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Formalismo Russo - aeflup.com

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MELI II – F ilom en a Vas c on ce los<br />

Na época positivista o conceito de literatura era simplista incluindo em si apenas todas<br />

as obras que representassem a civilização de qualquer época e de qualquer povo, quer<br />

possuíssem elementos de ordem estética ou não.<br />

No século XX, o formalismo russo, o new criticism e a estilística representaram a<br />

reação contra o conceito positivista de história literária. Estes movimentos reconhecem a<br />

necessidade urgente, metodologicamente prioritária, de estabelecer <strong>com</strong> rigor um conceito de<br />

literatura enquanto fenómeno estético específico. Estes movimentos advogam o princípio de<br />

que os textos literários possuem características estruturais peculiares que os diferenciam<br />

inequivocamente dos textos não-literários, daí procedendo a viabilidade e a legitimidade de<br />

uma definição referencial de literatura. À especificidade da literatura correspondem os<br />

métodos e os processos de análise dos textos literários. Para designar essa especificidade<br />

Jakobson criou o vocábulo «literariedade»: «Assim, o objeto da ciência da literatura não é a<br />

literatura, mas a literariedade, isto é, o que faz de uma determinada obra uma obra literária.»<br />

O facto de as universidades deixarem de ser elitizadas fez <strong>com</strong> que, no século XX, o estudo<br />

da Teoria da Literatura de propagasse. Mas os fundamentos para o estudo da obra literária<br />

não foram entendidos do mesmo modo, originando, já na primeira metade do século XX,<br />

diferentes linhas:<br />

Uma tendência optou por um foco formalista, valorizando a construção da obra<br />

literária e descrevendo as características de cada género. O <strong>Formalismo</strong> associa-se<br />

fortemente ao grupo de pesquisadores que atuou nas primeiras décadas no século XX<br />

na Rússia, entre Moscou e São Petersburgo, destacando-se entre eles Roman<br />

Jakobson, Vitor Chklovski e Tynianov;<br />

Na década de 1930 contou-se entre os seus sucessores o Estruturalismo Checo,<br />

associado, de uma parte, à Estética, <strong>com</strong>o se constata na obra de Mukarovski, e de<br />

outro lado, à Linguística, ciência igualmente em expansão no período.<br />

Em língua inglesa, as preocupações formalista estavam em voga, tomando o nome de<br />

New Criticism, contando-se, entre os seus expoentes, I.A. Richards e Cleanth Brooks<br />

nos Estados Unidos.<br />

<strong>Formalismo</strong> <strong>Russo</strong><br />

Princípios fundamentais da teoria da <strong>com</strong>unicação e da teoria literária moderna: as<br />

palavras não podem identificar-se <strong>com</strong> as coisas que significam. A língua é um expediente<br />

necessário, <strong>com</strong> possibilidade limitadas para exprimir a grande diversidade e variabilidade<br />

das experiencias humanas;<br />

Os formalistas russos, <strong>com</strong> uma atividade limitada ao período de 1914 a 1930, não<br />

consideravam a literatura <strong>com</strong>o objeto da ciência literária e sim a «literariedade», que<br />

Jakobson define <strong>com</strong>o aquilo que faz de uma dada obra uma obra literária. Embora outras<br />

declarações de Jakobson atribuam, em princípio, ao leitor o papel de decidir se um texto<br />

deve ser considerado literário, as suas investigações – e as e outros formalistas russos –<br />

concentram-se, em primeiro lugar, sobre os elementos textuais, sobre as relações mútuas<br />

destes últimos e sobre a função que desempenham no conjunto do texto. É talvez neste<br />

ponto que reside um dos grandes méritos dos formalistas. Desenvolveram métodos para<br />

distinguir os elementos textuais e a sua função. Analisaram os elementos constitutivos dos<br />

textos literários.<br />

1


O início da elaboração de uma metalinguagem para a ciência da literatura foi talvez a<br />

contribuição essencial dos formalistas.<br />

Os formalistas dedicaram-se sobretudo à análise dos textos e em menor grau à elaboração<br />

de uma teoria coerente.<br />

Primeira fase do formalismo (1914-1925) – o texto literário era considerado um dado<br />

independente da posição do leitor e isolado do contexto da história literária de que fazia<br />

parte. Esta fase, a que se chama, <strong>com</strong> propriedade, formalista, apresenta muitos pontos de<br />

contacto <strong>com</strong> o New Criticism.<br />

Segunda fase do formalismo (1925-1930) – apresenta um carácter diferente. A conceção<br />

que fora lançada, mas não desenvolvida, por Chklovski – segundo a qual um texto pode ser<br />

criado <strong>com</strong>o não literário e apreendido <strong>com</strong>o literário, e inversamente – é retomada por<br />

Tynianov, que a especifica nos seus artigos relativos à história literária. Tynianov rejeita a<br />

possibilidade de definir de uma forma abstrata o conceito de literatura: «A existência de<br />

um facto literário depende da sua qualidade diferencial (ou seja, da sua correlação <strong>com</strong> a<br />

série literária ou <strong>com</strong> uma série extraliterária), ou, por outras palavras, da sua função.» A<br />

distinção entre forma e função que já se realizara ao nível da análise textual aplica-se, a<br />

partir daí, à forma total do texto e à sua função num vasto contexto cultural, literário e<br />

histórico.<br />

Chklovski incorporou os conceitos de procedimento e de estranhamento. O primeiro<br />

corresponde às estratégias e técnicas empregues pelo artista ao constituir a sua obra; o<br />

segundo corresponde ao efeito que ele deseja alcançar junto do destinatário e do público<br />

em geral.<br />

Chklovski é ambíguo nas suas análises e estudos críticos. Por vezes parece dar importância<br />

ao modo <strong>com</strong>o o leitor apreende um texto e demonstra que um texto pode ser criado<br />

<strong>com</strong>o não literário e apreendido <strong>com</strong>o literário, ou, pelo contrário, criado <strong>com</strong>o literário e<br />

apreendido <strong>com</strong>o não literário. Outras vezes quase não dá importância à posição do leitor,<br />

parecendo considerar o texto <strong>com</strong>o uma unidade autónoma, independente da perceção do<br />

leitor.<br />

Formalistas russos <strong>com</strong>partilharam estudos sobre a linguagem poética, sobre o ritmo na poesia<br />

e sobre a narrativa.<br />

Roman Jakobson voltou-se sobretudo para questões linguísticas;<br />

Eikhenbaum pesquisou sobretudo a forma romanesca;<br />

Tynianov, cujas teses versaram sobre a evolução literária e o papel da paródia.<br />

Para os formalistas, uma obra artística caracteriza-se por um serie de procedimentos<br />

destinados a provocar um efeito sobre o seu destinatário. Esses procedimentos serão tanto<br />

mais efetivos quanto mais singulares e originais, gerando uma sensação de estranhamento no<br />

público.<br />

O emissor e a poética formalista<br />

Toda a teoria formalista da literatura tende a abolir o pólo da <strong>com</strong>unicação literária<br />

constituído pelo emissor, em nome da autonomia e da autotelecidade do texto literário e,<br />

consequentemente, em nome da análise estritamente imanente que este texto, obviamente<br />

requer.<br />

O formalismo russo, ao definir a literariedade mediante a função poética da linguagem<br />

e ao colocar no centro das suas preocupações metodológicas a análise descritiva e sincrónica<br />

dos textos literários, desvaloriza logicamente o emissor/autor. A atitude autobiografista do<br />

formalismo russo não resulta de uma simples relação polémica <strong>com</strong> a história literária<br />

positivista e académica, mas de uma conceção radicalmente anti-romântica do fenómeno da<br />

produção literária. Para os formalistas russos, a literatura é convenção, artifício,<br />

2


“procedimento” técnico-formal e semântico e não efusão confessional, imagem ou tradução<br />

de uma vivência, <strong>com</strong>o se entre a realidade psíquica e a ficção poética existisse um nexo de<br />

causalidade mecânica. Tynianov formula em termos explícitos uma poética antibiografista: não<br />

é a vida real que se projeta na literatura, mas, inversamente, a literatura que se expande na<br />

vida, em conformidade <strong>com</strong> as normas linguísticas e estilísticas dominantes num dado sistema<br />

literário.<br />

No âmbito da teoria estética do CLP (Círculo Linguístico de Praga), encontra-se nalguns<br />

estudos de Mukarovský uma sistemática desvalorização do autor, não só do autor considerado<br />

enquanto consciência subjetiva, mas também do próprio considerado enquanto produtor da<br />

obra.<br />

A tendência formalista para desvalorizar, e mesmo para anular, a função do<br />

autor/emissor está exemplarmente consubstanciada num dos textos mais famosos e mais<br />

influentes da poética do new criticism – “The intencional fallacy” de W. K. Wimsatt e C. M.<br />

Beardsley. Por “intenção” Wimssat e Beardsley entendem o desígnio ou o plano da obra<br />

literária existentes no espírito do autor - «Intention has obvious affinities of the author’s<br />

attitude toward his work, the way he felt, what made him write» - e por “falácia da intenção”,<br />

designam o erro lógico e metodológico que consiste em interpretar e julgar um poema,<br />

concebido lato sensu <strong>com</strong>o equivalente a obra literária, <strong>com</strong>o fundamento na intenção do<br />

autor. Em conformidade <strong>com</strong> esta perspetiva anti-intencionalista, a análise de um texto<br />

literário deve ser alheia a problemas de ordem genética, de natureza histórica ou biográficopsicologista,<br />

à atitude do autor em relação à sua obra, aos motivos que o levaram a escrever<br />

ou a quaisquer outros fatores similares.<br />

TEORIA DO MÉTODO FORMAL – EIKHENBAUM<br />

Para Eikhenbaum o «método formal» é o resultado do esforço para a criação de uma<br />

ciência autónoma e concreta. Para os formalistas o essencial é a literatura enquanto do objeto<br />

de estudos.<br />

Portanto, os formalistas não falam de «métodos» mas sim de alguns princípios teóricos<br />

que surgem ao estudar uma matéria concreta e das suas particularidades. Contudo, ao longo<br />

dos anos mal entendidos surgiram relativamente a esses princípios, e Eikhenbaum propõem-se<br />

a mostrar a evolução do trabalho dos formalistas desde o <strong>com</strong>eço.<br />

Muitos transformaram o método formal num formalismo imóvel, todavia o trabalho<br />

científico deles baseia-se no apreciar da obra <strong>com</strong>o uma hipótese de trabalho. Eles não se<br />

ocupam <strong>com</strong> definições nem <strong>com</strong> teorias gerais, apenas estabelecem princípios concretos de<br />

modo a que possam ser aplicados numa matéria e se a matéria exigir uma modificação dos<br />

princípios, eles alteram-nos.<br />

Ao evoluir o seu método de estudo, o método formal ultrapassou os limites da<br />

metodologia e transformou-se numa ciência autónoma que tem <strong>com</strong>o objeto a literatura.<br />

O que o carateriza não é:<br />

Nem o «formalismo» enquanto teoria estética;<br />

Nem uma «metodologia» que represente um sistema científico definido.<br />

Eles desejam:<br />

Criar uma ciência literária autónoma a partir das qualidades intrínsecas da<br />

matéria literária.<br />

A sua finalidade é a consciência teórica dos factos que dependem da arte<br />

literária <strong>com</strong>o tal.<br />

3


I<br />

Nos trabalhos dos formalistas sobressaíam certos princípios que contradiziam as<br />

tradições e os axiomas, à primeira vista estáveis, da ciência literária e da estética me geral. As<br />

noções e os princípios elaborados pelos formalistas visavam a teoria geral da arte.<br />

A crise da estética filosófica e a viragem brusca que se observou na arte, leva ao<br />

renascer da poética (que se encontrava fora de uso), e esta viragem escolhe a poesia <strong>com</strong>o<br />

terreno de eleição na Rússia.<br />

Quando os formalistas surgiram, tiveram a necessidade de lutar contra a ciência<br />

académica, que ignorava os problemas teóricos e usava os velhos axiomas, perdendo a noção<br />

do seu objeto de estudo.<br />

A autoridade e a influência já não pertenciam à ciência académica, mas a uma ciência<br />

jornalística, pertencente aos trabalhos dos críticos e dos teóricos do simbolismo. Esta ciência<br />

jornalística estava fundada sobre princípios e formulas teóricas apoiadas pelas correntes<br />

artísticas em voga.<br />

Os formalistas entraram em conflito <strong>com</strong> estes simbolistas, tentando libertar a poética<br />

das teorias do subjetivismo estético e filosófico para introduzirem o estudo científico dos<br />

factos.<br />

Os formalistas pretendiam libertar a palavra poética da filosofia e da religião:<br />

Recusa de premissas filosóficas;<br />

Recusa de interpretações filosóficas e estéticas.<br />

Era necessário que se ocupassem dos factos e se afastassem dos sistemas e dos<br />

problemas gerais. Esta ciência literária queria ser concreta.<br />

II<br />

Formalistas apresentavam <strong>com</strong>o fundamental que o objeto da ciência literária devia<br />

ser o estudo das particularidades específicas dos objetos literários que os distinguem de<br />

qualquer outra matéria, e esta matéria poderá ser usada noutras ciências <strong>com</strong>o objeto auxiliar.<br />

Cita Jakobson: «O objeto da ciência literária não é a literatura, mas a “literariedade”,<br />

isto é, o que faz de uma determinada obra uma obra literária.» Jakobson diz ainda que havia<br />

disciplinas grosseiras (história da filosofia, história da cultura, psicologia, etc.) que se diziam<br />

literatura, mas que no fundo apenas se serviam de factos literários para escrevem sobre tudo:<br />

vida pessoal, psicologia, política, filosofia, etc.<br />

A dita «literariedade» alcançava-se através do estudo de várias obras, a partir das<br />

quais era possível fazer generalizações.<br />

Os formalistas orientavam os seus estudos na direção da linguística, pois esta<br />

apresentava-se <strong>com</strong>o uma ciência que se cruzava <strong>com</strong> a poética na matéria do seu estudo.<br />

Confronto entre:<br />

Língua poética Língua quotidiana<br />

Victor Chklovski demonstrou, exemplificando, que «as pessoas usam, por vezes,<br />

palavras sem se referirem ao seu sentido». Um poeta que use uma palavra transracional<br />

demonstra que não <strong>com</strong>preendeu o sentido dos seus versos, acrescenta Chklovski.<br />

Estas observações levaram os formalistas a concluir que a língua poética não é<br />

unicamente uma língua das imagens e que os sons têm em si mesmos uma significação<br />

autónoma; ao contrário dos simbolistas, que interpretavam os sons quer <strong>com</strong>o onomatopeias,<br />

quer <strong>com</strong>o aliterações (aliteração: repetição das mesmas letras, sílabas ou sons, na mesma frase, para produzir<br />

um efeito de harmonia).<br />

4


III<br />

O trabalho dos formalistas estreou-se <strong>com</strong> o estudo do problema dos sons no verso.<br />

Teses mais tarde reveladas:<br />

Distinção entre os sistemas de língua poética e língua prosaica;<br />

Conceção da poesia <strong>com</strong>o um pensamento por imagens (poesia=imagem), não<br />

correspondia aos factos observados e aos princípios gerais delineados; ou seja,<br />

o ritmo, os sons e a sintaxe tinham uma importância secundária.<br />

Os formalistas libertaram-se da correlação forma/fundo e da noção de forma <strong>com</strong>o um<br />

envelope; a forma passa a ser uma integridade dinâmica e concreta que tem um conteúdo em<br />

si mesma, fora de toda a correlação.<br />

Era preciso mostrar que a sensação de forma surgia <strong>com</strong>o resultado de certos<br />

processos artísticos destinados a no-la fazerem sentir. Chklovski afirma que numa mesma<br />

época as imagens são quase invariáveis, isto é, os poetas retiram as imagens dadas por outros<br />

poetas, havendo uma acumulação de processos de elaboração de material verbal, havendo<br />

uma disposição deste material e não uma criação.<br />

Chklovski distingue imagem poética de imagem prosaica:<br />

Imagem poética: é um dos meios da língua poética, é um processo tal <strong>com</strong>o<br />

paralelismos, <strong>com</strong>parações, repetições, etc. A noção de imagem entrava no<br />

sistema geral dos processos poéticos e perdia o seu papel dominante na teoria<br />

geral das figuras.<br />

Chklovski avançou <strong>com</strong> o termo “estranhamento” ou “processo de singularização”, isto<br />

é, quanto mais difícil for a <strong>com</strong>preensão da forma, maior será a duração da perceção. Então,<br />

para Chkovski, o estranhamento seria o efeito criado pela obra de arte literária para nos<br />

distanciar em relação ao modo <strong>com</strong>um <strong>com</strong> apreendemos o mundo e a própria arte, o que nos<br />

permitiria entrar numa dimensão nova, só visível pelo olhar estético ou artístico.<br />

A partir dos artigos citados, Eikhenbaum diz que os principais esforços dos formalistas<br />

não incidiam sobre o estudo da «forma» nem na construção de um método particular, mas sim<br />

que visavam fundar a tese segundo a qual se deve estudar os traços específicos da arte<br />

literária.<br />

Os formalistas consideravam importante alterar o sentido à palavra «forma» e<br />

«fundo», termos confusos e pouco científicos.<br />

IV<br />

Pontos que têm uma importância teórica que ultrapassa o âmbito dos problemas<br />

relativos ao assunto e que deixaram traços na evolução ulterior do método formal:<br />

1º Afirma-se a existência de processos próprios à <strong>com</strong>posição do assunto<br />

O assunto deixa de ser a <strong>com</strong>binação de uma série de motivos (elemento temático) e<br />

passa a ser um dos elementos de elaboração.<br />

Nova noção de assunto;<br />

A noção de forma ganha novos traços e <strong>com</strong>eçava a perder o seu caráter<br />

abstrato.<br />

2º Analogia entre processos de <strong>com</strong>posição e do assunto e os processos estilísticos.<br />

Chklovski não utiliza a ligação geral da literatura <strong>com</strong> a vida real para explicar as<br />

particularidades do facto literário. A génese explica a origem e nada mais, enquanto o que<br />

importa para a poética é a <strong>com</strong>preensão da função literária.<br />

5


V<br />

Diferença entre assunto e fábula (apresentado por Chklovski):<br />

Fábula: descrição dos acontecimentos; é o material que serve para a formação do<br />

assunto<br />

Noção de assunto Noção de fábula<br />

Construção Material<br />

VI<br />

Não existia uma teoria do verso (nem sobre o ritmo poético, nem sobre a ligação<br />

ritmo/sintaxe, etc.), ou seja, o problema do verso continuava obscuro.<br />

Este capítulo trata do problema do verso.<br />

VII<br />

Continuação do tema do verso, <strong>com</strong> citações de Jakobson e Tynianov.<br />

Graças a Tynianov, o método formal revelou-se capaz de tratar novos problemas e a<br />

evoluir. Tornou-se evidente para os formalistas que o seu trabalho consistia num estudo das<br />

particularidades intrínsecas da arte literária, e não no estabelecimento de um «método<br />

formal» imutável, deram-se conta de que se tratava do objeto do estudo e não do seu método.<br />

Tynianov: «Cada obra de arte representa uma interação <strong>com</strong>plexa de numerosos<br />

fatores; em consequência, a finalidade do estudo é definir o seu caráter específico desta<br />

interação.»<br />

VIII<br />

Chklovski indicava que a literatura progride segundo uma linha entrecortada: «Cada<br />

época literária contém não uma, mas várias escolas literárias. Elas existem simultaneamente<br />

na literatura, e uma delas toma a chefia e fica canonizada. As outras existem <strong>com</strong>o não<br />

canonizadas, escondidas. (…) Cada nova escola literária representa uma revolução, um<br />

fenómeno que se assemelha ao surgimento de uma nova classe social. Mas, evidentemente,<br />

não é senão uma analogia. O ramo vencido não é aniquilado, não deixa de existir. Abandona<br />

somente o topo, é relegado para um plano de espera, mas pode ressurgir de novo <strong>com</strong>o um<br />

pretendente eterno ao topo.<br />

IX<br />

Os formalistas dizem que não introduzem nos seus estudos os problemas de biografia<br />

nem de psicologia da criação, porque defendem que estes problemas, que são muito<br />

importantes e muito <strong>com</strong>plexos, devem ter o seu lugar noutras ciências. Importa-lhes<br />

encontrar na evolução os traços das leis históricas; é por isso que deixamos de lado tudo o<br />

que, deste ponto de vista, aparece <strong>com</strong>o ocasional e não se refere à história. Interessam-se<br />

pelo próprio processo da evolução, pela dinâmica das formas literárias, na medida em que as<br />

podem observar sobre os factos do passado. Para eles, o problema central da história literária<br />

é o problema da evolução fora da personalidade, o estudo da literatura enquanto fenómeno<br />

social original. Neste sentido, dispensam uma importância extraordinária à questão da<br />

formação dos géneros e da sua substituição; por conseguinte, a literatura de segunda ordem, a<br />

literatura de massas, toma também o seu valor, visto que participa neste processo. O que<br />

importa é distinguir a literatura de massas que prepara a formação de novos géneros daquela<br />

que aparece no processo da sua desagregação e que representa uma matéria possível para o<br />

estudo da inércia histórica.<br />

Por outro lado, não se interessam pelo passado enquanto passado, enquanto facto<br />

histórico individual, eles não se ocupam da simples restauração de uma ou outra época que<br />

lhes agradou por alguma razão. A história oferece-lhes o que a atualidade não pode oferecer: o<br />

6


acabamento do material. É por isso que eles o abordam <strong>com</strong> uma certa bagagem de princípios<br />

e problemas teóricos que são sugeridos em parte pelos factos da literatura contemporânea.<br />

Balanço geral:<br />

A Opoiaz realizou o próprio modelo do trabalho coletivo. As razões disso são<br />

evidentes: desde o início que <strong>com</strong>preenderam o seu trabalho <strong>com</strong>o um trabalho histórico, e<br />

não <strong>com</strong>o um pessoal de cada um deles. Foi nisso que consistiu o seu contacto essencial <strong>com</strong> a<br />

época. A ciência evolui e eles evoluem <strong>com</strong> ela.<br />

Eikenbhaum indica os principais momentos da evolução do método formal:<br />

«1. Tendo partido da oposição inicial e sumária da língua poética à língua quotidiana,<br />

chegámos à diferenciação, seguindo as suas diferentes funções, da noção de língua quotidiana<br />

e à delimitação dos métodos da língua poética e da língua emocional. Em ligação <strong>com</strong> esta<br />

evolução, interessámo-nos pelo estudo do discurso oratório, que nos parece o mais próximo<br />

da literatura na linguagem quotidiana, mas que tem, contudo, funções diferentes, e<br />

<strong>com</strong>eçámos a falar da necessidade de uma retórica que renasce a par da poética.<br />

2. Tendo partido da noção geral de forma na sua nova aceção, chegámos à noção de<br />

processos, e através dela à noção de fundo.<br />

3. Tendo partido do ritmo poético oposto ao metro e da noção de ritmo <strong>com</strong>o fator<br />

construtivo do verso na sua unidade, chegámos à conceção dos versos <strong>com</strong>o uma forma<br />

particular do discurso <strong>com</strong> as suas próprias qualidades linguísticas (sintáticas, lexicais e<br />

semânticas).<br />

4. Tendo partido da noção de assunto <strong>com</strong>o construção, chegámos à noção de material <strong>com</strong>o<br />

motivação, e, assim, acabámos por conceber o material <strong>com</strong>o um elemento que participa da<br />

construção, ao mesmo tempo que depende da dominante construtiva.<br />

5. Tendo partido do estabelecimento da identidade do processo sobre materiais diferentes e<br />

da diferenciação do processo segundo as suas funções, chegámos à questão da evolução das<br />

formas, isto é, aos problemas do estudo da história literária.»<br />

NOÇÃO DE CONSTRUÇÃO - TYNIANOV<br />

Estudo da arte literária:<br />

Duas espécies de dificuldades<br />

1ª Dificuldade: aquelas que se<br />

prendem ao seu material (a palavra, o<br />

vocábulo)<br />

Analisamos a palavra segundo a nossa<br />

consciência prática, e fazemos o<br />

estudo literário apoiando-nos nas<br />

relações que extraímos à vida prática,<br />

o que neste estudo é errado fazer.<br />

Esquecemos o carácter polissémico<br />

do material.<br />

A noção de «material» não<br />

transborda os limites da forma, o<br />

material é igualmente formal; e é um<br />

erro confundi-lo <strong>com</strong> elementos<br />

exteriores à construção.<br />

2ª Dificuldade: aquelas que se ligam ao princípio de construção da arte<br />

literária<br />

Esta 2ª dificuldade consiste em tratarmos o princípio de construção<br />

<strong>com</strong>o um princípio estático. A unidade da obra não é uma entidade<br />

simétrica e fechada, mas uma integridade dinâmica que tem o seu<br />

próprio desenvolvimento; os seus elementos não são ligados por um<br />

sinal de igualdade e de adição, mas por um sinal dinâmico de<br />

correlação e de integração.<br />

A forma da obra literária deve ser sentida <strong>com</strong>o uma forma dinâmica.<br />

Não somos obrigados a introduzir a dimensão temporal no conceito de<br />

evolução, a dinâmica, em si mesma, fora do tempo, <strong>com</strong>o um<br />

movimento puro. A arte vive desta interação, deste conflito.<br />

Introduz-se assim uma dimensão histórica na noção do «princípio de<br />

construção» e na noção de «material», embora a história literária nos<br />

prove a estabilidade desses princípios fundamentais e do material.<br />

7


Estruturalismo<br />

A tradição dos formalistas russos sobreviveu na Checoslováquia através do Círculo<br />

Linguístico de Praga (1926-1048), no qual Roman Jakobson e Nicolai Troubetzkoy,<br />

abandonando a Rússia, desempenharam um papel preponderante.<br />

O círculo impulsionou fortemente o desenvolvimento do estruturalismo, sobretudo no<br />

campo da ciência literária.<br />

Tal <strong>com</strong>o Tynianov, Mukarovsky inseria o texto literário no contexto da história literária e<br />

de todo o sistema cultural. A inovação está em definir a arte <strong>com</strong>o facto semiótico.<br />

Mukarovsky conseguiu integrar a sua teoria da literatura no quadro mais vasto de uma<br />

teoria da <strong>com</strong>unicação orientada para um ponto de vista semiótico.<br />

Mukarovsky demonstrou que o texto literário é ao mesmo tempo um signo e uma<br />

estrutura de signos e que além disso representa um valor. Se um texto é concebido <strong>com</strong>o<br />

signo, podem distinguir-se dois aspetos: o símbolo externo ou significante, que<br />

representa uma significação, e a significação representada ou significado. A obra literária<br />

não pode ser reduzida ao seu aspeto material, visto que o texto material, que na<br />

terminologia de Mukarovsky é um artefacto, só é investido de significação pelo ato de<br />

perceção. O objeto da estética não é o artefacto (significante) mas o objeto estético<br />

(significado), ou seja, «a expressão e o <strong>com</strong>plemento do artefacto na consciência do<br />

recetor».<br />

Mukarovsky insistiu no facto de a interpretação e a avaliação da obra literária estarem<br />

sujeitas a alterações, à medida que se transforma o fundo cultural e social em relação ao<br />

qual o artefacto é apreendido. No entanto, na sua conceção, nem todas as interpretações<br />

individuais formam um objeto estético: o objeto estético é apenas aquilo que as<br />

interpretações individuais, e necessariamente subjetivas, de um determinado grupo de<br />

recetores têm em <strong>com</strong>um.<br />

Vodicka desenvolveu a teoria semiótica de Mukarovsky na perspetiva da problemática da<br />

história literária. Inspirando-se no modelo da situação <strong>com</strong>unicativa, descreve a tarefa<br />

tripla do historiador da literatura, distinguindo no processo da <strong>com</strong>unicação a mensagem<br />

do texto, o emissor e o recetor:<br />

1) A tarefa primordial consiste em estudar os textos que foram atualizados enquanto<br />

literatura por determinado público, em dado momento, e que foram uma série<br />

histórica. Não só o texto, mas também o contexto histórico no momento da sua<br />

génese são de primordial importância para o historiador da literatura.<br />

2) A segunda tarefa é a do estudo da produção do texto. Este tipo de estudo tornase<br />

necessário para <strong>com</strong>preender a tensão entre, por um lado, a criatividade<br />

literária do escritor e, por outro, o contexto literário e social no qual trabalha. Ao<br />

estudar-se a relação entre a produção do texto e o contexto é importante ver o<br />

texto literário <strong>com</strong>o um signo no qual a função estética domina, e que é dirigido a<br />

um público de leitores mais ou menos determinado num dado contexto cultural e<br />

social.<br />

3) A terceira tarefa consiste no estudo da receção dos textos literários.<br />

Ao formular esta tripla tarefa, Vodicka vai distinguir rigorosamente, <strong>com</strong>o é óbvio, o papel do<br />

leitor-recetor e do investigador que se encontra fora da situação de <strong>com</strong>unicação estudada.<br />

Segundo Vodicka, a história da literatura pode realmente considerar-se um ramo da<br />

história social.<br />

As teorias de Mukarosky e de Vodicka, <strong>com</strong>patíveis <strong>com</strong> as da semiótica russa, são<br />

para nós ainda válidas.<br />

8


Polémica entre o New Criticism e a crítica universitária expressa nos ensaios de Roland<br />

Barthes:<br />

Barthes define a relação entre uma obra e o seu leitor <strong>com</strong>o uma semiose livre. Não se<br />

trata de encontrar o significado que o autor deu a obra, mas de constituir um sentido,<br />

<strong>com</strong>o um ato criativo livre de subjetividade. Uma obra de arte torna-se o «significante de<br />

um significado». Barthes visa uma subjetividade em que o sujeito se integra em «visões<br />

do mundo» bem determinadas, classificáveis em categorias, bem determinadas, e que<br />

devem ser explicitadas. Barthes reivindica a «franqueza do sistema», que significa para ele<br />

«a ideia preconcebida que temos do mundo».<br />

A conceção de Barthes apresenta pontos de contato sensíveis <strong>com</strong> a da teoria alemã da<br />

receção, pelo menos na sua primeira fase. No entanto, depois de elaborada a relação <strong>com</strong><br />

o estruturalismo checo e <strong>com</strong> a semiótica, a teoria da receção adotou um tipo de<br />

argumentação flexível, permitindo evitar o abismo inultrapassável que separa a<br />

significação genética e a significação vinculada.<br />

O desafio que está implicado na tese de Barthes dá origem a uma polémica contra a<br />

conceção universitária do documento, que não permitia ao leitor nenhuma liberdade ou<br />

criatividade quanto á produção de sentido;<br />

Estruturalistas incorporam questões trazidas pelos formalistas, mas diferenciar-se-ão<br />

deles graças à orientação teórica escolhida pelos seus membros. Tal <strong>com</strong>o os formalistas,<br />

preocupam-se <strong>com</strong> questões relativas à linguagem, admitindo a separação entre o seu<br />

uso em situações quotidianas de <strong>com</strong>unicação e na literatura. Além disso, aprofundaram<br />

as pesquisas no campo da Linguística, especialmente no âmbito da fonologia.<br />

Mukarovski apresenta três conceitos fundamentais do estruturalismo:<br />

1- A obra literária é uma estrutura, construída por diferentes elementos que constituem<br />

uma unidade orgânica. Nesse sentido, todos os elementos estão unidos entre si de<br />

modo a que a alteração de um deles determina a mudança do conjunto.<br />

2- Conceito de “norma estética”, oposto ao de “valor estético”. Segundo ele, o sistema<br />

literário é dominado por normas de todo o tipo; há normas sociais, normas religiosas e<br />

também normas estéticas (estas últimas dizem respeito às convenções aceites pelos<br />

criadores, artistas e escritores). Definem-se os géneros conforme as normas estéticas<br />

dominantes, facultando o estabelecimento de distinções entre o romance e conto,<br />

prosa e poesia, literatura e não-literatura. Os artistas podem obedecer passivamente<br />

às normas estéticas, recusá-las, contestá-las ou desconstruí-las. Quanto mais o artista<br />

se distanciar das normas dominantes, mais desafiadora, inovadora e criativa é a sua<br />

obra. É no efeito de estranhamento que Mukarovski localizou o valor estético.<br />

3- Ao invés de propor que o valor estético é um dado absoluto a que todas as obras<br />

devem chegar, ele chama a atenção para a relatividade e a mutabilidade do conceito.<br />

Reconhece que as obras literárias têm um valor; mas recusa-se a explicitar qual é a<br />

essência desse valor. Coloca-o, pois, numa relação – aquela que se estabelece entre as<br />

normas vigentes e as modalidades de rutura propostas por cada texto.<br />

9


A LIÇÃO – ROLAND BARTHES<br />

Barthes discursa para uma plateia. Começa por ser modesto, dizendo que o seu<br />

percurso não é académico, mas mesmo assim o Colégio de França recebeu-o; agradece por<br />

isso. Ele diz não se considerar o mais sabedor dentro daquelas paredes.<br />

Considera o Colégio um lugar exterior ao poder.<br />

Introduz o tema <strong>com</strong> subtileza, enquadrando a literatura em tudo, inclusive nos poderes;<br />

portanto, a literatura não é produto excedentário da sociedade.<br />

Diz-nos que a literatura é uma forma de libertação, mas a língua, na sociedade, não possuí<br />

essa dinâmica.<br />

Introduz o papel da literatura e vai mais além, porque há mais língua para além da<br />

mensagem.<br />

O “autor” é uma autoridade, o sujeito da ação; há uma gregaridade da repetição, isto é, a<br />

autoridade não profere frases únicas, havendo sempre uma dose de repetições. Chama à<br />

língua de «fascista», pois a nossa individualidade em cada ocorrência não é única, há<br />

sempre uma obrigação de ir de encontro às regras da língua.<br />

«os signos de que a língua é <strong>com</strong>posta apenas existem na medida em que são reconhecidos<br />

, quer isto dizer que apenas existem na medida em que se repetem» - só é possível fazer<br />

<strong>com</strong>parações quando há elementos de <strong>com</strong>paração, e estes só existem na medida em que<br />

se repetem.<br />

«… a linguagem não possuí um exterior: é um lugar hermético.» - é estanque.<br />

Não importa quem é o autor, mas o seu trabalho sobre a língua.<br />

Entre as forças da literatura Barthes ordena três conceitos gregos:<br />

Matesis: estrutura que a língua dá através dos signos;<br />

Mimesis: representação; tornar a apresentar;<br />

Semiosis: interpretação<br />

Estão relacionados, pois há um objeto a<br />

representar<br />

Através dos signos da representação,<br />

chegar àquilo que nos pretende dizer.<br />

Matesis:<br />

A literatura ocupa-se muitos saberes, e se tivesse de se eleger uma disciplina, elegerse-ia<br />

a literatura, porque todas as ciências encontram-se disseminadas no monumento<br />

literário. A matesis é o lugar do real.<br />

A ciência é grosseira, a vida é subtil, e a literatura tenta corrigir essa distância, essa<br />

diferença. Por outro lado, o saber da literatura não é <strong>com</strong>pleto nem conclusivo; a literatura<br />

não diz que sabe alguma coisa, mas que sabe de alguma coisa.<br />

Mimesis:<br />

Esta é a força da representação que implica um transporte dos signos do real. Desde a<br />

antiguidade que a literatura se preocupa em representar o real. Contudo, o real não é<br />

representável, e é por os homens quererem representá-lo que existe uma história da<br />

literatura- O real não é representável porque não se pode fazer coincidir uma ordem<br />

pluridimensional (o real) <strong>com</strong> uma ordem unidimensional (a linguagem). É a esta<br />

impossibilidade que o homem não se quer render.<br />

Obstinar-se significa afirmar o Irredutível da literatura: aquilo que nela resiste e<br />

sobrevive aos discursos tipificados que a cercam: as filosofias, as ciências, as psicologias; agir<br />

<strong>com</strong>o se ela fosse in<strong>com</strong>parável e imortal. Um escritor – e por escritor entendo não o defensor<br />

de uma função ou o servidor de uma arte, mas sim o sujeito de uma prática – deve possuir a<br />

obstinação do espreitador que está na encruzilhada de todos os outros discursos, em posição<br />

trivial, em relação à pureza das doutrinas. Obstinar-se significa, em suma, manter para <strong>com</strong> e<br />

contra tudo a força de uma deriva e de uma espera. E é precisamente por se obstinar que a<br />

escrita é levada a deslocar-se. Deslocar-se quer então dizer: conduzir-se até onde não se é<br />

10


esperado, ou ainda e mais radicalmente, abjurar o que se escreveu (mas não forçosamente o<br />

que se pensou), quando o poder gregário utiliza e subjuga essa escrita.<br />

Semiosis:<br />

Esta terceira força é a faculdade de jogar os signos em vez de destrui-los, introduzindoos<br />

numa maquinaria da linguagem, noutras palavras, é instituir uma verdadeira heteronímia<br />

das coisas.<br />

A semiologia que se pode definir canonicamente <strong>com</strong>o sendo a ciência dos signos, de<br />

todos os signos, procede da linguística devido aos seus conceitos operatórios. Mas a própria<br />

linguística, está a deteriorar-se devido a sucessivas fendas: por um lado inclina-se para um<br />

pólo formal e, formaliza-se cada vez mais; por outro lado apodera-se de conteúdos cada vez<br />

mais numerosos e mais afastados das suas atribuições originais. O objeto da linguística não<br />

está ainda delimitado; a língua é o próprio social. Em suma, quer seja por um excesso de<br />

ascese (busca do aperfeiçoamento espiritual através do afastamento do mundo e da renúncia aos prazeres<br />

associados à vida terrena), quer seja por um excesso de fome, franzina ou obesa, a linguística vai-se<br />

desconstruindo. É essa desconstrução da linguística que eu dou o nome de semiologia.<br />

Toda a investigação de Barthes parte da consideração da literatura <strong>com</strong>o linguagem, <strong>com</strong>o um sistema de<br />

signos, sendo que a ação do criador e do crítico acabam por confluir e confundir-se, assumindo-se a cada vez mais<br />

<strong>com</strong>o uma crítica da linguagem.<br />

A “Lição” (1977), que corresponde à aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária do Colégio de<br />

França, denuncia um carácter auto-biográfico que nos permite perspetivar a sua atitude face à prática do<br />

conhecimento, entendida <strong>com</strong>o um processo contínuo de transformação, pautada pela sua postura crítica face ao<br />

saber instituído, bem <strong>com</strong>o uma crítica da linguagem <strong>com</strong>o condição primeira da sua conceção da Semiologia<br />

Literária.<br />

Primeiramente abordaremos a sua crítica da linguagem, perspetivando-se neste sentido a linguagem na<br />

sua função instrumental (<strong>com</strong>o veículo para…) em que o signo se instaura pela sua dimensão “gregária” e<br />

“imitativa”: “a língua manipulada pelo poder”.<br />

Tentaremos seguidamente entender de que forma o “Texto” (enquanto “espaço de despoder”), se assume<br />

<strong>com</strong>o o campo de estudo privilegiado da Semiologia literária, (que é em simultâneo “ativa” e “negativa”)<br />

Em jeito de conclusão, explicito as características da semiologia literária, focalizando os seguintes aspetos:<br />

a “metalinguagem”, o método (“uma ficção”,) os processos (“a fragmentação e a excursão”), e as atitudes do<br />

investigador/criador face à força corrosiva do poder (“obstinação” e “deslocação”).<br />

Barthes dirige-se a um auditório que respeita: o Colégio de França. Será de referir uma<br />

duplicidade no seu discurso: recorrendo <strong>com</strong> frequência a uma linguagem metafórica, a<br />

subjetividade e as razões de ordem afetiva são assumidas sem pudor, contudo, o seu discurso<br />

obedece a uma construção retórica que lhe confere uma eficácia inquestionável. Barthes<br />

cumpre os propósitos inerentes a qualquer aula inaugural (de Semiologia Literária) – apresenta<br />

o seu “projeto de estudo”, especifica o seu “método”, e a “metalinguagem”.<br />

11


1. Crítica da Linguagem:<br />

“A linguagem é uma legislação, e a língua o seu código.”<br />

Barthes procura desmontar os mecanismos da linguagem de forma a expor os<br />

processos e meios pelos quais esta se nos impõe numa relação de total alienação, entrando ao<br />

serviço de um poder, sob o signo da “autoridade de asserção” e da “gregaridade da repetição”.<br />

Toda a língua encerra em si uma dimensão classificativa, o que instaura à partida uma<br />

relação de opressão no sentido em que nomear é já classificar, dividir, hierarquizar. Para além<br />

disso, cada língua, pela sua própria estrutura, determina os modos de enunciação que nos são<br />

permitidos utilizar. Barthes dá <strong>com</strong>o exemplo a estrutura SVO (sujeito/verbo/objeto) da língua<br />

francesa (tal <strong>com</strong>o o português) em que a enunciação do sujeito precede a ação, surgindo a<br />

ação <strong>com</strong>o que um atributo do sujeito. Da mesma forma, quando tomamos a palavra somos<br />

obrigados a definir-nos (classificar-nos) de acordo <strong>com</strong> as regras do género: masculino ou<br />

feminino, não nos sendo possível a indeterminação, assumindo por exemplo a posição de<br />

género neutro.<br />

Quanto à “autoridade de asserção”, confronta-nos <strong>com</strong> a (im)possibilidade de<br />

“moderar o (…) implacável poder de constatação”. Isto é, sempre que falamos, ainda que<br />

recorramos a operadores linguísticos para modelizar o nosso discurso (para expressar negação,<br />

dúvida, possibilidade…), aquilo que predomina é a dimensão assertiva, não havendo qualquer<br />

possibilidade de a contornar.<br />

A “gregaridade da repetição” entende-se pelo facto de todo o signo linguístico ser<br />

percecionado <strong>com</strong>o tal, apenas pelo seu carácter repetitivo, sendo um signo que por ser<br />

“imitador e gregário” tende para a formação de estereótipos. Face à “autoridade de asserção”<br />

e “gregaridade da repetição” somos simultaneamente “senhores” e “escravos”: “não me<br />

contento em repetir o que já foi dito, em me albergar confortavelmente na dependência dos<br />

signos: eu digo, afirmo, reafirmo o que repito.<br />

Parafraseando Barthes, a linguagem humana é um lugar hermético, não há <strong>com</strong>o<br />

<strong>com</strong>batê-la fora dela. Assim sendo, <strong>com</strong>o poderemos libertar-nos do seu “poder” implacável?<br />

Fazendo “batota”, “trapaceando” a língua através de um “jogo <strong>com</strong> as palavras”, num<br />

verdadeiro movimento de “subversão”, em que nos libertamos dessa contingência da<br />

“regência generalizada” e da consequente tendência para a formação de estereótipos. Esta<br />

“batota”, este “jogo” que conduz a um “lugar de despoder”, é, em suma, nada mais do que a<br />

“literatura”, ou melhor, o “Texto” (que se identifica <strong>com</strong> a prática de escrita) – o campo de<br />

estudo privilegiado da Semiótica Literária barthesiana.<br />

2. Conceção barthesiana de Texto:<br />

Toda a conceptualização do Texto é efetuada pela sua aproximação contrastiva <strong>com</strong> o<br />

conceito de obra (no seu sentido tradicional). Se por um lado é possível fazer corresponder a<br />

uma dada obra uma materialidade (ex. o livro), tal não acontece <strong>com</strong> o Texto já que este<br />

corresponde, antes de mais, a um “campo metodológico”, a uma prática (a escrita),<br />

instituindo-se <strong>com</strong>o um “movimento constitutivo” que poderá, eventualmente, atravessar<br />

várias obras. Outro fator diferencial entre obra e Texto prende-se <strong>com</strong> a dificuldade em<br />

classificar um Texto de acordo <strong>com</strong> a categoria género, na medida em que um dos seus traços<br />

distintivos reside na sua “força de subversão”, implicando sempre uma certa “experiência dos<br />

limites” que quebra os limites das crenças (o Texto é eminentemente paradoxal). A obra pode<br />

ser entendida <strong>com</strong>o um “signo geral”, uma “categoria institucional”, contrariamente, o Texto<br />

assume-se <strong>com</strong>o sendo “radicalmente simbólico”.<br />

O Texto é plurissignificativo, polissémico, correspondendo, não à coexistência de<br />

sentidos mas à “passagem”, à “travessia”, uma energia que se experimenta pela prática da<br />

escrita. Como tal, os seus sentidos não relevam de uma interpretação, mas de uma “explosão”,<br />

de uma “disseminação” de sentidos.<br />

A obra é suscetível de ser apropriada <strong>com</strong>o “objeto de consumo”, dito de outra forma,<br />

presta-se a uma leitura reducionista, uma prática que se poderá entender <strong>com</strong>o um tipo de<br />

12


“mimesis passiva”, contrariamente, ao Texto apenas se acede através de uma leitura (escrita),<br />

no sentido em que o leitor <strong>com</strong>o que “reescreve” o Texto, assumindo-se <strong>com</strong>o um agente<br />

ativo de uma “produção”, através de um “jogo” duplo: o leitor joga ao Texto e,<br />

simultaneamente joga o Texto (executa).<br />

Assim concebido, o Texto corresponderá ao “espaço em que nenhuma linguagem<br />

<strong>com</strong>anda a outra”, um espaço onde as linguagens “circulam” sem que “nenhuma(...) <strong>com</strong>ande<br />

a outra ”, ou seja, um “lugar de despoder”, um espaço “utópico de liberdade” onde a língua,<br />

por um movimento contínuo de “subversão” e de “deslocação”, se liberta da palavra gregária,<br />

implicando uma dimensão de impessoalidade que inviabiliza uma leitura onde se procura a<br />

“decifração” de um sentido único e pleno cuja origem radica, supostamente, na determinação<br />

da intencionalidade autoral.<br />

Se, tal <strong>com</strong>o postula Barthes, a força da literatura (Texto) não decorre nem do seu<br />

conteúdo doutrinal (do sentido), nem da pessoa civil (o autor), mas do “trabalho de<br />

deslocação”, isto é do exercício do símbolo, o “apagamento” da voz autoral constitui uma<br />

condição primeira do “ato de escrita”.<br />

3. A Semiologia Literária:<br />

Como referimos anteriormente, o projeto barthesiano passa pela proposta de um<br />

novo paradigma em que não exista uma separação entre “sábios e investigadores” por um<br />

lado, e “escritores e ensaístas” por outro. De facto, ele assume-se <strong>com</strong>o um sujeito de uma<br />

prática: a escrita. Ele é “scriptor”, quer estejamos a falar do crítico, do teórico, do linguista, ou<br />

do semiólogo.<br />

O semiólogo será o artista que “manipula”, que “joga” o/ao signo sem nunca esquecer<br />

a dimensão metafórica (ficcional) da linguagem, tendo em vista “repensar” o signo, <strong>com</strong>o<br />

forma de o subtrair à máquina do poder criadora de estereótipos bem <strong>com</strong>o para o<br />

salvaguardar do mito da criatividade pura.<br />

Barthes apresenta o seu projeto atualizando, “mostrando”, “dramatizando” os<br />

princípios metodológicos inerentes à sua proposta. A semiologia literária será<br />

simultaneamente ativa e negativa. Será uma semiologia negativa na medida em que se tem<br />

presente a noção de que nenhuma linguagem é verdadeiramente “científica”, isto é, plena de<br />

“carateres positivos, inalteráveis, a-históricos, a-corporais”.<br />

Mais uma vez trata-se, efetivamente da consciência de que toda a linguagem é um<br />

sistema de signos convencional e, <strong>com</strong>o tal, histórico (variável), sendo condicionado pelo<br />

sujeito e pelo meio (histórico, social) em que surge. Será ativa porque não visa a destruição do<br />

signo (semioclastia) nem assenta “numa naturalidade inerte do signo” (semiofisis), ou seja no<br />

esquecimento do carácter convencional (artificial) do signo, mas sim numa “semiotropia”: a<br />

Semiologia volta-se para o signo, imitando-lhe, quando necessário os seus processos. A força<br />

semiótica residirá precisamente nesta faculdade de jogar os signos (em vez de os destruir),<br />

instituindo no “interior da língua servil, uma verdadeira heteronomia das coisas”. O semiólogo<br />

é o “criador” aquele que “manipula” os signos, “saboreia” os signos e dá a “saborear e<br />

<strong>com</strong>preender essa fascinação”.<br />

13


New Criticism<br />

O fator que mais contribui para manter o mundo anglo-saxão afastado das teorias<br />

funcionalistas de origem russo ou checa foi, verosimilmente, a sólida tradição o New<br />

Criticism que, inspirado nas obras críticas de T.S. Elliot e I. A. Richards, publicadas<br />

respetivamente em 1920 e 1924, surgiu durante os anos 30 nos Estados Unidos e<br />

dominou por um largo período de tempo o mundo universitário americano.<br />

As fontes de inspiração do New Criticism foram o estruturalismo antropológico de Claude<br />

Lévi-Strauss e a psicanálise de Freud.<br />

Na conceção de Elliot, a literatura consiste numa série de «momentos», à qual uma obra<br />

nova pode ser adicionada, o que vai alterar levemente a tradição no seu conjunto. Os<br />

«monumentos» em si permanecem intactos, apesar da adição referida. Quanto ao papel<br />

do leitor, Elliot não o considera.<br />

Apesar da sua atenção específica aos problemas psicológicos, Richards assinalou «a<br />

prioridade dos elementos formais sobre o conteúdo» em literatura, a organização<br />

específica do material semântico.<br />

Traços que caraterizam o New Criticism: conceção da obra <strong>com</strong>o monumento e<br />

interpretação imanente do texto.<br />

Nas suas interpretações, os adeptos desta corrente apoiam-se na distinção tradicional<br />

entre experiencia estética e interesse prático. Isolam, de certo modo, o texto dos outros<br />

textos, e postulam que os elementos constitutivos de um texto literário se referem uns<br />

aos outros de uma forma específica e que se modificam mutuamente.<br />

Os representantes do New Criticism duvidam que seja possível explicar o texto literário<br />

em termos racionais e receiam que a paráfrase destrua a «estrutura essencial» da obra de<br />

arte. A interpretação não pode ser mais que uma aproximação grosseira, e para efetuar<br />

essa aproximação exegeta é forçado a «recorrer aos métodos do poema – analogia,<br />

metáfora, símbolo, etc.».<br />

Este ponto de vista significa uma recusa fundamental da divisão entre língua-objeto e a<br />

metalinguagem. Isto prejudica uma separação nítida entre análise e avaliação, e afasta o<br />

New Criticism da ciência literária moderna.<br />

René Wellek fez notar que os New Critics «são inimigos da ciência». Neste ponto, o New<br />

Criticism distingue-se radicalmente do formalismo russo, que podia afirmar-se ligado à<br />

tradição científica. A coerência do texto literário, que o New Criticism aceita <strong>com</strong>o<br />

postulado, pode ser formulada, na tradição do formalismo russo, do estruturalismo e da<br />

semiótica, <strong>com</strong>o uma convenção admitida em dada cultura, podendo, enquanto tal, ser<br />

estudada cientificamente no quando da teoria da <strong>com</strong>unicação. Os formalistas e os<br />

estruturalistas souberam, distanciar-se da sua própria situação literária, conseguindo<br />

assim estudar a sucessão dos sistemas poéticos.<br />

TRADITIONAL AND INDIVIDUAL TALENT – T. S. ELLIOT<br />

O ensaio está dividido em 3 partes:<br />

1ª Elliot dá o conceito de tradição;<br />

2ª Elliot desenvolve a sua teoria da impessoalidade na poesia;<br />

3ª Espécie de conclusão e resumo da discussão.<br />

14


Elliot <strong>com</strong>eça o ensaio salientando que a palavra “tradition” é geralmente vista <strong>com</strong>o<br />

uma palavra de censura. É uma palavra desagradável aos ouvidos dos ingleses. Quando os<br />

ingleses louvam um poeta, louvam-no pelos aspetos do seu trabalho que são “individual” e<br />

originais. Contudo, eles elogiam o poeta pela coisa errada. Se eles examinarem a questão<br />

crítica <strong>com</strong> uma mente aberta, vão perceber que a melhor e a mais individual parte do<br />

trabalho do poeta é aquela que mais mostra a influência dos escritores do passado.<br />

Maneiras de se adquirir a “Literary Tradition”<br />

Elliot diz que a tradição não significa copiar todos os caminhos das gerações anteriores,<br />

pois isso seriam uma mera imitação e repetição do que já tinha sido feito. A tradição no<br />

sentido de repetição passiva devia ser desencorajado, e para Elliot a tradição tem um<br />

significado de maior importância. A tradição, no verdadeiro sentido da palavra, não pode ser<br />

herdade, só pode ser obtida através de trabalho duro. Este trabalho é o de conhecer os<br />

escritores do passado. É o trabalho crítico de separar o bom do mau e de saber o que é bom e<br />

útil. A tradição só pode ser obtida por aqueles que têm um sentido histórico, e este sentido<br />

histórico envolve uma perceção “not only of the pasteness of the past, but also of its<br />

presence”: aquele que tem o sentido histórico sente toda a literatura europeia desde Homero<br />

até à sua época, incluindo a literatura do seu próprio país, que constituí uma contínua tradição<br />

literária. Ele percebe que o passado existe no presente, e que ambos formam uma ordem<br />

simultânea. Este sentido histórico é o sentido do intemporal e do temporal, bem <strong>com</strong>o os dois<br />

juntos. É este sentido histórico que faz um escritor tradicional. Um escritor <strong>com</strong> sentido<br />

tradicional tem consciência da sua própria geração, do seu lugar no presente, mas ele também<br />

tem consciência da sua relação <strong>com</strong> os escritores do passado. Muito brevemente, o sentido de<br />

tradição implica:<br />

(a) O reconhecimento da continuidade na literatura;<br />

(b) Um juízo crítico de que os escritores do passado continuam a ser importantes no<br />

presente;<br />

(c) O conhecimento de um escritor significativo é obtido através de muito esforço.<br />

A tradição representa a acumulação de sabedoria e experiencia ao longo dos anos, por isso, o<br />

seu conhecimento é essencial para grandes e nobres conquistas.<br />

Conceção dinâmica da Tradição: o seu valor.<br />

Para reforçar o valor da tradição, Elliot diz que nenhum escritor tem significado de<br />

forma isolada. Para julgar um poeta ou um artista é necessário <strong>com</strong>parar e contratar o seu<br />

trabalho <strong>com</strong> poetas e artistas do passado. Esta <strong>com</strong>paração e contraste são essenciais para<br />

formar a ideia do valor e do significado de um novo escritor e do seu trabalho. Para Elliot a<br />

tradição é um processo dinâmico. De acordo <strong>com</strong> a sua visão, a tradição não é fixa nem<br />

estática; está constantemente a mudar, a crescer e a tornar-se diferente do que é. Um escritor<br />

deve procurar orientação no passado, ele deve estar de acordo <strong>com</strong> a tradição literária. Da<br />

mesma maneira que o passado direciona e orienta o presente, o presente também altera e<br />

modifica o passado. Quando uma nova obra de arte é criada, se for realmente nova e original,<br />

toda a tradição literária é modificada, embora muito ligeiramente. A relação entre o passado e<br />

o presente não é unilateral, mas sim uma relação recíproca. O passado orienta o presente, e é<br />

alterado em si mesmo pelo presente. Citando Elliot: “The existing monuments form and ideal<br />

order among themselves, which is modified by the introduction of the new (really new) work<br />

of art among them. The existing order is <strong>com</strong>plete before the new work arrives; for order to<br />

persist after the supervention of novelty, the whole existing order must be, if ever so slightly,<br />

altered.”<br />

15


A função da tradição<br />

Apesar do trabalho de um poeta do presente dever ser <strong>com</strong>parado e contratado <strong>com</strong><br />

as obras do passado e julgado pelos padrões do passado, este julgamento não deve<br />

determinar se a obra é boa ou má. A <strong>com</strong>paração deve ser feita para se conhecerem os factos<br />

sobre a nova obra de arte, e esta <strong>com</strong>paração é feito para efeitos de análise e formação de<br />

uma melhor <strong>com</strong>preensão do novo. Esta <strong>com</strong>paração é recíproca: o passado ajuda a<br />

<strong>com</strong>preender o presente e o presente dá-nos luz sobre o passado, e só assim podemos ter<br />

uma ideia do que é realmente individual e novo.<br />

O real significado do sentido de tradição<br />

Elliot diz que o sentido de tradição não significa que o poeta deve conhecer o passado<br />

<strong>com</strong>o um todo, e absorve-lo sem qualquer discriminação. Fazer isto é indesejável. O passado<br />

deve ser examinado criticamente e só o importante deve ser adquirido. O sentido de tradição<br />

não significa que o poeta só deve conhecer os poetas que admira, pois isso demonstra<br />

imaturidade e inexperiência. Também não deve estudar apenas um período particular que ele<br />

aprecie, pois isso não constitui um sentido de tradição. Para conhecer a tradição o poeta deve<br />

julgar criticamente quais são as principais tendências e quais não são. Ele deve limitar-se às<br />

principais tendências e evitar o que é secundário – o poeta deve ter o dom da crítica em<br />

medida ampla.<br />

Obras de arte: a sua estabilidade/continuidade/permanência<br />

O poeta deve perceber que a arte nunca melhora e que o seu material nunca é o<br />

mesmo. As mentalidades podem mudar, mas isso não significa que Shakespeare e Homero<br />

tenham perdido o seu significado. As grandes obras de arte nunca perdem a seu significado,<br />

pois não há melhorias qualitativas na arte. Pode haver refinamento e desenvolvimento, mas<br />

do ponto de vista do artista não há melhoria.<br />

O poeta deve adquirir consciência do passado<br />

O ponto de vista de Elliot sobre tradição exige uma quantidade gigante de erudição.<br />

Demasiada aprendizagem mata a sensibilidade. Contudo, conhecimento não significa apenas<br />

conhecimento livresco e a capacidade de adquirir conhecimento difere de pessoa para pessoa.<br />

Alguns aprendem facilmente, outras têm de suar para conseguir. É o dever do poeta adquirir o<br />

conhecimento do passado e ele deve continuar a adquirir essa consciência ao longo da sua<br />

carreira. Esta consciência da tradição aguça a criação poética.<br />

Impessoalidade da poesia: extinção da personalidade<br />

O poeta deve render-se continuamente a algo mais valioso do que a ele mesmo, ou<br />

seja, à tradição literária. O poeta deve permitir que a sua sensibilidade seja moldada e<br />

modificada pelo passado, e deve continuar a adquirir o sentido de tradição ao longo da sua<br />

carreira. No início a sua individualidade pode aparecer, mas conforme os seus poderes<br />

amadurecem deve haver uma extinção cada vez maior da personalidade. As emoções e<br />

paixões devem ser despersonalizadas, e ele deve ser o mais impessoal e objetivo <strong>com</strong>o um<br />

cientista. A personalidade do artista não é importante, o importante é o seu senso de tradição.<br />

Processo poético: a analogia do catalisador<br />

Elliot desenvolve a sua teoria da impessoalidade na poesia: <strong>com</strong>para a mente do poeta<br />

a um catalisador e o processo poético a uma reação química. Tal <strong>com</strong>o as reações químicas<br />

tomam lugar na presença de um catalisador sozinho, também a mente de um poeta é o agente<br />

catalisador para <strong>com</strong>binar diferentes emoções em algo novo. A mente do poeta é <strong>com</strong>o um<br />

catalisador: é necessário novas <strong>com</strong>binações de emoções e experiências, mas ele próprio não<br />

sofre qualquer alteração durante o processo de <strong>com</strong>binação poética. A mente do poeta forma<br />

constantemente novas emoções e experiencias <strong>com</strong>o totalidades, mas a nova <strong>com</strong>binação não<br />

16


contém qualquer traço da mente do poeta. Um poeta jovem e imaturo pode deixar que as<br />

suas emoções e experiencias pessoais encontrem expressão na sua <strong>com</strong>posição, mas Elliot diz<br />

que o poeta perfeito é aquele que se separa mais de si mesmo. A personalidade do poeta não<br />

encontra expressão na sua poesia; age sim <strong>com</strong>o um agente catalisador no processo da<br />

<strong>com</strong>posição poética.<br />

Poesia <strong>com</strong>o organização: intensidade do processo poético<br />

Elliot <strong>com</strong>para a mente do poeta a um recipiente onde são armazenados os<br />

sentimentos e as emoções, e lá dentro permanecem de um forma desorganizada e caótica, até<br />

que as partículas que se podem unir para formar um novo <strong>com</strong>posto estão presentes. Assim, a<br />

poesia é mais organização do que inspiração e a grandeza de um poema não depende da<br />

grandeza da intensidade das emoções (que são os <strong>com</strong>ponentes do poema), mas sobre a<br />

intensidade do processo de <strong>com</strong>posição poética. O poeta não tem personalidade para<br />

expressar, ele é apenas o meio no qual as impressões e experiencias se <strong>com</strong>binam de uma<br />

forma peculiar e inesperada. Impressões e experiencias que são importantes para o homem<br />

podem não encontrar lugar na sua poesia, e aquelas que se tornam importantes na poesia não<br />

têm significado nenhum para o homem. Elliot rejeita assim o subjetivismo romântico.<br />

Poesia, uma fuga da personalidade e das emoções pessoais<br />

Elliot conclui “Poetry is not a turning loose of emotion, but an escape from emotion; it<br />

is not the expression of personality, but an escape from personality.” Elliot não nega a<br />

personalidade ou a emoção do poeta, ele apenas deve despersonalizar as suas emoções. A sua<br />

personalidade deve ser extinta. Esta impersonalidade pode ser alcançada apenas quando o<br />

poeta se entrega <strong>com</strong>pletamente ao trabalho que está a ser feito. O poeta pode saber o que<br />

está a ser feito, apenas se ele adquirir o sentido de tradição, o sentido histórico, que o faz<br />

consciente, não apenas do presente, mas também do momento presente do passado, não<br />

apenas o que está morto, mas o que ainda está vivo.<br />

17


Estética da Receção<br />

Reintegra na sua teoria da literatura o aspeto da historicidade;<br />

Não professa o determinismo, mas sim um relativismo histórico e cultural, que encontra a<br />

sua base empírica na distância geográfica e cronológica à qual estão submetidos tantos os<br />

leitores ulteriores em relação às obras literárias do passado <strong>com</strong>o as obras literárias –<br />

umas em relação às outras;<br />

Escola <strong>com</strong> grande desenvolvimento na Alemanha graças a Hans Robert Jauss;<br />

Apesar de Jauss não ter aprofundado, em princípio, as ligações entre a estética da receção<br />

e o formalismo russo, estas correntes parecem ter bastantes pontos de contacto:<br />

Ponto concordante: o texto literário insere-se numa situação de <strong>com</strong>unicação – o<br />

estudioso pode relacionar o texto, enquanto signo, <strong>com</strong> o emissor e as suas<br />

convenções, ou <strong>com</strong> os sistemas de regras e o horizonte de expetativas dos<br />

leitores;<br />

1º o próprio texto é objeto de análise pois encontra-se num contexto de tradição<br />

em relação a textos anteriores, posteriores ou contemporâneos – deste modo é<br />

possível encontrar traços distintivos;<br />

2º o leitor é objeto de análise, pode haver um contributo de outras disciplinas<br />

para uma investigação dos aspetos sociológicos ou psicológicos que implica o ato<br />

da leitura.<br />

As várias correntes da teoria da receção têm um ponto em <strong>com</strong>um: para todas elas o<br />

texto literário é um signo. Esta característica distingue a teoria da receção das conceções<br />

do texto <strong>com</strong>o documento e <strong>com</strong>o monumento;<br />

A teoria da receção permite, <strong>com</strong> efeito, distinguir a partir de um ponto de vista semiótico<br />

de que forma os signos são transferidos do seu contexto histórico original para outro, e<br />

explicar a distância assim produzida recuando até à significação primária;<br />

O principal representante, Hans Robert Jauss, tem <strong>com</strong>o objetivo recuperar a vitalidade<br />

da História da Literatura, que considera estagnada nos paradigmas do seculo XIX.<br />

Portanto, chama à atenção para a importância do leitor, responsável pela permanente<br />

atualização das obras literárias e, portanto, pela sua historicidade.<br />

O leitor e a estética da receção<br />

O emissor/autor de um texto literário não ignora que o seu texto, sob pena de se<br />

negar <strong>com</strong>o texto literário, tem de entrar num circuito de <strong>com</strong>unicação em que a derradeira<br />

instância é o recetor/leitor. Assim, o recetor manifesta-se sob múltiplas marcas textuais, <strong>com</strong><br />

prefácios e posfácios, explicações e advertências proemiais, moldadas de modo cativante,<br />

notas de esclarecimento – usa elementos estruturais e para-estruturais onde se efetua o<br />

dialogo entre o autor textual <strong>com</strong> o leitor.<br />

A partir dos últimos anos da década de sessenta (1970) e sobretudo em centros<br />

universitários alemães, desenvolveu-se a chamada estética da receção, à qual se deve a<br />

valorização da função do recetor/leitor na investigação literária contemporânea.<br />

Na perspetiva da estética da receção, tanto o texto literário, enquanto “artefacto”,<br />

enquanto “objeto artístico”, <strong>com</strong>o o seu emissor e o seu código possuem uma historicidade<br />

própria, mas a historicidade do recetor não é anulada, nem desqualificada, antes é entendida e<br />

valorada <strong>com</strong>o fator essencial na constituição do texto-objeto estético.<br />

«Horizonte de expetativas» - este conceito foi introduzido e difundido na teoria da<br />

literatura contemporânea por Hans Robert Jauss, constituindo um dos elementos teoréticos<br />

fundamentais da chamada “estética da receção”. Popper define do seguinte modo: «Com esta<br />

expressão, eludo à soma total das nossas expetativas conscientes, subconscientes ou,<br />

inclusive, enunciadas explicitamente numa linguagem […] Os diversos horizontes de<br />

18


expetativas diferem, evidentemente, não só pelo seu maior ou menor grau de consciência,<br />

mas também pelo seu conteúdo. Em todos os casos, porém, o horizonte de expetativas<br />

desempenha a função de um quadro de referência: as nossas experiências, ações e<br />

observações só adquirem significado pela sua posição neste quadro.<br />

Jauss considerava importante ter em conta as condições históricas e o contexto social<br />

que moldam e influênciam a atitude do recetor do texto. Ele defendia que a tríade autor-obraleitor<br />

desenvolve uma energia que contribui para a interpretação e a construção de sentido<br />

para um texto. É a intervenção do leitor que faz <strong>com</strong> que o horizonte da obra não seja fixo.<br />

Isso por que: "[a] obra literária não é um objeto existente em si mesma e que apresenta em<br />

todo tempo e a todo observador a mesma aparência"<br />

As expectativas e as experiências do leitor quanto ao texto são fatores importantes<br />

para a construção de seu sentido para o mesmo. Por isso, é possível alterar ou multiplicar os<br />

possíveis sentidos de um texto. A problemática de Jauss é, também, <strong>com</strong>preender <strong>com</strong>o<br />

funcionam as resignificações na experiência de fruição da obra de arte. Além disso, o sentido<br />

se dividiria em efeito e receção. Efeito seria um momento condicionado pelo texto e receção<br />

um momento condicionado pelo leitor; <strong>com</strong> isso, o sentido se realizaria na junção desses dois<br />

momentos: o implicado pela obra e o trazido pelo leitor de uma determinada sociedade.<br />

LITERARY HISTORY AS A CHALLENGE TO LITERARY THEORY – HANS ROBERT JAUSS<br />

Jauss <strong>com</strong>eça onde os Marxistas e os Formalistas terminam; isto é, ambos tratam o texto literário isolado<br />

da sua receção. Os formalistas olham para ele apenas pelo seu lado estético e os marxistas vêm-no pelo seu lado<br />

representativo.<br />

Jauss elaborou 7 teses neste seu ensaio, contudo as mais destacadas são apenas as três primeiras:<br />

Tese 1:<br />

O texto literário não é um objeto histórico positivista. Em vez disso, oferece visões diferentes a diferentes leitores<br />

em diferentes períodos históricos.<br />

A história do trabalho literário é um processo de receção e produção estética. O texto é realizado através da<br />

receção do leitor, da reflexão da crítica e da produtividade do autor.<br />

O texto irá continuar a existir apenas se nós continuarmos a responder-lhe.<br />

Tese 2:<br />

A análise do texto a partir da resposta do leitor irá afastar-se dos já fixados critérios pelos quais nos podemos<br />

julgar um texto, tal <strong>com</strong>o exige o género, o tema, etc.<br />

Qualquer novo texto literário não é produzido absolutamente novo num vazio de informação. O texto é produzido<br />

num horizonte de expetativas sintagmáticas.<br />

O horizonte de expetativas do leitor é evocado apenas para ser destruído.<br />

O horizonte de expetativas pode ser objetivado através de três fatores:<br />

1- Padrões/normas de género;<br />

2- Relação implícita <strong>com</strong> o meio histórico;<br />

3- Oposição entre a realidade e a ficção.<br />

Tese 3<br />

A reconstrução do horizonte de expectativas “permite determinar o seu carácter artístico pelo seu tipo e o grau<br />

da sua influência numa suposta audiência.”<br />

O trabalho pode ser apreciado e o seu mérito artístico pode ser determinado de acordo <strong>com</strong> a distância entre ela<br />

e o horizonte de expectativas. Quanto mais próxima for esta distância entre as expectativas e o trabalho, mais o<br />

trabalho entreterá desde que satisfaça as expectativas dos seus leitores e confirme as suas crenças. Quanto maior<br />

for a distância, esta pode ser desagradável à audiência contemporânea mas ao mesmo tempo pode definir novas<br />

expectativas para os futuros leitores.<br />

Por outro lado, quando o horizonte de expectativas alcança a aceitação/adesão, então “o poder da norma<br />

estética alterada pode ser demonstrada nessa na audiência que experienciou antes <strong>com</strong>o um trabalho de sucesso<br />

e agora <strong>com</strong>o fora de moda, e isso retira a sua apreciação.” Exemplo: Madame Bovary<br />

19


A Estética da Receção deriva do termo filosófico de hermenêuticas de Hans-Georg<br />

Gamader, aliás, um dos seus alunos, Hans Robert Jauss tornou-se um dos mais importantes<br />

expoentes da Estética da Receção. Tal <strong>com</strong>o Gadamer, Jauss preocupa-se <strong>com</strong> dialética (arte<br />

da argumentação) entre o passado e o presente, e a <strong>com</strong>preensão de que o presente está<br />

sempre a ser ajustado e reajustado pelo passado.<br />

Jauss elogia mas também critica as teorias Formalista e Marxista. A sua principal crítica<br />

contra os Formalistas é o facto de eles ignorarem a história, enquanto a teoria social Marxista<br />

tende a ignorar o texto. Desde o início, Jauss dá prioridade ao papel do leitor: Quer um que<br />

critica o trabalho literário, quer um que realmente produza um trabalho literário <strong>com</strong>o autor,<br />

ou quer um que esteja envolvido de uma maneira ou outra na classificação ou canonização da<br />

literatura, um que <strong>com</strong>ece simplesmente <strong>com</strong>o leitor. Todos os críticos, autores e<br />

historiadores literários eram leitores em primeiro lugar. A receção de um trabalho literário é o<br />

resultado de um <strong>com</strong>promisso ativo <strong>com</strong> texto, um <strong>com</strong>promisso que poderá levar à produção<br />

de um novo texto. Deste modo, existe uma relação <strong>com</strong>plexa e dinâmica entre o texto, autor e<br />

leitor que muda continuamente.<br />

Jauss preocupa-se principalmente <strong>com</strong> a história literária – sobre os textos que<br />

alcançam o cânone literário de um país, e por que o fazem. Porquê que alguns textos são<br />

considerados <strong>com</strong>o literatura séria e escolhidos <strong>com</strong>o cânones literários para o<br />

reconhecimento das futuras gerações, e porquê que alguns textos são lidos apenas por um<br />

período limitado de tempo sendo descartados depois? Por outras palavras: porquê que<br />

Shakespeare ainda é lido e Barbara Cartland não? Jauss esforça-se para responder a esta<br />

questão através de sete teses.<br />

Thesis 1: A renewal of literary history demands the removal of the prejudices of<br />

historical observation and the grounding of the traditional aesthetics of production and<br />

representation in an aesthetics of reception and influence. The historicity of literature rests no<br />

on an organization of “literary facts” that is established post festum, but rather on the<br />

preceding experience of the literary work by its readers.<br />

[«Tese 1: A renovação da história literária exige que se removam os preconceitos da observação histórica<br />

e das bases da produção estética tradicional e da representação numa receção estética e influencia. A historicidade<br />

da literatura não se baseia numa organização dos factos literários que é estabelecida post festum, mas sim na<br />

experiência anterior do trabalho literário pelos seus leitores.»]<br />

Esta tese recusa a ideia do objetivismo histórico. Jauss coloca em primeiro plano o<br />

público leitor histórico e as suas expetativas em constante mudança e a sua receção dos<br />

textos. As obras literárias não são apreciadas de acordo <strong>com</strong> critérios objetivos estáveis/fixos<br />

que são válidos em todas as épocas e idades. A apreciação literária é dependente ou da<br />

experiência que os leitores têm de um texto e o grau de influência nas suas vidas, ou em<br />

termos da vida social <strong>com</strong>o um todo. Contudo, o ponto importante é o facto de a receção e da<br />

influência não serem questões estáveis nem invariáveis: estas mudam de acordo <strong>com</strong> os<br />

diferentes leitores e <strong>com</strong> os diferentes períodos históricos em que eles viveram. Com esta tese<br />

Jauss mais um vez afirma que um texto literário não pode nem ser separado das suas<br />

circunstâncias de produção nem que audiência que o recebeu.<br />

People are made up memories. – Jauss diz que as pessoas são feitas de memórias. Isto<br />

é a realidade dos leitores e dos autores. Novas informações e novos conhecimentos estão a ser<br />

constantemente <strong>com</strong>parados do conhecimento existente. O conhecimento existente ou é<br />

refutado ou transformado pelas diferentes respostas ao que é novo. O mesmo acontece <strong>com</strong> a<br />

literatura. Tanto o autor <strong>com</strong>o o leitor não leem a obra literária <strong>com</strong>o se ele ou ela numa<br />

tivessem lido nada antes. Bem pelo contrário! Geralmente os autores e os leitores leem muito<br />

e, por isso, têm o conhecimento de muitas obras literárias e todas têm um efeito particular<br />

neles. Um autor adequa um novo conhecimento para criar algo novo <strong>com</strong> um<br />

objetivo/intenção específico – geralmente diferente. Um leitor tanto pode rejeitar o que ele ou<br />

ela lê <strong>com</strong>o novo ou pode responder-lhe, acolhendo-o de coração.<br />

20


Muito brevemente: A verdadeira literatura deve a um fazer pensar e a outro fazer <strong>com</strong><br />

que ele faça algo.<br />

Thesis 2: The analysis of literary experience of the reader avoids the threatening pitfalls<br />

of psychology if it describes the influence of a work within the objectifiable system of<br />

expectations that arises for each work in the historical moment of its appearance, from a preunderstanding<br />

of the genre, from the form and themes of already familiar works, and from the<br />

opposition between poetical and practical language.<br />

[«Tese 2: A analise da experiencia literária do leitor pode evitar armadilhas ameaçadores da psicologia se<br />

ela descrever a influencia de uma obra dentro do sistema objetivável de expetativas, que surge em cada obra, no<br />

momento histórico do seu surgimento, desde a pré-<strong>com</strong>preensão do género, da forma e dos temas de obras já<br />

familiares, e até da oposição entre a linguagem poética e a linguagem prática.]<br />

Esta tese alerta-nos contra o conceito de que qualquer coisa é válida, que é para o<br />

leitor julgar pessoalmente se ele ou ela gostam da obra ou não. Existe algo <strong>com</strong>o categorias<br />

literárias – ou género. Toda a obra literária é colocada dentro de um género literário<br />

particular, por exemplo um poema, um romance, uma carta, uma sátira e por aí em diante. Um<br />

leitor lê um poema de modo diferente de <strong>com</strong>o leria uma carta (apesar de algumas cartas<br />

poderem ser extremamente poéticas!). Por isso, um leitor aborda um texto <strong>com</strong> certas<br />

expetativas.<br />

As teorias de resposta do leitor são muitas vezes criticadas porque enfatizam a<br />

resposta do leitor, que eles negligenciam o texto e apenas têm em atenção as impressões<br />

subjetivas do leitor. Esta segunda tese de Jauss é uma espécie de encobrimento destas críticas.<br />

As impressões do leitor subjugadas ao género <strong>com</strong> que ele ou ela estão a lidar. Um leitor<br />

<strong>com</strong>para sempre o texto que está a ler <strong>com</strong> textos que já leu. Portanto, um leitor aborda<br />

qualquer novo texto esperando algo dele. De um modo notório, estas expectativas podem ser<br />

violadas. Por um lado o leito poderá encontrar num poema ou num romance tudo o que<br />

espera. Por outro lado, ler um romance ou um poema pode virar tudo ao contrário e exigir ao<br />

leitor que pense doutra maneira e que mude as expectativas existentes.<br />

Às expectativas familiares Jauss denomina-as Horizonte de Expectativas. Estas<br />

relacionam-se às memórias que o leitor fez de textos anteriores. Um horizonte de expectativas<br />

é construído na base da familiaridade <strong>com</strong> as normas dos textos já existentes, das relações<br />

entre textos do mesmo período histórico, e, de que modo, um novo texto, se desvia das<br />

normas existentes. Um novo texto tanto pode atenuar <strong>com</strong>o desafiar um horizonte de<br />

expectativas já existentes, apropriando as muitas disciplinas do género de uma maneira<br />

diferente. O leitor necessita então de substituir, corrigir, diversificar ou alterar de acordo <strong>com</strong><br />

o seu horizonte de expectativas.<br />

Esta tese de Jauss parece corresponder à noção de desfamiliarização dos Formalistas.<br />

Contudo, para Jauss, o horizonte de expectativas é um conceito mais amplo do que o que se<br />

pode esperar de um género literário em particular. Mais do que convenções literárias, o<br />

horizonte de expectativas também indica as expectativas e as crenças de um período histórico<br />

específico. Este último, especialmente, não pode ser examinado objetivamente porque eles<br />

não podem ser declarados publicamente. A consciência histórica de que um período particular<br />

existe de modo inconsciente, que é impossível de definir objetivamente: nem o autor, nem os<br />

leitores contemporâneos nem os últimos recetores são capazes de o fazer.<br />

21


Thesis 3: Reconstructed in this way, the horizon of expectations of a work allows one to<br />

determine its artistic character by the kind and degree of its influence on a presupposed<br />

audience. If one characterizes as aesthetic distance the disparity between the given horizon of<br />

expectations and the appearance of a new work whose reception can result in a “change of<br />

horizons” through negation of familiar experiences or through raising newly articulated<br />

experiences to the level of consciousness, the this aesthetic distance can be objectified<br />

historically along the spectrum of the audience’s reactions and criticism’s judgment<br />

(spontaneous success, rejection or shock, scattered approval, gradual or belated<br />

understanding).<br />

[«Tese 3: Reconstruído desta forma, o horizonte de expetativas de uma obra permite determinar o seu<br />

caracter artístico, pelo tipo e pelo grau da sua influência, numa pressuposta audiência. Se um se caracteriza <strong>com</strong>o<br />

distância estética, a disparidade entre o horizonte de expetativas dado e o aparecimento da nova obra, cuja receção<br />

pode resultar numa “mudança de horizontes” através da negação das experiencias familiares, ou através de um<br />

aumento de experiencias acabadas de expressar ao nível da consciência, a distância estética pode ser<br />

historicamente especificada ao longo do espectro da reação da audiência e do julgamento crítico.»]<br />

A distância estética é a palavra-chave desta tese. Jauss usa este conceito para<br />

distinguir a literatura e a escrita, noutras palavras, para responder a pergunta: “Quando é que<br />

a escrita se torna literatura e quando é que é adequada apenas para o entretenimento?”.<br />

Como já foi dito, um leitor aborda um novo texto <strong>com</strong> um horizonte de expetativas particular.<br />

Se o texto afirmar simplesmente o que o leitor espera dele, o leitor não terá necessidade de<br />

ajustar as suas expetativas. Por outras palavras, a distância estética é pequena. Por outro lado,<br />

se o texto exigir que o leitor ajuste ou altere as suas expetativas, a distância estética é<br />

significativa. Nesta perspetiva, a distância estética está ao serviço <strong>com</strong>o uma medida para<br />

estimar o valor literário de um texto. A leitura prazerosa, romances de mesinha de cabeceira,<br />

provavelmente incluir-se-ão na categoria de textos que têm pouca, ou não têm, distância<br />

estética do horizonte de expetativas do leitor. Estes textos dificilmente serão considerados<br />

<strong>com</strong>o cânone literário. Por outro lado, há textos que deixam o leitor inquieto, perturbado ou<br />

confuso. Estes textos são os que desafiam a distância estética e os horizontes de expetativas<br />

dos leitores.<br />

Narrativa<br />

Categorias narrativas:<br />

História A sua articulação dá-nos a estratégia de<br />

Discurso toda a narrativa<br />

Personagens<br />

Espaço (social, físico, psicológico, etc.)<br />

Tempo (cronológico, psicológico, etc.)<br />

Tempo do discurso: aquele que implica todas as estratégias narrativas do narrador; decisão<br />

que ele toma ao contar a história – quando <strong>com</strong>eça a história até acabar que pode ir buscar<br />

muitos tempos.<br />

Tempo da história: duma data à outra, período onde ocorre uma história.<br />

De que trata? É o que temos de ter em conta no modo narrativa, pois ele tem de se apoiar<br />

numa referência.<br />

[no modo lírico dá-se ênfase ao sujeito, da subjetividade representada; no modo dramático trata-se do “tu”, o apelo<br />

à persuasão, o modo <strong>com</strong>o é recebida pelo destinatário]<br />

Na Literatura, na narrativa, a avaliação moral é feita através da instância narrativa que está<br />

sempre presente.<br />

22


No texto narrativo convém, apresentar a macro estrutura:<br />

1º ponto de análise: O que trata o texto?<br />

Sinopse (espécie de resumo)<br />

Acção: principal (foreground) e secundária (background)<br />

2º ponto de análise:<br />

Quem é o narrador?<br />

Quanto à presença Autodiegético: o narrador participa na ação <strong>com</strong>o personagem principal – 1ª pessoa<br />

Homodiegético: o narrador participa na ação <strong>com</strong>o personagem secundária – 1ª pessoa<br />

Heterodiegético: o narrador não participa na ação <strong>com</strong>o personagem, é exterior à<br />

história – 3ª pessoa<br />

Quanto à focalização Omnisciente: o narrador possui conhecimento ilimitado de toda a história, bem <strong>com</strong>o o<br />

íntimo das personagens. Ele sabe tudo, assumindo uma posição de transcendência no<br />

relato dos acontecimentos<br />

Interna: o narrador relata os acontecimentos, assumindo o ponto de vista de uma<br />

personagem, daí que, neste cada, o seu conhecimento se restrinja ao que a<br />

personagem vê/sabe<br />

Externa: o narrador conhece apenas o que é observável exteriormente, sabendo<br />

menos do que a personagem<br />

Quanto à posição Objetiva: narrador é imparcial, não emite juízos de valor<br />

Subjetiva: narrador defende uma posição/opinião face ao que conta<br />

Ponto de vista do narrador: se é interior ou exterior. Como é que o narrado nos dá a conhecer<br />

as coisas e <strong>com</strong>o é que eu (leitor) vejo as coisas?<br />

O tempo:<br />

O espaço:<br />

(1) Do discurso<br />

(2) Da história – é a história toda, numa biografia recua ao tempo do<br />

nascimento até ao momento presente da vida dele; período de vida; ou<br />

seja, implica uma analepse (voltar ao passado para <strong>com</strong>eçara história do<br />

início); Por vezes, no tempo do diálogo e nas cenas cénicas, a escrita<br />

decorre no tempo da história; nas cenas descritivas há uma paragem.<br />

(1) Físico: geográfico e local<br />

(2) Psicológico<br />

(3) Moral<br />

(4) Social<br />

3º ponto de análise: ação, personagens (o que está a ser narrado; intriga; eleger sobre<br />

o que é o episódio no excerto apresentado e onde entram os personagens.<br />

Personagens: ter em conta o protagonista (e os antagonistas que podem ser entidades<br />

ou forças não humanas), o conflito, a <strong>com</strong>plicação e <strong>com</strong>o esta se resolve, a<br />

<strong>com</strong>plicação e <strong>com</strong>o se ultrapassa dando à resolução.<br />

4º ponto de análise: linguagem. Temos de ver se é um discurso inteligível, se é<br />

racional, se tem uma ordem lógica, <strong>com</strong>o é o nível de língua, <strong>com</strong>o apresenta o<br />

discurso em determinados momentos.<br />

5º ponto de análise: Conclusão. O texto <strong>com</strong>o figura. Os textos podem ser míticos,<br />

alegóricos, irónicos, paradoxais, anafóricos, etc.<br />

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