Modelos de Gestão e Inovação Social em Organizações ... - Anpad
Modelos de Gestão e Inovação Social em Organizações ... - Anpad
Modelos de Gestão e Inovação Social em Organizações ... - Anpad
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
<strong>Mo<strong>de</strong>los</strong> <strong>de</strong> <strong>Gestão</strong> e <strong>Inovação</strong> <strong>Social</strong> <strong>em</strong> <strong>Organizações</strong> S<strong>em</strong> Fins<br />
Lucrativos: Divergências e Convergências entre Nonprofit Sector e<br />
Economia <strong>Social</strong><br />
Autoria: Andrea Leite Rodrigues<br />
Resumo: Esse trabalho se insere no campo <strong>de</strong> estudos sobre organizações s<strong>em</strong> fins<br />
lucrativos. Observa-se que o crescimento <strong>em</strong> quantida<strong>de</strong> veio acompanhado por mudanças <strong>em</strong><br />
seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão, particularmente nas estruturas organizacional e <strong>de</strong> governança. O<br />
objetivo principal <strong>de</strong>sse trabalho é <strong>de</strong>senvolver relações entre mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong><br />
organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos e geração <strong>de</strong> inovação social. O quadro teórico foi<br />
construído a partir <strong>de</strong> revisão bibliográfica nos seguintes conceitos: nonprofit sector, cujo<br />
referencial t<strong>em</strong> orig<strong>em</strong> anglo-saxã, economia social, <strong>de</strong> orig<strong>em</strong> francesa e inovação social.<br />
Trata-se <strong>de</strong> estudo qualitativo, exploratório, cujos meios <strong>de</strong> investigação são estudos <strong>de</strong> dois<br />
casos <strong>de</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos. Os estudos <strong>de</strong> casos envolveram pesquisa <strong>de</strong><br />
campo, investigação documental, observação participante e entrevistas com atores-chave que<br />
trabalham nas respectivas organizações. O primeiro caso ocorreu <strong>em</strong> uma associação<br />
localizada <strong>em</strong> São Paulo, Brasil, que possui uma escola <strong>de</strong> artes; o outro, <strong>de</strong>u-se <strong>em</strong> uma<br />
cooperativa <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> localizada <strong>em</strong> Montreal, Québec, Canadá. Ao final do trabalho<br />
são indicados os resultados das análises sobre as relações entre mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão e geração<br />
<strong>de</strong> inovação social.<br />
I. Introdução<br />
O objetivo principal <strong>de</strong>sse trabalho é investigar relações entre mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong><br />
organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos e geração <strong>de</strong> inovação social. Adicionalmente,<br />
<strong>de</strong>senvolv<strong>em</strong>os uma análise entre dois referenciais teóricos presentes na literatura no campo<br />
<strong>de</strong> estudos sobre organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos: a economia social, <strong>de</strong> orig<strong>em</strong> francesa e as<br />
nonprofit organizations, ligadas a tradições anglo-saxãs.<br />
Esse é um trabalho <strong>de</strong> pesquisa qualitativa, exploratória, cujos meios <strong>de</strong> investigação<br />
foram estudos bibliográficos e estudos <strong>de</strong> dois casos <strong>de</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos. Os<br />
estudos <strong>de</strong> casos envolveram pesquisa <strong>de</strong> campo, investigação documental, observação<br />
participante e entrevistas com atores-chaves que trabalham com as respectivas organizações.<br />
<strong>Organizações</strong> s<strong>em</strong> fins lucrativos vêm apresentando importância crescente, a ponto <strong>de</strong><br />
se po<strong>de</strong>r reconhecer que assumiram papéis <strong>de</strong> alocação <strong>de</strong> recursos, regulação econômica e<br />
redistribuição <strong>de</strong> renda: alocação, na medida que envolv<strong>em</strong> processos <strong>de</strong> aquisição,<br />
transformação e produção <strong>de</strong> bens e serviços públicos ou quase públicos; regulação<br />
econômica, quando, por ex<strong>em</strong>plo, associações ou cooperativas r<strong>em</strong>anejam a vida econômica<br />
ao se tornar<strong>em</strong> parceiras do po<strong>de</strong>r público na tarefa <strong>de</strong> inserir no mercado <strong>de</strong> trabalho<br />
indivíduos <strong>de</strong>squalificados ou <strong>em</strong> permanente situação <strong>de</strong> exclusão e criminalida<strong>de</strong>.<br />
Redistribuição, ao t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que viabilizam a provisão gratuita ou quase gratuita <strong>de</strong> serviços<br />
a populações socialmente <strong>de</strong>sfavorecidas.<br />
Mesmo com crescente importância econômica e social, pouco se sabe sobre seus<br />
mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão. Há literatura orientada para capacitá-las <strong>em</strong> termos <strong>de</strong> uso das ferramentas<br />
já conhecidas pelo meio <strong>em</strong>presarial, público ou privado. No entanto, há b<strong>em</strong> menos trabalhos<br />
sobre como elas efetivamente concretizaram a missão que persegu<strong>em</strong>. Cabe, portanto,<br />
1
indagar: Quais são as características <strong>de</strong> seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão? Há distinções entre os<br />
mo<strong>de</strong>los se compararmos organizações da economia social com aquelas inseridas no contexto<br />
brasileiro, inspiradas nas nonprofit organizations norte-americanas? Quais fatores faz<strong>em</strong>-nas<br />
gerar ou não impacto social? Em outras palavras, o que <strong>de</strong>fine a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gerar inovação<br />
social nos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão adotados por tais organizações?<br />
Este trabalho dispoe-se a isso: apreen<strong>de</strong>r como são os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong><br />
organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos a partir <strong>de</strong> dois estudos <strong>de</strong> casos. Buscou-se aprendizado na<br />
realida<strong>de</strong> vivenciada pelo pesquisador sobre os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão. Investigou-se organizações<br />
inseridas <strong>em</strong> dois contextos diferentes, cada uma mais próxima <strong>de</strong> uma das duas linhas<br />
teóricas principais que po<strong>de</strong>m ser encontradas <strong>em</strong> estudos sobre o setor s<strong>em</strong> fins lucrativos.<br />
A primeira, ligada <strong>em</strong> orig<strong>em</strong> e <strong>de</strong>senvolvimento aos Estados Unidos, foi responsável<br />
pela <strong>em</strong>ergência do termo third sector, composto por diferentes nonprofit organizations,<br />
habitualmente chamadas pela sigla NPO. Para conhecer um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> uma<br />
organização com tal orientação, realizamos um estudo <strong>de</strong> caso com uma associação brasileira,<br />
localizada <strong>em</strong> São Paulo.<br />
A segunda, francesa na orig<strong>em</strong>, utiliza b<strong>em</strong> menos o termo "terceiro setor", referindose<br />
à economia social, que engloba cooperativas, organizações <strong>de</strong> interesses mútuos –<br />
mutuelles - e associações (há um aumento da inclusão <strong>de</strong> fundações também). Esse outro<br />
mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gestão foi estudado <strong>em</strong> uma cooperativa <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> localizada <strong>em</strong> Montreal,<br />
Québec, província <strong>de</strong> colonização francesa do Canadá.<br />
Ao estudar os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong>ssas organizações, buscamos enten<strong>de</strong>r quais<br />
fatores as levam (ou não) a gerar impacto social. Resolver probl<strong>em</strong>as sociais, promover<br />
autonomia e <strong>em</strong>ancipação, aumentar a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, incentivar cidadania e respeito a<br />
direitos humanos são apenas alguns dos motivos que estão por traz <strong>de</strong> suas origens. Elas estão<br />
orientadas para mudar uma situação social insatisfatória, reunindo múltiplos atores sociais -<br />
indivíduos, governos, <strong>em</strong>presas, comunida<strong>de</strong>, organizações da socieda<strong>de</strong> civil que ag<strong>em</strong> para<br />
um rearranjo dos papéis sociais. São modos <strong>de</strong> agir que dão, aos probl<strong>em</strong>as sociais, respostas<br />
inovadoras, mas não necessariamente inéditas. Quais fatores <strong>em</strong> seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão<br />
facilitam ou dificultam tais respostas inovadoras? Quais as relações entre as características <strong>de</strong><br />
seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão e a geração <strong>de</strong> inovação social? Em que medida po<strong>de</strong>-se consi<strong>de</strong>rar<br />
que são mesmo inovadoras? O quadro abaixo apresenta um esqu<strong>em</strong>a ilustrativo da pergunta<br />
<strong>de</strong> pesquisa, conceitos chaves e <strong>de</strong>finições operacionais estabelecidas neste trabalho <strong>de</strong><br />
pesquisa.<br />
II. O objeto <strong>de</strong> estudo: organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos <strong>em</strong>preen<strong>de</strong>doras<br />
Uma vez que "setor s<strong>em</strong> fins lucrativos" ou "terceiro setor" po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados<br />
termos guarda-chuvas, pois englobam uma ampla gama <strong>de</strong> tipos organizacionais, é necessário<br />
restringir o escopo do objeto <strong>de</strong> pesquisa. Como o que interessa é discutir mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão,<br />
tomamos como objeto <strong>de</strong> estudo organizações que mantêm sustentação econômico-financeira<br />
por meio da comercialização <strong>de</strong> bens e serviços produzidos pelos próprios m<strong>em</strong>bros. Assim, o<br />
objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong>ste trabalho <strong>de</strong> pesquisa ficou <strong>de</strong>finido como organizações s<strong>em</strong> fins<br />
lucrativos que contenham ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção e comercialização <strong>de</strong> bens ou serviços que<br />
possibilitam geração <strong>de</strong> renda tanto para a própria organização, como para seus m<strong>em</strong>bros,<br />
individualmente. Essa <strong>de</strong>finição inspira-se no conceito <strong>de</strong> <strong>em</strong>presa social, tal qual <strong>de</strong>finido no<br />
trabalho <strong>de</strong> Defourny (2001). Suas características <strong>de</strong> base são:<br />
2
a) ter como missão beneficiar um grupo ou comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas que partilham um<br />
interesse comum;<br />
b) possuir ativida<strong>de</strong> contínua <strong>de</strong> produção e comercialização <strong>de</strong> bens e serviços. Isso não<br />
exclui receber doações ou repasses <strong>de</strong> recursos públicos;<br />
c) possuir autonomia, ou seja, não se encontrar sujeito às <strong>de</strong>terminações <strong>de</strong> outras<br />
organizações, seja do Estado ou da iniciativa privada; e<br />
d) contar com trabalho assalariado e voluntário, atuando <strong>em</strong> conjunto.<br />
Adicionalmente, adotamos como <strong>de</strong>finição operacional que os termos "terceiro setor" e<br />
"organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos" serão utilizados neste trabalho <strong>de</strong> pesquisa como termos<br />
sinônimos, cientes da imperfeição <strong>de</strong> tal <strong>de</strong>finição. Este procedimento visa não dar <strong>de</strong>staque<br />
às infindáveis discussões sobre a probl<strong>em</strong>ática <strong>de</strong> <strong>de</strong>finições no campo, mas sim às diferenças<br />
entre as duas principais vertentes teóricas: economia social e nonprofit organizations, como<br />
ter<strong>em</strong>os oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> esclarecer no quadro teórico.<br />
III. Características gerais do trabalho<br />
Neste trabalho <strong>de</strong> pesquisa, o quadro teórico foi construído com base <strong>em</strong> revisão<br />
bibliográfica <strong>de</strong> dois campos <strong>de</strong> estudos: as produções sobre organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos<br />
e sobre inovação organizacional. Quanto à revisão da bibliografia sobre o primeiro campo, ela<br />
ocorreu nas produções acadêmicas anglo-saxã e franco-quebequense: nonprofit organizations<br />
(doravante, NPO) e economia social, respectivamente. A partir da literatura, formamos<br />
mo<strong>de</strong>los organizacionais "i<strong>de</strong>ais", ou seja, que representam a média das organizações do<br />
terceiro setor inseridas <strong>em</strong> cada contexto. Realizamos uma análise comparativa entre mo<strong>de</strong>los<br />
<strong>de</strong> gestão entre organizações da economia social e NPO, proporcionando uma contribuição<br />
aos futuros estudos do campo <strong>de</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos.<br />
Quanto à revisão da bibliografia sobre inovação organizacional, po<strong>de</strong>-se afirmar que a<br />
maioria dos trabalhos está <strong>de</strong>dicada a inovações tecnológicas, analisando-as <strong>em</strong> contextos <strong>de</strong><br />
sist<strong>em</strong>as produtivos e tratando-as como fonte <strong>de</strong> vantag<strong>em</strong> competitiva para <strong>em</strong>presas<br />
comerciais. A inovação social aparece menos <strong>em</strong> trabalhos sobre organizações comerciais e<br />
mais <strong>em</strong> administração pública, terceiro setor e <strong>em</strong> periódicos <strong>de</strong> sociologia. A fonte inicial<br />
para <strong>de</strong>finição do conceito foi o Conselho <strong>de</strong> Ciências e Tecnologia da Província do Québec,<br />
organismo do governo a qu<strong>em</strong> compete a maior autorida<strong>de</strong> para <strong>de</strong>liberações nessas áreas,<br />
incluindo análises <strong>de</strong> condições <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da inovação social. O Conselho preparou<br />
e publicou um relatório intitulado Innovation <strong>Social</strong>e et Innovation Technologique: l'apport<br />
<strong>de</strong> la recherche en sciences sociales et humaines – Pour une politique Quebecoise <strong>de</strong><br />
l'Innovation 1 . O relatório do Conselho <strong>de</strong>fine inovação social como:<br />
todas as novas práticas, abordagens ou intervenções, ou<br />
ainda todos os novos produtos <strong>de</strong>senvolvidos para melhorar uma<br />
situação ou solucionar um probl<strong>em</strong>a social que se estabeleceu no<br />
nível das instituições, das organizações e das comunida<strong>de</strong>s.<br />
(QUÉBEC (Canadá), 2000).<br />
Quanto ao quadro metodológico, a opção <strong>de</strong>ste trabalho foi por uma abordag<strong>em</strong><br />
interpretativista. O nível <strong>de</strong> análise é a organização e as variáveis observadas são: mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong><br />
gestão e inovação social. Para enten<strong>de</strong>r o que é um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gestão, optamos pelo estudo<br />
das características das formas organizacionais e da governança. Aspectos jurídicos,<br />
normativos e econômicos relacionados ao nonprofit sector e à economia social também foram<br />
3
investigados para a composição <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo organizacional típico <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>stas<br />
formas <strong>de</strong> organização do setor s<strong>em</strong> fins lucrativos. Adotamos como estratégia <strong>de</strong> pesquisa a<br />
abordag<strong>em</strong> qualitativa, com estudo <strong>de</strong> dois casos.<br />
O quadro <strong>em</strong>pírico estabelecido <strong>de</strong>finiu procedimentos para coleta, análise e<br />
interpretação do material <strong>de</strong> campo. Utilizamos como procedimentos <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> dados<br />
entrevistas <strong>em</strong> profundida<strong>de</strong>, análise <strong>de</strong> documentos e observação participante. Os dois<br />
estudos <strong>de</strong> casos elaborados, um <strong>em</strong> São Paulo e outro <strong>em</strong> Montreal, têm caráter etnográfico.<br />
A finalida<strong>de</strong> dos estudos foi apreen<strong>de</strong>r a dinâmica <strong>de</strong> vida <strong>de</strong>ssas organizações e investigar as<br />
características <strong>de</strong> seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão, à luz da contribuição <strong>em</strong> termos <strong>de</strong> inovação social.<br />
Um dos estudos <strong>de</strong> casos <strong>de</strong>u-se <strong>em</strong> uma cooperativa <strong>de</strong> produtos ecologicamente<br />
corretos situada <strong>em</strong> Montreal, Canadá. O outro aconteceu <strong>em</strong> uma associação que possui uma<br />
escola <strong>de</strong> artes com livre acesso para portadores <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiências físicas, mentais, sensoriais ou<br />
múltiplas, localizada <strong>em</strong> São Paulo, Brasil.<br />
A formação do quadro teórico e os estudos <strong>de</strong> campo permitiram, cada qual, a<br />
construção <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> proposições teóricas sobre as relações entre mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão<br />
e inovação social. O final <strong>de</strong>ste artigo apresenta a discussão comparativa.<br />
IV. Nonprofit sector e economia social: convergências e divergências nos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong><br />
gestão relatados na literatura<br />
Não constitui novida<strong>de</strong> afirmar que nas últimas três décadas do século XX ocorreu um<br />
aumento acentuado na quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos <strong>em</strong> quase todos os<br />
países do mundo. Crises <strong>de</strong> alcance mundial e mudanças na organização do trabalho<br />
provocaram ondas <strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>em</strong>prego <strong>em</strong> massa e o fim do mo<strong>de</strong>lo econômico baseado no Estado<br />
Providência como o provedor dos serviços sociais <strong>de</strong> apoio e <strong>de</strong>senvolvimento do capitalismo.<br />
No trabalho <strong>de</strong> autores como Defourny (2001) e Depuydt, Malice e Marechal (1994)<br />
po<strong>de</strong>-se apren<strong>de</strong>r que houve, inclusive, o crescimento no número <strong>de</strong> organizações cujo perfil<br />
não é mais o <strong>de</strong> prover trabalho assistencial a populações excluídas por pobreza ou abandono;<br />
diferent<strong>em</strong>ente <strong>de</strong> outros momentos históricos, a partir <strong>de</strong> 1970 observa-se o aumento <strong>de</strong><br />
cooperativas e associações criadas com intuito <strong>de</strong> promover inclusão social com geração <strong>de</strong><br />
renda. Tais organizações exist<strong>em</strong> para oferecer alternativas inovadoras para combater<br />
situações <strong>de</strong> <strong>de</strong>sgaste social, pois propõ<strong>em</strong> superar probl<strong>em</strong>as sociais por meio do<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> econômica. Autores como Levesque (2002) chamam a<br />
atenção para o caráter inovador <strong>de</strong>stas organizações, posto que seu propósito é prover<br />
capacitação e geração <strong>de</strong> renda a indivíduos <strong>em</strong> situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>em</strong>prego prolongado ou<br />
<strong>de</strong>squalificados para o mercado <strong>de</strong> trabalho. Os avanços na tecnologia da informação<br />
<strong>de</strong>terminaram níveis <strong>de</strong> exigência e qualificação b<strong>em</strong> mais altos, o que <strong>em</strong>purrou um vasto<br />
contingente <strong>de</strong> pessoas para o <strong>de</strong>s<strong>em</strong>prego. Daí a <strong>em</strong>ergência <strong>de</strong> tipos organizacionais<br />
singulares, como é o caso <strong>de</strong> <strong>em</strong>presas sociais, amplamente estudadas por autores como<br />
Borzaga e Defourny (2001).<br />
Dada a heterogeneida<strong>de</strong> das organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos, há imensa dificulda<strong>de</strong><br />
<strong>em</strong> <strong>de</strong>finir suas características e limitar seu escopo <strong>de</strong> ações. Tal qual colocado por Billis e<br />
Harrys, "a <strong>de</strong>finição do terceiro setor envolve características organizacionais que implicam<br />
<strong>de</strong>safios especiais para pesquisadores e práticos <strong>de</strong> gestão consi<strong>de</strong>rando aspectos <strong>de</strong> estrutura<br />
organizacional e <strong>de</strong> formas <strong>de</strong> governança" (BILLIS; HARRIS, 1996, p. 238). Os aspectos<br />
legais, normativos e econômicos fornec<strong>em</strong> algumas pistas para tentarmos <strong>de</strong>linear o perfil <strong>de</strong><br />
mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão nesta gama tão ampla <strong>de</strong> tipos organizacionais.<br />
4
Quanto aos aspectos legais, observa-se que na França e no Québec, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> leis<br />
específicas para a economia social resolveu este imbróglio por meio da restrição do status<br />
jurídico para consi<strong>de</strong>rar uma organização como pertencente ou não à economia social: apenas<br />
cooperativas, mutuelles e associações são, segundo a lei, consi<strong>de</strong>radas como pertencentes à<br />
economia social. Por sua vez, no nonprofit sector esta limitação via status jurídico não<br />
acontece, sendo ele formado por uma amálgama <strong>de</strong> organizações distintas entre si. Há indício,<br />
portanto, <strong>de</strong> que o processo <strong>de</strong> institucionalização esteja mais adiantado na economia social<br />
do que no nonprofit sector.<br />
Quanto aos aspectos normativos, a pesquisa bibliográfica nos mostrou que a economia<br />
social apresenta propostas mais claras e conceitualmente <strong>de</strong>senvolvidas sobre como<br />
estabelecer estruturas organizacional e <strong>de</strong> governança compatíveis com o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong><br />
solidarieda<strong>de</strong> e cooperação que é a base da missão. Há, portanto, na produção sobre economia<br />
social um caráter não só normativo quanto à forma organizacional "i<strong>de</strong>al", mas também um<br />
cunho prescritivo quanto à dinâmica <strong>de</strong> entrosamento entre os aspectos econômicos e sociais<br />
<strong>de</strong> cada organização. A esse respeito, o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> duplo caráter apresentado por Vienney<br />
(1994) é significativo a medida que torna explícito como uma organização cooperativa po<strong>de</strong><br />
assumir um modo <strong>de</strong> funcionamento <strong>de</strong>mocrático e solidário.<br />
Segundo Vienney, a economia social po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finida a partir da construção <strong>de</strong> um<br />
"tipo i<strong>de</strong>al" <strong>de</strong> organização cooperativa. A idéia <strong>de</strong> partida é que indivíduos que se tornam<br />
m<strong>em</strong>bros <strong>de</strong> uma cooperativa passam a ter com ela uma relação <strong>de</strong> duplo caráter ou uma<br />
dupla relação. Por um lado, uma cooperativa representa uma associação <strong>de</strong> pessoas unidas<br />
por uma <strong>de</strong>terminada crença ou ativida<strong>de</strong> comum. Por ex<strong>em</strong>plo, uma associação <strong>de</strong><br />
fornecedores <strong>de</strong> uma mesma matéria-prima, <strong>de</strong> consumidores <strong>de</strong> um mesmo produto ou <strong>de</strong><br />
trabalhadores <strong>de</strong> uma certa indústria. De outro lado, essas mesmas pessoas, ao se agrupar<strong>em</strong>,<br />
passam a ter uma relação <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>, pois se tornam sócios <strong>de</strong> uma <strong>em</strong>presa, o que<br />
estabelece uma relação <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>. Essa organização cooperativa i<strong>de</strong>al funcionaria<br />
segundo quatro princípios (ver também MALO, 2001):<br />
a) Uma regra específica a uma associação <strong>de</strong> pessoas: cada m<strong>em</strong>bro t<strong>em</strong> um, e apenas um,<br />
voto. Há uma gestão in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do Estado ou <strong>de</strong> qualquer outra organização privada<br />
ou pública. Todos os associados são iguais – um m<strong>em</strong>bro, um voto –,<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt<strong>em</strong>ente do valor <strong>de</strong> sua participação no financiamento e na ativida<strong>de</strong> da<br />
<strong>em</strong>presa;<br />
b) Uma regra específica para a <strong>em</strong>presa: Constituição obrigatória <strong>de</strong> uma reserva, com<br />
caráter indivisível;<br />
c) Uma regra específica a uma associação <strong>de</strong> pessoas que controlam uma <strong>em</strong>presa: cada<br />
m<strong>em</strong>bro <strong>de</strong>verá capitalizar a <strong>em</strong>presa; e<br />
d) Uma regra específica para uma <strong>em</strong>presa que existe para prestar serviços aos próprios<br />
m<strong>em</strong>bros <strong>de</strong> uma associação pessoas: Uma vez que a reserva seja constituída, os<br />
exce<strong>de</strong>ntes restantes da operação serão partilhados entre os m<strong>em</strong>bros não <strong>em</strong> função do<br />
capital <strong>em</strong>pregado, mais proporcionalmente ao volume <strong>de</strong> transações dos m<strong>em</strong>bros com<br />
a cooperativa.<br />
Esse mo<strong>de</strong>lo i<strong>de</strong>al proposto originalmente por Vienney tornou-se a referência para<br />
compreensão da dinâmica <strong>de</strong> funcionamento <strong>de</strong> uma organização da economia social e cabe,<br />
plenamente, para explicar a formação da LMV.<br />
Enquanto a economia social já apresenta tipos i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> organização, nos estudos<br />
sobre características do nonprofit sector não foi possível i<strong>de</strong>ntificar fato s<strong>em</strong>elhante.<br />
Curiosamente, um dos principais t<strong>em</strong>as <strong>de</strong> pesquisa ainda é a <strong>de</strong>finição do que po<strong>de</strong> ou não<br />
5
ser consi<strong>de</strong>rado como "nonprofit sector". A questão da busca pela i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e por<br />
características comuns a todas as organizações ainda é um dos <strong>de</strong>safios mais presentes, vi<strong>de</strong> o<br />
trabalho renomado do John Hopkins Comparative Non-profit Sector Project (Projeto<br />
Comparativo Sobre o Setor S<strong>em</strong> Fins Lucrativos), coor<strong>de</strong>nado por Helmut Salamon<br />
(SALAMON; ANHEIMER, 1994 e 1997; SALAMON et al., 1997).<br />
Outro ponto também relevante entre os estudos do nonprofit sector resi<strong>de</strong> nos<br />
probl<strong>em</strong>as <strong>de</strong> accountability, ou seja, probl<strong>em</strong>as quanto a limites <strong>de</strong> suas responsabilida<strong>de</strong>s e<br />
estabelecimento <strong>de</strong> práticas que favoreçam transparência e responsabilização (KEATING;<br />
FRUMKIM, 2003). Tais probl<strong>em</strong>as surg<strong>em</strong> a medida que as funções <strong>de</strong>ssas organizações não<br />
estão claras, há uma zona ambígua entre serviços prestados pelo Estado e pelas NPO e uma<br />
falta <strong>de</strong> clareza quanto a orig<strong>em</strong> <strong>de</strong> seus fundos, que po<strong>de</strong>m vir <strong>de</strong> inúmeras formas.<br />
No caso específico da economia social, a discussão sobre accountability parece ser<br />
consi<strong>de</strong>rada menos probl<strong>em</strong>ática do que no nonprofit sector, uma vez que o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gestão<br />
associativo ou cooperativo <strong>de</strong> duplo caráter contém aspectos normativos que prescrev<strong>em</strong> as<br />
regras <strong>de</strong> funcionamento da <strong>em</strong>presa e da associação <strong>de</strong> pessoas. Mais uma vez, o grau <strong>de</strong><br />
institucionalização normativa (DiMAGGIO; POWELL, 1983) apresenta-se mais adiantado na<br />
economia social do que no nonprofit sector.<br />
Ainda tratando da forma organizacional, pu<strong>de</strong>mos conhecer nesta pesquisa o trabalho<br />
<strong>de</strong> alguns autores que consi<strong>de</strong>ram as organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos <strong>de</strong> um modo geral<br />
como possuidoras <strong>de</strong> estruturas orgânicas, com menos centralização <strong>de</strong> autorida<strong>de</strong> do que as<br />
<strong>em</strong>presas estatais ou com fim <strong>de</strong> lucro, atuando mais próximas aos beneficiários <strong>de</strong> seus<br />
serviços e que utilizam mesclas entre recursos monetários, não monetários (reciprocida<strong>de</strong>) e<br />
não mercantis (redistribuição) (COOPERRIDER; PASMORE, 1999; DEPUYDT; MALICE;<br />
MARECHAL, 1994; GORDON, 1989; LÉVESQUE, 2002; TEIXEIRA, 2003). Não tendo<br />
fim <strong>de</strong> lucro, muitos consi<strong>de</strong>ram que seus m<strong>em</strong>bros não são movidos por utilitarismo e<br />
maximização <strong>de</strong> interesses individuais, o que lhes confere um álibi <strong>de</strong> melhores gestoras e<br />
mais comprometidas com as causas e com os resultados a que se <strong>de</strong>dicam.<br />
Há, no entanto, controvérsias <strong>em</strong> torno <strong>de</strong>ssas idéias. Não parece ser privilégio do<br />
terceiro setor a orientação para criar organizações próprias para ambientes turbulentos. A<br />
gestão <strong>de</strong> organizações <strong>de</strong> qualquer setor implica <strong>em</strong> lidar com maiores níveis <strong>de</strong><br />
complexida<strong>de</strong> e ambigüida<strong>de</strong> (WOOD JUNIOR, 2001). Localizamos tal discussão sobre as<br />
"super qualida<strong>de</strong>s" das organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos principalmente na literatura sobre<br />
nonprofit sector. O trabalho <strong>de</strong> Marshall (1996) nos apresentou contribuição relevante para<br />
minimizar "os mitos" <strong>de</strong> que organizações do Estado ou privadas são mais lentas e menos<br />
orientadas para o b<strong>em</strong> comum do que as do terceiro setor. Este autor, também envolvido no<br />
árduo exercício intelectual <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição do terceiro setor, propõe como característica<br />
fundamental que as organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos ser<strong>em</strong> consi<strong>de</strong>radas como mediadores<br />
sociais, ou seja, atores que estão orientados para promover mudanças sociais.<br />
As diferenças entre economia social e nonprofit sector vão além da questão <strong>de</strong><br />
accountability e <strong>de</strong>finição do escopo <strong>de</strong> organizações constituintes do setor s<strong>em</strong> fins<br />
lucrativos <strong>em</strong> cada vertente teórica. A economia social apresenta um modus operandi que<br />
engloba ativida<strong>de</strong> <strong>em</strong>presarial e ativida<strong>de</strong> solidária <strong>em</strong> bases iguais, enquanto o nonprofit<br />
sector não <strong>de</strong>ixa tal relação explícita. Enquanto proposta ou mo<strong>de</strong>lo i<strong>de</strong>al, a economia social<br />
parte da pr<strong>em</strong>issa <strong>de</strong> que existe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> promover <strong>de</strong>senvolvimento econômico com<br />
<strong>de</strong>senvolvimento social, e não um <strong>de</strong>pois o outro, ou um no lugar do outro. Tal pensamento<br />
t<strong>em</strong> orig<strong>em</strong> nas idéias <strong>de</strong> Polanyi sobre o encastramento entre social e econômico e a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer economias plurais, nas quais a economia <strong>de</strong> mercado não é a que<br />
prevalece, como no modo capitalista <strong>de</strong> produção (POLANYI, 1983).<br />
6
Há, no entanto, similarida<strong>de</strong>s evi<strong>de</strong>ntes entre economia social e nonprofit sector. Nos<br />
estudos <strong>de</strong> autores das duas vertentes, observamos a preocupação <strong>em</strong> tratar com <strong>de</strong>talhes as<br />
conseqüências dos processos <strong>de</strong> institucionalização ocasionados pelo crescimento e pelas<br />
<strong>de</strong>mandas do ambiente externo que apontam para a adoção <strong>de</strong> modos <strong>de</strong> gestão com mais<br />
similarida<strong>de</strong> <strong>em</strong> relação a <strong>em</strong>presas públicas ou privadas. Nas duas revisões bibliográficas<br />
está presente à menção ao processo <strong>de</strong> isomorfismo organizacional (POWELL; DiMAGGIO,<br />
1991), o que é consi<strong>de</strong>rado, <strong>em</strong> ambas, como um efeito que po<strong>de</strong> <strong>de</strong>scaracterizar as<br />
organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos como agentes <strong>de</strong> mudança e mediadores sociais que<br />
promov<strong>em</strong> a voz e a inclusão <strong>de</strong> indivíduos excluídos <strong>de</strong> representação social.<br />
V. O conceito <strong>de</strong> inovação social<br />
Ao nos aprofundarmos na discussão sobre geração <strong>de</strong> impactos sociais, conhec<strong>em</strong>os o<br />
conceito <strong>de</strong> inovação social (D'AMOURS 2000; CLOUTIER 2003; LALLEMAND, 2001;<br />
LÉVESQUE, 2002; MALO, 2001; TAYLOR, 1970). Como vimos na seção anterior, a<br />
economia social é uma linha teórica sobre organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos que propõe novas<br />
formas <strong>de</strong> encastrar a esfera da economia e das relações sociais na vida do hom<strong>em</strong>. As<br />
inovações na tecnologia e no processo produtivos, com certeza, também são relevantes para o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento da economia social. No entanto, o aspecto inovador distintivo resi<strong>de</strong> na<br />
inovação social, ou seja, <strong>em</strong> novas formas <strong>de</strong> fazer as coisas com o fim explícito <strong>de</strong> rearranjar<br />
os papéis sociais ou <strong>de</strong> dar outras respostas para situações sociais insatisfatórias e<br />
probl<strong>em</strong>áticas.<br />
A inovação social não é um conceito restrito ao terceiro setor, mas autores como<br />
Lévesque (2002) propõ<strong>em</strong> que há maior disposição para ela no setor s<strong>em</strong> fins lucrativos.<br />
Tratando especificamente da economia social, Lévesque (2002) chega a i<strong>de</strong>ntificar três<br />
períodos, a partir <strong>de</strong> sua contribuição para a promoção <strong>de</strong> inovação social:<br />
1. 1968-1975: <strong>de</strong>ntro do movimento da contra-cultura, as experimentações da inovação<br />
social ocorr<strong>em</strong> nos movimentos contra o consumo <strong>de</strong> massa e as críticas à organização<br />
do trabalho nas<br />
2. 1975-1985: a crise do Estado <strong>de</strong> B<strong>em</strong>-Estar traz inovações sociais pela via da<br />
necessida<strong>de</strong>, da crise. Ao invés da crise do trabalho monótono, ocorre a crise do<br />
<strong>de</strong>s<strong>em</strong>prego, o que gera inovações sociais no domínio da criação do <strong>em</strong>prego e do<br />
<strong>de</strong>senvolvimento econômico. Uma outra via <strong>de</strong> inovações sociais surg<strong>em</strong> <strong>em</strong><br />
iniciativas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento local e serviços sociais. Proliferam experiências piloto,<br />
pouco institucionalizadas, como clínicas populares, creches, <strong>de</strong>senvolvimento<br />
comunitário e fundo <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, entre outras experiências.<br />
3. 1990-2000, um período não mais <strong>de</strong> crise, mas <strong>de</strong> mutações e reconfigurações do<br />
Estado, a <strong>em</strong>ergência <strong>de</strong> novas formas <strong>de</strong> regulação, <strong>de</strong> novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
coor<strong>de</strong>nação e novos modos <strong>de</strong> governança. Dentro <strong>de</strong>ste contexto <strong>de</strong> mutação, as<br />
inovações sociais não estão mais à marg<strong>em</strong> como na contra-cultura; elas passam a ser<br />
parte constituinte da <strong>em</strong>ergência <strong>de</strong> uma nova configuração do capitalismo, mas seus<br />
contornos se tornam móveis e variáveis, segundo os diversos níveis <strong>de</strong> análise.<br />
Ocorr<strong>em</strong> mutações, por ex<strong>em</strong>plo, no nível dos atores sociais, revelando novos atores<br />
sociais, notadamente da socieda<strong>de</strong> civil, as ONGs, os grupos <strong>de</strong> mulheres, entre outras<br />
iniciativas; no nível das formas organizacionais, revelando novas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
coor<strong>de</strong>nação e <strong>de</strong> governança, novas relações entre social e econômico; e, no nível das<br />
instituições, com relação ao sist<strong>em</strong>a político, uma reconfiguração dos po<strong>de</strong>res entre os<br />
7
Estados, as instâncias mundiais e continentais, as coletivida<strong>de</strong>s locais e as parcerias<br />
com a socieda<strong>de</strong> civil;<br />
Ao explicar o conceito <strong>de</strong> inovação social, Lévesque (2002) refere-se às novas formas<br />
<strong>de</strong> intervenção que organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos proporcionam, <strong>em</strong> relação às anteriores,<br />
relacionadas ao Estado Providência. <strong>Inovação</strong> social <strong>de</strong>signa esse conjunto <strong>de</strong> iniciativas<br />
socioeconômicas que promov<strong>em</strong> maior b<strong>em</strong> estar <strong>de</strong> indivíduos face aos probl<strong>em</strong>as sociais e<br />
que part<strong>em</strong> da idéia <strong>de</strong> um novo encastramento entre social e econômico, como fora colocado<br />
por POLANYI (1983). Para Lévesque, as organizações da economia social inovam porque<br />
reún<strong>em</strong> fatores produtivos diversos, têm foco <strong>em</strong> iniciativas associativistas e cooperativas<br />
locais, inclu<strong>em</strong> os próprios usuários dos serviços nos processos <strong>de</strong> trabalho e estabelec<strong>em</strong><br />
relações sociais voltadas para maior qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida no trabalho.<br />
O estudo da produção intelectual sobre inovação social nos fez optar por agrupar os<br />
autores e suas obras <strong>em</strong> três níveis <strong>de</strong> análise: inovações sociais centradas <strong>em</strong> indivíduos, <strong>em</strong><br />
organizações e <strong>em</strong> instituições. Tal opção foi inspirada na proposta <strong>de</strong> Alan Touraine para<br />
análise dos níveis do sist<strong>em</strong>a social (TOURAINE, 1965). Os três níveis são inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes,<br />
uma vez que uma inovação social centrada <strong>em</strong> indivíduos, por ex<strong>em</strong>plo, certamente repercute<br />
<strong>em</strong> organizações e <strong>em</strong> instituições. Essa classificação não é, portanto, um limitador dos<br />
níveis, servindo apenas para salientar a orientação primeira do impacto da inovação social. O<br />
quadro 1 oferece um resumo sobre a produção intelectual <strong>em</strong> inovação social, utilizando-se os<br />
três níveis.<br />
1. Resumo da <strong>Inovação</strong> <strong>Social</strong><br />
Dimensões da <strong>Inovação</strong> Indicadores <strong>de</strong> <strong>Inovação</strong> <strong>Social</strong> Autores<br />
Atores Sociais (indivíduos<br />
ou grupos)<br />
• Aumentar/favorecer<br />
autonomia e<br />
<strong>em</strong>ancipação;<br />
• Promover qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
vida.<br />
• Sentido para o trabalho.<br />
<strong>Organizações</strong><br />
• Formas Organizacionais;<br />
• Formas <strong>de</strong> Governança;<br />
• Aspectos Jurídicos,<br />
normativos e econômicos.<br />
Instituições<br />
• Mudanças nos ambientes<br />
legal, político, social e<br />
• Novas formas <strong>de</strong> divisão e coor<strong>de</strong>nação do trabalho<br />
(cooperação e geração <strong>de</strong> aprendizag<strong>em</strong>);<br />
• Novos atores sociais, antes excluídos ou<br />
•<br />
marginalizados;<br />
Novos papéis sociais (e/ou rearranjo <strong>de</strong> papéis sociais).<br />
Mudanças nas expectativas recíprocas nas relações<br />
sociais envolvendo pessoas excluídas;<br />
• Grau <strong>de</strong> inclusão <strong>de</strong> usuários ou beneficiários nos<br />
processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, concepção, <strong>de</strong>senvolvimento e<br />
entrega <strong>de</strong> bens e serviços sociais;<br />
• Grau <strong>de</strong> autonomia e processos <strong>de</strong>cisórios;<br />
• Novas relações entre trabalho e família.<br />
• Novas formas <strong>de</strong> divisão e coor<strong>de</strong>nação do trabalho;<br />
• Novas configurações organizacionais: estruturas <strong>em</strong><br />
re<strong>de</strong>, por projetos, matriciais;<br />
• Misturas entre recursos disponíveis (mercantis, não<br />
mercantis e reciprocida<strong>de</strong>);<br />
• Novas formas <strong>de</strong> governança: (interações com políticas<br />
públicas, <strong>em</strong>preen<strong>de</strong>dorismo coletivo);<br />
• Grau <strong>de</strong> participação <strong>de</strong> diferentes stakehol<strong>de</strong>rs nos<br />
processos <strong>de</strong>cisórios;<br />
• Novas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso aos mercados (público e<br />
privado);<br />
• Objetivos da organização e benefícios individuais<br />
(monetários e não monetários) e coletivos (para a<br />
socieda<strong>de</strong>) <strong>em</strong> geral alcançados pela mediação <strong>de</strong>stas<br />
organizações.<br />
• Universalização <strong>de</strong> direitos;<br />
• Legislação sobre inclusão social e <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> minorias;<br />
• Auclair; Lampron<br />
(1987);<br />
• Taylor (1970)<br />
• Cloutier (2003).<br />
• Cornforth (2003)<br />
• Gordon (1989)<br />
• Cloutier (2003)<br />
• Lévesque (2002)<br />
• Cloutier (2003)<br />
8
econômico;<br />
O modo <strong>de</strong> gestão e a promoção da inovação social aparec<strong>em</strong> como conceitos<br />
relacionados na literatura, pois se reconhece a inovação a medida que transforma o indivíduo<br />
<strong>em</strong> seu estilo <strong>de</strong> vida, na organização do trabalho e na participação e influência sobre as<br />
<strong>de</strong>cisões que afetam seu próprio <strong>de</strong>stino. No entanto, os estudos dos casos nos mostraram que<br />
a inovação social não acontece apenas por questões relacionadas a mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão<br />
organizacionais. Como tiv<strong>em</strong>os oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r, inovações sociais po<strong>de</strong>m <strong>em</strong>ergir<br />
<strong>de</strong> uma atitu<strong>de</strong> impetuosa e <strong>em</strong>preen<strong>de</strong>dora, relacionada à percepção <strong>de</strong> uma situação social<br />
insatisfatória que po<strong>de</strong> ser modificada por meio <strong>de</strong> um trabalho artístico, por ex<strong>em</strong>plo. Cabe,<br />
portanto, conhecer experiências que nos permitam amadurecer as idéias que o quadro teórico<br />
proporcionou a respeito <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão e geração <strong>de</strong> impactos via inovação social.<br />
VI. Os Estudos <strong>de</strong> Casos<br />
Buscamos as características dos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão e a relação com a geração <strong>de</strong><br />
inovação social <strong>em</strong> ambos os estudos. Procuramos apreen<strong>de</strong>r como eram os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong><br />
gestão <strong>de</strong> cada organização, tendo <strong>em</strong> mente o referencial teórico sobre nonprofit sector e<br />
economia social.<br />
Caso I<br />
A Associação Life in Motion (LIM, nome fictício) é uma organização s<strong>em</strong> fins<br />
lucrativos fundada <strong>em</strong> 1994 com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> promover o <strong>de</strong>senvolvimento artístico <strong>de</strong><br />
pessoas portadoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência. Seu fundador começou a pintar com a boca quando tinha<br />
19 anos, logo após ter sofrido um aci<strong>de</strong>nte que o <strong>de</strong>ixou tetraplégico<br />
O início ao projeto da Associação visava proporcionar a outros portadores <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ficiência as benesses <strong>de</strong> se conviver com a arte. Des<strong>de</strong> o começo, a Life in Motion utiliza a<br />
filosofia <strong>de</strong> inclusão social, adotada pela UNESCO, e oferece seus serviços a todas as<br />
pessoas, <strong>de</strong>ficientes ou não, visando à promoção do convívio entre elas e real integração do<br />
portador <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência na socieda<strong>de</strong>. A inclusão social é o processo pelo qual a socieda<strong>de</strong> e o<br />
portador <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiências procuram adaptar-se mutuamente tendo <strong>em</strong> vista a equiparação <strong>de</strong><br />
oportunida<strong>de</strong>s e, conseqüent<strong>em</strong>ente, uma socieda<strong>de</strong> para todos. A inclusão (na escola, no<br />
trabalho, no lazer, nos serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> etc.) significa que a pessoa <strong>de</strong>ficiente <strong>de</strong>ve integrarse<br />
à socieda<strong>de</strong> sim, mas também a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve adaptar-se às necessida<strong>de</strong>s da pessoa com<br />
<strong>de</strong>ficiência<br />
A Associação promove cursos <strong>de</strong> Artes Plásticas nos quais são ensinadas diferentes<br />
técnicas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, pintura, gravura, mo<strong>de</strong>lag<strong>em</strong> e escultura. Aten<strong>de</strong> a alunos com diferentes<br />
ida<strong>de</strong>s (a partir <strong>de</strong> 14 anos) e funciona <strong>em</strong> um espaço acessível a indivíduos com limitações<br />
motoras e portadores <strong>de</strong> algum tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência (física, mental, sensorial e múltipla). Sua<br />
equipe <strong>de</strong> professores é composta por profissionais com formação <strong>em</strong> artes plásticas,<br />
capacitados para orientar e acompanhar individualmente o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> cada aluno.<br />
Life in Motion conta com oito funcionários assalariados e oito voluntários, incluindo o<br />
próprio fundador.<br />
No começo, a escola funcionava com o apoio <strong>de</strong> pessoas próximas e a divulgação na<br />
mídia, s<strong>em</strong>pre com a presença do próprio fundador. Os primeiros alunos vieram após<br />
conhecê-lo pelos programas <strong>de</strong> televisão; talvez por isso tenha prevalecido nas entrevistas o<br />
comentário <strong>de</strong> que, ao vê-lo, surgia a corag<strong>em</strong> e a iniciativa para conhecer a escola <strong>de</strong> artes e<br />
começar a ter aulas. Tornou-se habitual o comentário <strong>de</strong> que, uma vez vendo o que do que ele<br />
9
era capaz fazer, outras pessoas portadoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiências encontraram estímulo e corag<strong>em</strong><br />
para mudar um cotidiano <strong>de</strong> isolamento. O convívio com os alunos na LIM comprovou que a<br />
maioria raramente se ausenta da própria residência e que, antes <strong>de</strong> começar a seguir cursos,<br />
nunca havia tido nenhuma experiência <strong>de</strong> aprendizado <strong>em</strong> artes.<br />
Caso II<br />
La Maison Verte (LMV) é uma cooperativa <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> que trabalha com<br />
produção, distribuição e comercialização <strong>de</strong> produtos ecologicamente corretos <strong>em</strong> Montreal,<br />
Québec, Canadá. Trata-se <strong>de</strong> uma cooperativa <strong>de</strong> m<strong>em</strong>bros proprietários que oferece produtos<br />
e serviços ecológicos. Está localizada no bairro <strong>de</strong> Notre Dame <strong>de</strong> Grace − NDG −, on<strong>de</strong> a<br />
maioria dos resi<strong>de</strong>ntes é <strong>de</strong> orig<strong>em</strong> anglo-saxã, ou seja, há mais domicílios <strong>em</strong> que o idioma<br />
utilizado é o inglês do que domicílios que utilizam francês ou outros idiomas. A criação da<br />
cooperativa ocorreu <strong>de</strong> uma forma planejada, pela iniciativa <strong>de</strong> quatro pessoas com passado<br />
<strong>de</strong> envolvimento <strong>em</strong> trabalhos com a comunida<strong>de</strong> e que se sensibilizaram para a questão da<br />
consciência ecológica a partir dos <strong>de</strong>sastres provocados pelo Verglas, forte t<strong>em</strong>pesta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
neve que ocorreu <strong>em</strong> Montreal <strong>em</strong> 1998.<br />
A missão da LMV ressalta o comprometimento com a promoção <strong>de</strong> educação e ação<br />
social para fortalecer e inspirar práticas saudáveis e sustentáveis para o meio-ambiente. Em<br />
parceria com outras entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> orientação ecológica e com a comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> NDG, o<br />
Conselho <strong>de</strong> Administração e os m<strong>em</strong>bros-fundadores da LMV estão engajados e<br />
comprometidos na promoção <strong>de</strong> educação e ação social para promover práticas voltadas para<br />
a saú<strong>de</strong> do meio ambiente.<br />
VII. Discussão e Comparação da Aprendizag<strong>em</strong> com os Casos<br />
Nos dois casos estudados, as origens das organizações estão associadas a tragédias:<br />
uma pessoal e uma coletiva. No entanto, na LIM a criação da organização está relacionada a<br />
atitu<strong>de</strong> impetuosa, impulsionada pela re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações pessoais que apoiava o fundador, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
que sofreu o <strong>de</strong>sastre que o <strong>de</strong>ixou tetraplégico. Por sua vez, a LMV é fruto <strong>de</strong> ação planejada<br />
entre quatro pessoas que se mobilizaram para criar um espaço comunitário que favorecesse o<br />
ganho <strong>de</strong> consciência para questões ecológicas e <strong>de</strong>senvolvimento da comunida<strong>de</strong> local.<br />
As duas organizações buscam criar espaços <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços como forma <strong>de</strong><br />
promover geração <strong>de</strong> renda e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, construir consciência para a causa da<br />
entida<strong>de</strong>. Neste pormenor, ambas estão alinhadas com a idéia <strong>de</strong> Levesque (2002), na qual as<br />
organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos que surgiram após as crises da década <strong>de</strong> 1980 são<br />
inovadoras <strong>em</strong> relação ao passado, pois preten<strong>de</strong>m alinhar <strong>de</strong>senvolvimento social com<br />
ativida<strong>de</strong> econômica. Nenhuma das duas aceita a idéia <strong>de</strong> assistencialismo e ambas reforçam<br />
propostas <strong>de</strong> autonomia e inclusão social por meio <strong>de</strong> novos comportamentos, seja novas<br />
formas <strong>de</strong> produzir, comercializar e consumir produtos e serviços, seja pelo aprendizado e<br />
trabalho com a arte.<br />
Nos dois casos observamos que há pequeno interesse dos m<strong>em</strong>bros, cooperados ou<br />
associados, pela participação nas esferas <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões formais da organização, mesmo que<br />
tenham possibilida<strong>de</strong>s para a isso. Na LIM verificamos o pouco interesse <strong>de</strong> pais e voluntários<br />
por participar <strong>em</strong> reuniões <strong>de</strong> planejamento. Na LMV, presenciamos o quase cancelamento da<br />
reunião da Ass<strong>em</strong>bléia Geral por falta <strong>de</strong> quorum.<br />
Se interesse <strong>em</strong> participar das reuniões gerenciais é pequeno, por outro lado, a<br />
participação nas ativida<strong>de</strong>s que envolv<strong>em</strong> os serviços das organizações <strong>em</strong> si é elevada. Na<br />
10
LMV, observou-se <strong>em</strong> todas as visitas à loja que ela estava s<strong>em</strong>pre cheia e o ponto <strong>de</strong><br />
equilíbrio financeiro foi alçado. Na LIM, os eventos e ativida<strong>de</strong>s artísticas contam s<strong>em</strong>pre<br />
com a presença <strong>de</strong> quase todos os alunos e familiares, como é o caso das exposições anuais<br />
dos trabalhos dos alunos. Isso nos sugeriu concluir que o comportamento solidário é mais<br />
praticado pelo consumo do que pela participação direta nos processos <strong>de</strong>cisórios e nos fez<br />
pensar no papel das organizações como mediadoras sociais, tal qual colocado por Marshall<br />
(1996). Cabe refletir sobre outros modos <strong>de</strong> participação, que se dão por outros caminhos que<br />
não necessariamente pela participação direta nos processos <strong>de</strong>cisórios.<br />
Tanto a LIM quanto a LVM trabalham com misturas <strong>de</strong> recursos – públicos, privados,<br />
não monetários, não mercantis – com multistakehol<strong>de</strong>rs e com a orientação <strong>de</strong> tentar compor<br />
um equilíbrio entre a economia <strong>de</strong> mercado e o <strong>de</strong>senvolvimento da causa social. Entretanto,<br />
no período <strong>de</strong> investigação <strong>de</strong>dicado a cada uma das organizações, observamos que a questão<br />
econômica (negócios, vendas <strong>de</strong> serviços, prestação <strong>de</strong> serviços r<strong>em</strong>unerados, criação <strong>de</strong><br />
filiais) foram tratadas <strong>de</strong> modo distinto nas duas organizações.<br />
Na LIM, conseguir <strong>de</strong>senvolver trabalho r<strong>em</strong>unerado é consi<strong>de</strong>rado o corolário do<br />
processo <strong>de</strong> inclusão social para pessoas portadoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência. A LIM adota como<br />
política na comercialização das obras <strong>de</strong> cada aluno o princípio <strong>de</strong> que, quando vendidas, uma<br />
parte da receita vai para os próprios alunos – a maior parte – e outra para a LIM. Os alunos<br />
têm participação na receita e não no exce<strong>de</strong>nte − <strong>de</strong>scontados custos <strong>de</strong> organização. O maior<br />
evento continua a ser a exposição anual, com os melhores trabalhos escolhidos por uma<br />
curadoria que inclui m<strong>em</strong>bros da associação, professores e críticos <strong>de</strong> arte. Segundo,<br />
respectivamente, o fundador e uma aluna:<br />
Quando os alunos começam a ver seus quadros sendo vendidos,<br />
mudam suas expectativas, é como se começass<strong>em</strong> a pensar que po<strong>de</strong>m<br />
ter um futuro profissional. Eu vislumbro isso como um dos pilares da<br />
escola. É muito <strong>de</strong>sgastante o trabalho <strong>de</strong> patrocínio. Se po<strong>de</strong>mos ter<br />
essa liberda<strong>de</strong>, t<strong>em</strong>os que ir atrás. (Informação verbal) 2 .<br />
Até já vendi quadro! (Informação verbal) 3 .<br />
Entretanto, na LMV, o crescimento nas vendas apareceu como fonte <strong>de</strong> conflitos entre<br />
os fundadores e outros m<strong>em</strong>bros da cooperativa. Em set<strong>em</strong>bro <strong>de</strong> 2003, enquanto a maioria <strong>de</strong><br />
seus 2700 m<strong>em</strong>bros com<strong>em</strong>orava o alcance do ponto <strong>de</strong> equilíbrio entre receitas e <strong>de</strong>spesas,<br />
uma outra parte, incluindo aí os m<strong>em</strong>bros fundadores da cooperativa <strong>em</strong> 1999, não se<br />
mostravam nada satisfeitos com os resultados alcançados até então; o motivo alegado: mesmo<br />
atingindo resultado financeiro positivo, o trabalho na cooperativa ainda não alcançara os<br />
objetivos iniciais propostos na fundação. Para os quatro m<strong>em</strong>bros fundadores, as ativida<strong>de</strong>s<br />
comerciais, que transcorriam tão b<strong>em</strong>, <strong>de</strong>veriam s<strong>em</strong>pre ser consi<strong>de</strong>radas um meio para<br />
suportar o trabalho <strong>de</strong> educação da comunida<strong>de</strong>, visando o <strong>de</strong>senvolvimento sustentável; o<br />
comércio não era um fim <strong>em</strong> si mesmo. Revelava-se, portanto, uma diferença entre os<br />
m<strong>em</strong>bros sobre o sentido da missão da cooperativa, ainda que todos eles permanecess<strong>em</strong><br />
unidos na idéia <strong>de</strong> uma organização voltada para um b<strong>em</strong> comum relacionado à educação<br />
ambiental e promoção <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento local sustentável.<br />
Essa distinção mostra uma importante diferença entre o que observamos no trabalho<br />
<strong>de</strong> campo e o que apren<strong>de</strong>mos na revisão teórica. Como tiv<strong>em</strong>os oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expor,<br />
autores ligados à economia social têm por idéia <strong>de</strong> base o encastramento entre social e<br />
econômico, enquanto autores relacionados com o nonprofit sector não tratam disso<br />
11
objetivamente. Nos estudos <strong>de</strong> campo, observamos justamente o contrário! A organização da<br />
economia social tratava o crescimento como um potencial fator <strong>de</strong> <strong>de</strong>sequilíbrio e crise,<br />
enquanto a organização que representa uma NPO encarava-o como caminho <strong>de</strong><br />
sustentabilida<strong>de</strong> econômico-financeira no longo prazo.<br />
Sendo uma organização da economia social, os m<strong>em</strong>bros gestores da LMV apresentam<br />
uma nítida preocupação <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver um mo<strong>de</strong>lo organizacional no qual componha<br />
relações <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> estejam enlaçadas com relações <strong>de</strong> pertencimento a uma associação<br />
<strong>de</strong> pessoas com i<strong>de</strong>ais comuns. Na LIM, a orientação não é para o mo<strong>de</strong>lo organizacional e<br />
sim para a prestação dos serviços e conquista <strong>de</strong> autonomia por meio do trabalho artístico. A<br />
estrutura da LIM não é inovadora, havendo especialização e centralização <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão na<br />
pessoa do fundador. Isso, no entanto, não apareceu nos <strong>de</strong>poimentos como um probl<strong>em</strong>a ou<br />
ponto <strong>de</strong> atenção. Ao contrário, a estrutura funciona como um fator construtor <strong>de</strong> sentido e<br />
orientador das ações que cada um <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>s<strong>em</strong>penhar para que a escola <strong>de</strong> artes atenda cada<br />
vez mais alunos. Esta característica da LIM nos fez pensar no trabalho <strong>de</strong> Brown e Eisenhardt<br />
(1997) que trata a existência <strong>de</strong> processos <strong>de</strong>cisórios centralizados como fator <strong>de</strong> construção<br />
do sentido para uma equipe <strong>de</strong> trabalho inovadora.<br />
As duas organizações passam por processos <strong>de</strong> profissionalização, diminuindo a<br />
parcela do trabalho realizado por voluntários e recrutando profissionais no mercvado <strong>de</strong><br />
trabalho com conhecimento e formação específica <strong>em</strong> gestão. Porém, só na LMV isso se<br />
mostra como orig<strong>em</strong> <strong>de</strong> um conflito entre objetivos econômicos e sociais. Para a LIM, a<br />
questão da profissionalização não significa probl<strong>em</strong>a, uma vez que se enten<strong>de</strong> que é por meio<br />
<strong>de</strong>la que se viabiliza a autonomia econômico-financeira. Fatores sociais e econômicos não<br />
apenas interag<strong>em</strong> <strong>de</strong> forma distinta nas duas organizações, mas também receb<strong>em</strong> perspectivas<br />
<strong>de</strong> interpretação e importância diferentes pelos m<strong>em</strong>bros <strong>de</strong> cada uma.<br />
O crescimento das ativida<strong>de</strong>s comerciais da LMV levou-a à seguinte mudança: <strong>de</strong> um<br />
espaço <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento comunitário para uma iniciativa <strong>em</strong>preen<strong>de</strong>dora orientada para<br />
consumo consciente e suporte a programas <strong>de</strong> agricultura familiar. Na LIM, o crescimento foi<br />
acompanhado por cada vez maior grau <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são à filosofia da inclusão social, o que a levou<br />
a alterar sua missão <strong>de</strong> escola para <strong>de</strong>ficientes para escola com acesso a <strong>de</strong>ficientes. O<br />
crescimento levou a LMV a transcen<strong>de</strong>r a idéia inicial <strong>de</strong> espaço comunitário, para tornar-se<br />
um ponto <strong>de</strong> consumo consciente. Na LIM, o crescimento reforçou a missão inicial,<br />
favorecendo a inclusão social.<br />
As duas organizações vêm buscando formas <strong>de</strong> auto-sustentação. Por vezes as<br />
soluções encontradas para a sustentação econômica ou viabilida<strong>de</strong> da organização são<br />
confundidas com os objetivos, chegando mesmo a gerar conflitos. Este fato reforça a idéia <strong>de</strong><br />
que a gestão <strong>de</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos é marcada pela complexida<strong>de</strong> e pela<br />
ambigüida<strong>de</strong>.<br />
Os conflitos na LMV parec<strong>em</strong> relacionados às diferenças na construção <strong>de</strong> sentidos<br />
entre os m<strong>em</strong>bros <strong>em</strong> relação ao papel social da cooperativa. Adicionalmente, po<strong>de</strong>mos<br />
associa-los ao que Paton <strong>de</strong>finiu como conflitos <strong>de</strong> valores, ou seja,"um conflito<br />
organizacional que reflete tensões não resolvidas ou <strong>em</strong>ergentes a respeito do<br />
comprometimento com a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> central ou missão <strong>de</strong> uma organização" (PATON, 1996,<br />
p. 31).<br />
Consi<strong>de</strong>rar as tensões e conflitos relatados na LMV como associados à construção <strong>de</strong><br />
sentido ou conflito <strong>de</strong> valores sugere investigar qual a relação disso com as formas <strong>de</strong><br />
governança e com a estrutura organizacional. Os estudos <strong>de</strong> casos e o estudo da literatura nos<br />
faz<strong>em</strong> consi<strong>de</strong>rar que organizações inovadoras são propensas a situações <strong>de</strong> ambigüida<strong>de</strong> e no<br />
terceiro setor isso não é diferente. No entanto, a economia social fornece um aparato<br />
12
normativo mais robusto para tratar <strong>de</strong>stas questões, uma vez que prescreve como é o<br />
relacionamento entre m<strong>em</strong>bros e entre m<strong>em</strong>bros e <strong>em</strong>presa. Como vimos, o mo<strong>de</strong>lo<br />
organizacional da LMV possibilitou inovação social, mas existe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dividir a<br />
LMV entre uma cooperativa e uma associação, o que <strong>de</strong>nota uma incapacida<strong>de</strong> das pessoas<br />
<strong>em</strong> lidar com a ambigüida<strong>de</strong>, mesmo inseridas <strong>em</strong> estruturas <strong>de</strong>senhadas para cont<strong>em</strong>pla-las.<br />
VIII. Discussão dos Resultados do Trabalho <strong>de</strong> Pesquisa<br />
Os estudos <strong>de</strong> casos apresentados neste trabalho possibilitaram as seguintes reflexões<br />
sobre as relações existentes nos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão e inovação social:<br />
Os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão relatados na literatura sobre nonprofit sector e economia social<br />
são diferentes <strong>em</strong> aspectos normativos, jurídicos, nas formas organizacionais e no modo <strong>de</strong><br />
governança. A revisão bibliográfica apontou para a conclusão <strong>de</strong> que a economia social<br />
oferece possibilida<strong>de</strong>s mais concretas <strong>de</strong> inovação social, pelo menos no plano teórico. No<br />
trabalho <strong>de</strong> campo, ao contrário, o crescimento das ativida<strong>de</strong>s comerciais gera para a LMV<br />
levou a um momento <strong>de</strong> crise entre os m<strong>em</strong>bros, o que não acontece na LIM. A geração <strong>de</strong><br />
receita é consi<strong>de</strong>rada por alguns m<strong>em</strong>bros da LMV como fonte <strong>de</strong> <strong>de</strong>scaracterização dos<br />
objetivos comunitários da cooperativa, enquanto na LIM a geração <strong>de</strong> receita é o resultado da<br />
evolução do trabalho artístico <strong>de</strong> indivíduos <strong>em</strong> situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sfavorecimento social.<br />
Curiosamente, a proposta <strong>de</strong> um novo encastramento entre econômico e social foi<br />
relatado na literatura sobre economia social, mas nossa experiência no campo nos mostrou<br />
que é a organização com perfil próximo aos que enten<strong>de</strong>mos como nonprofit sector que<br />
consegue lidar com os dois aspectos <strong>de</strong> forma não conflituosa, incentivando os m<strong>em</strong>bros a<br />
engajar-se <strong>em</strong> ativida<strong>de</strong>s comerciais como parte do processo <strong>de</strong> inclusão social.<br />
O estudo do caso na LIM sugere que não há necessariamente relação negativa entre<br />
geração <strong>de</strong> inovação social e estruturas organizacionais hierárquicas. Observamos a LIM po<strong>de</strong><br />
ser consi<strong>de</strong>rada como organização promotora <strong>de</strong> inovação social mesmo apresentando um<br />
perfil <strong>de</strong> estrutura hierárquica e processo <strong>de</strong>cisório centralizado. Os m<strong>em</strong>bros escolh<strong>em</strong><br />
participar nas ativida<strong>de</strong>s finais – lojas, eventos e exposições – consi<strong>de</strong>rando legítimo e<br />
a<strong>de</strong>quado a gestão ficar sob responsabilida<strong>de</strong> do fundador.<br />
Analogamente, na LMV também observamos que, conquanto aconteçam<br />
periodicamente fóruns <strong>de</strong> discussão e <strong>de</strong> participação abertos para todos os stakehol<strong>de</strong>rs,<br />
<strong>de</strong>nota-se pouco interesse pelo exercício da participação nos processos <strong>de</strong>cisórios. Há, no<br />
entanto, gran<strong>de</strong> interesse pelas ativida<strong>de</strong>s que envolv<strong>em</strong> os produtos ou serviços oferecidos<br />
pela cooperativa. Isso sugere que os stakehol<strong>de</strong>rs buscam ativamente participar das<br />
ativida<strong>de</strong>s, porém não apresentam interesse nos processo <strong>de</strong>cisórios que lhes são facultados.<br />
Cabe a reflexão sobre o sentido <strong>de</strong> participação, termo ou conceito amplamente utilizado no<br />
campo <strong>de</strong> estudos sobre organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos e que também é enfatizado como<br />
fator promotor <strong>de</strong> inovação social nos níveis individual e organizacional.<br />
Ao comparar os resultados das investigações teórica e <strong>em</strong>pírica chegamos às seguintes<br />
reflexões:<br />
A produção teórica, principalmente da economia social, confere ao terceiro setor uma<br />
representação <strong>de</strong> distinção <strong>em</strong> relação ao setor privado e público. São freqüentes os trabalho<br />
que apresentam o terceiro setor mais competente para gerar inovação e aprendizado, isso é<br />
claramente um discurso reducionista e que t<strong>em</strong> por objetivo marcar um ponto <strong>de</strong> vista<br />
i<strong>de</strong>ológico. Os dois estudos <strong>de</strong> casos ofereceram evidência <strong>de</strong> inovação social, no entanto não<br />
parece a<strong>de</strong>quado consi<strong>de</strong>rar que toda organização do terceiro setor seja, por <strong>de</strong>finição, uma<br />
13
geradora <strong>de</strong> inovação social, b<strong>em</strong> como consi<strong>de</strong>rar que as organizações <strong>de</strong> negócios não sejam<br />
capazes <strong>de</strong> gerar inovação social na mesma medida; Embora a literatura faça referência à<br />
existência da complexida<strong>de</strong> e da ambigüida<strong>de</strong> <strong>em</strong> organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos, não foram<br />
i<strong>de</strong>ntificados trabalhos que trat<strong>em</strong> <strong>de</strong>ssas questões sob o ponto <strong>de</strong> vista da gestão. O tom geral<br />
encontrado nessa bibliografia é normativo e prescritivo; observa-se a ausência <strong>de</strong> literatura<br />
com base <strong>em</strong> teoria crítica. Nos estudos <strong>de</strong> casos, no entanto, há evidências <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong><br />
e ambigüida<strong>de</strong>;<br />
Afinal, quais os fatores e relações existentes nos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão facilitam ou<br />
dificultam o surgimento <strong>de</strong> inovação social <strong>em</strong> organizações? Este trabalho <strong>de</strong>senvolveu a<br />
conceituação acerca <strong>de</strong>ssa questão chegando às seguintes reflexões:<br />
Abordagens, práticas ou intervenções são consi<strong>de</strong>radas geradoras <strong>de</strong> inovação social<br />
se provocar<strong>em</strong> mudanças <strong>em</strong> um <strong>de</strong>terminado contexto, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt<strong>em</strong>ente <strong>de</strong> ser<strong>em</strong> inéditas.<br />
A inovação social está relacionada à mudanças <strong>em</strong> papéis sociais, ou seja, mudanças na foram<br />
como o individuo se pensa no mundo e nas expectativas recíprocas entre pessoas.<br />
O estudo da produção acadêmica sobre nonprofit sector não evi<strong>de</strong>nciou o uso do<br />
termo inovação social. Na literatura anglófona, inovação social aparece <strong>em</strong> trabalhos que não<br />
são necessariamente relacionados a organizações s<strong>em</strong> fins lucrativos. Com base nisso,<br />
chegamos às seguintes proposições teóricas:<br />
(i) inovações sociais po<strong>de</strong>m ocorrer intencionalmente ou <strong>em</strong>ergir <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong><br />
mudança social s<strong>em</strong> planejamento prévio;<br />
(ii) inovações sociais po<strong>de</strong>m ocorr<strong>em</strong> <strong>em</strong> três níveis: atores sociais; organizações e<br />
instituições;<br />
(iii)são indicadores <strong>de</strong> inovação social <strong>em</strong> atores sociais práticas relevantes para<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> autonomia, co-responsabilida<strong>de</strong>, participação <strong>de</strong> populações<br />
excluídas e aumento da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida;<br />
(iv) são indicadores <strong>de</strong> inovação social nas organizações estruturas organizacionais e <strong>de</strong><br />
governança que promovam formas <strong>de</strong> divisão e coor<strong>de</strong>nação do trabalho <strong>de</strong>mocráticas<br />
e que favoreçam aprendizag<strong>em</strong> e autonomia;<br />
(v) são indicadores <strong>de</strong> inovação social nas instituições mudanças nos ambientes legal,<br />
político, social e econômico que favoreçam a universalização <strong>de</strong> direitos, o surgimento<br />
<strong>de</strong> legislações que promovam inclusão social e <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> minorias;<br />
Terminamos este estudo com a consciência <strong>de</strong> que a idéia <strong>de</strong> setores distintos na<br />
economia não revela a complexida<strong>de</strong> e as ambigüida<strong>de</strong>s do mundo atual que se caracteriza<br />
por fronteiras flexíveis, mutáveis ou mesmo in<strong>de</strong>finidas. As organizações se entrelaçam por<br />
meio <strong>de</strong> parcerias e alianças o que torna imperfeito consi<strong>de</strong>rar mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> gestão como sendo<br />
próprios para apenas um setor.<br />
Na mesma linha <strong>de</strong> pensamento, não parece que seja a<strong>de</strong>quado continuar consi<strong>de</strong>rando<br />
que os probl<strong>em</strong>as sociais são questões ausentes do mundo das organizações <strong>de</strong> negócios.<br />
Assim, esse trabalho traz como contribuição a reflexão <strong>de</strong> um t<strong>em</strong>a que constant<strong>em</strong>ente<br />
aparece relacionado a organizações <strong>de</strong> negócios e que apresentamos <strong>em</strong> uma perspectiva<br />
social: a inovação. Tal como ele, outros t<strong>em</strong>as po<strong>de</strong>rão ser investigados na mesma<br />
perspectiva.<br />
14
IX. Referências Bibliográficas<br />
AUCLAIR, René; LAMPRON, Christiane. Approche intégrée: une innovation dans la<br />
dispensation <strong>de</strong>s services sociaux. Service <strong>Social</strong>, [S.I.], vol.36, n. 2/3, p.315-341, 1987.<br />
BILLIS, D.; HARRIS, M. Voluntary Agencies: Challenges of Organisation & Manag<strong>em</strong>ent.<br />
Londres: Macmillan Press Ltd, 1996.<br />
BORZAGA, C.; DEFOURNY, J. (Editors) The Emergence of <strong>Social</strong> Enterprise. Routledge<br />
Studies of Voluntary and Non-profit Organizations, London, 2001.<br />
BROWN, S.; EISENHARDT, K. The Art of Continous Change: Linking Complexity Theory<br />
and Time-Paced Evolution in Relentlessly Shifting Organizations. Administrative Sciencie<br />
Quartely, Local, v.42, n.1, p. 1-34, 1997.<br />
CLOUTIER, Julie. Qu'est-ce que l'innovation sociale? Centre <strong>de</strong> Recherche sur les<br />
Innovations <strong>Social</strong>es. Document <strong>de</strong> travail <strong>de</strong> l'interaxe, Montreal, 2003.<br />
COOPERRIDER, D.; PASMORE, W. Global <strong>Social</strong> Change: A New Agenda for <strong>Social</strong><br />
Science? Human Relations, v.44, n.10, p. 1037-1055, 1991.<br />
CORNFORTH, Chris (ed.) The Governance of Public and Nonprofit Organisations: What do<br />
boards do? Londres: Routledge Studies in the manag<strong>em</strong>ent of voluntary and non-profit<br />
organizations, 2003.<br />
DEPUYDT, D.; MALICE, P.; MARECHAL, P; (Org.). Developper L´Entreprise <strong>Social</strong>e.<br />
Bruxelas: Fondation Roi Baudouin, 1994, ISBN: 2-87212-126-9.<br />
DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: institutional isomorphism and<br />
collective rationality in organizational fields. American Sociological Review, [S.I.], v. 48:<br />
p.147-160, 1983.<br />
D'AMOURS, M. Procès d'institutionnlisation <strong>de</strong> l'économie sociale au Québec. Québec<br />
(Canada, Province): Copublication CRISES/LAREPPS, 2000.<br />
DRAYTON, W. e McDONALD, S. Leading Public Entrepreneurs. Ashoka; Innovators for<br />
the Public, 1993.<br />
DUCA, D.J. Mo<strong>de</strong>ls of Governance and Lea<strong>de</strong>rship. In: ______ Nonprofit Boards: Roles<br />
Responsibilities and Performance, New York, Jonh Wiley & Sons, 1996. p. 2-15.<br />
GORDON, R. Les entrepreneurs, l´entreprise el les fon<strong>de</strong>ments sociaux <strong>de</strong> l´innovation.<br />
Sociologie du Travail, Paris, vol. 31, n.1, 1989.<br />
KEATING, E.; FRUMKIN, P. Reengeniring nonprofit financial accountability: toward a<br />
more reliable foundation for regulation. Public Administration Review, Washington, v. 63,<br />
n.1, p. 3-15, Jan/Feb. 2003.<br />
LALLEMAND, D. Les <strong>de</strong>fies <strong>de</strong> l'innovation sociale. Issy-les-Moulineaux: ESF Editeur,<br />
2001.<br />
LÉVESQUE, B. Les entreprises d'économie sociale, plus porteuses d'innovations sociales que<br />
les autres? In: COLLOQUE DU CQRS AU CONGRES DE L’ACFAS, 2001, Montreal,<br />
Cahiers du CRISES, v. 0205, 2002.<br />
MALO, M.C. La gestion stratégique <strong>de</strong> la coopérative et <strong>de</strong> l’association d’économie <strong>Social</strong>e.<br />
1ière partie: l´entrepreneur et son environn<strong>em</strong>ent” . RECMA, Revue Internationale <strong>de</strong><br />
L´Économie <strong>Social</strong>e, 80e année, no 281, p.84-95, 2001.<br />
15
MARSHALL, T. Can we <strong>de</strong>fine the voluntary sector? In: BILLIS, D.; HARRIS, M.<br />
Voluntary Agencies: Challenges of Organisation & Manag<strong>em</strong>ent. Londres: Macmillan Press<br />
Ltd, 1996.<br />
POLANYI, K. La gran<strong>de</strong> Transformation: aux origins politiques et économiques <strong>de</strong> notre<br />
t<strong>em</strong>ps. Paris: Gallimard, 1983.<br />
QUÉBEC (Canada). Conseil <strong>de</strong> la Science et <strong>de</strong> la Technologie. Innovation <strong>Social</strong>e et<br />
Innovation Technologique: l'apport <strong>de</strong> la recherche <strong>em</strong> sciences sociales et humaines. Sainte-<br />
Foy (Québec), 2000. 82p. Disponível <strong>em</strong>: . Acesso <strong>em</strong> 12 abr.<br />
2006.<br />
SALAMON, L. et al. Global Civil Society: dimensions of the nonprofit sector. Baltimore:<br />
Johns Hopkins Center for Civil Society Studies. 1997.<br />
SALAMON, L.; ANHEIER, H. <strong>Social</strong> origins of civil society: explaining the nonprofit sector<br />
cross-nationally. Voluntas, [S.I.], V.9 N. 2, 1998.<br />
SALAMON, L.; ANHEIER, H. Defining the nonprofit sector: a cross-national analisys.<br />
Manchester: Manchester University Press, 1997.<br />
TAYLOR, J. Introducing <strong>Social</strong> Innovation. The Journal of Applied Behavioral Science,<br />
[S.I.], v. 6, n.1, p. 69-77, 1970.<br />
TAYLOR, M. What are the key influences on the work of voluntary agencies? In: BILLIS,<br />
D.; HARRIS, M. Voluntary Agencies: Challenges of Organisation & Manag<strong>em</strong>ent. Londres:<br />
Macmillan Press Ltd, 1996.<br />
TOURAINE, A., <strong>Social</strong> Mov<strong>em</strong>ents and <strong>Social</strong> Change, In BORDA, O. F. (Org.) The<br />
Challenge of <strong>Social</strong> Change. London, Sage, 1985. p. 77-92.<br />
WOOD JÚNIOR, T. Novas configurações organizacionais: pesquisa exploratória <strong>em</strong>pírica<br />
sobre organizações locais. NPP – Núcleo <strong>de</strong> Pesquisas e Publicações, Série Relatórios <strong>de</strong><br />
Pesquisa – EAESP-FGV. São Paulo: Relatório n.37, 2001.<br />
1 <strong>Inovação</strong> <strong>Social</strong> e <strong>Inovação</strong> Tecnológica: relações com a pesquisa <strong>em</strong> ciências sociais e<br />
humanas – por uma política quebequense da inovação.<br />
2 Fundador da LIM, <strong>de</strong>poimento concedido <strong>em</strong> 26/03/2004.<br />
3 Aluna <strong>de</strong> 56 anos, que sofreu quatro aci<strong>de</strong>ntes vasculares cardíacos e possui apenas parte<br />
dos movimentos das mãos, nunca havia aprendido artes antes <strong>de</strong> 2001. Depoimento concedido<br />
<strong>em</strong> 22/03/2004.<br />
16