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PAIXÃO DE ARTISTA - Crmpr.org.br

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Esta edição é dedicada à imprensa médica e à medicina na imprensa; expressão de um conhecimento movediço.<<strong>br</strong> />

<strong>PAIXÃO</strong> <strong>DE</strong> <strong>ARTISTA</strong>


03<<strong>br</strong> />

10<<strong>br</strong> />

21<<strong>br</strong> />

26<<strong>br</strong> />

IÁTRICA AO LEITOR<<strong>br</strong> />

Provocar, para<<strong>br</strong> />

despertar.<<strong>br</strong> />

INGLESES E<<strong>br</strong> />

AMERICANOS<<strong>br</strong> />

Contrastes que<<strong>br</strong> />

exigem atenção.<<strong>br</strong> />

O MÉDICO E A<<strong>br</strong> />

RELIGIÃO<<strong>br</strong> />

Mitos e Conflitos.<<strong>br</strong> />

HUMANISMO E<<strong>br</strong> />

TECNICISMO<<strong>br</strong> />

Reflexão so<strong>br</strong>e passado<<strong>br</strong> />

e presente.<<strong>br</strong> />

O<strong>br</strong>a “A bela e a<<strong>br</strong> />

fera”, <strong>br</strong>onze, de Luiz<<strong>br</strong> />

Gagliastri (PR).<<strong>br</strong> />

“Esta edição é dedicada à<<strong>br</strong> />

imprensa médica e à medicina<<strong>br</strong> />

na imprensa; expressão de um<<strong>br</strong> />

conhecimento movediço.”<<strong>br</strong> />

05<<strong>br</strong> />

16<<strong>br</strong> />

JOIO DO TRIGO<<strong>br</strong> />

Apostar na liberdade<<strong>br</strong> />

intelectual.<<strong>br</strong> />

<strong>PAIXÃO</strong> <strong>DE</strong> <strong>ARTISTA</strong><<strong>br</strong> />

Rodin, Gagliastri e<<strong>br</strong> />

Paixão, as diferentes<<strong>br</strong> />

faces da arte.<<strong>br</strong> />

31 <strong>DE</strong>CÁLOGOS<<strong>br</strong> />

10 razões para se ler<<strong>br</strong> />

revistas médicas.<<strong>br</strong> />

EDIÇÕES ANTERIORES<<strong>br</strong> />

Confira as edições do Iátrico<<strong>br</strong> />

no site do Conselho:<<strong>br</strong> />

www.crmpr.<strong>org</strong>.<strong>br</strong><<strong>br</strong> />

CAPA<<strong>br</strong> />

A mão da capa é uma homenagem<<strong>br</strong> />

do Iátrico ao médico<<strong>br</strong> />

sensível. Pouco importa clínico<<strong>br</strong> />

ou cirurgião; que toque crianças<<strong>br</strong> />

ou instrumentos; tem que ser<<strong>br</strong> />

de ação sem desprezar a<<strong>br</strong> />

ternura, de precisão sem negar<<strong>br</strong> />

afeto. Tem que ser uma mão<<strong>br</strong> />

diferente como a de Rodin,<<strong>br</strong> />

única, com a mestria do movimento.<<strong>br</strong> />

Pomponius Gauricus, circa<<strong>br</strong> />

1504, em seu “De Sculptura”<<strong>br</strong> />

disse: Os escritores atuam por<<strong>br</strong> />

meio das palavras... Os escultores<<strong>br</strong> />

por meio da ação. Médicos<<strong>br</strong> />

vão além: são múltiplos em<<strong>br</strong> />

sua seara; verbo e movimento<<strong>br</strong> />

são seus gestos de vida.<<strong>br</strong> />

Mutáveis, como a própria vida.<<strong>br</strong> />

PUBLICAÇÃO CIENTÍFICO-CULTURAL DO CONSELHO REGIONAL <strong>DE</strong> MEDICINA DO PARANÁ.<<strong>br</strong> />

Edição nº 18 - Julho a Outu<strong>br</strong>o de 2006<<strong>br</strong> />

CRMPR - Rua Victorio Viezzer, 84 | Vista Alegre | Curitiba-PR | CEP 80810-340 | Fone: 41 3240-4026 | E-mail: iatrico@crmpr.<strong>org</strong>.<strong>br</strong><<strong>br</strong> />

Conselho Editorial: João Manuel Cardoso Martins, Gerson Zafalon Martins, Luiz Sallim Emed, Donizetti Dimer Giamberardino Filho,<<strong>br</strong> />

Hélcio Bertolozzi Soares (presidente do CRM-PR), Ehrenfried O. Wittig e Hernani Vieira. Editor-Coordenador: João Manuel Cardoso<<strong>br</strong> />

Martins (Prof. da PUCPR e mem<strong>br</strong>o da Academia Paranaense de Medicina) Projeto Gráfico e Diagramação: Upper Comunicação (41<<strong>br</strong> />

3024-0674) | Impressão: Serzegraf (41 3026-9460) | Tiragem: 20.000 exemplares | Periodicidade: Trimestral


Como redator tenho<<strong>br</strong> />

um privilégio raro,<<strong>br</strong> />

o de poder escrever<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e o que me apeteça. Mas<<strong>br</strong> />

não o exerço. Sabem por<<strong>br</strong> />

quê? Porque tenho um critério,<<strong>br</strong> />

escrevo so<strong>br</strong>e o que<<strong>br</strong> />

gostaria de ter lido quando<<strong>br</strong> />

me formei.<<strong>br</strong> />

Já como editor tenho o dever de<<strong>br</strong> />

sugerir temas aos colaboradores, e de<<strong>br</strong> />

aceitar ou não o material enviado,<<strong>br</strong> />

pedido ou não. E os mais humildes<<strong>br</strong> />

são os velhos professores: — Vê se<<strong>br</strong> />

interessa ou não. É sem compromisso!<<strong>br</strong> />

Mas qual o critério? Se possível, que<<strong>br</strong> />

sejam bem escritos, bem pensados e<<strong>br</strong> />

bem evocativos ou provocativos. Esse<<strong>br</strong> />

o ponto. Só gerando dúvida na cabeça<<strong>br</strong> />

do leitor temos a certeza da reflexão.<<strong>br</strong> />

E sob reflexão haverá movimento,<<strong>br</strong> />

ação. No sentido de mudança ou<<strong>br</strong> />

de fortalecimento de suas convicções.<<strong>br</strong> />

Por isso, um texto cultural deveria<<strong>br</strong> />

mais provocar do que ensinar.<<strong>br</strong> />

Lem<strong>br</strong>o-me do ano da graça de 1979,<<strong>br</strong> />

quando um editor-médico suíço, Wolfgang<<strong>br</strong> />

Kolditz, se viu às voltas com um<<strong>br</strong> />

texto do sempre herético Martins Eisner.<<strong>br</strong> />

Publico ou não, eis a questão! Decisão:<<strong>br</strong> />

imprimir. Há um risco inerente a qualquer<<strong>br</strong> />

comprometimento verdadeiro; e esse<<strong>br</strong> />

risco é também integrante da responsabilidade<<strong>br</strong> />

redacional. Ou nas palavras<<strong>br</strong> />

também heréticas de Kolditz: Aquele que<<strong>br</strong> />

tem medo das conseqüências que poderiam<<strong>br</strong> />

decorrer do conhecimento (seja<<strong>br</strong> />

este, de fato, convincente, discutível ou<<strong>br</strong> />

errado) deve se contentar com o tédio<<strong>br</strong> />

insípido que todo paraíso promete para<<strong>br</strong> />

eternidade aos seus habitantes.<<strong>br</strong> />

A árvore do conhecimento<<strong>br</strong> />

apresenta riscos, e<<strong>br</strong> />

seus frutos podem ser bem<<strong>br</strong> />

indigestos.<<strong>br</strong> />

Esta edição do Iátrico<<strong>br</strong> />

tem a pretensão de provocálo,<<strong>br</strong> />

dileto leitor. Se o fizer,<<strong>br</strong> />

também se desdo<strong>br</strong>ará em conhecimento<<strong>br</strong> />

a si. Ou na sentença de<<strong>br</strong> />

Schiller: “Se queres te conhecer,<<strong>br</strong> />

observa os outros. Se quiseres compreender<<strong>br</strong> />

os outros, olha no fundo de<<strong>br</strong> />

ti mesmo”. Sempre direito e avesso.<<strong>br</strong> />

Sempre os ângulos insuspeitos.<<strong>br</strong> />

É assim uma cabeça bem-feita;<<strong>br</strong> />

não se faz por si só. Necessita ser<<strong>br</strong> />

recheada por dúvidas e provocações.<<strong>br</strong> />

Ou seja, é uma erupção de imperfeições<<strong>br</strong> />

em busca da harmonia. E com<<strong>br</strong> />

esta não se contenta, pois persegue<<strong>br</strong> />

a autonomia de pensamento.<<strong>br</strong> />

Aceite nossas provocações e<<strong>br</strong> />

tenha boa leitura.<<strong>br</strong> />

tema<<strong>br</strong> />

3


imprensa<<strong>br</strong> />

4<<strong>br</strong> />

H<<strong>br</strong> />

á uma citação de Shakespeare<<strong>br</strong> />

que traduzida — “Each in his time,<<strong>br</strong> />

plays many roles” — significa que<<strong>br</strong> />

cada um desempenha muitos papéis, ou<<strong>br</strong> />

seja, o poeta tentava aclarar que cada ser<<strong>br</strong> />

humano tem um universo dentro de si. Pelo<<strong>br</strong> />

menos os mais bem aquinhoados em<<strong>br</strong> />

circuitaria cere<strong>br</strong>al.<<strong>br</strong> />

Tomo essa idéia para explicitar que o<<strong>br</strong> />

fazer médico, além de sua prática mais<<strong>br</strong> />

imediata com o paciente, também implica<<strong>br</strong> />

na função social de divulgar a medicina e a<<strong>br</strong> />

saúde. Mas isso torna-se difícil por que divulgar<<strong>br</strong> />

a ciência médica para colegas é uma<<strong>br</strong> />

coisa, já em si difícil, para leigos, outra, bem<<strong>br</strong> />

mais penosa. Basta dizer que com colegas<<strong>br</strong> />

usamos jargão e razão, e que estas ferramentas<<strong>br</strong> />

cognitivas têm pouca valia com o<<strong>br</strong> />

público leigo, mais propenso à emoção.<<strong>br</strong> />

Sabemos que informação não muda<<strong>br</strong> />

comportamento. Se fosse o contrário,<<strong>br</strong> />

provavelmente não teríamos mais Aids nem<<strong>br</strong> />

engravidamentos indesejados na adultícia.<<strong>br</strong> />

Para que a informação mude comportamento<<strong>br</strong> />

tem que ser processada, assimilada,<<strong>br</strong> />

e ainda virar convicção. É um longo<<strong>br</strong> />

caminho que passa não apenas pelo raciocínio<<strong>br</strong> />

lógico e analítico, mas principalmente<<strong>br</strong> />

pelas impressões, território carregado de<<strong>br</strong> />

emoções. Só se convence pela racionalidade<<strong>br</strong> />

os racionais, naturalmente uma pequena<<strong>br</strong> />

parcela da população. A maioria tem que<<strong>br</strong> />

ser pega pela emoção, porque age emocionalmente<<strong>br</strong> />

o tempo todo. Basta você,<<strong>br</strong> />

dileto leitor, assistir em uma tarde de ócio o<<strong>br</strong> />

que é propagado pela mídia televisiva. As<<strong>br</strong> />

panacéias mais absurdas, mais inverossímeis,<<strong>br</strong> />

são vendidas e compradas copiosamente.<<strong>br</strong> />

Acredite, até por médicos e seus familiares.<<strong>br</strong> />

Então, a questão que se formula é a seguinte:<<strong>br</strong> />

como divulgar medicina e saúde de maneira<<strong>br</strong> />

eficaz e correta? Claro que usando a<<strong>br</strong> />

racionalidade, mas temperada pela emoção.<<strong>br</strong> />

E quem você gostaria que as divulgasse?<<strong>br</strong> />

Pessoalmente preferiria um médico, mas o<<strong>br</strong> />

patrulhamento é enorme.<<strong>br</strong> />

Damos de om<strong>br</strong>os, isto é, não damos à<<strong>br</strong> />

mínima, quando um colega charlata paga para<<strong>br</strong> />

ser entrevistado pela mídia tecendo loas à sua<<strong>br</strong> />

competência, única naturalmente; verdadeiro<<strong>br</strong> />

repositório do engenho e arte. Mas quando o<<strong>br</strong> />

Drauzio Varella, no Fantástico, disse a uma<<strong>br</strong> />

paciente: — “Então vamos tirar a sua pressão”,<<strong>br</strong> />

sabem o que aconteceu? Foi varrido por uma<<strong>br</strong> />

enxurrada de e-mails de colegas que o<<strong>br</strong> />

desqualificavam dizendo que o certo era<<strong>br</strong> />

“medir a pressão”. Óquei, queriam mesmo é<<strong>br</strong> />

que tivesse dito à simplória paciente, “vou<<strong>br</strong> />

aferir sua tensão arterial”! Por aí vejam o grau<<strong>br</strong> />

de patrulhamento da classe com bons<<strong>br</strong> />

divulgadores. Já os charlatas podem agir à<<strong>br</strong> />

vontade, ninguém tá nem aí. Dizem que é para<<strong>br</strong> />

não se melecar. Então o que é melhor, uma<<strong>br</strong> />

imprensa marrom que corrompe e é corrompida<<strong>br</strong> />

por pseudos ? Ou exercermos uma das<<strong>br</strong> />

funções básicas da medicina que é ser divulgada<<strong>br</strong> />

corretamente e sem vieses mercantilistas<<strong>br</strong> />

à população? É por causa desse tipo de<<strong>br</strong> />

patrulhamento que muitos colegas competentes,<<strong>br</strong> />

e que gostam de ensinar, não se<<strong>br</strong> />

atrevem a aparecer na mídia. Têm receio de<<strong>br</strong> />

parecer pouco científicos pela classe.<<strong>br</strong> />

Claro que a divulgação da medicina e da<<strong>br</strong> />

saúde melhorou muito na imprensa leiga nos<<strong>br</strong> />

últimos trinta anos. E pelo simples motivo<<strong>br</strong> />

da população ter passado a se interessar mais<<strong>br</strong> />

pela própria saúde. As pessoas vivem mais e<<strong>br</strong> />

há mais possibilidades de prevenção. É um<<strong>br</strong> />

fenômeno mundial. Só nos últimos cinco<<strong>br</strong> />

anos, a revista Veja deu praticamente 1 ano<<strong>br</strong> />

de capas com matérias destinadas ao assunto.<<strong>br</strong> />

Tem quatro jornalistas preparadas e especializadas<<strong>br</strong> />

co<strong>br</strong>indo a área. Mas por melhores<<strong>br</strong> />

que sejam, e são ótimas, não têm formação<<strong>br</strong> />

nem vivência, não são médicas, por isso às<<strong>br</strong> />

vezes levam barrigas, publicam simples<<strong>br</strong> />

“releases” da indústria farmacêutica como se<<strong>br</strong> />

fossem o “ó do bodó”! Claro que o ideal seria<<strong>br</strong> />

ter um médico-jornalista, consultor, vivendo<<strong>br</strong> />

o dia-a-dia da redação. Nada como idealizar!<<strong>br</strong> />

De qualquer forma fazem bem seu trabalho,<<strong>br</strong> />

até por que seus leitores são cada vez mais<<strong>br</strong> />

desejosos de informações médicas e<<strong>br</strong> />

exigentes. Portanto, rastreiam as principais<<strong>br</strong> />

publicações especializadas à cata de bom<<strong>br</strong> />

material e conferem com especialistas os<<strong>br</strong> />

nós das matérias.<<strong>br</strong> />

Mas você há de me perguntar, isso é o<<strong>br</strong> />

que há de melhor em divulgação científica<<strong>br</strong> />

em nossa imprensa? Claro que não. O<<strong>br</strong> />

crème <strong>br</strong>ûlée da divulgação está na concorrente<<strong>br</strong> />

e antípoda ideológica de Veja,<<strong>br</strong> />

CartaCapital. Lá pontificam três médicos<<strong>br</strong> />

cientificamente competentes e com a<<strong>br</strong> />

grande qualidade jornalística de deixar<<strong>br</strong> />

coisas complexas ao sabor do leigo.<<strong>br</strong> />

Drauzio Varella, Riad Younes e Rogério<<strong>br</strong> />

Tuma assinam a coluna Evolução e Saúde,<<strong>br</strong> />

sempre centrada em coisas do interesse da<<strong>br</strong> />

população, do consumo de vitaminas às<<strong>br</strong> />

técnicas médicas mais recentes. Isso elevou<<strong>br</strong> />

o nível do que é publicado. Há trinta anos<<strong>br</strong> />

a divulgação era baseada em “fazedores de<<strong>br</strong> />

notícias médicas” plantados pelo complexo<<strong>br</strong> />

médico-industrial. O contraponto eram<<strong>br</strong> />

colunas heróicas, como as do falecido José<<strong>br</strong> />

Reis na Folha de S. Paulo. Hoje, embora<<strong>br</strong> />

ocorra a indução por parte da indústria, o<<strong>br</strong> />

leitor, se quiser, tem à sua disposição a<<strong>br</strong> />

possibilidade de ter informações qualificadas,<<strong>br</strong> />

filtradas por profissionais de boa<<strong>br</strong> />

formação e com vivência clínica. Em<<strong>br</strong> />

outros países ocorre o mesmo fenômeno.<<strong>br</strong> />

A tiragem das revistas aumenta quando a<<strong>br</strong> />

capa é so<strong>br</strong>e saúde e há picos de audiência<<strong>br</strong> />

quando os canais abordam avanços, reais<<strong>br</strong> />

ou despropositados, na medicina. E cada<<strong>br</strong> />

vez mais profissionais da área médica se<<strong>br</strong> />

tornam jornalistas.<<strong>br</strong> />

Claro que tudo tem dois lados. O<<strong>br</strong> />

telespectador que vê um ator conhecido<<strong>br</strong> />

passar por um transplante bem-sucedido,<<strong>br</strong> />

pensa simplesmente que o mesmo está<<strong>br</strong> />

curado, que nada mais precisa ser feito.<<strong>br</strong> />

Como se não tivesse trocado uma doença<<strong>br</strong> />

terminal, é fato, por outra crônica, o<<strong>br</strong> />

controle da rejeição. Pelo menos, nos<<strong>br</strong> />

chamados transplantes capitais, os que<<strong>br</strong> />

mais impressionam a população.<<strong>br</strong> />

É para adequar os avanços da medicina<<strong>br</strong> />

à realidade própria que precisamos muito dos<<strong>br</strong> />

divulgadores. Naturalmente há que haver<<strong>br</strong> />

cautela. Quando um profissional fala só de<<strong>br</strong> />

si, de suas habilidades e de seus tratamentos<<strong>br</strong> />

miraculosos, é hora de mudar de canal. Ou<<strong>br</strong> />

de revista. Ou de livro. Ou de sítio.


H<<strong>br</strong> />

á 25 anos o Canadian Medical<<strong>br</strong> />

Association Journal (vide referências<<strong>br</strong> />

no decálogo da penúltima<<strong>br</strong> />

página) publicava uma série de<<strong>br</strong> />

artigos que tentavam desmistificar a<<strong>br</strong> />

credibilidade instantânea adquirida por<<strong>br</strong> />

um artigo científico. Ou seja, a aura<<strong>br</strong> />

mística da palavra impressa. E fazia uma<<strong>br</strong> />

“razzia” em avaliação crítica, mostrando<<strong>br</strong> />

como muitos trabalhos publicados em<<strong>br</strong> />

revistas de prestígio, com um “peer review”<<strong>br</strong> />

de notáveis, falhavam no momento de<<strong>br</strong> />

discriminar a falta de evidências. E ia<<strong>br</strong> />

fundo. Metade dos artigos publicados nas<<strong>br</strong> />

revistas de maior credibilidade utilizavam<<strong>br</strong> />

métodos estatísticos inadequados, ou<<strong>br</strong> />

tinham problemas no seu desenho, na<<strong>br</strong> />

definição da amostra, ou erravam na<<strong>br</strong> />

escolha de indicadores e instrumentos.<<strong>br</strong> />

Depois de um quarto de século, como<<strong>br</strong> />

estamos? Melhoraram as revistas mas<<strong>br</strong> />

ainda temos problemas importantes.<<strong>br</strong> />

Outrossim, houve uma incrível expansão<<strong>br</strong> />

de revistas médicas que continuam<<strong>br</strong> />

cometendo os mesmos erros de há 25 anos.<<strong>br</strong> />

E notem, isso depois do advento e consolidação<<strong>br</strong> />

da chamada Medicina Baseada em<<strong>br</strong> />

Evidências. Sabe por quê? Vamos aos<<strong>br</strong> />

fatores: a revisão de pares (peer review) não<<strong>br</strong> />

tem resolvido o problema; o complexo<<strong>br</strong> />

médico-industrial continua plantando os<<strong>br</strong> />

resultados que quer; e as revistas científicas<<strong>br</strong> />

deveriam comentar criticamente os ensaios<<strong>br</strong> />

em vez de publicá-los. Acresce ser comum<<strong>br</strong> />

os ensaios terem como padrão de comparação,<<strong>br</strong> />

terapêutica reconhecidamente<<strong>br</strong> />

inferior; ou usarem comparações com a<<strong>br</strong> />

menor dose do comparativo; ou ao contrário,<<strong>br</strong> />

com a maior dose da droga de comparação,<<strong>br</strong> />

tornando a sua “menos tóxica”; igualmente<<strong>br</strong> />

comum é usarem amostras propositalmente<<strong>br</strong> />

pequenas, buscando múltiplos resultados<<strong>br</strong> />

finais para selecionar os mais favoráveis para<<strong>br</strong> />

publicação; ou estudos multicêntricos,<<strong>br</strong> />

selecionando os resultados dos centros mais<<strong>br</strong> />

favoráveis; ou de subgrupos propícios; ou<<strong>br</strong> />

apresentando os resultados que mais impressionam,<<strong>br</strong> />

por exemplo, redução do risco<<strong>br</strong> />

relativo e não do risco absoluto.<<strong>br</strong> />

Corolário: ou você, caro leitor, aprende<<strong>br</strong> />

a ler criticamente uma revista, ou será<<strong>br</strong> />

enrolado. Assustado? Assuste-se um pouco<<strong>br</strong> />

mais. Há um quarto de século para se manter<<strong>br</strong> />

atualizado na leitura das dez melhores<<strong>br</strong> />

revistas de Clínica Médica, um clínico<<strong>br</strong> />

deveria ler duzentos artigos e setenta<<strong>br</strong> />

imprensa<<strong>br</strong> />

editoriais por mês. A uma expansão de 7%<<strong>br</strong> />

ao ano, faça as contas e atualize os números.<<strong>br</strong> />

Eu escrevi as “dez principais”. Mas não se<<strong>br</strong> />

apoquente. Lutar por autonomia de leitura<<strong>br</strong> />

é sempre bom e você deveria fazê-lo. Se não<<strong>br</strong> />

conseguiu, o mercado está a seu favor. Para<<strong>br</strong> />

preencher essa lacuna lhe apresenta um<<strong>br</strong> />

leque de opções tradicionais ou eletrônicas,<<strong>br</strong> />

mastigadas e baseadas em evidências, de<<strong>br</strong> />

boa qualidade e com preços salgados, para<<strong>br</strong> />

os parcos proventos do esculápio patrício.<<strong>br</strong> />

Ironia à parte, há igualmente publicações<<strong>br</strong> />

“non-profit”, de boa cepa, e mais baratas.<<strong>br</strong> />

Como exemplo Medical Letter, no segmento<<strong>br</strong> />

de avaliação de drogas, de maneira<<strong>br</strong> />

didática e correta. Tudo que o homem<<strong>br</strong> />

complica em seguida simplifica. O tal do<<strong>br</strong> />

mercado se encarrega disso, desde que você<<strong>br</strong> />

tenha lastro. Nada é perfeito!<<strong>br</strong> />

Mas bom mesmo é não depender dos<<strong>br</strong> />

outros. Por isso, cabe a pergunta: onde está<<strong>br</strong> />

o conhecimento nessa pletora de informações?<<strong>br</strong> />

Onde a fidedignidade? Na sua liberdade<<strong>br</strong> />

intelectual, na sua capacidade de ser<<strong>br</strong> />

autônomo, de ler criticamente um artigo. Isso<<strong>br</strong> />

fará com que marche contra a corrente, do<<strong>br</strong> />

lado contrário do analfabetismo científico<<strong>br</strong> />

que, claro, sempre foi o caudal maior.<<strong>br</strong> />

5


imprensa<<strong>br</strong> />

6<<strong>br</strong> />

Q<<strong>br</strong> />

uero<<strong>br</strong> />

contribuir<<strong>br</strong> />

com uma análise e reflexão<<strong>br</strong> />

crítica so<strong>br</strong>e a minha<<strong>br</strong> />

vivência e desafios como<<strong>br</strong> />

fundador e editor - por 8 anos,<<strong>br</strong> />

de uma revista científica - a<<strong>br</strong> />

Revista do Médico Residente. Já<<strong>br</strong> />

havia adquirido uma experiência<<strong>br</strong> />

inicial e inspiradora como editor da<<strong>br</strong> />

Revista Médica do Paraná, órgão oficial<<strong>br</strong> />

da Associação Médica do Paraná.<<strong>br</strong> />

Segundo Su<strong>br</strong>amanyan apud Campello<<strong>br</strong> />

& Campos (1993), o periódico<<strong>br</strong> />

científico possui três funções: 1)<<strong>br</strong> />

registro público do conhecimento, pois<<strong>br</strong> />

qualquer indivíduo pode oferecer à<<strong>br</strong> />

apreciação um trabalho para publicação<<strong>br</strong> />

e, também, pode obter a publicação;<<strong>br</strong> />

2) função social, isto é, ele<<strong>br</strong> />

atribui prestígio e reconhecimento<<strong>br</strong> />

tanto aos autores, quanto aos editores<<strong>br</strong> />

do periódico, aos referees e, inclusive,<<strong>br</strong> />

aos seus assinantes; 3) disseminação<<strong>br</strong> />

da informação, colocando a informação<<strong>br</strong> />

à disposição do leitor, pois, se ela<<strong>br</strong> />

não for publicada, não existe.<<strong>br</strong> />

O primeiro e grande desafio é ter<<strong>br</strong> />

uma fonte financeira de manutenção<<strong>br</strong> />

da publicação de um periódico<<strong>br</strong> />

trimestral, com tiragem importante,<<strong>br</strong> />

para chegar a todo Estado e à maior<<strong>br</strong> />

parte das Instituições Acadêmicas do<<strong>br</strong> />

País, uma vez que a inserção de<<strong>br</strong> />

propagandas da área da saúde é cada<<strong>br</strong> />

vez mais difícil em periódicos que precisam<<strong>br</strong> />

ser indexados e reconhecidos.<<strong>br</strong> />

Mister se faz necessário para se<<strong>br</strong> />

obter outras fontes de financiamento,<<strong>br</strong> />

sem conflito de interesses, a incorporação<<strong>br</strong> />

de profissionais da área de<<strong>br</strong> />

marketing e propaganda.<<strong>br</strong> />

Os Pilares necessários<<strong>br</strong> />

para a publicação dos<<strong>br</strong> />

artigos científicos são os autores,<<strong>br</strong> />

revisores e editores.<<strong>br</strong> />

O editor e editores associados são<<strong>br</strong> />

responsáveis pela manutenção da qualidade<<strong>br</strong> />

científica e editorial da revista. A<<strong>br</strong> />

o<strong>br</strong>igação principal de um editor é<<strong>br</strong> />

garantir que os manuscritos submetidos<<strong>br</strong> />

para a publicação sejam avaliados de<<strong>br</strong> />

forma correta, sem preconceitos e com<<strong>br</strong> />

eventual retorno para correção.<<strong>br</strong> />

O editor é um tipo de ombudsman que<<strong>br</strong> />

deve tentar proteger os diretos dos<<strong>br</strong> />

autores e revisores, devendo ser uma<<strong>br</strong> />

ponte de comunicação entre as partes.<<strong>br</strong> />

Está implícito que só editores-pesquisadores<<strong>br</strong> />

produtivos têm habilidade<<strong>br</strong> />

para avaliar e indicar outros para emitirem<<strong>br</strong> />

seus pareceres.<<strong>br</strong> />

Outro grande desafio é conseguir a<<strong>br</strong> />

indexação na base de dados do Lilacs,<<strong>br</strong> />

junto à Bireme, para depois se conseguir<<strong>br</strong> />

o Scielo. Este é um trabalho intenso,<<strong>br</strong> />

prolongado, laborioso e desgastante para<<strong>br</strong> />

os editores. Porque se precisa atingir<<strong>br</strong> />

todos os desideratos exigidos, e entre<<strong>br</strong> />

alguns, está a personalização da Revista<<strong>br</strong> />

Científica e a publicação de mais de 50%<<strong>br</strong> />

de artigos originais – o que não é fácil –<<strong>br</strong> />

para uma revista que ainda não está<<strong>br</strong> />

indexada – ou seja, este é um dos maiores<<strong>br</strong> />

problemas: vencer este preconceito e<<strong>br</strong> />

romper o círculo vicioso.<<strong>br</strong> />

Daí, reputo imprescindível o tra-<<strong>br</strong> />

balho exercido igualmente por todos<<strong>br</strong> />

os editores vinculados de uma maneira<<strong>br</strong> />

pessoal e responsável com a<<strong>br</strong> />

indexação de mais uma revista<<strong>br</strong> />

científica. Se não houver isto, tudo<<strong>br</strong> />

será inútil e infrutífero.<<strong>br</strong> />

Ou seja, precisamos todo o dia<<strong>br</strong> />

vencer a autofagia acadêmica, o que é<<strong>br</strong> />

muito próprio dos professores dos<<strong>br</strong> />

cursos de medicina da nossa cidade e<<strong>br</strong> />

do nosso Estado!<<strong>br</strong> />

Os requisitos éticos de uma<<strong>br</strong> />

publicação científica estão, hoje em<<strong>br</strong> />

dia, bastante facilitados pelas Comissões<<strong>br</strong> />

de Ética em Pesquisa dos seres humanos<<strong>br</strong> />

e animais de experimentação. Todavia<<strong>br</strong> />

nunca devem os editores e revisores se<<strong>br</strong> />

descurarem de verificar este item e da<<strong>br</strong> />

procedência das instituições.<<strong>br</strong> />

Outro aspecto nas publicações<<strong>br</strong> />

científicas é com relação aos conflitos<<strong>br</strong> />

de interesse e fonte de financiamento.<<strong>br</strong> />

O Comitê Internacional de<<strong>br</strong> />

Editores Médicos (www.icmje.<strong>org</strong>),<<strong>br</strong> />

ativo há mais de 30 anos e que auxilia<<strong>br</strong> />

muito os editores a fazer o seu trabalho<<strong>br</strong> />

com qualidade, vem se preocupando<<strong>br</strong> />

cada vez mais com aspectos<<strong>br</strong> />

éticos e conflitos de interesse.<<strong>br</strong> />

Conflitos podem ocorrer por outras<<strong>br</strong> />

razões, tais como relações pessoais,<<strong>br</strong> />

competitividade acadêmica e paixão<<strong>br</strong> />

intelectual<<strong>br</strong> />

Os conflitos de interesse sempre<<strong>br</strong> />

existiram e continuarão a existir, mas<<strong>br</strong> />

é evidente que a preocupação diuturna<<strong>br</strong> />

com a ética e, principalmente,<<strong>br</strong> />

com a transparência das informações<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e relações entre as partes interessadas<<strong>br</strong> />

(autores, editores, público e<<strong>br</strong> />

patrocinadores) leva ao aprimoramento<<strong>br</strong> />

do processo editorial em sua<<strong>br</strong> />

efetiva contribuição para o desenvolvimento<<strong>br</strong> />

da ciência e da prática<<strong>br</strong> />

médica.<<strong>br</strong> />

Dr. João Carlos Simões (PR).<<strong>br</strong> />

REFERÊNCIA:<<strong>br</strong> />

SUBRAMANYAN, K; CAMPELLO, B. S.;<<strong>br</strong> />

CAMPOS, C. M. Fontes de informação<<strong>br</strong> />

especializada: características e utilização. Belo<<strong>br</strong> />

Horizonte, Editora UFMG, 1993. p. 42-43.


C<<strong>br</strong> />

om certeza, depois da introdução<<strong>br</strong> />

do microcomputador, o<<strong>br</strong> />

processo de ensino-aprendizado<<strong>br</strong> />

da medicina nunca mais foi o<<strong>br</strong> />

mesmo. Nós, os professores um pouco<<strong>br</strong> />

mais velhos e acostumados a ensinar a<<strong>br</strong> />

medicina da maneira pela qual aprendemos,<<strong>br</strong> />

podemos muitas vezes sentir<<strong>br</strong> />

dificuldades para exercer a docência<<strong>br</strong> />

com um armamentário que revolucionou<<strong>br</strong> />

o acesso ao conhecimento e<<strong>br</strong> />

facilitou a sua multiplicação.<<strong>br</strong> />

Se isto é bom ou ruim, é difícil dizer.<<strong>br</strong> />

É tudo uma questão de ponto de vista.<<strong>br</strong> />

É formidável, ao discutir um caso<<strong>br</strong> />

clínico em sala de aula, perceber que a<<strong>br</strong> />

maioria dos alunos ‘saca do bolso’ um<<strong>br</strong> />

palm top e coloca com precisão a<<strong>br</strong> />

porcentagem de aparecimento de<<strong>br</strong> />

determinada complicação de uma<<strong>br</strong> />

doença ou a lista completa dos efeitos<<strong>br</strong> />

colaterais de um medicamento em uso.<<strong>br</strong> />

Por outro lado, é desesperador orientar<<strong>br</strong> />

um trabalho de pesquisa, quando o<<strong>br</strong> />

estudante chega, curvado sob o peso<<strong>br</strong> />

de uma enorme pilha de folhas de<<strong>br</strong> />

papel, que contem, nada mais, nada<<strong>br</strong> />

menos que 7.280 referências so<strong>br</strong>e o<<strong>br</strong> />

assunto a ser estudado.<<strong>br</strong> />

Não se trata de gostar ou não<<strong>br</strong> />

porque a presença do microcomputador<<strong>br</strong> />

na vida do estudante de<<strong>br</strong> />

medicina é fato consumado. Só nos<<strong>br</strong> />

resta nos acomodarmos à situação e<<strong>br</strong> />

aprender a trabalhar com ela.<<strong>br</strong> />

Ao refletir so<strong>br</strong>e as atitudes que um<<strong>br</strong> />

professor pode tomar frente à oferta de<<strong>br</strong> />

conhecimento a ser feita ao aluno nesta<<strong>br</strong> />

situação, temos muito a aprender com<<strong>br</strong> />

o sistema imune humano que, sabiamente,<<strong>br</strong> />

transforma a ameaça de um<<strong>br</strong> />

elemento agressor (antígeno) em anticorpos<<strong>br</strong> />

e células de defesa. Todavia,<<strong>br</strong> />

para que isto ocorra, é necessário que<<strong>br</strong> />

alguns quesitos sejam preenchidos.<<strong>br</strong> />

O primeiro deles é, sem dúvida, o<<strong>br</strong> />

fato de que nosso sistema imune responde<<strong>br</strong> />

a uma dose ideal de antígeno. Quantidades<<strong>br</strong> />

muitas baixas levam à anergia; as<<strong>br</strong> />

muito altas causam tolerância. É como<<strong>br</strong> />

se o sistema imune não se “preocupasse”<<strong>br</strong> />

em responder ao muito pouco e se<<strong>br</strong> />

rendesse de imediato ao excesso. Com o<<strong>br</strong> />

conhecimento, não é diferente. Muito<<strong>br</strong> />

pouco leva a superficialidade; excesso<<strong>br</strong> />

pode causar desânimo e sensação de<<strong>br</strong> />

impotência. Como saber a dose ideal?<<strong>br</strong> />

Nas pesquisas com palavras-chave, o uso<<strong>br</strong> />

de descritores muito específicos levam o<<strong>br</strong> />

aluno a artigos superespecializados que,<<strong>br</strong> />

muitas vezes, por enfocarem um aspecto<<strong>br</strong> />

particular de determinada doença, oferecem<<strong>br</strong> />

um conhecimento fragmentado e<<strong>br</strong> />

impedindo que ele tenha uma visão mais<<strong>br</strong> />

geral do assunto. Por outro lado, descritores<<strong>br</strong> />

mais abertos como, por exemplo,<<strong>br</strong> />

aqueles que designam diagnósticos sin-<<strong>br</strong> />

drômicos, trazem um número excessivo<<strong>br</strong> />

de referências. Talvez até 7.280. Uma<<strong>br</strong> />

maneira de reduzi-las é ensinar o aluno a<<strong>br</strong> />

procurar inicialmente por artigos de revisão<<strong>br</strong> />

e, à medida que o assunto é<<strong>br</strong> />

dominado, partir para a pesquisa mais<<strong>br</strong> />

especializada.<<strong>br</strong> />

Uma segunda lição a aprender com<<strong>br</strong> />

o sistema imune é a de que a rota de<<strong>br</strong> />

administração do antígeno é importante<<strong>br</strong> />

para a sua imunogenicidade. Assim,<<strong>br</strong> />

como as vias subcutânea, oral, aérea ou<<strong>br</strong> />

intradérmica levam a maior ou menor<<strong>br</strong> />

eficiência do processo imunológico, as<<strong>br</strong> />

rotas de pesquisa na internet também<<strong>br</strong> />

trazem diferentes maneiras de se abordar<<strong>br</strong> />

o conhecimento. Pesquisas feitas em<<strong>br</strong> />

sistemas não médicos de busca como<<strong>br</strong> />

google, yahoo, etc... podem levar o aluno<<strong>br</strong> />

a páginas particulares ou mesmo de<<strong>br</strong> />

indivíduos leigos, cujo conteúdo tem<<strong>br</strong> />

valor científico duvidoso. É importante<<strong>br</strong> />

ensinar o estudante a verificar as fontes<<strong>br</strong> />

de seu material de pesquisa dando preferência<<strong>br</strong> />

àquelas que se originam em<<strong>br</strong> />

ensino<<strong>br</strong> />

universidades e órgãos de classe.<<strong>br</strong> />

Por último, é bom lem<strong>br</strong>ar que<<strong>br</strong> />

nem todos os antígenos têm capacidade<<strong>br</strong> />

de despertar a atividade imunogênica<<strong>br</strong> />

no hospedeiro. Aqueles polímeros<<strong>br</strong> />

repetitivos, mesmos grandes e<<strong>br</strong> />

de alto peso molecular não despertam<<strong>br</strong> />

o sistema imune, ao passo que, pequenas<<strong>br</strong> />

substâncias como os haptenos, que<<strong>br</strong> />

precisam se ligar a proteínas carreadoras<<strong>br</strong> />

próprias do <strong>org</strong>anismo, conseguem<<strong>br</strong> />

respostas formidáveis. Da mesma<<strong>br</strong> />

maneira, páginas maravilhosas e com<<strong>br</strong> />

alto teor científico nem sempre conseguirão<<strong>br</strong> />

despertar no aluno o interesse<<strong>br</strong> />

desejado. Todavia, aquelas que exigem<<strong>br</strong> />

um pouco da participação pessoal ou<<strong>br</strong> />

tocam n’alguma forma de interesse<<strong>br</strong> />

individual, conseguem fazê-lo. De<<strong>br</strong> />

nada adianta um maravilhoso atlas de<<strong>br</strong> />

dermatologia com fotografias de alta<<strong>br</strong> />

resolução para um aluno cujo interesse<<strong>br</strong> />

no momento é ortopedia. Entretanto,<<strong>br</strong> />

se as complicações ortopédicas estudadas<<strong>br</strong> />

resultam, por exemplo, de<<strong>br</strong> />

hanseníase, esta pode ser vista com<<strong>br</strong> />

olhos diferentes. É necessário que o<<strong>br</strong> />

professor saiba mostrar um “link”<<strong>br</strong> />

entre os assuntos nem sempre percebido<<strong>br</strong> />

pela simples visitação do local.<<strong>br</strong> />

Assim como o sistema imune pode<<strong>br</strong> />

transformar a estimulação antigênica<<strong>br</strong> />

em vacina para seu próprio proveito<<strong>br</strong> />

ou em doenças de autoimunidade,<<strong>br</strong> />

causando agressões ao corpo humano,<<strong>br</strong> />

na dependência da composição, volume<<strong>br</strong> />

e rota de administração de antígeno,<<strong>br</strong> />

também a oferta de conhecimento<<strong>br</strong> />

necessita ser dosada, selecionada e<<strong>br</strong> />

processada da maneira correta. O professor<<strong>br</strong> />

deve estar atento para que o aluno<<strong>br</strong> />

de medicina consiga apanhar aquele<<strong>br</strong> />

conhecimento oferecido na internet,<<strong>br</strong> />

selecioná-lo, incorporá-lo e transformálo<<strong>br</strong> />

de teoria em boa prática de medicina.<<strong>br</strong> />

Dr.ª Thelma L. Skare (PR).<<strong>br</strong> />

7


imprensa<<strong>br</strong> />

8<<strong>br</strong> />

M<<strong>br</strong> />

uitas pessoas, inclusive médicos<<strong>br</strong> />

e cientistas, primeiro informamse<<strong>br</strong> />

das descobertas da medicina<<strong>br</strong> />

através da mídia. Entretanto, a cobertura<<strong>br</strong> />

de notícias médicas pela imprensa é<<strong>br</strong> />

geralmente imprecisa, superficial ou<<strong>br</strong> />

sensacionalista. Notícias médicas são<<strong>br</strong> />

freqüentemente simplificadas, ou pior,<<strong>br</strong> />

sensacionalisadas por pressão da indústria.<<strong>br</strong> />

Notícias de saúde são um produto que<<strong>br</strong> />

vende bem e que no processo de promoção<<strong>br</strong> />

pode ser distorcido. Além disto, alguns<<strong>br</strong> />

dos temas médicos mais importantes não<<strong>br</strong> />

são cobertos pela mídia.<<strong>br</strong> />

Jornalismo de baixa qualidade na área<<strong>br</strong> />

da política ou negócios pode manchar a<<strong>br</strong> />

reputação; mas em medicina, relatos<<strong>br</strong> />

imprecisos podem gerar falsas esperanças<<strong>br</strong> />

e temores desnecessários. Os cientistas<<strong>br</strong> />

culpam a mídia por esse problema, argumentando<<strong>br</strong> />

que os jornalistas são descuidados<<strong>br</strong> />

quando apresentam os resultados<<strong>br</strong> />

de uma pesquisa médica. Esta, por outro<<strong>br</strong> />

lado, acusa a comunidade médica por<<strong>br</strong> />

obstruir, desorientar ou falhar em alertar a<<strong>br</strong> />

imprensa. Críticos da mídia sugerem que<<strong>br</strong> />

a dificuldade está com a audiência: as<<strong>br</strong> />

pessoas precisam estar mais atentas e<<strong>br</strong> />

céticas quando interpretarem notícias<<strong>br</strong> />

médicas. Tudo leva a crer que ambos<<strong>br</strong> />

(cientistas médicos e jornalistas) dividem<<strong>br</strong> />

a responsabilidade de uma comunicação<<strong>br</strong> />

mais precisa para o público. Mas é preciso<<strong>br</strong> />

distinguir “jornalistas” da “mídia”. Profissão<<strong>br</strong> />

de jornalismo é uma coisa e mídia<<strong>br</strong> />

refere-se à indústria competitiva. Muitas<<strong>br</strong> />

vezes os objetivos e motivação do jornalismo<<strong>br</strong> />

entram em conflito com os da mídia!<<strong>br</strong> />

Os problemas:<<strong>br</strong> />

SENSACIONALISMO<<strong>br</strong> />

Freqüentemente os jornalistas perseguem<<strong>br</strong> />

uma notícia médica como se eles<<strong>br</strong> />

estivessem relatando um seqüestro. A<<strong>br</strong> />

informação é rápida mas sem contexto. O<<strong>br</strong> />

relato é sensacionalista: o jornalista exagera<<strong>br</strong> />

o achado científico e, como conseqüência,<<strong>br</strong> />

o público é enganado so<strong>br</strong>e as<<strong>br</strong> />

implicações do achado.<<strong>br</strong> />

Por outro lado, os cientistas desejam a<<strong>br</strong> />

publicidade. Ajuda na captação de recursos<<strong>br</strong> />

para pesquisa, são valorizados pelas<<strong>br</strong> />

instituições e aumenta a conscientização<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e as suas pesquisas. Mas este esforço<<strong>br</strong> />

em atrair a mídia pode resultar em relatos<<strong>br</strong> />

imprecisos ou incompletos. Da mesma forma<<strong>br</strong> />

que incentivos podem levar a mídia a<<strong>br</strong> />

exagerar afirmações; os jornalistas podem<<strong>br</strong> />

querer oferecer esperança que pode levar a<<strong>br</strong> />

um retrato falso de novos tratamentos.<<strong>br</strong> />

Muitos exemplos podem ser encontrados: um<<strong>br</strong> />

tratamento não usual e invasivo para tratamento<<strong>br</strong> />

da doença de Alzheimer foi amplamente<<strong>br</strong> />

divulgado após um pequeno estudo<<strong>br</strong> />

não-cego; a fluoxetina (Prozac©) foi saudada<<strong>br</strong> />

como a cura certa da depressão quando<<strong>br</strong> />

foi lançada no mercado; melatonina recentemente<<strong>br</strong> />

recebeu um excessivo tratamento<<strong>br</strong> />

positivo da mídia como a “cura” para o<<strong>br</strong> />

envelhecimento. Jornalistas que publicam<<strong>br</strong> />

falsas expectativas podem ser censurados<<strong>br</strong> />

mas os cientistas que fornecem a informação<<strong>br</strong> />

devem dividir a culpa. Uma história negativa<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e os possíveis efeitos deletérios à saúde é<<strong>br</strong> />

outra tática sensacionalista. Relatos imprecisos<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e os riscos à saúde são facilitados<<strong>br</strong> />

pela tendência da mídia e da comunidade<<strong>br</strong> />

medica contra estudos negativos, talvez por<<strong>br</strong> />

que eles não tenham conseqüência. Essa<<strong>br</strong> />

omissão é combinada ao fato de revistas<<strong>br</strong> />

médicas serem menos propensas a publicar<<strong>br</strong> />

estudos com resultados negativos e cientistas<<strong>br</strong> />

menos ainda em submetê-los à publicação.<<strong>br</strong> />

VIÉS E CONFLITOS <strong>DE</strong> INTERESSE<<strong>br</strong> />

Para evitar histórias imprecisas, os repórteres<<strong>br</strong> />

devem examinar a credibilidade e viés das<<strong>br</strong> />

fontes científicas. Mas esse exame não é freqüentemente<<strong>br</strong> />

feito. Por outro lado, os cientistas<<strong>br</strong> />

e instituições não estão errados em convidar<<strong>br</strong> />

a imprensa para co<strong>br</strong>ir suas pesquisas e achados.<<strong>br</strong> />

Os pesquisadores podem evitar imprecisões<<strong>br</strong> />

nos relatos, desencorajando coletivas<<strong>br</strong> />

de imprensa para discutir dados preliminares<<strong>br</strong> />

e exigindo revisão final e aprovação do artigo<<strong>br</strong> />

a ser publicado. A principal fonte do repórter<<strong>br</strong> />

num artigo de pesquisa ou apresentação é o<<strong>br</strong> />

próprio autor ou conferencista. Os repórteres<<strong>br</strong> />

que querem confirmar os dados devem falar<<strong>br</strong> />

também com pessoas que podem criticar o<<strong>br</strong> />

trabalho. Revistas médicas ou instituições<<strong>br</strong> />

podem fornecer nomes de revisores que se<<strong>br</strong> />

dispõem a falar so<strong>br</strong>e o estudo. Os repórteres<<strong>br</strong> />

também estão mais conscientes dos conflitos<<strong>br</strong> />

de interesse por que muitas revistas médicas<<strong>br</strong> />

requerem que conflitos sejam revelados.<<strong>br</strong> />

Algumas vezes um estudo publicado foi<<strong>br</strong> />

financiado pela indústria que produz o<<strong>br</strong> />

medicamento. Relatar conflitos de interesse<<strong>br</strong> />

é crucial, porque permite que os leitores<<strong>br</strong> />

julguem por eles mesmos a validade dos<<strong>br</strong> />

resultados. Recentes acontecimentos<<strong>br</strong> />

levantaram preocupações so<strong>br</strong>e a extensão<<strong>br</strong> />

com que a imprensa pode ser enganada por<<strong>br</strong> />

comentários patrocinados pela indústria e<<strong>br</strong> />

disfarçados como comentários de um cientista<<strong>br</strong> />

ou médico. Algumas vezes um editorial<<strong>br</strong> />

foi escrito por um médico contratado, pago,<<strong>br</strong> />

ou foi parcialmente escrito por firmas de<<strong>br</strong> />

relações públicas representando a indústria<<strong>br</strong> />

farmacêutica. Qualquer carta, editorial ou<<strong>br</strong> />

conferencista deve ser identificado quando<<strong>br</strong> />

patrocinado pela indústria.<<strong>br</strong> />

FALTA <strong>DE</strong> SEGUIMENTO<<strong>br</strong> />

Como o público leigo não tem conhecimento<<strong>br</strong> />

do processo científico, pode dar<<strong>br</strong> />

mais importância do que cientistas aos<<strong>br</strong> />

resultados de um único estudo.Retornar a<<strong>br</strong> />

um assunto que foi relatado com base em<<strong>br</strong> />

dados preliminares pode não interessar aos<<strong>br</strong> />

editores e muitos jornalistas não sabem<<strong>br</strong> />

como o processo científico se dá: estudos -<<strong>br</strong> />

pilotos seguidos de estudos aleatórios,<<strong>br</strong> />

cegos, etc. Se a mídia não publicar artigos<<strong>br</strong> />

de seguimento, acompanhamento de uma<<strong>br</strong> />

notícia médica, o público pode ser enganado.<<strong>br</strong> />

Um exemplo disto foi o relato da<<strong>br</strong> />

suposta associação entre ingestão de café<<strong>br</strong> />

e câncer pancreático. A compreensão do<<strong>br</strong> />

público foi ofuscada pela falta de seguimento.<<strong>br</strong> />

A mídia deu cobertura ao artigo<<strong>br</strong> />

que falava da associação mas não da<<strong>br</strong> />

pesquisa subseqüente, que falhou em<<strong>br</strong> />

confirmar a associação.<<strong>br</strong> />

ÁREAS QUE NÃO SÃO COBERTAS PELA MÍDIA<<strong>br</strong> />

Até há pouco tempo, notícias médicas<<strong>br</strong> />

eram tipicamente escritas por repórteres não<<strong>br</strong> />

especializados. Embora hoje em dia já haja<<strong>br</strong> />

muitos repórteres especializados na área<<strong>br</strong> />

médica, muitos tópicos continuam a ser<<strong>br</strong> />

ignorados pela mídia. A explicação é que<<strong>br</strong> />

alguns jornalistas mantêm o foco em apenas<<strong>br</strong> />

algumas áreas, não de outras que não conseguem<<strong>br</strong> />

obter respostas as suas perguntas.<<strong>br</strong> />

Novamente a responsabilidade recai so<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />

a mídia e a comunidade médica. Semanalmente<<strong>br</strong> />

os repórteres da área médica são<<strong>br</strong> />

o<strong>br</strong>igados a ler artigos ou notícias de revistas<<strong>br</strong> />

médicas específicas. Esta o<strong>br</strong>igação pode<<strong>br</strong> />

desencorajá-los a perseguir uma área de<<strong>br</strong> />

pesquisa, um processo que envolve contatar<<strong>br</strong> />

cientistas, ler revistas mais especializa-


das, etc. Algumas revistas médicas enviam<<strong>br</strong> />

notícias que são “embargadas”, ou sejam, só<<strong>br</strong> />

podem ser divulgadas após uma determinada<<strong>br</strong> />

data. Em parte para evitar o constrangimento<<strong>br</strong> />

dos médicos que recebiam a revista<<strong>br</strong> />

médica após a publicação da notícia na<<strong>br</strong> />

imprensa e eram confrontados com perguntas<<strong>br</strong> />

de seus pacientes so<strong>br</strong>e novidades que não<<strong>br</strong> />

tinham conhecimento. O outro argumento<<strong>br</strong> />

é dar tempo aos repórteres para pesquisarem<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e o tema e encorajar um relato mais<<strong>br</strong> />

preciso. Como jornalistas podem ser motivados<<strong>br</strong> />

a investigar áreas nas quais eles não<<strong>br</strong> />

têm conhecimento e como cientistas e médicos<<strong>br</strong> />

podem ser estimulados a compartilhar<<strong>br</strong> />

problemas nos quais eles são expertos? Temse<<strong>br</strong> />

dito que uma função dos profissionais da<<strong>br</strong> />

saúde pública é trabalhar com a mídia proativamente<<strong>br</strong> />

para evitar distorções, e tornar<<strong>br</strong> />

as notícias de saúde mais compreensíveis.<<strong>br</strong> />

PRESSÃO DAS INSTITUIÇÕES PARA FICAR QUIETO<<strong>br</strong> />

Seria ingenuidade não reconhecer as<<strong>br</strong> />

muitas razões que os cientistas têm para não<<strong>br</strong> />

inha visto pela manhã, junto com<<strong>br</strong> />

T<<strong>br</strong> />

a residente de reumatologia, um<<strong>br</strong> />

caso de paciente com um pseudotumor<<strong>br</strong> />

orbitário, responsivo a corticosteróide<<strong>br</strong> />

e que desenvolvera também quadro<<strong>br</strong> />

de polineuropatia periférica. Não havia<<strong>br</strong> />

evidência clara de uma doença sistêmica,<<strong>br</strong> />

que pudesse explicar os dois achados.<<strong>br</strong> />

Anotei em um papel: “pseudotumor órbita<<strong>br</strong> />

x neuropatia” – e pensei em olhar à noite<<strong>br</strong> />

na internet. Cabe aqui a observação de que<<strong>br</strong> />

não tenho acesso à rede durante a tarde<<strong>br</strong> />

quando estou no consultório. O motivo?<<strong>br</strong> />

Minha certeza de que ao invés de checar a<<strong>br</strong> />

pilha de artigos a ler, entraria on-line entre<<strong>br</strong> />

as consultas e ficaria “navegando”, com o<<strong>br</strong> />

resultado óbvio de no final ter juntado mais<<strong>br</strong> />

falar com a imprensa. A natureza competitiva<<strong>br</strong> />

da ciência e a crescente interdependência com<<strong>br</strong> />

o mundo corporativo deixaram os cientistas<<strong>br</strong> />

temerosos de que se a mídia ou mesmo um<<strong>br</strong> />

colega tomar conhecimento da sua pesquisa<<strong>br</strong> />

prematuramente, a notícia pode afetar<<strong>br</strong> />

adversamente o investimento da empresa ou<<strong>br</strong> />

a resposta do mercado na bolsa de valores.<<strong>br</strong> />

Num recente episódio, uma poderosa<<strong>br</strong> />

indústria farmacêutica ameaçou processar<<strong>br</strong> />

uma universidade americana se determinado<<strong>br</strong> />

estudo fosse publicado. Alguns mem<strong>br</strong>os da<<strong>br</strong> />

universidade abordaram um repórter de um<<strong>br</strong> />

influente jornal que publicou a matéria em<<strong>br</strong> />

primeira página. Um ano depois o artigo foi<<strong>br</strong> />

publicado. A indústria concordou com a<<strong>br</strong> />

publicação devido a intensa especulação na<<strong>br</strong> />

mídia so<strong>br</strong>e os achados e conclusões. Fica<<strong>br</strong> />

evidente que a indústria teria evitado a publicação<<strong>br</strong> />

se a mídia não tivesse se envolvido.<<strong>br</strong> />

CONCLUSÕES<<strong>br</strong> />

Examinando-se a cobertura da medicina<<strong>br</strong> />

pela mídia, verifica-se que o relato de notí-<<strong>br</strong> />

alguns artigos à pilha original.<<strong>br</strong> />

Chegando em casa, janto, <strong>br</strong>inco com a<<strong>br</strong> />

filha um pouco e depois que ela dorme,<<strong>br</strong> />

vamos ao computador lá por volta das 22<<strong>br</strong> />

horas. Tiro do bolso o papelzinho de pesquisa,<<strong>br</strong> />

juntei com outros que já me esperavam. Mas<<strong>br</strong> />

primeiro, o ritual – checar os e-mails do dia:<<strong>br</strong> />

propagandas, rapidamente descartadas;<<strong>br</strong> />

antigos residentes querendo discutir casos;<<strong>br</strong> />

piadas - o<strong>br</strong>igatoriamente lidas na hora, e<<strong>br</strong> />

se boas forem, comunicadas imediatamente<<strong>br</strong> />

à esposa e “espalhadas” para parentes e<<strong>br</strong> />

amigos; uma mensagem so<strong>br</strong>e o livro que eu<<strong>br</strong> />

tenho que revisar e não revisei; outra so<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />

um artigo que devo analisar e não analisei;<<strong>br</strong> />

um e-mail assustador, so<strong>br</strong>e as aulas do congresso,<<strong>br</strong> />

que seriam só para daqui um mês e<<strong>br</strong> />

com as quais eu iria me preocupar no devido<<strong>br</strong> />

tempo, devem agora ser mandadas de<<strong>br</strong> />

antemão para os anais do congresso; e vários<<strong>br</strong> />

“e-tocs” - conteúdos de diversas revistas que<<strong>br</strong> />

saíram naquela semana. Leio os índices, em<<strong>br</strong> />

busca de artigos que me interessem, e como<<strong>br</strong> />

não tenho acesso na íntegra da maioria deles,<<strong>br</strong> />

anoto na minha lista de referências para<<strong>br</strong> />

serem pesquisadas e obtidas nos computadores<<strong>br</strong> />

da universidade; lista esta já com três<<strong>br</strong> />

meses de defasagem em artigos acumulados.<<strong>br</strong> />

Acabo os e-mails, entro no navegador<<strong>br</strong> />

para ir ao site de pesquisa. A página de<<strong>br</strong> />

abertura é do meu provedor, repleta de coisas<<strong>br</strong> />

interessantíssimas: novidades da política que<<strong>br</strong> />

imprensa<<strong>br</strong> />

cias médicas está longe do ideal. Médicos,<<strong>br</strong> />

cientistas e jornalistas dividem a responsabilidade<<strong>br</strong> />

pelo problema. Os jornalistas<<strong>br</strong> />

devem certificar-se de que o relato é preciso,<<strong>br</strong> />

os achados não são descritos de forma<<strong>br</strong> />

exagerada e os conflitos de interesse são<<strong>br</strong> />

informados. Os cientistas não devem ser<<strong>br</strong> />

citados fora do contexto e deve-se ter cuidado<<strong>br</strong> />

para explicar as implicações da suas<<strong>br</strong> />

pesquisas. É devido a experiências nas quais<<strong>br</strong> />

estas mínimas expectativas não foram<<strong>br</strong> />

satisfeitas que médicos e cientistas da saúde<<strong>br</strong> />

vêem os repórteres como seus piores<<strong>br</strong> />

inimigos. Freqüentemente parece que a<<strong>br</strong> />

melhor atitude é não falar com a mídia.<<strong>br</strong> />

Entretanto, ignorar a mídia é negligenciar<<strong>br</strong> />

o profundo efeito que as notícias de saúde<<strong>br</strong> />

têm so<strong>br</strong>e os pacientes. Quando os jornalistas<<strong>br</strong> />

falham na precisão da informação, na<<strong>br</strong> />

identificação de conflitos de interesse, no<<strong>br</strong> />

seguimento de histórias e na cobertura de<<strong>br</strong> />

assuntos de saúde importantes, são os<<strong>br</strong> />

pacientes os que mais sofrem.<<strong>br</strong> />

Dr. Miguel C. Riella (PR).<<strong>br</strong> />

não vi no jornal televisivo (pois estava<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>incando com minha filha, como posto<<strong>br</strong> />

anteriormente), fofocas, acontecimentos<<strong>br</strong> />

mundiais, lançamento de filmes, trailers de<<strong>br</strong> />

filmes, acontecimentos mundiais, fotos<<strong>br</strong> />

imperdíveis. Cada uma dessas chamadas<<strong>br</strong> />

merece uma conferida rápida.<<strong>br</strong> />

Lem<strong>br</strong>o dos filmes que vi recentemente,<<strong>br</strong> />

os quais ainda não foram conferidos no meu<<strong>br</strong> />

site preferido de crítica cinematográfica.<<strong>br</strong> />

Dou uma passadinha lá, e depois em outro<<strong>br</strong> />

site de cinema pra checar se as opiniões<<strong>br</strong> />

batem. Falando de opinião, tenho que<<strong>br</strong> />

checar o meu jornal favorito, pois há<<strong>br</strong> />

colunistas que não se pode deixar de consultar<<strong>br</strong> />

diariamente.<<strong>br</strong> />

Vou então a Pubmed, digito os termos<<strong>br</strong> />

certos e listam-me cerca de 40 artigos com<<strong>br</strong> />

o que eu desejo; alguns realmente “nada a<<strong>br</strong> />

ver”, outros bastante interessantes. Leio os<<strong>br</strong> />

resumos, imprimo alguns, tento ver se<<strong>br</strong> />

consigo algum na íntegra, ponho alguns na<<strong>br</strong> />

lista pra checar na universidade.<<strong>br</strong> />

Lem<strong>br</strong>o de um outro site de pesquisa,<<strong>br</strong> />

digito os mesmos termos, aparecem alguns<<strong>br</strong> />

capítulos de livro so<strong>br</strong>e os temas, um bem<<strong>br</strong> />

amplo so<strong>br</strong>e pseudotumor orbital, que me<<strong>br</strong> />

dedico a ler mais a fundo.<<strong>br</strong> />

Satisfeito, olho no relógio: meia-noite<<strong>br</strong> />

e quinze minutos. Nada como uma pesquisa<<strong>br</strong> />

rápida na internet...<<strong>br</strong> />

Dr. Eduardo S. Paiva (PR).<<strong>br</strong> />

9


imprensa<<strong>br</strong> />

N<<strong>br</strong> />

unca tive problemas sérios com<<strong>br</strong> />

minhas publicações internacionais,<<strong>br</strong> />

desde a primeira no British<<strong>br</strong> />

Journal of Clinical Pharmacology, em 1979,<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e o temazepam. Após o concurso de<<strong>br</strong> />

professor titular na UFPR, em 1991, já com<<strong>br</strong> />

bem mais de uma centena, parei de contar<<strong>br</strong> />

de maneira cartorial, mas ainda foram<<strong>br</strong> />

muitas até o fim dos anos 90.<<strong>br</strong> />

De lá para cá publico ocasionalmente<<strong>br</strong> />

algo de maior impacto, como um novo<<strong>br</strong> />

tratamento de esclerose múltipla, na Acta<<strong>br</strong> />

Neurológica Scandinavica, em 2005.<<strong>br</strong> />

Porém, tive problemas de em<strong>br</strong>omação de<<strong>br</strong> />

vários tipos, em revistas de maior ou menor<<strong>br</strong> />

impacto. Existe política no campo científico,<<strong>br</strong> />

e é normal, pois os donos do poder se<<strong>br</strong> />

esforçam continuamente, investem tempo,<<strong>br</strong> />

verbas e salários, e não apreciam que se<<strong>br</strong> />

rompam as barreiras do “establishment”.<<strong>br</strong> />

Quais as razões do domínio anglosaxão<<strong>br</strong> />

na esfera científica internacional?<<strong>br</strong> />

Um fator básico é que sua língua é a<<strong>br</strong> />

mundial. Uma interpretação histórica<<strong>br</strong> />

indica que a primeira razão do sucesso da<<strong>br</strong> />

língua inglesa é o fato de que o planeta está,<<strong>br</strong> />

na prática, sob influência predominante de<<strong>br</strong> />

ingleses e americanos desde que Sir Francis<<strong>br</strong> />

Drake e outros piratas começaram a<<strong>br</strong> />

aterrorizar os mares, há 4 séculos. A expansão<<strong>br</strong> />

marítima tinha uma base comercial<<strong>br</strong> />

e intelectual muito forte dentro das ilhas<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>itânicas, muito prósperas desde a Idade<<strong>br</strong> />

Média, como atestado pela construção de<<strong>br</strong> />

61 catedrais góticas e normandas, e pela<<strong>br</strong> />

emergência de Cam<strong>br</strong>idge e Oxford como<<strong>br</strong> />

centros de saber, antes da descoberta da<<strong>br</strong> />

América, que refletiu a expansão ibérica.<<strong>br</strong> />

Outro fator é lingüístico: o inglês tem<<strong>br</strong> />

estrutura simples, coloquial e musical. As<<strong>br</strong> />

línguas latinas parecem feitas para ópera e<<strong>br</strong> />

pessoas de alto saber; inglês é popular. Pelo<<strong>br</strong> />

menos em comparação com outras línguas<<strong>br</strong> />

indo-européias e com as do extremo<<strong>br</strong> />

oriente. Em recente viagem pude testemunhar<<strong>br</strong> />

como africanos de várias etnias,<<strong>br</strong> />

vindos de tribos nas savanas, interagem<<strong>br</strong> />

10<<strong>br</strong> />

perfeitamente em inglês, em um cenário de<<strong>br</strong> />

doença grave, com asiáticos, europeus e<<strong>br</strong> />

americanos. Não consigo imaginar o mesmo<<strong>br</strong> />

em alemão, russo, francês ou chinês.<<strong>br</strong> />

Durante este longo predomínio “anglo”<<strong>br</strong> />

explodiu o conhecimento humano, inclusive<<strong>br</strong> />

nas ciências da saúde. Leonardo da Vinci,<<strong>br</strong> />

italiano radicado no sul da França, marca o<<strong>br</strong> />

fim da idade média e o renascimento, não só<<strong>br</strong> />

artístico. Desta época em diante a maioria<<strong>br</strong> />

do conhecimento médico e científico foi<<strong>br</strong> />

gerado na Europa do Norte. A mais antiga<<strong>br</strong> />

sociedade científica existente é a Royal<<strong>br</strong> />

Society, que deu origem à revista Nature. Foi<<strong>br</strong> />

fundada em 1660, em Londres. Lá também,<<strong>br</strong> />

em 1773, começou a mais antiga sociedade<<strong>br</strong> />

médica existente: “The Medical Society”.<<strong>br</strong> />

Outras foram surgindo, muitas pioneiras no<<strong>br</strong> />

mundo, como a Physiological Society, já<<strong>br</strong> />

puramente experimental e sub-especializada,<<strong>br</strong> />

em 1876. Nem se dava o nome de “British”<<strong>br</strong> />

ou “English”, eram únicas.<<strong>br</strong> />

Do outro lado do Atlântico as coisas<<strong>br</strong> />

começaram antes, pararam durante e se reiniciaram<<strong>br</strong> />

após a guerra civil americana e o<<strong>br</strong> />

real estabelecimento do país. A American<<strong>br</strong> />

Association for the Advancement of Science,<<strong>br</strong> />

que deu origem à revista Science, foi fundada<<strong>br</strong> />

em 1848. A American Medical Association<<strong>br</strong> />

foi fundada em 1847, e os oftalmo-otologistas<<strong>br</strong> />

lançaram a revista da sua especialidade em<<strong>br</strong> />

1876, seguido pelos dermatologistas em 1882.<<strong>br</strong> />

Só em 1883 foi lançado o JAMA, dos clínicos.<<strong>br</strong> />

Antes das sociedades os médicos mais<<strong>br</strong> />

eminentes se comunicavam por cartas,<<strong>br</strong> />

muitas vezes levadas em mãos por pacientes<<strong>br</strong> />

que cruzavam o Atlântico ou o Canal da<<strong>br</strong> />

Mancha para ouvir outra opinião so<strong>br</strong>e suas<<strong>br</strong> />

doenças. Dom Pedro II, viajante notório, era<<strong>br</strong> />

cliente de Jean Martin Charcot, neurologista<<strong>br</strong> />

em Paris. Com o advento das sociedades<<strong>br</strong> />

médicas, seus periódicos acabaram gerando<<strong>br</strong> />

as revistas médicas como as temos até hoje,<<strong>br</strong> />

partindo de resenhas de casos clínicos que já<<strong>br</strong> />

existiam pouco antes. A distrofia muscular<<strong>br</strong> />

de Duchenne foi descrita em 1868, em<<strong>br</strong> />

francês, numa revista que já circulava havia<<strong>br</strong> />

uma década. Porém, vários ingleses já<<strong>br</strong> />

haviam descrito a mesma doença 20 anos<<strong>br</strong> />

antes, entre eles Bell, Little, Meryon e<<strong>br</strong> />

Gowers, em revistas e livros.<<strong>br</strong> />

Os europeus se comunicavam muito na<<strong>br</strong> />

virada do século XX. Em 1908 já era<<strong>br</strong> />

fundada Epilepsia, talvez a mais antiga<<strong>br</strong> />

revista de neurologia e psiquiatria, e um<<strong>br</strong> />

bom exemplo: editada a partir de Budapest,<<strong>br</strong> />

os patronos eram um inglês, um<<strong>br</strong> />

holandês, um francês, um alemão e um<<strong>br</strong> />

suíço; tinha artigos em inglês, francês e<<strong>br</strong> />

alemão; precedeu em um ano a fundação<<strong>br</strong> />

da International League Against Epilepsy;<<strong>br</strong> />

foi interrompida pelas duas guerras;<<strong>br</strong> />

acabou dominada pela sociedade americana<<strong>br</strong> />

de epilepsia imediatamente após a<<strong>br</strong> />

segunda guerra, quando os americanos<<strong>br</strong> />

passaram a custear os eventos da sociedade<<strong>br</strong> />

e a publicação da revista.<<strong>br</strong> />

Então, no início da era científica da<<strong>br</strong> />

Medicina, do meio para o fim do século<<strong>br</strong> />

XIX, as primeiras revistas e editoras de<<strong>br</strong> />

livros eram mais igualmente divididas<<strong>br</strong> />

entre os europeus, e americanos se desenvolviam<<strong>br</strong> />

independentemente. Após a<<strong>br</strong> />

primeira guerra, na Europa a supremacia<<strong>br</strong> />

estava passando do Império Austrohúngaro<<strong>br</strong> />

e da Europa central para os países<<strong>br</strong> />

nórdicos, incluindo o norte da França.<<strong>br</strong> />

Com a segunda guerra mundial os anglosaxões<<strong>br</strong> />

deixaram todo o resto do mundo<<strong>br</strong> />

para trás. Trouxeram para a liderança do<<strong>br</strong> />

conhecimento escandinavos e holandeses,<<strong>br</strong> />

que saíram relativamente incólumes da<<strong>br</strong> />

guerra, com poderio financeiro e proximidade<<strong>br</strong> />

geográfica; suas línguas nativas<<strong>br</strong> />

eram tão restritas que nem tentaram<<strong>br</strong> />

torná-las mundiais. Passaram suas revistas<<strong>br</strong> />

para o inglês e pronto.<<strong>br</strong> />

Temos hoje um primeiro mundo científico,<<strong>br</strong> />

anglo-saxão, com as revistas de ponta<<strong>br</strong> />

de ciência básica, como Nature (Londres,<<strong>br</strong> />

1869) e Science (New York, 1880), e as<<strong>br</strong> />

revistas clínicas, como Lancet e New<<strong>br</strong> />

England, British Medical Journal e Annals<<strong>br</strong> />

of Internal Medicine. A segunda linha é


ainda de revistas anglo-saxãs, mas entram<<strong>br</strong> />

as escandinavas. Franceses, alemães e<<strong>br</strong> />

italianos, até pela insistência em manter<<strong>br</strong> />

suas línguas, vêm num terceiro plano. A<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>iga no primeiríssimo time é <strong>br</strong>aba.<<strong>br</strong> />

Publicações significam o resultado de<<strong>br</strong> />

investimentos milionários em pesquisa<<strong>br</strong> />

realizada, e dão direito a verbas ainda<<strong>br</strong> />

maiores para pesquisa futura.<<strong>br</strong> />

A expressão “publish or perish”,<<strong>br</strong> />

traduzida como “publique ou morra”, é<<strong>br</strong> />

típica americana. Acredito que sua origem<<strong>br</strong> />

esteja também após a Segunda Guerra,<<strong>br</strong> />

quando a explosão do conhecimento<<strong>br</strong> />

médico foi patrocinada pelo investimento<<strong>br</strong> />

através dos National Institutes of Health,<<strong>br</strong> />

localizados em Bethesda, arredores da<<strong>br</strong> />

capital americana. Dos anos 50 aos 80,<<strong>br</strong> />

foi dali que saíram ou a pesquisa original<<strong>br</strong> />

ou as verbas para pesquisa extra-mural.<<strong>br</strong> />

As verbas se tornaram dependentes de<<strong>br</strong> />

publicação com impacto apropriado ao<<strong>br</strong> />

tamanho da despesa. Quando entraram<<strong>br</strong> />

as pesquisas patrocinadas por companhias<<strong>br</strong> />

farmacêuticas, nos anos 80 e 90, os<<strong>br</strong> />

americanos aumentaram seu domínio,<<strong>br</strong> />

através da chancela do Federal Drug<<strong>br</strong> />

Administration. Quando uma nova droga<<strong>br</strong> />

é certificada para venda no mercado<<strong>br</strong> />

americano pelo FDA, o mundo aceita.<<strong>br</strong> />

Quando uma nova definição clínica<<strong>br</strong> />

aparece, precisa ter a chancela do Centers<<strong>br</strong> />

for Disease Control, o CDC.<<strong>br</strong> />

Os ingleses entraram junto nesta nova<<strong>br</strong> />

fase, em parte. Grande parte dos grupos<<strong>br</strong> />

americanos, de origem multinacional,<<strong>br</strong> />

eram chefiados por ingleses ou americanos<<strong>br</strong> />

anglo-saxões. Estes só tinham a diferença<<strong>br</strong> />

de ter chegado lá 100 ou 200 anos antes.<<strong>br</strong> />

Europeus, até mexicanos, tinham<<strong>br</strong> />

equivalentes dos NIH nos seus países,<<strong>br</strong> />

como o Medical Research Council na<<strong>br</strong> />

Grã-Bretanha, mas seu volume financeiro<<strong>br</strong> />

era muito menor. Criou-se outra expressão,<<strong>br</strong> />

o “american jargon”, ou jeito<<strong>br</strong> />

americano de publicar, sempre com<<strong>br</strong> />

centenas de pacientes provenientes de<<strong>br</strong> />

algum lugar obscuro como Montana ou<<strong>br</strong> />

Iowa; o mesmo palavreado, refletindo o<<strong>br</strong> />

protocolo formado entre autores, editores<<strong>br</strong> />

e “referees”, algo como juízes.<<strong>br</strong> />

Quando se encaminha um artigo para<<strong>br</strong> />

qualquer revista das chamadas indexadas,<<strong>br</strong> />

o editor tem o poder de encaminhar para<<strong>br</strong> />

avaliação por 2 ou 3 “referees” de sua<<strong>br</strong> />

escolha, que podem ser rivais ou partidários<<strong>br</strong> />

dos autores. Este é o sistema de “peerreview”,<<strong>br</strong> />

revisão por colegas, gente que<<strong>br</strong> />

entende do assunto, e, por definição, tem<<strong>br</strong> />

interesse na publicação mais rápida ou mais<<strong>br</strong> />

lenta daquele artigo. Em geral o sistema é<<strong>br</strong> />

honesto, não há bloqueio, mas há em<strong>br</strong>omação<<strong>br</strong> />

e influência. Tanto que os clonadores<<strong>br</strong> />

coreanos furaram o filtro e deu no que deu,<<strong>br</strong> />

da mesma maneira que os Vioxx e as<<strong>br</strong> />

nifedipinas da vida, entre tantos outros erros<<strong>br</strong> />

dos quais americanos têm tido que se retratar.<<strong>br</strong> />

O sistema europeu do norte, incluindo<<strong>br</strong> />

até australianos, foi mais honesto. O interesse<<strong>br</strong> />

diretamente financeiro, seja de verbas<<strong>br</strong> />

ou mercadológico, era menor. No sistema<<strong>br</strong> />

inglês sempre pesou a tradição científica da<<strong>br</strong> />

Royal Society. A honra máxima para um<<strong>br</strong> />

pesquisador é ser eleito “Fellow of the Royal<<strong>br</strong> />

Society” e o critério inclui ausência de<<strong>br</strong> />

interesse financeiro. O pensamento científico<<strong>br</strong> />

está no âmago da educação <strong>br</strong>itânica. Outra<<strong>br</strong> />

diferença está no fato de que a Medicina<<strong>br</strong> />

européia do norte é socializada. Os médicos<<strong>br</strong> />

ganham salários fixos no fim do mês, e o lucro<<strong>br</strong> />

com pacientes, pesquisa e publicações, é<<strong>br</strong> />

institucional. Americanos levam para casa<<strong>br</strong> />

o dinheiro. Europeus do norte levam o<<strong>br</strong> />

mérito. O dinheiro fica no departamento. É<<strong>br</strong> />

impensável mexer no que é da instituição.<<strong>br</strong> />

Foi nos anos 80 que apareceram os<<strong>br</strong> />

grandes estudos epidemiológicos, que deram<<strong>br</strong> />

origem a muitas normas clínicas atuais, como<<strong>br</strong> />

as de controle de pressão arterial. Estes<<strong>br</strong> />

grandes projetos são mais fáceis em comunidades<<strong>br</strong> />

onde pacientes vão sempre ao<<strong>br</strong> />

mesmo clínico de bairro, ao mesmo hospital<<strong>br</strong> />

regional ou ao mesmo centro nacional de<<strong>br</strong> />

excelência. E não ao que melhor se apresenta<<strong>br</strong> />

mercadologicamente, como acontece na<<strong>br</strong> />

medicina capitalista.<<strong>br</strong> />

Os americanos se ressentiram muito dos<<strong>br</strong> />

avanços epidemiológicos europeus e australianos,<<strong>br</strong> />

e ficaram décadas pressionando pela<<strong>br</strong> />

manutenção dos achados dos seus estudos,<<strong>br</strong> />

como os de Framingham. As normas atuais<<strong>br</strong> />

de pressão arterial e risco de doença vascular<<strong>br</strong> />

já são conhecidas de europeus do norte e de<<strong>br</strong> />

australianos há mais de 15 anos. Porém, só<<strong>br</strong> />

furaram a em<strong>br</strong>omação americana, só<<strong>br</strong> />

obtiveram a chancela do NIH, FDA e CDC,<<strong>br</strong> />

há 3 anos. Assim, os americanos venderam<<strong>br</strong> />

metil-dopa e nifedipina mais 10 anos,<<strong>br</strong> />

imprensa<<strong>br</strong> />

enquanto que em 1980 já se sabia que<<strong>br</strong> />

beta-bloqueadores prolongavam a vida de<<strong>br</strong> />

recém-infartados.<<strong>br</strong> />

Os beta-bloqueadores deram um nó<<strong>br</strong> />

na cardiologia americana de duas décadas,<<strong>br</strong> />

e, por conseqüência, na <strong>br</strong>asileira. Foi<<strong>br</strong> />

muito recentemente que saiu de moda a<<strong>br</strong> />

idéia de que beta-bloqueadores são<<strong>br</strong> />

contra-indicados em insuficiência cardíaca<<strong>br</strong> />

e prejudicam fluxo sanguíneo renal.<<strong>br</strong> />

Ocorreu uma mudança conceitual que<<strong>br</strong> />

atingiu grande parte da cardiologia,<<strong>br</strong> />

nefrologia e medicina interna, e o “mundo”<<strong>br</strong> />

demorou duas décadas e meia para<<strong>br</strong> />

perceber, pela em<strong>br</strong>omação científicomercadológica<<strong>br</strong> />

americana, o “American<<strong>br</strong> />

jargon”. Na epilepsia até hoje persiste o<<strong>br</strong> />

uso excessivo de fenitoína, em detrimento<<strong>br</strong> />

de drogas européias como oxicarbamazepina<<strong>br</strong> />

e lamotrigina.<<strong>br</strong> />

Creio que esta é a diferença entre a<<strong>br</strong> />

imprensa médica americana e inglesa.<<strong>br</strong> />

Americanos tem o poder, com maior<<strong>br</strong> />

reflexo mercadológico, financeiro e de<<strong>br</strong> />

lucro pessoal. Publicações inglesas, que<<strong>br</strong> />

representam a Europa do norte, são mais<<strong>br</strong> />

epidemiológicas e de ciência de ponta,<<strong>br</strong> />

menos por o<strong>br</strong>igação de so<strong>br</strong>evivência<<strong>br</strong> />

financeira, menos por lucro pessoal. Mais<<strong>br</strong> />

por mérito.<<strong>br</strong> />

Não há jeito, é necessário acompanhar<<strong>br</strong> />

os dois tipos. E tomar muito cuidado com<<strong>br</strong> />

conceitos como os da medicina baseada<<strong>br</strong> />

em evidências, pois as evidências que<<strong>br</strong> />

convencem o FDA e CDC custam muitos<<strong>br</strong> />

milhões, que não estão disponíveis para<<strong>br</strong> />

condutas para as quais os direitos de<<strong>br</strong> />

produção já expiraram.<<strong>br</strong> />

Dr. Paulo Rogério Mudrovitsch<<strong>br</strong> />

de Bittencourt (PR).<<strong>br</strong> />

11


poesia<<strong>br</strong> />

12<<strong>br</strong> />

Instantes<<strong>br</strong> />

Se eu pudesse viver novamente a minha vida,<<strong>br</strong> />

na próxima trataria de cometer mais erros.<<strong>br</strong> />

Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.<<strong>br</strong> />

Seria mais tolo ainda do que tenho sido,<<strong>br</strong> />

na verdade bem poucas coisas levaria a sério.<<strong>br</strong> />

Seria menos ingênuo.<<strong>br</strong> />

Correria mais riscos, viajaria mais,<<strong>br</strong> />

contemplaria mais entardeceres,<<strong>br</strong> />

subiria mais montanhas, nadaria mais rios.<<strong>br</strong> />

Iria a mais lugares onde nunca fui,<<strong>br</strong> />

tomaria mais sorvete e menos lentilha,<<strong>br</strong> />

teria mais problemas reais e<<strong>br</strong> />

menos problemas imaginários.<<strong>br</strong> />

Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e<<strong>br</strong> />

produtivamente cada minuto da sua vida;<<strong>br</strong> />

claro que tive momentos de alegria.<<strong>br</strong> />

Mas, se pudesse voltar a viver,<<strong>br</strong> />

trataria somente de ter bons momentos.<<strong>br</strong> />

Porque, se não sabem, disso é feita a vida,<<strong>br</strong> />

só de momentos; não percas o agora.<<strong>br</strong> />

Eu era um desses que nunca ia a parte alguma sem um<<strong>br</strong> />

termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas;<<strong>br</strong> />

se voltasse a viver, começaria a andar descalço<<strong>br</strong> />

no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono.<<strong>br</strong> />

Daria mais voltas na minha rua,<<strong>br</strong> />

contemplaria mais amanheceres<<strong>br</strong> />

E <strong>br</strong>incaria com mais crianças,<<strong>br</strong> />

se tivesse outra vez uma vida pela frente.<<strong>br</strong> />

Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo.<<strong>br</strong> />

O poema acima é prescrito a pacientes com freqüência. Por<<strong>br</strong> />

que médicos o fazem? Porque é comum pacientes se apresentarem<<strong>br</strong> />

no consultório estressados por levarem uma vida sem vazios<<strong>br</strong> />

existenciais. E o poema tenta trazer o valetudinário para um ritmo<<strong>br</strong> />

mais lento e é um alerta a uma vida inaproveitada. Será? A grande<<strong>br</strong> />

ironia é que não se aplica à maioria das pessoas, que são devagar,<<strong>br</strong> />

quase parando. Quem não tem parada o acha lindo. Quem passa<<strong>br</strong> />

a vida em <strong>br</strong>anca nuvem o utiliza para justificar sua vagagem.<<strong>br</strong> />

Uns e outros o acham uma beleza, por que é de auto-ajuda, e o<<strong>br</strong> />

fato de estar associado a um gênio da literatura, o argentino J<strong>org</strong>e<<strong>br</strong> />

Luiz B<strong>org</strong>es, falecido na Suíça em 1986, e considerado um dos<<strong>br</strong> />

maiores escritores do século passado, lhe dá uma aura de<<strong>br</strong> />

preciosidade. Nem é um grande poema, nem é de B<strong>org</strong>es, nem se<<strong>br</strong> />

aplica à maioria das gentes. Como não é de B<strong>org</strong>es se você já o<<strong>br</strong> />

viu por aí impresso nas paredes da vida com seu nome? É desses<<strong>br</strong> />

mistérios como os que cada vez mais se vê na internet. Textos<<strong>br</strong> />

apócrifos.<<strong>br</strong> />

Alguém escreve e nomina outra autoria. Geralmente de<<strong>br</strong> />

alguém famoso de quem gosta, e que gostaria de ser e, portanto,<<strong>br</strong> />

Esquecer, para Pensar!<<strong>br</strong> />

espalha seu próprio texto com uma falsa autoria. A ser lido por<<strong>br</strong> />

uma multidão. Todos os grandes autores sofrem, ou sofreram, com<<strong>br</strong> />

isso. E B<strong>org</strong>es não poderia ser exceção. Para isso existem os<<strong>br</strong> />

autenticadores. No caso, a própria Maria Kodama, inicialmente<<strong>br</strong> />

secretária, depois esposa do autor que diz muito a nós médicos, já<<strong>br</strong> />

que entre outros escreveu, esse sim, um conto genial chamado<<strong>br</strong> />

Funes, o memorioso.<<strong>br</strong> />

Nesse conto descrevia a história de um rapaz uruguaio que,<<strong>br</strong> />

depois de um acidente, ficou com uma memória prodigiosa. Tão<<strong>br</strong> />

perfeita que podia lem<strong>br</strong>ar qualquer detalhe de um dia inteiro.<<strong>br</strong> />

Isto é, conseguia reconstituir na sua inteireza o dia todo.<<strong>br</strong> />

Resultado: não lhe restava tempo suficiente para pensar.<<strong>br</strong> />

Para pensar é necessário poder esquecer, só assim se generaliza.<<strong>br</strong> />

Ou seja, Funes é uma personagem literária que não poderia existir<<strong>br</strong> />

na vida real. É uma personagem magnífica, mas falsa. O que é<<strong>br</strong> />

coisa de gênio.<<strong>br</strong> />

Ah, de quem é o poema? De uma escritora americana de autoajuda,<<strong>br</strong> />

de quem não lem<strong>br</strong>o o nome. Mas não tem importância.<<strong>br</strong> />

Também necessito esquecer, para pensar!


Roteiro<<strong>br</strong> />

Parar. Parar não paro.<<strong>br</strong> />

Esquecer. Esquecer não esqueço<<strong>br</strong> />

Um rio, só se for claro.<<strong>br</strong> />

Correr, sim, mas sem tropeço.<<strong>br</strong> />

Tinha o olhar severo. No fundo<<strong>br</strong> />

Se caráter custa caro<<strong>br</strong> />

Mas se tropeçar não paro deles imagens concretas, embora<<strong>br</strong> />

pago o preço.<<strong>br</strong> />

- não paro nem mereço.<<strong>br</strong> />

também fosse poeta. Nada de<<strong>br</strong> />

Pago embora seja raro.<<strong>br</strong> />

E que ninguém me dê amparo enredar-se, omitir-se, derrubar-<<strong>br</strong> />

Mas o homem não tem avesso<<strong>br</strong> />

nem me pergunte se padeço.<<strong>br</strong> />

se. Esgrimia os donos-do-mundo<<strong>br</strong> />

e o peso da pedra em comparo<<strong>br</strong> />

à força do arremesso.<<strong>br</strong> />

Não sou nem serei avaro<<strong>br</strong> />

- se caráter custa caro<<strong>br</strong> />

pago o preço.<<strong>br</strong> />

com cálculo bem-feito e verbo<<strong>br</strong> />

perfeito. Agrupados com o nexo<<strong>br</strong> />

SIDÓNIO MURALHA<<strong>br</strong> />

que superava a si mesmo.<<strong>br</strong> />

Lisboa, 29 de julho de 1920<<strong>br</strong> />

Sim, tinha o olhar severo.<<strong>br</strong> />

Curitiba, 8 de dezem<strong>br</strong>o de 1982<<strong>br</strong> />

Também as idéias eram escar-<<strong>br</strong> />

Radiografando a Poesia<<strong>br</strong> />

padas, apontando o prumo da<<strong>br</strong> />

justiça, ansiando por uma vida tão<<strong>br</strong> />

Sidónio Muralha, o Poeta da Condição Humana, é da primeira estirpe intelectual<<strong>br</strong> />

de Portugal. Um lisboeta ilustre cujo invulgar amor cívico fez com que o Brasil –<<strong>br</strong> />

igualitária quanto é a morte.<<strong>br</strong> />

Quis a vida que, como médico,<<strong>br</strong> />

especialmente Curitiba – fossem <strong>br</strong>indados com sua presença física e intelectual.<<strong>br</strong> />

Generoso, impulsivo, possuidor de imensa ternura humana calcada no amor cívico e<<strong>br</strong> />

na exigência de Justiça, fez-se porta-voz dos humilhados e ofendidos, missão que dele<<strong>br</strong> />

cruzasse esse olhar severo. Quando<<strong>br</strong> />

o aconselhamento sugeriu a omissão<<strong>br</strong> />

exigiu coragem, perspicácia e altruísmo. Tinha em uma das mãos a poesia e noutra o de um de seus prazeres, o olhar<<strong>br</strong> />

sonho de uma vida solidária e construtiva a todos disponível.<<strong>br</strong> />

Muralha foi um desassom<strong>br</strong>ado que marcou passagem – como “um dardo que eu<<strong>br</strong> />

mesmo lancei”-, seja no lirismo seja na adversidade política que enfrentou, na <strong>br</strong>eve<<strong>br</strong> />

a<strong>br</strong>andou-se, a firmeza não:<<strong>br</strong> />

— Doutor, sou de um tempo que,<<strong>br</strong> />

porém profícua existência. A autodefinição é exemplar:<<strong>br</strong> />

“A minha poesia é uma árvore cheia de frutos / que um sol de tragédia emadurece:/<<strong>br</strong> />

mas eu não os arranco nem procuro:/ - o meu sol de tragédia aquece, aquece,/ e o fruto<<strong>br</strong> />

em Paris, se entrasse num bistrô e<<strong>br</strong> />

pedisse um copo d’água para<<strong>br</strong> />

cai maduro / no chão de minha vida”.<<strong>br</strong> />

acompanhar a refeição, seria enxo-<<strong>br</strong> />

A liberdade de expressão tão almejada e tão fortemente roubada pelo sistema<<strong>br</strong> />

ditatorial em Portugal, levou-o a outras plagas – então Congo Belga, Guiné Bissau,<<strong>br</strong> />

Bruxelas, Dakar, Londres, Paris e por fim Brasil, em São Paulo, onde fundou a 1ª editora<<strong>br</strong> />

tado sem piedade. Não posso<<strong>br</strong> />

atendê-lo nesse quesito. O demais<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>asileira dedicada exclusivamente à produção de poesia para as crianças. À Giroflé se<<strong>br</strong> />

deve a publicação de Os Olhos das Crianças, essas mesmas que ele identificava como as<<strong>br</strong> />

auroras do amanhã:<<strong>br</strong> />

farei.<<strong>br</strong> />

Morreu como viveu, com o<<strong>br</strong> />

“Atrás dos muros altos com garrafas partidas / bem para trás das grades do silêncio olhar severo de quem contempla,<<strong>br</strong> />

imposto / as crianças de olhos de espanto e de medo transidas / o que pedem é que gritemos<<strong>br</strong> />

por elas / as crianças sem livros, sem ternura, sem janelas / as crianças dos versos que são<<strong>br</strong> />

como pedradas”.<<strong>br</strong> />

sem contemplação. À socapa,<<strong>br</strong> />

dulcíssimo.<<strong>br</strong> />

Após a morte do poeta, a viúva dele, Dra. Helen Butler Muralha, cria a Fundação<<strong>br</strong> />

Sidónio Muralha em Curitiba, hoje já com 25 anos de existência, afirmando-se como centro<<strong>br</strong> />

cultural educativo e filosófico, promotor de seminários so<strong>br</strong>e educação, literatura e filosofia,<<strong>br</strong> />

Deleite-se com a poesia de<<strong>br</strong> />

quem sabia que tudo tem custo,<<strong>br</strong> />

em especial os Cursos de Especialização em Filosofia para Crianças, em parcerias com principalmente o caráter. E nunca<<strong>br</strong> />

segmentos <strong>org</strong>anizados da sociedade.<<strong>br</strong> />

Fundamentada no amor e no diálogo fraternal, a filosofia muralhista compõe-se com<<strong>br</strong> />

a verve poética, definida, cristalina, inque<strong>br</strong>antável. Rija, porém cheia de ternura:<<strong>br</strong> />

regateou o preço.<<strong>br</strong> />

O ano dois mil já passou, meu<<strong>br</strong> />

“Se os seres não dialogassem com um vidro entre eles / se cada diálogo não fosse<<strong>br</strong> />

dois monólogos / uma consciência unitária romperia a crisálida / e o ângulo de visão<<strong>br</strong> />

a<strong>br</strong>angeria o universo”.<<strong>br</strong> />

Alzeli Bassetti (PR)<<strong>br</strong> />

caro Sidónio, e dei um beijo nele<<strong>br</strong> />

por ti.<<strong>br</strong> />

poesia<<strong>br</strong> />

13


futebol<<strong>br</strong> />

14<<strong>br</strong> />

P<<strong>br</strong> />

EU,TORCEDOR<<strong>br</strong> />

“E isto lem<strong>br</strong>a uma tristeza<<strong>br</strong> />

E a lem<strong>br</strong>ança é que entristece,<<strong>br</strong> />

Dou à saudade a riqueza<<strong>br</strong> />

De emoção que a hora tece .”<<strong>br</strong> />

rimeiro de julho e o jogo acabou.<<strong>br</strong> />

Também estou acabado. Por isso,<<strong>br</strong> />

tenho que elaborar a derrota. E<<strong>br</strong> />

não estou conseguindo. Como não sou de<<strong>br</strong> />

beber, escrevo. E lhe peço escusas, caro<<strong>br</strong> />

leitor, mas não quero me servir de você,<<strong>br</strong> />

apenas espero que me acompanhe nesta<<strong>br</strong> />

digressão.<<strong>br</strong> />

Ganhos e perdas foram constantes na<<strong>br</strong> />

minha vida. Aliás, como na de qualquer<<strong>br</strong> />

pessoa. Mas sempre diante de qualquer<<strong>br</strong> />

perda me perguntava: tá bom, meu<<strong>br</strong> />

mundo caiu, o que vou ganhar com isso?<<strong>br</strong> />

Essa forma de lidar com as coisas, sempre<<strong>br</strong> />

me ajudou a superar dificuldades. E me<<strong>br</strong> />

deu serenidade para relativizar perdas.<<strong>br</strong> />

Para extrair lições das dificuldades, sejam<<strong>br</strong> />

pessoais ou coletivas, para me ajudar a<<strong>br</strong> />

superar frustrações. Outrossim, sei que<<strong>br</strong> />

tenho limitações, mas também sei que<<strong>br</strong> />

nossos alcances são indefinidos, por isso<<strong>br</strong> />

é necessário ousar criativamente e com<<strong>br</strong> />

muito disciplina. Esse sempre foi meu<<strong>br</strong> />

caminho. Desta forma superei muitas de<<strong>br</strong> />

minhas precariedades. Claro que continuo<<strong>br</strong> />

tendo outras. Não se esgotam. Mas<<strong>br</strong> />

não me assustam, faço delas meus alvos<<strong>br</strong> />

de superação. E sei que necessito da<<strong>br</strong> />

colaboração de muitos outros para poder<<strong>br</strong> />

evoluir. Agora, nas derrotas, sempre caí<<strong>br</strong> />

de pé, <strong>org</strong>ulhosamente. Ferido, mas<<strong>br</strong> />

digno. E não se diga que falar de coisas<<strong>br</strong> />

pessoais seja mais fácil. Não. Quase<<strong>br</strong> />

sempre procuramos desculpas, escamotear<<strong>br</strong> />

nossas deficiências ou projetá-las nos<<strong>br</strong> />

outros. Consciente disso, estou à vontade<<strong>br</strong> />

para comentar essa grande perda.<<strong>br</strong> />

Vejam, no plano pessoal sei do que sou<<strong>br</strong> />

capaz para fazer um diagnóstico, sem me<<strong>br</strong> />

fugir a razão de que seja sempre probabilístico.<<strong>br</strong> />

Sei lidar com uma platéia, sem<<strong>br</strong> />

me arrogar a pretensão de nunca entrar<<strong>br</strong> />

em saia justa. Ou seja, sei claramente o<<strong>br</strong> />

que posso fazer, não fujo aos desafios e tenho<<strong>br</strong> />

ciência de que para meus critérios de<<strong>br</strong> />

exigência pessoal nunca alcancei a excelência<<strong>br</strong> />

pretendida. Mas sempre fui lutador, e<<strong>br</strong> />

alcancei sempre um mínimo desejável.<<strong>br</strong> />

Ao conhecer meus limites sempre estabeleci<<strong>br</strong> />

a estratégia concernente. Adotava a<<strong>br</strong> />

tática que me parecia mais eficaz, tendo a<<strong>br</strong> />

certeza de que a única coisa que nunca<<strong>br</strong> />

faltaria seria esforço pessoal e solidariedade<<strong>br</strong> />

com os meus. Talento, se existisse, ficaria para<<strong>br</strong> />

o acaso, para o imponderável.<<strong>br</strong> />

Daí minha frustração com o jogo acabado<<strong>br</strong> />

e perdido. Perder sim, é do jogo, mas com a<<strong>br</strong> />

dignidade do lutador que nunca desiste. Que<<strong>br</strong> />

chega junto até o fim. Que nunca dá vezo à<<strong>br</strong> />

apatia.Vemos, às vezes, equipes limitadas<<strong>br</strong> />

alcançando vitórias e dizemos: falta-lhes<<strong>br</strong> />

talento. E daí? Venceram, se superaram. Um<<strong>br</strong> />

Kleberson, em 2002, não era limitado em<<strong>br</strong> />

face dos demais? Claro que sim. Felipão<<strong>br</strong> />

soube extrair dele o necessário. E acabou<<strong>br</strong> />

parecendo ser melhor do que era: num<<strong>br</strong> />

conjunto de jogadores mais técnicos, teve o<<strong>br</strong> />

essencial que é a alma. O espírito do vencedor.<<strong>br</strong> />

Isso é que faz a verdadeira diferença.<<strong>br</strong> />

Para meu temperamento sou mais a<<strong>br</strong> />

racionalidade e serenidade do Parreira do<<strong>br</strong> />

que a erupção emotiva do Felipão. Conseguiria<<strong>br</strong> />

ser o primeiro e não o segundo. Mas,<<strong>br</strong> />

neste momento de desilusão, às 19h do dia<<strong>br</strong> />

1.º, e sem mudar uma linha nos próximos<<strong>br</strong> />

dias, qualquer que seja o resultado dos<<strong>br</strong> />

próximos jogos, consigo ver com toda clareza<<strong>br</strong> />

quem é o mais eficaz. É o vulcânico. O que<<strong>br</strong> />

jamais permitiria a indiferença em face do<<strong>br</strong> />

domínio francês. E deixo claro que se fosse<<strong>br</strong> />

construir um modelo de treinador o faria com<<strong>br</strong> />

a serenidade e racionalidade do Parreira e<<strong>br</strong> />

com a impetuosidade e emocionalidade do<<strong>br</strong> />

Felipão. Procuraria o equilí<strong>br</strong>io. Perder, tudo<<strong>br</strong> />

bem; mas sem cabisbaixo. Derrotado moralmente.<<strong>br</strong> />

Como se diz, jamais sair à francesa.<<strong>br</strong> />

Fomos nós que saímos.<<strong>br</strong> />

Em 54 não ouvi a Copa pelo rádio. Em<<strong>br</strong> />

58 e 62 sim, e vi<strong>br</strong>ei muito. Foi minha<<strong>br</strong> />

formação futebolística. Cunhei minhas<<strong>br</strong> />

referências. Em 66 não deu para sofrer, não<<strong>br</strong> />

demos pro começo, culpa da des<strong>org</strong>anização.<<strong>br</strong> />

Em 70, cheguei à Europa logo<<strong>br</strong> />

depois da Copa, peito estufado, e muito<<strong>br</strong> />

badalado pelos amigos que encontrei.<<strong>br</strong> />

Todos maravilhados com nossa Seleção.<<strong>br</strong> />

Em 74, a Holanda com seu futebol surpreendente,<<strong>br</strong> />

ajudou-me a elaborar a perda. Em<<strong>br</strong> />

78, “campeões morais”, estava tudo armado<<strong>br</strong> />

pelo regime militar argentino. O escândalo<<strong>br</strong> />

me apaziguou. Sofri muito em 82, 86 e 90,<<strong>br</strong> />

mas não escreveria o que estou escrevendo<<strong>br</strong> />

depois dessas derrotas. Houve dignidade<<strong>br</strong> />

nas derrotas. Em 94 vi<strong>br</strong>ei muito, apesar<<strong>br</strong> />

do espetáculo limitado, mas havia disciplina,<<strong>br</strong> />

garra e a genialidade do Romário. Em<<strong>br</strong> />

98, o episódio Ronaldinho, qualquer que<<strong>br</strong> />

tenha sido, ajudou-me a dar a volta por<<strong>br</strong> />

cima. Em 2002, mesmo sozinho, foi catártico.<<strong>br</strong> />

Hoje, 19h08 do 1.º de julho, estou<<strong>br</strong> />

desolado e com dificuldade de digerir este<<strong>br</strong> />

nó na garganta.<<strong>br</strong> />

Sei que este artigo sairá daqui alguns<<strong>br</strong> />

meses, defasado no tempo, inoportuno,<<strong>br</strong> />

depois de todas as análises de especialistas.<<strong>br</strong> />

Mas queria deixar registrado no calor da<<strong>br</strong> />

decepção algo que já vi ocorrer várias vezes<<strong>br</strong> />

no front da medicina. Colegas que são<<strong>br</strong> />

verdadeiros gênios intelectuais não darem<<strong>br</strong> />

certo. Sabem por quê? Porque não conseguem<<strong>br</strong> />

fazer o arroz-com-feijão no dia-a-dia.<<strong>br</strong> />

São abúlicos com a rotina, só querem<<strong>br</strong> />

participar de grande lances, vale dizer, de<<strong>br</strong> />

grande diagnósticos e inusitadas empreitadas<<strong>br</strong> />

terapêuticas. E não se encontram. O<<strong>br</strong> />

futebol também é assim. Uma rotina bemfeita<<strong>br</strong> />

tem mais valor; sem excluir o talento.<<strong>br</strong> />

É nisso que eu quero que acredite, caro<<strong>br</strong> />

leitor. Só o esforço continuado redime. Em<<strong>br</strong> />

qualquer profissão. Sem que se exclua a<<strong>br</strong> />

oportunidade para o inusitado, para a<<strong>br</strong> />

invenção, para a alegria.<<strong>br</strong> />

O<strong>br</strong>igado por participar de minha<<strong>br</strong> />

tristeza às 19h20 do 1.º de julho. Mas,<<strong>br</strong> />

acredite, já estou me sentindo melhor.<<strong>br</strong> />

Refeito, em parte. Graças a você. O que<<strong>br</strong> />

demonstra duas coisas: primeiro, que uns<<strong>br</strong> />

precisamos dos outros; segundo, que<<strong>br</strong> />

espírito é fundamental.


A eutanásia (do grego<<strong>br</strong> />

eu = boa, thanatos =<<strong>br</strong> />

morte) é assunto controverso<<strong>br</strong> />

desde a Antigüidade, época em que<<strong>br</strong> />

os grandes pensadores travavam<<strong>br</strong> />

fervorosos debates so<strong>br</strong>e o tema.<<strong>br</strong> />

Prova disso é a passagem “A ninguém<<strong>br</strong> />

darei por comprazer, nem remédio<<strong>br</strong> />

mortal e nem um conselho que induza<<strong>br</strong> />

a perda”, a qual consta no juramento<<strong>br</strong> />

de Hipócrates. Ao longo dos anos, o<<strong>br</strong> />

assunto certamente não deixou de ser<<strong>br</strong> />

discutido incontáveis vezes pelas mais<<strong>br</strong> />

variadas estirpes de pessoas: de<<strong>br</strong> />

médicos, filósofos e advogados a<<strong>br</strong> />

leigos e enfermos.<<strong>br</strong> />

“Mar Adentro” (2004), do diretor<<strong>br</strong> />

chileno-espanhol Alejandro Amenábar<<strong>br</strong> />

– o mesmo de “Os Outros”<<strong>br</strong> />

(2001) e “Preso na Escuridão” (1997)<<strong>br</strong> />

-, trata justamente deste complicado<<strong>br</strong> />

dilema que é a prática da eutanásia.<<strong>br</strong> />

O filme descreve a verídica trajetória<<strong>br</strong> />

do espanhol Ramón Sampedro (personagem<<strong>br</strong> />

vivido por Javier<<strong>br</strong> />

Bardem) em sua luta incansável<<strong>br</strong> />

pelo direito de<<strong>br</strong> />

“morrer dignamente”.<<strong>br</strong> />

Ramón era um jovem<<strong>br</strong> />

aventureiro que, aos 20<<strong>br</strong> />

anos, já havia conhecido o<<strong>br</strong> />

mundo viajando como marinheiro.Ironicamente,<<strong>br</strong> />

foi<<strong>br</strong> />

também no mar que, após<<strong>br</strong> />

um mergulho em água rasa,<<strong>br</strong> />

tornou-se tetraplégico (“o<<strong>br</strong> />

mar me deu vida e depois<<strong>br</strong> />

a tomou”). A partir de<<strong>br</strong> />

então, Ramón passa a encarar<<strong>br</strong> />

a morte como única<<strong>br</strong> />

saída para o fim de seu<<strong>br</strong> />

sofrimento. Preso a uma<<strong>br</strong> />

cama, conta com o suporte<<strong>br</strong> />

e auxílio constante de sua<<strong>br</strong> />

família. Entretanto, nem<<strong>br</strong> />

todos apóiam a sua decisão,<<strong>br</strong> />

foto divulgação<<strong>br</strong> />

Mar Adentro<<strong>br</strong> />

fato que ilustra a delicadeza do tema. Esta<<strong>br</strong> />

divergência de opiniões atinge o clímax<<strong>br</strong> />

na feroz discussão entre Ramón e seu<<strong>br</strong> />

irmão mais velho. A desaprovação da<<strong>br</strong> />

Igreja Católica é evidenciada pela figura<<strong>br</strong> />

do também tetraplégico Padre Francisco<<strong>br</strong> />

de Gáldar que, coincidentemente ou não,<<strong>br</strong> />

torna-se uma figura execrável apesar de<<strong>br</strong> />

sua <strong>br</strong>eve aparição.<<strong>br</strong> />

Ramón é um homem que chora rindo,<<strong>br</strong> />

escreve poesias com geringonças de sua<<strong>br</strong> />

autoria, voa para onde sua imaginação o<<strong>br</strong> />

leva, sonha acordado, mas nunca perde<<strong>br</strong> />

a lucidez e coerência em suas argumentações<<strong>br</strong> />

quando defende sua escolha<<strong>br</strong> />

pela morte.Nesta luta, Ramón conta<<strong>br</strong> />

também com o apoio de uma <strong>org</strong>anização<<strong>br</strong> />

não-governamental e com a advogada<<strong>br</strong> />

Júlia, que se identifica com o caso pelo<<strong>br</strong> />

fato de ser portadora de uma doença<<strong>br</strong> />

progressivamente incapacitante chamada<<strong>br</strong> />

Cadasil (acrônimo em inglês para Arteropatia<<strong>br</strong> />

Cere<strong>br</strong>al Autossômica Dominante<<strong>br</strong> />

com Infartos Subcorticais e Leucoence-<<strong>br</strong> />

cinema<<strong>br</strong> />

falopatia). Com Júlia, Ramón partilha<<strong>br</strong> />

cigarros, discute suas trágicas vidas,<<strong>br</strong> />

publica seu livro de poesias e chega a<<strong>br</strong> />

trocar seu primeiro beijo ao longo dos<<strong>br</strong> />

28 anos desde o seu acidente. Outra<<strong>br</strong> />

mulher de fundamental importância<<strong>br</strong> />

no enredo é Rosa, mãe solteira de dois<<strong>br</strong> />

filhos que, curiosamente, encontra em<<strong>br</strong> />

Ramón um significado para viver.<<strong>br</strong> />

A burocracia judicial (“de um estado<<strong>br</strong> />

que se diz laico”) também é explicitamente<<strong>br</strong> />

questionada na cena que representa<<strong>br</strong> />

o julgamento de Ramón e em seu<<strong>br</strong> />

testamento: “Senhores juízes, negar a<<strong>br</strong> />

propriedade privada de nosso próprio ser<<strong>br</strong> />

é a maior das mentiras culturais”.<<strong>br</strong> />

“Mar Adentro” é um filme que,<<strong>br</strong> />

apesar de posicionar-se a favor da<<strong>br</strong> />

eutanásia ao bater na idéia de que<<strong>br</strong> />

“viver é um direito e não uma o<strong>br</strong>igação”,<<strong>br</strong> />

acende uma reflexão e discussão<<strong>br</strong> />

bastante profundas e questionadoras<<strong>br</strong> />

acerca do tema. Vale a pena conferir.<<strong>br</strong> />

Dr. Guilherme Gadens (PR).<<strong>br</strong> />

15


16<<strong>br</strong> />

N<<strong>br</strong> />

osso Paixão é um apaixonado<<strong>br</strong> />

pelo Le Penseur. À maneira<<strong>br</strong> />

de Rodin, só no Iátrico já<<strong>br</strong> />

produziu dois. Por que à la Rodin?<<strong>br</strong> />

Porque embora O Pensador que<<strong>br</strong> />

ilustra a página seja o mais famoso<<strong>br</strong> />

(verdadeiro ícone da escultura<<strong>br</strong> />

universal tanto que qualquer turista<<strong>br</strong> />

ao visitar Paris quer logo<<strong>br</strong> />

comprar uma réplica em<<strong>br</strong> />

miniatura), o grande<<strong>br</strong> />

escultor francês só<<strong>br</strong> />

na inacabada<<strong>br</strong> />

porta do<<strong>br</strong> />

“Gabiru Lamentador”,<<strong>br</strong> />

de Luiz Gagliastri (PR).<<strong>br</strong> />

inferno, baseada no inferno de Dante,<<strong>br</strong> />

lavrou vários. Rodin era assim, um<<strong>br</strong> />

obsessivo. Embora não lhe faltasse um<<strong>br</strong> />

variado repertório de idéias, formas e<<strong>br</strong> />

temas, quando obcecado com uma,<<strong>br</strong> />

produzia protótipos e esculpia alguns<<strong>br</strong> />

com pequenas variações, o que demonstrava<<strong>br</strong> />

sua permanente insatisfação com o<<strong>br</strong> />

que criava. Tanto melhor para<<strong>br</strong> />

nós, a exaustão de seu perfeccionismo<<strong>br</strong> />

gerou algumas<<strong>br</strong> />

o<strong>br</strong>as-primas. Mas não<<strong>br</strong> />

pense o caro leitor que<<strong>br</strong> />

seu gênio tenha sido<<strong>br</strong> />

reconhecido precocemente.<<strong>br</strong> />

Muito ao<<strong>br</strong> />

contrário. Expôs<<strong>br</strong> />

algumas vezes sem a<<strong>br</strong> />

menor repercussão e,<<strong>br</strong> />

para variar, com<<strong>br</strong> />

críticas acerbas. Mas<<strong>br</strong> />

tinha a perseverança dos<<strong>br</strong> />

imprescindíveis. Na sua<<strong>br</strong> />

solidão — ficou anos<<strong>br</strong> />

encafuado — treinava e<<strong>br</strong> />

aperfeiçoava sua<<strong>br</strong> />

gale<<strong>br</strong> />

força natural. Portanto, o lirismo sensual<<strong>br</strong> />

de O Beijo ou a intensidade trágica d’Os<<strong>br</strong> />

Burgueses de Calais levaram tempo para<<strong>br</strong> />

vir à luz. Embora dominasse suas referências,<<strong>br</strong> />

era cegado pela originalidade. E<<strong>br</strong> />

era lento, o que reduzia sua produção (o<<strong>br</strong> />

leitor deste espaço já sabe que só o que é<<strong>br</strong> />

lento perdura). Mas sua lentidão era<<strong>br</strong> />

calculada. Permitiu torná-lo um mestre<<strong>br</strong> />

nas superfícies anatômicas. E isso não<<strong>br</strong> />

sobejava, queria dar um espírito a suas<<strong>br</strong> />

esculturas. E conseguiu. A mestria de<<strong>br</strong> />

suas reentrâncias, com extensão e<<strong>br</strong> />

profundidade peculiares, permitiu-o<<strong>br</strong> />

expressar a sensação de movimento. Essa<<strong>br</strong> />

sua revolução. O espírito de suas esculturas<<strong>br</strong> />

nos vem da sensação de movimento.<<strong>br</strong> />

Não tinha medo de suas verdades.<<strong>br</strong> />

Assumiu-as com a paixão que detona a<<strong>br</strong> />

vocação criadora, mas sem perder o<<strong>br</strong> />

sentido das proporções. O resultado está<<strong>br</strong> />

lá no Musée Rodin: um espectro de<<strong>br</strong> />

saliências e reentrâncias que vai do<<strong>br</strong> />

desespero quieto ao vendaval de desejos.<<strong>br</strong> />

Quer um exemplo? Quando faz um nu é<<strong>br</strong> />

sempre uma nudez desamparada, absoluta,<<strong>br</strong> />

e única. Alia à paixão e à proporção o<<strong>br</strong> />

senso de responsabilidade autoral. Não<<strong>br</strong> />

faz o que os outros fazem, registra a sua<<strong>br</strong> />

marca, sempre uma digital criativa e<<strong>br</strong> />

singular. Por isso, produziu uma o<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />

fundamental: a que cresce sempre, feito<<strong>br</strong> />

um bosque. Daí ser a paixão de tantos


ia<<strong>br</strong> />

artistas.<<strong>br</strong> />

Todo verdadeiro artista prima<<strong>br</strong> />

pela originalidade. Foi o que fez<<strong>br</strong> />

nosso Paixão, e também o que fez<<strong>br</strong> />

nosso escultor Luiz Gagliastri. Olhem a<<strong>br</strong> />

escultura à esquerda e abaixo. Penso ter<<strong>br</strong> />

sido seu primeiro “pensador”. Uma de<<strong>br</strong> />

suas primeiras peças. O artista original<<strong>br</strong> />

esculpe sua terra, sua gente com carne e<<strong>br</strong> />

osso, mesmo que forjada no ferro. O<<strong>br</strong> />

pensador de Rodin é o homem que percebe<<strong>br</strong> />

o horror e a beleza do espetáculo humano<<strong>br</strong> />

por que pensa. Embora abstraído e mudo,<<strong>br</strong> />

está pleno de visões e pensamentos.<<strong>br</strong> />

Grávido de possibilidades. O corpo<<strong>br</strong> />

inteiro se faz cére<strong>br</strong>o, este mente,<<strong>br</strong> />

porque está em ação. O pensador<<strong>br</strong> />

de Gagliastri não pensa, se<<strong>br</strong> />

lamenta. O corpo não se concentra,<<strong>br</strong> />

se desfaz; não tem<<strong>br</strong> />

músculos, é permeável à ruína;<<strong>br</strong> />

as mãos não sustentam o peso<<strong>br</strong> />

das idéias, clamam sua falta. As<<strong>br</strong> />

lágrimas são pregos que espetam<<strong>br</strong> />

nossa sensibilidade e se perdem sem<<strong>br</strong> />

regar o terreno porque não há seara. Só<<strong>br</strong> />

há desespero, sem esperança.<<strong>br</strong> />

Um pensador é francês, regado a iluminismo,<<strong>br</strong> />

todos o querem; o outro é nordestino,<<strong>br</strong> />

seco no horror da esterilidade de idéias e fome,<<strong>br</strong> />

todos o rejeitam. Um gabiru lamentador, triste<<strong>br</strong> />

imagem de nossa desatenção. Ambos, paixão de<<strong>br</strong> />

artistas, que revelam o sublime e a barbárie.<<strong>br</strong> />

“O Pensador” (Le Penseur),<<strong>br</strong> />

de Auguste Rodin.<<strong>br</strong> />

17


diálogos<<strong>br</strong> />

18<<strong>br</strong> />

A PROVA DO JOÃOZINHO<<strong>br</strong> />

Filho de médico, diligente e aplicado,<<strong>br</strong> />

Joãozinho era daqueles estudantes<<strong>br</strong> />

que, a um só tempo, suscitam<<strong>br</strong> />

respeito e inveja. Mas cá entre nós,<<strong>br</strong> />

era muito chato também.<<strong>br</strong> />

Deu-se que enfiou uma coisa na<<strong>br</strong> />

cabeça e começou a perseguir a<<strong>br</strong> />

professora.<<strong>br</strong> />

— Você de novo Joãozinho, qual<<strong>br</strong> />

o problema?<<strong>br</strong> />

— É que sou muito inteligente<<strong>br</strong> />

para estar no primeiro ano. Minha<<strong>br</strong> />

irmã está no terceiro e não sabe nem<<strong>br</strong> />

um pouco do que eu sei. Quero ir para<<strong>br</strong> />

o terceiro também!<<strong>br</strong> />

A professora no íntimo sabia que<<strong>br</strong> />

não ia conseguir ser dissuasória e<<strong>br</strong> />

mandou-o à diretoria. Enquanto o<<strong>br</strong> />

Joãozinho esperava na ante-sala, a<<strong>br</strong> />

“profe” explica a situação ao diretor.<<strong>br</strong> />

Este, não se fez de rogado, e do alto<<strong>br</strong> />

de sua onipotência diz-lhe:<<strong>br</strong> />

— Deixa comigo! Vou aplicar um<<strong>br</strong> />

A semente da verdade<<strong>br</strong> />

pode demorar a<<strong>br</strong> />

florescer, mas no fim<<strong>br</strong> />

floresce, aconteça o<<strong>br</strong> />

que acontecer.<<strong>br</strong> />

Gregório Marañón (1887-<<strong>br</strong> />

1960), médico e escritor<<strong>br</strong> />

espanhol, escreveu sozinho o<<strong>br</strong> />

Manual de Diagnóstico Etiológico,<<strong>br</strong> />

um clássico.<<strong>br</strong> />

teste no garoto, e como não vai responder<<strong>br</strong> />

a todas as questões, vai mesmo é ficar no<<strong>br</strong> />

primeiro ano.<<strong>br</strong> />

Professora de acordo, chama Joãozinho,<<strong>br</strong> />

cujo pai também já fora terror de<<strong>br</strong> />

turma, e explica-lhe que vai passar por<<strong>br</strong> />

uma prova oral. Terá que responder a<<strong>br</strong> />

todas as perguntas, se for bem-sucedido...<<strong>br</strong> />

O garoto acedeu, e o diretor começou<<strong>br</strong> />

pegando leve:<<strong>br</strong> />

— Quanto é três vezes três?<<strong>br</strong> />

— Nove.<<strong>br</strong> />

— E seis vezes seis?<<strong>br</strong> />

— Trinta e seis.<<strong>br</strong> />

O diretor continua oferecendo questões<<strong>br</strong> />

pertinentes a um aluno do 3° ano e<<strong>br</strong> />

o danado do menino impecavelmente a<<strong>br</strong> />

todas responde. O diretor, visivelmente<<strong>br</strong> />

aturdido com tantas respostas irretorquíveis,<<strong>br</strong> />

diz à professora:<<strong>br</strong> />

— Penso não haver outro jeito, temos<<strong>br</strong> />

que colocá-lo no terceiro.<<strong>br</strong> />

A mestre que o achava purgante não<<strong>br</strong> />

se deu por vencida e pediu para também<<strong>br</strong> />

argüi-lo! Diretor e Little John assentaram<<strong>br</strong> />

e ela veio com tudo. Inconformada com<<strong>br</strong> />

as respostas normais partiu para a<<strong>br</strong> />

abstração e perguntou:<<strong>br</strong> />

— O que é que a vaca tem quatro e<<strong>br</strong> />

eu só tenho duas?<<strong>br</strong> />

Joãozinho pensa e num átimo responde:<<strong>br</strong> />

— Pernas.<<strong>br</strong> />

— E o que há nas suas calças que não<<strong>br</strong> />

há nas minhas?<<strong>br</strong> />

O diretor arregala os olhos mas não<<strong>br</strong> />

tem tempo de interromper.<<strong>br</strong> />

— Bolsos, professora.<<strong>br</strong> />

— O que é que entra na frente na<<strong>br</strong> />

mulher e só pode entrar atrás no<<strong>br</strong> />

homem?<<strong>br</strong> />

Estupefato com os questionamentos<<strong>br</strong> />

o diretor prende a respiração e antes<<strong>br</strong> />

que respire...<<strong>br</strong> />

— A letra “M”, responde o guri.<<strong>br</strong> />

A argüição continuava:<<strong>br</strong> />

— Onde é que a mulher tem o cabelo<<strong>br</strong> />

mais enroladinho?<<strong>br</strong> />

— Na África, responde o garoto de<<strong>br</strong> />

primeira.<<strong>br</strong> />

— Qual o monossílabo tônico que<<strong>br</strong> />

começa com a letra C, e termina com a<<strong>br</strong> />

letra U, ora está sujo, ora está limpo?<<strong>br</strong> />

O diretor está suando frio.<<strong>br</strong> />

— O céu, professora.<<strong>br</strong> />

— O que é que começa com C, tem<<strong>br</strong> />

duas letras, um buraco no meio e eu já<<strong>br</strong> />

dei para várias pessoas?<<strong>br</strong> />

— CD, responde o travesso.<<strong>br</strong> />

Não mais se contendo, o diretor<<strong>br</strong> />

interrompe a prova oral, respira aliviado<<strong>br</strong> />

e diz para professora:<<strong>br</strong> />

— P.Q.P., vamos pôr esse moleque<<strong>br</strong> />

como diretor. Eu mesmo errei todas.<<strong>br</strong> />

Moral: Quem pensa fixo pode<<strong>br</strong> />

perder o siso.<<strong>br</strong> />

J.M. e A.T. (PR).


O exercício da medicina realizado<<strong>br</strong> />

na sua dimensão maior apóia-se em<<strong>br</strong> />

dois pilares: o conhecimento científico<<strong>br</strong> />

e o humanismo. Este conceito, aparentemente<<strong>br</strong> />

óbvio, explica porque o<<strong>br</strong> />

bom médico não é aquele apenas<<strong>br</strong> />

dotado de ilustração técnica, mas,<<strong>br</strong> />

também, aquele que tem compaixão e<<strong>br</strong> />

estabelece relações humanas profundas,<<strong>br</strong> />

aquele que se posta ao lado do seu<<strong>br</strong> />

paciente, como leal companheiro de<<strong>br</strong> />

viagem.<<strong>br</strong> />

Com toda intolerância que prevalece<<strong>br</strong> />

na nossa sociedade, incapaz de aceitar até<<strong>br</strong> />

os fatos médicos inexoráveis, como a<<strong>br</strong> />

decadência física pela idade e as doenças<<strong>br</strong> />

ou a morte incontornáveis, com todo<<strong>br</strong> />

ambiente indigente no qual atua um semnúmero<<strong>br</strong> />

de médicos <strong>br</strong>asileiros e com todas<<strong>br</strong> />

as imperfeições da natureza humana, que<<strong>br</strong> />

atinge inclusive os médicos, é ainda<<strong>br</strong> />

possível produzir bons médicos? Tenho<<strong>br</strong> />

certeza que sim.<<strong>br</strong> />

Michelangelo dizia que cada bloco de<<strong>br</strong> />

mármore <strong>br</strong>uto esconde uma figura<<strong>br</strong> />

esculpida, pronta para ser liberada com<<strong>br</strong> />

um pouco de trabalho e talento. Essa é<<strong>br</strong> />

a função dos educadores médicos.<<strong>br</strong> />

Desco<strong>br</strong>ir nos blocos amorfos os pequeninos<<strong>br</strong> />

Davis e Pietás dotados não<<strong>br</strong> />

apenas de conhecimento para curar,<<strong>br</strong> />

mas principalmente, de sentimentos<<strong>br</strong> />

humanísticos genuínos que irão reconfortar.<<strong>br</strong> />

E moldar nos blocos amorfos<<strong>br</strong> />

cidadãos que, além de amenizar o<<strong>br</strong> />

sofrimento, sejam capazes de influenciar<<strong>br</strong> />

suas comunidades, modificando<<strong>br</strong> />

o cotidiano das pessoas, transformando<<strong>br</strong> />

a sociedade e ajudando a desenhar um<<strong>br</strong> />

novo país.<<strong>br</strong> />

Dr. Miguel Srougi (SP).<<strong>br</strong> />

Jatos de idéias médicas para refletir e criticar<<strong>br</strong> />

Disse Nelson Algren: “Não vá para a cama com quem tem mais<<strong>br</strong> />

problemas do que você”. Digo eu: Vão faltar parceiros!<<strong>br</strong> />

Humilhados pelas leis biológicas que nos reduzem a um<<strong>br</strong> />

agregado de bases, nos consolamos na imortalidade.<<strong>br</strong> />

Fale dos que lhe a<strong>br</strong>em as portas da percepção.<<strong>br</strong> />

Aos que fecham, ignore-os.<<strong>br</strong> />

Os tempos são de grosseria e deboche. Não caia nessa<<strong>br</strong> />

esparrela. Nós, médicos, sempre fomos agentes da<<strong>br</strong> />

cortesia e da delicadeza, sem perder a firmeza.<<strong>br</strong> />

Saiba fazer para fazer saber e mandar. Sem perder a graça.<<strong>br</strong> />

Não lamente os erros. Aprenda com os mesmos. São a<<strong>br</strong> />

matéria-prima de sua própria autolapidaçao.<<strong>br</strong> />

Não se lamente. Vire-se.<<strong>br</strong> />

Nunca se ache bom o bastante.<<strong>br</strong> />

Continue melhorando. Com satisfação.<<strong>br</strong> />

Não seja novidadeiro. Procure as provas.<<strong>br</strong> />

Você conhece seus limites? Isso é muito bom! Agora<<strong>br</strong> />

expanda-os. Nunca conhecemos nosso alcance.<<strong>br</strong> />

Mantenha seus desejos, porque necessários, mas<<strong>br</strong> />

controle-os. A realidade será mais estável.<<strong>br</strong> />

Faça de sua precariedade o estimúlo para seu aperfeiçoamento.<<strong>br</strong> />

reflexão<<strong>br</strong> />

Você anda com relacionamentos complicados? Pelo menos aprenda<<strong>br</strong> />

com os mesmos. Lem<strong>br</strong>e-se da advertência de Sócrates:<<strong>br</strong> />

Aquele que tiver uma boa mulher será um homem feliz;<<strong>br</strong> />

aquele que não a tiver será um filósofo.<<strong>br</strong> />

Compare-se com os melhores. Devem ser sua referência.<<strong>br</strong> />

Mas nunca esqueça que sua (deles) escalada foi<<strong>br</strong> />

árdua. Sem competência ninguém se sustenta.<<strong>br</strong> />

Na flauta, só músicos, e com talento!<<strong>br</strong> />

19


pérolas<<strong>br</strong> />

20<<strong>br</strong> />

O escore de Framinghan avalia a<<strong>br</strong> />

influência de fatores de risco qualitativos<<strong>br</strong> />

(tabagismo e presença ou não de diabetes)<<strong>br</strong> />

e quantitativos (níveis de pressão<<strong>br</strong> />

arterial, colesterol e HDL colesterol) na<<strong>br</strong> />

determinação do risco de infarto do<<strong>br</strong> />

miocárdio, morte coronariana e angina de<<strong>br</strong> />

peito em 10 anos.<<strong>br</strong> />

A aterosclerose é uma doença inflamatória<<strong>br</strong> />

de baixa atividade quando<<strong>br</strong> />

comparada à doença do colágeno.<<strong>br</strong> />

Contudo, quanto maior essa “discreta”<<strong>br</strong> />

atividade, maior será o risco de evento<<strong>br</strong> />

coronário. A determinação da PCR<<strong>br</strong> />

(proteína C reativa) de alta sensibilidade<<strong>br</strong> />

pode ser útil para melhorar a estratificação<<strong>br</strong> />

clínica dada pelos escores de Framinghan<<strong>br</strong> />

em indivíduos com risco intermediário (10<<strong>br</strong> />

a 20% em dez anos de eventos cardiovasculares).<<strong>br</strong> />

Índices acima de 3 mg/l indicam<<strong>br</strong> />

aumento de risco relativo de 2 a 2,5 vezes<<strong>br</strong> />

quando comparados a indivíduos com<<strong>br</strong> />

valores < 1 mg/l.<<strong>br</strong> />

O diagnóstico da síndrome metabólica<<strong>br</strong> />

é feito pela presença de pelo menos três<<strong>br</strong> />

dos cinco critérios a seguir (NCEP ATP III –<<strong>br</strong> />

National Cholesterol Education Programme<<strong>br</strong> />

Adult Treatment Panel III): obesidade<<strong>br</strong> />

abdominal (cintura > 102 cm para homens<<strong>br</strong> />

e 88 cm para mulheres); triglicerídeos ><<strong>br</strong> />

150 mg/dl; HDL-C < 40 mg/dl para<<strong>br</strong> />

homens e 130/85 mmhg; glicemia<<strong>br</strong> />

> 110 mg/dl.<<strong>br</strong> />

Em adultos, a pressão sistólica é<<strong>br</strong> />

definida como o aparecimento do primeiro<<strong>br</strong> />

som regular (fase I de Korotkoff) seguido<<strong>br</strong> />

de batidas regulares que se intensificam<<strong>br</strong> />

com o aumento da velocidade de deflação<<strong>br</strong> />

(manguito). A pressão diastólica é determinada<<strong>br</strong> />

no desaparecimento do som (fase<<strong>br</strong> />

V de Korotkoff).<<strong>br</strong> />

Os dados epidemiológicos demonstram<<strong>br</strong> />

uma relação positiva entre a ingestão de<<strong>br</strong> />

sódio e os níveis de pressão arterial. A orientação<<strong>br</strong> />

das diretrizes de tratamento da hipertensão<<strong>br</strong> />

arterial quanto ao consumo diário de<<strong>br</strong> />

sal é em torno de 100 mmol. A cada redução<<strong>br</strong> />

de 40 mEq/dia de sódio há uma redução<<strong>br</strong> />

média de 4 mmhg na pressão sistólica.<<strong>br</strong> />

A hipertensão arterial acomete cerca de<<strong>br</strong> />

22 a 44% da população adulta <strong>br</strong>asileira. De<<strong>br</strong> />

acordo com a etiologia, mais de 90% dos<<strong>br</strong> />

pacientes hipertensos são considerados como<<strong>br</strong> />

portadores de hipertensão arterial sistêmica<<strong>br</strong> />

primária, essencial ou idiopática. Em cerca de<<strong>br</strong> />

10% dos pacientes ocorre a Hipertensão<<strong>br</strong> />

arterial sistêmica secundária a outras doenças<<strong>br</strong> />

que são responsáveis pela sua gênese.<<strong>br</strong> />

Indícios clínicos de hipertensão arterial<<strong>br</strong> />

sistêmica secundária: início da HAS antes dos<<strong>br</strong> />

30 anos ou após os 50 anos; HAS refratária à<<strong>br</strong> />

terapêutica otimizada; tríade do feocromocitoma:<<strong>br</strong> />

palpitações, sudorese e cefaléia<<strong>br</strong> />

de aparecimento concomitante e em crises;<<strong>br</strong> />

fácies e/ou biótipo de doença que cursa com<<strong>br</strong> />

HAS: doença renal, hipertireoidismo, acromegalia,<<strong>br</strong> />

síndrome de Cushing; presença de<<strong>br</strong> />

sopros abdominais; assimetria de pulsos;<<strong>br</strong> />

aumento da creatinina sérica; hipopotassemia<<strong>br</strong> />

espontânea (< 3 mEq/l); exame de urina<<strong>br</strong> />

anormal (hematúria ou proteinúria).<<strong>br</strong> />

A insuficiência cardíaca considerada hoje<<strong>br</strong> />

como uma síndrome clínica complexa,<<strong>br</strong> />

constitui o principal problema cardiovascular<<strong>br</strong> />

de saúde pública. Há no Brasil cerca de 2<<strong>br</strong> />

milhões de pacientes com ICC e a cada ano<<strong>br</strong> />

240 mil novos casos são diagnosticados. Para<<strong>br</strong> />

tratá-la é fundamental o diagnóstico etiológico<<strong>br</strong> />

(coronariopatia, HAS, valvopatia, miocardiopatias,<<strong>br</strong> />

taqui e <strong>br</strong>adiarritmias) assim como<<strong>br</strong> />

o diagnóstico funcional (Sistólica -60 a 80%<<strong>br</strong> />

dos casos; ocorre por so<strong>br</strong>ecarga de volume<<strong>br</strong> />

acarretando dilatação excêntrica do ventrículo<<strong>br</strong> />

esquerdo e redução da fração de ejeção.<<strong>br</strong> />

Diastólica – 20 a 40% dos casos; ocorre por<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>ecarga de pressão acarretando alteração<<strong>br</strong> />

do relaxamento, redução da elasticidade e<<strong>br</strong> />

aumento da rigidez do ventrículo esquerdo,<<strong>br</strong> />

mantendo preservada a área cardíaca e a<<strong>br</strong> />

fração de ejeção).<<strong>br</strong> />

A estenose aórtica prevalente no homem<<strong>br</strong> />

acima de 50 anos tem como etiologia mais<<strong>br</strong> />

freqüente a valva aórtica bicúspide (50%).<<strong>br</strong> />

A tríade clássica prognóstica é indicativa<<strong>br</strong> />

de tratamento cirúrgico: síncope (taxa de<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>evida 50% em 3 anos); angina pectoris<<strong>br</strong> />

(taxa de so<strong>br</strong>evida 50% em 5 anos);<<strong>br</strong> />

insuficiência cardíaca congestiva (taxa de<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>evida 50% em 2 anos).<<strong>br</strong> />

A insuficiência aórtica é a valvopatia com<<strong>br</strong> />

maior número de sinais semiológicos periféricos:<<strong>br</strong> />

pressão arterial divergente (PAS<<strong>br</strong> />

aumentada e PAD normal/baixa); pulso:<<strong>br</strong> />

amplo de ascensão rápida; Sinal de Corrighan:<<strong>br</strong> />

“martelo d’água; Sinal de Musset: movimentação<<strong>br</strong> />

da cabeça concomitante aos batimentos<<strong>br</strong> />

cardíacos; Sinal de Muller: pulsação<<strong>br</strong> />

sistólica de úvula; Pulso de Quinke: pulsação<<strong>br</strong> />

capilar visível no leito ungueal ou lábio.<<strong>br</strong> />

A síndrome coronariana aguda (IAM e<<strong>br</strong> />

angina instável) representa quase 1/5 dos<<strong>br</strong> />

casos de dor torácica nas salas de emergência,<<strong>br</strong> />

e por possuir uma significativa<<strong>br</strong> />

morbi-mortalidade, a abordagem inicial<<strong>br</strong> />

desses pacientes é sempre feita no sentido<<strong>br</strong> />

de confirmar ou afastar este diagnóstico.<<strong>br</strong> />

As unidades de dor torácica (UDT) foram<<strong>br</strong> />

criadas em 1982, e desde então vêm sendo<<strong>br</strong> />

reconhecidas como um aprimoramento da<<strong>br</strong> />

assistência emergencial. Essas unidades<<strong>br</strong> />

visam: 1 – prover acesso fácil e prioritário<<strong>br</strong> />

ao paciente com dor torácica que procura<<strong>br</strong> />

a sala de emergência; 2 – fornecer uma<<strong>br</strong> />

estratégia diagnóstica e terapêutica<<strong>br</strong> />

<strong>org</strong>anizada na sala de emergência,<<strong>br</strong> />

objetivando rapidez, alta qualidade de<<strong>br</strong> />

cuidados, eficiência e contenção de custos.<<strong>br</strong> />

A semiologia da dor torácica é a principal<<strong>br</strong> />

ferramenta seguida pelo ECG e marcadores<<strong>br</strong> />

de necrose (CPK, CK-mb, troponinas) para<<strong>br</strong> />

avaliar e alocar o paciente com dor torácica<<strong>br</strong> />

na UDT em uma das rotas; Rota 1: IAM com<<strong>br</strong> />

supradesnível do segmento ST; Rota 2: IAM<<strong>br</strong> />

sem supradesnível do segmento ST e Angina<<strong>br</strong> />

Instável; Rota 3: dor torácica provavelmente<<strong>br</strong> />

anginosa; Rota 4: dor torácica definitivamente<<strong>br</strong> />

não anginosa.<<strong>br</strong> />

Dr. Francisco Maia (PR).


A<<strong>br</strong> />

o a<strong>br</strong>açar a medicina como profissão<<strong>br</strong> />

se herda uma postura, uma<<strong>br</strong> />

metodologia especial de se avaliar<<strong>br</strong> />

o mundo e a vida. Afinal a medicina,<<strong>br</strong> />

além de arte, é ciência aplicada. A medicina<<strong>br</strong> />

é, e sempre foi, baseada em evidências.<<strong>br</strong> />

Evidências!<<strong>br</strong> />

O que não for passível de verificação<<strong>br</strong> />

e demonstração, não é admitido como<<strong>br</strong> />

verdade. O tratamento só é instituído<<strong>br</strong> />

depois de estabelecido um diagnóstico. O<<strong>br</strong> />

diagnóstico é alcançado pela análise dos<<strong>br</strong> />

dados reunidos pela anamnese e exames<<strong>br</strong> />

preliminares, desde o clínico até o mais<<strong>br</strong> />

sofisticado exame complementar. O<<strong>br</strong> />

tratamento, por sua vez, é feito por meio<<strong>br</strong> />

de terapias cuja eficácia foi comprovada<<strong>br</strong> />

através de métodos de análise estritamente<<strong>br</strong> />

objetivos. Embora a subjetividade,<<strong>br</strong> />

a intuição, não deva ser desprezada, pois<<strong>br</strong> />

são atributos do cientista e sem os quais<<strong>br</strong> />

não haveria descobertas. Na hora de avaliar<<strong>br</strong> />

fatos é recomendável que a subjetividade<<strong>br</strong> />

fique de fora.<<strong>br</strong> />

O médico moderno não aceita e não<<strong>br</strong> />

aplica o que não tenha sido cabalmente<<strong>br</strong> />

demonstrado; o que não tenha resistido a<<strong>br</strong> />

estudos prospectivos, duplo-cego, randomizados,<<strong>br</strong> />

etc.<<strong>br</strong> />

Pois bem. Convencido da legitimidade<<strong>br</strong> />

“Primum vivere, deinde philosophari”.<<strong>br</strong> />

da metodologia científica, o médico tem a<<strong>br</strong> />

o<strong>br</strong>igação de rever conceitos tidos como<<strong>br</strong> />

verdadeiros por todo mundo, inclusive por<<strong>br</strong> />

seus pais, avós, amigos. Pois, como disse<<strong>br</strong> />

Bertrand Russel, mesmo que cinqüenta<<strong>br</strong> />

milhões de pessoas digam uma bobagem, ela<<strong>br</strong> />

continua sendo uma bobagem.<<strong>br</strong> />

Ao se auto-analisar, o médico verificará<<strong>br</strong> />

que a<strong>br</strong>iga uma grande quantidade de<<strong>br</strong> />

conceitos falsos, meras crenças que não<<strong>br</strong> />

condizem com seu status de cientista, a<<strong>br</strong> />

maioria dos quais lhe foi introjetado desde a<<strong>br</strong> />

infância. Conceitos que ele vem mantendo<<strong>br</strong> />

sem tê-los revisados à luz de todo o conhecimento<<strong>br</strong> />

que a universidade e a vida lhe<<strong>br</strong> />

aportaram. Assim, é essencial que ele reveja<<strong>br</strong> />

com cuidado suas crenças, pois vai verificar<<strong>br</strong> />

que a maioria não passa de mitos pueris que<<strong>br</strong> />

não resistem a mais simples análise.<<strong>br</strong> />

Por lhe ter sido ensinado que duvidar de<<strong>br</strong> />

Deus é um sacrilégio, é usual simplesmente<<strong>br</strong> />

se aceitar o dito pelo não dito, seguindo-se<<strong>br</strong> />

com antigas ilusões. Há, para quem vive da<<strong>br</strong> />

ciência, a o<strong>br</strong>igatoriedade de revisar suas<<strong>br</strong> />

crenças religiosas sem receio, pejo ou preconceitos,<<strong>br</strong> />

sob pena de andar pelo mundo dicotomizado,<<strong>br</strong> />

usando dois pesos e duas medidas:<<strong>br</strong> />

a ciência e a fé. E quem ora usa uma, ora usa<<strong>br</strong> />

outra, está mal resolvido e sua ciência pode<<strong>br</strong> />

cair em descrédito. Do cientista espera-se<<strong>br</strong> />

ciência e fé<<strong>br</strong> />

coerência e coragem intelectual.<<strong>br</strong> />

Religiões, todas elas, são frutos da<<strong>br</strong> />

angústia que assola o homem uma vez que<<strong>br</strong> />

ele é o único animal que sabe que vai<<strong>br</strong> />

morrer. A ignorância do que se passa no<<strong>br</strong> />

além túmulo é geradora de formidável<<strong>br</strong> />

insegurança; o ego exige alguma explicação<<strong>br</strong> />

para este enigma, e se dá por satisfeito<<strong>br</strong> />

mesmo que se trate apenas de uma<<strong>br</strong> />

lenda, uma mitologia.<<strong>br</strong> />

Destituídos dos conhecimentos que<<strong>br</strong> />

hoje se dispõe, nossa ancestralidade inventou<<strong>br</strong> />

todo tipo de fantasia para esta emergência.<<strong>br</strong> />

Criou não somente deuses como<<strong>br</strong> />

verdadeiras burocracias celestiais, bem à<<strong>br</strong> />

feição humana, eivadas com seus vícios e<<strong>br</strong> />

fraquezas. Dá como fato que a morte seria<<strong>br</strong> />

a passagem para uma outra vida, eterna.<<strong>br</strong> />

Há quem descreva, em detalhes, os procedimentos<<strong>br</strong> />

que então se dariam.<<strong>br</strong> />

Portanto, veja se o deus no qual você<<strong>br</strong> />

crê resiste a uma análise honesta e<<strong>br</strong> />

destituída de subjetividades. Verifique se<<strong>br</strong> />

ele subsiste a um estudo prospectivo,<<strong>br</strong> />

duplo-cego e randomizado.<<strong>br</strong> />

Enfim, você não pode exercer uma<<strong>br</strong> />

medicina do século XXI e simultaneamente<<strong>br</strong> />

acalentar mitos oriundos do<<strong>br</strong> />

neolítico.<<strong>br</strong> />

Dr. Cezar Zillig (SC).<<strong>br</strong> />

“Certo tipo de comunicação, tratando de certo tipo de assunto, trazida à<<strong>br</strong> />

atenção de certo tipo de audiência, submetida a certas condições, produz<<strong>br</strong> />

certo tipo de efeito”.<<strong>br</strong> />

Bernard Berelson.<<strong>br</strong> />

Como na medicina, as variáveis são muitas — aqui cinco —, mas não existe um tipo de<<strong>br</strong> />

comunicação melhor que outro. Tudo depende das circunstâncias e do momento em que se<<strong>br</strong> />

dá emissão e recepção. No entanto, como o ser humano tem maior capacidade de retenção<<strong>br</strong> />

visual, o que está impresso tem maior probabilidade de ser retido. Mas por ser múltiplo, o ideal<<strong>br</strong> />

é alimentar todos os sentidos, e conjugá-los.<<strong>br</strong> />

Primeiro viver, depois filosofar. Melhor, primeiro viver e filosofar, depois viver melhor.<<strong>br</strong> />

A vida do médico açambarca tudo ao mesmo tempo; conhecimentos, habilidades e atitudes. Nada deve ser deixado para depois. Deixe<<strong>br</strong> />

uma vida plural te levar, sem perder sua singularidade. Mas seja focado; a dispersão pode ser tentadora mas seus caminhos curtos.<<strong>br</strong> />

Simples colcha-de-retalhos. Se a coberta já esta cosida, dê-lhe unidade e conexão. Nada de seu exclua sem ponto feito.<<strong>br</strong> />

21


memória<<strong>br</strong> />

22<<strong>br</strong> />

A<<strong>br</strong> />

vida do compositor russo Alexandre<<strong>br</strong> />

Borodin, nascido em<<strong>br</strong> />

São Petersburgo, em 1833, foi<<strong>br</strong> />

surpreendente. Ocupou um lugar central<<strong>br</strong> />

na história musical do império tzarista.<<strong>br</strong> />

Na infância começou a demonstrar<<strong>br</strong> />

suas qualidades excepcionais. Filho<<strong>br</strong> />

natural de um príncipe ge<strong>org</strong>iano,<<strong>br</strong> />

recebeu excelente educação. Poliglota na<<strong>br</strong> />

juventude, além do russo, dominava o<<strong>br</strong> />

inglês, francês, alemão e italiano.<<strong>br</strong> />

Desde a infância manifestou dotes<<strong>br</strong> />

musicais. Logo aprendeu vários instrumentos<<strong>br</strong> />

e começou precocemente a<<strong>br</strong> />

compor polcas. Após terminar seus<<strong>br</strong> />

estudos universitários, Borodin conheceu,<<strong>br</strong> />

em 1861, em Heidelberg, uma <strong>br</strong>ilhante<<strong>br</strong> />

pianista russa, Ekaterina Protopopova,<<strong>br</strong> />

que ali se achava em tratamento<<strong>br</strong> />

de tuberculose. O gosto musical<<strong>br</strong> />

os uniu e os levou ao noivado, em Baden-<<strong>br</strong> />

Baden. No mesmo ano seguiram para<<strong>br</strong> />

Pisa, na Itália, em busca de um clima mais<<strong>br</strong> />

favorável para a saúde de Ekaterina. Os<<strong>br</strong> />

noivos voltaram para a Rússia e casaramse<<strong>br</strong> />

em 1863, em São Petersburgo.<<strong>br</strong> />

No ano anterior, 1862, Borodin havia<<strong>br</strong> />

conhecido o maestro Mily Balakirev, em<<strong>br</strong> />

torno de quem gravitavam jovens compositores,<<strong>br</strong> />

entre eles achavam-se Muss<strong>org</strong>ski,<<strong>br</strong> />

Rimsky-Korsakov e Cui. Os três,<<strong>br</strong> />

com Borodin e Balakirev, passaram a<<strong>br</strong> />

dominar o panorama russo da música e<<strong>br</strong> />

foram mais tarde conhecidos e aclamados<<strong>br</strong> />

como Os Cinco Russos, ou também O<<strong>br</strong> />

Punhado de Poderosos. O grupo dedicouse<<strong>br</strong> />

a criar uma música tipicamente russa,<<strong>br</strong> />

liberada de influências européias. Ao<<strong>br</strong> />

contrário de seus contemporâneos Tchaikowski<<strong>br</strong> />

e Korsakov, Borodin não utilizou<<strong>br</strong> />

melodias populares, mas ligou várias de<<strong>br</strong> />

suas o<strong>br</strong>as a lugares e temas russos.<<strong>br</strong> />

Sob influência de Balakirev criou<<strong>br</strong> />

duas sinfonias bem-recebidas. Mas foi em<<strong>br</strong> />

1869 que apareceu sua ópera Príncipe Igor,<<strong>br</strong> />

a mais conhecida de suas o<strong>br</strong>as. A ação<<strong>br</strong> />

passa-se no século XII, quando os polovitsianos,<<strong>br</strong> />

bárbaros e nômades invadiram<<strong>br</strong> />

o sul da Rússia. A ópera inclui as arrebatadoras<<strong>br</strong> />

Danças Polovetsianas de encantadora<<strong>br</strong> />

beleza. Modernamente a ópera foi popularizada<<strong>br</strong> />

na opereta Kismet pela melodia<<strong>br</strong> />

Stranger in Paradise. Entre outras de sua<<strong>br</strong> />

composições está o conhecido poema sinfônico<<strong>br</strong> />

Nas Estepes da Ásia Central e um quarteto<<strong>br</strong> />

de cordas, composto após a morte de<<strong>br</strong> />

Muss<strong>org</strong>ski, a qual aparentemente o inspirou.<<strong>br</strong> />

Sua terceira sinfonia ficou inacabada,<<strong>br</strong> />

como várias de suas o<strong>br</strong>as, incluindo a<<strong>br</strong> />

Príncipe Igor.<<strong>br</strong> />

Sua vida com Ekaterina foi muito feliz,<<strong>br</strong> />

desfrutada em um ambiente doméstico fervilhante<<strong>br</strong> />

pela desordenada presença de artistas<<strong>br</strong> />

e hóspedes inesperados, onde não havia disciplina<<strong>br</strong> />

alguma, nem mesmo para refeições.<<strong>br</strong> />

No início de 1877, embora fosse cardiopata<<strong>br</strong> />

e tivesse a saúde abalada por um<<strong>br</strong> />

surto de cólera, compareceu a um baile a<<strong>br</strong> />

fantasia. Trajava uma camisa vermelha, calça<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>anca e botas tipicamente russas. Participava<<strong>br</strong> />

animadamente da festa e quando<<strong>br</strong> />

ela chegou ao clímax, caiu fulminado por um<<strong>br</strong> />

ataque cardíaco.<<strong>br</strong> />

O extraordinário é que, ainda que seu<<strong>br</strong> />

gênio musical o coloque entre os maiores da<<strong>br</strong> />

Rússia, Alexandre Borodin dizia que a música<<strong>br</strong> />

era um passatempo e um relaxamento<<strong>br</strong> />

para outras ocupações sérias. Ele se referia à<<strong>br</strong> />

Medicina, especialmente à Bioquímica. Aos<<strong>br</strong> />

17 anos, em 1850, matriculou-se na Academia<<strong>br</strong> />

Médico-Cirúrgica de São Petersburgo.<<strong>br</strong> />

Após a graduação, serviu um ano como<<strong>br</strong> />

médico militar, seguido de três anos de<<strong>br</strong> />

estudos na Europa na céle<strong>br</strong>e Universidade<<strong>br</strong> />

de Heidelberg. Durante seu pós-doutorado<<strong>br</strong> />

trabalhou no laboratório de Erlenmeyer,<<strong>br</strong> />

estudando os derivados do benzeno e em<<strong>br</strong> />

Pisa, onde acompanhava sua noiva Ekaterina,<<strong>br</strong> />

quando estudou so<strong>br</strong>e halogenados<<strong>br</strong> />

<strong>org</strong>ânicos. Em 1862, de volta à Academia<<strong>br</strong> />

de São Petersburgo, assumiu o cargo de<<strong>br</strong> />

professor de química <strong>org</strong>ânica, que conservou<<strong>br</strong> />

até o fim da vida. Foi um professor<<strong>br</strong> />

apreciado pelos estudantes e teve papel<<strong>br</strong> />

saliente na criação de uma Faculdade de<<strong>br</strong> />

Medicina para mulheres, que deu início ao<<strong>br</strong> />

predomínio numérico delas na medicina<<strong>br</strong> />

russa, que até hoje persiste.<<strong>br</strong> />

Seus estudos no campo da bioquímica<<strong>br</strong> />

tiveram destaque no mundo acadêmico e<<strong>br</strong> />

compreenderam pesquisas so<strong>br</strong>e a condensação<<strong>br</strong> />

de aldeídos, campo em que concorreu<<strong>br</strong> />

com Kekulé. Os russos o creditam com<<strong>br</strong> />

a descoberta da reação do aldol, juntamente<<strong>br</strong> />

com Wurz. Seus últimos estudos foram<<strong>br</strong> />

so<strong>br</strong>e as reações das amidas, em 1875.<<strong>br</strong> />

Em um congresso da Sociedade Química<<strong>br</strong> />

Russa, em 1871, Borodin apresentou os<<strong>br</strong> />

resultados de pesquisa de seu discípulo<<strong>br</strong> />

Krylov, conduzidas sob sua direção,<<strong>br</strong> />

investigando o conteúdo de gordura do<<strong>br</strong> />

miocárdio afetado pela degeneração<<strong>br</strong> />

gordurosa. Juntamente com a gordura<<strong>br</strong> />

encontraram uma substância parecida<<strong>br</strong> />

com a lecitina. Esperavam que a hidrólise<<strong>br</strong> />

desta substância resultasse em glicerol,<<strong>br</strong> />

mas o produto era colesterol. Na ocasião,<<strong>br</strong> />

o achado de colesterol esterificado entre<<strong>br</strong> />

os lipídios cardíacos não foi considerado<<strong>br</strong> />

de importância. Somente mais tarde<<strong>br</strong> />

verificou-se que os depósitos ateromatosos<<strong>br</strong> />

arteriais têm composição semelhante. O<<strong>br</strong> />

colesterol em estado sólido foi descrito em<<strong>br</strong> />

1784 em cálculos biliares, mas apenas no<<strong>br</strong> />

início do século XX seu papel na gênese<<strong>br</strong> />

da aterosclerose começou a ser conhecido.<<strong>br</strong> />

O trabalho de Krylov e Borodin é tido<<strong>br</strong> />

como o primeiro a estabelecer a relação<<strong>br</strong> />

do colesterol com cardiopatia. Essa<<strong>br</strong> />

contribuição pioneira permanece pouco<<strong>br</strong> />

conhecida. A repercussão da criação<<strong>br</strong> />

musical de Borodin sem dúvida a ofusca...<<strong>br</strong> />

A ligação de Borodin com a patologia<<strong>br</strong> />

cardiovascular foi completada, de maneira<<strong>br</strong> />

irônica, pela constatação necroscópica de<<strong>br</strong> />

sua causa mortis: ruptura de aneurisma de<<strong>br</strong> />

uma artéria coronária.<<strong>br</strong> />

Dr. Iseu Affonso da Costa (PR).


Afinidades<<strong>br</strong> />

Deve ser algo biológico. Os analistas que me<<strong>br</strong> />

perdoem, mas tenho uma queda por barítonos.<<strong>br</strong> />

Me perdoem também os leitores, dada sua pouca<<strong>br</strong> />

idade média, mas muitos não devem conhecer<<strong>br</strong> />

Arthur Prysock. É do mesmo veio do Billy<<strong>br</strong> />

Eckstine. Como diz o Ivan Lessa, são negros com<<strong>br</strong> />

uma voz de couro bem curtido e que, à medida<<strong>br</strong> />

que envelhecem, adquirem uma textura mais<<strong>br</strong> />

profunda, marrom-escuro. O Prysock quase<<strong>br</strong> />

sempre cantou canções de amor e dor, binômio<<strong>br</strong> />

onipresente, tanto na boa quanto na má música.<<strong>br</strong> />

Nessa linha, algumas são até bem <strong>br</strong>egas, como<<strong>br</strong> />

You Are So Beautiful, mas, humano que sou,<<strong>br</strong> />

adoro. Naturalmente não é só a voz. É a competência.<<strong>br</strong> />

O Arthur era da estirpe de cantores que,<<strong>br</strong> />

por mais banal que fosse a letra, conseguia viajar<<strong>br</strong> />

de modo próprio pela melodia. Sabia fazer a coisa<<strong>br</strong> />

de maneira correta e, às vezes, surpreendente.<<strong>br</strong> />

De um standard em levada jazzística a um<<strong>br</strong> />

popezinho bacharachiano. Isso, do Burt Bacharach<<strong>br</strong> />

mesmo. Basta ouvir os álbuns de 1987 e 88,<<strong>br</strong> />

This Guy’s In Love With You e Today’s Love Songs,<<strong>br</strong> />

Tomorrow’s Blues. Alguns são melôs com a<<strong>br</strong> />

dignidade agridoce da realidade. São cantores<<strong>br</strong> />

que dizem uma coisa com a letra e conseguimos<<strong>br</strong> />

subentender outra, oculta e malandra. Ou sofrida<<strong>br</strong> />

mesmo. Dou exemplo: “Jelly, jelly stays on<<strong>br</strong> />

mind...” adivinhou? É aquela fixação mesmo!<<strong>br</strong> />

Conforme a entonação pode ser outras coisas...<<strong>br</strong> />

Ou, “I’ve got you under my skin...”, que pode ser<<strong>br</strong> />

coisa de pele mesmo, ou, mais difícil de<<strong>br</strong> />

desvendar, um pico.<<strong>br</strong> />

Estilistas desse naipe, quando comparamos<<strong>br</strong> />

suas gravações com as de outros menos votados,<<strong>br</strong> />

nos dão subentendidos que vão muito além da<<strong>br</strong> />

letra e da melodia, criam mundos próprios, e nos<<strong>br</strong> />

provocam sonoridades que evocam nosso<<strong>br</strong> />

passado de dores e amores, adensados pela<<strong>br</strong> />

reflexão e experiência, ou simplesmente liberam<<strong>br</strong> />

pulsões de nossa subjetividade. Agora, os<<strong>br</strong> />

analistas gostaram!<<strong>br</strong> />

Sinal das letras<<strong>br</strong> />

Vai Popozuda<<strong>br</strong> />

Equipe Furacão 2000<<strong>br</strong> />

vai vai vai vai<<strong>br</strong> />

vai popozudaa<<strong>br</strong> />

empina a sua bunda<<strong>br</strong> />

ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />

vai popozuda (caramba)<<strong>br</strong> />

empina a sua bunda<<strong>br</strong> />

ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />

vai vai vai vai vai vai...<<strong>br</strong> />

só tem popozão<<strong>br</strong> />

(eu vou te belisca heim)<<strong>br</strong> />

só tem popozaum (caramba)<<strong>br</strong> />

vai popozudaa<<strong>br</strong> />

empina a sua bunda<<strong>br</strong> />

ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />

vai popozudaa<<strong>br</strong> />

empina a sua bunda<<strong>br</strong> />

ohhh raimunda.<<strong>br</strong> />

Olhos Nos Olhos<<strong>br</strong> />

Chico Buarque<<strong>br</strong> />

Quando você me deixou, meu bem<<strong>br</strong> />

Me disse pra ser feliz e passar bem<<strong>br</strong> />

Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci<<strong>br</strong> />

Mas depois, como era de costume, obedeci<<strong>br</strong> />

Quando você me quiser rever<<strong>br</strong> />

Já vai me encontrar refeita, pode crer<<strong>br</strong> />

Olhos nos olhos<<strong>br</strong> />

Quero ver o que você faz<<strong>br</strong> />

Ao sentir que sem você eu passo bem demais<<strong>br</strong> />

E que venho até remoçando<<strong>br</strong> />

Me pego cantando, sem mais, nem por quê<<strong>br</strong> />

Tantas águas rolaram<<strong>br</strong> />

Quantos homens me amaram<<strong>br</strong> />

Bem mais e melhor que você<<strong>br</strong> />

Quando talvez precisar de mim<<strong>br</strong> />

Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim<<strong>br</strong> />

Olhos nos olhos<<strong>br</strong> />

Quero ver o que você diz<<strong>br</strong> />

Quero ver como suporta me ver tão feliz<<strong>br</strong> />

música<<strong>br</strong> />

Pasmem, mas infelizmente é a primeira que figurou nas listas de sucesso da grande<<strong>br</strong> />

maioria das rádios voltadas ao público jovem. Após décadas de luta pela valorização<<strong>br</strong> />

da figura feminina - como “coisa mais linda mais cheia de graça”, mas também<<strong>br</strong> />

como forças do intelecto, da cultura - o que se observa nos refrões mais cantados<<strong>br</strong> />

por um número assom<strong>br</strong>oso de <strong>br</strong>asileiros (e pior, crescente), é um verdadeiro<<strong>br</strong> />

retrocesso, prestigiando exclusivamente a feição carnal e o erotismo vulgar. Desespero!<<strong>br</strong> />

Com tantas barbáries profanadas a cada neologismo chulo, novo refrão hostil,<<strong>br</strong> />

aquela submissão já tão cantada nas peles de “Emílias” e “Amélias” soa como elogio.<<strong>br</strong> />

Então pergunto - sem saudosismo posso lhes garantir - onde se perderam as<<strong>br</strong> />

poesias românticas que se fundiam às melodias harmoniosas de beleza imensuráveis,<<strong>br</strong> />

tão cantadas por Jobim, Vinícius, Chico e tantos outros? Com eles, palavras acariciavam,<<strong>br</strong> />

versos afagavam, sonetos aclamavam, e o amor cantado era formoso, com<<strong>br</strong> />

um romantismo intenso mas ao mesmo tempo sem pieguice. Ainda nas vozes e<<strong>br</strong> />

letras destes, floresceu na música demonstrações de poder feminino, mulheres que<<strong>br</strong> />

após rejeitadas lutavam e se reerguiam, às vezes só para reclamarem prazer num<<strong>br</strong> />

próximo contato “olhos nos olhos”. Surgiram também “Terezinhas”, “Carolinas” e<<strong>br</strong> />

muitas outras que sempre galgavam algo mais: aquelas pensavam, lutavam e amavam (e<<strong>br</strong> />

como amavam!); as “Raimundas” de hoje rebolam, reque<strong>br</strong>am e...de novo, rebolam.<<strong>br</strong> />

Seria isso uma desvalorização da mulher? Uma forma de, sorrateiramente,<<strong>br</strong> />

banalizar o papel da mesma na sociedade? A resposta é fácil: longe disso! O problema<<strong>br</strong> />

real parece ser a superficialidade com que tudo é encarado nos dias de hoje, principalmente<<strong>br</strong> />

entre os jovens. A música parece ser apenas o retrato fiel desta situação...<<strong>br</strong> />

a sonoridade das palavras é supervalorizada ao passo que a mensagem, o cerne, a<<strong>br</strong> />

forma e a estrutura das canções são relegadas. Ao ligar o rádio e sintonizar em uma<<strong>br</strong> />

estação “pop” ou “teen”, prepare-se para ouvir diversas músicas, diferentes ritmos e<<strong>br</strong> />

sons, mas não espere encontrar aquela digna de ser escutada. Infelizmente este tipo<<strong>br</strong> />

de “empo<strong>br</strong>ecimento cultural” vem se propagando como uma tene<strong>br</strong>osa pandemia,<<strong>br</strong> />

estendendo-se para os mais diversos campos (artes, cinema, etc.), com sinais e<<strong>br</strong> />

sintomas óbvios e estarrecedores. O diagnóstico é inequívoco e explícito, já a cura<<strong>br</strong> />

está ao alcance de poucos (mas perdura!).<<strong>br</strong> />

Dr. Guilherme A. Gadens (PR), jovem.<<strong>br</strong> />

23


multifário<<strong>br</strong> />

24<<strong>br</strong> />

N<<strong>br</strong> />

ão há qualquer consenso.<<strong>br</strong> />

O contraditório<<strong>br</strong> />

surge de pronto na<<strong>br</strong> />

medicina e no jornalismo. Enquanto<<strong>br</strong> />

a primeira tem a missão<<strong>br</strong> />

do sigilo, o jornalismo<<strong>br</strong> />

ensina estratégias para a informação<<strong>br</strong> />

e a divulgação de fatos relevantes de<<strong>br</strong> />

interesse público. Médicos e jornalistas,<<strong>br</strong> />

desde a graduação e na atividade<<strong>br</strong> />

profissional, atuam com esses<<strong>br</strong> />

princípios.<<strong>br</strong> />

Em se tratando de homem público<<strong>br</strong> />

um outro componente acresce nesta<<strong>br</strong> />

relação. Enquanto o médico tenta ser<<strong>br</strong> />

ainda mais cuidadoso com as informações<<strong>br</strong> />

que toma conhecimento no<<strong>br</strong> />

exercício de seu mister, o jornalista<<strong>br</strong> />

atua em sentido contrário, e coloca<<strong>br</strong> />

todo seu talento para tornar o fato<<strong>br</strong> />

público e levar à comunidade informações<<strong>br</strong> />

de seu interesse. O contraditório<<strong>br</strong> />

não está restrito à medicina e<<strong>br</strong> />

ao jornalismo. Muitos consideram<<strong>br</strong> />

que o homem público goza de todos<<strong>br</strong> />

os direitos do cidadão comum, enquanto<<strong>br</strong> />

outros defendem que a sociedade<<strong>br</strong> />

tem o direito de saber o estado<<strong>br</strong> />

de saúde de seu representante. O<<strong>br</strong> />

direito à privacidade deverá ser<<strong>br</strong> />

diferente? Considerando o aspecto<<strong>br</strong> />

jurídico, não, pois todos são iguais<<strong>br</strong> />

perante a lei. Mesmo perante essa<<strong>br</strong> />

igualdade, o homem público está<<strong>br</strong> />

sujeito à publicidade das suas atividades<<strong>br</strong> />

de gestor e às decisões pertinentes<<strong>br</strong> />

ao cargo. As outras, de caráter<<strong>br</strong> />

estritamente pessoal, têm a possibilidade<<strong>br</strong> />

do conhecimento público. Exceto<<strong>br</strong> />

nos regimes autoritários, como<<strong>br</strong> />

foi na ditadura <strong>br</strong>asileira com o presidente<<strong>br</strong> />

Costa e Silva e a cubana com<<strong>br</strong> />

Fidel Castro, quando nenhuma informação<<strong>br</strong> />

foi repassada, pois consideraram<<strong>br</strong> />

não apenas sigilo profissional,<<strong>br</strong> />

mas segredo de Estado. Nos estados<<strong>br</strong> />

democráticos a sociedade tem o<<strong>br</strong> />

direito de ser informada se o governante<<strong>br</strong> />

está em plenas condições para<<strong>br</strong> />

o exercício de sua função, pois uma<<strong>br</strong> />

decisão equivocada poderá com-<<strong>br</strong> />

prometer a vida e os destinos da sociedade.<<strong>br</strong> />

Nessas situações o interesse<<strong>br</strong> />

público deve prevalecer so<strong>br</strong>e o privado.<<strong>br</strong> />

Outro dilema é quando a doença é<<strong>br</strong> />

limitante para as atividades da autoridade<<strong>br</strong> />

pública. Exemplo recente foi a doença<<strong>br</strong> />

progressiva do Papa João Paulo II. A<<strong>br</strong> />

Igreja considerou o afastamento e isso foi<<strong>br</strong> />

motivo de discussão pública, no sentido<<strong>br</strong> />

de como lidar frente a situações semelhantes.<<strong>br</strong> />

O parecer do médico nessas<<strong>br</strong> />

situações assume importância pois define<<strong>br</strong> />

os destinos do dirigente de instituições<<strong>br</strong> />

ou mesmo de um país. Além do aspecto<<strong>br</strong> />

jurídico, a condução ética deve prevalecer.<<strong>br</strong> />

Desvios no comportamento ético<<strong>br</strong> />

surgem quando o médico avança nas<<strong>br</strong> />

informações e que<strong>br</strong>a a privacidade do<<strong>br</strong> />

paciente, ou distorce o diagnóstico. O<<strong>br</strong> />

caso Tancredo Neves exemplifica a clara<<strong>br</strong> />

omissão dos fatos a mando de terceiros<<strong>br</strong> />

e de outros interessados. O jornalista<<strong>br</strong> />

rompe com os princípios quando a publicação<<strong>br</strong> />

extrapola a notícia e fica claro interesses<<strong>br</strong> />

comerciais ou mesmo de sensacionalismo.<<strong>br</strong> />

A referência de grande erro<<strong>br</strong> />

jornalístico, foi da Escola de Base de São<<strong>br</strong> />

Paulo, verdadeiro linchamento moral e<<strong>br</strong> />

a promoção de danos irreparáveis aos<<strong>br</strong> />

seus diretores. O médico deve revelar o<<strong>br</strong> />

diagnóstico para a imprensa, apenas com<<strong>br</strong> />

o consentimento do paciente. Deve prevalecer<<strong>br</strong> />

a autonomia do paciente ou do seu<<strong>br</strong> />

representante legal no seu impedimento.<<strong>br</strong> />

No caso do governador Mário Covas,<<strong>br</strong> />

ao tomar conhecimento de que era<<strong>br</strong> />

portador de câncer na bexiga, decidiu<<strong>br</strong> />

pessoalmente divulgá-la. Foi uma decisão<<strong>br</strong> />

ousada e corajosa ao considerar que a<<strong>br</strong> />

sociedade deveria ser informada de sua<<strong>br</strong> />

patologia, tendo em vista o cargo que<<strong>br</strong> />

ocupava e as conseqüências da sua<<strong>br</strong> />

evolução. Tinha pleno conhecimento do<<strong>br</strong> />

desfecho final e agiu com altivez .<<strong>br</strong> />

Esta decisão trouxe benefícios impor-<<strong>br</strong> />

tantes e transparentes. Inaugurou<<strong>br</strong> />

um novo modelo, até<<strong>br</strong> />

então não seguido pelos políticos<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>asileiros. A intenção<<strong>br</strong> />

foi pedagógica, pois a imprensa<<strong>br</strong> />

passou a divulgar as<<strong>br</strong> />

causas prevalentes da doença, os riscos<<strong>br</strong> />

do tabaco e repassou à população a<<strong>br</strong> />

importância do diagnóstico precoce e<<strong>br</strong> />

a prevenção das neoplasias. Possibilitou<<strong>br</strong> />

à comunidade a redução de morbidades<<strong>br</strong> />

e mortalidade. Popularizou uma linguagem<<strong>br</strong> />

científica, os procedimentos e<<strong>br</strong> />

exames. Não é ético apresentar detalhes<<strong>br</strong> />

da doença, muito menos relatar<<strong>br</strong> />

descontroles fisiológicos, promovendo<<strong>br</strong> />

constrangimentos pessoais e aos familiares,<<strong>br</strong> />

pior ainda com o registro de<<strong>br</strong> />

fotos, caracterizando interesses outros<<strong>br</strong> />

e não apenas jornalísticos.<<strong>br</strong> />

Muitas vezes o jornalista na busca<<strong>br</strong> />

do denominada notícia importante, um<<strong>br</strong> />

furo jornalístico, desconsidera a autonomia<<strong>br</strong> />

do paciente, desautoriza a sua<<strong>br</strong> />

vontade ou distorce as informações do<<strong>br</strong> />

médico, ou pior, é capaz de seduzi-lo e<<strong>br</strong> />

obter diagnóstico preferencialmente<<strong>br</strong> />

em detrimento dos demais órgãos da<<strong>br</strong> />

imprensa. O médico deve sempre elaborar<<strong>br</strong> />

boletins claros e concisos para<<strong>br</strong> />

evitar interpretações equivocadas. Não<<strong>br</strong> />

deve agir como um ator, sempre em<<strong>br</strong> />

busca dos holofotes excedendo no seu<<strong>br</strong> />

dever de preservar o sigilo e a discrição.<<strong>br</strong> />

Não é possível transformar em um show<<strong>br</strong> />

as informações. Quais então os limites<<strong>br</strong> />

éticos? A orientação é que ao divulgar<<strong>br</strong> />

noticias so<strong>br</strong>e doenças de homens<<strong>br</strong> />

públicos ou de qualquer cidadão, tanto<<strong>br</strong> />

o médico como o profissional de imprensa<<strong>br</strong> />

respeitem os critérios éticos de<<strong>br</strong> />

suas respectivas atividades. Ao agir<<strong>br</strong> />

com princípios éticos, não restará<<strong>br</strong> />

nenhuma preocupação aos profissionais<<strong>br</strong> />

com referência a limites ou restrições.<<strong>br</strong> />

A atuação deverá ser norteada pelo<<strong>br</strong> />

respeito, bom senso e a dignidade da<<strong>br</strong> />

pessoa humana, quer seja pública ou<<strong>br</strong> />

um ilustre desconhecido. Ética não é<<strong>br</strong> />

quantificada.<<strong>br</strong> />

Luiz Sallim Emed (PR).


semelhança das outras especiali-<<strong>br</strong> />

À<<strong>br</strong> />

dades médicas, exames complementares<<strong>br</strong> />

como o próprio nome<<strong>br</strong> />

refere, deveriam, quando indicados,<<strong>br</strong> />

complementar nossos diagnósticos clínicos.<<strong>br</strong> />

Ou seja, nos auxiliar na definição<<strong>br</strong> />

diagnóstica e até mesmo, em algumas<<strong>br</strong> />

situações, sugerir prognósticos e acompanhamento.<<strong>br</strong> />

Entretanto, nem sempre são<<strong>br</strong> />

utilizados de forma coerente e racional.<<strong>br</strong> />

Inúmeras vezes uma entrevista e exame<<strong>br</strong> />

clínicos superficiais, com tempo inadequado,<<strong>br</strong> />

são completados com solicitação<<strong>br</strong> />

“desenfreada” de exames complementares.<<strong>br</strong> />

Fecha-se um círculo vicioso, onde o médico,<<strong>br</strong> />

pelo fato de ser mal remunerado,<<strong>br</strong> />

tende a dispor de pouco tempo para a<<strong>br</strong> />

entrevista e exame clínico do paciente.<<strong>br</strong> />

Devido a este fato, solicita dispendiosa lista<<strong>br</strong> />

de exames complementares que conseqüentemente<<strong>br</strong> />

levam a parcos honorários<<strong>br</strong> />

pagos pela consulta, so<strong>br</strong>etudo no sistema<<strong>br</strong> />

de atendimento por meio dos convênios<<strong>br</strong> />

médicos. Além disto, inúmeros pacientes<<strong>br</strong> />

nos vêm à consulta solicitando que pratiquemos<<strong>br</strong> />

uma lista enorme de exames<<strong>br</strong> />

complementares para um “check up”, ou<<strong>br</strong> />

por que recém entrou no convênio ou por<<strong>br</strong> />

que está para sair e quer “aproveitar” a<<strong>br</strong> />

ocasião. Às vezes, fica difícil convencer o<<strong>br</strong> />

paciente da não necessidade desses e em<<strong>br</strong> />

algumas situações somos, até mesmo,<<strong>br</strong> />

“forçados” a solicitá-los. Ainda outras<<strong>br</strong> />

vezes nos solicitam exames pedidos pelo<<strong>br</strong> />

seu médico particular que não tem o seu<<strong>br</strong> />

convênio. E assim por diante...<<strong>br</strong> />

Na prática ginecológica alguns exames<<strong>br</strong> />

poderiam ser comentados dentro<<strong>br</strong> />

dessa ótica, e escolhemos duas situações<<strong>br</strong> />

para esta finalidade.<<strong>br</strong> />

CLIMATÉRIO<<strong>br</strong> />

Freqüentemente em pacientes que<<strong>br</strong> />

estejam no Climatério (erroneamente<<strong>br</strong> />

chamado de menopausa, que na realidade<<strong>br</strong> />

é a data da última menstruação) apresentam<<strong>br</strong> />

lista enorme de exames plenamente<<strong>br</strong> />

dispensáveis. Na dúvida deste<<strong>br</strong> />

estado hormonal, em paciente que<<strong>br</strong> />

apresente sintomas sugestivos de fogachos<<strong>br</strong> />

e que não esteja em idade compatível com a<<strong>br</strong> />

menopausa (em torno de 49 anos em nosso<<strong>br</strong> />

meio), basta solicitar dosagem plasmática do<<strong>br</strong> />

Hormônio Folículo Estimulante (FSH) que<<strong>br</strong> />

quando acima de 40, sugere esta situação<<strong>br</strong> />

(climatério). Assim sendo, dosagens dos<<strong>br</strong> />

demais hormônios tais como: estradiol,<<strong>br</strong> />

progesterona, LH, entre outros, não se<<strong>br</strong> />

justificam para este diagnóstico. De forma<<strong>br</strong> />

semelhante depois de instalada a terapêutica<<strong>br</strong> />

hormonal (TH), obviamente que quando<<strong>br</strong> />

indicada, o acompanhamento é basicamente<<strong>br</strong> />

clínico e não através de dosagens hormonais.<<strong>br</strong> />

Outrossim, é fundamental que se solicite<<strong>br</strong> />

exame de mamografia previamente e no<<strong>br</strong> />

acompanhamento da TH, como rastreamento<<strong>br</strong> />

do câncer de mama. A avaliação da densidade<<strong>br</strong> />

mineral óssea por Densitometria<<strong>br</strong> />

Óssea, é exame que poderá ser solicitado<<strong>br</strong> />

nesta fase da vida da mulher, so<strong>br</strong>etudo<<strong>br</strong> />

naquelas que apresentem história familiar de<<strong>br</strong> />

osteoporose ou outros fatores de risco.<<strong>br</strong> />

Entretanto, caso o exame esteja normal, o<<strong>br</strong> />

prazo para nova solicitação deveria ser<<strong>br</strong> />

superior a 2 anos, justificando a solicitação<<strong>br</strong> />

anual apenas nos casos alterados para<<strong>br</strong> />

acompanhamento. Nos casos de osteopenia<<strong>br</strong> />

não são o<strong>br</strong>igatoriamente indicativos de que<<strong>br</strong> />

evoluirão para osteoporose (e que necessitam<<strong>br</strong> />

tratamento), pois podem permanecer como<<strong>br</strong> />

tal indicando apenas que a densidade mineral<<strong>br</strong> />

óssea neste caso estava abaixo dos padrões<<strong>br</strong> />

comparativos. Ainda no Climatério, a solicitação<<strong>br</strong> />

de Ecografia Pélvica Endovaginal para<<strong>br</strong> />

avaliação da espessura endometrial é exame<<strong>br</strong> />

plenamente justificável.<<strong>br</strong> />

PREVENÇÃO DO CÂNCER<<strong>br</strong> />

DO COLO UTERINO<<strong>br</strong> />

O rastreamento do Câncer do Colo Uterino<<strong>br</strong> />

em nosso meio é realizado classicamente<<strong>br</strong> />

pelo exame de Papanicolaou (colpocitologia<<strong>br</strong> />

oncótica) anualmente. Em que pese a chance<<strong>br</strong> />

de falsos negativos (relativa baixa sensibilidade,<<strong>br</strong> />

citada na literatura em torno de 15<<strong>br</strong> />

a 30%), ainda é exame que, pelo custo e<<strong>br</strong> />

praticidade, se justifica. No entanto, devemos<<strong>br</strong> />

respeitar os casos onde limitações<<strong>br</strong> />

questionam o diagnóstico citopatológico,<<strong>br</strong> />

como na inflamação acentuada, e reavaliar<<strong>br</strong> />

ginecologia<<strong>br</strong> />

após o tratamento (sendo que nesta<<strong>br</strong> />

situação a endocervicite poderia estar<<strong>br</strong> />

implicada). Sua apresentação na forma de<<strong>br</strong> />

coleta em meio líquido (ou de esfregaço<<strong>br</strong> />

de fina camada) aumenta significantemente<<strong>br</strong> />

a sensibilidade, entretanto, ainda<<strong>br</strong> />

não está inserido na rotina da maioria.<<strong>br</strong> />

Outra situação, bastante comentada na<<strong>br</strong> />

literatura, e ao que parece será o método<<strong>br</strong> />

do futuro deste rastreamento, é evidenciado<<strong>br</strong> />

por exame de biologia molecular<<strong>br</strong> />

chamado teste de HPV ou HPV-DNA, ou<<strong>br</strong> />

ainda Captura Hí<strong>br</strong>ida. Neste exame se<<strong>br</strong> />

evidencia a presença do HPV que, pela sua<<strong>br</strong> />

implicação na oncogênese do colo uterino,<<strong>br</strong> />

justifica sua detecção. Infelizmente vemos<<strong>br</strong> />

freqüente iatrogênese na interpretação<<strong>br</strong> />

deste teste: o fato de ser positivo para HPV<<strong>br</strong> />

de alto risco oncogênico (o nome já<<strong>br</strong> />

assusta!) e ainda com alta carga do vírus,<<strong>br</strong> />

em um único exame, não tem a significância<<strong>br</strong> />

fatídica como alguns interpretam.<<strong>br</strong> />

Na imensa maioria das vezes, o HPV é<<strong>br</strong> />

vírus transitório e sua presença, ainda que<<strong>br</strong> />

em alta carga, não significa que irá permanecer<<strong>br</strong> />

no <strong>org</strong>anismo. Devemos salientar<<strong>br</strong> />

que em cerca de 60 a 70% este vírus é<<strong>br</strong> />

passageiro e esta transitoriedade pode<<strong>br</strong> />

ocorrer em até um ano e meio da infecção<<strong>br</strong> />

inicial. Ainda, o teste resulta positivo em<<strong>br</strong> />

cerca de 38% (em amostragem de mulheres<<strong>br</strong> />

entre 15 e 25 anos em nosso meio),<<strong>br</strong> />

sendo os vírus de risco oncogênico os mais<<strong>br</strong> />

prevalentes e, portanto, com grande<<strong>br</strong> />

chance de obtermos este resultado.<<strong>br</strong> />

Lem<strong>br</strong>amos que o exame de colposcopia,<<strong>br</strong> />

ou seja, observação do colo uterino por<<strong>br</strong> />

sistema ótico que amplia as imagens,<<strong>br</strong> />

apresenta papel definido e de grande<<strong>br</strong> />

importância, so<strong>br</strong>etudo como indicador<<strong>br</strong> />

das áreas alteradas para posicionar o local<<strong>br</strong> />

de biópsia e remoção da amostra histológica<<strong>br</strong> />

quando indicado. Assim, por meio<<strong>br</strong> />

da adequada solicitação e interpretação<<strong>br</strong> />

dos exames complementares teremos<<strong>br</strong> />

ferramenta valiosa para nossa prática<<strong>br</strong> />

clínica, não esquecendo do binômio custo<<strong>br</strong> />

versus beneficio em prol da melhor<<strong>br</strong> />

condução do caso.<<strong>br</strong> />

Dr. Newton Sergio de Carvalho (PR)<<strong>br</strong> />

25


ciência e arte<<strong>br</strong> />

Oconhecimento, o estudo e a análise da<<strong>br</strong> />

história e da evolução da medicina<<strong>br</strong> />

trazem ensinamentos básicos para o<<strong>br</strong> />

bom exercício, principalmente no aspecto ético<<strong>br</strong> />

e humanista. Humanismo hoje tão esquecido<<strong>br</strong> />

com o advento e predomínio do tecnicismo.<<strong>br</strong> />

A sociedade ao precisar da medicina e do<<strong>br</strong> />

médico faz uma exaltação, um culto de<<strong>br</strong> />

respeito à profissão seguramente mais antiga<<strong>br</strong> />

na história da humanidade e mais importante<<strong>br</strong> />

dentre todas pois trata da o<strong>br</strong>a maior do<<strong>br</strong> />

Criador, que é o ser humano.<<strong>br</strong> />

Ao falar so<strong>br</strong>e médico e medicina que<<strong>br</strong> />

deve ser entendida como forma de afeição e<<strong>br</strong> />

amor à vida, quero fazer uma exegese entre os<<strong>br</strong> />

versos de São Francisco de Assis e a atividade<<strong>br</strong> />

médica. Diz São Francisco:<<strong>br</strong> />

— O homem que executa seu trabalho<<strong>br</strong> />

com as mãos é um trabalhador.<<strong>br</strong> />

— O homem que trabalha com as mãos e<<strong>br</strong> />

o cére<strong>br</strong>o é um artesão.<<strong>br</strong> />

— O homem que trabalha com as mãos,<<strong>br</strong> />

o cére<strong>br</strong>o e o coração é um artista.<<strong>br</strong> />

Aí está a arte de ser médico, a mão no<<strong>br</strong> />

exame clínico e no ato cirúrgico, o cére<strong>br</strong>o no<<strong>br</strong> />

estudo e conhecimento constante da matéria<<strong>br</strong> />

médica e o coração no atendimento e<<strong>br</strong> />

compreensão do sofrimento do semelhante.<<strong>br</strong> />

A arte da medicina não é como afirmava<<strong>br</strong> />

Voltaire: a arte da medicina consiste em<<strong>br</strong> />

distrair o paciente enquanto a natureza cuida<<strong>br</strong> />

da doença. A alma do médico é o altar, onde<<strong>br</strong> />

vai ajoelhar-se e rezar a dor dos que sofrem e<<strong>br</strong> />

procuram solução para seus problemas físicos<<strong>br</strong> />

e mentais. Logo, a combinação verdade e amor<<strong>br</strong> />

é intrínseca ao ato médico, sendo inadmissível<<strong>br</strong> />

uma medicina baseada na falta de amor ao<<strong>br</strong> />

próximo.<<strong>br</strong> />

O doente ao procurar o médico não quer<<strong>br</strong> />

apenas a cura, quer também compreensão e<<strong>br</strong> />

amparo pois sem ajuda ou conselho, sem<<strong>br</strong> />

orientação formal, medicina só de aparelho é<<strong>br</strong> />

coisa despropositada. Miguel Couto afirmava:<<strong>br</strong> />

o homem humaniza a ciência ou a ciência<<strong>br</strong> />

desumaniza o homem. Também dizia: a<<strong>br</strong> />

medicina quando não cura, deve consolar.<<strong>br</strong> />

Sempre é oportuno lem<strong>br</strong>ar Galeno de<<strong>br</strong> />

Pergamo (200 d.C.), quando definiu terapêutica<<strong>br</strong> />

como sendo: o que fazer, como fazer,<<strong>br</strong> />

em cada caso. Daí deduzimos um preceito<<strong>br</strong> />

fundamental, que a terapêutica é um processo<<strong>br</strong> />

específico para cada doente. Antecipou-se a<<strong>br</strong> />

William Osler, que afirmava que mais impor-<<strong>br</strong> />

26<<strong>br</strong> />

tante do que saber que doença tem o doente, é<<strong>br</strong> />

que doente tem uma doença.<<strong>br</strong> />

A Medicina deve ser entendida como forma<<strong>br</strong> />

de afeição e aplicação à vida. Tratamos doentes<<strong>br</strong> />

e não doenças, ensinamento que deve ser sempre<<strong>br</strong> />

lem<strong>br</strong>ado e que vem de nossos antepassados.<<strong>br</strong> />

Já Hipócrates enfatizava a “observação”: as<<strong>br</strong> />

técnicas podem mudar, podem morrer, mas a<<strong>br</strong> />

observação permanece para sempre.<<strong>br</strong> />

A medicina está trocando o atendimento<<strong>br</strong> />

pessoal, a elegância do pensamento, a conclusão<<strong>br</strong> />

de raciocínio pelo atendimento técnico e<<strong>br</strong> />

impessoal.<<strong>br</strong> />

O domínio técnico é do médico, mas a<<strong>br</strong> />

mescla da ciência e arte é que distingue o bom<<strong>br</strong> />

profissional daquele que é simplesmente um<<strong>br</strong> />

técnico competente.<<strong>br</strong> />

A Medicina de hoje evoluiu e cabe ao médico<<strong>br</strong> />

corrigir impressões distorcidas chegando a um<<strong>br</strong> />

diagnóstico que pode levar tristeza e decepção,<<strong>br</strong> />

mas que formulado em termos comuns favorece<<strong>br</strong> />

a empatia e o tratamento.<<strong>br</strong> />

Não assistimos mais hoje às centenas de<<strong>br</strong> />

apendicectomias como antigamente, e Simão<<strong>br</strong> />

Kossobudzki citava em artigo publicado na<<strong>br</strong> />

Revista da Associação Médica de 1932, que em<<strong>br</strong> />

cerca de 25% dos apêndices retirados não havia<<strong>br</strong> />

lesões macroscópicas, o que faz lem<strong>br</strong>ar a<<strong>br</strong> />

possibilidade de que certo número de cirurgias<<strong>br</strong> />

não eram necessárias.<<strong>br</strong> />

Ressalte-se, no entanto, que era o único<<strong>br</strong> />

procedimento correto na época, pois os métodos<<strong>br</strong> />

diagnósticos e a terapêutica possível eram po<strong>br</strong>es.<<strong>br</strong> />

Da mesma forma as amigdalectomias foram<<strong>br</strong> />

sendo suprimidas, já que, com advento da era<<strong>br</strong> />

antibiótica, o tratamento clínico solucionou o<<strong>br</strong> />

problema na grande maioria dos casos.<<strong>br</strong> />

Cabe lem<strong>br</strong>ar da época que encontrávamos<<strong>br</strong> />

no quadro de cirurgias a serem realizadas, as<<strong>br</strong> />

“laparatomias exploradoras”, que caracterizavam<<strong>br</strong> />

a insegurança diagnóstica.<<strong>br</strong> />

Com o avanço dos meios diagnósticos, a<<strong>br</strong> />

entubação gástrica com determinação da acidez<<strong>br</strong> />

gástrica antes e após injeção subcutânea de<<strong>br</strong> />

histamina, foi superada no diagnóstico diferencial<<strong>br</strong> />

entre úlcera e câncer gástrico, pois neste não<<strong>br</strong> />

havia resposta da acidez após a injeção de<<strong>br</strong> />

histamina.<<strong>br</strong> />

Não se tinha ainda conhecimento da<<strong>br</strong> />

existência dos receptores gástricos H2, responsáveis<<strong>br</strong> />

pela regulação da secreção de ácido<<strong>br</strong> />

clorídrico. Hoje a farmacologia fornece a<<strong>br</strong> />

cimetidina, a ranitidina, bloqueando os receptores<<strong>br</strong> />

H2, e de grande utilidade no tratamento<<strong>br</strong> />

do doente ulceroso.<<strong>br</strong> />

As cirurgias laparoscópicas, são menos<<strong>br</strong> />

agressivas, com menor período de internamento<<strong>br</strong> />

e sem lesões cicatriciais enormes.<<strong>br</strong> />

Imagino qual seria a reação e a surpresa dos<<strong>br</strong> />

grandes mestres da cirurgia paranaense, como<<strong>br</strong> />

Erasto Gaertner, João Vieira de Alencar e<<strong>br</strong> />

Mário Braga de A<strong>br</strong>eu entre tantos outros,<<strong>br</strong> />

diante das intervenções laparoscópicas.<<strong>br</strong> />

As dúvidas eram grandes e o Prof. Aluízio<<strong>br</strong> />

França, pediatra e catedrático de Terapêutica<<strong>br</strong> />

Clínica, com quem iniciei minha vida como<<strong>br</strong> />

professor, publicou em 1932 artigo na Revista<<strong>br</strong> />

da Associação Médica com o título: “A<<strong>br</strong> />

Malária curará a Coqueluche”, em função de<<strong>br</strong> />

ter acompanhado crianças de Paranaguá e<<strong>br</strong> />

verificado sua melhora após o surto de malária.<<strong>br</strong> />

Seguramente processos imunológicos desconhecidos<<strong>br</strong> />

eram ativados com melhoria da<<strong>br</strong> />

Coqueluche, mas a observação do fato mostra<<strong>br</strong> />

quão atento estava o professor Aluízio França.<<strong>br</strong> />

As doenças infecciosas mais freqüentemente<<strong>br</strong> />

conhecidas eram: tuberculose, sífilis,<<strong>br</strong> />

impaludismo e blenorragia. Esta com tratamento<<strong>br</strong> />

agressivo à base de lavagem uretral<<strong>br</strong> />

com nitrato de prata, até poderia erradicar a<<strong>br</strong> />

doenças, mas às custas de uma uretrite<<strong>br</strong> />

química, com posterior estenose de uretra.<<strong>br</strong> />

A sífilis era combatida com “salvarsan”; o<<strong>br</strong> />

impaludismo com o quinino, como tratamento<<strong>br</strong> />

supressivo da crise. Cabe citar o famoso<<strong>br</strong> />

“esidron”, diurético mercurial, com efeito ótimo<<strong>br</strong> />

mas com lesões renais, hiponatremia aguda e<<strong>br</strong> />

alterações metabólicas graves. Não posso<<strong>br</strong> />

deixar de citar os laxantes tipo sulfato de<<strong>br</strong> />

magnésio (sal de Epson) e sódio, cujos efeitos<<strong>br</strong> />

eram tão evidentes que levavam às vezes a uma<<strong>br</strong> />

limpeza intestinal de tal ordem que so<strong>br</strong>avam<<strong>br</strong> />

só o “tamanco do constipado intestinal”. Hoje<<strong>br</strong> />

com uma gama enorme de antibióticos,<<strong>br</strong> />

diuréticos com efeitos farmacológicos bem<<strong>br</strong> />

definidos e laxativos bem equacionados, a<<strong>br</strong> />

agressão farmacológica se reduziu e os efeitos<<strong>br</strong> />

terapêuticos são melhores e previsíveis.<<strong>br</strong> />

O avanço terapêutico fez cair no esquecimento<<strong>br</strong> />

substâncias como a digoxina no<<strong>br</strong> />

controle da insuficiência cardíaca, com o<<strong>br</strong> />

apoucamento de sua ação e a eficácia de<<strong>br</strong> />

outras drogas. A indústria farmacêutica tem<<strong>br</strong> />

ação dúbia nesse avanço. Ora com drogas


surpreendentes na sua eficácia, ora propagando medicamentos de eficácia<<strong>br</strong> />

duvidosa e riscos consideráveis. A propaganda medicamentosa é de tal<<strong>br</strong> />

ordem que muitas vezes o médico é um verdadeiro “cãozinho de Pavlov”,<<strong>br</strong> />

que secretava suco gástrico ao estímulo visual do alimento. Ou seja,<<strong>br</strong> />

condicionado ao clínico, logo médico.<<strong>br</strong> />

Tenho uma idéia precisa das teorias de propaganda, pois estivemos<<strong>br</strong> />

vinculados ao setor médico de uma grande indústria durante anos, e lá<<strong>br</strong> />

<strong>br</strong>incávamos que o pessoal após as grandes reuniões (com média de três<<strong>br</strong> />

dias), saíam mais fanáticos em relação ao produto do que a juventude<<strong>br</strong> />

hitlerista em relação ao Führer.<<strong>br</strong> />

Humano é procurar no doente entre tantas pessoas vistas no mesmo<<strong>br</strong> />

dia, um rosto, uma emoção, uma preocupação particular. Compreender essa<<strong>br</strong> />

pessoa implica em atenção, consome tempo e energia. Cabe ao médico<<strong>br</strong> />

reconhecer e compreender as queixas de seus pacientes, não só em termos<<strong>br</strong> />

de enfermidades, mas também de conflitos e problemas pessoais e, então,<<strong>br</strong> />

usar essa compreensão de modo a poder obter os efeitos terapêuticos.<<strong>br</strong> />

O médico deve ter sempre presente que muitos pacientes têm além<<strong>br</strong> />

da queixa apresentada outras que não querem ou não podem dizer. Há<<strong>br</strong> />

motivos que justificam interromper a fala do paciente e tentar entrar na<<strong>br</strong> />

intimidade de sua problemática. Tudo que o paciente diz é importante,<<strong>br</strong> />

tudo que deixa de dizer também é. A falta de tempo, de empatia e a<<strong>br</strong> />

ansiedade, impedem que percebamos um problema <strong>org</strong>ânico ou psíquico<<strong>br</strong> />

importante.<<strong>br</strong> />

Devemos entender que o doente está sendo o que não pretende ser,<<strong>br</strong> />

pois almeja ser sadio. Tem um desejo desesperado de não ser no momento<<strong>br</strong> />

o que ele é.<<strong>br</strong> />

A doença provoca uma angústia, que é a preocupação para a qual<<strong>br</strong> />

ainda não se vislum<strong>br</strong>a solução. A certeza por má que seja não gera<<strong>br</strong> />

angústia. Talvez tristeza e decepção.<<strong>br</strong> />

Para a mente sadia a grande fá<strong>br</strong>ica de angústias, a incerteza é a dúvida.<<strong>br</strong> />

A doença cria uma solução de continuidade não assimilada entre o<<strong>br</strong> />

viver anterior e o presente, tornando o futuro incerto, e o futuro reserva<<strong>br</strong> />

insegurança, ansiedade e medo. O medo é uma resposta comum quando<<strong>br</strong> />

não se tem conhecimento dos riscos ou da maneira de combater a doença.<<strong>br</strong> />

Cabe então ao médico, corrigir impressões distorcidas, chegar a um<<strong>br</strong> />

diagnóstico e discernir, isto é, estabelecer as diferenças entre as queixas<<strong>br</strong> />

de pessoas distintas, com critério e juízo. É uma sutileza de espírito. Há<<strong>br</strong> />

necessidade de compreender o paciente na sua realidade e o significado<<strong>br</strong> />

que a doença tem para si. Devemos nos colocar em seu lugar para melhor<<strong>br</strong> />

interpretá-lo, e procurar ter consciência de como ele está sendo agredido.<<strong>br</strong> />

As ordens médicas devem ser orientadas e explicadas de maneira<<strong>br</strong> />

segura e lógica, criando uma empatia sólida que favorecerá a vontade<<strong>br</strong> />

firme e o desejo permanente de sarar.<<strong>br</strong> />

A parte final da consulta é, às vezes, minimizada; deve conciliar uma<<strong>br</strong> />

orientação terapêutica cuidadosa explicando sua importância.<<strong>br</strong> />

Finalmente temos que estar juntos até no momento mais difícil, que é<<strong>br</strong> />

a morte, respeitando-a e não lançando mão de procedimentos<<strong>br</strong> />

desesperados que tentam negar a realidade.<<strong>br</strong> />

E se assim procedermos, seguiremos o conselho admirável de Fernando<<strong>br</strong> />

Pessoa quando diz:<<strong>br</strong> />

Segue teu caminho<<strong>br</strong> />

Rega tuas plantas<<strong>br</strong> />

Ama as tuas rosas<<strong>br</strong> />

O resto é a som<strong>br</strong>a<<strong>br</strong> />

De árvores alheias<<strong>br</strong> />

Dr. João Gualberto de Sá Scheffer (PR).<<strong>br</strong> />

ciência e arte<<strong>br</strong> />

Remoção de adenomas colorretais<<strong>br</strong> />

previne mortes por câncer. A maneira de fazer<<strong>br</strong> />

o rastreamento inclui pesquisa de sangue oculto<<strong>br</strong> />

na fezes anualmente e sigmoidoscopia a cada<<strong>br</strong> />

3-5 anos ou colonoscopia a cada 10 anos para<<strong>br</strong> />

pacientes de risco moderado.<<strong>br</strong> />

A síndrome de Lemierre abarca faringotonsilite,<<strong>br</strong> />

cervicalgia, fe<strong>br</strong>e, tromboflebite<<strong>br</strong> />

jugular e embolia pulmonar séptica. Ocorre três<<strong>br</strong> />

a dez dias depois do início da faringite, sendo<<strong>br</strong> />

causada por anaeróbicos orais. O ultra-som<<strong>br</strong> />

permite detectar a tromboflebite em jugular<<strong>br</strong> />

interna. A maioria dos clínicos evita a anticoagulação<<strong>br</strong> />

na embolia séptica, algo em evolução.<<strong>br</strong> />

A síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW) é<<strong>br</strong> />

devida à existência de uma via acessória atrioventricular. É<<strong>br</strong> />

sugerida por um intervalo PR curto (< 0,12 seg.), ondas delta, e<<strong>br</strong> />

complexos QRS largos (> 0,12 seg.). Na forma ortodrômica (90%<<strong>br</strong> />

dos casos), a ablação é curativa em mais de 95% dos pacientes.<<strong>br</strong> />

Cuidado: A taquicardia de complexos largos do WPW<<strong>br</strong> />

deve ser tratada com drogas que reduzam a condução na via<<strong>br</strong> />

acessória (procainamida, propafenona, lidocaína, amiodarona,<<strong>br</strong> />

quinidina). Morte súbita pode resultar de um tratamento que<<strong>br</strong> />

use verapamil, digoxina ou propranolol. As drogas que<<strong>br</strong> />

prolongam o período refratário do nódulo AV podem ser<<strong>br</strong> />

seguras na taquicardia de complexos estreitos do WPW.<<strong>br</strong> />

As manifestações oftalmológicas na Doença de<<strong>br</strong> />

Wilson são: anéis corneanos pigmentados (deposição de co<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />

na mem<strong>br</strong>ana de Descemet) e cataratas em girassol.<<strong>br</strong> />

Os anéis corneanos são castanhos em olhos azuis e<<strong>br</strong> />

cinza-esverdeados ou dourados nos olhos castanhos. São vistos<<strong>br</strong> />

só em pacientes sintomáticos (97%). No começo requerem<<strong>br</strong> />

lâmpada de fenda para ser visibilizados. As cataratas em<<strong>br</strong> />

girassol ocorrem em 10 a 15% dos pacientes e não podem<<strong>br</strong> />

ser vistas com oftalmoscópio. Não impedem visão.<<strong>br</strong> />

Na Doença de Wilson há combinações variadas de<<strong>br</strong> />

manifestações hepáticas, neurológicas, oftalmológicas e renais.<<strong>br</strong> />

Metade dos pacientes apresentam-se com manifestações<<strong>br</strong> />

hepáticas, comumente entre oito e quinze anos.<<strong>br</strong> />

A Sarcoidose, doença multissistêmica de etiologia<<strong>br</strong> />

desconhecida, causa doença pulmonar intersticial curiosa: não<<strong>br</strong> />

é acompanhada de baqueteamento digital e tampouco<<strong>br</strong> />

estertores tipo velcro.<<strong>br</strong> />

A propósito, linfonodomegalia hilar bilateral ou<<strong>br</strong> />

paratraqueal em jovem assintomático (20 a 40 anos), é<<strong>br</strong> />

suficientemente específica para permitir o diagnóstico clínico<<strong>br</strong> />

presuntivo sem confirmação tecidual.<<strong>br</strong> />

27


iátricas<<strong>br</strong> />

Solidão<<strong>br</strong> />

Prezada Tereza,<<strong>br</strong> />

Escreves que num mundo que nada<<strong>br</strong> />

significa nosso destino é a solidão. Isso<<strong>br</strong> />

parece coisa de Hemingway. Relatas<<strong>br</strong> />

também que tua saída têm sido os diversos<<strong>br</strong> />

escapismos que não vêm aqui ao caso.<<strong>br</strong> />

Parece que te equili<strong>br</strong>as neles e não quero<<strong>br</strong> />

fazer juízos de valor. Mas, sinceramente,<<strong>br</strong> />

senti falta de um. Por que não estendes<<strong>br</strong> />

teu diário? Afinal, escreves bem. E haverá<<strong>br</strong> />

solidão maior que a do escritor? O teu<<strong>br</strong> />

estilo é simples, curto, claro, coloquial,<<strong>br</strong> />

parece teres bebido na fonte do escritor de<<strong>br</strong> />

Por quem os sinos do<strong>br</strong>am e O sol também se<<strong>br</strong> />

levanta, o que é uma virtude. Aliás, a<<strong>br</strong> />

grande virtude da prosa inglesa, o que se<<strong>br</strong> />

chama understatement, dizer tudo no<<strong>br</strong> />

mínimo possível. O nosso Dalton Trevisan<<strong>br</strong> />

levou isso ao paroxismo. Por que não te<<strong>br</strong> />

habilitas nessa senda? Agora, cá entre nós,<<strong>br</strong> />

tenho uma preocupação. Deste-me a<<strong>br</strong> />

sensação de teres altos e baixos, uma bipolaridade<<strong>br</strong> />

que talvez mereça aconselhamento.<<strong>br</strong> />

E tens genética propícia, pelo que<<strong>br</strong> />

revelas, o que merece do<strong>br</strong>ada atenção. És<<strong>br</strong> />

muito talentosa para te perderes em impossibilidades.<<strong>br</strong> />

Gostaria que seguisses os passos<<strong>br</strong> />

do grande escritor nas letras, não na vida,<<strong>br</strong> />

filho de suicida, e ele próprio suicida. Foi<<strong>br</strong> />

grande na integridade de seu individualismo<<strong>br</strong> />

que conseguiu colocar nas<<strong>br</strong> />

reportagens, contos e romances. Foi<<strong>br</strong> />

pequeno, trágico, no fim. Já que falamos<<strong>br</strong> />

em Por quem os sinos do<strong>br</strong>am, não gostaria<<strong>br</strong> />

que eles do<strong>br</strong>assem por ti, para usar o<<strong>br</strong> />

grande poeta John Donne. E não nos dão<<strong>br</strong> />

os poetas pedaços luminosos de vida? Viva!<<strong>br</strong> />

Filosofices<<strong>br</strong> />

Prezada Ana Carolina,<<strong>br</strong> />

O mundo não tá nem aí pra filosofia.<<strong>br</strong> />

Não nego que adora filosofices, nada mais<<strong>br</strong> />

denso. Só amenidades. Um joguinho? Uma<<strong>br</strong> />

mágica? Todos a fim. E é necessário também.<<strong>br</strong> />

Agora, na hora de pensar por conta<<strong>br</strong> />

própria poucos se atrevem. Mas nada de<<strong>br</strong> />

espanto. O mundo é essencialmente<<strong>br</strong> />

prático, e embora a filosofia nos ajude a<<strong>br</strong> />

entendê-lo, não nos ajuda a mudá-lo. Esse<<strong>br</strong> />

28<<strong>br</strong> />

o ponto. É ótima individualmente, desenvolve<<strong>br</strong> />

o potencial das pessoas para pensar<<strong>br</strong> />

logicamente e com rigor; ínfima no plano<<strong>br</strong> />

coletivo. Tanto que o grande médico e<<strong>br</strong> />

escritor espanhol Gregório Marañón —<<strong>br</strong> />

escreveu sozinho um clássico: Manual de<<strong>br</strong> />

Diagnóstico Etiológico — nos deixou uma<<strong>br</strong> />

afirmação famosa: “La filosofia es una cosa<<strong>br</strong> />

com la qual y sin la qual el mundo sigue tal qual”.<<strong>br</strong> />

Portanto, não lamente seu pouco uso<<strong>br</strong> />

genérico. Nem mesmo que não sirva para<<strong>br</strong> />

melhorar o caráter de ninguém, ou o<<strong>br</strong> />

convívio ético, como escreves. Mas não há<<strong>br</strong> />

dúvida quanto ao seguinte: serve ao teu<<strong>br</strong> />

autoconhecimento. E não é isso o que há de<<strong>br</strong> />

mais difícil? Então, use-a, como tens feito, e<<strong>br</strong> />

siga o socrático “conhece-te a ti mesmo”.<<strong>br</strong> />

Muito bom ler so<strong>br</strong>e teu espanto. Que é o de<<strong>br</strong> />

todos nós. Até mais.<<strong>br</strong> />

Recusa<<strong>br</strong> />

Prezada Denise,<<strong>br</strong> />

Não posso atender seu pedido. Há duas<<strong>br</strong> />

coisas particularmente difíceis. Uma, é falar de<<strong>br</strong> />

si próprio. Embora todos o queiramos, normalmente<<strong>br</strong> />

sai besteira. Legislamos em causa própria.<<strong>br</strong> />

Nos jactanciamos muito fácil. Perdemos<<strong>br</strong> />

o senso da medida e do propósito. Nesta edição<<strong>br</strong> />

vai algo muito pessoal, “Eu, torcedor”; mas foi<<strong>br</strong> />

uma necessidade minha, algo que não pretende<<strong>br</strong> />

ter serventia. Usei os leitores, o que não deve<<strong>br</strong> />

ser feito, para uma necessidade interior. Mas,<<strong>br</strong> />

tá feito, foi um ato compulsivo pós-jogo. Tinha<<strong>br</strong> />

que elaborar incontinenti. A propósito, há um<<strong>br</strong> />

poema de Drummond, Conclusão, que diz<<strong>br</strong> />

muito a respeito:<<strong>br</strong> />

Os impactos de amor não são poesia<<strong>br</strong> />

(tentaram ser: aspiração noturna).<<strong>br</strong> />

A memória infantil e o outono po<strong>br</strong>e<<strong>br</strong> />

vazam no verso de nossa urna diurna.<<strong>br</strong> />

Que é poesia, o belo? Não é poesia,<<strong>br</strong> />

e o que não é poesia não tem fala.<<strong>br</strong> />

Nem o mistério em si nem velhos nomes<<strong>br</strong> />

poesia são: coxa, fúria, cabala.<<strong>br</strong> />

Então desanimamos. Adeus, tudo!<<strong>br</strong> />

A mala pronta, o corpo desprendido,<<strong>br</strong> />

resta a alegria de estar só, e mudo.<<strong>br</strong> />

De que se formam nossos poemas? Onde?<<strong>br</strong> />

Que sonho envenenado lhes responde,<<strong>br</strong> />

se o poeta é um ressentido, e o mais são<<strong>br</strong> />

nuvens?<<strong>br</strong> />

Veja prezada Denise, se o poeta é um<<strong>br</strong> />

ressentido, ou parti pris do assunto abordado,<<strong>br</strong> />

nada de bom pode sair. Só nuvens.<<strong>br</strong> />

Por isso, outro poeta maior, Pessoa, deixou<<strong>br</strong> />

grafado em Isto:<<strong>br</strong> />

Por isso escrevo em meio<<strong>br</strong> />

Do que não está ao pé,<<strong>br</strong> />

Livre do meu enleio,<<strong>br</strong> />

Sério do que não é.<<strong>br</strong> />

Sentir? Sinta quem lê!<<strong>br</strong> />

A outra coisa difícil é escrever para alguém.<<strong>br</strong> />

Ser ghost writer. Não de algo genérico,<<strong>br</strong> />

digamos político, mas pessoal mesmo.<<strong>br</strong> />

Ou seja, sem estar na pele do próprio, sem<<strong>br</strong> />

ver sob seus prismas, sob seus ângulos,<<strong>br</strong> />

apenas sob seus desejos. Mestre João Ca<strong>br</strong>al<<strong>br</strong> />

de Melo Neto, quando lhe pediram algo<<strong>br</strong> />

semelhante, saiu-se com este:<<strong>br</strong> />

Pedem-me um poema<<strong>br</strong> />

um poema que seja inédito,<<strong>br</strong> />

poema é coisa que se faz vendo,<<strong>br</strong> />

Como imaginar Picasso cego?<<strong>br</strong> />

Um poema se faz vendo,<<strong>br</strong> />

um poema se faz para vista<<strong>br</strong> />

como fazer o poema ditados<<strong>br</strong> />

Em vê-lo na folha inescrita?<<strong>br</strong> />

Poema é composição,<<strong>br</strong> />

mesmo da coisa vivida,<<strong>br</strong> />

um poema é o que se arruma,<<strong>br</strong> />

dentro da desarrumada vida.<<strong>br</strong> />

Por exemplo, é como um rio,<<strong>br</strong> />

por exemplo, um Capiberibe,<<strong>br</strong> />

em suas margens domado<<strong>br</strong> />

para chegar ao Recife.<<strong>br</strong> />

Onde com o Beberibe,<<strong>br</strong> />

com o Tejipió, Jaboatão.<<strong>br</strong> />

Para fazer o Atlântico,<<strong>br</strong> />

todos se juntam a mão.<<strong>br</strong> />

Poema é coisa de ver,<<strong>br</strong> />

é coisa so<strong>br</strong>e um espaço,<<strong>br</strong> />

como se vê um Franz Weissman,<<strong>br</strong> />

como se ouve um quadrado.<<strong>br</strong> />

Como vês, prezada Denise, não sou


essentido e estou livre do meu enleio, mas<<strong>br</strong> />

não consigo ver e tenho receio de tecer<<strong>br</strong> />

nuvens. Daí, a folha inescrita. Escusas e<<strong>br</strong> />

saudações.<<strong>br</strong> />

Caderno Verde<<strong>br</strong> />

Prezado Paulo,<<strong>br</strong> />

Toda publicação necessita de alguns<<strong>br</strong> />

segredos e mistérios. Segredos, você sabe,<<strong>br</strong> />

são desvendáveis. Não ficam encobertos,<<strong>br</strong> />

questão de tempo e oportunidade. Os<<strong>br</strong> />

memes pertencem a essa classe. Quem tinha<<strong>br</strong> />

lido O Gene Egoísta do Dawkins sabia do<<strong>br</strong> />

que se tratava. Quem tinha tido a curiosidade<<strong>br</strong> />

de procurar no dicionário Oxford<<strong>br</strong> />

também. Já o Caderno Verde pertence à<<strong>br</strong> />

classe dos mistérios. Estes existem para<<strong>br</strong> />

desafiar, não para desvendar, por isso continuará<<strong>br</strong> />

mistério. Como consolo, ou desafio,<<strong>br</strong> />

dou-lhe outro mistério, o da vida, nos versos<<strong>br</strong> />

de Henriqueta Lisboa em Flor da Morte:<<strong>br</strong> />

Na morte, não.<<strong>br</strong> />

Na vida.<<strong>br</strong> />

Está na vida o mistério<<strong>br</strong> />

Em cada afirmação ou<<strong>br</strong> />

Abstinência.<<strong>br</strong> />

Na malícia<<strong>br</strong> />

Das plausíveis revelações,<<strong>br</strong> />

No suborno,<<strong>br</strong> />

Das silenciosas palavras.<<strong>br</strong> />

Evolução<<strong>br</strong> />

Prezada Carolina,<<strong>br</strong> />

Perguntas-me, jovem médica que és, o<<strong>br</strong> />

que fazer para evoluir profissionalmente.<<strong>br</strong> />

O essencial já tens, a intencionalidade.<<strong>br</strong> />

Deves também agregar informação depurada<<strong>br</strong> />

e raciocínio lógico. Alguns livros e<<strong>br</strong> />

revistas, tradicionais ou eletrônicos, podem<<strong>br</strong> />

prover isso. Há muito tempo não terias<<strong>br</strong> />

como desenvolver raciocínio clínico a não<<strong>br</strong> />

ser em raras publicações. Hoje há até certa<<strong>br</strong> />

pletora das mesmas, e muito boas. A par<<strong>br</strong> />

isso, praticar, praticar muito.<<strong>br</strong> />

Agora, tens que ter um tutor ou supervisor,<<strong>br</strong> />

alguém que te ajude na função<<strong>br</strong> />

crítica, a separar o joio do trigo. E, principalmente,<<strong>br</strong> />

que te adestre na capacidade<<strong>br</strong> />

crítica de fazer correlações, uma das<<strong>br</strong> />

capacidades mais no<strong>br</strong>es da medicina.<<strong>br</strong> />

Mas ainda falta algo, ler poesia. Sim,<<strong>br</strong> />

senhorita, decodificar ritmo e sentido de<<strong>br</strong> />

um poema é interpretá-lo, recriá-lo, e ao<<strong>br</strong> />

término dessa tarefa, que exige prazer, terás<<strong>br</strong> />

um belo diagnóstico. Assim acoplarás<<strong>br</strong> />

ciência e arte. Bom proveito.<<strong>br</strong> />

A Terapia Cognitiva-comportamental<<strong>br</strong> />

A Terapia Cognitiva-Comportamental, ou<<strong>br</strong> />

simplesmente Terapia Cognitiva (T.C.),<<strong>br</strong> />

idealizada pelo psiquiatra americano Aaron<<strong>br</strong> />

T. Beck e colaboradores, é hoje um dos<<strong>br</strong> />

enfoques psicoterapêuticos mais praticados<<strong>br</strong> />

por profissionais da área da saúde mental.<<strong>br</strong> />

É, ao mesmo tempo, o mais estudado e<<strong>br</strong> />

validado pela metodologia científica.<<strong>br</strong> />

Os primeiros escritos importantes e as<<strong>br</strong> />

primeiras abordagens cognitivo-comportamentais<<strong>br</strong> />

para o tratamento dos transtornos<<strong>br</strong> />

emocionais começaram a surgir nos anos<<strong>br</strong> />

1960 e 1970 com autores como Aaron T.<<strong>br</strong> />

Beck (1963, 1967; Beck et al., 1979), Albert<<strong>br</strong> />

Ellis (1962), Lazarus (1966), Meichenbaum<<strong>br</strong> />

(1973) e Mahoney (1974), entre outros.<<strong>br</strong> />

O modelo cognitivo prototípico se baseia<<strong>br</strong> />

nos seguintes pressupostos:<<strong>br</strong> />

1- A atividade cognitiva influencia o<<strong>br</strong> />

comportamento.<<strong>br</strong> />

2- A atividade cognitiva pode ser<<strong>br</strong> />

monitorada e alterada.<<strong>br</strong> />

3- O comportamento desejado pode<<strong>br</strong> />

ser influenciado mediante a mudança<<strong>br</strong> />

cognitiva.<<strong>br</strong> />

Mas o que se entende por atividade<<strong>br</strong> />

cognitiva?<<strong>br</strong> />

Atividade cognitiva, também chamada<<strong>br</strong> />

de cognição, é o fluxo mental que acontece<<strong>br</strong> />

em todos nós a todo o momento. Muitas<<strong>br</strong> />

vezes ela é comparada a um filme mental,<<strong>br</strong> />

com imagens e sons.<<strong>br</strong> />

O indivíduo onde se dá esta atividade<<strong>br</strong> />

(“o filme mental”) é, ao mesmo tempo, o<<strong>br</strong> />

escritor do script, o projetor na sala de<<strong>br</strong> />

cinema e o espectador.<<strong>br</strong> />

Neste filme, estão compreendidos os<<strong>br</strong> />

pensamentos, imagens mentais, memórias,<<strong>br</strong> />

imaginação, percepções etc.<<strong>br</strong> />

E o que se entende por comportamento<<strong>br</strong> />

desejado?<<strong>br</strong> />

É a atividade motora e seus correlatos<<strong>br</strong> />

emocionais e fisiológicos autonômicos. Assim,<<strong>br</strong> />

as cognições influenciam não só a psicomotricidade<<strong>br</strong> />

do paciente, mas também as<<strong>br</strong> />

suas emoções e as conseqüências internas.<<strong>br</strong> />

Por exemplo, um paciente que tem<<strong>br</strong> />

cognições ansiosas, terá emoções da mesma<<strong>br</strong> />

natureza (ansiedade) e toda a sua fisiologia<<strong>br</strong> />

refletirá este estado.<<strong>br</strong> />

A fisiologia da ansiedade, como da<<strong>br</strong> />

depressão, da raiva etc., já é bem conhecida<<strong>br</strong> />

psiquiatria<<strong>br</strong> />

dos clínicos. O que a T.C. nos traz como<<strong>br</strong> />

novidade é a associação entre os<<strong>br</strong> />

eventos da vida, as cognições, as<<strong>br</strong> />

emoções e a fisiologia. A seguinte figura<<strong>br</strong> />

nos mostra este construto:<<strong>br</strong> />

As crenças nucleares, os pressupostos<<strong>br</strong> />

subjacentes e os pensamentos<<strong>br</strong> />

automáticos, representam as cognições.<<strong>br</strong> />

As reações volitivas, emocionais e<<strong>br</strong> />

comportamentais são as conseqüências<<strong>br</strong> />

das citadas cognições.<<strong>br</strong> />

Desta maneira, se conseguirmos<<strong>br</strong> />

alterar estas últimas, monitorando-as<<strong>br</strong> />

mediante o método e a técnica cognitiva,<<strong>br</strong> />

aliviaremos as conseqüências<<strong>br</strong> />

afetivo-volitivo-comportamentais, que,<<strong>br</strong> />

muitas vezes cursam com transtornos<<strong>br</strong> />

de somatização, de dor, conversão,<<strong>br</strong> />

depressão, ansiedade e assim por<<strong>br</strong> />

diante.<<strong>br</strong> />

O método cognitivo consiste em um<<strong>br</strong> />

automonitoramento onde o paciente<<strong>br</strong> />

entende que as situações pelas quais<<strong>br</strong> />

passa ativam pensamentos automáticos<<strong>br</strong> />

e imagens mentais. Isto leva a uma<<strong>br</strong> />

interpretação, um sentido emprestado<<strong>br</strong> />

ao evento que produz o despertar<<strong>br</strong> />

emocional. As emoções resultantes,<<strong>br</strong> />

quando são disfuncionais, cursam com<<strong>br</strong> />

os diversos transtornos mentais e<<strong>br</strong> />

comportamentais.<<strong>br</strong> />

O paciente, juntamente com o<<strong>br</strong> />

terapeuta e de maneira colaborativa,<<strong>br</strong> />

aprende a mudar suas cognições, o que<<strong>br</strong> />

alivia seus sintomas. Aprende também,<<strong>br</strong> />

de onde elas vêm, qual a sua origem,<<strong>br</strong> />

aprendendo assim a evitar futuras<<strong>br</strong> />

recaídas.<<strong>br</strong> />

Dr. Gláucio Luiz B. Alves (PR).<<strong>br</strong> />

29


terapêutica<<strong>br</strong> />

PRÉ-HIPERTENSÃO<<strong>br</strong> />

A pressão é determinada pelo<<strong>br</strong> />

produto do débito cardíaco (Volume<<strong>br</strong> />

sistólico x Freqüência) e a resistência<<strong>br</strong> />

periférica total. Quando uma das<<strong>br</strong> />

variáveis sai do equilí<strong>br</strong>io, seja devido<<strong>br</strong> />

ao maior volume sistólico (Sístole =<<strong>br</strong> />

Débito cardíaco), ou maior resistência<<strong>br</strong> />

periférica (Diástole = Resistência<<strong>br</strong> />

periférica), o resultado é Hipertensão<<strong>br</strong> />

(Sistólica > 140 mmhg.)<<strong>br</strong> />

A hipertensão é uma doença silenciosa<<strong>br</strong> />

e de tendência à cronificação.<<strong>br</strong> />

Assim sendo, o diagnóstico precoce —<<strong>br</strong> />

Pré-Hipertensão (Sistólica 120-139;<<strong>br</strong> />

Diastólica 80-89/Joint National<<strong>br</strong> />

Committee 7)] — pode ser um valioso<<strong>br</strong> />

instrumento para decidir o início do<<strong>br</strong> />

tratamento medicamentoso.<<strong>br</strong> />

Uma amostra, randomizada, (n =<<strong>br</strong> />

809) de pré-hipertensos, com seguimento<<strong>br</strong> />

por 4 anos, foi dividida em 2<<strong>br</strong> />

grupos: um grupo recebeu placebo,<<strong>br</strong> />

enquanto o outro candesartan, durante<<strong>br</strong> />

os primeiros dois anos (1.ª fase). Nos<<strong>br</strong> />

dois anos que se seguiram, ambos os<<strong>br</strong> />

grupos recebeu placebo (2.ª fase).<<strong>br</strong> />

Como resultado da primeira fase,<<strong>br</strong> />

40,4% do grupo que recebeu placebo<<strong>br</strong> />

desenvolveu hipertensão em comparação<<strong>br</strong> />

a 13,6% do grupo que recebeu<<strong>br</strong> />

candesartan (16mg/d). Na segunda<<strong>br</strong> />

fase, onde ambos os grupos receberam<<strong>br</strong> />

placebo, obteve-se uma redução<<strong>br</strong> />

relativa de 16% no risco para hipertensão<<strong>br</strong> />

naqueles que, primeiramente,<<strong>br</strong> />

foram tratados com o bloqueador da<<strong>br</strong> />

angiotensina. (Julius S, et al N Eng J<<strong>br</strong> />

30<<strong>br</strong> />

Med, 2006;354:1685-1697).<<strong>br</strong> />

Apesar da pesquisa confirmar benefícios<<strong>br</strong> />

na prevenção da doença hipertensiva<<strong>br</strong> />

com tratamento medicamentoso,<<strong>br</strong> />

ainda é cedo para advogar o tratamento<<strong>br</strong> />

universal de todos os pré-hipertensos.<<strong>br</strong> />

Mais estudos são necessários.<<strong>br</strong> />

VARIZES E BLOQUEADORES<<strong>br</strong> />

As veias esofágicas são vasos colaterais<<strong>br</strong> />

no sistema porta. Como têm paredes<<strong>br</strong> />

finas, em determinadas condições<<strong>br</strong> />

(exemplo cirrose) um gradiente aumentado<<strong>br</strong> />

de pressão — hipertensão portal —<<strong>br</strong> />

torna suas veias dilatadas. As varizes<<strong>br</strong> />

esofágicas, então estabelecidas, podem<<strong>br</strong> />

ser estadiadas por fatores preditivos<<strong>br</strong> />

quanto aos riscos de hemorragia.<<strong>br</strong> />

Para prevenir a evolução das varizes<<strong>br</strong> />

esofágicas em pacientes com cirrose, os<<strong>br</strong> />

beta-bloqueadores não-seletivos são<<strong>br</strong> />

eficazes na redução de episódios de<<strong>br</strong> />

hemorragia. Acredita-se que seja resultado<<strong>br</strong> />

do decréscimo da pressão portal,<<strong>br</strong> />

controlada pelo tônus das artérias<<strong>br</strong> />

mesentéricas (B1-efeito), em combinação<<strong>br</strong> />

com a diminuição do fluxo esplênico<<strong>br</strong> />

(B2-efeito). As únicas drogas<<strong>br</strong> />

recomendadas para profilaxia são propranolol<<strong>br</strong> />

e nadalol.<<strong>br</strong> />

Um recente estudo (Groszmann RJ, et<<strong>br</strong> />

al. N Engl Med.2005;353:2254-2261),<<strong>br</strong> />

placebo-controlado, sugere que a ação<<strong>br</strong> />

dos beta-bloqueadores não seja somente<<strong>br</strong> />

o de reduzir o fluxo sangüíneo. Numa<<strong>br</strong> />

população (n = 213) de alto risco de<<strong>br</strong> />

desenvolverem varizes esofágicas —<<strong>br</strong> />

cirróticos com hipertensão portal (gra-<<strong>br</strong> />

diente de pressão demonstrado) —<<strong>br</strong> />

envolveu a administração de timolol<<strong>br</strong> />

(80mg/d), e seguimento a cada três<<strong>br</strong> />

meses por 54,9 meses. Monitoramento<<strong>br</strong> />

sangüíneo, endoscopia e mensuração<<strong>br</strong> />

da pressão foram avaliados anualmente.<<strong>br</strong> />

A pesquisa mostrou não haver<<strong>br</strong> />

diferença, quanto ao risco de hemorragia,<<strong>br</strong> />

no grupo placebo ou no grupo<<strong>br</strong> />

timolol. A contradição foi o grupo<<strong>br</strong> />

timolol ter apresentado eventos mais<<strong>br</strong> />

sérios que o grupo placebo.<<strong>br</strong> />

SECREÇÃO ÁCIDA E TIROXINA<<strong>br</strong> />

Milhões fazem reposição hormonal<<strong>br</strong> />

com levotiroxina. A acidez gástrica é<<strong>br</strong> />

um fator importante para sua absorção,<<strong>br</strong> />

daí, seu uso a 30 minutos do desjejum.<<strong>br</strong> />

É também muito comum o uso em<<strong>br</strong> />

jejum de inibidores protônicos (inibidores<<strong>br</strong> />

de bomba de prótons) para<<strong>br</strong> />

doença do refluxo gastroesofágico,<<strong>br</strong> />

gastrites e doença ulcerosa. Está claro<<strong>br</strong> />

que os inibidores protônicos ao reduzirem<<strong>br</strong> />

a acidez gástrica reduzem<<strong>br</strong> />

também a absorção da levotiroxina<<strong>br</strong> />

fazendo com que haja necessidade de<<strong>br</strong> />

dose maior na reposição. O último<<strong>br</strong> />

trabalho saiu no N. engl. J. Med.<<strong>br</strong> />

(2006;3541787-1795). Um cuidado<<strong>br</strong> />

que médicos e pacientes têm que passar<<strong>br</strong> />

a ter. Ou se usa as drogas dissociadas,<<strong>br</strong> />

com intervalo de 30 minutos; ou, às<<strong>br</strong> />

vezes, há necessidade de se aumentar<<strong>br</strong> />

a levotiroxina. A primeira opção é a<<strong>br</strong> />

melhor.<<strong>br</strong> />

Ac. Vic Mar (PR).


I Para impressionar<<strong>br</strong> />

Para<<strong>br</strong> />

os outros.<<strong>br</strong> />

VI Para conhecer as<<strong>br</strong> />

Para<<strong>br</strong> />

características clínicas e<<strong>br</strong> />

evolução de uma doença.<<strong>br</strong> />

Decálogo extraído dos artigos publicados no Canadian Medical Association<<strong>br</strong> />

Journal (CMAJ) 1981; 124: 555-558, 703-710, 869-872, 985-990, 1156-1162.<<strong>br</strong> />

IV Para desco<strong>br</strong>ir como um clínico Para<<strong>br</strong> />

experiente lida com um<<strong>br</strong> />

determinado problema.<<strong>br</strong> />

IX Para selecionar os pontos referentes à Para<<strong>br</strong> />

necessidade, e à utilização de<<strong>br</strong> />

tratamento clínico e de outros<<strong>br</strong> />

procedimentos de saúde considerando<<strong>br</strong> />

a qualidade e relação custo/eficácia.<<strong>br</strong> />

II<<strong>br</strong> />

Para se manter atualizado<<strong>br</strong> />

com as notícias médicas.<<strong>br</strong> />

VII determinar a<<strong>br</strong> />

Para<<strong>br</strong> />

etiologia ou causalidade.<<strong>br</strong> />

III entender de<<strong>br</strong> />

biopatologia.<<strong>br</strong> />

V<<strong>br</strong> />

verificar a possibilidade de utilização<<strong>br</strong> />

de um novo ou já existente exame<<strong>br</strong> />

diagnóstico em nossos pacientes.<<strong>br</strong> />

X<<strong>br</strong> />

se divertir com as<<strong>br</strong> />

cartas ao editor.<<strong>br</strong> />

VIII<<strong>br</strong> />

distinguir a terapêutica<<strong>br</strong> />

útil da inútil ou nociva.<<strong>br</strong> />

decálogos<<strong>br</strong> />

31

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