1 Identidades e Representações: Significados Associados ... - Anpad
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<strong>Identidades</strong> e <strong>Representações</strong>: <strong>Significados</strong> <strong>Associados</strong> ao Consumo de Pirataria<br />
Autoria: Talita de Oliveira Trindade<br />
Resumo: A comercialização de produtos falsificados tem crescido drasticamente em todo o<br />
mundo, fazendo com que a indústria formal e os governos enfrentem batalhas diárias. No<br />
Brasil, estima-se que cerca de 5% do PIB seja fomentado pela comercialização de produtos<br />
pirateados. Não obstante, é possível que o Governo perca cerca de R$ 160 bilhões em<br />
arrecadações oriundas de contrabando, sonegação e falsificação. O fenômeno da falsificação<br />
tem sido intensamente investigado sob a ótica da produção, enquanto a compreensão das<br />
motivações de compra dos indivíduos é pouco explorada. No entanto, o presente estudo busca<br />
investigar as associações atreladas ao consumo de produtos falsificados, no que servem a<br />
compreender a construção da identidade e representação social. Para isso, valeu-se do método<br />
qualitativo de pesquisa, a partir da utilização de duas técnicas etnográficas: observação<br />
participante e entrevistas em profundidade, a fim de verificar as associações intrínsecas e<br />
extrínsecas referentes ao consumo e ao comportamento de indivíduos de diferentes classes<br />
sociais diante do ato de compra. O Princípio da Visibilidade, conceito a partir do qual as<br />
informações coletadas foram analisadas e sistematizadas em um conjunto de conclusões,<br />
evidenciam a alta valorização do olhar do outro e uma nova lógica do efeito trickle-down.<br />
O mercado de falsificações<br />
Pirata: “homem marginal que, de forma autônoma ou organizado em grupos, promove saques<br />
a navios e a cidades”. O estereotipo mais conhecido do pirata se refere aos piratas das<br />
Caraíbas e cuja época áurea ocorreu principalmente entre os séculos XVI e XVIII.<br />
(ENCICLOPÉDIA LARROUSSE, 1993).<br />
Atualmente utilizado para se referir à cópia não-autorizada e à distribuição ilegal de material<br />
sob direito autoral, especialmente música, imagem, vestuário e software, o primeiro a usar o<br />
termo pirata para descrever aqueles que pilhavam os navios e cidades costeiras foi Homero,<br />
na Grécia antiga.<br />
Os tempos passaram e a idéia até mesmo lúdica da pirataria foi substituída pelo conceito de<br />
“Pirataria Moderna”. Este termo diz respeito à venda ou distribuição de material sem o<br />
pagamento dos direitos autorais, portanto, apropriação com plágio ou cópia de uma obra,<br />
configura uma infração deliberada à legislação que protege a propriedade artística ou<br />
intelectual (ISTO É ONLINE, 2006).<br />
Até 2004, o Brasil representava o quarto maior consumidor de produtos piratas do mundo e o<br />
segundo maior comprador de discos falsificados, perdendo apenas para a China e, ainda<br />
segundo o Sindicato dos Fiscais da Fazenda, o Brasil perde com a pirataria e o contrabando<br />
1,5 milhão de empregos por ano e cerca de US$ 10 bilhões de arrecadação. Neste sentido, a<br />
pirataria, envolve os mais diversos produtos, desde roupas, utensílios domésticos, remédios,<br />
livros e qualquer outro tipo de produto que possa ser copiado. Segundo pesquisas realizadas<br />
pela Indústria Fonográfica (2003), a cada dez CD’s legítimos, cinco são piratas, e outros<br />
tantos são copiados pela Internet.<br />
Os danos gerados pela pirataria, bem como suas proporções, alcançaram níveis tão<br />
significativos, que fomentaram a criação da Lei Anti-pirataria (10.695 de 01/07/2003 do<br />
1
Código de Processo Penal), que pune os que desrespeitam a licença de copyright e,<br />
dependendo dos casos, a pena pode chegar a 4 anos de reclusão (MINISTÉRIO DO<br />
PLANEJAMENTO, 2006).<br />
Dentre os consumidores de pirataria, 94% deles são jovens, entre 14 e 24 anos, que afirmam<br />
consumir produtos pirateados constantemente. Incrivelmente, esses jovens têm escolaridade e<br />
renda superior à media brasileira e afirmam consumir tais produtos em função dos altos<br />
preços dos produtos originais. O grande problema é que os jovens, pertencentes à classe B<br />
(54%), em sua maioria, não são capazes de perceber a relação entre os produtos falsificados e<br />
o crime organizado (IBOPE, 2005).<br />
Ainda de acordo com a pesquisa do Ibope, dentre os principais produtos consumidos estão<br />
CD’s, DVD’s, produtos eletrônicos e softwares, 82%, 60% e 31%, respectivamente. Em geral,<br />
os consumidores de produtos falsificados são provenientes de famílias que mantém esse<br />
hábito ao longo de anos (JORNAL DO COMMERCIO, 2006), o que reforça o fato de que o<br />
consumo de produtos pirateados é permeado não só por motivações financeiras, mas também<br />
culturais.<br />
O conceito de falsificação<br />
Diversos autores abordaram a definição sobre o que consiste uma falsificação. Com o<br />
decorrer do tempo, nota-se que a noção tornou-se muito mais aprimorada. Mas, não há uma<br />
única definição, o que pode ser verificado pelas definições abaixo.<br />
A questão da falsificação de marcas para fins comerciais foi inicialmente tratada por Bamossy<br />
e Scammon (1985), que descrevem esse fato como a prática fraudulenta de afixar uma<br />
denominação comercial para um produto. Os autores indicam uma similaridade com a<br />
imitação, porém, deixam claro que esta não é idêntica, pois significa uma cópia do original,<br />
fazendo com que não seja efetivamente uma falsificação porque não é suficientemente<br />
similar. Tratam-se, por exemplo, de práticas que imitam a embalagem, mas não falsificam o<br />
produto.<br />
Grossman e Shapiro (1988) definem falsificação como infração à marca e dividem o mercado<br />
em duas categorias:<br />
Consumidores que não podem observar a qualidade do bem que compram;<br />
Consumidores que não podem distinguir uma cópia de uma mercadoria autêntica.<br />
Porém, há consumidores que sabem ou suspeitam que a mercadoria seja falsa, distinguem por<br />
meio de inspeção de perto ou pela forma de venda, local ou preço e ainda assim adquirem o<br />
produto, tornando-se cúmplices da prática fraudulenta.<br />
Chakraborty et al (1996, 1997) corroboram com Grossman e Shapiro, e definem falsificação<br />
como toda cópia não autorizada, vendida como produto legítimo. Os autores reconhecem que<br />
há transações que decepcionam o consumidor e aquelas que não decepcionam, pois o<br />
consumidor está ciente da falsificação quando compra o produto.<br />
Baize (1999), por sua vez, aprofunda seus estudos sobre o entendimento do termo, e procura<br />
identificar os elementos de definição da falsificação, ou imitação pura, que é uma reprodução<br />
idêntica de um produto original através da consideração de seus símbolos distintivos. É a<br />
oferta de um produto cujo aspecto exterior é o mais próximo possível do original, através da<br />
2
eprodução da embalagem, marca, logotipo, cores e formatos do produto ou da empresa<br />
original. A empresa que falsifica usurpa a identidade e imagem de uma outra e, algumas<br />
vezes, tem no consumidor um cúmplice. Especialmente nos casos de produtos que portam<br />
marca e imagem fortes, expressivas e altamente conceituais.<br />
Ainda de acordo com Baize, os consumidores de produtos falsificados não são excompradores<br />
ou futuros consumidores de produtos genuínos. A imitação reflexiva empresta<br />
do produto original algumas de suas características, mas conserva características que são<br />
específicas suas, por exemplo, a marca da empresa que está efetuando a cópia. O conceito de<br />
produto é copiado, oferecendo as mesmas funções principais e dessa forma pode ser<br />
considerado como um produto concorrente. Portanto, o objetivo da imitação reflexiva não é<br />
enganar, mas arbitrar entre o original e a cópia.<br />
Zaichkowsky (1995) trata a questão da similaridade, afirmando, inicialmente, que a<br />
falsificação é relativamente fácil de identificar, pois é efetivamente uma cópia direta. Já uma<br />
imitação não é necessariamente uma cópia direta e por isso é difícil de definir, identificar e<br />
rotular como ilegal, e, portanto de ser prevenida. Imitação de marcas lida com similaridades e<br />
não diferenças. O similar é muitas vezes uma questão de percepção individual do que é<br />
realidade. O que pode ser percebido e definido como ilegal no mercado, pode não ser<br />
percebido e definido pelos indivíduos como tal. Posteriormente, ao lado de Wilke (1999),<br />
afirmará que as falsificações são feitas diretamente, como uma cópia, e as imitações<br />
emprestam alguns aspectos e atributos do produto original.<br />
Finalmente, Gentry et al (2001) abordaram o problema de forma bastante esclarecedora, ao<br />
afirmarem que a maior dificuldade de se tentar separar claramente o que é uma imitação de<br />
uma falsificação deriva do fato de não serem classes separadas claramente, mas um<br />
continuum. Como pode ser visto no quadro abaixo, o produto pode ser uma cópia autorizada,<br />
uma produção extra não autorizada pelo fabricante, boa cópia de alguns atributos importantes<br />
até uma cópia mal feita de atributos importantes.<br />
Quadro 1: Continuum das falsificações<br />
Item genuíno<br />
Produtos<br />
originais com<br />
garantia de<br />
qualidade total.<br />
Item de segunda<br />
classe<br />
Produtos<br />
autorizados pelo<br />
fabricante, com<br />
pequenos defeitos<br />
ou antigos.<br />
Excedente Cópia legítima<br />
Produtos<br />
produzidos sem<br />
autorização do<br />
fabricante.<br />
Comerciantes<br />
copiam design de<br />
casas de moda<br />
(lojas e revistas).<br />
Fonte: Strehlau (2001)<br />
Falsificação de<br />
alta qualidade<br />
Produtos não<br />
produzidos pelos<br />
padrões originais,<br />
mas similares em<br />
atributos-chave.<br />
Falsificação de<br />
baixa qualidade<br />
Produtos<br />
significativamente<br />
diferentes do original<br />
em diversos<br />
atributos-chave.<br />
O presente estudo pretende verificar quão aplicáveis são os conceitos apresentados pelos<br />
autores, tendo em vista como principais referências as postulações de Baize e Gentry et al,<br />
descritas anteriormente. No entanto, prevalecerão as categorias e definições apontadas pelos<br />
respondentes durante a consecução das entrevistas.<br />
A questão da identidade<br />
A análise histórica da construção da identidade deve passar, ao menos, por 3 períodos, como<br />
orienta Stuart Hall (2005). Assim, faz-se necessário observar a transformação do sujeito desde<br />
sua fase iluminista, passando pelo seu “eu” sociológico, até chegar ao indivíduo pós-moderno,<br />
3
objeto de análise do trabalho, para que seja possível caracterizar o sujeito cuja identidade<br />
apresenta certa fluidez.<br />
Após duas guerras mundiais e tantos outros eventos que marcaram época, a idéia de um<br />
sujeito estável e unificado segue em direção à fragmentação e pluridentidades, que podem ser<br />
até mesmo contraditórias entre si, sendo isso resultado de toda a modificação acelerada<br />
estrutural e institucional, como propõe Hall (2005).<br />
Alguns autores atribuem características próprias para o sujeito pós-moderno. Zigmun Bauman<br />
(2001) atribui a característica de fluidez à nova identidade humana. Segundo ele, o sujeito<br />
pós-moderno é capaz de ocupar espaços êmicos, fágicos, vazios e até mesmos não-lugares,<br />
uma vez que tem as “bençãos” da liberdade de sua identidade e representação social.<br />
Outro autor importante, Gilles Lipovetsky (2004), afirma que o termo “pós-modernidade” não<br />
é adequado para a descrição e análise dos tempos atuais, pois é demasiadamente ambíguo,<br />
problemático e mesmo incorreto, já que engendra um sentido de um para além da<br />
modernidade, marcando uma evidência de ruptura em relação aos modelos que alicerçavam a<br />
noção do individualismo moderno. Segundo o autor, a pós-modernidade foi, no máximo, uma<br />
fase de transição ocorrida entre os anos 60 e 80, que fez entrar em cena a figura inédita do<br />
indivíduo autônomo, liberto dos freios institucionais, das ideologias políticas e das normas da<br />
tradição, característicos da modernidade.<br />
Para tanto, é sugerido o termo hiper-modernidade. Primeiramente, porque reforça a idéia de<br />
que não estamos em uma sociedade pós-moderna, mas em uma outra modernidade. E<br />
finalmente, pois há inúmeros indícios que conduzem a pensar que vive-se a era onde tudo se<br />
tornou “hiper”, hipercidades, hipermercados, hiperpotências, hiperterrorismo,<br />
hipercapitalismo, uma cultura do excesso, cujos pilares se assentam nas noções de<br />
hipermodernidade, hiperconsumo e hipernarcisismo (LIPOVETSKY, 2004).<br />
Nesse contexto, é fundamental delimitar o quão significativo é o consumo para o sujeito pósmoderno.<br />
Consumir, seja para fins de satisfação de necessidades básicas ou “supérfluas”, duas<br />
categorias básicas de entendimento da atividade de consumo nas sociedades ocidentais<br />
contemporâneas, é uma atividade presente em toda e qualquer sociedade humana<br />
(BARBOSA, 2004).<br />
Cabe ainda expor, no que diz respeito às diversas facetas da representação social, a questão do<br />
“olhar do outro”, como propõe Fernanda Bruno (2005), ao questionar o impacto do olhar<br />
externo sobre a construção da subjetividade dos indivíduos. Sob a ótica sociocultural, é<br />
possível construir um caminho para traçar a construção da subjetividade a partir de uma série<br />
de cuidados e controles do comportamento, da conduta, do decoro corporal externo, das<br />
práticas de limpeza, de saúde e de beleza que se constituem inicialmente numa forte atenção<br />
ao olhar do outro (ELIAS, 1994). Este cuidado com o que é imediatamente visível ao outro é<br />
um aspecto fundamental tanto no âmbito das relações sociais, das normas, regras de conduta e<br />
codificação dos costumes no processo civilizador (ELIAS, 1994), quanto no universo da<br />
subjetividade, da interioridade, da intimidade. A hipótese histórica é a de que a atenção e o<br />
cuidado com o olhar do outro vão sendo progressivamente interiorizados e constituindo todo<br />
um campo de cuidados consigo, de autocontrole, autoregramento e autovigilância, que passam<br />
a reger a esfera íntima e privada.<br />
4
O Princípio de Visibilidade, por sua vez, prevê a necessidade do indivíduo de se expor e<br />
destacar-se dentre os demais, mesmo que seja sobre um ideal de identidade pretendida ainda<br />
distante da sua realidade. E é interessante observar a sua aplicabilidade na lógica do consumo<br />
de pirataria. É possível que o princípio de visibilidade, que já se sobrepôs ao princípio de<br />
realidade no âmbito mais amplo da inserção do indivíduo de classes inferiores na sociedade,<br />
que requerem a visibilidade como uma espécie de direito ou condição almejada de<br />
legitimação e reconhecimento, tenha encontrado no mecanismo de cópia uma ferramenta<br />
capaz de legitimar sua necessidade.<br />
Uma vez engendrados as postulações de Bauman (2001) e Elias (1994), o trabalho busca<br />
verificar a aplicabilidade do princípio da visibilidade e o impacto do olhar do outro, como<br />
propõe Fernanda Bruno, no que diz respeito ao consumo falsificações.<br />
Finalmente, o estudo observa, ainda, a possível existência da noção de “uniforme informal”,<br />
recorrente em estudos etnográficos, que trata da semelhança encontrada no modo de vestir e<br />
na utilização de objetos, que identificam membros de determinados grupos. Nesse caso, os<br />
exemplos são muitos, podendo ser citados desde aqueles com interesses bastante específicos e<br />
fortemente integrados – como os motoqueiros Harley Davidson (SCHOUTEN,<br />
MCALEXANDER, 1995) – até outros mais genéricos e dispersos, como executivos<br />
(WICKLUND, GOLLWITZER, 1982, apud BELK, 1988).<br />
Consumo<br />
A questão do consumo deve ser analisada, como propõe Mckendrick (1983), como uma<br />
Revolução à parte da Revolução Industrial e sem qual, sob o ponto de vista da demanda, essa<br />
não teria sido possível. O autor enfatiza o fato de que tal revolução na forma de consumir<br />
representa não só uma transformação de preferências ou hábitos de compra, mas uma<br />
alteração na cultura mundial. Dessa forma, deve ser encarada como um fator de transformação<br />
dos conceitos de tempo, espaço, indivíduo, sociedade, estado e família.<br />
Os primeiros registros do consumo sob a faceta da modernidade descrevem um cenário<br />
dramático, equiparado a uma “orgia do gasto” (MCKENDRICK ET AL, 1982) e a um<br />
“mundo de sonho” (WILLIAMS, 1982). Isso, como sugerem os autores, porque o consumo<br />
demasiado, desde os tempos de Elizabeth I, em Londres, tem sido responsável pela<br />
transformação de uma série de valores da sociedade ocidental.<br />
O consumo é algo tão significativo nas sociedades modernas, que o termo Sociedade do<br />
Consumo, ao lado de expressões como Sociedade da Informação e Sociedade do<br />
Conhecimento, são freqüentemente utilizados para descrever não mais o fim de uma época,<br />
mas para reforçar características da sociedade pós-moderna. Em todas as sociedades, os<br />
indivíduos lançam mão do consumo para se reproduzirem física e socialmente, e para isso<br />
manipulam objetos carregados de atributos simbólicos de diferenciação, atribuição de status,<br />
pertencimento e gratificação pessoal.<br />
Autores como Baudrillard (1995), McKendrick (1982) e Willian (1982), defendem que a<br />
sociedade há muito se apropria especificamente de signos e significados associados ao<br />
consumo. Entretanto, outras linhas, como defende Lipovetsky, afirmam que a sociedade do<br />
consumo vai além e tem como principal característica a permanente sensação de<br />
insaciabilidade e o descarte constante.<br />
5
É importante ressaltar que a Sociedade do Consumo aponta para duas esferas complementares<br />
acerca de sua aplicação, subsidiadas por diferentes linhas de estudo. Por um lado, a Sociedade<br />
do Consumo dá conta de um tipo específico de consumo, nesse caso, o consumo de signos,<br />
que podem assumir significados diversos, como defende Baudrillard (1995). Entretanto,<br />
outros autores apontam para o consumo além do consumo de signos comoditizados e<br />
assumem o consumo das massas e para as massas, a alta taxa de mercadorias, a forte relação<br />
da sociedade com a moda, o surgimento da sociedade de mercado, o constante sentimento de<br />
insaciabilidade e o indivíduo visto como consumidor (BARBOSA, 2004).<br />
Para efeito de análise, o trabalho apropria-se da primeira esfera citada, postulada por<br />
Baudrillard (1995), associada à assertiva de Campbell (1983), de que “o self é construído<br />
através do consumo e que o consumo expressa o self”.<br />
Deve-se retomar, ainda, a emergência do efeito trickle-down, que assume novas formas e<br />
proporções na Sociedade do Consumo. O termo postulado por Simmel (1904) prevê a ação de<br />
duas forças-motrizes para o desenvolvimento da moda. Grupos inferiores, ou subordinados,<br />
buscam, através da imitação, o status imposto pelas classes superiores através de seu<br />
vestuário. Estes, por sua vez, buscam a diferenciação através de novos signos e significados,<br />
que restabeleçam a relação hierárquica da situação anterior. O estudo propõe, entretanto, a<br />
ampliação do conceito para a relação original versus falsificado, visto que tratam-se de<br />
lógicas bastante semelhantes de imitação e recriação, ainda que seja notável o consumo dos<br />
bens falsificados pelas classes superiores, fato identificado por inúmeros autores e entidades –<br />
públicas e privadas – e que o torna objeto de estudo. Tal prática, em geral, acontece quando os<br />
objetos são explorados intensamente pela mídia, como é o caso de roupas e acessórios<br />
utilizados por personagens de novelas, que rapidamente figuram nos mercados populares.<br />
Metodologia<br />
O objetivo do estudo é verificar as associações intrínsecas e extrínsecas que permeiam o<br />
consumo de produtos pirateados, no que servem a compreender a construção da identidade e<br />
representação social.<br />
Por se tratar de um tema complexo e de natureza social, a pesquisa classifica-se como<br />
qualitativa, uma vez que esse método privilegia o entendimento do contexto social e cultural<br />
como fatores influenciadores do fenômeno estudado. Não obstante, o método considera a<br />
existência de uma relação ativa entre a realidade e o sujeito analisado, e tem como foco o<br />
processo em detrimento do resultado final, o que viabiliza um relacionamento mais longo e<br />
flexível com os entrevistados e exclui a necessidade de quantificação dos resultados (DIAS,<br />
1999).<br />
A pesquisa foi realizada na cidade do Rio de Janeiro, nas zonas Oeste e Sul, tendo como filtro<br />
para seleção dos respondentes, o consumo de produtos pirateados no período de até 12 meses<br />
anteriores à realização da entrevista. Ou seja, somente foram considerados respondentes aptos<br />
aqueles que consumiram produtos falsificados até 12 meses antes do momento da entrevista.<br />
A coleta de dados a partir da conjugação de duas técnicas etnográficas. Primeiramente, foi<br />
utilizado um procedimento de observação participante. Essa técnica, considerada uma das<br />
mais precisas em ciências sociais (GIL, 2006), foi usada com o objetivo de coletar impressões<br />
6
e informações do respondente em seu estado natural de consumo, sem viés, uma vez que os<br />
indivíduos estariam em uma situação mais confortável, distantes da posição de objeto de<br />
análise. Assim, foram visitados os pontos-de-venda de produtos falsificados, onde não só<br />
observou os indivíduos, mas também interagiu com os informantes, a fim de identificar suas<br />
razões de compra.<br />
Em um segundo momento foram realizadas entrevistas pessoais em profundidade junto a<br />
indivíduos pertencentes às classes A, B, C e D, cuja categorização foi feita através da<br />
aplicação do Critério Brasil. As entrevistas foram realizadas a partir de um roteiro semiestruturado,<br />
que as orientou por meio de uma seqüência lógica de temas a serem tratados.<br />
Uma vez coletados os dados, estes foram organizados e analisados a cada etapa. As categorias<br />
que regem o consumo de pirataria emergiram dos próprios dados relatados pelos indivíduos.<br />
Essas características foram, por sua vez, confrontadas com alguns dados demográficos, como<br />
idade e classe social, para que se verificassem os pressupostos citados anteriormente.<br />
Finalmente, as conclusões foram elaboradas de acordo com os resultados obtidos em ambas as<br />
etapas de análise.<br />
Principais resultados<br />
Os resultados gerados pela observação participativa elucidam, principalmente, o consumo de<br />
produtos falsificados. É importante compreender a mecânica desse consumo, para que se<br />
possa tratar efetivamente de questões ligadas à construção da identidade e representação<br />
social, aprofundadas nas entrevistas pessoais. Dentre os resultados alcançados na primeira<br />
etapa de investigação, destacam-se aqueles relacionados à produção e comercialização dos<br />
bens, cuja compreensão facilitará a leitura da etapa seguinte.<br />
Observou-se uma clara relação de cooperação entre fornecedor e comprador. Há<br />
consumidores, principalmente de classes sociais mais altas, que têm por hábito comprar<br />
falsificações de boa qualidade sempre com um mesmo vendedor. Nesse caso, é comum<br />
encomendarem mercadorias.<br />
Os produtos mais comprados durante a semana são DVD’S, eletrônicos de baixo valor e<br />
roupas. Nos finais de semana, período em que as compras tendem a ser planejadas, a venda de<br />
roupas e eletrônicos mais caros aumenta exponencialmente.<br />
Pôde-se identificar, ainda, a existência de uma cadeia produtiva de produtos falsificados<br />
bastante desenvolvida.<br />
“Meu fornecedor sempre me traz o que está no cinema. Já é a segunda vez que ele atrasa, os<br />
clientes vêm procurar e não encontram, aí eu que acabo perdendo. Para o próximo mês eu<br />
vou trocar de fornecedor.” (Vendedora de CD’s e DVD’s falsificados, classe D)<br />
Os DVD’s são disponibilizados para a venda nos mercados populares logo que entram em<br />
cartaz nos cinemas, o que gera um diferencial para o mercado de falsificações em detrimento<br />
do mercado de produtos originais. Em geral, esses produtos são procurados por consumidores<br />
de perfil imediatista, que anseiam por saber das novidades antes da maioria da população,<br />
para gerarem visibilidade sobre seu conhecimento acerca dos filmes. São pessoas que, muitas<br />
vezes, buscam informações profundas sobre o conteúdo dos discos, o que legitima seu<br />
conhecimento e, conseqüentemente, a imagem pretendida perante o grupo.<br />
7
Deve-se atentar, no entanto, para o fato de que a compra de DVD’s originais ainda representa<br />
uma aquisição de valor, tanto que, diferentemente dos CD’s de música, as embalagens são<br />
guardadas e compõem grandes videotecas.<br />
Em geral, a freqüência de compras por impulso é alta durante a semana, principalmente por se<br />
tratarem de locais de passagem, onde as pessoas freqüentam nos intervalos do trabalho.<br />
Muitas vezes, o baixo preço de marcas reconhecidas, falsificadas, atrai o olhar dos<br />
consumidores, que efetivamente vivenciam o prestígio da marca e as utilizam como algo<br />
original.<br />
Sujeitos de classe A/B, quando compram roupas de marca falsificadas, procuram ir até o<br />
ponto-de-venda em horários alternativos, em locais freqüentados por outras pessoas com o<br />
mesmo perfil, porém em momentos em que julguem ter mais privacidade para efetuar a<br />
compra. Ou seja, ainda que o consumo seja socialmente aceito, há uma preocupação com<br />
olhar do outro, que pode indicar reprovação, e não cumplicidade.<br />
De forma geral, observa-se que ambos os indivíduos de classes A, B, C e D procuram por<br />
produtos de marcas conhecidas, porém, em diferentes situações de compra e com diferentes<br />
finalidades. Quando questionados acerca dos diversos papéis sociais que ocupam, a maior<br />
parte dos entrevistados estruturou seu discurso de forma a enfatizar sua popularidade e<br />
capacidade de liderança dentro dos grupos a que pertencem. Alguns foram além e se autodescreveram<br />
como exemplos a serem seguidos e isso, segundo eles, exige um determinado<br />
padrão de comportamento e também de vestuário, como ilustra a fala de um dos informantes:<br />
“Como eu sou um dos mais antigos do condomínio, tenho que dar o exemplo, e a forma como<br />
me visto, como falo e me comporto é muito importante.” (Estudante, classe A)<br />
Em algumas situações, os respondentes afirmam ser os responsáveis por “criar moda” nos<br />
seus grupos. Dessa forma, nota-se, inicialmente, a aplicabilidade marcante de dois dos<br />
conceitos apresentados anteriormente. Uma vez como líderes, os indivíduos utilizam-se do<br />
princípio da visibilidade como instrumento de legitimação da posição pretendida.<br />
Conseqüentemente, os liderados tendem a copiá-lo e, com isso, observam-se os primeiros<br />
indícios do efeito trickle-down, em um universo micro, onde os padrões trafegam no sentido<br />
de um sujeito socialmente reconhecido como líder para os demais componentes do grupo, que<br />
passam a adotar um uniforme informal.<br />
Diante desse contexto, peças de vestuário e tecnologia são importantes instrumentos<br />
utilizados para atrair o olhar do outro, que hora designa admiração, hora designa reprovação.<br />
Para o primeiro caso, recomenda-se o uso do original, entretanto, as boas falsificações são<br />
permitidas, desde que o uso tenha sido previamente acordado pelo grupo. Em situações pouco<br />
formais, o uso de falsificações de má qualidade também é aceito por indivíduos de todas as<br />
classes sociais observadas e é nesse momento que surgem as categorizações dos<br />
consumidores para esse mercado.<br />
O uso de falsificações começa a ser restringido quando há risco de associação da “idéia de<br />
falso” à imagem do indivíduo. Assim, gera-se um gap de imagem, que pode ser um limitador<br />
de relacionamentos sociais, pondo em risco até mesmo a posição de liderança citada<br />
anteriormente.<br />
8
É importante observar que novos candidatos a membros dos grupos tendem a utilizar produtos<br />
originais, quando têm acesso, ou falsificações idênticas, quando o preço é uma barreira para a<br />
compra do original. Há vezes em que algum membro do grupo “rebela-se” e passa a utilizar<br />
falsificações irrestritamente, dentro de sua própria tolerância, adotando-as como um estilo<br />
próprio, que pretende designar liberdade e rompimento.<br />
Nota-se que, mesmo que o entrevistado não se dê conta, a possibilidade de que os outros<br />
reconheçam o não-original tão facilmente é motivo de desconforto pois, nesse caso, não<br />
houve um acordo prévio acerca do uso, ou ainda, o acordo foi quebrado quando o indivíduo<br />
optou pelo uso das falsificações como instrumento de auto-expressão.<br />
O continuum proposto por Strehlau (2001) foi um importante referencial para ma<br />
compreensão inicial do mercado de falsificações. No entanto, os indivíduos não reconhecem<br />
as nuances apresentadas como diferenças efetivas. Os indivíduos tendem a organizar os<br />
produtos da forma o mais simples possível, como ilustra o quadro 2.<br />
Quadro 2: Categorias de produtos<br />
Produtos originais<br />
- Produtos vendidos em lojas<br />
reconhecidas;<br />
- Alto valor agregado à<br />
marca;<br />
- Visibilidade garantida.<br />
Produtos falsificados<br />
Bons<br />
- Produtos com bom<br />
acabamento;<br />
- Normalmente, possuem<br />
etiquetas similares às<br />
originais;<br />
- Amplamente aceitos pelos<br />
grupos;<br />
- O uso pode estar associado<br />
a esperteza;<br />
- Categoria em que se<br />
enquadram os “genéricos” e<br />
“falsis”.<br />
Produtos falsificados<br />
Ruins<br />
- Produtos com acabamento<br />
mal feito;<br />
- Em alguns casos, podem<br />
ser motivos de brincadeira<br />
nos grupos;<br />
- O uso é permitido em uma<br />
quantidade restrita de<br />
situações;<br />
- Categoria em que se<br />
encontram os “similares”.<br />
Fonte: Talita Trindade (2006)<br />
Produtos roubados<br />
- Produtos oriundos de<br />
cargas roubadas;<br />
- o uso é velado e condenado<br />
mesmo por quem costuma<br />
consumi-los.<br />
Todos os informantes utilizaram, em algum momento da entrevista, “apelidos” como<br />
“similar”, “genérico” e “falsi”, numa tentativa de amenizar o peso das palavras falsificação e<br />
pirata. Dessa forma, cabe tratar acerca da questão ética relacionada a esse mercado. A<br />
possibilidade de ser um consumidor de genéricos e não de falsificações, transfere a imagem<br />
que antes era a de contraventor, para a de um justiceiro, ou seja, uma pessoa socialmente<br />
responsável, que gera empregos na sua comunidade. Conseqüentemente, espera-se que o olhar<br />
do outro sobre o ato de consumo de pirataria seja alterado, o que faz com que a sociedade<br />
entre em um círculo vicioso, em que a ética passa a transitar em uma nova esfera, cujos<br />
referenciais são relativizados, e não infringidos.<br />
No que diz respeito a roupas, algumas questões devem ser ponderadas. Ambos os indivíduos<br />
de classes A/B e C/D procuram por marcas conhecidas, principalmente no caso de camisetas e<br />
acessórios com o logotipo das marcas. A principal diferença no consumo, entretanto, está na<br />
forma de uso.<br />
9
Notou-se que sujeitos de classes superiores buscam produtos falsificados para ir para à<br />
academia, escola ou faculdade. Eventos mais sofisticados são acompanhados por produtos<br />
originais, para que o risco social seja minimizado. Já os indivíduos de classes mais baixas<br />
utilizam os produtos falsificados em dois momentos específicos:<br />
Produtos falsificados bons, com melhor acabamento, são utilizados em ocasiões<br />
especiais, como idas à festas e igrejas, por exemplo. Para isso, os indivíduos se<br />
dispõem a pagar um pouco mais caro pelas falsificações e a efetuar a compra em<br />
locais freqüentados por sujeitos de maior poder aquisitivo. Isso acontece, pois estes<br />
teriam acesso aos produtos originais e ainda assim preferem os falsificados. Logo, o<br />
lugar onde adquirem as falsificações deve comercializar produtos o mais próximo dos<br />
originais possível. Dessa forma, a compra de falsificações não é condenada, mas vista<br />
como uma indicação de roupas e acessórios que “devem ser usados”, o que reforça o<br />
efeito trickle-down.<br />
“Se eles quisessem poderiam comprar nas lojas. Pra comprarem aqui é porque as<br />
roupas são iguais mesmo, então eu venho.” (Estudante, classe D)<br />
Falsificações ruins são utilizadas no dia-a-dia e os informantes afirmam não fazerem<br />
questão de esconder que os produtos foram comprados em camelôs e mercados<br />
populares.<br />
Com essa diferenciação, os indivíduos buscam transmitir diferentes impressões acerca de si,<br />
em função dos diferentes papéis sociais desempenhados ao longo do dia. Este cuidado com o<br />
que é imediatamente visível ao outro é um aspecto fundamental no âmbito das relações<br />
sociais, como propôs Elias (1994). Assim, acredita-se que a atenção e o cuidado com o olhar<br />
do outro vão sendo progressivamente internalizados e constituindo um campo de cuidados<br />
consigo, de autocontrole e autoregramento que passam a reger a esfera íntima e privada, ou<br />
seja, passam a constituir a identidade do indivíduo, sua consciência moral e valores sociais.<br />
Note-se que para sujeitos com alto poder aquisitivo, o consumo pode estar associado a<br />
esperteza:<br />
“Eu costumo usar roupas de marca, sim. Aliás, se eu pudesse me vestiria com marcas<br />
famosas dos pés à cabeça, o tempo todo, mas ficaria muito caro. Se o produto for bom,<br />
ninguém vai dizer que é pirata, ainda mais se for eu usando!” (Estudante, classe A)<br />
Nesse caso, o consumo das falsificações é um ato secreto, pois a ampla revelação para os<br />
demais poderia gerar desapontamento. Além disso, o sujeito transmite a impressão de uma<br />
identidade fortemente construída sobre a aquisição e exposição de produtos originais, que<br />
garantem a ele a possibilidade do uso de itens falsificados sem que esses interfiram<br />
imediatamente na sua imagem.<br />
A seguir, no quadro 3, observa-se uma organização das categorias de produtos em função das<br />
inúmeras situações de compra e possibilidades de uso. O quadro considera as características<br />
de todas as classes sociais analisadas e resumo o que fora apresentado.<br />
10
Quadro 3: Organização dos aspectos subjetivos ligados ao consumo de pirataria.<br />
Situação de<br />
compra<br />
Uso<br />
permitido<br />
Original<br />
Categorias de produtos<br />
Falsificado Bom Falsificado Ruim Roubado<br />
Classe A/B Classe C/D Classe A/B Classe C/D Classe A/B Classe C/D Classe A/B Classe C/D<br />
- Associada ao<br />
desejo de inserção<br />
em novos grupos<br />
sociais.<br />
- Quando<br />
adquirido para<br />
presentear alguém,<br />
principalmente<br />
pertencente ao seu<br />
grupo social.<br />
- Em novos<br />
grupos, em que há<br />
necessidade de<br />
auto-afirmação.<br />
Tem-se a sensação<br />
de que o original<br />
traduz a<br />
personalidade do<br />
indivíduo.<br />
- Em locais que<br />
envolvem<br />
conquista e, para<br />
tanto, é necessário<br />
"impressionar" o<br />
outro (Valorização<br />
do “olhar do<br />
outro”).<br />
- Em ocasiões<br />
especiais,<br />
principalmente<br />
para presentear a<br />
si mesmo ou<br />
sujeitos de classes<br />
sociais superiores.<br />
- Associado ao<br />
sentimento de<br />
auto-indulgência.<br />
- Quando é<br />
necessário estar<br />
em outros<br />
ambientes, em que<br />
a maioria utiliza<br />
bens originais, o<br />
uso não só é<br />
permitido, mas<br />
recomendado,<br />
como tentativa de<br />
inserção no meio e<br />
auto-afirmação.<br />
- Normalmente, a<br />
compra é feita em<br />
locais onde o<br />
público com perfil<br />
semelhante<br />
também efetua<br />
compras (local<br />
socialmente<br />
aceito).<br />
- Compra designa<br />
"esperteza".<br />
- Em locais onde o<br />
uso seja possível e<br />
socialmente<br />
permitido (ex.:<br />
casa, faculdade e<br />
condomínio),<br />
ainda que "não<br />
seja necessário"<br />
falar que se trata<br />
de uma<br />
falsificação.<br />
- Quando se<br />
pretende utilizar<br />
em ocasiões<br />
especiais.<br />
- Em locais em<br />
que o uso é<br />
conhecido e<br />
socialmente<br />
permitido (ex.:<br />
igrejas e festas<br />
noturnas), além de<br />
aferir certo status.<br />
- Tem-se a<br />
sensação de<br />
experimentação da<br />
marca.<br />
- Compras corriqueiras, em locais<br />
freqüentados por indivíduos de<br />
diversas classes sociais.<br />
- Em locais em<br />
que o uso é<br />
conhecido e<br />
socialmente<br />
permitido.<br />
- O uso da<br />
falsificação pode<br />
ser motivo de<br />
brincadeira dentro<br />
do grupo, porém,<br />
sem risco de<br />
constrangimento.<br />
- Mulheres são<br />
menos propensas a<br />
utilizar<br />
falsificações. De<br />
baixa qualidade.<br />
- Em locais em<br />
que o uso é<br />
conhecido e<br />
socialmente<br />
permitido.<br />
- O uso da<br />
falsificação pode<br />
ser motivo de<br />
brincadeira<br />
dentro do grupo,<br />
porém, sem risco<br />
de<br />
constrangimento.<br />
- Quando se<br />
trata de<br />
produtos com<br />
baixo valor<br />
agregado e<br />
aplicação<br />
funcional (ex.:<br />
pilhas e fones<br />
de ouvido).<br />
- Em situações<br />
em que não<br />
haja risco de o<br />
uso ser<br />
desvendado,<br />
para não haja<br />
repreensão e<br />
desapontamento<br />
dos outros.<br />
- A ética, em<br />
geral, se<br />
sobrepõe à<br />
necessidade.<br />
- Os<br />
consumidores,<br />
muitas vezes,<br />
optam por<br />
produtos nonbranded.<br />
- Quando não é<br />
efetivamente<br />
possível<br />
adquirir o<br />
original.<br />
11
Uso<br />
proibido<br />
- Em locais que<br />
representem risco<br />
físico para o<br />
usuário.<br />
- Em locais em<br />
que o excesso de<br />
visibilidade<br />
gerado pelo<br />
produto original<br />
(utilizado pelos<br />
demais) possa<br />
representar risco<br />
de descoberta e<br />
ridicularização.<br />
- Em ocasiões<br />
especiais e,<br />
principalmente,<br />
em festas e boates,<br />
por 2 motivos:<br />
1. Outros<br />
indivíduos podem<br />
estar utilizando o<br />
original;<br />
2. São ambientes<br />
que envolvem<br />
conquista e onde<br />
há grande<br />
valorização do<br />
olhar do outro<br />
sobre si.<br />
- Em locais em<br />
que possa haver<br />
sujeitos utilizando<br />
o original e,<br />
conseqüentemente,<br />
haja a<br />
possibilidade de<br />
constrangimento.<br />
Nesse caso, muitas<br />
vezes, prefere-se o<br />
non-branded.<br />
Fonte: talita Trindade (2006)<br />
- Quando<br />
inseridos em<br />
novos grupos, em<br />
que o uso de<br />
falsificações possa<br />
desprestigiar a<br />
imagem do<br />
indivíduo.<br />
- Em ocasiões<br />
especiais (ex.:<br />
festas, casas<br />
noturnas etc).<br />
- Em locais em<br />
que possa haver<br />
sujeitos<br />
utilizando o<br />
original. Nesse<br />
caso, utiliza-se o<br />
falsificado de<br />
melhor<br />
qualidade ou o<br />
non-branded.<br />
- Em situações<br />
de risco físico<br />
(punição legal).<br />
- Em situações<br />
de risco físico<br />
(punição legal)<br />
e social (em<br />
comunidades<br />
que recriminam<br />
esse tipo de<br />
consumo).<br />
12
O estudo tinha como objetivo verificar as associações que permeiam o consumo de produtos<br />
falsificados, a fim de compreender a construção da identidade e representação social sob tal<br />
perspectiva. A noção de uniforme social está associada, inicialmente, a produtos originais,<br />
que orientam a sociedade acerca de objetos, cores, formatos, marcas e padrões de uso,<br />
indicados pelas classes de alto poder aquisitivo. No entanto, na medida em que os indivíduos<br />
das classes superiores, que têm acesso aos originais, passam a adquirir cópias, estes indicam<br />
as diretrizes da moda para as classes inferiores, que observam o consumo e adotam o mesmo<br />
uniforme em um formato alternativo, financeiramente possível.<br />
Uma outra característica observada é que a pirataria permite uma “mão-dupla” do efeito<br />
trickle-down. Assim, as classes A e B, que não só têm acesso ao universo dos produtos<br />
originais, mas também uma posição social garantida, passam a transitar pelo universo das<br />
falsificações sem que haja alto risco de rejeição social. Já as classes C e D, que não têm<br />
recursos financeiros para adquirir os produtos apresentados pelas classes superiores,<br />
encontram na falsificação um meio de aquisição desses bens e, da mesma forma, vivenciam o<br />
uso das marcas e de seus artifícios simbólicos, como meios de expressão. Ou seja, há<br />
mobilidade em ambos os sentidos.<br />
Nesse sentido, é possível ainda identificar uma sensação de fluidez do sujeito, como propõe<br />
Bauman. De acordo com o autor, o sujeito pós-moderno é capaz de ocupar espaços vazios e<br />
até mesmo não-espaços diante das inúmeras possibilidades da sua identidade e representação<br />
social. Assim, o consumo de marcas pode servir como mecanismo de preenchimento de um<br />
vazio gerado pelo olhar do outro.<br />
Quanto à construção da identidade, esta é influenciada pelo consumo de falsificações na<br />
medida em que a sociedade impõe regras para o uso desses produtos. Com isso, o sujeito<br />
gradativamente desenvolve noções de autocontrole, regramento e vigilância, que são<br />
estendidos para inúmeras esferas de sua vida. A insaciabilidade do sujeito pós-moderno,<br />
traduzida pelas postulações de Lipovetsky ao atribuir o sufixo “hiper” às relações pósmodernas,<br />
é uma característica que ao mesmo tempo ilustra e reforça as falsificações. Assim,<br />
os produtos falsificados atendem aos quesitos de imediatismo e novidade requeridos por<br />
muitos consumidores, não apenas por capricho, mas pela necessidade de legitimarem uma<br />
imagem de modernidade e atualização pretendida diante do grupo.<br />
Finalmente, o princípio da visibilidade foi, na verdade, o maior motivador de consumo<br />
identificado no estudo. Todos os indivíduos, irrestritamente, buscam mecanismos de<br />
representação social que validem características de sua identidade, seja ela real ou pretendida.<br />
Os produtos originais atendem plenamente a esse objetivo. No entanto, as falsificações<br />
também são permitidas, principalmente em situações em que seu uso tenha sido previamente<br />
acordado pelo grupo e, conseqüentemente, não representem risco social, de rejeição, por<br />
exemplo. Além disso, também podem ser usadas, especificamente no caso de falsificações de<br />
baixa qualidade, como expressão de irreverência e quebra com valores impostos pela<br />
sociedade e que não são facilmente assimilados por alguns indivíduos.<br />
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