PAIXÃO DE ARTISTA - Crmpr.org.br
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Esta edição é dedicada à imprensa médica e à medicina na imprensa; expressão de um conhecimento movediço.<<strong>br</strong> />
<strong>PAIXÃO</strong> <strong>DE</strong> <strong>ARTISTA</strong>
03<<strong>br</strong> />
10<<strong>br</strong> />
21<<strong>br</strong> />
26<<strong>br</strong> />
IÁTRICA AO LEITOR<<strong>br</strong> />
Provocar, para<<strong>br</strong> />
despertar.<<strong>br</strong> />
INGLESES E<<strong>br</strong> />
AMERICANOS<<strong>br</strong> />
Contrastes que<<strong>br</strong> />
exigem atenção.<<strong>br</strong> />
O MÉDICO E A<<strong>br</strong> />
RELIGIÃO<<strong>br</strong> />
Mitos e Conflitos.<<strong>br</strong> />
HUMANISMO E<<strong>br</strong> />
TECNICISMO<<strong>br</strong> />
Reflexão so<strong>br</strong>e passado<<strong>br</strong> />
e presente.<<strong>br</strong> />
O<strong>br</strong>a “A bela e a<<strong>br</strong> />
fera”, <strong>br</strong>onze, de Luiz<<strong>br</strong> />
Gagliastri (PR).<<strong>br</strong> />
“Esta edição é dedicada à<<strong>br</strong> />
imprensa médica e à medicina<<strong>br</strong> />
na imprensa; expressão de um<<strong>br</strong> />
conhecimento movediço.”<<strong>br</strong> />
05<<strong>br</strong> />
16<<strong>br</strong> />
JOIO DO TRIGO<<strong>br</strong> />
Apostar na liberdade<<strong>br</strong> />
intelectual.<<strong>br</strong> />
<strong>PAIXÃO</strong> <strong>DE</strong> <strong>ARTISTA</strong><<strong>br</strong> />
Rodin, Gagliastri e<<strong>br</strong> />
Paixão, as diferentes<<strong>br</strong> />
faces da arte.<<strong>br</strong> />
31 <strong>DE</strong>CÁLOGOS<<strong>br</strong> />
10 razões para se ler<<strong>br</strong> />
revistas médicas.<<strong>br</strong> />
EDIÇÕES ANTERIORES<<strong>br</strong> />
Confira as edições do Iátrico<<strong>br</strong> />
no site do Conselho:<<strong>br</strong> />
www.crmpr.<strong>org</strong>.<strong>br</strong><<strong>br</strong> />
CAPA<<strong>br</strong> />
A mão da capa é uma homenagem<<strong>br</strong> />
do Iátrico ao médico<<strong>br</strong> />
sensível. Pouco importa clínico<<strong>br</strong> />
ou cirurgião; que toque crianças<<strong>br</strong> />
ou instrumentos; tem que ser<<strong>br</strong> />
de ação sem desprezar a<<strong>br</strong> />
ternura, de precisão sem negar<<strong>br</strong> />
afeto. Tem que ser uma mão<<strong>br</strong> />
diferente como a de Rodin,<<strong>br</strong> />
única, com a mestria do movimento.<<strong>br</strong> />
Pomponius Gauricus, circa<<strong>br</strong> />
1504, em seu “De Sculptura”<<strong>br</strong> />
disse: Os escritores atuam por<<strong>br</strong> />
meio das palavras... Os escultores<<strong>br</strong> />
por meio da ação. Médicos<<strong>br</strong> />
vão além: são múltiplos em<<strong>br</strong> />
sua seara; verbo e movimento<<strong>br</strong> />
são seus gestos de vida.<<strong>br</strong> />
Mutáveis, como a própria vida.<<strong>br</strong> />
PUBLICAÇÃO CIENTÍFICO-CULTURAL DO CONSELHO REGIONAL <strong>DE</strong> MEDICINA DO PARANÁ.<<strong>br</strong> />
Edição nº 18 - Julho a Outu<strong>br</strong>o de 2006<<strong>br</strong> />
CRMPR - Rua Victorio Viezzer, 84 | Vista Alegre | Curitiba-PR | CEP 80810-340 | Fone: 41 3240-4026 | E-mail: iatrico@crmpr.<strong>org</strong>.<strong>br</strong><<strong>br</strong> />
Conselho Editorial: João Manuel Cardoso Martins, Gerson Zafalon Martins, Luiz Sallim Emed, Donizetti Dimer Giamberardino Filho,<<strong>br</strong> />
Hélcio Bertolozzi Soares (presidente do CRM-PR), Ehrenfried O. Wittig e Hernani Vieira. Editor-Coordenador: João Manuel Cardoso<<strong>br</strong> />
Martins (Prof. da PUCPR e mem<strong>br</strong>o da Academia Paranaense de Medicina) Projeto Gráfico e Diagramação: Upper Comunicação (41<<strong>br</strong> />
3024-0674) | Impressão: Serzegraf (41 3026-9460) | Tiragem: 20.000 exemplares | Periodicidade: Trimestral
Como redator tenho<<strong>br</strong> />
um privilégio raro,<<strong>br</strong> />
o de poder escrever<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e o que me apeteça. Mas<<strong>br</strong> />
não o exerço. Sabem por<<strong>br</strong> />
quê? Porque tenho um critério,<<strong>br</strong> />
escrevo so<strong>br</strong>e o que<<strong>br</strong> />
gostaria de ter lido quando<<strong>br</strong> />
me formei.<<strong>br</strong> />
Já como editor tenho o dever de<<strong>br</strong> />
sugerir temas aos colaboradores, e de<<strong>br</strong> />
aceitar ou não o material enviado,<<strong>br</strong> />
pedido ou não. E os mais humildes<<strong>br</strong> />
são os velhos professores: — Vê se<<strong>br</strong> />
interessa ou não. É sem compromisso!<<strong>br</strong> />
Mas qual o critério? Se possível, que<<strong>br</strong> />
sejam bem escritos, bem pensados e<<strong>br</strong> />
bem evocativos ou provocativos. Esse<<strong>br</strong> />
o ponto. Só gerando dúvida na cabeça<<strong>br</strong> />
do leitor temos a certeza da reflexão.<<strong>br</strong> />
E sob reflexão haverá movimento,<<strong>br</strong> />
ação. No sentido de mudança ou<<strong>br</strong> />
de fortalecimento de suas convicções.<<strong>br</strong> />
Por isso, um texto cultural deveria<<strong>br</strong> />
mais provocar do que ensinar.<<strong>br</strong> />
Lem<strong>br</strong>o-me do ano da graça de 1979,<<strong>br</strong> />
quando um editor-médico suíço, Wolfgang<<strong>br</strong> />
Kolditz, se viu às voltas com um<<strong>br</strong> />
texto do sempre herético Martins Eisner.<<strong>br</strong> />
Publico ou não, eis a questão! Decisão:<<strong>br</strong> />
imprimir. Há um risco inerente a qualquer<<strong>br</strong> />
comprometimento verdadeiro; e esse<<strong>br</strong> />
risco é também integrante da responsabilidade<<strong>br</strong> />
redacional. Ou nas palavras<<strong>br</strong> />
também heréticas de Kolditz: Aquele que<<strong>br</strong> />
tem medo das conseqüências que poderiam<<strong>br</strong> />
decorrer do conhecimento (seja<<strong>br</strong> />
este, de fato, convincente, discutível ou<<strong>br</strong> />
errado) deve se contentar com o tédio<<strong>br</strong> />
insípido que todo paraíso promete para<<strong>br</strong> />
eternidade aos seus habitantes.<<strong>br</strong> />
A árvore do conhecimento<<strong>br</strong> />
apresenta riscos, e<<strong>br</strong> />
seus frutos podem ser bem<<strong>br</strong> />
indigestos.<<strong>br</strong> />
Esta edição do Iátrico<<strong>br</strong> />
tem a pretensão de provocálo,<<strong>br</strong> />
dileto leitor. Se o fizer,<<strong>br</strong> />
também se desdo<strong>br</strong>ará em conhecimento<<strong>br</strong> />
a si. Ou na sentença de<<strong>br</strong> />
Schiller: “Se queres te conhecer,<<strong>br</strong> />
observa os outros. Se quiseres compreender<<strong>br</strong> />
os outros, olha no fundo de<<strong>br</strong> />
ti mesmo”. Sempre direito e avesso.<<strong>br</strong> />
Sempre os ângulos insuspeitos.<<strong>br</strong> />
É assim uma cabeça bem-feita;<<strong>br</strong> />
não se faz por si só. Necessita ser<<strong>br</strong> />
recheada por dúvidas e provocações.<<strong>br</strong> />
Ou seja, é uma erupção de imperfeições<<strong>br</strong> />
em busca da harmonia. E com<<strong>br</strong> />
esta não se contenta, pois persegue<<strong>br</strong> />
a autonomia de pensamento.<<strong>br</strong> />
Aceite nossas provocações e<<strong>br</strong> />
tenha boa leitura.<<strong>br</strong> />
tema<<strong>br</strong> />
3
imprensa<<strong>br</strong> />
4<<strong>br</strong> />
H<<strong>br</strong> />
á uma citação de Shakespeare<<strong>br</strong> />
que traduzida — “Each in his time,<<strong>br</strong> />
plays many roles” — significa que<<strong>br</strong> />
cada um desempenha muitos papéis, ou<<strong>br</strong> />
seja, o poeta tentava aclarar que cada ser<<strong>br</strong> />
humano tem um universo dentro de si. Pelo<<strong>br</strong> />
menos os mais bem aquinhoados em<<strong>br</strong> />
circuitaria cere<strong>br</strong>al.<<strong>br</strong> />
Tomo essa idéia para explicitar que o<<strong>br</strong> />
fazer médico, além de sua prática mais<<strong>br</strong> />
imediata com o paciente, também implica<<strong>br</strong> />
na função social de divulgar a medicina e a<<strong>br</strong> />
saúde. Mas isso torna-se difícil por que divulgar<<strong>br</strong> />
a ciência médica para colegas é uma<<strong>br</strong> />
coisa, já em si difícil, para leigos, outra, bem<<strong>br</strong> />
mais penosa. Basta dizer que com colegas<<strong>br</strong> />
usamos jargão e razão, e que estas ferramentas<<strong>br</strong> />
cognitivas têm pouca valia com o<<strong>br</strong> />
público leigo, mais propenso à emoção.<<strong>br</strong> />
Sabemos que informação não muda<<strong>br</strong> />
comportamento. Se fosse o contrário,<<strong>br</strong> />
provavelmente não teríamos mais Aids nem<<strong>br</strong> />
engravidamentos indesejados na adultícia.<<strong>br</strong> />
Para que a informação mude comportamento<<strong>br</strong> />
tem que ser processada, assimilada,<<strong>br</strong> />
e ainda virar convicção. É um longo<<strong>br</strong> />
caminho que passa não apenas pelo raciocínio<<strong>br</strong> />
lógico e analítico, mas principalmente<<strong>br</strong> />
pelas impressões, território carregado de<<strong>br</strong> />
emoções. Só se convence pela racionalidade<<strong>br</strong> />
os racionais, naturalmente uma pequena<<strong>br</strong> />
parcela da população. A maioria tem que<<strong>br</strong> />
ser pega pela emoção, porque age emocionalmente<<strong>br</strong> />
o tempo todo. Basta você,<<strong>br</strong> />
dileto leitor, assistir em uma tarde de ócio o<<strong>br</strong> />
que é propagado pela mídia televisiva. As<<strong>br</strong> />
panacéias mais absurdas, mais inverossímeis,<<strong>br</strong> />
são vendidas e compradas copiosamente.<<strong>br</strong> />
Acredite, até por médicos e seus familiares.<<strong>br</strong> />
Então, a questão que se formula é a seguinte:<<strong>br</strong> />
como divulgar medicina e saúde de maneira<<strong>br</strong> />
eficaz e correta? Claro que usando a<<strong>br</strong> />
racionalidade, mas temperada pela emoção.<<strong>br</strong> />
E quem você gostaria que as divulgasse?<<strong>br</strong> />
Pessoalmente preferiria um médico, mas o<<strong>br</strong> />
patrulhamento é enorme.<<strong>br</strong> />
Damos de om<strong>br</strong>os, isto é, não damos à<<strong>br</strong> />
mínima, quando um colega charlata paga para<<strong>br</strong> />
ser entrevistado pela mídia tecendo loas à sua<<strong>br</strong> />
competência, única naturalmente; verdadeiro<<strong>br</strong> />
repositório do engenho e arte. Mas quando o<<strong>br</strong> />
Drauzio Varella, no Fantástico, disse a uma<<strong>br</strong> />
paciente: — “Então vamos tirar a sua pressão”,<<strong>br</strong> />
sabem o que aconteceu? Foi varrido por uma<<strong>br</strong> />
enxurrada de e-mails de colegas que o<<strong>br</strong> />
desqualificavam dizendo que o certo era<<strong>br</strong> />
“medir a pressão”. Óquei, queriam mesmo é<<strong>br</strong> />
que tivesse dito à simplória paciente, “vou<<strong>br</strong> />
aferir sua tensão arterial”! Por aí vejam o grau<<strong>br</strong> />
de patrulhamento da classe com bons<<strong>br</strong> />
divulgadores. Já os charlatas podem agir à<<strong>br</strong> />
vontade, ninguém tá nem aí. Dizem que é para<<strong>br</strong> />
não se melecar. Então o que é melhor, uma<<strong>br</strong> />
imprensa marrom que corrompe e é corrompida<<strong>br</strong> />
por pseudos ? Ou exercermos uma das<<strong>br</strong> />
funções básicas da medicina que é ser divulgada<<strong>br</strong> />
corretamente e sem vieses mercantilistas<<strong>br</strong> />
à população? É por causa desse tipo de<<strong>br</strong> />
patrulhamento que muitos colegas competentes,<<strong>br</strong> />
e que gostam de ensinar, não se<<strong>br</strong> />
atrevem a aparecer na mídia. Têm receio de<<strong>br</strong> />
parecer pouco científicos pela classe.<<strong>br</strong> />
Claro que a divulgação da medicina e da<<strong>br</strong> />
saúde melhorou muito na imprensa leiga nos<<strong>br</strong> />
últimos trinta anos. E pelo simples motivo<<strong>br</strong> />
da população ter passado a se interessar mais<<strong>br</strong> />
pela própria saúde. As pessoas vivem mais e<<strong>br</strong> />
há mais possibilidades de prevenção. É um<<strong>br</strong> />
fenômeno mundial. Só nos últimos cinco<<strong>br</strong> />
anos, a revista Veja deu praticamente 1 ano<<strong>br</strong> />
de capas com matérias destinadas ao assunto.<<strong>br</strong> />
Tem quatro jornalistas preparadas e especializadas<<strong>br</strong> />
co<strong>br</strong>indo a área. Mas por melhores<<strong>br</strong> />
que sejam, e são ótimas, não têm formação<<strong>br</strong> />
nem vivência, não são médicas, por isso às<<strong>br</strong> />
vezes levam barrigas, publicam simples<<strong>br</strong> />
“releases” da indústria farmacêutica como se<<strong>br</strong> />
fossem o “ó do bodó”! Claro que o ideal seria<<strong>br</strong> />
ter um médico-jornalista, consultor, vivendo<<strong>br</strong> />
o dia-a-dia da redação. Nada como idealizar!<<strong>br</strong> />
De qualquer forma fazem bem seu trabalho,<<strong>br</strong> />
até por que seus leitores são cada vez mais<<strong>br</strong> />
desejosos de informações médicas e<<strong>br</strong> />
exigentes. Portanto, rastreiam as principais<<strong>br</strong> />
publicações especializadas à cata de bom<<strong>br</strong> />
material e conferem com especialistas os<<strong>br</strong> />
nós das matérias.<<strong>br</strong> />
Mas você há de me perguntar, isso é o<<strong>br</strong> />
que há de melhor em divulgação científica<<strong>br</strong> />
em nossa imprensa? Claro que não. O<<strong>br</strong> />
crème <strong>br</strong>ûlée da divulgação está na concorrente<<strong>br</strong> />
e antípoda ideológica de Veja,<<strong>br</strong> />
CartaCapital. Lá pontificam três médicos<<strong>br</strong> />
cientificamente competentes e com a<<strong>br</strong> />
grande qualidade jornalística de deixar<<strong>br</strong> />
coisas complexas ao sabor do leigo.<<strong>br</strong> />
Drauzio Varella, Riad Younes e Rogério<<strong>br</strong> />
Tuma assinam a coluna Evolução e Saúde,<<strong>br</strong> />
sempre centrada em coisas do interesse da<<strong>br</strong> />
população, do consumo de vitaminas às<<strong>br</strong> />
técnicas médicas mais recentes. Isso elevou<<strong>br</strong> />
o nível do que é publicado. Há trinta anos<<strong>br</strong> />
a divulgação era baseada em “fazedores de<<strong>br</strong> />
notícias médicas” plantados pelo complexo<<strong>br</strong> />
médico-industrial. O contraponto eram<<strong>br</strong> />
colunas heróicas, como as do falecido José<<strong>br</strong> />
Reis na Folha de S. Paulo. Hoje, embora<<strong>br</strong> />
ocorra a indução por parte da indústria, o<<strong>br</strong> />
leitor, se quiser, tem à sua disposição a<<strong>br</strong> />
possibilidade de ter informações qualificadas,<<strong>br</strong> />
filtradas por profissionais de boa<<strong>br</strong> />
formação e com vivência clínica. Em<<strong>br</strong> />
outros países ocorre o mesmo fenômeno.<<strong>br</strong> />
A tiragem das revistas aumenta quando a<<strong>br</strong> />
capa é so<strong>br</strong>e saúde e há picos de audiência<<strong>br</strong> />
quando os canais abordam avanços, reais<<strong>br</strong> />
ou despropositados, na medicina. E cada<<strong>br</strong> />
vez mais profissionais da área médica se<<strong>br</strong> />
tornam jornalistas.<<strong>br</strong> />
Claro que tudo tem dois lados. O<<strong>br</strong> />
telespectador que vê um ator conhecido<<strong>br</strong> />
passar por um transplante bem-sucedido,<<strong>br</strong> />
pensa simplesmente que o mesmo está<<strong>br</strong> />
curado, que nada mais precisa ser feito.<<strong>br</strong> />
Como se não tivesse trocado uma doença<<strong>br</strong> />
terminal, é fato, por outra crônica, o<<strong>br</strong> />
controle da rejeição. Pelo menos, nos<<strong>br</strong> />
chamados transplantes capitais, os que<<strong>br</strong> />
mais impressionam a população.<<strong>br</strong> />
É para adequar os avanços da medicina<<strong>br</strong> />
à realidade própria que precisamos muito dos<<strong>br</strong> />
divulgadores. Naturalmente há que haver<<strong>br</strong> />
cautela. Quando um profissional fala só de<<strong>br</strong> />
si, de suas habilidades e de seus tratamentos<<strong>br</strong> />
miraculosos, é hora de mudar de canal. Ou<<strong>br</strong> />
de revista. Ou de livro. Ou de sítio.
H<<strong>br</strong> />
á 25 anos o Canadian Medical<<strong>br</strong> />
Association Journal (vide referências<<strong>br</strong> />
no decálogo da penúltima<<strong>br</strong> />
página) publicava uma série de<<strong>br</strong> />
artigos que tentavam desmistificar a<<strong>br</strong> />
credibilidade instantânea adquirida por<<strong>br</strong> />
um artigo científico. Ou seja, a aura<<strong>br</strong> />
mística da palavra impressa. E fazia uma<<strong>br</strong> />
“razzia” em avaliação crítica, mostrando<<strong>br</strong> />
como muitos trabalhos publicados em<<strong>br</strong> />
revistas de prestígio, com um “peer review”<<strong>br</strong> />
de notáveis, falhavam no momento de<<strong>br</strong> />
discriminar a falta de evidências. E ia<<strong>br</strong> />
fundo. Metade dos artigos publicados nas<<strong>br</strong> />
revistas de maior credibilidade utilizavam<<strong>br</strong> />
métodos estatísticos inadequados, ou<<strong>br</strong> />
tinham problemas no seu desenho, na<<strong>br</strong> />
definição da amostra, ou erravam na<<strong>br</strong> />
escolha de indicadores e instrumentos.<<strong>br</strong> />
Depois de um quarto de século, como<<strong>br</strong> />
estamos? Melhoraram as revistas mas<<strong>br</strong> />
ainda temos problemas importantes.<<strong>br</strong> />
Outrossim, houve uma incrível expansão<<strong>br</strong> />
de revistas médicas que continuam<<strong>br</strong> />
cometendo os mesmos erros de há 25 anos.<<strong>br</strong> />
E notem, isso depois do advento e consolidação<<strong>br</strong> />
da chamada Medicina Baseada em<<strong>br</strong> />
Evidências. Sabe por quê? Vamos aos<<strong>br</strong> />
fatores: a revisão de pares (peer review) não<<strong>br</strong> />
tem resolvido o problema; o complexo<<strong>br</strong> />
médico-industrial continua plantando os<<strong>br</strong> />
resultados que quer; e as revistas científicas<<strong>br</strong> />
deveriam comentar criticamente os ensaios<<strong>br</strong> />
em vez de publicá-los. Acresce ser comum<<strong>br</strong> />
os ensaios terem como padrão de comparação,<<strong>br</strong> />
terapêutica reconhecidamente<<strong>br</strong> />
inferior; ou usarem comparações com a<<strong>br</strong> />
menor dose do comparativo; ou ao contrário,<<strong>br</strong> />
com a maior dose da droga de comparação,<<strong>br</strong> />
tornando a sua “menos tóxica”; igualmente<<strong>br</strong> />
comum é usarem amostras propositalmente<<strong>br</strong> />
pequenas, buscando múltiplos resultados<<strong>br</strong> />
finais para selecionar os mais favoráveis para<<strong>br</strong> />
publicação; ou estudos multicêntricos,<<strong>br</strong> />
selecionando os resultados dos centros mais<<strong>br</strong> />
favoráveis; ou de subgrupos propícios; ou<<strong>br</strong> />
apresentando os resultados que mais impressionam,<<strong>br</strong> />
por exemplo, redução do risco<<strong>br</strong> />
relativo e não do risco absoluto.<<strong>br</strong> />
Corolário: ou você, caro leitor, aprende<<strong>br</strong> />
a ler criticamente uma revista, ou será<<strong>br</strong> />
enrolado. Assustado? Assuste-se um pouco<<strong>br</strong> />
mais. Há um quarto de século para se manter<<strong>br</strong> />
atualizado na leitura das dez melhores<<strong>br</strong> />
revistas de Clínica Médica, um clínico<<strong>br</strong> />
deveria ler duzentos artigos e setenta<<strong>br</strong> />
imprensa<<strong>br</strong> />
editoriais por mês. A uma expansão de 7%<<strong>br</strong> />
ao ano, faça as contas e atualize os números.<<strong>br</strong> />
Eu escrevi as “dez principais”. Mas não se<<strong>br</strong> />
apoquente. Lutar por autonomia de leitura<<strong>br</strong> />
é sempre bom e você deveria fazê-lo. Se não<<strong>br</strong> />
conseguiu, o mercado está a seu favor. Para<<strong>br</strong> />
preencher essa lacuna lhe apresenta um<<strong>br</strong> />
leque de opções tradicionais ou eletrônicas,<<strong>br</strong> />
mastigadas e baseadas em evidências, de<<strong>br</strong> />
boa qualidade e com preços salgados, para<<strong>br</strong> />
os parcos proventos do esculápio patrício.<<strong>br</strong> />
Ironia à parte, há igualmente publicações<<strong>br</strong> />
“non-profit”, de boa cepa, e mais baratas.<<strong>br</strong> />
Como exemplo Medical Letter, no segmento<<strong>br</strong> />
de avaliação de drogas, de maneira<<strong>br</strong> />
didática e correta. Tudo que o homem<<strong>br</strong> />
complica em seguida simplifica. O tal do<<strong>br</strong> />
mercado se encarrega disso, desde que você<<strong>br</strong> />
tenha lastro. Nada é perfeito!<<strong>br</strong> />
Mas bom mesmo é não depender dos<<strong>br</strong> />
outros. Por isso, cabe a pergunta: onde está<<strong>br</strong> />
o conhecimento nessa pletora de informações?<<strong>br</strong> />
Onde a fidedignidade? Na sua liberdade<<strong>br</strong> />
intelectual, na sua capacidade de ser<<strong>br</strong> />
autônomo, de ler criticamente um artigo. Isso<<strong>br</strong> />
fará com que marche contra a corrente, do<<strong>br</strong> />
lado contrário do analfabetismo científico<<strong>br</strong> />
que, claro, sempre foi o caudal maior.<<strong>br</strong> />
5
imprensa<<strong>br</strong> />
6<<strong>br</strong> />
Q<<strong>br</strong> />
uero<<strong>br</strong> />
contribuir<<strong>br</strong> />
com uma análise e reflexão<<strong>br</strong> />
crítica so<strong>br</strong>e a minha<<strong>br</strong> />
vivência e desafios como<<strong>br</strong> />
fundador e editor - por 8 anos,<<strong>br</strong> />
de uma revista científica - a<<strong>br</strong> />
Revista do Médico Residente. Já<<strong>br</strong> />
havia adquirido uma experiência<<strong>br</strong> />
inicial e inspiradora como editor da<<strong>br</strong> />
Revista Médica do Paraná, órgão oficial<<strong>br</strong> />
da Associação Médica do Paraná.<<strong>br</strong> />
Segundo Su<strong>br</strong>amanyan apud Campello<<strong>br</strong> />
& Campos (1993), o periódico<<strong>br</strong> />
científico possui três funções: 1)<<strong>br</strong> />
registro público do conhecimento, pois<<strong>br</strong> />
qualquer indivíduo pode oferecer à<<strong>br</strong> />
apreciação um trabalho para publicação<<strong>br</strong> />
e, também, pode obter a publicação;<<strong>br</strong> />
2) função social, isto é, ele<<strong>br</strong> />
atribui prestígio e reconhecimento<<strong>br</strong> />
tanto aos autores, quanto aos editores<<strong>br</strong> />
do periódico, aos referees e, inclusive,<<strong>br</strong> />
aos seus assinantes; 3) disseminação<<strong>br</strong> />
da informação, colocando a informação<<strong>br</strong> />
à disposição do leitor, pois, se ela<<strong>br</strong> />
não for publicada, não existe.<<strong>br</strong> />
O primeiro e grande desafio é ter<<strong>br</strong> />
uma fonte financeira de manutenção<<strong>br</strong> />
da publicação de um periódico<<strong>br</strong> />
trimestral, com tiragem importante,<<strong>br</strong> />
para chegar a todo Estado e à maior<<strong>br</strong> />
parte das Instituições Acadêmicas do<<strong>br</strong> />
País, uma vez que a inserção de<<strong>br</strong> />
propagandas da área da saúde é cada<<strong>br</strong> />
vez mais difícil em periódicos que precisam<<strong>br</strong> />
ser indexados e reconhecidos.<<strong>br</strong> />
Mister se faz necessário para se<<strong>br</strong> />
obter outras fontes de financiamento,<<strong>br</strong> />
sem conflito de interesses, a incorporação<<strong>br</strong> />
de profissionais da área de<<strong>br</strong> />
marketing e propaganda.<<strong>br</strong> />
Os Pilares necessários<<strong>br</strong> />
para a publicação dos<<strong>br</strong> />
artigos científicos são os autores,<<strong>br</strong> />
revisores e editores.<<strong>br</strong> />
O editor e editores associados são<<strong>br</strong> />
responsáveis pela manutenção da qualidade<<strong>br</strong> />
científica e editorial da revista. A<<strong>br</strong> />
o<strong>br</strong>igação principal de um editor é<<strong>br</strong> />
garantir que os manuscritos submetidos<<strong>br</strong> />
para a publicação sejam avaliados de<<strong>br</strong> />
forma correta, sem preconceitos e com<<strong>br</strong> />
eventual retorno para correção.<<strong>br</strong> />
O editor é um tipo de ombudsman que<<strong>br</strong> />
deve tentar proteger os diretos dos<<strong>br</strong> />
autores e revisores, devendo ser uma<<strong>br</strong> />
ponte de comunicação entre as partes.<<strong>br</strong> />
Está implícito que só editores-pesquisadores<<strong>br</strong> />
produtivos têm habilidade<<strong>br</strong> />
para avaliar e indicar outros para emitirem<<strong>br</strong> />
seus pareceres.<<strong>br</strong> />
Outro grande desafio é conseguir a<<strong>br</strong> />
indexação na base de dados do Lilacs,<<strong>br</strong> />
junto à Bireme, para depois se conseguir<<strong>br</strong> />
o Scielo. Este é um trabalho intenso,<<strong>br</strong> />
prolongado, laborioso e desgastante para<<strong>br</strong> />
os editores. Porque se precisa atingir<<strong>br</strong> />
todos os desideratos exigidos, e entre<<strong>br</strong> />
alguns, está a personalização da Revista<<strong>br</strong> />
Científica e a publicação de mais de 50%<<strong>br</strong> />
de artigos originais – o que não é fácil –<<strong>br</strong> />
para uma revista que ainda não está<<strong>br</strong> />
indexada – ou seja, este é um dos maiores<<strong>br</strong> />
problemas: vencer este preconceito e<<strong>br</strong> />
romper o círculo vicioso.<<strong>br</strong> />
Daí, reputo imprescindível o tra-<<strong>br</strong> />
balho exercido igualmente por todos<<strong>br</strong> />
os editores vinculados de uma maneira<<strong>br</strong> />
pessoal e responsável com a<<strong>br</strong> />
indexação de mais uma revista<<strong>br</strong> />
científica. Se não houver isto, tudo<<strong>br</strong> />
será inútil e infrutífero.<<strong>br</strong> />
Ou seja, precisamos todo o dia<<strong>br</strong> />
vencer a autofagia acadêmica, o que é<<strong>br</strong> />
muito próprio dos professores dos<<strong>br</strong> />
cursos de medicina da nossa cidade e<<strong>br</strong> />
do nosso Estado!<<strong>br</strong> />
Os requisitos éticos de uma<<strong>br</strong> />
publicação científica estão, hoje em<<strong>br</strong> />
dia, bastante facilitados pelas Comissões<<strong>br</strong> />
de Ética em Pesquisa dos seres humanos<<strong>br</strong> />
e animais de experimentação. Todavia<<strong>br</strong> />
nunca devem os editores e revisores se<<strong>br</strong> />
descurarem de verificar este item e da<<strong>br</strong> />
procedência das instituições.<<strong>br</strong> />
Outro aspecto nas publicações<<strong>br</strong> />
científicas é com relação aos conflitos<<strong>br</strong> />
de interesse e fonte de financiamento.<<strong>br</strong> />
O Comitê Internacional de<<strong>br</strong> />
Editores Médicos (www.icmje.<strong>org</strong>),<<strong>br</strong> />
ativo há mais de 30 anos e que auxilia<<strong>br</strong> />
muito os editores a fazer o seu trabalho<<strong>br</strong> />
com qualidade, vem se preocupando<<strong>br</strong> />
cada vez mais com aspectos<<strong>br</strong> />
éticos e conflitos de interesse.<<strong>br</strong> />
Conflitos podem ocorrer por outras<<strong>br</strong> />
razões, tais como relações pessoais,<<strong>br</strong> />
competitividade acadêmica e paixão<<strong>br</strong> />
intelectual<<strong>br</strong> />
Os conflitos de interesse sempre<<strong>br</strong> />
existiram e continuarão a existir, mas<<strong>br</strong> />
é evidente que a preocupação diuturna<<strong>br</strong> />
com a ética e, principalmente,<<strong>br</strong> />
com a transparência das informações<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e relações entre as partes interessadas<<strong>br</strong> />
(autores, editores, público e<<strong>br</strong> />
patrocinadores) leva ao aprimoramento<<strong>br</strong> />
do processo editorial em sua<<strong>br</strong> />
efetiva contribuição para o desenvolvimento<<strong>br</strong> />
da ciência e da prática<<strong>br</strong> />
médica.<<strong>br</strong> />
Dr. João Carlos Simões (PR).<<strong>br</strong> />
REFERÊNCIA:<<strong>br</strong> />
SUBRAMANYAN, K; CAMPELLO, B. S.;<<strong>br</strong> />
CAMPOS, C. M. Fontes de informação<<strong>br</strong> />
especializada: características e utilização. Belo<<strong>br</strong> />
Horizonte, Editora UFMG, 1993. p. 42-43.
C<<strong>br</strong> />
om certeza, depois da introdução<<strong>br</strong> />
do microcomputador, o<<strong>br</strong> />
processo de ensino-aprendizado<<strong>br</strong> />
da medicina nunca mais foi o<<strong>br</strong> />
mesmo. Nós, os professores um pouco<<strong>br</strong> />
mais velhos e acostumados a ensinar a<<strong>br</strong> />
medicina da maneira pela qual aprendemos,<<strong>br</strong> />
podemos muitas vezes sentir<<strong>br</strong> />
dificuldades para exercer a docência<<strong>br</strong> />
com um armamentário que revolucionou<<strong>br</strong> />
o acesso ao conhecimento e<<strong>br</strong> />
facilitou a sua multiplicação.<<strong>br</strong> />
Se isto é bom ou ruim, é difícil dizer.<<strong>br</strong> />
É tudo uma questão de ponto de vista.<<strong>br</strong> />
É formidável, ao discutir um caso<<strong>br</strong> />
clínico em sala de aula, perceber que a<<strong>br</strong> />
maioria dos alunos ‘saca do bolso’ um<<strong>br</strong> />
palm top e coloca com precisão a<<strong>br</strong> />
porcentagem de aparecimento de<<strong>br</strong> />
determinada complicação de uma<<strong>br</strong> />
doença ou a lista completa dos efeitos<<strong>br</strong> />
colaterais de um medicamento em uso.<<strong>br</strong> />
Por outro lado, é desesperador orientar<<strong>br</strong> />
um trabalho de pesquisa, quando o<<strong>br</strong> />
estudante chega, curvado sob o peso<<strong>br</strong> />
de uma enorme pilha de folhas de<<strong>br</strong> />
papel, que contem, nada mais, nada<<strong>br</strong> />
menos que 7.280 referências so<strong>br</strong>e o<<strong>br</strong> />
assunto a ser estudado.<<strong>br</strong> />
Não se trata de gostar ou não<<strong>br</strong> />
porque a presença do microcomputador<<strong>br</strong> />
na vida do estudante de<<strong>br</strong> />
medicina é fato consumado. Só nos<<strong>br</strong> />
resta nos acomodarmos à situação e<<strong>br</strong> />
aprender a trabalhar com ela.<<strong>br</strong> />
Ao refletir so<strong>br</strong>e as atitudes que um<<strong>br</strong> />
professor pode tomar frente à oferta de<<strong>br</strong> />
conhecimento a ser feita ao aluno nesta<<strong>br</strong> />
situação, temos muito a aprender com<<strong>br</strong> />
o sistema imune humano que, sabiamente,<<strong>br</strong> />
transforma a ameaça de um<<strong>br</strong> />
elemento agressor (antígeno) em anticorpos<<strong>br</strong> />
e células de defesa. Todavia,<<strong>br</strong> />
para que isto ocorra, é necessário que<<strong>br</strong> />
alguns quesitos sejam preenchidos.<<strong>br</strong> />
O primeiro deles é, sem dúvida, o<<strong>br</strong> />
fato de que nosso sistema imune responde<<strong>br</strong> />
a uma dose ideal de antígeno. Quantidades<<strong>br</strong> />
muitas baixas levam à anergia; as<<strong>br</strong> />
muito altas causam tolerância. É como<<strong>br</strong> />
se o sistema imune não se “preocupasse”<<strong>br</strong> />
em responder ao muito pouco e se<<strong>br</strong> />
rendesse de imediato ao excesso. Com o<<strong>br</strong> />
conhecimento, não é diferente. Muito<<strong>br</strong> />
pouco leva a superficialidade; excesso<<strong>br</strong> />
pode causar desânimo e sensação de<<strong>br</strong> />
impotência. Como saber a dose ideal?<<strong>br</strong> />
Nas pesquisas com palavras-chave, o uso<<strong>br</strong> />
de descritores muito específicos levam o<<strong>br</strong> />
aluno a artigos superespecializados que,<<strong>br</strong> />
muitas vezes, por enfocarem um aspecto<<strong>br</strong> />
particular de determinada doença, oferecem<<strong>br</strong> />
um conhecimento fragmentado e<<strong>br</strong> />
impedindo que ele tenha uma visão mais<<strong>br</strong> />
geral do assunto. Por outro lado, descritores<<strong>br</strong> />
mais abertos como, por exemplo,<<strong>br</strong> />
aqueles que designam diagnósticos sin-<<strong>br</strong> />
drômicos, trazem um número excessivo<<strong>br</strong> />
de referências. Talvez até 7.280. Uma<<strong>br</strong> />
maneira de reduzi-las é ensinar o aluno a<<strong>br</strong> />
procurar inicialmente por artigos de revisão<<strong>br</strong> />
e, à medida que o assunto é<<strong>br</strong> />
dominado, partir para a pesquisa mais<<strong>br</strong> />
especializada.<<strong>br</strong> />
Uma segunda lição a aprender com<<strong>br</strong> />
o sistema imune é a de que a rota de<<strong>br</strong> />
administração do antígeno é importante<<strong>br</strong> />
para a sua imunogenicidade. Assim,<<strong>br</strong> />
como as vias subcutânea, oral, aérea ou<<strong>br</strong> />
intradérmica levam a maior ou menor<<strong>br</strong> />
eficiência do processo imunológico, as<<strong>br</strong> />
rotas de pesquisa na internet também<<strong>br</strong> />
trazem diferentes maneiras de se abordar<<strong>br</strong> />
o conhecimento. Pesquisas feitas em<<strong>br</strong> />
sistemas não médicos de busca como<<strong>br</strong> />
google, yahoo, etc... podem levar o aluno<<strong>br</strong> />
a páginas particulares ou mesmo de<<strong>br</strong> />
indivíduos leigos, cujo conteúdo tem<<strong>br</strong> />
valor científico duvidoso. É importante<<strong>br</strong> />
ensinar o estudante a verificar as fontes<<strong>br</strong> />
de seu material de pesquisa dando preferência<<strong>br</strong> />
àquelas que se originam em<<strong>br</strong> />
ensino<<strong>br</strong> />
universidades e órgãos de classe.<<strong>br</strong> />
Por último, é bom lem<strong>br</strong>ar que<<strong>br</strong> />
nem todos os antígenos têm capacidade<<strong>br</strong> />
de despertar a atividade imunogênica<<strong>br</strong> />
no hospedeiro. Aqueles polímeros<<strong>br</strong> />
repetitivos, mesmos grandes e<<strong>br</strong> />
de alto peso molecular não despertam<<strong>br</strong> />
o sistema imune, ao passo que, pequenas<<strong>br</strong> />
substâncias como os haptenos, que<<strong>br</strong> />
precisam se ligar a proteínas carreadoras<<strong>br</strong> />
próprias do <strong>org</strong>anismo, conseguem<<strong>br</strong> />
respostas formidáveis. Da mesma<<strong>br</strong> />
maneira, páginas maravilhosas e com<<strong>br</strong> />
alto teor científico nem sempre conseguirão<<strong>br</strong> />
despertar no aluno o interesse<<strong>br</strong> />
desejado. Todavia, aquelas que exigem<<strong>br</strong> />
um pouco da participação pessoal ou<<strong>br</strong> />
tocam n’alguma forma de interesse<<strong>br</strong> />
individual, conseguem fazê-lo. De<<strong>br</strong> />
nada adianta um maravilhoso atlas de<<strong>br</strong> />
dermatologia com fotografias de alta<<strong>br</strong> />
resolução para um aluno cujo interesse<<strong>br</strong> />
no momento é ortopedia. Entretanto,<<strong>br</strong> />
se as complicações ortopédicas estudadas<<strong>br</strong> />
resultam, por exemplo, de<<strong>br</strong> />
hanseníase, esta pode ser vista com<<strong>br</strong> />
olhos diferentes. É necessário que o<<strong>br</strong> />
professor saiba mostrar um “link”<<strong>br</strong> />
entre os assuntos nem sempre percebido<<strong>br</strong> />
pela simples visitação do local.<<strong>br</strong> />
Assim como o sistema imune pode<<strong>br</strong> />
transformar a estimulação antigênica<<strong>br</strong> />
em vacina para seu próprio proveito<<strong>br</strong> />
ou em doenças de autoimunidade,<<strong>br</strong> />
causando agressões ao corpo humano,<<strong>br</strong> />
na dependência da composição, volume<<strong>br</strong> />
e rota de administração de antígeno,<<strong>br</strong> />
também a oferta de conhecimento<<strong>br</strong> />
necessita ser dosada, selecionada e<<strong>br</strong> />
processada da maneira correta. O professor<<strong>br</strong> />
deve estar atento para que o aluno<<strong>br</strong> />
de medicina consiga apanhar aquele<<strong>br</strong> />
conhecimento oferecido na internet,<<strong>br</strong> />
selecioná-lo, incorporá-lo e transformálo<<strong>br</strong> />
de teoria em boa prática de medicina.<<strong>br</strong> />
Dr.ª Thelma L. Skare (PR).<<strong>br</strong> />
7
imprensa<<strong>br</strong> />
8<<strong>br</strong> />
M<<strong>br</strong> />
uitas pessoas, inclusive médicos<<strong>br</strong> />
e cientistas, primeiro informamse<<strong>br</strong> />
das descobertas da medicina<<strong>br</strong> />
através da mídia. Entretanto, a cobertura<<strong>br</strong> />
de notícias médicas pela imprensa é<<strong>br</strong> />
geralmente imprecisa, superficial ou<<strong>br</strong> />
sensacionalista. Notícias médicas são<<strong>br</strong> />
freqüentemente simplificadas, ou pior,<<strong>br</strong> />
sensacionalisadas por pressão da indústria.<<strong>br</strong> />
Notícias de saúde são um produto que<<strong>br</strong> />
vende bem e que no processo de promoção<<strong>br</strong> />
pode ser distorcido. Além disto, alguns<<strong>br</strong> />
dos temas médicos mais importantes não<<strong>br</strong> />
são cobertos pela mídia.<<strong>br</strong> />
Jornalismo de baixa qualidade na área<<strong>br</strong> />
da política ou negócios pode manchar a<<strong>br</strong> />
reputação; mas em medicina, relatos<<strong>br</strong> />
imprecisos podem gerar falsas esperanças<<strong>br</strong> />
e temores desnecessários. Os cientistas<<strong>br</strong> />
culpam a mídia por esse problema, argumentando<<strong>br</strong> />
que os jornalistas são descuidados<<strong>br</strong> />
quando apresentam os resultados<<strong>br</strong> />
de uma pesquisa médica. Esta, por outro<<strong>br</strong> />
lado, acusa a comunidade médica por<<strong>br</strong> />
obstruir, desorientar ou falhar em alertar a<<strong>br</strong> />
imprensa. Críticos da mídia sugerem que<<strong>br</strong> />
a dificuldade está com a audiência: as<<strong>br</strong> />
pessoas precisam estar mais atentas e<<strong>br</strong> />
céticas quando interpretarem notícias<<strong>br</strong> />
médicas. Tudo leva a crer que ambos<<strong>br</strong> />
(cientistas médicos e jornalistas) dividem<<strong>br</strong> />
a responsabilidade de uma comunicação<<strong>br</strong> />
mais precisa para o público. Mas é preciso<<strong>br</strong> />
distinguir “jornalistas” da “mídia”. Profissão<<strong>br</strong> />
de jornalismo é uma coisa e mídia<<strong>br</strong> />
refere-se à indústria competitiva. Muitas<<strong>br</strong> />
vezes os objetivos e motivação do jornalismo<<strong>br</strong> />
entram em conflito com os da mídia!<<strong>br</strong> />
Os problemas:<<strong>br</strong> />
SENSACIONALISMO<<strong>br</strong> />
Freqüentemente os jornalistas perseguem<<strong>br</strong> />
uma notícia médica como se eles<<strong>br</strong> />
estivessem relatando um seqüestro. A<<strong>br</strong> />
informação é rápida mas sem contexto. O<<strong>br</strong> />
relato é sensacionalista: o jornalista exagera<<strong>br</strong> />
o achado científico e, como conseqüência,<<strong>br</strong> />
o público é enganado so<strong>br</strong>e as<<strong>br</strong> />
implicações do achado.<<strong>br</strong> />
Por outro lado, os cientistas desejam a<<strong>br</strong> />
publicidade. Ajuda na captação de recursos<<strong>br</strong> />
para pesquisa, são valorizados pelas<<strong>br</strong> />
instituições e aumenta a conscientização<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e as suas pesquisas. Mas este esforço<<strong>br</strong> />
em atrair a mídia pode resultar em relatos<<strong>br</strong> />
imprecisos ou incompletos. Da mesma forma<<strong>br</strong> />
que incentivos podem levar a mídia a<<strong>br</strong> />
exagerar afirmações; os jornalistas podem<<strong>br</strong> />
querer oferecer esperança que pode levar a<<strong>br</strong> />
um retrato falso de novos tratamentos.<<strong>br</strong> />
Muitos exemplos podem ser encontrados: um<<strong>br</strong> />
tratamento não usual e invasivo para tratamento<<strong>br</strong> />
da doença de Alzheimer foi amplamente<<strong>br</strong> />
divulgado após um pequeno estudo<<strong>br</strong> />
não-cego; a fluoxetina (Prozac©) foi saudada<<strong>br</strong> />
como a cura certa da depressão quando<<strong>br</strong> />
foi lançada no mercado; melatonina recentemente<<strong>br</strong> />
recebeu um excessivo tratamento<<strong>br</strong> />
positivo da mídia como a “cura” para o<<strong>br</strong> />
envelhecimento. Jornalistas que publicam<<strong>br</strong> />
falsas expectativas podem ser censurados<<strong>br</strong> />
mas os cientistas que fornecem a informação<<strong>br</strong> />
devem dividir a culpa. Uma história negativa<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e os possíveis efeitos deletérios à saúde é<<strong>br</strong> />
outra tática sensacionalista. Relatos imprecisos<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e os riscos à saúde são facilitados<<strong>br</strong> />
pela tendência da mídia e da comunidade<<strong>br</strong> />
medica contra estudos negativos, talvez por<<strong>br</strong> />
que eles não tenham conseqüência. Essa<<strong>br</strong> />
omissão é combinada ao fato de revistas<<strong>br</strong> />
médicas serem menos propensas a publicar<<strong>br</strong> />
estudos com resultados negativos e cientistas<<strong>br</strong> />
menos ainda em submetê-los à publicação.<<strong>br</strong> />
VIÉS E CONFLITOS <strong>DE</strong> INTERESSE<<strong>br</strong> />
Para evitar histórias imprecisas, os repórteres<<strong>br</strong> />
devem examinar a credibilidade e viés das<<strong>br</strong> />
fontes científicas. Mas esse exame não é freqüentemente<<strong>br</strong> />
feito. Por outro lado, os cientistas<<strong>br</strong> />
e instituições não estão errados em convidar<<strong>br</strong> />
a imprensa para co<strong>br</strong>ir suas pesquisas e achados.<<strong>br</strong> />
Os pesquisadores podem evitar imprecisões<<strong>br</strong> />
nos relatos, desencorajando coletivas<<strong>br</strong> />
de imprensa para discutir dados preliminares<<strong>br</strong> />
e exigindo revisão final e aprovação do artigo<<strong>br</strong> />
a ser publicado. A principal fonte do repórter<<strong>br</strong> />
num artigo de pesquisa ou apresentação é o<<strong>br</strong> />
próprio autor ou conferencista. Os repórteres<<strong>br</strong> />
que querem confirmar os dados devem falar<<strong>br</strong> />
também com pessoas que podem criticar o<<strong>br</strong> />
trabalho. Revistas médicas ou instituições<<strong>br</strong> />
podem fornecer nomes de revisores que se<<strong>br</strong> />
dispõem a falar so<strong>br</strong>e o estudo. Os repórteres<<strong>br</strong> />
também estão mais conscientes dos conflitos<<strong>br</strong> />
de interesse por que muitas revistas médicas<<strong>br</strong> />
requerem que conflitos sejam revelados.<<strong>br</strong> />
Algumas vezes um estudo publicado foi<<strong>br</strong> />
financiado pela indústria que produz o<<strong>br</strong> />
medicamento. Relatar conflitos de interesse<<strong>br</strong> />
é crucial, porque permite que os leitores<<strong>br</strong> />
julguem por eles mesmos a validade dos<<strong>br</strong> />
resultados. Recentes acontecimentos<<strong>br</strong> />
levantaram preocupações so<strong>br</strong>e a extensão<<strong>br</strong> />
com que a imprensa pode ser enganada por<<strong>br</strong> />
comentários patrocinados pela indústria e<<strong>br</strong> />
disfarçados como comentários de um cientista<<strong>br</strong> />
ou médico. Algumas vezes um editorial<<strong>br</strong> />
foi escrito por um médico contratado, pago,<<strong>br</strong> />
ou foi parcialmente escrito por firmas de<<strong>br</strong> />
relações públicas representando a indústria<<strong>br</strong> />
farmacêutica. Qualquer carta, editorial ou<<strong>br</strong> />
conferencista deve ser identificado quando<<strong>br</strong> />
patrocinado pela indústria.<<strong>br</strong> />
FALTA <strong>DE</strong> SEGUIMENTO<<strong>br</strong> />
Como o público leigo não tem conhecimento<<strong>br</strong> />
do processo científico, pode dar<<strong>br</strong> />
mais importância do que cientistas aos<<strong>br</strong> />
resultados de um único estudo.Retornar a<<strong>br</strong> />
um assunto que foi relatado com base em<<strong>br</strong> />
dados preliminares pode não interessar aos<<strong>br</strong> />
editores e muitos jornalistas não sabem<<strong>br</strong> />
como o processo científico se dá: estudos -<<strong>br</strong> />
pilotos seguidos de estudos aleatórios,<<strong>br</strong> />
cegos, etc. Se a mídia não publicar artigos<<strong>br</strong> />
de seguimento, acompanhamento de uma<<strong>br</strong> />
notícia médica, o público pode ser enganado.<<strong>br</strong> />
Um exemplo disto foi o relato da<<strong>br</strong> />
suposta associação entre ingestão de café<<strong>br</strong> />
e câncer pancreático. A compreensão do<<strong>br</strong> />
público foi ofuscada pela falta de seguimento.<<strong>br</strong> />
A mídia deu cobertura ao artigo<<strong>br</strong> />
que falava da associação mas não da<<strong>br</strong> />
pesquisa subseqüente, que falhou em<<strong>br</strong> />
confirmar a associação.<<strong>br</strong> />
ÁREAS QUE NÃO SÃO COBERTAS PELA MÍDIA<<strong>br</strong> />
Até há pouco tempo, notícias médicas<<strong>br</strong> />
eram tipicamente escritas por repórteres não<<strong>br</strong> />
especializados. Embora hoje em dia já haja<<strong>br</strong> />
muitos repórteres especializados na área<<strong>br</strong> />
médica, muitos tópicos continuam a ser<<strong>br</strong> />
ignorados pela mídia. A explicação é que<<strong>br</strong> />
alguns jornalistas mantêm o foco em apenas<<strong>br</strong> />
algumas áreas, não de outras que não conseguem<<strong>br</strong> />
obter respostas as suas perguntas.<<strong>br</strong> />
Novamente a responsabilidade recai so<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />
a mídia e a comunidade médica. Semanalmente<<strong>br</strong> />
os repórteres da área médica são<<strong>br</strong> />
o<strong>br</strong>igados a ler artigos ou notícias de revistas<<strong>br</strong> />
médicas específicas. Esta o<strong>br</strong>igação pode<<strong>br</strong> />
desencorajá-los a perseguir uma área de<<strong>br</strong> />
pesquisa, um processo que envolve contatar<<strong>br</strong> />
cientistas, ler revistas mais especializa-
das, etc. Algumas revistas médicas enviam<<strong>br</strong> />
notícias que são “embargadas”, ou sejam, só<<strong>br</strong> />
podem ser divulgadas após uma determinada<<strong>br</strong> />
data. Em parte para evitar o constrangimento<<strong>br</strong> />
dos médicos que recebiam a revista<<strong>br</strong> />
médica após a publicação da notícia na<<strong>br</strong> />
imprensa e eram confrontados com perguntas<<strong>br</strong> />
de seus pacientes so<strong>br</strong>e novidades que não<<strong>br</strong> />
tinham conhecimento. O outro argumento<<strong>br</strong> />
é dar tempo aos repórteres para pesquisarem<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e o tema e encorajar um relato mais<<strong>br</strong> />
preciso. Como jornalistas podem ser motivados<<strong>br</strong> />
a investigar áreas nas quais eles não<<strong>br</strong> />
têm conhecimento e como cientistas e médicos<<strong>br</strong> />
podem ser estimulados a compartilhar<<strong>br</strong> />
problemas nos quais eles são expertos? Temse<<strong>br</strong> />
dito que uma função dos profissionais da<<strong>br</strong> />
saúde pública é trabalhar com a mídia proativamente<<strong>br</strong> />
para evitar distorções, e tornar<<strong>br</strong> />
as notícias de saúde mais compreensíveis.<<strong>br</strong> />
PRESSÃO DAS INSTITUIÇÕES PARA FICAR QUIETO<<strong>br</strong> />
Seria ingenuidade não reconhecer as<<strong>br</strong> />
muitas razões que os cientistas têm para não<<strong>br</strong> />
inha visto pela manhã, junto com<<strong>br</strong> />
T<<strong>br</strong> />
a residente de reumatologia, um<<strong>br</strong> />
caso de paciente com um pseudotumor<<strong>br</strong> />
orbitário, responsivo a corticosteróide<<strong>br</strong> />
e que desenvolvera também quadro<<strong>br</strong> />
de polineuropatia periférica. Não havia<<strong>br</strong> />
evidência clara de uma doença sistêmica,<<strong>br</strong> />
que pudesse explicar os dois achados.<<strong>br</strong> />
Anotei em um papel: “pseudotumor órbita<<strong>br</strong> />
x neuropatia” – e pensei em olhar à noite<<strong>br</strong> />
na internet. Cabe aqui a observação de que<<strong>br</strong> />
não tenho acesso à rede durante a tarde<<strong>br</strong> />
quando estou no consultório. O motivo?<<strong>br</strong> />
Minha certeza de que ao invés de checar a<<strong>br</strong> />
pilha de artigos a ler, entraria on-line entre<<strong>br</strong> />
as consultas e ficaria “navegando”, com o<<strong>br</strong> />
resultado óbvio de no final ter juntado mais<<strong>br</strong> />
falar com a imprensa. A natureza competitiva<<strong>br</strong> />
da ciência e a crescente interdependência com<<strong>br</strong> />
o mundo corporativo deixaram os cientistas<<strong>br</strong> />
temerosos de que se a mídia ou mesmo um<<strong>br</strong> />
colega tomar conhecimento da sua pesquisa<<strong>br</strong> />
prematuramente, a notícia pode afetar<<strong>br</strong> />
adversamente o investimento da empresa ou<<strong>br</strong> />
a resposta do mercado na bolsa de valores.<<strong>br</strong> />
Num recente episódio, uma poderosa<<strong>br</strong> />
indústria farmacêutica ameaçou processar<<strong>br</strong> />
uma universidade americana se determinado<<strong>br</strong> />
estudo fosse publicado. Alguns mem<strong>br</strong>os da<<strong>br</strong> />
universidade abordaram um repórter de um<<strong>br</strong> />
influente jornal que publicou a matéria em<<strong>br</strong> />
primeira página. Um ano depois o artigo foi<<strong>br</strong> />
publicado. A indústria concordou com a<<strong>br</strong> />
publicação devido a intensa especulação na<<strong>br</strong> />
mídia so<strong>br</strong>e os achados e conclusões. Fica<<strong>br</strong> />
evidente que a indústria teria evitado a publicação<<strong>br</strong> />
se a mídia não tivesse se envolvido.<<strong>br</strong> />
CONCLUSÕES<<strong>br</strong> />
Examinando-se a cobertura da medicina<<strong>br</strong> />
pela mídia, verifica-se que o relato de notí-<<strong>br</strong> />
alguns artigos à pilha original.<<strong>br</strong> />
Chegando em casa, janto, <strong>br</strong>inco com a<<strong>br</strong> />
filha um pouco e depois que ela dorme,<<strong>br</strong> />
vamos ao computador lá por volta das 22<<strong>br</strong> />
horas. Tiro do bolso o papelzinho de pesquisa,<<strong>br</strong> />
juntei com outros que já me esperavam. Mas<<strong>br</strong> />
primeiro, o ritual – checar os e-mails do dia:<<strong>br</strong> />
propagandas, rapidamente descartadas;<<strong>br</strong> />
antigos residentes querendo discutir casos;<<strong>br</strong> />
piadas - o<strong>br</strong>igatoriamente lidas na hora, e<<strong>br</strong> />
se boas forem, comunicadas imediatamente<<strong>br</strong> />
à esposa e “espalhadas” para parentes e<<strong>br</strong> />
amigos; uma mensagem so<strong>br</strong>e o livro que eu<<strong>br</strong> />
tenho que revisar e não revisei; outra so<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />
um artigo que devo analisar e não analisei;<<strong>br</strong> />
um e-mail assustador, so<strong>br</strong>e as aulas do congresso,<<strong>br</strong> />
que seriam só para daqui um mês e<<strong>br</strong> />
com as quais eu iria me preocupar no devido<<strong>br</strong> />
tempo, devem agora ser mandadas de<<strong>br</strong> />
antemão para os anais do congresso; e vários<<strong>br</strong> />
“e-tocs” - conteúdos de diversas revistas que<<strong>br</strong> />
saíram naquela semana. Leio os índices, em<<strong>br</strong> />
busca de artigos que me interessem, e como<<strong>br</strong> />
não tenho acesso na íntegra da maioria deles,<<strong>br</strong> />
anoto na minha lista de referências para<<strong>br</strong> />
serem pesquisadas e obtidas nos computadores<<strong>br</strong> />
da universidade; lista esta já com três<<strong>br</strong> />
meses de defasagem em artigos acumulados.<<strong>br</strong> />
Acabo os e-mails, entro no navegador<<strong>br</strong> />
para ir ao site de pesquisa. A página de<<strong>br</strong> />
abertura é do meu provedor, repleta de coisas<<strong>br</strong> />
interessantíssimas: novidades da política que<<strong>br</strong> />
imprensa<<strong>br</strong> />
cias médicas está longe do ideal. Médicos,<<strong>br</strong> />
cientistas e jornalistas dividem a responsabilidade<<strong>br</strong> />
pelo problema. Os jornalistas<<strong>br</strong> />
devem certificar-se de que o relato é preciso,<<strong>br</strong> />
os achados não são descritos de forma<<strong>br</strong> />
exagerada e os conflitos de interesse são<<strong>br</strong> />
informados. Os cientistas não devem ser<<strong>br</strong> />
citados fora do contexto e deve-se ter cuidado<<strong>br</strong> />
para explicar as implicações da suas<<strong>br</strong> />
pesquisas. É devido a experiências nas quais<<strong>br</strong> />
estas mínimas expectativas não foram<<strong>br</strong> />
satisfeitas que médicos e cientistas da saúde<<strong>br</strong> />
vêem os repórteres como seus piores<<strong>br</strong> />
inimigos. Freqüentemente parece que a<<strong>br</strong> />
melhor atitude é não falar com a mídia.<<strong>br</strong> />
Entretanto, ignorar a mídia é negligenciar<<strong>br</strong> />
o profundo efeito que as notícias de saúde<<strong>br</strong> />
têm so<strong>br</strong>e os pacientes. Quando os jornalistas<<strong>br</strong> />
falham na precisão da informação, na<<strong>br</strong> />
identificação de conflitos de interesse, no<<strong>br</strong> />
seguimento de histórias e na cobertura de<<strong>br</strong> />
assuntos de saúde importantes, são os<<strong>br</strong> />
pacientes os que mais sofrem.<<strong>br</strong> />
Dr. Miguel C. Riella (PR).<<strong>br</strong> />
não vi no jornal televisivo (pois estava<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>incando com minha filha, como posto<<strong>br</strong> />
anteriormente), fofocas, acontecimentos<<strong>br</strong> />
mundiais, lançamento de filmes, trailers de<<strong>br</strong> />
filmes, acontecimentos mundiais, fotos<<strong>br</strong> />
imperdíveis. Cada uma dessas chamadas<<strong>br</strong> />
merece uma conferida rápida.<<strong>br</strong> />
Lem<strong>br</strong>o dos filmes que vi recentemente,<<strong>br</strong> />
os quais ainda não foram conferidos no meu<<strong>br</strong> />
site preferido de crítica cinematográfica.<<strong>br</strong> />
Dou uma passadinha lá, e depois em outro<<strong>br</strong> />
site de cinema pra checar se as opiniões<<strong>br</strong> />
batem. Falando de opinião, tenho que<<strong>br</strong> />
checar o meu jornal favorito, pois há<<strong>br</strong> />
colunistas que não se pode deixar de consultar<<strong>br</strong> />
diariamente.<<strong>br</strong> />
Vou então a Pubmed, digito os termos<<strong>br</strong> />
certos e listam-me cerca de 40 artigos com<<strong>br</strong> />
o que eu desejo; alguns realmente “nada a<<strong>br</strong> />
ver”, outros bastante interessantes. Leio os<<strong>br</strong> />
resumos, imprimo alguns, tento ver se<<strong>br</strong> />
consigo algum na íntegra, ponho alguns na<<strong>br</strong> />
lista pra checar na universidade.<<strong>br</strong> />
Lem<strong>br</strong>o de um outro site de pesquisa,<<strong>br</strong> />
digito os mesmos termos, aparecem alguns<<strong>br</strong> />
capítulos de livro so<strong>br</strong>e os temas, um bem<<strong>br</strong> />
amplo so<strong>br</strong>e pseudotumor orbital, que me<<strong>br</strong> />
dedico a ler mais a fundo.<<strong>br</strong> />
Satisfeito, olho no relógio: meia-noite<<strong>br</strong> />
e quinze minutos. Nada como uma pesquisa<<strong>br</strong> />
rápida na internet...<<strong>br</strong> />
Dr. Eduardo S. Paiva (PR).<<strong>br</strong> />
9
imprensa<<strong>br</strong> />
N<<strong>br</strong> />
unca tive problemas sérios com<<strong>br</strong> />
minhas publicações internacionais,<<strong>br</strong> />
desde a primeira no British<<strong>br</strong> />
Journal of Clinical Pharmacology, em 1979,<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e o temazepam. Após o concurso de<<strong>br</strong> />
professor titular na UFPR, em 1991, já com<<strong>br</strong> />
bem mais de uma centena, parei de contar<<strong>br</strong> />
de maneira cartorial, mas ainda foram<<strong>br</strong> />
muitas até o fim dos anos 90.<<strong>br</strong> />
De lá para cá publico ocasionalmente<<strong>br</strong> />
algo de maior impacto, como um novo<<strong>br</strong> />
tratamento de esclerose múltipla, na Acta<<strong>br</strong> />
Neurológica Scandinavica, em 2005.<<strong>br</strong> />
Porém, tive problemas de em<strong>br</strong>omação de<<strong>br</strong> />
vários tipos, em revistas de maior ou menor<<strong>br</strong> />
impacto. Existe política no campo científico,<<strong>br</strong> />
e é normal, pois os donos do poder se<<strong>br</strong> />
esforçam continuamente, investem tempo,<<strong>br</strong> />
verbas e salários, e não apreciam que se<<strong>br</strong> />
rompam as barreiras do “establishment”.<<strong>br</strong> />
Quais as razões do domínio anglosaxão<<strong>br</strong> />
na esfera científica internacional?<<strong>br</strong> />
Um fator básico é que sua língua é a<<strong>br</strong> />
mundial. Uma interpretação histórica<<strong>br</strong> />
indica que a primeira razão do sucesso da<<strong>br</strong> />
língua inglesa é o fato de que o planeta está,<<strong>br</strong> />
na prática, sob influência predominante de<<strong>br</strong> />
ingleses e americanos desde que Sir Francis<<strong>br</strong> />
Drake e outros piratas começaram a<<strong>br</strong> />
aterrorizar os mares, há 4 séculos. A expansão<<strong>br</strong> />
marítima tinha uma base comercial<<strong>br</strong> />
e intelectual muito forte dentro das ilhas<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>itânicas, muito prósperas desde a Idade<<strong>br</strong> />
Média, como atestado pela construção de<<strong>br</strong> />
61 catedrais góticas e normandas, e pela<<strong>br</strong> />
emergência de Cam<strong>br</strong>idge e Oxford como<<strong>br</strong> />
centros de saber, antes da descoberta da<<strong>br</strong> />
América, que refletiu a expansão ibérica.<<strong>br</strong> />
Outro fator é lingüístico: o inglês tem<<strong>br</strong> />
estrutura simples, coloquial e musical. As<<strong>br</strong> />
línguas latinas parecem feitas para ópera e<<strong>br</strong> />
pessoas de alto saber; inglês é popular. Pelo<<strong>br</strong> />
menos em comparação com outras línguas<<strong>br</strong> />
indo-européias e com as do extremo<<strong>br</strong> />
oriente. Em recente viagem pude testemunhar<<strong>br</strong> />
como africanos de várias etnias,<<strong>br</strong> />
vindos de tribos nas savanas, interagem<<strong>br</strong> />
10<<strong>br</strong> />
perfeitamente em inglês, em um cenário de<<strong>br</strong> />
doença grave, com asiáticos, europeus e<<strong>br</strong> />
americanos. Não consigo imaginar o mesmo<<strong>br</strong> />
em alemão, russo, francês ou chinês.<<strong>br</strong> />
Durante este longo predomínio “anglo”<<strong>br</strong> />
explodiu o conhecimento humano, inclusive<<strong>br</strong> />
nas ciências da saúde. Leonardo da Vinci,<<strong>br</strong> />
italiano radicado no sul da França, marca o<<strong>br</strong> />
fim da idade média e o renascimento, não só<<strong>br</strong> />
artístico. Desta época em diante a maioria<<strong>br</strong> />
do conhecimento médico e científico foi<<strong>br</strong> />
gerado na Europa do Norte. A mais antiga<<strong>br</strong> />
sociedade científica existente é a Royal<<strong>br</strong> />
Society, que deu origem à revista Nature. Foi<<strong>br</strong> />
fundada em 1660, em Londres. Lá também,<<strong>br</strong> />
em 1773, começou a mais antiga sociedade<<strong>br</strong> />
médica existente: “The Medical Society”.<<strong>br</strong> />
Outras foram surgindo, muitas pioneiras no<<strong>br</strong> />
mundo, como a Physiological Society, já<<strong>br</strong> />
puramente experimental e sub-especializada,<<strong>br</strong> />
em 1876. Nem se dava o nome de “British”<<strong>br</strong> />
ou “English”, eram únicas.<<strong>br</strong> />
Do outro lado do Atlântico as coisas<<strong>br</strong> />
começaram antes, pararam durante e se reiniciaram<<strong>br</strong> />
após a guerra civil americana e o<<strong>br</strong> />
real estabelecimento do país. A American<<strong>br</strong> />
Association for the Advancement of Science,<<strong>br</strong> />
que deu origem à revista Science, foi fundada<<strong>br</strong> />
em 1848. A American Medical Association<<strong>br</strong> />
foi fundada em 1847, e os oftalmo-otologistas<<strong>br</strong> />
lançaram a revista da sua especialidade em<<strong>br</strong> />
1876, seguido pelos dermatologistas em 1882.<<strong>br</strong> />
Só em 1883 foi lançado o JAMA, dos clínicos.<<strong>br</strong> />
Antes das sociedades os médicos mais<<strong>br</strong> />
eminentes se comunicavam por cartas,<<strong>br</strong> />
muitas vezes levadas em mãos por pacientes<<strong>br</strong> />
que cruzavam o Atlântico ou o Canal da<<strong>br</strong> />
Mancha para ouvir outra opinião so<strong>br</strong>e suas<<strong>br</strong> />
doenças. Dom Pedro II, viajante notório, era<<strong>br</strong> />
cliente de Jean Martin Charcot, neurologista<<strong>br</strong> />
em Paris. Com o advento das sociedades<<strong>br</strong> />
médicas, seus periódicos acabaram gerando<<strong>br</strong> />
as revistas médicas como as temos até hoje,<<strong>br</strong> />
partindo de resenhas de casos clínicos que já<<strong>br</strong> />
existiam pouco antes. A distrofia muscular<<strong>br</strong> />
de Duchenne foi descrita em 1868, em<<strong>br</strong> />
francês, numa revista que já circulava havia<<strong>br</strong> />
uma década. Porém, vários ingleses já<<strong>br</strong> />
haviam descrito a mesma doença 20 anos<<strong>br</strong> />
antes, entre eles Bell, Little, Meryon e<<strong>br</strong> />
Gowers, em revistas e livros.<<strong>br</strong> />
Os europeus se comunicavam muito na<<strong>br</strong> />
virada do século XX. Em 1908 já era<<strong>br</strong> />
fundada Epilepsia, talvez a mais antiga<<strong>br</strong> />
revista de neurologia e psiquiatria, e um<<strong>br</strong> />
bom exemplo: editada a partir de Budapest,<<strong>br</strong> />
os patronos eram um inglês, um<<strong>br</strong> />
holandês, um francês, um alemão e um<<strong>br</strong> />
suíço; tinha artigos em inglês, francês e<<strong>br</strong> />
alemão; precedeu em um ano a fundação<<strong>br</strong> />
da International League Against Epilepsy;<<strong>br</strong> />
foi interrompida pelas duas guerras;<<strong>br</strong> />
acabou dominada pela sociedade americana<<strong>br</strong> />
de epilepsia imediatamente após a<<strong>br</strong> />
segunda guerra, quando os americanos<<strong>br</strong> />
passaram a custear os eventos da sociedade<<strong>br</strong> />
e a publicação da revista.<<strong>br</strong> />
Então, no início da era científica da<<strong>br</strong> />
Medicina, do meio para o fim do século<<strong>br</strong> />
XIX, as primeiras revistas e editoras de<<strong>br</strong> />
livros eram mais igualmente divididas<<strong>br</strong> />
entre os europeus, e americanos se desenvolviam<<strong>br</strong> />
independentemente. Após a<<strong>br</strong> />
primeira guerra, na Europa a supremacia<<strong>br</strong> />
estava passando do Império Austrohúngaro<<strong>br</strong> />
e da Europa central para os países<<strong>br</strong> />
nórdicos, incluindo o norte da França.<<strong>br</strong> />
Com a segunda guerra mundial os anglosaxões<<strong>br</strong> />
deixaram todo o resto do mundo<<strong>br</strong> />
para trás. Trouxeram para a liderança do<<strong>br</strong> />
conhecimento escandinavos e holandeses,<<strong>br</strong> />
que saíram relativamente incólumes da<<strong>br</strong> />
guerra, com poderio financeiro e proximidade<<strong>br</strong> />
geográfica; suas línguas nativas<<strong>br</strong> />
eram tão restritas que nem tentaram<<strong>br</strong> />
torná-las mundiais. Passaram suas revistas<<strong>br</strong> />
para o inglês e pronto.<<strong>br</strong> />
Temos hoje um primeiro mundo científico,<<strong>br</strong> />
anglo-saxão, com as revistas de ponta<<strong>br</strong> />
de ciência básica, como Nature (Londres,<<strong>br</strong> />
1869) e Science (New York, 1880), e as<<strong>br</strong> />
revistas clínicas, como Lancet e New<<strong>br</strong> />
England, British Medical Journal e Annals<<strong>br</strong> />
of Internal Medicine. A segunda linha é
ainda de revistas anglo-saxãs, mas entram<<strong>br</strong> />
as escandinavas. Franceses, alemães e<<strong>br</strong> />
italianos, até pela insistência em manter<<strong>br</strong> />
suas línguas, vêm num terceiro plano. A<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>iga no primeiríssimo time é <strong>br</strong>aba.<<strong>br</strong> />
Publicações significam o resultado de<<strong>br</strong> />
investimentos milionários em pesquisa<<strong>br</strong> />
realizada, e dão direito a verbas ainda<<strong>br</strong> />
maiores para pesquisa futura.<<strong>br</strong> />
A expressão “publish or perish”,<<strong>br</strong> />
traduzida como “publique ou morra”, é<<strong>br</strong> />
típica americana. Acredito que sua origem<<strong>br</strong> />
esteja também após a Segunda Guerra,<<strong>br</strong> />
quando a explosão do conhecimento<<strong>br</strong> />
médico foi patrocinada pelo investimento<<strong>br</strong> />
através dos National Institutes of Health,<<strong>br</strong> />
localizados em Bethesda, arredores da<<strong>br</strong> />
capital americana. Dos anos 50 aos 80,<<strong>br</strong> />
foi dali que saíram ou a pesquisa original<<strong>br</strong> />
ou as verbas para pesquisa extra-mural.<<strong>br</strong> />
As verbas se tornaram dependentes de<<strong>br</strong> />
publicação com impacto apropriado ao<<strong>br</strong> />
tamanho da despesa. Quando entraram<<strong>br</strong> />
as pesquisas patrocinadas por companhias<<strong>br</strong> />
farmacêuticas, nos anos 80 e 90, os<<strong>br</strong> />
americanos aumentaram seu domínio,<<strong>br</strong> />
através da chancela do Federal Drug<<strong>br</strong> />
Administration. Quando uma nova droga<<strong>br</strong> />
é certificada para venda no mercado<<strong>br</strong> />
americano pelo FDA, o mundo aceita.<<strong>br</strong> />
Quando uma nova definição clínica<<strong>br</strong> />
aparece, precisa ter a chancela do Centers<<strong>br</strong> />
for Disease Control, o CDC.<<strong>br</strong> />
Os ingleses entraram junto nesta nova<<strong>br</strong> />
fase, em parte. Grande parte dos grupos<<strong>br</strong> />
americanos, de origem multinacional,<<strong>br</strong> />
eram chefiados por ingleses ou americanos<<strong>br</strong> />
anglo-saxões. Estes só tinham a diferença<<strong>br</strong> />
de ter chegado lá 100 ou 200 anos antes.<<strong>br</strong> />
Europeus, até mexicanos, tinham<<strong>br</strong> />
equivalentes dos NIH nos seus países,<<strong>br</strong> />
como o Medical Research Council na<<strong>br</strong> />
Grã-Bretanha, mas seu volume financeiro<<strong>br</strong> />
era muito menor. Criou-se outra expressão,<<strong>br</strong> />
o “american jargon”, ou jeito<<strong>br</strong> />
americano de publicar, sempre com<<strong>br</strong> />
centenas de pacientes provenientes de<<strong>br</strong> />
algum lugar obscuro como Montana ou<<strong>br</strong> />
Iowa; o mesmo palavreado, refletindo o<<strong>br</strong> />
protocolo formado entre autores, editores<<strong>br</strong> />
e “referees”, algo como juízes.<<strong>br</strong> />
Quando se encaminha um artigo para<<strong>br</strong> />
qualquer revista das chamadas indexadas,<<strong>br</strong> />
o editor tem o poder de encaminhar para<<strong>br</strong> />
avaliação por 2 ou 3 “referees” de sua<<strong>br</strong> />
escolha, que podem ser rivais ou partidários<<strong>br</strong> />
dos autores. Este é o sistema de “peerreview”,<<strong>br</strong> />
revisão por colegas, gente que<<strong>br</strong> />
entende do assunto, e, por definição, tem<<strong>br</strong> />
interesse na publicação mais rápida ou mais<<strong>br</strong> />
lenta daquele artigo. Em geral o sistema é<<strong>br</strong> />
honesto, não há bloqueio, mas há em<strong>br</strong>omação<<strong>br</strong> />
e influência. Tanto que os clonadores<<strong>br</strong> />
coreanos furaram o filtro e deu no que deu,<<strong>br</strong> />
da mesma maneira que os Vioxx e as<<strong>br</strong> />
nifedipinas da vida, entre tantos outros erros<<strong>br</strong> />
dos quais americanos têm tido que se retratar.<<strong>br</strong> />
O sistema europeu do norte, incluindo<<strong>br</strong> />
até australianos, foi mais honesto. O interesse<<strong>br</strong> />
diretamente financeiro, seja de verbas<<strong>br</strong> />
ou mercadológico, era menor. No sistema<<strong>br</strong> />
inglês sempre pesou a tradição científica da<<strong>br</strong> />
Royal Society. A honra máxima para um<<strong>br</strong> />
pesquisador é ser eleito “Fellow of the Royal<<strong>br</strong> />
Society” e o critério inclui ausência de<<strong>br</strong> />
interesse financeiro. O pensamento científico<<strong>br</strong> />
está no âmago da educação <strong>br</strong>itânica. Outra<<strong>br</strong> />
diferença está no fato de que a Medicina<<strong>br</strong> />
européia do norte é socializada. Os médicos<<strong>br</strong> />
ganham salários fixos no fim do mês, e o lucro<<strong>br</strong> />
com pacientes, pesquisa e publicações, é<<strong>br</strong> />
institucional. Americanos levam para casa<<strong>br</strong> />
o dinheiro. Europeus do norte levam o<<strong>br</strong> />
mérito. O dinheiro fica no departamento. É<<strong>br</strong> />
impensável mexer no que é da instituição.<<strong>br</strong> />
Foi nos anos 80 que apareceram os<<strong>br</strong> />
grandes estudos epidemiológicos, que deram<<strong>br</strong> />
origem a muitas normas clínicas atuais, como<<strong>br</strong> />
as de controle de pressão arterial. Estes<<strong>br</strong> />
grandes projetos são mais fáceis em comunidades<<strong>br</strong> />
onde pacientes vão sempre ao<<strong>br</strong> />
mesmo clínico de bairro, ao mesmo hospital<<strong>br</strong> />
regional ou ao mesmo centro nacional de<<strong>br</strong> />
excelência. E não ao que melhor se apresenta<<strong>br</strong> />
mercadologicamente, como acontece na<<strong>br</strong> />
medicina capitalista.<<strong>br</strong> />
Os americanos se ressentiram muito dos<<strong>br</strong> />
avanços epidemiológicos europeus e australianos,<<strong>br</strong> />
e ficaram décadas pressionando pela<<strong>br</strong> />
manutenção dos achados dos seus estudos,<<strong>br</strong> />
como os de Framingham. As normas atuais<<strong>br</strong> />
de pressão arterial e risco de doença vascular<<strong>br</strong> />
já são conhecidas de europeus do norte e de<<strong>br</strong> />
australianos há mais de 15 anos. Porém, só<<strong>br</strong> />
furaram a em<strong>br</strong>omação americana, só<<strong>br</strong> />
obtiveram a chancela do NIH, FDA e CDC,<<strong>br</strong> />
há 3 anos. Assim, os americanos venderam<<strong>br</strong> />
metil-dopa e nifedipina mais 10 anos,<<strong>br</strong> />
imprensa<<strong>br</strong> />
enquanto que em 1980 já se sabia que<<strong>br</strong> />
beta-bloqueadores prolongavam a vida de<<strong>br</strong> />
recém-infartados.<<strong>br</strong> />
Os beta-bloqueadores deram um nó<<strong>br</strong> />
na cardiologia americana de duas décadas,<<strong>br</strong> />
e, por conseqüência, na <strong>br</strong>asileira. Foi<<strong>br</strong> />
muito recentemente que saiu de moda a<<strong>br</strong> />
idéia de que beta-bloqueadores são<<strong>br</strong> />
contra-indicados em insuficiência cardíaca<<strong>br</strong> />
e prejudicam fluxo sanguíneo renal.<<strong>br</strong> />
Ocorreu uma mudança conceitual que<<strong>br</strong> />
atingiu grande parte da cardiologia,<<strong>br</strong> />
nefrologia e medicina interna, e o “mundo”<<strong>br</strong> />
demorou duas décadas e meia para<<strong>br</strong> />
perceber, pela em<strong>br</strong>omação científicomercadológica<<strong>br</strong> />
americana, o “American<<strong>br</strong> />
jargon”. Na epilepsia até hoje persiste o<<strong>br</strong> />
uso excessivo de fenitoína, em detrimento<<strong>br</strong> />
de drogas européias como oxicarbamazepina<<strong>br</strong> />
e lamotrigina.<<strong>br</strong> />
Creio que esta é a diferença entre a<<strong>br</strong> />
imprensa médica americana e inglesa.<<strong>br</strong> />
Americanos tem o poder, com maior<<strong>br</strong> />
reflexo mercadológico, financeiro e de<<strong>br</strong> />
lucro pessoal. Publicações inglesas, que<<strong>br</strong> />
representam a Europa do norte, são mais<<strong>br</strong> />
epidemiológicas e de ciência de ponta,<<strong>br</strong> />
menos por o<strong>br</strong>igação de so<strong>br</strong>evivência<<strong>br</strong> />
financeira, menos por lucro pessoal. Mais<<strong>br</strong> />
por mérito.<<strong>br</strong> />
Não há jeito, é necessário acompanhar<<strong>br</strong> />
os dois tipos. E tomar muito cuidado com<<strong>br</strong> />
conceitos como os da medicina baseada<<strong>br</strong> />
em evidências, pois as evidências que<<strong>br</strong> />
convencem o FDA e CDC custam muitos<<strong>br</strong> />
milhões, que não estão disponíveis para<<strong>br</strong> />
condutas para as quais os direitos de<<strong>br</strong> />
produção já expiraram.<<strong>br</strong> />
Dr. Paulo Rogério Mudrovitsch<<strong>br</strong> />
de Bittencourt (PR).<<strong>br</strong> />
11
poesia<<strong>br</strong> />
12<<strong>br</strong> />
Instantes<<strong>br</strong> />
Se eu pudesse viver novamente a minha vida,<<strong>br</strong> />
na próxima trataria de cometer mais erros.<<strong>br</strong> />
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.<<strong>br</strong> />
Seria mais tolo ainda do que tenho sido,<<strong>br</strong> />
na verdade bem poucas coisas levaria a sério.<<strong>br</strong> />
Seria menos ingênuo.<<strong>br</strong> />
Correria mais riscos, viajaria mais,<<strong>br</strong> />
contemplaria mais entardeceres,<<strong>br</strong> />
subiria mais montanhas, nadaria mais rios.<<strong>br</strong> />
Iria a mais lugares onde nunca fui,<<strong>br</strong> />
tomaria mais sorvete e menos lentilha,<<strong>br</strong> />
teria mais problemas reais e<<strong>br</strong> />
menos problemas imaginários.<<strong>br</strong> />
Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e<<strong>br</strong> />
produtivamente cada minuto da sua vida;<<strong>br</strong> />
claro que tive momentos de alegria.<<strong>br</strong> />
Mas, se pudesse voltar a viver,<<strong>br</strong> />
trataria somente de ter bons momentos.<<strong>br</strong> />
Porque, se não sabem, disso é feita a vida,<<strong>br</strong> />
só de momentos; não percas o agora.<<strong>br</strong> />
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um<<strong>br</strong> />
termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas;<<strong>br</strong> />
se voltasse a viver, começaria a andar descalço<<strong>br</strong> />
no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono.<<strong>br</strong> />
Daria mais voltas na minha rua,<<strong>br</strong> />
contemplaria mais amanheceres<<strong>br</strong> />
E <strong>br</strong>incaria com mais crianças,<<strong>br</strong> />
se tivesse outra vez uma vida pela frente.<<strong>br</strong> />
Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.<<strong>br</strong> />
O poema acima é prescrito a pacientes com freqüência. Por<<strong>br</strong> />
que médicos o fazem? Porque é comum pacientes se apresentarem<<strong>br</strong> />
no consultório estressados por levarem uma vida sem vazios<<strong>br</strong> />
existenciais. E o poema tenta trazer o valetudinário para um ritmo<<strong>br</strong> />
mais lento e é um alerta a uma vida inaproveitada. Será? A grande<<strong>br</strong> />
ironia é que não se aplica à maioria das pessoas, que são devagar,<<strong>br</strong> />
quase parando. Quem não tem parada o acha lindo. Quem passa<<strong>br</strong> />
a vida em <strong>br</strong>anca nuvem o utiliza para justificar sua vagagem.<<strong>br</strong> />
Uns e outros o acham uma beleza, por que é de auto-ajuda, e o<<strong>br</strong> />
fato de estar associado a um gênio da literatura, o argentino J<strong>org</strong>e<<strong>br</strong> />
Luiz B<strong>org</strong>es, falecido na Suíça em 1986, e considerado um dos<<strong>br</strong> />
maiores escritores do século passado, lhe dá uma aura de<<strong>br</strong> />
preciosidade. Nem é um grande poema, nem é de B<strong>org</strong>es, nem se<<strong>br</strong> />
aplica à maioria das gentes. Como não é de B<strong>org</strong>es se você já o<<strong>br</strong> />
viu por aí impresso nas paredes da vida com seu nome? É desses<<strong>br</strong> />
mistérios como os que cada vez mais se vê na internet. Textos<<strong>br</strong> />
apócrifos.<<strong>br</strong> />
Alguém escreve e nomina outra autoria. Geralmente de<<strong>br</strong> />
alguém famoso de quem gosta, e que gostaria de ser e, portanto,<<strong>br</strong> />
Esquecer, para Pensar!<<strong>br</strong> />
espalha seu próprio texto com uma falsa autoria. A ser lido por<<strong>br</strong> />
uma multidão. Todos os grandes autores sofrem, ou sofreram, com<<strong>br</strong> />
isso. E B<strong>org</strong>es não poderia ser exceção. Para isso existem os<<strong>br</strong> />
autenticadores. No caso, a própria Maria Kodama, inicialmente<<strong>br</strong> />
secretária, depois esposa do autor que diz muito a nós médicos, já<<strong>br</strong> />
que entre outros escreveu, esse sim, um conto genial chamado<<strong>br</strong> />
Funes, o memorioso.<<strong>br</strong> />
Nesse conto descrevia a história de um rapaz uruguaio que,<<strong>br</strong> />
depois de um acidente, ficou com uma memória prodigiosa. Tão<<strong>br</strong> />
perfeita que podia lem<strong>br</strong>ar qualquer detalhe de um dia inteiro.<<strong>br</strong> />
Isto é, conseguia reconstituir na sua inteireza o dia todo.<<strong>br</strong> />
Resultado: não lhe restava tempo suficiente para pensar.<<strong>br</strong> />
Para pensar é necessário poder esquecer, só assim se generaliza.<<strong>br</strong> />
Ou seja, Funes é uma personagem literária que não poderia existir<<strong>br</strong> />
na vida real. É uma personagem magnífica, mas falsa. O que é<<strong>br</strong> />
coisa de gênio.<<strong>br</strong> />
Ah, de quem é o poema? De uma escritora americana de autoajuda,<<strong>br</strong> />
de quem não lem<strong>br</strong>o o nome. Mas não tem importância.<<strong>br</strong> />
Também necessito esquecer, para pensar!
Roteiro<<strong>br</strong> />
Parar. Parar não paro.<<strong>br</strong> />
Esquecer. Esquecer não esqueço<<strong>br</strong> />
Um rio, só se for claro.<<strong>br</strong> />
Correr, sim, mas sem tropeço.<<strong>br</strong> />
Tinha o olhar severo. No fundo<<strong>br</strong> />
Se caráter custa caro<<strong>br</strong> />
Mas se tropeçar não paro deles imagens concretas, embora<<strong>br</strong> />
pago o preço.<<strong>br</strong> />
- não paro nem mereço.<<strong>br</strong> />
também fosse poeta. Nada de<<strong>br</strong> />
Pago embora seja raro.<<strong>br</strong> />
E que ninguém me dê amparo enredar-se, omitir-se, derrubar-<<strong>br</strong> />
Mas o homem não tem avesso<<strong>br</strong> />
nem me pergunte se padeço.<<strong>br</strong> />
se. Esgrimia os donos-do-mundo<<strong>br</strong> />
e o peso da pedra em comparo<<strong>br</strong> />
à força do arremesso.<<strong>br</strong> />
Não sou nem serei avaro<<strong>br</strong> />
- se caráter custa caro<<strong>br</strong> />
pago o preço.<<strong>br</strong> />
com cálculo bem-feito e verbo<<strong>br</strong> />
perfeito. Agrupados com o nexo<<strong>br</strong> />
SIDÓNIO MURALHA<<strong>br</strong> />
que superava a si mesmo.<<strong>br</strong> />
Lisboa, 29 de julho de 1920<<strong>br</strong> />
Sim, tinha o olhar severo.<<strong>br</strong> />
Curitiba, 8 de dezem<strong>br</strong>o de 1982<<strong>br</strong> />
Também as idéias eram escar-<<strong>br</strong> />
Radiografando a Poesia<<strong>br</strong> />
padas, apontando o prumo da<<strong>br</strong> />
justiça, ansiando por uma vida tão<<strong>br</strong> />
Sidónio Muralha, o Poeta da Condição Humana, é da primeira estirpe intelectual<<strong>br</strong> />
de Portugal. Um lisboeta ilustre cujo invulgar amor cívico fez com que o Brasil –<<strong>br</strong> />
igualitária quanto é a morte.<<strong>br</strong> />
Quis a vida que, como médico,<<strong>br</strong> />
especialmente Curitiba – fossem <strong>br</strong>indados com sua presença física e intelectual.<<strong>br</strong> />
Generoso, impulsivo, possuidor de imensa ternura humana calcada no amor cívico e<<strong>br</strong> />
na exigência de Justiça, fez-se porta-voz dos humilhados e ofendidos, missão que dele<<strong>br</strong> />
cruzasse esse olhar severo. Quando<<strong>br</strong> />
o aconselhamento sugeriu a omissão<<strong>br</strong> />
exigiu coragem, perspicácia e altruísmo. Tinha em uma das mãos a poesia e noutra o de um de seus prazeres, o olhar<<strong>br</strong> />
sonho de uma vida solidária e construtiva a todos disponível.<<strong>br</strong> />
Muralha foi um desassom<strong>br</strong>ado que marcou passagem – como “um dardo que eu<<strong>br</strong> />
mesmo lancei”-, seja no lirismo seja na adversidade política que enfrentou, na <strong>br</strong>eve<<strong>br</strong> />
a<strong>br</strong>andou-se, a firmeza não:<<strong>br</strong> />
— Doutor, sou de um tempo que,<<strong>br</strong> />
porém profícua existência. A autodefinição é exemplar:<<strong>br</strong> />
“A minha poesia é uma árvore cheia de frutos / que um sol de tragédia emadurece:/<<strong>br</strong> />
mas eu não os arranco nem procuro:/ - o meu sol de tragédia aquece, aquece,/ e o fruto<<strong>br</strong> />
em Paris, se entrasse num bistrô e<<strong>br</strong> />
pedisse um copo d’água para<<strong>br</strong> />
cai maduro / no chão de minha vida”.<<strong>br</strong> />
acompanhar a refeição, seria enxo-<<strong>br</strong> />
A liberdade de expressão tão almejada e tão fortemente roubada pelo sistema<<strong>br</strong> />
ditatorial em Portugal, levou-o a outras plagas – então Congo Belga, Guiné Bissau,<<strong>br</strong> />
Bruxelas, Dakar, Londres, Paris e por fim Brasil, em São Paulo, onde fundou a 1ª editora<<strong>br</strong> />
tado sem piedade. Não posso<<strong>br</strong> />
atendê-lo nesse quesito. O demais<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>asileira dedicada exclusivamente à produção de poesia para as crianças. À Giroflé se<<strong>br</strong> />
deve a publicação de Os Olhos das Crianças, essas mesmas que ele identificava como as<<strong>br</strong> />
auroras do amanhã:<<strong>br</strong> />
farei.<<strong>br</strong> />
Morreu como viveu, com o<<strong>br</strong> />
“Atrás dos muros altos com garrafas partidas / bem para trás das grades do silêncio olhar severo de quem contempla,<<strong>br</strong> />
imposto / as crianças de olhos de espanto e de medo transidas / o que pedem é que gritemos<<strong>br</strong> />
por elas / as crianças sem livros, sem ternura, sem janelas / as crianças dos versos que são<<strong>br</strong> />
como pedradas”.<<strong>br</strong> />
sem contemplação. À socapa,<<strong>br</strong> />
dulcíssimo.<<strong>br</strong> />
Após a morte do poeta, a viúva dele, Dra. Helen Butler Muralha, cria a Fundação<<strong>br</strong> />
Sidónio Muralha em Curitiba, hoje já com 25 anos de existência, afirmando-se como centro<<strong>br</strong> />
cultural educativo e filosófico, promotor de seminários so<strong>br</strong>e educação, literatura e filosofia,<<strong>br</strong> />
Deleite-se com a poesia de<<strong>br</strong> />
quem sabia que tudo tem custo,<<strong>br</strong> />
em especial os Cursos de Especialização em Filosofia para Crianças, em parcerias com principalmente o caráter. E nunca<<strong>br</strong> />
segmentos <strong>org</strong>anizados da sociedade.<<strong>br</strong> />
Fundamentada no amor e no diálogo fraternal, a filosofia muralhista compõe-se com<<strong>br</strong> />
a verve poética, definida, cristalina, inque<strong>br</strong>antável. Rija, porém cheia de ternura:<<strong>br</strong> />
regateou o preço.<<strong>br</strong> />
O ano dois mil já passou, meu<<strong>br</strong> />
“Se os seres não dialogassem com um vidro entre eles / se cada diálogo não fosse<<strong>br</strong> />
dois monólogos / uma consciência unitária romperia a crisálida / e o ângulo de visão<<strong>br</strong> />
a<strong>br</strong>angeria o universo”.<<strong>br</strong> />
Alzeli Bassetti (PR)<<strong>br</strong> />
caro Sidónio, e dei um beijo nele<<strong>br</strong> />
por ti.<<strong>br</strong> />
poesia<<strong>br</strong> />
13
futebol<<strong>br</strong> />
14<<strong>br</strong> />
P<<strong>br</strong> />
EU,TORCEDOR<<strong>br</strong> />
“E isto lem<strong>br</strong>a uma tristeza<<strong>br</strong> />
E a lem<strong>br</strong>ança é que entristece,<<strong>br</strong> />
Dou à saudade a riqueza<<strong>br</strong> />
De emoção que a hora tece .”<<strong>br</strong> />
rimeiro de julho e o jogo acabou.<<strong>br</strong> />
Também estou acabado. Por isso,<<strong>br</strong> />
tenho que elaborar a derrota. E<<strong>br</strong> />
não estou conseguindo. Como não sou de<<strong>br</strong> />
beber, escrevo. E lhe peço escusas, caro<<strong>br</strong> />
leitor, mas não quero me servir de você,<<strong>br</strong> />
apenas espero que me acompanhe nesta<<strong>br</strong> />
digressão.<<strong>br</strong> />
Ganhos e perdas foram constantes na<<strong>br</strong> />
minha vida. Aliás, como na de qualquer<<strong>br</strong> />
pessoa. Mas sempre diante de qualquer<<strong>br</strong> />
perda me perguntava: tá bom, meu<<strong>br</strong> />
mundo caiu, o que vou ganhar com isso?<<strong>br</strong> />
Essa forma de lidar com as coisas, sempre<<strong>br</strong> />
me ajudou a superar dificuldades. E me<<strong>br</strong> />
deu serenidade para relativizar perdas.<<strong>br</strong> />
Para extrair lições das dificuldades, sejam<<strong>br</strong> />
pessoais ou coletivas, para me ajudar a<<strong>br</strong> />
superar frustrações. Outrossim, sei que<<strong>br</strong> />
tenho limitações, mas também sei que<<strong>br</strong> />
nossos alcances são indefinidos, por isso<<strong>br</strong> />
é necessário ousar criativamente e com<<strong>br</strong> />
muito disciplina. Esse sempre foi meu<<strong>br</strong> />
caminho. Desta forma superei muitas de<<strong>br</strong> />
minhas precariedades. Claro que continuo<<strong>br</strong> />
tendo outras. Não se esgotam. Mas<<strong>br</strong> />
não me assustam, faço delas meus alvos<<strong>br</strong> />
de superação. E sei que necessito da<<strong>br</strong> />
colaboração de muitos outros para poder<<strong>br</strong> />
evoluir. Agora, nas derrotas, sempre caí<<strong>br</strong> />
de pé, <strong>org</strong>ulhosamente. Ferido, mas<<strong>br</strong> />
digno. E não se diga que falar de coisas<<strong>br</strong> />
pessoais seja mais fácil. Não. Quase<<strong>br</strong> />
sempre procuramos desculpas, escamotear<<strong>br</strong> />
nossas deficiências ou projetá-las nos<<strong>br</strong> />
outros. Consciente disso, estou à vontade<<strong>br</strong> />
para comentar essa grande perda.<<strong>br</strong> />
Vejam, no plano pessoal sei do que sou<<strong>br</strong> />
capaz para fazer um diagnóstico, sem me<<strong>br</strong> />
fugir a razão de que seja sempre probabilístico.<<strong>br</strong> />
Sei lidar com uma platéia, sem<<strong>br</strong> />
me arrogar a pretensão de nunca entrar<<strong>br</strong> />
em saia justa. Ou seja, sei claramente o<<strong>br</strong> />
que posso fazer, não fujo aos desafios e tenho<<strong>br</strong> />
ciência de que para meus critérios de<<strong>br</strong> />
exigência pessoal nunca alcancei a excelência<<strong>br</strong> />
pretendida. Mas sempre fui lutador, e<<strong>br</strong> />
alcancei sempre um mínimo desejável.<<strong>br</strong> />
Ao conhecer meus limites sempre estabeleci<<strong>br</strong> />
a estratégia concernente. Adotava a<<strong>br</strong> />
tática que me parecia mais eficaz, tendo a<<strong>br</strong> />
certeza de que a única coisa que nunca<<strong>br</strong> />
faltaria seria esforço pessoal e solidariedade<<strong>br</strong> />
com os meus. Talento, se existisse, ficaria para<<strong>br</strong> />
o acaso, para o imponderável.<<strong>br</strong> />
Daí minha frustração com o jogo acabado<<strong>br</strong> />
e perdido. Perder sim, é do jogo, mas com a<<strong>br</strong> />
dignidade do lutador que nunca desiste. Que<<strong>br</strong> />
chega junto até o fim. Que nunca dá vezo à<<strong>br</strong> />
apatia.Vemos, às vezes, equipes limitadas<<strong>br</strong> />
alcançando vitórias e dizemos: falta-lhes<<strong>br</strong> />
talento. E daí? Venceram, se superaram. Um<<strong>br</strong> />
Kleberson, em 2002, não era limitado em<<strong>br</strong> />
face dos demais? Claro que sim. Felipão<<strong>br</strong> />
soube extrair dele o necessário. E acabou<<strong>br</strong> />
parecendo ser melhor do que era: num<<strong>br</strong> />
conjunto de jogadores mais técnicos, teve o<<strong>br</strong> />
essencial que é a alma. O espírito do vencedor.<<strong>br</strong> />
Isso é que faz a verdadeira diferença.<<strong>br</strong> />
Para meu temperamento sou mais a<<strong>br</strong> />
racionalidade e serenidade do Parreira do<<strong>br</strong> />
que a erupção emotiva do Felipão. Conseguiria<<strong>br</strong> />
ser o primeiro e não o segundo. Mas,<<strong>br</strong> />
neste momento de desilusão, às 19h do dia<<strong>br</strong> />
1.º, e sem mudar uma linha nos próximos<<strong>br</strong> />
dias, qualquer que seja o resultado dos<<strong>br</strong> />
próximos jogos, consigo ver com toda clareza<<strong>br</strong> />
quem é o mais eficaz. É o vulcânico. O que<<strong>br</strong> />
jamais permitiria a indiferença em face do<<strong>br</strong> />
domínio francês. E deixo claro que se fosse<<strong>br</strong> />
construir um modelo de treinador o faria com<<strong>br</strong> />
a serenidade e racionalidade do Parreira e<<strong>br</strong> />
com a impetuosidade e emocionalidade do<<strong>br</strong> />
Felipão. Procuraria o equilí<strong>br</strong>io. Perder, tudo<<strong>br</strong> />
bem; mas sem cabisbaixo. Derrotado moralmente.<<strong>br</strong> />
Como se diz, jamais sair à francesa.<<strong>br</strong> />
Fomos nós que saímos.<<strong>br</strong> />
Em 54 não ouvi a Copa pelo rádio. Em<<strong>br</strong> />
58 e 62 sim, e vi<strong>br</strong>ei muito. Foi minha<<strong>br</strong> />
formação futebolística. Cunhei minhas<<strong>br</strong> />
referências. Em 66 não deu para sofrer, não<<strong>br</strong> />
demos pro começo, culpa da des<strong>org</strong>anização.<<strong>br</strong> />
Em 70, cheguei à Europa logo<<strong>br</strong> />
depois da Copa, peito estufado, e muito<<strong>br</strong> />
badalado pelos amigos que encontrei.<<strong>br</strong> />
Todos maravilhados com nossa Seleção.<<strong>br</strong> />
Em 74, a Holanda com seu futebol surpreendente,<<strong>br</strong> />
ajudou-me a elaborar a perda. Em<<strong>br</strong> />
78, “campeões morais”, estava tudo armado<<strong>br</strong> />
pelo regime militar argentino. O escândalo<<strong>br</strong> />
me apaziguou. Sofri muito em 82, 86 e 90,<<strong>br</strong> />
mas não escreveria o que estou escrevendo<<strong>br</strong> />
depois dessas derrotas. Houve dignidade<<strong>br</strong> />
nas derrotas. Em 94 vi<strong>br</strong>ei muito, apesar<<strong>br</strong> />
do espetáculo limitado, mas havia disciplina,<<strong>br</strong> />
garra e a genialidade do Romário. Em<<strong>br</strong> />
98, o episódio Ronaldinho, qualquer que<<strong>br</strong> />
tenha sido, ajudou-me a dar a volta por<<strong>br</strong> />
cima. Em 2002, mesmo sozinho, foi catártico.<<strong>br</strong> />
Hoje, 19h08 do 1.º de julho, estou<<strong>br</strong> />
desolado e com dificuldade de digerir este<<strong>br</strong> />
nó na garganta.<<strong>br</strong> />
Sei que este artigo sairá daqui alguns<<strong>br</strong> />
meses, defasado no tempo, inoportuno,<<strong>br</strong> />
depois de todas as análises de especialistas.<<strong>br</strong> />
Mas queria deixar registrado no calor da<<strong>br</strong> />
decepção algo que já vi ocorrer várias vezes<<strong>br</strong> />
no front da medicina. Colegas que são<<strong>br</strong> />
verdadeiros gênios intelectuais não darem<<strong>br</strong> />
certo. Sabem por quê? Porque não conseguem<<strong>br</strong> />
fazer o arroz-com-feijão no dia-a-dia.<<strong>br</strong> />
São abúlicos com a rotina, só querem<<strong>br</strong> />
participar de grande lances, vale dizer, de<<strong>br</strong> />
grande diagnósticos e inusitadas empreitadas<<strong>br</strong> />
terapêuticas. E não se encontram. O<<strong>br</strong> />
futebol também é assim. Uma rotina bemfeita<<strong>br</strong> />
tem mais valor; sem excluir o talento.<<strong>br</strong> />
É nisso que eu quero que acredite, caro<<strong>br</strong> />
leitor. Só o esforço continuado redime. Em<<strong>br</strong> />
qualquer profissão. Sem que se exclua a<<strong>br</strong> />
oportunidade para o inusitado, para a<<strong>br</strong> />
invenção, para a alegria.<<strong>br</strong> />
O<strong>br</strong>igado por participar de minha<<strong>br</strong> />
tristeza às 19h20 do 1.º de julho. Mas,<<strong>br</strong> />
acredite, já estou me sentindo melhor.<<strong>br</strong> />
Refeito, em parte. Graças a você. O que<<strong>br</strong> />
demonstra duas coisas: primeiro, que uns<<strong>br</strong> />
precisamos dos outros; segundo, que<<strong>br</strong> />
espírito é fundamental.
A eutanásia (do grego<<strong>br</strong> />
eu = boa, thanatos =<<strong>br</strong> />
morte) é assunto controverso<<strong>br</strong> />
desde a Antigüidade, época em que<<strong>br</strong> />
os grandes pensadores travavam<<strong>br</strong> />
fervorosos debates so<strong>br</strong>e o tema.<<strong>br</strong> />
Prova disso é a passagem “A ninguém<<strong>br</strong> />
darei por comprazer, nem remédio<<strong>br</strong> />
mortal e nem um conselho que induza<<strong>br</strong> />
a perda”, a qual consta no juramento<<strong>br</strong> />
de Hipócrates. Ao longo dos anos, o<<strong>br</strong> />
assunto certamente não deixou de ser<<strong>br</strong> />
discutido incontáveis vezes pelas mais<<strong>br</strong> />
variadas estirpes de pessoas: de<<strong>br</strong> />
médicos, filósofos e advogados a<<strong>br</strong> />
leigos e enfermos.<<strong>br</strong> />
“Mar Adentro” (2004), do diretor<<strong>br</strong> />
chileno-espanhol Alejandro Amenábar<<strong>br</strong> />
– o mesmo de “Os Outros”<<strong>br</strong> />
(2001) e “Preso na Escuridão” (1997)<<strong>br</strong> />
-, trata justamente deste complicado<<strong>br</strong> />
dilema que é a prática da eutanásia.<<strong>br</strong> />
O filme descreve a verídica trajetória<<strong>br</strong> />
do espanhol Ramón Sampedro (personagem<<strong>br</strong> />
vivido por Javier<<strong>br</strong> />
Bardem) em sua luta incansável<<strong>br</strong> />
pelo direito de<<strong>br</strong> />
“morrer dignamente”.<<strong>br</strong> />
Ramón era um jovem<<strong>br</strong> />
aventureiro que, aos 20<<strong>br</strong> />
anos, já havia conhecido o<<strong>br</strong> />
mundo viajando como marinheiro.Ironicamente,<<strong>br</strong> />
foi<<strong>br</strong> />
também no mar que, após<<strong>br</strong> />
um mergulho em água rasa,<<strong>br</strong> />
tornou-se tetraplégico (“o<<strong>br</strong> />
mar me deu vida e depois<<strong>br</strong> />
a tomou”). A partir de<<strong>br</strong> />
então, Ramón passa a encarar<<strong>br</strong> />
a morte como única<<strong>br</strong> />
saída para o fim de seu<<strong>br</strong> />
sofrimento. Preso a uma<<strong>br</strong> />
cama, conta com o suporte<<strong>br</strong> />
e auxílio constante de sua<<strong>br</strong> />
família. Entretanto, nem<<strong>br</strong> />
todos apóiam a sua decisão,<<strong>br</strong> />
foto divulgação<<strong>br</strong> />
Mar Adentro<<strong>br</strong> />
fato que ilustra a delicadeza do tema. Esta<<strong>br</strong> />
divergência de opiniões atinge o clímax<<strong>br</strong> />
na feroz discussão entre Ramón e seu<<strong>br</strong> />
irmão mais velho. A desaprovação da<<strong>br</strong> />
Igreja Católica é evidenciada pela figura<<strong>br</strong> />
do também tetraplégico Padre Francisco<<strong>br</strong> />
de Gáldar que, coincidentemente ou não,<<strong>br</strong> />
torna-se uma figura execrável apesar de<<strong>br</strong> />
sua <strong>br</strong>eve aparição.<<strong>br</strong> />
Ramón é um homem que chora rindo,<<strong>br</strong> />
escreve poesias com geringonças de sua<<strong>br</strong> />
autoria, voa para onde sua imaginação o<<strong>br</strong> />
leva, sonha acordado, mas nunca perde<<strong>br</strong> />
a lucidez e coerência em suas argumentações<<strong>br</strong> />
quando defende sua escolha<<strong>br</strong> />
pela morte.Nesta luta, Ramón conta<<strong>br</strong> />
também com o apoio de uma <strong>org</strong>anização<<strong>br</strong> />
não-governamental e com a advogada<<strong>br</strong> />
Júlia, que se identifica com o caso pelo<<strong>br</strong> />
fato de ser portadora de uma doença<<strong>br</strong> />
progressivamente incapacitante chamada<<strong>br</strong> />
Cadasil (acrônimo em inglês para Arteropatia<<strong>br</strong> />
Cere<strong>br</strong>al Autossômica Dominante<<strong>br</strong> />
com Infartos Subcorticais e Leucoence-<<strong>br</strong> />
cinema<<strong>br</strong> />
falopatia). Com Júlia, Ramón partilha<<strong>br</strong> />
cigarros, discute suas trágicas vidas,<<strong>br</strong> />
publica seu livro de poesias e chega a<<strong>br</strong> />
trocar seu primeiro beijo ao longo dos<<strong>br</strong> />
28 anos desde o seu acidente. Outra<<strong>br</strong> />
mulher de fundamental importância<<strong>br</strong> />
no enredo é Rosa, mãe solteira de dois<<strong>br</strong> />
filhos que, curiosamente, encontra em<<strong>br</strong> />
Ramón um significado para viver.<<strong>br</strong> />
A burocracia judicial (“de um estado<<strong>br</strong> />
que se diz laico”) também é explicitamente<<strong>br</strong> />
questionada na cena que representa<<strong>br</strong> />
o julgamento de Ramón e em seu<<strong>br</strong> />
testamento: “Senhores juízes, negar a<<strong>br</strong> />
propriedade privada de nosso próprio ser<<strong>br</strong> />
é a maior das mentiras culturais”.<<strong>br</strong> />
“Mar Adentro” é um filme que,<<strong>br</strong> />
apesar de posicionar-se a favor da<<strong>br</strong> />
eutanásia ao bater na idéia de que<<strong>br</strong> />
“viver é um direito e não uma o<strong>br</strong>igação”,<<strong>br</strong> />
acende uma reflexão e discussão<<strong>br</strong> />
bastante profundas e questionadoras<<strong>br</strong> />
acerca do tema. Vale a pena conferir.<<strong>br</strong> />
Dr. Guilherme Gadens (PR).<<strong>br</strong> />
15
16<<strong>br</strong> />
N<<strong>br</strong> />
osso Paixão é um apaixonado<<strong>br</strong> />
pelo Le Penseur. À maneira<<strong>br</strong> />
de Rodin, só no Iátrico já<<strong>br</strong> />
produziu dois. Por que à la Rodin?<<strong>br</strong> />
Porque embora O Pensador que<<strong>br</strong> />
ilustra a página seja o mais famoso<<strong>br</strong> />
(verdadeiro ícone da escultura<<strong>br</strong> />
universal tanto que qualquer turista<<strong>br</strong> />
ao visitar Paris quer logo<<strong>br</strong> />
comprar uma réplica em<<strong>br</strong> />
miniatura), o grande<<strong>br</strong> />
escultor francês só<<strong>br</strong> />
na inacabada<<strong>br</strong> />
porta do<<strong>br</strong> />
“Gabiru Lamentador”,<<strong>br</strong> />
de Luiz Gagliastri (PR).<<strong>br</strong> />
inferno, baseada no inferno de Dante,<<strong>br</strong> />
lavrou vários. Rodin era assim, um<<strong>br</strong> />
obsessivo. Embora não lhe faltasse um<<strong>br</strong> />
variado repertório de idéias, formas e<<strong>br</strong> />
temas, quando obcecado com uma,<<strong>br</strong> />
produzia protótipos e esculpia alguns<<strong>br</strong> />
com pequenas variações, o que demonstrava<<strong>br</strong> />
sua permanente insatisfação com o<<strong>br</strong> />
que criava. Tanto melhor para<<strong>br</strong> />
nós, a exaustão de seu perfeccionismo<<strong>br</strong> />
gerou algumas<<strong>br</strong> />
o<strong>br</strong>as-primas. Mas não<<strong>br</strong> />
pense o caro leitor que<<strong>br</strong> />
seu gênio tenha sido<<strong>br</strong> />
reconhecido precocemente.<<strong>br</strong> />
Muito ao<<strong>br</strong> />
contrário. Expôs<<strong>br</strong> />
algumas vezes sem a<<strong>br</strong> />
menor repercussão e,<<strong>br</strong> />
para variar, com<<strong>br</strong> />
críticas acerbas. Mas<<strong>br</strong> />
tinha a perseverança dos<<strong>br</strong> />
imprescindíveis. Na sua<<strong>br</strong> />
solidão — ficou anos<<strong>br</strong> />
encafuado — treinava e<<strong>br</strong> />
aperfeiçoava sua<<strong>br</strong> />
gale<<strong>br</strong> />
força natural. Portanto, o lirismo sensual<<strong>br</strong> />
de O Beijo ou a intensidade trágica d’Os<<strong>br</strong> />
Burgueses de Calais levaram tempo para<<strong>br</strong> />
vir à luz. Embora dominasse suas referências,<<strong>br</strong> />
era cegado pela originalidade. E<<strong>br</strong> />
era lento, o que reduzia sua produção (o<<strong>br</strong> />
leitor deste espaço já sabe que só o que é<<strong>br</strong> />
lento perdura). Mas sua lentidão era<<strong>br</strong> />
calculada. Permitiu torná-lo um mestre<<strong>br</strong> />
nas superfícies anatômicas. E isso não<<strong>br</strong> />
sobejava, queria dar um espírito a suas<<strong>br</strong> />
esculturas. E conseguiu. A mestria de<<strong>br</strong> />
suas reentrâncias, com extensão e<<strong>br</strong> />
profundidade peculiares, permitiu-o<<strong>br</strong> />
expressar a sensação de movimento. Essa<<strong>br</strong> />
sua revolução. O espírito de suas esculturas<<strong>br</strong> />
nos vem da sensação de movimento.<<strong>br</strong> />
Não tinha medo de suas verdades.<<strong>br</strong> />
Assumiu-as com a paixão que detona a<<strong>br</strong> />
vocação criadora, mas sem perder o<<strong>br</strong> />
sentido das proporções. O resultado está<<strong>br</strong> />
lá no Musée Rodin: um espectro de<<strong>br</strong> />
saliências e reentrâncias que vai do<<strong>br</strong> />
desespero quieto ao vendaval de desejos.<<strong>br</strong> />
Quer um exemplo? Quando faz um nu é<<strong>br</strong> />
sempre uma nudez desamparada, absoluta,<<strong>br</strong> />
e única. Alia à paixão e à proporção o<<strong>br</strong> />
senso de responsabilidade autoral. Não<<strong>br</strong> />
faz o que os outros fazem, registra a sua<<strong>br</strong> />
marca, sempre uma digital criativa e<<strong>br</strong> />
singular. Por isso, produziu uma o<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />
fundamental: a que cresce sempre, feito<<strong>br</strong> />
um bosque. Daí ser a paixão de tantos
ia<<strong>br</strong> />
artistas.<<strong>br</strong> />
Todo verdadeiro artista prima<<strong>br</strong> />
pela originalidade. Foi o que fez<<strong>br</strong> />
nosso Paixão, e também o que fez<<strong>br</strong> />
nosso escultor Luiz Gagliastri. Olhem a<<strong>br</strong> />
escultura à esquerda e abaixo. Penso ter<<strong>br</strong> />
sido seu primeiro “pensador”. Uma de<<strong>br</strong> />
suas primeiras peças. O artista original<<strong>br</strong> />
esculpe sua terra, sua gente com carne e<<strong>br</strong> />
osso, mesmo que forjada no ferro. O<<strong>br</strong> />
pensador de Rodin é o homem que percebe<<strong>br</strong> />
o horror e a beleza do espetáculo humano<<strong>br</strong> />
por que pensa. Embora abstraído e mudo,<<strong>br</strong> />
está pleno de visões e pensamentos.<<strong>br</strong> />
Grávido de possibilidades. O corpo<<strong>br</strong> />
inteiro se faz cére<strong>br</strong>o, este mente,<<strong>br</strong> />
porque está em ação. O pensador<<strong>br</strong> />
de Gagliastri não pensa, se<<strong>br</strong> />
lamenta. O corpo não se concentra,<<strong>br</strong> />
se desfaz; não tem<<strong>br</strong> />
músculos, é permeável à ruína;<<strong>br</strong> />
as mãos não sustentam o peso<<strong>br</strong> />
das idéias, clamam sua falta. As<<strong>br</strong> />
lágrimas são pregos que espetam<<strong>br</strong> />
nossa sensibilidade e se perdem sem<<strong>br</strong> />
regar o terreno porque não há seara. Só<<strong>br</strong> />
há desespero, sem esperança.<<strong>br</strong> />
Um pensador é francês, regado a iluminismo,<<strong>br</strong> />
todos o querem; o outro é nordestino,<<strong>br</strong> />
seco no horror da esterilidade de idéias e fome,<<strong>br</strong> />
todos o rejeitam. Um gabiru lamentador, triste<<strong>br</strong> />
imagem de nossa desatenção. Ambos, paixão de<<strong>br</strong> />
artistas, que revelam o sublime e a barbárie.<<strong>br</strong> />
“O Pensador” (Le Penseur),<<strong>br</strong> />
de Auguste Rodin.<<strong>br</strong> />
17
diálogos<<strong>br</strong> />
18<<strong>br</strong> />
A PROVA DO JOÃOZINHO<<strong>br</strong> />
Filho de médico, diligente e aplicado,<<strong>br</strong> />
Joãozinho era daqueles estudantes<<strong>br</strong> />
que, a um só tempo, suscitam<<strong>br</strong> />
respeito e inveja. Mas cá entre nós,<<strong>br</strong> />
era muito chato também.<<strong>br</strong> />
Deu-se que enfiou uma coisa na<<strong>br</strong> />
cabeça e começou a perseguir a<<strong>br</strong> />
professora.<<strong>br</strong> />
— Você de novo Joãozinho, qual<<strong>br</strong> />
o problema?<<strong>br</strong> />
— É que sou muito inteligente<<strong>br</strong> />
para estar no primeiro ano. Minha<<strong>br</strong> />
irmã está no terceiro e não sabe nem<<strong>br</strong> />
um pouco do que eu sei. Quero ir para<<strong>br</strong> />
o terceiro também!<<strong>br</strong> />
A professora no íntimo sabia que<<strong>br</strong> />
não ia conseguir ser dissuasória e<<strong>br</strong> />
mandou-o à diretoria. Enquanto o<<strong>br</strong> />
Joãozinho esperava na ante-sala, a<<strong>br</strong> />
“profe” explica a situação ao diretor.<<strong>br</strong> />
Este, não se fez de rogado, e do alto<<strong>br</strong> />
de sua onipotência diz-lhe:<<strong>br</strong> />
— Deixa comigo! Vou aplicar um<<strong>br</strong> />
A semente da verdade<<strong>br</strong> />
pode demorar a<<strong>br</strong> />
florescer, mas no fim<<strong>br</strong> />
floresce, aconteça o<<strong>br</strong> />
que acontecer.<<strong>br</strong> />
Gregório Marañón (1887-<<strong>br</strong> />
1960), médico e escritor<<strong>br</strong> />
espanhol, escreveu sozinho o<<strong>br</strong> />
Manual de Diagnóstico Etiológico,<<strong>br</strong> />
um clássico.<<strong>br</strong> />
teste no garoto, e como não vai responder<<strong>br</strong> />
a todas as questões, vai mesmo é ficar no<<strong>br</strong> />
primeiro ano.<<strong>br</strong> />
Professora de acordo, chama Joãozinho,<<strong>br</strong> />
cujo pai também já fora terror de<<strong>br</strong> />
turma, e explica-lhe que vai passar por<<strong>br</strong> />
uma prova oral. Terá que responder a<<strong>br</strong> />
todas as perguntas, se for bem-sucedido...<<strong>br</strong> />
O garoto acedeu, e o diretor começou<<strong>br</strong> />
pegando leve:<<strong>br</strong> />
— Quanto é três vezes três?<<strong>br</strong> />
— Nove.<<strong>br</strong> />
— E seis vezes seis?<<strong>br</strong> />
— Trinta e seis.<<strong>br</strong> />
O diretor continua oferecendo questões<<strong>br</strong> />
pertinentes a um aluno do 3° ano e<<strong>br</strong> />
o danado do menino impecavelmente a<<strong>br</strong> />
todas responde. O diretor, visivelmente<<strong>br</strong> />
aturdido com tantas respostas irretorquíveis,<<strong>br</strong> />
diz à professora:<<strong>br</strong> />
— Penso não haver outro jeito, temos<<strong>br</strong> />
que colocá-lo no terceiro.<<strong>br</strong> />
A mestre que o achava purgante não<<strong>br</strong> />
se deu por vencida e pediu para também<<strong>br</strong> />
argüi-lo! Diretor e Little John assentaram<<strong>br</strong> />
e ela veio com tudo. Inconformada com<<strong>br</strong> />
as respostas normais partiu para a<<strong>br</strong> />
abstração e perguntou:<<strong>br</strong> />
— O que é que a vaca tem quatro e<<strong>br</strong> />
eu só tenho duas?<<strong>br</strong> />
Joãozinho pensa e num átimo responde:<<strong>br</strong> />
— Pernas.<<strong>br</strong> />
— E o que há nas suas calças que não<<strong>br</strong> />
há nas minhas?<<strong>br</strong> />
O diretor arregala os olhos mas não<<strong>br</strong> />
tem tempo de interromper.<<strong>br</strong> />
— Bolsos, professora.<<strong>br</strong> />
— O que é que entra na frente na<<strong>br</strong> />
mulher e só pode entrar atrás no<<strong>br</strong> />
homem?<<strong>br</strong> />
Estupefato com os questionamentos<<strong>br</strong> />
o diretor prende a respiração e antes<<strong>br</strong> />
que respire...<<strong>br</strong> />
— A letra “M”, responde o guri.<<strong>br</strong> />
A argüição continuava:<<strong>br</strong> />
— Onde é que a mulher tem o cabelo<<strong>br</strong> />
mais enroladinho?<<strong>br</strong> />
— Na África, responde o garoto de<<strong>br</strong> />
primeira.<<strong>br</strong> />
— Qual o monossílabo tônico que<<strong>br</strong> />
começa com a letra C, e termina com a<<strong>br</strong> />
letra U, ora está sujo, ora está limpo?<<strong>br</strong> />
O diretor está suando frio.<<strong>br</strong> />
— O céu, professora.<<strong>br</strong> />
— O que é que começa com C, tem<<strong>br</strong> />
duas letras, um buraco no meio e eu já<<strong>br</strong> />
dei para várias pessoas?<<strong>br</strong> />
— CD, responde o travesso.<<strong>br</strong> />
Não mais se contendo, o diretor<<strong>br</strong> />
interrompe a prova oral, respira aliviado<<strong>br</strong> />
e diz para professora:<<strong>br</strong> />
— P.Q.P., vamos pôr esse moleque<<strong>br</strong> />
como diretor. Eu mesmo errei todas.<<strong>br</strong> />
Moral: Quem pensa fixo pode<<strong>br</strong> />
perder o siso.<<strong>br</strong> />
J.M. e A.T. (PR).
O exercício da medicina realizado<<strong>br</strong> />
na sua dimensão maior apóia-se em<<strong>br</strong> />
dois pilares: o conhecimento científico<<strong>br</strong> />
e o humanismo. Este conceito, aparentemente<<strong>br</strong> />
óbvio, explica porque o<<strong>br</strong> />
bom médico não é aquele apenas<<strong>br</strong> />
dotado de ilustração técnica, mas,<<strong>br</strong> />
também, aquele que tem compaixão e<<strong>br</strong> />
estabelece relações humanas profundas,<<strong>br</strong> />
aquele que se posta ao lado do seu<<strong>br</strong> />
paciente, como leal companheiro de<<strong>br</strong> />
viagem.<<strong>br</strong> />
Com toda intolerância que prevalece<<strong>br</strong> />
na nossa sociedade, incapaz de aceitar até<<strong>br</strong> />
os fatos médicos inexoráveis, como a<<strong>br</strong> />
decadência física pela idade e as doenças<<strong>br</strong> />
ou a morte incontornáveis, com todo<<strong>br</strong> />
ambiente indigente no qual atua um semnúmero<<strong>br</strong> />
de médicos <strong>br</strong>asileiros e com todas<<strong>br</strong> />
as imperfeições da natureza humana, que<<strong>br</strong> />
atinge inclusive os médicos, é ainda<<strong>br</strong> />
possível produzir bons médicos? Tenho<<strong>br</strong> />
certeza que sim.<<strong>br</strong> />
Michelangelo dizia que cada bloco de<<strong>br</strong> />
mármore <strong>br</strong>uto esconde uma figura<<strong>br</strong> />
esculpida, pronta para ser liberada com<<strong>br</strong> />
um pouco de trabalho e talento. Essa é<<strong>br</strong> />
a função dos educadores médicos.<<strong>br</strong> />
Desco<strong>br</strong>ir nos blocos amorfos os pequeninos<<strong>br</strong> />
Davis e Pietás dotados não<<strong>br</strong> />
apenas de conhecimento para curar,<<strong>br</strong> />
mas principalmente, de sentimentos<<strong>br</strong> />
humanísticos genuínos que irão reconfortar.<<strong>br</strong> />
E moldar nos blocos amorfos<<strong>br</strong> />
cidadãos que, além de amenizar o<<strong>br</strong> />
sofrimento, sejam capazes de influenciar<<strong>br</strong> />
suas comunidades, modificando<<strong>br</strong> />
o cotidiano das pessoas, transformando<<strong>br</strong> />
a sociedade e ajudando a desenhar um<<strong>br</strong> />
novo país.<<strong>br</strong> />
Dr. Miguel Srougi (SP).<<strong>br</strong> />
Jatos de idéias médicas para refletir e criticar<<strong>br</strong> />
Disse Nelson Algren: “Não vá para a cama com quem tem mais<<strong>br</strong> />
problemas do que você”. Digo eu: Vão faltar parceiros!<<strong>br</strong> />
Humilhados pelas leis biológicas que nos reduzem a um<<strong>br</strong> />
agregado de bases, nos consolamos na imortalidade.<<strong>br</strong> />
Fale dos que lhe a<strong>br</strong>em as portas da percepção.<<strong>br</strong> />
Aos que fecham, ignore-os.<<strong>br</strong> />
Os tempos são de grosseria e deboche. Não caia nessa<<strong>br</strong> />
esparrela. Nós, médicos, sempre fomos agentes da<<strong>br</strong> />
cortesia e da delicadeza, sem perder a firmeza.<<strong>br</strong> />
Saiba fazer para fazer saber e mandar. Sem perder a graça.<<strong>br</strong> />
Não lamente os erros. Aprenda com os mesmos. São a<<strong>br</strong> />
matéria-prima de sua própria autolapidaçao.<<strong>br</strong> />
Não se lamente. Vire-se.<<strong>br</strong> />
Nunca se ache bom o bastante.<<strong>br</strong> />
Continue melhorando. Com satisfação.<<strong>br</strong> />
Não seja novidadeiro. Procure as provas.<<strong>br</strong> />
Você conhece seus limites? Isso é muito bom! Agora<<strong>br</strong> />
expanda-os. Nunca conhecemos nosso alcance.<<strong>br</strong> />
Mantenha seus desejos, porque necessários, mas<<strong>br</strong> />
controle-os. A realidade será mais estável.<<strong>br</strong> />
Faça de sua precariedade o estimúlo para seu aperfeiçoamento.<<strong>br</strong> />
reflexão<<strong>br</strong> />
Você anda com relacionamentos complicados? Pelo menos aprenda<<strong>br</strong> />
com os mesmos. Lem<strong>br</strong>e-se da advertência de Sócrates:<<strong>br</strong> />
Aquele que tiver uma boa mulher será um homem feliz;<<strong>br</strong> />
aquele que não a tiver será um filósofo.<<strong>br</strong> />
Compare-se com os melhores. Devem ser sua referência.<<strong>br</strong> />
Mas nunca esqueça que sua (deles) escalada foi<<strong>br</strong> />
árdua. Sem competência ninguém se sustenta.<<strong>br</strong> />
Na flauta, só músicos, e com talento!<<strong>br</strong> />
19
pérolas<<strong>br</strong> />
20<<strong>br</strong> />
O escore de Framinghan avalia a<<strong>br</strong> />
influência de fatores de risco qualitativos<<strong>br</strong> />
(tabagismo e presença ou não de diabetes)<<strong>br</strong> />
e quantitativos (níveis de pressão<<strong>br</strong> />
arterial, colesterol e HDL colesterol) na<<strong>br</strong> />
determinação do risco de infarto do<<strong>br</strong> />
miocárdio, morte coronariana e angina de<<strong>br</strong> />
peito em 10 anos.<<strong>br</strong> />
A aterosclerose é uma doença inflamatória<<strong>br</strong> />
de baixa atividade quando<<strong>br</strong> />
comparada à doença do colágeno.<<strong>br</strong> />
Contudo, quanto maior essa “discreta”<<strong>br</strong> />
atividade, maior será o risco de evento<<strong>br</strong> />
coronário. A determinação da PCR<<strong>br</strong> />
(proteína C reativa) de alta sensibilidade<<strong>br</strong> />
pode ser útil para melhorar a estratificação<<strong>br</strong> />
clínica dada pelos escores de Framinghan<<strong>br</strong> />
em indivíduos com risco intermediário (10<<strong>br</strong> />
a 20% em dez anos de eventos cardiovasculares).<<strong>br</strong> />
Índices acima de 3 mg/l indicam<<strong>br</strong> />
aumento de risco relativo de 2 a 2,5 vezes<<strong>br</strong> />
quando comparados a indivíduos com<<strong>br</strong> />
valores < 1 mg/l.<<strong>br</strong> />
O diagnóstico da síndrome metabólica<<strong>br</strong> />
é feito pela presença de pelo menos três<<strong>br</strong> />
dos cinco critérios a seguir (NCEP ATP III –<<strong>br</strong> />
National Cholesterol Education Programme<<strong>br</strong> />
Adult Treatment Panel III): obesidade<<strong>br</strong> />
abdominal (cintura > 102 cm para homens<<strong>br</strong> />
e 88 cm para mulheres); triglicerídeos ><<strong>br</strong> />
150 mg/dl; HDL-C < 40 mg/dl para<<strong>br</strong> />
homens e 130/85 mmhg; glicemia<<strong>br</strong> />
> 110 mg/dl.<<strong>br</strong> />
Em adultos, a pressão sistólica é<<strong>br</strong> />
definida como o aparecimento do primeiro<<strong>br</strong> />
som regular (fase I de Korotkoff) seguido<<strong>br</strong> />
de batidas regulares que se intensificam<<strong>br</strong> />
com o aumento da velocidade de deflação<<strong>br</strong> />
(manguito). A pressão diastólica é determinada<<strong>br</strong> />
no desaparecimento do som (fase<<strong>br</strong> />
V de Korotkoff).<<strong>br</strong> />
Os dados epidemiológicos demonstram<<strong>br</strong> />
uma relação positiva entre a ingestão de<<strong>br</strong> />
sódio e os níveis de pressão arterial. A orientação<<strong>br</strong> />
das diretrizes de tratamento da hipertensão<<strong>br</strong> />
arterial quanto ao consumo diário de<<strong>br</strong> />
sal é em torno de 100 mmol. A cada redução<<strong>br</strong> />
de 40 mEq/dia de sódio há uma redução<<strong>br</strong> />
média de 4 mmhg na pressão sistólica.<<strong>br</strong> />
A hipertensão arterial acomete cerca de<<strong>br</strong> />
22 a 44% da população adulta <strong>br</strong>asileira. De<<strong>br</strong> />
acordo com a etiologia, mais de 90% dos<<strong>br</strong> />
pacientes hipertensos são considerados como<<strong>br</strong> />
portadores de hipertensão arterial sistêmica<<strong>br</strong> />
primária, essencial ou idiopática. Em cerca de<<strong>br</strong> />
10% dos pacientes ocorre a Hipertensão<<strong>br</strong> />
arterial sistêmica secundária a outras doenças<<strong>br</strong> />
que são responsáveis pela sua gênese.<<strong>br</strong> />
Indícios clínicos de hipertensão arterial<<strong>br</strong> />
sistêmica secundária: início da HAS antes dos<<strong>br</strong> />
30 anos ou após os 50 anos; HAS refratária à<<strong>br</strong> />
terapêutica otimizada; tríade do feocromocitoma:<<strong>br</strong> />
palpitações, sudorese e cefaléia<<strong>br</strong> />
de aparecimento concomitante e em crises;<<strong>br</strong> />
fácies e/ou biótipo de doença que cursa com<<strong>br</strong> />
HAS: doença renal, hipertireoidismo, acromegalia,<<strong>br</strong> />
síndrome de Cushing; presença de<<strong>br</strong> />
sopros abdominais; assimetria de pulsos;<<strong>br</strong> />
aumento da creatinina sérica; hipopotassemia<<strong>br</strong> />
espontânea (< 3 mEq/l); exame de urina<<strong>br</strong> />
anormal (hematúria ou proteinúria).<<strong>br</strong> />
A insuficiência cardíaca considerada hoje<<strong>br</strong> />
como uma síndrome clínica complexa,<<strong>br</strong> />
constitui o principal problema cardiovascular<<strong>br</strong> />
de saúde pública. Há no Brasil cerca de 2<<strong>br</strong> />
milhões de pacientes com ICC e a cada ano<<strong>br</strong> />
240 mil novos casos são diagnosticados. Para<<strong>br</strong> />
tratá-la é fundamental o diagnóstico etiológico<<strong>br</strong> />
(coronariopatia, HAS, valvopatia, miocardiopatias,<<strong>br</strong> />
taqui e <strong>br</strong>adiarritmias) assim como<<strong>br</strong> />
o diagnóstico funcional (Sistólica -60 a 80%<<strong>br</strong> />
dos casos; ocorre por so<strong>br</strong>ecarga de volume<<strong>br</strong> />
acarretando dilatação excêntrica do ventrículo<<strong>br</strong> />
esquerdo e redução da fração de ejeção.<<strong>br</strong> />
Diastólica – 20 a 40% dos casos; ocorre por<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>ecarga de pressão acarretando alteração<<strong>br</strong> />
do relaxamento, redução da elasticidade e<<strong>br</strong> />
aumento da rigidez do ventrículo esquerdo,<<strong>br</strong> />
mantendo preservada a área cardíaca e a<<strong>br</strong> />
fração de ejeção).<<strong>br</strong> />
A estenose aórtica prevalente no homem<<strong>br</strong> />
acima de 50 anos tem como etiologia mais<<strong>br</strong> />
freqüente a valva aórtica bicúspide (50%).<<strong>br</strong> />
A tríade clássica prognóstica é indicativa<<strong>br</strong> />
de tratamento cirúrgico: síncope (taxa de<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>evida 50% em 3 anos); angina pectoris<<strong>br</strong> />
(taxa de so<strong>br</strong>evida 50% em 5 anos);<<strong>br</strong> />
insuficiência cardíaca congestiva (taxa de<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>evida 50% em 2 anos).<<strong>br</strong> />
A insuficiência aórtica é a valvopatia com<<strong>br</strong> />
maior número de sinais semiológicos periféricos:<<strong>br</strong> />
pressão arterial divergente (PAS<<strong>br</strong> />
aumentada e PAD normal/baixa); pulso:<<strong>br</strong> />
amplo de ascensão rápida; Sinal de Corrighan:<<strong>br</strong> />
“martelo d’água; Sinal de Musset: movimentação<<strong>br</strong> />
da cabeça concomitante aos batimentos<<strong>br</strong> />
cardíacos; Sinal de Muller: pulsação<<strong>br</strong> />
sistólica de úvula; Pulso de Quinke: pulsação<<strong>br</strong> />
capilar visível no leito ungueal ou lábio.<<strong>br</strong> />
A síndrome coronariana aguda (IAM e<<strong>br</strong> />
angina instável) representa quase 1/5 dos<<strong>br</strong> />
casos de dor torácica nas salas de emergência,<<strong>br</strong> />
e por possuir uma significativa<<strong>br</strong> />
morbi-mortalidade, a abordagem inicial<<strong>br</strong> />
desses pacientes é sempre feita no sentido<<strong>br</strong> />
de confirmar ou afastar este diagnóstico.<<strong>br</strong> />
As unidades de dor torácica (UDT) foram<<strong>br</strong> />
criadas em 1982, e desde então vêm sendo<<strong>br</strong> />
reconhecidas como um aprimoramento da<<strong>br</strong> />
assistência emergencial. Essas unidades<<strong>br</strong> />
visam: 1 – prover acesso fácil e prioritário<<strong>br</strong> />
ao paciente com dor torácica que procura<<strong>br</strong> />
a sala de emergência; 2 – fornecer uma<<strong>br</strong> />
estratégia diagnóstica e terapêutica<<strong>br</strong> />
<strong>org</strong>anizada na sala de emergência,<<strong>br</strong> />
objetivando rapidez, alta qualidade de<<strong>br</strong> />
cuidados, eficiência e contenção de custos.<<strong>br</strong> />
A semiologia da dor torácica é a principal<<strong>br</strong> />
ferramenta seguida pelo ECG e marcadores<<strong>br</strong> />
de necrose (CPK, CK-mb, troponinas) para<<strong>br</strong> />
avaliar e alocar o paciente com dor torácica<<strong>br</strong> />
na UDT em uma das rotas; Rota 1: IAM com<<strong>br</strong> />
supradesnível do segmento ST; Rota 2: IAM<<strong>br</strong> />
sem supradesnível do segmento ST e Angina<<strong>br</strong> />
Instável; Rota 3: dor torácica provavelmente<<strong>br</strong> />
anginosa; Rota 4: dor torácica definitivamente<<strong>br</strong> />
não anginosa.<<strong>br</strong> />
Dr. Francisco Maia (PR).
A<<strong>br</strong> />
o a<strong>br</strong>açar a medicina como profissão<<strong>br</strong> />
se herda uma postura, uma<<strong>br</strong> />
metodologia especial de se avaliar<<strong>br</strong> />
o mundo e a vida. Afinal a medicina,<<strong>br</strong> />
além de arte, é ciência aplicada. A medicina<<strong>br</strong> />
é, e sempre foi, baseada em evidências.<<strong>br</strong> />
Evidências!<<strong>br</strong> />
O que não for passível de verificação<<strong>br</strong> />
e demonstração, não é admitido como<<strong>br</strong> />
verdade. O tratamento só é instituído<<strong>br</strong> />
depois de estabelecido um diagnóstico. O<<strong>br</strong> />
diagnóstico é alcançado pela análise dos<<strong>br</strong> />
dados reunidos pela anamnese e exames<<strong>br</strong> />
preliminares, desde o clínico até o mais<<strong>br</strong> />
sofisticado exame complementar. O<<strong>br</strong> />
tratamento, por sua vez, é feito por meio<<strong>br</strong> />
de terapias cuja eficácia foi comprovada<<strong>br</strong> />
através de métodos de análise estritamente<<strong>br</strong> />
objetivos. Embora a subjetividade,<<strong>br</strong> />
a intuição, não deva ser desprezada, pois<<strong>br</strong> />
são atributos do cientista e sem os quais<<strong>br</strong> />
não haveria descobertas. Na hora de avaliar<<strong>br</strong> />
fatos é recomendável que a subjetividade<<strong>br</strong> />
fique de fora.<<strong>br</strong> />
O médico moderno não aceita e não<<strong>br</strong> />
aplica o que não tenha sido cabalmente<<strong>br</strong> />
demonstrado; o que não tenha resistido a<<strong>br</strong> />
estudos prospectivos, duplo-cego, randomizados,<<strong>br</strong> />
etc.<<strong>br</strong> />
Pois bem. Convencido da legitimidade<<strong>br</strong> />
“Primum vivere, deinde philosophari”.<<strong>br</strong> />
da metodologia científica, o médico tem a<<strong>br</strong> />
o<strong>br</strong>igação de rever conceitos tidos como<<strong>br</strong> />
verdadeiros por todo mundo, inclusive por<<strong>br</strong> />
seus pais, avós, amigos. Pois, como disse<<strong>br</strong> />
Bertrand Russel, mesmo que cinqüenta<<strong>br</strong> />
milhões de pessoas digam uma bobagem, ela<<strong>br</strong> />
continua sendo uma bobagem.<<strong>br</strong> />
Ao se auto-analisar, o médico verificará<<strong>br</strong> />
que a<strong>br</strong>iga uma grande quantidade de<<strong>br</strong> />
conceitos falsos, meras crenças que não<<strong>br</strong> />
condizem com seu status de cientista, a<<strong>br</strong> />
maioria dos quais lhe foi introjetado desde a<<strong>br</strong> />
infância. Conceitos que ele vem mantendo<<strong>br</strong> />
sem tê-los revisados à luz de todo o conhecimento<<strong>br</strong> />
que a universidade e a vida lhe<<strong>br</strong> />
aportaram. Assim, é essencial que ele reveja<<strong>br</strong> />
com cuidado suas crenças, pois vai verificar<<strong>br</strong> />
que a maioria não passa de mitos pueris que<<strong>br</strong> />
não resistem a mais simples análise.<<strong>br</strong> />
Por lhe ter sido ensinado que duvidar de<<strong>br</strong> />
Deus é um sacrilégio, é usual simplesmente<<strong>br</strong> />
se aceitar o dito pelo não dito, seguindo-se<<strong>br</strong> />
com antigas ilusões. Há, para quem vive da<<strong>br</strong> />
ciência, a o<strong>br</strong>igatoriedade de revisar suas<<strong>br</strong> />
crenças religiosas sem receio, pejo ou preconceitos,<<strong>br</strong> />
sob pena de andar pelo mundo dicotomizado,<<strong>br</strong> />
usando dois pesos e duas medidas:<<strong>br</strong> />
a ciência e a fé. E quem ora usa uma, ora usa<<strong>br</strong> />
outra, está mal resolvido e sua ciência pode<<strong>br</strong> />
cair em descrédito. Do cientista espera-se<<strong>br</strong> />
ciência e fé<<strong>br</strong> />
coerência e coragem intelectual.<<strong>br</strong> />
Religiões, todas elas, são frutos da<<strong>br</strong> />
angústia que assola o homem uma vez que<<strong>br</strong> />
ele é o único animal que sabe que vai<<strong>br</strong> />
morrer. A ignorância do que se passa no<<strong>br</strong> />
além túmulo é geradora de formidável<<strong>br</strong> />
insegurança; o ego exige alguma explicação<<strong>br</strong> />
para este enigma, e se dá por satisfeito<<strong>br</strong> />
mesmo que se trate apenas de uma<<strong>br</strong> />
lenda, uma mitologia.<<strong>br</strong> />
Destituídos dos conhecimentos que<<strong>br</strong> />
hoje se dispõe, nossa ancestralidade inventou<<strong>br</strong> />
todo tipo de fantasia para esta emergência.<<strong>br</strong> />
Criou não somente deuses como<<strong>br</strong> />
verdadeiras burocracias celestiais, bem à<<strong>br</strong> />
feição humana, eivadas com seus vícios e<<strong>br</strong> />
fraquezas. Dá como fato que a morte seria<<strong>br</strong> />
a passagem para uma outra vida, eterna.<<strong>br</strong> />
Há quem descreva, em detalhes, os procedimentos<<strong>br</strong> />
que então se dariam.<<strong>br</strong> />
Portanto, veja se o deus no qual você<<strong>br</strong> />
crê resiste a uma análise honesta e<<strong>br</strong> />
destituída de subjetividades. Verifique se<<strong>br</strong> />
ele subsiste a um estudo prospectivo,<<strong>br</strong> />
duplo-cego e randomizado.<<strong>br</strong> />
Enfim, você não pode exercer uma<<strong>br</strong> />
medicina do século XXI e simultaneamente<<strong>br</strong> />
acalentar mitos oriundos do<<strong>br</strong> />
neolítico.<<strong>br</strong> />
Dr. Cezar Zillig (SC).<<strong>br</strong> />
“Certo tipo de comunicação, tratando de certo tipo de assunto, trazida à<<strong>br</strong> />
atenção de certo tipo de audiência, submetida a certas condições, produz<<strong>br</strong> />
certo tipo de efeito”.<<strong>br</strong> />
Bernard Berelson.<<strong>br</strong> />
Como na medicina, as variáveis são muitas — aqui cinco —, mas não existe um tipo de<<strong>br</strong> />
comunicação melhor que outro. Tudo depende das circunstâncias e do momento em que se<<strong>br</strong> />
dá emissão e recepção. No entanto, como o ser humano tem maior capacidade de retenção<<strong>br</strong> />
visual, o que está impresso tem maior probabilidade de ser retido. Mas por ser múltiplo, o ideal<<strong>br</strong> />
é alimentar todos os sentidos, e conjugá-los.<<strong>br</strong> />
Primeiro viver, depois filosofar. Melhor, primeiro viver e filosofar, depois viver melhor.<<strong>br</strong> />
A vida do médico açambarca tudo ao mesmo tempo; conhecimentos, habilidades e atitudes. Nada deve ser deixado para depois. Deixe<<strong>br</strong> />
uma vida plural te levar, sem perder sua singularidade. Mas seja focado; a dispersão pode ser tentadora mas seus caminhos curtos.<<strong>br</strong> />
Simples colcha-de-retalhos. Se a coberta já esta cosida, dê-lhe unidade e conexão. Nada de seu exclua sem ponto feito.<<strong>br</strong> />
21
memória<<strong>br</strong> />
22<<strong>br</strong> />
A<<strong>br</strong> />
vida do compositor russo Alexandre<<strong>br</strong> />
Borodin, nascido em<<strong>br</strong> />
São Petersburgo, em 1833, foi<<strong>br</strong> />
surpreendente. Ocupou um lugar central<<strong>br</strong> />
na história musical do império tzarista.<<strong>br</strong> />
Na infância começou a demonstrar<<strong>br</strong> />
suas qualidades excepcionais. Filho<<strong>br</strong> />
natural de um príncipe ge<strong>org</strong>iano,<<strong>br</strong> />
recebeu excelente educação. Poliglota na<<strong>br</strong> />
juventude, além do russo, dominava o<<strong>br</strong> />
inglês, francês, alemão e italiano.<<strong>br</strong> />
Desde a infância manifestou dotes<<strong>br</strong> />
musicais. Logo aprendeu vários instrumentos<<strong>br</strong> />
e começou precocemente a<<strong>br</strong> />
compor polcas. Após terminar seus<<strong>br</strong> />
estudos universitários, Borodin conheceu,<<strong>br</strong> />
em 1861, em Heidelberg, uma <strong>br</strong>ilhante<<strong>br</strong> />
pianista russa, Ekaterina Protopopova,<<strong>br</strong> />
que ali se achava em tratamento<<strong>br</strong> />
de tuberculose. O gosto musical<<strong>br</strong> />
os uniu e os levou ao noivado, em Baden-<<strong>br</strong> />
Baden. No mesmo ano seguiram para<<strong>br</strong> />
Pisa, na Itália, em busca de um clima mais<<strong>br</strong> />
favorável para a saúde de Ekaterina. Os<<strong>br</strong> />
noivos voltaram para a Rússia e casaramse<<strong>br</strong> />
em 1863, em São Petersburgo.<<strong>br</strong> />
No ano anterior, 1862, Borodin havia<<strong>br</strong> />
conhecido o maestro Mily Balakirev, em<<strong>br</strong> />
torno de quem gravitavam jovens compositores,<<strong>br</strong> />
entre eles achavam-se Muss<strong>org</strong>ski,<<strong>br</strong> />
Rimsky-Korsakov e Cui. Os três,<<strong>br</strong> />
com Borodin e Balakirev, passaram a<<strong>br</strong> />
dominar o panorama russo da música e<<strong>br</strong> />
foram mais tarde conhecidos e aclamados<<strong>br</strong> />
como Os Cinco Russos, ou também O<<strong>br</strong> />
Punhado de Poderosos. O grupo dedicouse<<strong>br</strong> />
a criar uma música tipicamente russa,<<strong>br</strong> />
liberada de influências européias. Ao<<strong>br</strong> />
contrário de seus contemporâneos Tchaikowski<<strong>br</strong> />
e Korsakov, Borodin não utilizou<<strong>br</strong> />
melodias populares, mas ligou várias de<<strong>br</strong> />
suas o<strong>br</strong>as a lugares e temas russos.<<strong>br</strong> />
Sob influência de Balakirev criou<<strong>br</strong> />
duas sinfonias bem-recebidas. Mas foi em<<strong>br</strong> />
1869 que apareceu sua ópera Príncipe Igor,<<strong>br</strong> />
a mais conhecida de suas o<strong>br</strong>as. A ação<<strong>br</strong> />
passa-se no século XII, quando os polovitsianos,<<strong>br</strong> />
bárbaros e nômades invadiram<<strong>br</strong> />
o sul da Rússia. A ópera inclui as arrebatadoras<<strong>br</strong> />
Danças Polovetsianas de encantadora<<strong>br</strong> />
beleza. Modernamente a ópera foi popularizada<<strong>br</strong> />
na opereta Kismet pela melodia<<strong>br</strong> />
Stranger in Paradise. Entre outras de sua<<strong>br</strong> />
composições está o conhecido poema sinfônico<<strong>br</strong> />
Nas Estepes da Ásia Central e um quarteto<<strong>br</strong> />
de cordas, composto após a morte de<<strong>br</strong> />
Muss<strong>org</strong>ski, a qual aparentemente o inspirou.<<strong>br</strong> />
Sua terceira sinfonia ficou inacabada,<<strong>br</strong> />
como várias de suas o<strong>br</strong>as, incluindo a<<strong>br</strong> />
Príncipe Igor.<<strong>br</strong> />
Sua vida com Ekaterina foi muito feliz,<<strong>br</strong> />
desfrutada em um ambiente doméstico fervilhante<<strong>br</strong> />
pela desordenada presença de artistas<<strong>br</strong> />
e hóspedes inesperados, onde não havia disciplina<<strong>br</strong> />
alguma, nem mesmo para refeições.<<strong>br</strong> />
No início de 1877, embora fosse cardiopata<<strong>br</strong> />
e tivesse a saúde abalada por um<<strong>br</strong> />
surto de cólera, compareceu a um baile a<<strong>br</strong> />
fantasia. Trajava uma camisa vermelha, calça<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>anca e botas tipicamente russas. Participava<<strong>br</strong> />
animadamente da festa e quando<<strong>br</strong> />
ela chegou ao clímax, caiu fulminado por um<<strong>br</strong> />
ataque cardíaco.<<strong>br</strong> />
O extraordinário é que, ainda que seu<<strong>br</strong> />
gênio musical o coloque entre os maiores da<<strong>br</strong> />
Rússia, Alexandre Borodin dizia que a música<<strong>br</strong> />
era um passatempo e um relaxamento<<strong>br</strong> />
para outras ocupações sérias. Ele se referia à<<strong>br</strong> />
Medicina, especialmente à Bioquímica. Aos<<strong>br</strong> />
17 anos, em 1850, matriculou-se na Academia<<strong>br</strong> />
Médico-Cirúrgica de São Petersburgo.<<strong>br</strong> />
Após a graduação, serviu um ano como<<strong>br</strong> />
médico militar, seguido de três anos de<<strong>br</strong> />
estudos na Europa na céle<strong>br</strong>e Universidade<<strong>br</strong> />
de Heidelberg. Durante seu pós-doutorado<<strong>br</strong> />
trabalhou no laboratório de Erlenmeyer,<<strong>br</strong> />
estudando os derivados do benzeno e em<<strong>br</strong> />
Pisa, onde acompanhava sua noiva Ekaterina,<<strong>br</strong> />
quando estudou so<strong>br</strong>e halogenados<<strong>br</strong> />
<strong>org</strong>ânicos. Em 1862, de volta à Academia<<strong>br</strong> />
de São Petersburgo, assumiu o cargo de<<strong>br</strong> />
professor de química <strong>org</strong>ânica, que conservou<<strong>br</strong> />
até o fim da vida. Foi um professor<<strong>br</strong> />
apreciado pelos estudantes e teve papel<<strong>br</strong> />
saliente na criação de uma Faculdade de<<strong>br</strong> />
Medicina para mulheres, que deu início ao<<strong>br</strong> />
predomínio numérico delas na medicina<<strong>br</strong> />
russa, que até hoje persiste.<<strong>br</strong> />
Seus estudos no campo da bioquímica<<strong>br</strong> />
tiveram destaque no mundo acadêmico e<<strong>br</strong> />
compreenderam pesquisas so<strong>br</strong>e a condensação<<strong>br</strong> />
de aldeídos, campo em que concorreu<<strong>br</strong> />
com Kekulé. Os russos o creditam com<<strong>br</strong> />
a descoberta da reação do aldol, juntamente<<strong>br</strong> />
com Wurz. Seus últimos estudos foram<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e as reações das amidas, em 1875.<<strong>br</strong> />
Em um congresso da Sociedade Química<<strong>br</strong> />
Russa, em 1871, Borodin apresentou os<<strong>br</strong> />
resultados de pesquisa de seu discípulo<<strong>br</strong> />
Krylov, conduzidas sob sua direção,<<strong>br</strong> />
investigando o conteúdo de gordura do<<strong>br</strong> />
miocárdio afetado pela degeneração<<strong>br</strong> />
gordurosa. Juntamente com a gordura<<strong>br</strong> />
encontraram uma substância parecida<<strong>br</strong> />
com a lecitina. Esperavam que a hidrólise<<strong>br</strong> />
desta substância resultasse em glicerol,<<strong>br</strong> />
mas o produto era colesterol. Na ocasião,<<strong>br</strong> />
o achado de colesterol esterificado entre<<strong>br</strong> />
os lipídios cardíacos não foi considerado<<strong>br</strong> />
de importância. Somente mais tarde<<strong>br</strong> />
verificou-se que os depósitos ateromatosos<<strong>br</strong> />
arteriais têm composição semelhante. O<<strong>br</strong> />
colesterol em estado sólido foi descrito em<<strong>br</strong> />
1784 em cálculos biliares, mas apenas no<<strong>br</strong> />
início do século XX seu papel na gênese<<strong>br</strong> />
da aterosclerose começou a ser conhecido.<<strong>br</strong> />
O trabalho de Krylov e Borodin é tido<<strong>br</strong> />
como o primeiro a estabelecer a relação<<strong>br</strong> />
do colesterol com cardiopatia. Essa<<strong>br</strong> />
contribuição pioneira permanece pouco<<strong>br</strong> />
conhecida. A repercussão da criação<<strong>br</strong> />
musical de Borodin sem dúvida a ofusca...<<strong>br</strong> />
A ligação de Borodin com a patologia<<strong>br</strong> />
cardiovascular foi completada, de maneira<<strong>br</strong> />
irônica, pela constatação necroscópica de<<strong>br</strong> />
sua causa mortis: ruptura de aneurisma de<<strong>br</strong> />
uma artéria coronária.<<strong>br</strong> />
Dr. Iseu Affonso da Costa (PR).
Afinidades<<strong>br</strong> />
Deve ser algo biológico. Os analistas que me<<strong>br</strong> />
perdoem, mas tenho uma queda por barítonos.<<strong>br</strong> />
Me perdoem também os leitores, dada sua pouca<<strong>br</strong> />
idade média, mas muitos não devem conhecer<<strong>br</strong> />
Arthur Prysock. É do mesmo veio do Billy<<strong>br</strong> />
Eckstine. Como diz o Ivan Lessa, são negros com<<strong>br</strong> />
uma voz de couro bem curtido e que, à medida<<strong>br</strong> />
que envelhecem, adquirem uma textura mais<<strong>br</strong> />
profunda, marrom-escuro. O Prysock quase<<strong>br</strong> />
sempre cantou canções de amor e dor, binômio<<strong>br</strong> />
onipresente, tanto na boa quanto na má música.<<strong>br</strong> />
Nessa linha, algumas são até bem <strong>br</strong>egas, como<<strong>br</strong> />
You Are So Beautiful, mas, humano que sou,<<strong>br</strong> />
adoro. Naturalmente não é só a voz. É a competência.<<strong>br</strong> />
O Arthur era da estirpe de cantores que,<<strong>br</strong> />
por mais banal que fosse a letra, conseguia viajar<<strong>br</strong> />
de modo próprio pela melodia. Sabia fazer a coisa<<strong>br</strong> />
de maneira correta e, às vezes, surpreendente.<<strong>br</strong> />
De um standard em levada jazzística a um<<strong>br</strong> />
popezinho bacharachiano. Isso, do Burt Bacharach<<strong>br</strong> />
mesmo. Basta ouvir os álbuns de 1987 e 88,<<strong>br</strong> />
This Guy’s In Love With You e Today’s Love Songs,<<strong>br</strong> />
Tomorrow’s Blues. Alguns são melôs com a<<strong>br</strong> />
dignidade agridoce da realidade. São cantores<<strong>br</strong> />
que dizem uma coisa com a letra e conseguimos<<strong>br</strong> />
subentender outra, oculta e malandra. Ou sofrida<<strong>br</strong> />
mesmo. Dou exemplo: “Jelly, jelly stays on<<strong>br</strong> />
mind...” adivinhou? É aquela fixação mesmo!<<strong>br</strong> />
Conforme a entonação pode ser outras coisas...<<strong>br</strong> />
Ou, “I’ve got you under my skin...”, que pode ser<<strong>br</strong> />
coisa de pele mesmo, ou, mais difícil de<<strong>br</strong> />
desvendar, um pico.<<strong>br</strong> />
Estilistas desse naipe, quando comparamos<<strong>br</strong> />
suas gravações com as de outros menos votados,<<strong>br</strong> />
nos dão subentendidos que vão muito além da<<strong>br</strong> />
letra e da melodia, criam mundos próprios, e nos<<strong>br</strong> />
provocam sonoridades que evocam nosso<<strong>br</strong> />
passado de dores e amores, adensados pela<<strong>br</strong> />
reflexão e experiência, ou simplesmente liberam<<strong>br</strong> />
pulsões de nossa subjetividade. Agora, os<<strong>br</strong> />
analistas gostaram!<<strong>br</strong> />
Sinal das letras<<strong>br</strong> />
Vai Popozuda<<strong>br</strong> />
Equipe Furacão 2000<<strong>br</strong> />
vai vai vai vai<<strong>br</strong> />
vai popozudaa<<strong>br</strong> />
empina a sua bunda<<strong>br</strong> />
ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />
vai popozuda (caramba)<<strong>br</strong> />
empina a sua bunda<<strong>br</strong> />
ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />
vai vai vai vai vai vai...<<strong>br</strong> />
só tem popozão<<strong>br</strong> />
(eu vou te belisca heim)<<strong>br</strong> />
só tem popozaum (caramba)<<strong>br</strong> />
vai popozudaa<<strong>br</strong> />
empina a sua bunda<<strong>br</strong> />
ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />
vai popozudaa<<strong>br</strong> />
empina a sua bunda<<strong>br</strong> />
ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />
Olhos Nos Olhos<<strong>br</strong> />
Chico Buarque<<strong>br</strong> />
Quando você me deixou, meu bem<<strong>br</strong> />
Me disse pra ser feliz e passar bem<<strong>br</strong> />
Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci<<strong>br</strong> />
Mas depois, como era de costume, obedeci<<strong>br</strong> />
Quando você me quiser rever<<strong>br</strong> />
Já vai me encontrar refeita, pode crer<<strong>br</strong> />
Olhos nos olhos<<strong>br</strong> />
Quero ver o que você faz<<strong>br</strong> />
Ao sentir que sem você eu passo bem demais<<strong>br</strong> />
E que venho até remoçando<<strong>br</strong> />
Me pego cantando, sem mais, nem por quê<<strong>br</strong> />
Tantas águas rolaram<<strong>br</strong> />
Quantos homens me amaram<<strong>br</strong> />
Bem mais e melhor que você<<strong>br</strong> />
Quando talvez precisar de mim<<strong>br</strong> />
Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim<<strong>br</strong> />
Olhos nos olhos<<strong>br</strong> />
Quero ver o que você diz<<strong>br</strong> />
Quero ver como suporta me ver tão feliz<<strong>br</strong> />
música<<strong>br</strong> />
Pasmem, mas infelizmente é a primeira que figurou nas listas de sucesso da grande<<strong>br</strong> />
maioria das rádios voltadas ao público jovem. Após décadas de luta pela valorização<<strong>br</strong> />
da figura feminina - como “coisa mais linda mais cheia de graça”, mas também<<strong>br</strong> />
como forças do intelecto, da cultura - o que se observa nos refrões mais cantados<<strong>br</strong> />
por um número assom<strong>br</strong>oso de <strong>br</strong>asileiros (e pior, crescente), é um verdadeiro<<strong>br</strong> />
retrocesso, prestigiando exclusivamente a feição carnal e o erotismo vulgar. Desespero!<<strong>br</strong> />
Com tantas barbáries profanadas a cada neologismo chulo, novo refrão hostil,<<strong>br</strong> />
aquela submissão já tão cantada nas peles de “Emílias” e “Amélias” soa como elogio.<<strong>br</strong> />
Então pergunto - sem saudosismo posso lhes garantir - onde se perderam as<<strong>br</strong> />
poesias românticas que se fundiam às melodias harmoniosas de beleza imensuráveis,<<strong>br</strong> />
tão cantadas por Jobim, Vinícius, Chico e tantos outros? Com eles, palavras acariciavam,<<strong>br</strong> />
versos afagavam, sonetos aclamavam, e o amor cantado era formoso, com<<strong>br</strong> />
um romantismo intenso mas ao mesmo tempo sem pieguice. Ainda nas vozes e<<strong>br</strong> />
letras destes, floresceu na música demonstrações de poder feminino, mulheres que<<strong>br</strong> />
após rejeitadas lutavam e se reerguiam, às vezes só para reclamarem prazer num<<strong>br</strong> />
próximo contato “olhos nos olhos”. Surgiram também “Terezinhas”, “Carolinas” e<<strong>br</strong> />
muitas outras que sempre galgavam algo mais: aquelas pensavam, lutavam e amavam (e<<strong>br</strong> />
como amavam!); as “Raimundas” de hoje rebolam, reque<strong>br</strong>am e...de novo, rebolam.<<strong>br</strong> />
Seria isso uma desvalorização da mulher? Uma forma de, sorrateiramente,<<strong>br</strong> />
banalizar o papel da mesma na sociedade? A resposta é fácil: longe disso! O problema<<strong>br</strong> />
real parece ser a superficialidade com que tudo é encarado nos dias de hoje, principalmente<<strong>br</strong> />
entre os jovens. A música parece ser apenas o retrato fiel desta situação...<<strong>br</strong> />
a sonoridade das palavras é supervalorizada ao passo que a mensagem, o cerne, a<<strong>br</strong> />
forma e a estrutura das canções são relegadas. Ao ligar o rádio e sintonizar em uma<<strong>br</strong> />
estação “pop” ou “teen”, prepare-se para ouvir diversas músicas, diferentes ritmos e<<strong>br</strong> />
sons, mas não espere encontrar aquela digna de ser escutada. Infelizmente este tipo<<strong>br</strong> />
de “empo<strong>br</strong>ecimento cultural” vem se propagando como uma tene<strong>br</strong>osa pandemia,<<strong>br</strong> />
estendendo-se para os mais diversos campos (artes, cinema, etc.), com sinais e<<strong>br</strong> />
sintomas óbvios e estarrecedores. O diagnóstico é inequívoco e explícito, já a cura<<strong>br</strong> />
está ao alcance de poucos (mas perdura!).<<strong>br</strong> />
Dr. Guilherme A. Gadens (PR), jovem.<<strong>br</strong> />
23
multifário<<strong>br</strong> />
24<<strong>br</strong> />
N<<strong>br</strong> />
ão há qualquer consenso.<<strong>br</strong> />
O contraditório<<strong>br</strong> />
surge de pronto na<<strong>br</strong> />
medicina e no jornalismo. Enquanto<<strong>br</strong> />
a primeira tem a missão<<strong>br</strong> />
do sigilo, o jornalismo<<strong>br</strong> />
ensina estratégias para a informação<<strong>br</strong> />
e a divulgação de fatos relevantes de<<strong>br</strong> />
interesse público. Médicos e jornalistas,<<strong>br</strong> />
desde a graduação e na atividade<<strong>br</strong> />
profissional, atuam com esses<<strong>br</strong> />
princípios.<<strong>br</strong> />
Em se tratando de homem público<<strong>br</strong> />
um outro componente acresce nesta<<strong>br</strong> />
relação. Enquanto o médico tenta ser<<strong>br</strong> />
ainda mais cuidadoso com as informações<<strong>br</strong> />
que toma conhecimento no<<strong>br</strong> />
exercício de seu mister, o jornalista<<strong>br</strong> />
atua em sentido contrário, e coloca<<strong>br</strong> />
todo seu talento para tornar o fato<<strong>br</strong> />
público e levar à comunidade informações<<strong>br</strong> />
de seu interesse. O contraditório<<strong>br</strong> />
não está restrito à medicina e<<strong>br</strong> />
ao jornalismo. Muitos consideram<<strong>br</strong> />
que o homem público goza de todos<<strong>br</strong> />
os direitos do cidadão comum, enquanto<<strong>br</strong> />
outros defendem que a sociedade<<strong>br</strong> />
tem o direito de saber o estado<<strong>br</strong> />
de saúde de seu representante. O<<strong>br</strong> />
direito à privacidade deverá ser<<strong>br</strong> />
diferente? Considerando o aspecto<<strong>br</strong> />
jurídico, não, pois todos são iguais<<strong>br</strong> />
perante a lei. Mesmo perante essa<<strong>br</strong> />
igualdade, o homem público está<<strong>br</strong> />
sujeito à publicidade das suas atividades<<strong>br</strong> />
de gestor e às decisões pertinentes<<strong>br</strong> />
ao cargo. As outras, de caráter<<strong>br</strong> />
estritamente pessoal, têm a possibilidade<<strong>br</strong> />
do conhecimento público. Exceto<<strong>br</strong> />
nos regimes autoritários, como<<strong>br</strong> />
foi na ditadura <strong>br</strong>asileira com o presidente<<strong>br</strong> />
Costa e Silva e a cubana com<<strong>br</strong> />
Fidel Castro, quando nenhuma informação<<strong>br</strong> />
foi repassada, pois consideraram<<strong>br</strong> />
não apenas sigilo profissional,<<strong>br</strong> />
mas segredo de Estado. Nos estados<<strong>br</strong> />
democráticos a sociedade tem o<<strong>br</strong> />
direito de ser informada se o governante<<strong>br</strong> />
está em plenas condições para<<strong>br</strong> />
o exercício de sua função, pois uma<<strong>br</strong> />
decisão equivocada poderá com-<<strong>br</strong> />
prometer a vida e os destinos da sociedade.<<strong>br</strong> />
Nessas situações o interesse<<strong>br</strong> />
público deve prevalecer so<strong>br</strong>e o privado.<<strong>br</strong> />
Outro dilema é quando a doença é<<strong>br</strong> />
limitante para as atividades da autoridade<<strong>br</strong> />
pública. Exemplo recente foi a doença<<strong>br</strong> />
progressiva do Papa João Paulo II. A<<strong>br</strong> />
Igreja considerou o afastamento e isso foi<<strong>br</strong> />
motivo de discussão pública, no sentido<<strong>br</strong> />
de como lidar frente a situações semelhantes.<<strong>br</strong> />
O parecer do médico nessas<<strong>br</strong> />
situações assume importância pois define<<strong>br</strong> />
os destinos do dirigente de instituições<<strong>br</strong> />
ou mesmo de um país. Além do aspecto<<strong>br</strong> />
jurídico, a condução ética deve prevalecer.<<strong>br</strong> />
Desvios no comportamento ético<<strong>br</strong> />
surgem quando o médico avança nas<<strong>br</strong> />
informações e que<strong>br</strong>a a privacidade do<<strong>br</strong> />
paciente, ou distorce o diagnóstico. O<<strong>br</strong> />
caso Tancredo Neves exemplifica a clara<<strong>br</strong> />
omissão dos fatos a mando de terceiros<<strong>br</strong> />
e de outros interessados. O jornalista<<strong>br</strong> />
rompe com os princípios quando a publicação<<strong>br</strong> />
extrapola a notícia e fica claro interesses<<strong>br</strong> />
comerciais ou mesmo de sensacionalismo.<<strong>br</strong> />
A referência de grande erro<<strong>br</strong> />
jornalístico, foi da Escola de Base de São<<strong>br</strong> />
Paulo, verdadeiro linchamento moral e<<strong>br</strong> />
a promoção de danos irreparáveis aos<<strong>br</strong> />
seus diretores. O médico deve revelar o<<strong>br</strong> />
diagnóstico para a imprensa, apenas com<<strong>br</strong> />
o consentimento do paciente. Deve prevalecer<<strong>br</strong> />
a autonomia do paciente ou do seu<<strong>br</strong> />
representante legal no seu impedimento.<<strong>br</strong> />
No caso do governador Mário Covas,<<strong>br</strong> />
ao tomar conhecimento de que era<<strong>br</strong> />
portador de câncer na bexiga, decidiu<<strong>br</strong> />
pessoalmente divulgá-la. Foi uma decisão<<strong>br</strong> />
ousada e corajosa ao considerar que a<<strong>br</strong> />
sociedade deveria ser informada de sua<<strong>br</strong> />
patologia, tendo em vista o cargo que<<strong>br</strong> />
ocupava e as conseqüências da sua<<strong>br</strong> />
evolução. Tinha pleno conhecimento do<<strong>br</strong> />
desfecho final e agiu com altivez .<<strong>br</strong> />
Esta decisão trouxe benefícios impor-<<strong>br</strong> />
tantes e transparentes. Inaugurou<<strong>br</strong> />
um novo modelo, até<<strong>br</strong> />
então não seguido pelos políticos<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>asileiros. A intenção<<strong>br</strong> />
foi pedagógica, pois a imprensa<<strong>br</strong> />
passou a divulgar as<<strong>br</strong> />
causas prevalentes da doença, os riscos<<strong>br</strong> />
do tabaco e repassou à população a<<strong>br</strong> />
importância do diagnóstico precoce e<<strong>br</strong> />
a prevenção das neoplasias. Possibilitou<<strong>br</strong> />
à comunidade a redução de morbidades<<strong>br</strong> />
e mortalidade. Popularizou uma linguagem<<strong>br</strong> />
científica, os procedimentos e<<strong>br</strong> />
exames. Não é ético apresentar detalhes<<strong>br</strong> />
da doença, muito menos relatar<<strong>br</strong> />
descontroles fisiológicos, promovendo<<strong>br</strong> />
constrangimentos pessoais e aos familiares,<<strong>br</strong> />
pior ainda com o registro de<<strong>br</strong> />
fotos, caracterizando interesses outros<<strong>br</strong> />
e não apenas jornalísticos.<<strong>br</strong> />
Muitas vezes o jornalista na busca<<strong>br</strong> />
do denominada notícia importante, um<<strong>br</strong> />
furo jornalístico, desconsidera a autonomia<<strong>br</strong> />
do paciente, desautoriza a sua<<strong>br</strong> />
vontade ou distorce as informações do<<strong>br</strong> />
médico, ou pior, é capaz de seduzi-lo e<<strong>br</strong> />
obter diagnóstico preferencialmente<<strong>br</strong> />
em detrimento dos demais órgãos da<<strong>br</strong> />
imprensa. O médico deve sempre elaborar<<strong>br</strong> />
boletins claros e concisos para<<strong>br</strong> />
evitar interpretações equivocadas. Não<<strong>br</strong> />
deve agir como um ator, sempre em<<strong>br</strong> />
busca dos holofotes excedendo no seu<<strong>br</strong> />
dever de preservar o sigilo e a discrição.<<strong>br</strong> />
Não é possível transformar em um show<<strong>br</strong> />
as informações. Quais então os limites<<strong>br</strong> />
éticos? A orientação é que ao divulgar<<strong>br</strong> />
noticias so<strong>br</strong>e doenças de homens<<strong>br</strong> />
públicos ou de qualquer cidadão, tanto<<strong>br</strong> />
o médico como o profissional de imprensa<<strong>br</strong> />
respeitem os critérios éticos de<<strong>br</strong> />
suas respectivas atividades. Ao agir<<strong>br</strong> />
com princípios éticos, não restará<<strong>br</strong> />
nenhuma preocupação aos profissionais<<strong>br</strong> />
com referência a limites ou restrições.<<strong>br</strong> />
A atuação deverá ser norteada pelo<<strong>br</strong> />
respeito, bom senso e a dignidade da<<strong>br</strong> />
pessoa humana, quer seja pública ou<<strong>br</strong> />
um ilustre desconhecido. Ética não é<<strong>br</strong> />
quantificada.<<strong>br</strong> />
Luiz Sallim Emed (PR).
semelhança das outras especiali-<<strong>br</strong> />
À<<strong>br</strong> />
dades médicas, exames complementares<<strong>br</strong> />
como o próprio nome<<strong>br</strong> />
refere, deveriam, quando indicados,<<strong>br</strong> />
complementar nossos diagnósticos clínicos.<<strong>br</strong> />
Ou seja, nos auxiliar na definição<<strong>br</strong> />
diagnóstica e até mesmo, em algumas<<strong>br</strong> />
situações, sugerir prognósticos e acompanhamento.<<strong>br</strong> />
Entretanto, nem sempre são<<strong>br</strong> />
utilizados de forma coerente e racional.<<strong>br</strong> />
Inúmeras vezes uma entrevista e exame<<strong>br</strong> />
clínicos superficiais, com tempo inadequado,<<strong>br</strong> />
são completados com solicitação<<strong>br</strong> />
“desenfreada” de exames complementares.<<strong>br</strong> />
Fecha-se um círculo vicioso, onde o médico,<<strong>br</strong> />
pelo fato de ser mal remunerado,<<strong>br</strong> />
tende a dispor de pouco tempo para a<<strong>br</strong> />
entrevista e exame clínico do paciente.<<strong>br</strong> />
Devido a este fato, solicita dispendiosa lista<<strong>br</strong> />
de exames complementares que conseqüentemente<<strong>br</strong> />
levam a parcos honorários<<strong>br</strong> />
pagos pela consulta, so<strong>br</strong>etudo no sistema<<strong>br</strong> />
de atendimento por meio dos convênios<<strong>br</strong> />
médicos. Além disto, inúmeros pacientes<<strong>br</strong> />
nos vêm à consulta solicitando que pratiquemos<<strong>br</strong> />
uma lista enorme de exames<<strong>br</strong> />
complementares para um “check up”, ou<<strong>br</strong> />
por que recém entrou no convênio ou por<<strong>br</strong> />
que está para sair e quer “aproveitar” a<<strong>br</strong> />
ocasião. Às vezes, fica difícil convencer o<<strong>br</strong> />
paciente da não necessidade desses e em<<strong>br</strong> />
algumas situações somos, até mesmo,<<strong>br</strong> />
“forçados” a solicitá-los. Ainda outras<<strong>br</strong> />
vezes nos solicitam exames pedidos pelo<<strong>br</strong> />
seu médico particular que não tem o seu<<strong>br</strong> />
convênio. E assim por diante...<<strong>br</strong> />
Na prática ginecológica alguns exames<<strong>br</strong> />
poderiam ser comentados dentro<<strong>br</strong> />
dessa ótica, e escolhemos duas situações<<strong>br</strong> />
para esta finalidade.<<strong>br</strong> />
CLIMATÉRIO<<strong>br</strong> />
Freqüentemente em pacientes que<<strong>br</strong> />
estejam no Climatério (erroneamente<<strong>br</strong> />
chamado de menopausa, que na realidade<<strong>br</strong> />
é a data da última menstruação) apresentam<<strong>br</strong> />
lista enorme de exames plenamente<<strong>br</strong> />
dispensáveis. Na dúvida deste<<strong>br</strong> />
estado hormonal, em paciente que<<strong>br</strong> />
apresente sintomas sugestivos de fogachos<<strong>br</strong> />
e que não esteja em idade compatível com a<<strong>br</strong> />
menopausa (em torno de 49 anos em nosso<<strong>br</strong> />
meio), basta solicitar dosagem plasmática do<<strong>br</strong> />
Hormônio Folículo Estimulante (FSH) que<<strong>br</strong> />
quando acima de 40, sugere esta situação<<strong>br</strong> />
(climatério). Assim sendo, dosagens dos<<strong>br</strong> />
demais hormônios tais como: estradiol,<<strong>br</strong> />
progesterona, LH, entre outros, não se<<strong>br</strong> />
justificam para este diagnóstico. De forma<<strong>br</strong> />
semelhante depois de instalada a terapêutica<<strong>br</strong> />
hormonal (TH), obviamente que quando<<strong>br</strong> />
indicada, o acompanhamento é basicamente<<strong>br</strong> />
clínico e não através de dosagens hormonais.<<strong>br</strong> />
Outrossim, é fundamental que se solicite<<strong>br</strong> />
exame de mamografia previamente e no<<strong>br</strong> />
acompanhamento da TH, como rastreamento<<strong>br</strong> />
do câncer de mama. A avaliação da densidade<<strong>br</strong> />
mineral óssea por Densitometria<<strong>br</strong> />
Óssea, é exame que poderá ser solicitado<<strong>br</strong> />
nesta fase da vida da mulher, so<strong>br</strong>etudo<<strong>br</strong> />
naquelas que apresentem história familiar de<<strong>br</strong> />
osteoporose ou outros fatores de risco.<<strong>br</strong> />
Entretanto, caso o exame esteja normal, o<<strong>br</strong> />
prazo para nova solicitação deveria ser<<strong>br</strong> />
superior a 2 anos, justificando a solicitação<<strong>br</strong> />
anual apenas nos casos alterados para<<strong>br</strong> />
acompanhamento. Nos casos de osteopenia<<strong>br</strong> />
não são o<strong>br</strong>igatoriamente indicativos de que<<strong>br</strong> />
evoluirão para osteoporose (e que necessitam<<strong>br</strong> />
tratamento), pois podem permanecer como<<strong>br</strong> />
tal indicando apenas que a densidade mineral<<strong>br</strong> />
óssea neste caso estava abaixo dos padrões<<strong>br</strong> />
comparativos. Ainda no Climatério, a solicitação<<strong>br</strong> />
de Ecografia Pélvica Endovaginal para<<strong>br</strong> />
avaliação da espessura endometrial é exame<<strong>br</strong> />
plenamente justificável.<<strong>br</strong> />
PREVENÇÃO DO CÂNCER<<strong>br</strong> />
DO COLO UTERINO<<strong>br</strong> />
O rastreamento do Câncer do Colo Uterino<<strong>br</strong> />
em nosso meio é realizado classicamente<<strong>br</strong> />
pelo exame de Papanicolaou (colpocitologia<<strong>br</strong> />
oncótica) anualmente. Em que pese a chance<<strong>br</strong> />
de falsos negativos (relativa baixa sensibilidade,<<strong>br</strong> />
citada na literatura em torno de 15<<strong>br</strong> />
a 30%), ainda é exame que, pelo custo e<<strong>br</strong> />
praticidade, se justifica. No entanto, devemos<<strong>br</strong> />
respeitar os casos onde limitações<<strong>br</strong> />
questionam o diagnóstico citopatológico,<<strong>br</strong> />
como na inflamação acentuada, e reavaliar<<strong>br</strong> />
ginecologia<<strong>br</strong> />
após o tratamento (sendo que nesta<<strong>br</strong> />
situação a endocervicite poderia estar<<strong>br</strong> />
implicada). Sua apresentação na forma de<<strong>br</strong> />
coleta em meio líquido (ou de esfregaço<<strong>br</strong> />
de fina camada) aumenta significantemente<<strong>br</strong> />
a sensibilidade, entretanto, ainda<<strong>br</strong> />
não está inserido na rotina da maioria.<<strong>br</strong> />
Outra situação, bastante comentada na<<strong>br</strong> />
literatura, e ao que parece será o método<<strong>br</strong> />
do futuro deste rastreamento, é evidenciado<<strong>br</strong> />
por exame de biologia molecular<<strong>br</strong> />
chamado teste de HPV ou HPV-DNA, ou<<strong>br</strong> />
ainda Captura Hí<strong>br</strong>ida. Neste exame se<<strong>br</strong> />
evidencia a presença do HPV que, pela sua<<strong>br</strong> />
implicação na oncogênese do colo uterino,<<strong>br</strong> />
justifica sua detecção. Infelizmente vemos<<strong>br</strong> />
freqüente iatrogênese na interpretação<<strong>br</strong> />
deste teste: o fato de ser positivo para HPV<<strong>br</strong> />
de alto risco oncogênico (o nome já<<strong>br</strong> />
assusta!) e ainda com alta carga do vírus,<<strong>br</strong> />
em um único exame, não tem a significância<<strong>br</strong> />
fatídica como alguns interpretam.<<strong>br</strong> />
Na imensa maioria das vezes, o HPV é<<strong>br</strong> />
vírus transitório e sua presença, ainda que<<strong>br</strong> />
em alta carga, não significa que irá permanecer<<strong>br</strong> />
no <strong>org</strong>anismo. Devemos salientar<<strong>br</strong> />
que em cerca de 60 a 70% este vírus é<<strong>br</strong> />
passageiro e esta transitoriedade pode<<strong>br</strong> />
ocorrer em até um ano e meio da infecção<<strong>br</strong> />
inicial. Ainda, o teste resulta positivo em<<strong>br</strong> />
cerca de 38% (em amostragem de mulheres<<strong>br</strong> />
entre 15 e 25 anos em nosso meio),<<strong>br</strong> />
sendo os vírus de risco oncogênico os mais<<strong>br</strong> />
prevalentes e, portanto, com grande<<strong>br</strong> />
chance de obtermos este resultado.<<strong>br</strong> />
Lem<strong>br</strong>amos que o exame de colposcopia,<<strong>br</strong> />
ou seja, observação do colo uterino por<<strong>br</strong> />
sistema ótico que amplia as imagens,<<strong>br</strong> />
apresenta papel definido e de grande<<strong>br</strong> />
importância, so<strong>br</strong>etudo como indicador<<strong>br</strong> />
das áreas alteradas para posicionar o local<<strong>br</strong> />
de biópsia e remoção da amostra histológica<<strong>br</strong> />
quando indicado. Assim, por meio<<strong>br</strong> />
da adequada solicitação e interpretação<<strong>br</strong> />
dos exames complementares teremos<<strong>br</strong> />
ferramenta valiosa para nossa prática<<strong>br</strong> />
clínica, não esquecendo do binômio custo<<strong>br</strong> />
versus beneficio em prol da melhor<<strong>br</strong> />
condução do caso.<<strong>br</strong> />
Dr. Newton Sergio de Carvalho (PR)<<strong>br</strong> />
25
ciência e arte<<strong>br</strong> />
Oconhecimento, o estudo e a análise da<<strong>br</strong> />
história e da evolução da medicina<<strong>br</strong> />
trazem ensinamentos básicos para o<<strong>br</strong> />
bom exercício, principalmente no aspecto ético<<strong>br</strong> />
e humanista. Humanismo hoje tão esquecido<<strong>br</strong> />
com o advento e predomínio do tecnicismo.<<strong>br</strong> />
A sociedade ao precisar da medicina e do<<strong>br</strong> />
médico faz uma exaltação, um culto de<<strong>br</strong> />
respeito à profissão seguramente mais antiga<<strong>br</strong> />
na história da humanidade e mais importante<<strong>br</strong> />
dentre todas pois trata da o<strong>br</strong>a maior do<<strong>br</strong> />
Criador, que é o ser humano.<<strong>br</strong> />
Ao falar so<strong>br</strong>e médico e medicina que<<strong>br</strong> />
deve ser entendida como forma de afeição e<<strong>br</strong> />
amor à vida, quero fazer uma exegese entre os<<strong>br</strong> />
versos de São Francisco de Assis e a atividade<<strong>br</strong> />
médica. Diz São Francisco:<<strong>br</strong> />
— O homem que executa seu trabalho<<strong>br</strong> />
com as mãos é um trabalhador.<<strong>br</strong> />
— O homem que trabalha com as mãos e<<strong>br</strong> />
o cére<strong>br</strong>o é um artesão.<<strong>br</strong> />
— O homem que trabalha com as mãos,<<strong>br</strong> />
o cére<strong>br</strong>o e o coração é um artista.<<strong>br</strong> />
Aí está a arte de ser médico, a mão no<<strong>br</strong> />
exame clínico e no ato cirúrgico, o cére<strong>br</strong>o no<<strong>br</strong> />
estudo e conhecimento constante da matéria<<strong>br</strong> />
médica e o coração no atendimento e<<strong>br</strong> />
compreensão do sofrimento do semelhante.<<strong>br</strong> />
A arte da medicina não é como afirmava<<strong>br</strong> />
Voltaire: a arte da medicina consiste em<<strong>br</strong> />
distrair o paciente enquanto a natureza cuida<<strong>br</strong> />
da doença. A alma do médico é o altar, onde<<strong>br</strong> />
vai ajoelhar-se e rezar a dor dos que sofrem e<<strong>br</strong> />
procuram solução para seus problemas físicos<<strong>br</strong> />
e mentais. Logo, a combinação verdade e amor<<strong>br</strong> />
é intrínseca ao ato médico, sendo inadmissível<<strong>br</strong> />
uma medicina baseada na falta de amor ao<<strong>br</strong> />
próximo.<<strong>br</strong> />
O doente ao procurar o médico não quer<<strong>br</strong> />
apenas a cura, quer também compreensão e<<strong>br</strong> />
amparo pois sem ajuda ou conselho, sem<<strong>br</strong> />
orientação formal, medicina só de aparelho é<<strong>br</strong> />
coisa despropositada. Miguel Couto afirmava:<<strong>br</strong> />
o homem humaniza a ciência ou a ciência<<strong>br</strong> />
desumaniza o homem. Também dizia: a<<strong>br</strong> />
medicina quando não cura, deve consolar.<<strong>br</strong> />
Sempre é oportuno lem<strong>br</strong>ar Galeno de<<strong>br</strong> />
Pergamo (200 d.C.), quando definiu terapêutica<<strong>br</strong> />
como sendo: o que fazer, como fazer,<<strong>br</strong> />
em cada caso. Daí deduzimos um preceito<<strong>br</strong> />
fundamental, que a terapêutica é um processo<<strong>br</strong> />
específico para cada doente. Antecipou-se a<<strong>br</strong> />
William Osler, que afirmava que mais impor-<<strong>br</strong> />
26<<strong>br</strong> />
tante do que saber que doença tem o doente, é<<strong>br</strong> />
que doente tem uma doença.<<strong>br</strong> />
A Medicina deve ser entendida como forma<<strong>br</strong> />
de afeição e aplicação à vida. Tratamos doentes<<strong>br</strong> />
e não doenças, ensinamento que deve ser sempre<<strong>br</strong> />
lem<strong>br</strong>ado e que vem de nossos antepassados.<<strong>br</strong> />
Já Hipócrates enfatizava a “observação”: as<<strong>br</strong> />
técnicas podem mudar, podem morrer, mas a<<strong>br</strong> />
observação permanece para sempre.<<strong>br</strong> />
A medicina está trocando o atendimento<<strong>br</strong> />
pessoal, a elegância do pensamento, a conclusão<<strong>br</strong> />
de raciocínio pelo atendimento técnico e<<strong>br</strong> />
impessoal.<<strong>br</strong> />
O domínio técnico é do médico, mas a<<strong>br</strong> />
mescla da ciência e arte é que distingue o bom<<strong>br</strong> />
profissional daquele que é simplesmente um<<strong>br</strong> />
técnico competente.<<strong>br</strong> />
A Medicina de hoje evoluiu e cabe ao médico<<strong>br</strong> />
corrigir impressões distorcidas chegando a um<<strong>br</strong> />
diagnóstico que pode levar tristeza e decepção,<<strong>br</strong> />
mas que formulado em termos comuns favorece<<strong>br</strong> />
a empatia e o tratamento.<<strong>br</strong> />
Não assistimos mais hoje às centenas de<<strong>br</strong> />
apendicectomias como antigamente, e Simão<<strong>br</strong> />
Kossobudzki citava em artigo publicado na<<strong>br</strong> />
Revista da Associação Médica de 1932, que em<<strong>br</strong> />
cerca de 25% dos apêndices retirados não havia<<strong>br</strong> />
lesões macroscópicas, o que faz lem<strong>br</strong>ar a<<strong>br</strong> />
possibilidade de que certo número de cirurgias<<strong>br</strong> />
não eram necessárias.<<strong>br</strong> />
Ressalte-se, no entanto, que era o único<<strong>br</strong> />
procedimento correto na época, pois os métodos<<strong>br</strong> />
diagnósticos e a terapêutica possível eram po<strong>br</strong>es.<<strong>br</strong> />
Da mesma forma as amigdalectomias foram<<strong>br</strong> />
sendo suprimidas, já que, com advento da era<<strong>br</strong> />
antibiótica, o tratamento clínico solucionou o<<strong>br</strong> />
problema na grande maioria dos casos.<<strong>br</strong> />
Cabe lem<strong>br</strong>ar da época que encontrávamos<<strong>br</strong> />
no quadro de cirurgias a serem realizadas, as<<strong>br</strong> />
“laparatomias exploradoras”, que caracterizavam<<strong>br</strong> />
a insegurança diagnóstica.<<strong>br</strong> />
Com o avanço dos meios diagnósticos, a<<strong>br</strong> />
entubação gástrica com determinação da acidez<<strong>br</strong> />
gástrica antes e após injeção subcutânea de<<strong>br</strong> />
histamina, foi superada no diagnóstico diferencial<<strong>br</strong> />
entre úlcera e câncer gástrico, pois neste não<<strong>br</strong> />
havia resposta da acidez após a injeção de<<strong>br</strong> />
histamina.<<strong>br</strong> />
Não se tinha ainda conhecimento da<<strong>br</strong> />
existência dos receptores gástricos H2, responsáveis<<strong>br</strong> />
pela regulação da secreção de ácido<<strong>br</strong> />
clorídrico. Hoje a farmacologia fornece a<<strong>br</strong> />
cimetidina, a ranitidina, bloqueando os receptores<<strong>br</strong> />
H2, e de grande utilidade no tratamento<<strong>br</strong> />
do doente ulceroso.<<strong>br</strong> />
As cirurgias laparoscópicas, são menos<<strong>br</strong> />
agressivas, com menor período de internamento<<strong>br</strong> />
e sem lesões cicatriciais enormes.<<strong>br</strong> />
Imagino qual seria a reação e a surpresa dos<<strong>br</strong> />
grandes mestres da cirurgia paranaense, como<<strong>br</strong> />
Erasto Gaertner, João Vieira de Alencar e<<strong>br</strong> />
Mário Braga de A<strong>br</strong>eu entre tantos outros,<<strong>br</strong> />
diante das intervenções laparoscópicas.<<strong>br</strong> />
As dúvidas eram grandes e o Prof. Aluízio<<strong>br</strong> />
França, pediatra e catedrático de Terapêutica<<strong>br</strong> />
Clínica, com quem iniciei minha vida como<<strong>br</strong> />
professor, publicou em 1932 artigo na Revista<<strong>br</strong> />
da Associação Médica com o título: “A<<strong>br</strong> />
Malária curará a Coqueluche”, em função de<<strong>br</strong> />
ter acompanhado crianças de Paranaguá e<<strong>br</strong> />
verificado sua melhora após o surto de malária.<<strong>br</strong> />
Seguramente processos imunológicos desconhecidos<<strong>br</strong> />
eram ativados com melhoria da<<strong>br</strong> />
Coqueluche, mas a observação do fato mostra<<strong>br</strong> />
quão atento estava o professor Aluízio França.<<strong>br</strong> />
As doenças infecciosas mais freqüentemente<<strong>br</strong> />
conhecidas eram: tuberculose, sífilis,<<strong>br</strong> />
impaludismo e blenorragia. Esta com tratamento<<strong>br</strong> />
agressivo à base de lavagem uretral<<strong>br</strong> />
com nitrato de prata, até poderia erradicar a<<strong>br</strong> />
doenças, mas às custas de uma uretrite<<strong>br</strong> />
química, com posterior estenose de uretra.<<strong>br</strong> />
A sífilis era combatida com “salvarsan”; o<<strong>br</strong> />
impaludismo com o quinino, como tratamento<<strong>br</strong> />
supressivo da crise. Cabe citar o famoso<<strong>br</strong> />
“esidron”, diurético mercurial, com efeito ótimo<<strong>br</strong> />
mas com lesões renais, hiponatremia aguda e<<strong>br</strong> />
alterações metabólicas graves. Não posso<<strong>br</strong> />
deixar de citar os laxantes tipo sulfato de<<strong>br</strong> />
magnésio (sal de Epson) e sódio, cujos efeitos<<strong>br</strong> />
eram tão evidentes que levavam às vezes a uma<<strong>br</strong> />
limpeza intestinal de tal ordem que so<strong>br</strong>avam<<strong>br</strong> />
só o “tamanco do constipado intestinal”. Hoje<<strong>br</strong> />
com uma gama enorme de antibióticos,<<strong>br</strong> />
diuréticos com efeitos farmacológicos bem<<strong>br</strong> />
definidos e laxativos bem equacionados, a<<strong>br</strong> />
agressão farmacológica se reduziu e os efeitos<<strong>br</strong> />
terapêuticos são melhores e previsíveis.<<strong>br</strong> />
O avanço terapêutico fez cair no esquecimento<<strong>br</strong> />
substâncias como a digoxina no<<strong>br</strong> />
controle da insuficiência cardíaca, com o<<strong>br</strong> />
apoucamento de sua ação e a eficácia de<<strong>br</strong> />
outras drogas. A indústria farmacêutica tem<<strong>br</strong> />
ação dúbia nesse avanço. Ora com drogas
surpreendentes na sua eficácia, ora propagando medicamentos de eficácia<<strong>br</strong> />
duvidosa e riscos consideráveis. A propaganda medicamentosa é de tal<<strong>br</strong> />
ordem que muitas vezes o médico é um verdadeiro “cãozinho de Pavlov”,<<strong>br</strong> />
que secretava suco gástrico ao estímulo visual do alimento. Ou seja,<<strong>br</strong> />
condicionado ao clínico, logo médico.<<strong>br</strong> />
Tenho uma idéia precisa das teorias de propaganda, pois estivemos<<strong>br</strong> />
vinculados ao setor médico de uma grande indústria durante anos, e lá<<strong>br</strong> />
<strong>br</strong>incávamos que o pessoal após as grandes reuniões (com média de três<<strong>br</strong> />
dias), saíam mais fanáticos em relação ao produto do que a juventude<<strong>br</strong> />
hitlerista em relação ao Führer.<<strong>br</strong> />
Humano é procurar no doente entre tantas pessoas vistas no mesmo<<strong>br</strong> />
dia, um rosto, uma emoção, uma preocupação particular. Compreender essa<<strong>br</strong> />
pessoa implica em atenção, consome tempo e energia. Cabe ao médico<<strong>br</strong> />
reconhecer e compreender as queixas de seus pacientes, não só em termos<<strong>br</strong> />
de enfermidades, mas também de conflitos e problemas pessoais e, então,<<strong>br</strong> />
usar essa compreensão de modo a poder obter os efeitos terapêuticos.<<strong>br</strong> />
O médico deve ter sempre presente que muitos pacientes têm além<<strong>br</strong> />
da queixa apresentada outras que não querem ou não podem dizer. Há<<strong>br</strong> />
motivos que justificam interromper a fala do paciente e tentar entrar na<<strong>br</strong> />
intimidade de sua problemática. Tudo que o paciente diz é importante,<<strong>br</strong> />
tudo que deixa de dizer também é. A falta de tempo, de empatia e a<<strong>br</strong> />
ansiedade, impedem que percebamos um problema <strong>org</strong>ânico ou psíquico<<strong>br</strong> />
importante.<<strong>br</strong> />
Devemos entender que o doente está sendo o que não pretende ser,<<strong>br</strong> />
pois almeja ser sadio. Tem um desejo desesperado de não ser no momento<<strong>br</strong> />
o que ele é.<<strong>br</strong> />
A doença provoca uma angústia, que é a preocupação para a qual<<strong>br</strong> />
ainda não se vislum<strong>br</strong>a solução. A certeza por má que seja não gera<<strong>br</strong> />
angústia. Talvez tristeza e decepção.<<strong>br</strong> />
Para a mente sadia a grande fá<strong>br</strong>ica de angústias, a incerteza é a dúvida.<<strong>br</strong> />
A doença cria uma solução de continuidade não assimilada entre o<<strong>br</strong> />
viver anterior e o presente, tornando o futuro incerto, e o futuro reserva<<strong>br</strong> />
insegurança, ansiedade e medo. O medo é uma resposta comum quando<<strong>br</strong> />
não se tem conhecimento dos riscos ou da maneira de combater a doença.<<strong>br</strong> />
Cabe então ao médico, corrigir impressões distorcidas, chegar a um<<strong>br</strong> />
diagnóstico e discernir, isto é, estabelecer as diferenças entre as queixas<<strong>br</strong> />
de pessoas distintas, com critério e juízo. É uma sutileza de espírito. Há<<strong>br</strong> />
necessidade de compreender o paciente na sua realidade e o significado<<strong>br</strong> />
que a doença tem para si. Devemos nos colocar em seu lugar para melhor<<strong>br</strong> />
interpretá-lo, e procurar ter consciência de como ele está sendo agredido.<<strong>br</strong> />
As ordens médicas devem ser orientadas e explicadas de maneira<<strong>br</strong> />
segura e lógica, criando uma empatia sólida que favorecerá a vontade<<strong>br</strong> />
firme e o desejo permanente de sarar.<<strong>br</strong> />
A parte final da consulta é, às vezes, minimizada; deve conciliar uma<<strong>br</strong> />
orientação terapêutica cuidadosa explicando sua importância.<<strong>br</strong> />
Finalmente temos que estar juntos até no momento mais difícil, que é<<strong>br</strong> />
a morte, respeitando-a e não lançando mão de procedimentos<<strong>br</strong> />
desesperados que tentam negar a realidade.<<strong>br</strong> />
E se assim procedermos, seguiremos o conselho admirável de Fernando<<strong>br</strong> />
Pessoa quando diz:<<strong>br</strong> />
Segue teu caminho<<strong>br</strong> />
Rega tuas plantas<<strong>br</strong> />
Ama as tuas rosas<<strong>br</strong> />
O resto é a som<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />
De árvores alheias<<strong>br</strong> />
Dr. João Gualberto de Sá Scheffer (PR).<<strong>br</strong> />
ciência e arte<<strong>br</strong> />
Remoção de adenomas colorretais<<strong>br</strong> />
previne mortes por câncer. A maneira de fazer<<strong>br</strong> />
o rastreamento inclui pesquisa de sangue oculto<<strong>br</strong> />
na fezes anualmente e sigmoidoscopia a cada<<strong>br</strong> />
3-5 anos ou colonoscopia a cada 10 anos para<<strong>br</strong> />
pacientes de risco moderado.<<strong>br</strong> />
A síndrome de Lemierre abarca faringotonsilite,<<strong>br</strong> />
cervicalgia, fe<strong>br</strong>e, tromboflebite<<strong>br</strong> />
jugular e embolia pulmonar séptica. Ocorre três<<strong>br</strong> />
a dez dias depois do início da faringite, sendo<<strong>br</strong> />
causada por anaeróbicos orais. O ultra-som<<strong>br</strong> />
permite detectar a tromboflebite em jugular<<strong>br</strong> />
interna. A maioria dos clínicos evita a anticoagulação<<strong>br</strong> />
na embolia séptica, algo em evolução.<<strong>br</strong> />
A síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW) é<<strong>br</strong> />
devida à existência de uma via acessória atrioventricular. É<<strong>br</strong> />
sugerida por um intervalo PR curto (< 0,12 seg.), ondas delta, e<<strong>br</strong> />
complexos QRS largos (> 0,12 seg.). Na forma ortodrômica (90%<<strong>br</strong> />
dos casos), a ablação é curativa em mais de 95% dos pacientes.<<strong>br</strong> />
Cuidado: A taquicardia de complexos largos do WPW<<strong>br</strong> />
deve ser tratada com drogas que reduzam a condução na via<<strong>br</strong> />
acessória (procainamida, propafenona, lidocaína, amiodarona,<<strong>br</strong> />
quinidina). Morte súbita pode resultar de um tratamento que<<strong>br</strong> />
use verapamil, digoxina ou propranolol. As drogas que<<strong>br</strong> />
prolongam o período refratário do nódulo AV podem ser<<strong>br</strong> />
seguras na taquicardia de complexos estreitos do WPW.<<strong>br</strong> />
As manifestações oftalmológicas na Doença de<<strong>br</strong> />
Wilson são: anéis corneanos pigmentados (deposição de co<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />
na mem<strong>br</strong>ana de Descemet) e cataratas em girassol.<<strong>br</strong> />
Os anéis corneanos são castanhos em olhos azuis e<<strong>br</strong> />
cinza-esverdeados ou dourados nos olhos castanhos. São vistos<<strong>br</strong> />
só em pacientes sintomáticos (97%). No começo requerem<<strong>br</strong> />
lâmpada de fenda para ser visibilizados. As cataratas em<<strong>br</strong> />
girassol ocorrem em 10 a 15% dos pacientes e não podem<<strong>br</strong> />
ser vistas com oftalmoscópio. Não impedem visão.<<strong>br</strong> />
Na Doença de Wilson há combinações variadas de<<strong>br</strong> />
manifestações hepáticas, neurológicas, oftalmológicas e renais.<<strong>br</strong> />
Metade dos pacientes apresentam-se com manifestações<<strong>br</strong> />
hepáticas, comumente entre oito e quinze anos.<<strong>br</strong> />
A Sarcoidose, doença multissistêmica de etiologia<<strong>br</strong> />
desconhecida, causa doença pulmonar intersticial curiosa: não<<strong>br</strong> />
é acompanhada de baqueteamento digital e tampouco<<strong>br</strong> />
estertores tipo velcro.<<strong>br</strong> />
A propósito, linfonodomegalia hilar bilateral ou<<strong>br</strong> />
paratraqueal em jovem assintomático (20 a 40 anos), é<<strong>br</strong> />
suficientemente específica para permitir o diagnóstico clínico<<strong>br</strong> />
presuntivo sem confirmação tecidual.<<strong>br</strong> />
27
iátricas<<strong>br</strong> />
Solidão<<strong>br</strong> />
Prezada Tereza,<<strong>br</strong> />
Escreves que num mundo que nada<<strong>br</strong> />
significa nosso destino é a solidão. Isso<<strong>br</strong> />
parece coisa de Hemingway. Relatas<<strong>br</strong> />
também que tua saída têm sido os diversos<<strong>br</strong> />
escapismos que não vêm aqui ao caso.<<strong>br</strong> />
Parece que te equili<strong>br</strong>as neles e não quero<<strong>br</strong> />
fazer juízos de valor. Mas, sinceramente,<<strong>br</strong> />
senti falta de um. Por que não estendes<<strong>br</strong> />
teu diário? Afinal, escreves bem. E haverá<<strong>br</strong> />
solidão maior que a do escritor? O teu<<strong>br</strong> />
estilo é simples, curto, claro, coloquial,<<strong>br</strong> />
parece teres bebido na fonte do escritor de<<strong>br</strong> />
Por quem os sinos do<strong>br</strong>am e O sol também se<<strong>br</strong> />
levanta, o que é uma virtude. Aliás, a<<strong>br</strong> />
grande virtude da prosa inglesa, o que se<<strong>br</strong> />
chama understatement, dizer tudo no<<strong>br</strong> />
mínimo possível. O nosso Dalton Trevisan<<strong>br</strong> />
levou isso ao paroxismo. Por que não te<<strong>br</strong> />
habilitas nessa senda? Agora, cá entre nós,<<strong>br</strong> />
tenho uma preocupação. Deste-me a<<strong>br</strong> />
sensação de teres altos e baixos, uma bipolaridade<<strong>br</strong> />
que talvez mereça aconselhamento.<<strong>br</strong> />
E tens genética propícia, pelo que<<strong>br</strong> />
revelas, o que merece do<strong>br</strong>ada atenção. És<<strong>br</strong> />
muito talentosa para te perderes em impossibilidades.<<strong>br</strong> />
Gostaria que seguisses os passos<<strong>br</strong> />
do grande escritor nas letras, não na vida,<<strong>br</strong> />
filho de suicida, e ele próprio suicida. Foi<<strong>br</strong> />
grande na integridade de seu individualismo<<strong>br</strong> />
que conseguiu colocar nas<<strong>br</strong> />
reportagens, contos e romances. Foi<<strong>br</strong> />
pequeno, trágico, no fim. Já que falamos<<strong>br</strong> />
em Por quem os sinos do<strong>br</strong>am, não gostaria<<strong>br</strong> />
que eles do<strong>br</strong>assem por ti, para usar o<<strong>br</strong> />
grande poeta John Donne. E não nos dão<<strong>br</strong> />
os poetas pedaços luminosos de vida? Viva!<<strong>br</strong> />
Filosofices<<strong>br</strong> />
Prezada Ana Carolina,<<strong>br</strong> />
O mundo não tá nem aí pra filosofia.<<strong>br</strong> />
Não nego que adora filosofices, nada mais<<strong>br</strong> />
denso. Só amenidades. Um joguinho? Uma<<strong>br</strong> />
mágica? Todos a fim. E é necessário também.<<strong>br</strong> />
Agora, na hora de pensar por conta<<strong>br</strong> />
própria poucos se atrevem. Mas nada de<<strong>br</strong> />
espanto. O mundo é essencialmente<<strong>br</strong> />
prático, e embora a filosofia nos ajude a<<strong>br</strong> />
entendê-lo, não nos ajuda a mudá-lo. Esse<<strong>br</strong> />
28<<strong>br</strong> />
o ponto. É ótima individualmente, desenvolve<<strong>br</strong> />
o potencial das pessoas para pensar<<strong>br</strong> />
logicamente e com rigor; ínfima no plano<<strong>br</strong> />
coletivo. Tanto que o grande médico e<<strong>br</strong> />
escritor espanhol Gregório Marañón —<<strong>br</strong> />
escreveu sozinho um clássico: Manual de<<strong>br</strong> />
Diagnóstico Etiológico — nos deixou uma<<strong>br</strong> />
afirmação famosa: “La filosofia es una cosa<<strong>br</strong> />
com la qual y sin la qual el mundo sigue tal qual”.<<strong>br</strong> />
Portanto, não lamente seu pouco uso<<strong>br</strong> />
genérico. Nem mesmo que não sirva para<<strong>br</strong> />
melhorar o caráter de ninguém, ou o<<strong>br</strong> />
convívio ético, como escreves. Mas não há<<strong>br</strong> />
dúvida quanto ao seguinte: serve ao teu<<strong>br</strong> />
autoconhecimento. E não é isso o que há de<<strong>br</strong> />
mais difícil? Então, use-a, como tens feito, e<<strong>br</strong> />
siga o socrático “conhece-te a ti mesmo”.<<strong>br</strong> />
Muito bom ler so<strong>br</strong>e teu espanto. Que é o de<<strong>br</strong> />
todos nós. Até mais.<<strong>br</strong> />
Recusa<<strong>br</strong> />
Prezada Denise,<<strong>br</strong> />
Não posso atender seu pedido. Há duas<<strong>br</strong> />
coisas particularmente difíceis. Uma, é falar de<<strong>br</strong> />
si próprio. Embora todos o queiramos, normalmente<<strong>br</strong> />
sai besteira. Legislamos em causa própria.<<strong>br</strong> />
Nos jactanciamos muito fácil. Perdemos<<strong>br</strong> />
o senso da medida e do propósito. Nesta edição<<strong>br</strong> />
vai algo muito pessoal, “Eu, torcedor”; mas foi<<strong>br</strong> />
uma necessidade minha, algo que não pretende<<strong>br</strong> />
ter serventia. Usei os leitores, o que não deve<<strong>br</strong> />
ser feito, para uma necessidade interior. Mas,<<strong>br</strong> />
tá feito, foi um ato compulsivo pós-jogo. Tinha<<strong>br</strong> />
que elaborar incontinenti. A propósito, há um<<strong>br</strong> />
poema de Drummond, Conclusão, que diz<<strong>br</strong> />
muito a respeito:<<strong>br</strong> />
Os impactos de amor não são poesia<<strong>br</strong> />
(tentaram ser: aspiração noturna).<<strong>br</strong> />
A memória infantil e o outono po<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />
vazam no verso de nossa urna diurna.<<strong>br</strong> />
Que é poesia, o belo? Não é poesia,<<strong>br</strong> />
e o que não é poesia não tem fala.<<strong>br</strong> />
Nem o mistério em si nem velhos nomes<<strong>br</strong> />
poesia são: coxa, fúria, cabala.<<strong>br</strong> />
Então desanimamos. Adeus, tudo!<<strong>br</strong> />
A mala pronta, o corpo desprendido,<<strong>br</strong> />
resta a alegria de estar só, e mudo.<<strong>br</strong> />
De que se formam nossos poemas? Onde?<<strong>br</strong> />
Que sonho envenenado lhes responde,<<strong>br</strong> />
se o poeta é um ressentido, e o mais são<<strong>br</strong> />
nuvens?<<strong>br</strong> />
Veja prezada Denise, se o poeta é um<<strong>br</strong> />
ressentido, ou parti pris do assunto abordado,<<strong>br</strong> />
nada de bom pode sair. Só nuvens.<<strong>br</strong> />
Por isso, outro poeta maior, Pessoa, deixou<<strong>br</strong> />
grafado em Isto:<<strong>br</strong> />
Por isso escrevo em meio<<strong>br</strong> />
Do que não está ao pé,<<strong>br</strong> />
Livre do meu enleio,<<strong>br</strong> />
Sério do que não é.<<strong>br</strong> />
Sentir? Sinta quem lê!<<strong>br</strong> />
A outra coisa difícil é escrever para alguém.<<strong>br</strong> />
Ser ghost writer. Não de algo genérico,<<strong>br</strong> />
digamos político, mas pessoal mesmo.<<strong>br</strong> />
Ou seja, sem estar na pele do próprio, sem<<strong>br</strong> />
ver sob seus prismas, sob seus ângulos,<<strong>br</strong> />
apenas sob seus desejos. Mestre João Ca<strong>br</strong>al<<strong>br</strong> />
de Melo Neto, quando lhe pediram algo<<strong>br</strong> />
semelhante, saiu-se com este:<<strong>br</strong> />
Pedem-me um poema<<strong>br</strong> />
um poema que seja inédito,<<strong>br</strong> />
poema é coisa que se faz vendo,<<strong>br</strong> />
Como imaginar Picasso cego?<<strong>br</strong> />
Um poema se faz vendo,<<strong>br</strong> />
um poema se faz para vista<<strong>br</strong> />
como fazer o poema ditados<<strong>br</strong> />
Em vê-lo na folha inescrita?<<strong>br</strong> />
Poema é composição,<<strong>br</strong> />
mesmo da coisa vivida,<<strong>br</strong> />
um poema é o que se arruma,<<strong>br</strong> />
dentro da desarrumada vida.<<strong>br</strong> />
Por exemplo, é como um rio,<<strong>br</strong> />
por exemplo, um Capiberibe,<<strong>br</strong> />
em suas margens domado<<strong>br</strong> />
para chegar ao Recife.<<strong>br</strong> />
Onde com o Beberibe,<<strong>br</strong> />
com o Tejipió, Jaboatão.<<strong>br</strong> />
Para fazer o Atlântico,<<strong>br</strong> />
todos se juntam a mão.<<strong>br</strong> />
Poema é coisa de ver,<<strong>br</strong> />
é coisa so<strong>br</strong>e um espaço,<<strong>br</strong> />
como se vê um Franz Weissman,<<strong>br</strong> />
como se ouve um quadrado.<<strong>br</strong> />
Como vês, prezada Denise, não sou
essentido e estou livre do meu enleio, mas<<strong>br</strong> />
não consigo ver e tenho receio de tecer<<strong>br</strong> />
nuvens. Daí, a folha inescrita. Escusas e<<strong>br</strong> />
saudações.<<strong>br</strong> />
Caderno Verde<<strong>br</strong> />
Prezado Paulo,<<strong>br</strong> />
Toda publicação necessita de alguns<<strong>br</strong> />
segredos e mistérios. Segredos, você sabe,<<strong>br</strong> />
são desvendáveis. Não ficam encobertos,<<strong>br</strong> />
questão de tempo e oportunidade. Os<<strong>br</strong> />
memes pertencem a essa classe. Quem tinha<<strong>br</strong> />
lido O Gene Egoísta do Dawkins sabia do<<strong>br</strong> />
que se tratava. Quem tinha tido a curiosidade<<strong>br</strong> />
de procurar no dicionário Oxford<<strong>br</strong> />
também. Já o Caderno Verde pertence à<<strong>br</strong> />
classe dos mistérios. Estes existem para<<strong>br</strong> />
desafiar, não para desvendar, por isso continuará<<strong>br</strong> />
mistério. Como consolo, ou desafio,<<strong>br</strong> />
dou-lhe outro mistério, o da vida, nos versos<<strong>br</strong> />
de Henriqueta Lisboa em Flor da Morte:<<strong>br</strong> />
Na morte, não.<<strong>br</strong> />
Na vida.<<strong>br</strong> />
Está na vida o mistério<<strong>br</strong> />
Em cada afirmação ou<<strong>br</strong> />
Abstinência.<<strong>br</strong> />
Na malícia<<strong>br</strong> />
Das plausíveis revelações,<<strong>br</strong> />
No suborno,<<strong>br</strong> />
Das silenciosas palavras.<<strong>br</strong> />
Evolução<<strong>br</strong> />
Prezada Carolina,<<strong>br</strong> />
Perguntas-me, jovem médica que és, o<<strong>br</strong> />
que fazer para evoluir profissionalmente.<<strong>br</strong> />
O essencial já tens, a intencionalidade.<<strong>br</strong> />
Deves também agregar informação depurada<<strong>br</strong> />
e raciocínio lógico. Alguns livros e<<strong>br</strong> />
revistas, tradicionais ou eletrônicos, podem<<strong>br</strong> />
prover isso. Há muito tempo não terias<<strong>br</strong> />
como desenvolver raciocínio clínico a não<<strong>br</strong> />
ser em raras publicações. Hoje há até certa<<strong>br</strong> />
pletora das mesmas, e muito boas. A par<<strong>br</strong> />
isso, praticar, praticar muito.<<strong>br</strong> />
Agora, tens que ter um tutor ou supervisor,<<strong>br</strong> />
alguém que te ajude na função<<strong>br</strong> />
crítica, a separar o joio do trigo. E, principalmente,<<strong>br</strong> />
que te adestre na capacidade<<strong>br</strong> />
crítica de fazer correlações, uma das<<strong>br</strong> />
capacidades mais no<strong>br</strong>es da medicina.<<strong>br</strong> />
Mas ainda falta algo, ler poesia. Sim,<<strong>br</strong> />
senhorita, decodificar ritmo e sentido de<<strong>br</strong> />
um poema é interpretá-lo, recriá-lo, e ao<<strong>br</strong> />
término dessa tarefa, que exige prazer, terás<<strong>br</strong> />
um belo diagnóstico. Assim acoplarás<<strong>br</strong> />
ciência e arte. Bom proveito.<<strong>br</strong> />
A Terapia Cognitiva-comportamental<<strong>br</strong> />
A Terapia Cognitiva-Comportamental, ou<<strong>br</strong> />
simplesmente Terapia Cognitiva (T.C.),<<strong>br</strong> />
idealizada pelo psiquiatra americano Aaron<<strong>br</strong> />
T. Beck e colaboradores, é hoje um dos<<strong>br</strong> />
enfoques psicoterapêuticos mais praticados<<strong>br</strong> />
por profissionais da área da saúde mental.<<strong>br</strong> />
É, ao mesmo tempo, o mais estudado e<<strong>br</strong> />
validado pela metodologia científica.<<strong>br</strong> />
Os primeiros escritos importantes e as<<strong>br</strong> />
primeiras abordagens cognitivo-comportamentais<<strong>br</strong> />
para o tratamento dos transtornos<<strong>br</strong> />
emocionais começaram a surgir nos anos<<strong>br</strong> />
1960 e 1970 com autores como Aaron T.<<strong>br</strong> />
Beck (1963, 1967; Beck et al., 1979), Albert<<strong>br</strong> />
Ellis (1962), Lazarus (1966), Meichenbaum<<strong>br</strong> />
(1973) e Mahoney (1974), entre outros.<<strong>br</strong> />
O modelo cognitivo prototípico se baseia<<strong>br</strong> />
nos seguintes pressupostos:<<strong>br</strong> />
1- A atividade cognitiva influencia o<<strong>br</strong> />
comportamento.<<strong>br</strong> />
2- A atividade cognitiva pode ser<<strong>br</strong> />
monitorada e alterada.<<strong>br</strong> />
3- O comportamento desejado pode<<strong>br</strong> />
ser influenciado mediante a mudança<<strong>br</strong> />
cognitiva.<<strong>br</strong> />
Mas o que se entende por atividade<<strong>br</strong> />
cognitiva?<<strong>br</strong> />
Atividade cognitiva, também chamada<<strong>br</strong> />
de cognição, é o fluxo mental que acontece<<strong>br</strong> />
em todos nós a todo o momento. Muitas<<strong>br</strong> />
vezes ela é comparada a um filme mental,<<strong>br</strong> />
com imagens e sons.<<strong>br</strong> />
O indivíduo onde se dá esta atividade<<strong>br</strong> />
(“o filme mental”) é, ao mesmo tempo, o<<strong>br</strong> />
escritor do script, o projetor na sala de<<strong>br</strong> />
cinema e o espectador.<<strong>br</strong> />
Neste filme, estão compreendidos os<<strong>br</strong> />
pensamentos, imagens mentais, memórias,<<strong>br</strong> />
imaginação, percepções etc.<<strong>br</strong> />
E o que se entende por comportamento<<strong>br</strong> />
desejado?<<strong>br</strong> />
É a atividade motora e seus correlatos<<strong>br</strong> />
emocionais e fisiológicos autonômicos. Assim,<<strong>br</strong> />
as cognições influenciam não só a psicomotricidade<<strong>br</strong> />
do paciente, mas também as<<strong>br</strong> />
suas emoções e as conseqüências internas.<<strong>br</strong> />
Por exemplo, um paciente que tem<<strong>br</strong> />
cognições ansiosas, terá emoções da mesma<<strong>br</strong> />
natureza (ansiedade) e toda a sua fisiologia<<strong>br</strong> />
refletirá este estado.<<strong>br</strong> />
A fisiologia da ansiedade, como da<<strong>br</strong> />
depressão, da raiva etc., já é bem conhecida<<strong>br</strong> />
psiquiatria<<strong>br</strong> />
dos clínicos. O que a T.C. nos traz como<<strong>br</strong> />
novidade é a associação entre os<<strong>br</strong> />
eventos da vida, as cognições, as<<strong>br</strong> />
emoções e a fisiologia. A seguinte figura<<strong>br</strong> />
nos mostra este construto:<<strong>br</strong> />
As crenças nucleares, os pressupostos<<strong>br</strong> />
subjacentes e os pensamentos<<strong>br</strong> />
automáticos, representam as cognições.<<strong>br</strong> />
As reações volitivas, emocionais e<<strong>br</strong> />
comportamentais são as conseqüências<<strong>br</strong> />
das citadas cognições.<<strong>br</strong> />
Desta maneira, se conseguirmos<<strong>br</strong> />
alterar estas últimas, monitorando-as<<strong>br</strong> />
mediante o método e a técnica cognitiva,<<strong>br</strong> />
aliviaremos as conseqüências<<strong>br</strong> />
afetivo-volitivo-comportamentais, que,<<strong>br</strong> />
muitas vezes cursam com transtornos<<strong>br</strong> />
de somatização, de dor, conversão,<<strong>br</strong> />
depressão, ansiedade e assim por<<strong>br</strong> />
diante.<<strong>br</strong> />
O método cognitivo consiste em um<<strong>br</strong> />
automonitoramento onde o paciente<<strong>br</strong> />
entende que as situações pelas quais<<strong>br</strong> />
passa ativam pensamentos automáticos<<strong>br</strong> />
e imagens mentais. Isto leva a uma<<strong>br</strong> />
interpretação, um sentido emprestado<<strong>br</strong> />
ao evento que produz o despertar<<strong>br</strong> />
emocional. As emoções resultantes,<<strong>br</strong> />
quando são disfuncionais, cursam com<<strong>br</strong> />
os diversos transtornos mentais e<<strong>br</strong> />
comportamentais.<<strong>br</strong> />
O paciente, juntamente com o<<strong>br</strong> />
terapeuta e de maneira colaborativa,<<strong>br</strong> />
aprende a mudar suas cognições, o que<<strong>br</strong> />
alivia seus sintomas. Aprende também,<<strong>br</strong> />
de onde elas vêm, qual a sua origem,<<strong>br</strong> />
aprendendo assim a evitar futuras<<strong>br</strong> />
recaídas.<<strong>br</strong> />
Dr. Gláucio Luiz B. Alves (PR).<<strong>br</strong> />
29
terapêutica<<strong>br</strong> />
PRÉ-HIPERTENSÃO<<strong>br</strong> />
A pressão é determinada pelo<<strong>br</strong> />
produto do débito cardíaco (Volume<<strong>br</strong> />
sistólico x Freqüência) e a resistência<<strong>br</strong> />
periférica total. Quando uma das<<strong>br</strong> />
variáveis sai do equilí<strong>br</strong>io, seja devido<<strong>br</strong> />
ao maior volume sistólico (Sístole =<<strong>br</strong> />
Débito cardíaco), ou maior resistência<<strong>br</strong> />
periférica (Diástole = Resistência<<strong>br</strong> />
periférica), o resultado é Hipertensão<<strong>br</strong> />
(Sistólica > 140 mmhg.)<<strong>br</strong> />
A hipertensão é uma doença silenciosa<<strong>br</strong> />
e de tendência à cronificação.<<strong>br</strong> />
Assim sendo, o diagnóstico precoce —<<strong>br</strong> />
Pré-Hipertensão (Sistólica 120-139;<<strong>br</strong> />
Diastólica 80-89/Joint National<<strong>br</strong> />
Committee 7)] — pode ser um valioso<<strong>br</strong> />
instrumento para decidir o início do<<strong>br</strong> />
tratamento medicamentoso.<<strong>br</strong> />
Uma amostra, randomizada, (n =<<strong>br</strong> />
809) de pré-hipertensos, com seguimento<<strong>br</strong> />
por 4 anos, foi dividida em 2<<strong>br</strong> />
grupos: um grupo recebeu placebo,<<strong>br</strong> />
enquanto o outro candesartan, durante<<strong>br</strong> />
os primeiros dois anos (1.ª fase). Nos<<strong>br</strong> />
dois anos que se seguiram, ambos os<<strong>br</strong> />
grupos recebeu placebo (2.ª fase).<<strong>br</strong> />
Como resultado da primeira fase,<<strong>br</strong> />
40,4% do grupo que recebeu placebo<<strong>br</strong> />
desenvolveu hipertensão em comparação<<strong>br</strong> />
a 13,6% do grupo que recebeu<<strong>br</strong> />
candesartan (16mg/d). Na segunda<<strong>br</strong> />
fase, onde ambos os grupos receberam<<strong>br</strong> />
placebo, obteve-se uma redução<<strong>br</strong> />
relativa de 16% no risco para hipertensão<<strong>br</strong> />
naqueles que, primeiramente,<<strong>br</strong> />
foram tratados com o bloqueador da<<strong>br</strong> />
angiotensina. (Julius S, et al N Eng J<<strong>br</strong> />
30<<strong>br</strong> />
Med, 2006;354:1685-1697).<<strong>br</strong> />
Apesar da pesquisa confirmar benefícios<<strong>br</strong> />
na prevenção da doença hipertensiva<<strong>br</strong> />
com tratamento medicamentoso,<<strong>br</strong> />
ainda é cedo para advogar o tratamento<<strong>br</strong> />
universal de todos os pré-hipertensos.<<strong>br</strong> />
Mais estudos são necessários.<<strong>br</strong> />
VARIZES E BLOQUEADORES<<strong>br</strong> />
As veias esofágicas são vasos colaterais<<strong>br</strong> />
no sistema porta. Como têm paredes<<strong>br</strong> />
finas, em determinadas condições<<strong>br</strong> />
(exemplo cirrose) um gradiente aumentado<<strong>br</strong> />
de pressão — hipertensão portal —<<strong>br</strong> />
torna suas veias dilatadas. As varizes<<strong>br</strong> />
esofágicas, então estabelecidas, podem<<strong>br</strong> />
ser estadiadas por fatores preditivos<<strong>br</strong> />
quanto aos riscos de hemorragia.<<strong>br</strong> />
Para prevenir a evolução das varizes<<strong>br</strong> />
esofágicas em pacientes com cirrose, os<<strong>br</strong> />
beta-bloqueadores não-seletivos são<<strong>br</strong> />
eficazes na redução de episódios de<<strong>br</strong> />
hemorragia. Acredita-se que seja resultado<<strong>br</strong> />
do decréscimo da pressão portal,<<strong>br</strong> />
controlada pelo tônus das artérias<<strong>br</strong> />
mesentéricas (B1-efeito), em combinação<<strong>br</strong> />
com a diminuição do fluxo esplênico<<strong>br</strong> />
(B2-efeito). As únicas drogas<<strong>br</strong> />
recomendadas para profilaxia são propranolol<<strong>br</strong> />
e nadalol.<<strong>br</strong> />
Um recente estudo (Groszmann RJ, et<<strong>br</strong> />
al. N Engl Med.2005;353:2254-2261),<<strong>br</strong> />
placebo-controlado, sugere que a ação<<strong>br</strong> />
dos beta-bloqueadores não seja somente<<strong>br</strong> />
o de reduzir o fluxo sangüíneo. Numa<<strong>br</strong> />
população (n = 213) de alto risco de<<strong>br</strong> />
desenvolverem varizes esofágicas —<<strong>br</strong> />
cirróticos com hipertensão portal (gra-<<strong>br</strong> />
diente de pressão demonstrado) —<<strong>br</strong> />
envolveu a administração de timolol<<strong>br</strong> />
(80mg/d), e seguimento a cada três<<strong>br</strong> />
meses por 54,9 meses. Monitoramento<<strong>br</strong> />
sangüíneo, endoscopia e mensuração<<strong>br</strong> />
da pressão foram avaliados anualmente.<<strong>br</strong> />
A pesquisa mostrou não haver<<strong>br</strong> />
diferença, quanto ao risco de hemorragia,<<strong>br</strong> />
no grupo placebo ou no grupo<<strong>br</strong> />
timolol. A contradição foi o grupo<<strong>br</strong> />
timolol ter apresentado eventos mais<<strong>br</strong> />
sérios que o grupo placebo.<<strong>br</strong> />
SECREÇÃO ÁCIDA E TIROXINA<<strong>br</strong> />
Milhões fazem reposição hormonal<<strong>br</strong> />
com levotiroxina. A acidez gástrica é<<strong>br</strong> />
um fator importante para sua absorção,<<strong>br</strong> />
daí, seu uso a 30 minutos do desjejum.<<strong>br</strong> />
É também muito comum o uso em<<strong>br</strong> />
jejum de inibidores protônicos (inibidores<<strong>br</strong> />
de bomba de prótons) para<<strong>br</strong> />
doença do refluxo gastroesofágico,<<strong>br</strong> />
gastrites e doença ulcerosa. Está claro<<strong>br</strong> />
que os inibidores protônicos ao reduzirem<<strong>br</strong> />
a acidez gástrica reduzem<<strong>br</strong> />
também a absorção da levotiroxina<<strong>br</strong> />
fazendo com que haja necessidade de<<strong>br</strong> />
dose maior na reposição. O último<<strong>br</strong> />
trabalho saiu no N. engl. J. Med.<<strong>br</strong> />
(2006;3541787-1795). Um cuidado<<strong>br</strong> />
que médicos e pacientes têm que passar<<strong>br</strong> />
a ter. Ou se usa as drogas dissociadas,<<strong>br</strong> />
com intervalo de 30 minutos; ou, às<<strong>br</strong> />
vezes, há necessidade de se aumentar<<strong>br</strong> />
a levotiroxina. A primeira opção é a<<strong>br</strong> />
melhor.<<strong>br</strong> />
Ac. Vic Mar (PR).
I Para impressionar<<strong>br</strong> />
Para<<strong>br</strong> />
os outros.<<strong>br</strong> />
VI Para conhecer as<<strong>br</strong> />
Para<<strong>br</strong> />
características clínicas e<<strong>br</strong> />
evolução de uma doença.<<strong>br</strong> />
Decálogo extraído dos artigos publicados no Canadian Medical Association<<strong>br</strong> />
Journal (CMAJ) 1981; 124: 555-558, 703-710, 869-872, 985-990, 1156-1162.<<strong>br</strong> />
IV Para desco<strong>br</strong>ir como um clínico Para<<strong>br</strong> />
experiente lida com um<<strong>br</strong> />
determinado problema.<<strong>br</strong> />
IX Para selecionar os pontos referentes à Para<<strong>br</strong> />
necessidade, e à utilização de<<strong>br</strong> />
tratamento clínico e de outros<<strong>br</strong> />
procedimentos de saúde considerando<<strong>br</strong> />
a qualidade e relação custo/eficácia.<<strong>br</strong> />
II<<strong>br</strong> />
Para se manter atualizado<<strong>br</strong> />
com as notícias médicas.<<strong>br</strong> />
VII determinar a<<strong>br</strong> />
Para<<strong>br</strong> />
etiologia ou causalidade.<<strong>br</strong> />
III entender de<<strong>br</strong> />
biopatologia.<<strong>br</strong> />
V<<strong>br</strong> />
verificar a possibilidade de utilização<<strong>br</strong> />
de um novo ou já existente exame<<strong>br</strong> />
diagnóstico em nossos pacientes.<<strong>br</strong> />
X<<strong>br</strong> />
se divertir com as<<strong>br</strong> />
cartas ao editor.<<strong>br</strong> />
VIII<<strong>br</strong> />
distinguir a terapêutica<<strong>br</strong> />
útil da inútil ou nociva.<<strong>br</strong> />
decálogos<<strong>br</strong> />
31