu que quanto me<strong>no</strong>r for o grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações, maior será a manifestação da heurística afetiva.<br />
Trabalhos como os <strong>de</strong> Fre<strong>de</strong>rick (2005), Jensen (1998) e Fleischhauer et al. (2010) trazem<br />
evidências <strong>de</strong> que pessoas com maior grau <strong>de</strong> conhecimento (cognição) sujeitam-se me<strong>no</strong>s às<br />
manifestações <strong>de</strong> heurísticas. Em outros contextos e com outras abordagens comportamentais,<br />
tem existido certo alinhamento a fim <strong>de</strong> que quanto maior for o grau <strong>de</strong> cognição, me<strong>no</strong>r será<br />
a manifestação <strong>de</strong> fenôme<strong>no</strong>s comportamentais.<br />
A mensuração do grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações foi realizada por<br />
meio da escala adaptada <strong>de</strong> Carvalho Jr. (2009) e formada por quatro pares <strong>de</strong> itens: fraco –<br />
8
forte, incompleto – completo, muito baixo – muito alto, insatisfatório – satisfatório. Para cada<br />
par, o pesquisado <strong>de</strong>veria avaliar o seu grau <strong>de</strong> conhecimento em uma escala <strong>de</strong> 1 a 7 pontos,<br />
sendo 1 o nível mais baixo <strong>de</strong> conhecimento e 7 o nível mais alto. A escala foi validada<br />
conforme os procedimentos apresentados em Netemeyer et al. (2003) e sintetizados na Tabela<br />
3. Após as verificações sobre dimensionalida<strong>de</strong>, confiabilida<strong>de</strong> e convergência, a escala<br />
passou a ser representada pela média das respostas coletadas para os quatro itens.<br />
Tabela 3.<br />
Passos associados à validação da escala grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento.<br />
Etapas e técnicas ou<br />
Regras para a validação Resultados<br />
estatísticas<br />
Dimensionalida<strong>de</strong><br />
.Componentes principais. Apenas um autovalor <strong>de</strong>ve existir na<br />
escala.<br />
Apenas um autovalor na escala<br />
(autovalor igual 3,565, explicando<br />
89,134% da variância).<br />
KMO igual a 0,861, <strong>de</strong>sejável.<br />
.Índice KMO. Maior que 0,7: Desejável.<br />
Me<strong>no</strong>r que 0,5: Inaceitável.<br />
.Teste <strong>de</strong> esfericida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Baixo nível <strong>de</strong> significância. Qui-quadrado igual a 720,619, nível<br />
Bartlett.<br />
Confiabilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> significância igual a 0,000.<br />
Alfa <strong>de</strong> Cronbach.<br />
Convergência<br />
Alfa <strong>de</strong> Cronbach > 0,60. Alfa <strong>de</strong> Cronbach = 0,957.<br />
Coeficiente <strong>de</strong> Pearson. Coeficientes <strong>de</strong> Pearson > 0. Todos os coeficientes <strong>de</strong> Pearson<br />
foram positivos e significativos<br />
O mo<strong>de</strong>lo operacional da pesquisa apresentado na Figura 1 <strong>de</strong>staca que ida<strong>de</strong>, gênero e<br />
conhecimento foram consi<strong>de</strong>rados como variáveis in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> regressão<br />
logística, empregado para tentar explicar a heurística manifestada e percebida <strong>no</strong> grupo 2, em<br />
conformida<strong>de</strong> com os resultados discutidos anteriormente.<br />
Segundo o mo<strong>de</strong>lo, para um estímulo <strong>de</strong> alto risco espera-se a ocorrência da heurística afetiva<br />
se, simultaneamente, a percepção <strong>de</strong> risco aumentar e a percepção <strong>de</strong> benefício diminuir,<br />
valendo a mesma lógica para os outros três cenários. Essas percepções foram coletadas pelas<br />
questões 4 e 5 (sem estímulo) e 6 e 7 (após o estímulo) do questionário.<br />
A variável <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte consi<strong>de</strong>rada criada a partir da análise das diferenças <strong>de</strong> percepções,<br />
resultante da comparação dos pares <strong>de</strong> questões apresentados antes e <strong>de</strong>pois do estímulo.<br />
Apenas para as respostas do grupo 2 se criou uma variável dummy. Respostas que aten<strong>de</strong>ram<br />
ao mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação da variável heurística afetiva (risco me<strong>no</strong>r após estímulo e<br />
benefício maior após estímulo) receberam o código 1 (heurística afetiva manifestada). As<br />
<strong>de</strong>mais respostas receberam código 0 (heurística afetiva não manifestada).<br />
A análise da relação conjunta entre variáveis foi feita com o apoio <strong>de</strong> regressões logísticas,<br />
amparadas pelo seguinte mo<strong>de</strong>lo geral. No mo<strong>de</strong>lo, Y correspon<strong>de</strong> à ocorrência da heurística<br />
afetiva; β0 correspon<strong>de</strong> à constante ou intercepto; β1, β2, β3 correspon<strong>de</strong>m aos coeficientes que<br />
<strong>de</strong>terminam a contribuição <strong>de</strong> cada variável para a ocorrência da heurística afetiva; X1<br />
correspon<strong>de</strong> à ida<strong>de</strong>; X2 correspon<strong>de</strong> ao gênero e X3 correspon<strong>de</strong> ao grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações e εi correspon<strong>de</strong> ao erro aleatório.<br />
Y = β0 + β1X1 + β2X2 + β3X3 + εi Equação 01.<br />
9
Os resultados dos testes estão apresentados na Tabela 3. As células <strong>de</strong>stacadas indicam a<br />
presença <strong>de</strong> resultados significativos. Os resultados indicam que as variáveis ida<strong>de</strong> e gênero<br />
não apresentaram associação significativa, com níveis <strong>de</strong> significância ou p-valores superiores<br />
a 5%. Contudo, foi possível perceber uma associação significativa e negativa em relação ao<br />
grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento. O sinal negativo encontrado indica que quanto maior o<br />
nível <strong>de</strong> autoconhecimento percebido, me<strong>no</strong>r será a manifestação da heurística afetiva.<br />
Indivíduos que apresentaram me<strong>no</strong>r conhecimento do mercado estão mais sujeitos à<br />
manifestação da heurística afetiva.<br />
Tabela 3.<br />
Resultados dos testes <strong>de</strong> possíveis explicações para a manifestação da heurística afetiva.<br />
Cox &<br />
-2 Log Snell<br />
B S.E. Wald df Sig. Exp(B) likelihood R 2<br />
Nagelkerke<br />
R 2<br />
Mo<strong>de</strong>lo: y = β0 + β1X1 + εi<br />
Ida<strong>de</strong> -,069 ,049 1,955 1 ,162 ,933 39,311 ,059 ,088<br />
Constante 1,130 1,624 ,485 1 ,486 3,097<br />
Mo<strong>de</strong>lo: y = β0 + β1X1 + β2X2 + εi<br />
Ida<strong>de</strong> -,068 ,050 1,825 1 ,177 ,934 38,785 ,071 ,107<br />
Gênero -1,090 1,477 ,545 1 ,460 ,336<br />
Constante 2,107 2,108 1,000 1 ,317 8,224<br />
Mo<strong>de</strong>lo: y = β0 + β1X1 + β2X2 + β3X3 + εi<br />
Ida<strong>de</strong> -,115 ,068 2,906 1 ,088 ,891 32,058 ,222 ,334<br />
Gênero -,891 1,574 ,320 1 ,571 ,410<br />
Conhecimento -,939 ,406 5,347 1 ,021 ,391<br />
Constante 7,326 3,500 4,382 1 ,036 1519,159<br />
Quanto às <strong>de</strong>terminantes da manifestação da heurística afetiva, para esta pesquisa, observouse<br />
influência significativa <strong>no</strong> grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações,<br />
resultado que se alinha aos apresentados por Ganzach (2000) e associados à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
familiarida<strong>de</strong>. O conhecimento parece exercer influência central na manifestação <strong>de</strong> vieses<br />
comportamentais. No campo das heurísticas afetivas essa influência alinha-se com outros<br />
achados <strong>de</strong> pesquisas <strong>de</strong>senvolvidas em outros contextos, com outros vieses. As variáveis<br />
ida<strong>de</strong> e gênero não exerceram influência significativa, sugerindo que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />
ida<strong>de</strong> ou do gênero, se o indivíduo possui me<strong>no</strong>r grau <strong>de</strong> conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações,<br />
mais sujeito à manifestação da heurística afetiva ele estará.<br />
Hipótese Resultado<br />
dos testes<br />
H11: Estímulo que saliente baixo benefício do investimento <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ia um estado afetivo negativo<br />
levando ao aumento da percepção <strong>de</strong> risco e diminuição da percepção <strong>de</strong> benefício.<br />
Rejeitada<br />
H12: Estímulo que saliente baixo risco do investimento <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ia um estado afetivo positivo<br />
levando à diminuição da percepção <strong>de</strong> risco e ao aumento da percepção <strong>de</strong> benefício.<br />
Aceita<br />
H13: Estímulo que saliente alto benefício do investimento <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ia um estado afetivo positivo<br />
levando à diminuição da percepção <strong>de</strong> risco e ao aumento da percepção <strong>de</strong> benefício.<br />
Rejeitada<br />
H14: Estímulo que saliente alto risco do investimento <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ia um estado afetivo negativo<br />
levando ao aumento da percepção <strong>de</strong> risco e diminuição da percepção <strong>de</strong> benefício.<br />
Rejeitada<br />
H2: Quanto maior for a ida<strong>de</strong> maior será o efeito da influência <strong>de</strong> fatores afetivos em <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong><br />
investimentos em ações.<br />
Rejeitada<br />
H3: A influência <strong>de</strong> fatores afetivos em <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> investimentos em ações não se manifesta na<br />
Rejeitada<br />
mesma magnitu<strong>de</strong> entre gêneros.<br />
H4: Quanto maior for o grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do mercado <strong>de</strong> ações me<strong>no</strong>r será a<br />
influência <strong>de</strong> fatores afetivos em <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> investimentos em ações<br />
Figura 3. Síntese dos testes <strong>de</strong> hipóteses.<br />
Aceita<br />
10
A Figura 3 traz uma síntese dos testes <strong>de</strong> hipóteses. A hipótese H1 foi <strong>de</strong>composta em quatro<br />
sub-hipóteses, por meio das quais se buscou investigar a manifestação da heurística afetiva.<br />
Consi<strong>de</strong>ra-se evi<strong>de</strong>nciada a manifestação da heurística, conforme Finucane et al. (2000), se<br />
ocorrer modificação significativa na percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício simultaneamente.<br />
Dessa forma, a sub-hipótese H11 testou se um estímulo que salienta o baixo benefício do<br />
investimento conduz a modificação significativa <strong>de</strong> percepção do risco e do benefício,<br />
aumentando a percepção <strong>de</strong> risco e diminuindo a percepção <strong>de</strong> benefício. A sub-hipótese H12<br />
testou o estímulo <strong>de</strong> baixo risco, a sub-hipótese H13 testou o estímulo <strong>de</strong> alto benefício e a subhipótese<br />
H14 testou o estímulo <strong>de</strong> alto risco. Observou-se modificação significativa na<br />
percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício na sub-hipótese H12.<br />
As hipóteses H2, H3 e H4 buscaram testar a significância das variáveis ida<strong>de</strong>, gênero e grau<br />
autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do mercado, respectivamente. Encontrou-se explicação para a<br />
manifestação da heurística afetiva do grupo 2 na variável grau autopercebido <strong>de</strong><br />
conhecimento, sugerindo que, quanto me<strong>no</strong>r for o grau autopercebido <strong>de</strong> conhecimento do<br />
mercado maior será a manifestação da heurística afetuiva.<br />
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />
Os resultados <strong>de</strong>ste trabalho evi<strong>de</strong>nciaram a manifestação <strong>de</strong> heurísticas afetivas em uma<br />
amostra <strong>de</strong> investidores em ações. Estímulo que salientou o baixo risco do mercado foi<br />
acompanhado por meio da mudança <strong>de</strong> percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício. Tal manifestação <strong>de</strong><br />
heurística po<strong>de</strong>ria ser explicada por meio do conhecimento autopercebido do mercado <strong>de</strong><br />
ações.<br />
Estudos anteriores já haviam evi<strong>de</strong>nciado que as pessoas buscam informações que confirmem<br />
as suas crenças (efeito isolamento), e os investidores estão sempre em busca <strong>de</strong> informações<br />
que confirmem as suas crenças <strong>de</strong> que o mercado vai subir, caso contrário não estariam<br />
aplicando seu dinheiro nesse mercado. Dessa forma, ao se <strong>de</strong>pararem com uma informação<br />
que confirma o que eles acreditam, tornam-se ainda mais otimistas, aumentando a sua<br />
percepção <strong>de</strong> benefício e diminuindo a sua percepção <strong>de</strong> risco.<br />
Outro ponto importante faz referência ao excesso <strong>de</strong> confiança. O estímulo <strong>de</strong> baixo risco<br />
po<strong>de</strong> elevar a confiança <strong>de</strong> que o investimento em ações seria, <strong>de</strong> fato, benéfico, contribuindo<br />
para o aumento do julgamento do benefício e para a redução do risco. Indivíduos possuiriam<br />
aversão ao arrependimento. Isso se traduziria em reconhecer que errou, o que levaria a<br />
arrepen<strong>de</strong>r-se da primeira avaliação e alterar a sua percepção em uma segunda avaliação. Em<br />
investidores tal viés po<strong>de</strong>ria conduzir a resultados que “mascarassem” a real manifestação da<br />
heurística afetiva, pois, mesmo sentindo-se influenciado pelo estímulo, o investidor ten<strong>de</strong>ria a<br />
manter o seu julgamento inicial.<br />
Investidores do mercado <strong>de</strong> ações são, por natureza, otimistas. O efeito “ostrich”, em síntese,<br />
sugere que os indivíduos evitam informações negativas, e ao analisar-se esse efeito em<br />
conjunto com o excesso <strong>de</strong> confiança, a perseverança e o isolamento, po<strong>de</strong>-se concluir que os<br />
investidores ten<strong>de</strong>rão a manter os seus julgamentos iniciais, principalmente se possuírem um<br />
alto grau <strong>de</strong> conhecimento do mercado.<br />
Em mercados mais evoluídos, em que os indivíduos possuem um grau <strong>de</strong> conhecimento<br />
maior, ten<strong>de</strong>-se a observar um nível <strong>de</strong> racionalida<strong>de</strong> mais acentuado, me<strong>no</strong>res oscilações e<br />
me<strong>no</strong>res efeitos comportamentais, como, por exemplo, o efeito manada.<br />
11
As <strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong>ssa pesquisa contribuem para a compreensão <strong>de</strong> alguns aspectos<br />
comportamentais dos investidores ainda pouco conhecidos e estudados. Sabe-se, por exemplo,<br />
que investidores sujeitam-se a heurísticas e vieses comportamentais, entretanto, a dimensão da<br />
influência <strong>de</strong> fatores afetivos ainda carece <strong>de</strong> maiores estudos. A pesquisa evi<strong>de</strong>ncia que o<br />
aspecto afetivo exerce, ainda que em parte, influência significativa na percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong><br />
benefício do investidor.<br />
Outro achado <strong>de</strong> pesquisa que merece ser <strong>de</strong>stacado é a variável que influencia<br />
significativamente na manifestação da heurística. O conhecimento (cognição) foi o<br />
<strong>de</strong>terminante para a manifestação da heurística afetiva, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da ida<strong>de</strong> ou do<br />
gênero. Com relação à ida<strong>de</strong>, por exemplo, o fato <strong>de</strong> um indivíduo ser mais jovem do que<br />
outro não significa que estará mais sujeito a vieses afetivos em seus julgamentos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
ele possua mais conhecimento do que o indivíduo mais velho.<br />
Todas essas reflexões conduzem a uma conclusão geral: aspectos afetivos influenciam na<br />
percepção <strong>de</strong> risco e <strong>de</strong> benefício do investidor, e quanto mais conhecimento o indivíduo<br />
possuir, me<strong>no</strong>s sujeito estará a vieses comportamentais, aqui particularizados por meio das<br />
heurísticas afetivas.<br />
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