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O Passado Ainda é Presente: a ditadura militar e seus efeitos (pdf)

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O <strong>Passado</strong> <strong>Ainda</strong> <strong>é</strong> <strong>Presente</strong>: a <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong> e <strong>seus</strong> <strong>efeitos</strong>.<br />

A- Tortura nas Forças Armadas<br />

* Cecília Maria Bouças Coimbra<br />

De um modo geral, as Forças Armadas, no Brasil, têm sido apontadas como um grande trunfo no<br />

combate à chamada violência urbana e rural e ao tráfico de drogas.<br />

Entretanto, em realidade, essas mesmas Forças Armadas enfrentam em suas fileiras s<strong>é</strong>rios e<br />

graves problemas. Em mat<strong>é</strong>ria publicada em O Globo (19/08/01, p. 19), lê-se que “a grande maioria dos<br />

cerca de 1500 inqu<strong>é</strong>ritos e processos em tramitação na Justiça Militar da União, <strong>é</strong> de crimes graves, como<br />

latrocínio, homicídio, estelionato e roubo” . Esses crimes, no Rio de Janeiro, chegam a 71% do total desses<br />

processos.<br />

Al<strong>é</strong>m disso, nas Forças Armadas há um número alto de alcoolismo e uso de drogas. “Somente no<br />

ambulatório do Centro de Tratamento Químico do Hospital Central da Marinha estão, cerca de 300 <strong>militar</strong>es<br />

dependentes de álcool, barbitúricos, anfetaminas, maconha e cocaína” (O Globo, idem)<br />

Fora este quadro – pouquíssimo divulgado – uma outra questão ganha espaço dentro das Forças<br />

Armadas: o uso sistemático da tortura e de outras violações contra <strong>seus</strong> próprios integrantes.O tema <strong>é</strong><br />

bastante delicado e, no Brasil, considerado tabu. Pela força, prestígio e poder que as Forças Armadas ainda<br />

desfrutam no país – não esquecer o recente período de <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong> e a transição para os governos civis<br />

comprometida pelo silenciamento e pelo esquecimento – as investigações são realizadas dentro das<br />

próprias corporações e as punições, quando acontecem, são bastante leves tendo em vista os delitos<br />

cometidos.<br />

Humilhações e coações são rotina. Episódios envolvendo maus tratos não são novidades nas<br />

Forças Armadas. At<strong>é</strong> documentos em vídeos já registraram coações físicas e psicológicas durante<br />

treinamentos: em 1993, a imprensa brasileira teve acesso a uma fita que mostrava soldados do Ex<strong>é</strong>rcito<br />

sugando o sangue de galinhas mortas. Tamb<strong>é</strong>m há registros de casos de suicídios motivados por<br />

humilhações e coações psicológicas.<br />

Em maio de 2001, o Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e o Centro de Justiça Global entregaram ao<br />

Comitê Contra a Tortura da ONU documento onde eram assinalados 11 casos de torturas e violações<br />

acontecidos, em especial no estado do Rio de Janeiro, a partir de 1990.<br />

Hoje, tem-se registrado 23 casos que se tornaram, de algum modo, públicos. Entretanto, somente<br />

em um número muito pequeno deles houve continuidade das denúncias feitas. Na maioria dos casos,<br />

pressionadas de diferentes formas, as pessoas desistiram de suas denúncias. São os seguintes os casos<br />

at<strong>é</strong> agora levantados:<br />

1. Cadete Márcio Lapoente da Silveira, 18 anos - (tortura e morte)<br />

* Psicóloga, Professora Adjunta na Universidade Federal Fluminense, Pós-Doutora em Ciência Política pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP, Coordenadora<br />

da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia,Vice-Presidente do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ, Membro do Conselho Consultivo<br />

do Centro de Justiça Global.<br />

1


2<br />

No dia 9 de outubro de 1990, às cinco da manhã, Márcio estava em treinamento na Academia<br />

Militar das Agulhas Negras (AMAN), em Resende, Rio de Janeiro, num pelotão comandado pelo tenente<br />

Antônio Carlos De Pessoa. O exercício era puxado. Márcio sentiu-se mal e pediu para descansar um pouco.<br />

Aos gritos o instrutor ordenou que continuasse. Márcio continuou a instrução, suando, fraco, sentindo que o<br />

chão lhe faltava e tudo começava a rodar à sua volta, a ficar longe...<br />

Desmaiou e decretou sua sentença de morte. Seu instrutor, o tenente De Pessoa, passou a gritar e<br />

a dizer-lhe, em meio a uma enxurrada de palavrões, que fosse homem e parasse de embromar. Das<br />

palavras passou aos atos e começou a chutar Márcio no corpo e na cabeça. O coturno do oficial bateu<br />

várias vezes, com força, na fronte do rapaz. Em <strong>seus</strong> derradeiros momentos de consciência, Márcio ainda<br />

tentou defender-se. Uma coronha de fuzil esmagou-lhe quatro dedos e reduziu sua mão esquerda a uma<br />

bola disforme de sangue.<br />

Enquanto De Pessoa agredia Márcio, outros oficiais a tudo assistiam, sem intervir, mantendo os<br />

alunos à distância. Um deles chegou a comentar, dirigindo-se a Márcio que agonizava: “Você está com cara<br />

de quem vai morrer”. Toda a sessão de tortura foi filmada ante o espanto e a revolta dos colegas de turma..<br />

Márcio, inconsciente, ficou estendido numa maca, exposto ao sol durante três horas, sem qualquer<br />

assistência. Formou-se um cordão de isolamento de soldados à sua volta com <strong>seus</strong> companheiros e at<strong>é</strong><br />

dois m<strong>é</strong>dicos que foram impedidos de aproximar-se dele, sendo informados de que se tratava de “uma<br />

cagada da instrução”. Só às 8h 30 deu entrada no Hospital da AMAN. Diagnóstico: meningite.<br />

Em Resende, há um hospital com UTI que poderia ter atendido o rapaz. Entretanto, ele foi jogado<br />

numa ambulância sem qualquer equipamento e sem oxigênio, e transferido para o Hospital Central do<br />

Ex<strong>é</strong>rcito, no Rio. O calor era tanto, dentro da ambulância, que o trajeto foi feito com a porta aberta, porque o<br />

enfermeiro que o acompanhava reclamou. Márcio morreu na Via Dutra e chegou morto ao Hospital Central<br />

do Ex<strong>é</strong>rcito.<br />

A autópsia foi assinada por um legista de passado notório, Rubens Pedro Macuco Janine, que já<br />

assinara laudos falsos de presos políticos assassinados durante a <strong>ditadura</strong> e que, por isto, acabou tendo<br />

seu registro de m<strong>é</strong>dico cassado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro, em<br />

2000.<br />

O caso de Márcio foi parar na Justiça Militar, mas o espírito corporativo protegeu o assassino. A<br />

abertura do processo foi atrasada para que De Pessoa pudesse ser promovido a Capitão.<br />

A Justiça Militar reconheceu documentalmente que houve “excessos” praticados por oficiais,<br />

negligência e erro m<strong>é</strong>dico, por parte dos m<strong>é</strong>dicos da AMAN. Apenas De Pessoa foi julgado, punido, mas<br />

beneficiado por sursis pelo Superior Tribunal Militar.<br />

Os pais de Márcio continuam procurando justiça, apesar das pressões e ameaças que têm sofrido.<br />

2. Luis Viana Santos, 19 anos - (tortura)<br />

Em novembro de 1991, o então soldado Luiz V Santos, no quartel da Vila Militar (RJ), foi submetido<br />

a uma sessão de sete horas de tortura que o deixou incapacitado para o trabalho. Havia sido acusado do<br />

furto de um cheque, quando fazia um curso para cabo, preparando-se para a carreira <strong>militar</strong>. Apesar do<br />

soldado Almir Francisco de Sá ter confessado o roubo, três meses depois, Luiz Viana foi desligado do<br />

Ex<strong>é</strong>rcito sem direito a tratamento m<strong>é</strong>dico.


3<br />

Com as pernas, braços e pescoço amarrados com cordas, o soldado foi espancado com chutes e<br />

pontap<strong>é</strong>s e jogado contra a parede. Passou a apresentar várias seqüelas como problemas de coluna e de<br />

movimento no pulso esquerdo, devido às múltiplas fraturas que sofreu.<br />

Em outubro de 1992, o Capitão de Cavalaria Delano Bastos de Miranda e o 3 o Sargento George<br />

Carlos Rincon Baldessani foram condenados a 1 ano e 9 meses de prisão na 1 a Auditoria do Ex<strong>é</strong>rcito, mas<br />

foram beneficiados por sursis e estão em liberdade.<br />

A família foi pressionada para desistir do processo.<br />

3. Emerson Santos de Melo, 20 anos - (suicídio)<br />

Em novembro de 1992, o soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Emerson que servia no 3 o Batalhão Especial de<br />

Fronteira, em Macapá (Amapá), não suportando mais as pressões e humilhações sofridas no cotidiano do<br />

quartel, suicidou-se tomando uma mistura de medicamentos. No bilhete de despedida que deixou escreveu:<br />

“...como já disse antes esse <strong>é</strong> o pior ano de minha vida. Nunca pensei que um dia iria passar por tantas<br />

humilhações de uma vez só na vida.”<br />

4. Jean Fábio da Silva Martins, 18 anos à <strong>é</strong>poca da prisão - (torturas)<br />

Em 25 de março de 1994, para confessar um crime – o roubo de um fuzil – o recruta Fábio foi<br />

submetido a torturas. Esteve preso no Quartel da Vila Militar (RJ), na Delegacia de Roubos e Furtos e no<br />

Quartel da Polícia do Ex<strong>é</strong>rcito. Foram 36 dias de suplício por conta de sua inexperiência e ingenuidade.<br />

Havia recebido ordem de um <strong>militar</strong>, que se dizia tenente, para deixar seu fuzil FAL no local e fazer o<br />

reconhecimento da área próxima. Ao voltar, o fuzil havia desaparecido. Os superiores não aceitando sua<br />

história, prenderam-no e, durante 36 dias, foi violentamente torturado, sofrendo espancamentos, asfixia, etc.<br />

5. Eduardo Ferreira Agostinho, 19 anos - (tortura e morte)<br />

Após ter sido submetido a intensos exercícios físicos e maus tratos, em 24 de janeiro de 1996, o<br />

aluno da Escola Naval (RJ) Eduardo não resistiu aos treinamentos e morreu. Foi submetido a uma brutal<br />

sessão de exercícios e, durante uma corrida, sob sol forte, desmaiou e entrou em coma. Eduardo já havia<br />

baixado à enfermaria, uma hora antes, mas foi obrigado a retornar aos exercícios. Suas mãos e p<strong>é</strong>s<br />

apresentavam bolhas de queimaduras provocadas pelo asfalto, onde teve que fazer várias flexões de<br />

braços. Al<strong>é</strong>m de Eduardo, dois outros aspirantes passaram mal, sendo que um deles chegou a ser<br />

internado. Dez outros não resistiram às brutalidades dos exercícios físicos e pediram baixa, ainda em<br />

janeiro de 1996.<br />

6. Samuel de Oliveira Cardoso, 17 anos à <strong>é</strong>poca da prisão - (tortura)


4<br />

O ex-aluno do Col<strong>é</strong>gio Naval, em Angra dos Reis (RJ), Samuel após ser submetido a inúmeras<br />

torturas, saiu da escola, em janeiro de 1996. Vítima de maus tratos, ficou internado no Hospital da Marinha.<br />

Foi torturado por alunos mais velhos, o que dizem ser praxe no Col<strong>é</strong>gio Naval. Sofreu espancamentos,<br />

torturas psicológicas e vários tipos de violência durante dois anos. Fazia testes físicos brutais, como passar<br />

o dia inteiro correndo. A comida, muitas vezes, era estragada, mas os alunos eram obrigados a comer.<br />

Ficou hipertenso e com alterações no comportamento, não sendo mais capaz de fazer exercícios físicos.<br />

7. Joílson da Silva Melo, 20 anos - (tortura e morte)<br />

Em 27 de setembro de 1998, o aluno Joílson no 3 o Batalhão de Infantaria (Niterói – RJ) não<br />

agüentou o treinamento realizado e os exercícios de sobrevivência na selva, vindo a falecer no Hospital<br />

Central do Ex<strong>é</strong>rcito. O laudo de necrópsia deu como causa mortis edema cerebral. A família soube por<br />

colegas de Joílson que, durante o treinamento, ele havia recebido chutes na cabeça. A família que<br />

pretendia processar o Ex<strong>é</strong>rcito desistiu diante das pressões sofridas.<br />

8. Nazareno Kleber de Mattos Vargas, 29 anos à <strong>é</strong>poca da prisão - (torturas)<br />

Cabo da Aeronáutica acusado de seqüestro, ficou preso, inicialmente, na 76ª Delegacia Policial, em<br />

Niterói, em 03 de fevereiro de 1997. Naquela Delegacia foi torturado com choques el<strong>é</strong>tricos e<br />

espancamentos. Sua mulher tamb<strong>é</strong>m foi presa e torturada naquele local o que fez com que ele assinasse a<br />

confissão de seqüestro. No dia seguinte foi levado para o Batalhão de Infantaria da Aeronáutica (BINFA) do<br />

III o Comando A<strong>é</strong>reo/RJ, (COMAR), onde foi torturado quase que diariamente durante dois anos e meio, at<strong>é</strong><br />

junho de 1999, quando por ordem da Justiça foi transferido para a Clínica Psiquiátrica Bela Vista, em<br />

Jacarepaguá (RJ).<br />

Durante os dois anos e seis meses em que ficou preso foi, quase que diariamente, torturado com<br />

espancamentos (chutes, socos, pontap<strong>é</strong>s, joelhadas, tapas), choques el<strong>é</strong>tricos, sevícias sexuais (introdução<br />

de dedos e cassetete em seu ânus), palmatórias nas palmas das mãos e solas dos p<strong>é</strong>s. De um modo geral,<br />

esses suplícios aconteciam à noite. Freqüentemente, era algemado para receber choques el<strong>é</strong>tricos e ser<br />

espancado. A cela que ocupou com mais três outros presos (os casos são descritos adiante) era insalubre,<br />

com condições sub-humanas de higiene, com ratos, lacraias e baratas. Muitas vezes, após ser torturado,<br />

era colocado na cela despido e no meio de suas próprias fezes.<br />

Nesses dois anos e meio de prisão somente foi levado ao banho de sol, duas ou três vezes. Seu desespero<br />

foi tanto que, por duas vezes, tentou o suicídio. De um modo geral, <strong>seus</strong> torturadores usavam capuz.<br />

Quando da sua transferência para a Clínica Psiquiátrica foi ameaçado de morte se revelasse as<br />

agressões sofridas; na própria viatura que o transportava foi agredido com socos.<br />

Depoimentos de vários de <strong>seus</strong> familiares confirmam as torturas sofridas, pelas marcas vistas em<br />

seu corpo (hematomas, inchaços e marcas de queimaduras)<br />

At<strong>é</strong> hoje, Nazareno continua internado sob custódia e tem s<strong>é</strong>rios e graves abalos psíquicos, tendo<br />

pesadelos constantes. Foi aberto processo no Minist<strong>é</strong>rio Público Militar e o cabo vem sendo<br />

sistematicamente ameaçado para retirar a queixa. Tamb<strong>é</strong>m na Polícia Federal foi aberto um inqu<strong>é</strong>rito<br />

policial e seu caso vem sendo acompanhado, desde janeiro de 2001, pelo Procurador Federal dos Direitos<br />

dos Cidadãos, no Rio de Janeiro, Dr. Daniel Sarmento


9. Anderson Gomes Monteiro, 18 anos à <strong>é</strong>poca da prisão - (torturas)<br />

Soldado da Aeronáutica, acusado de roubar um carro, foi preso, em 17/07/98 e encaminhado para o<br />

Batalhão de Infantaria da Aeronáutica (BINFA) do III o Comando A<strong>é</strong>reo (COMAR) do Rio de Janeiro onde foi<br />

torturado por cerca de um ano e meio, at<strong>é</strong> agosto de 2000. Da mesma forma que o Cabo Nazareno – com<br />

quem ficou na mesma cela – foi violentamente torturado, quase que diariamente, especialmente à noite e<br />

nos fins de semana. Em algumas ocasiões, chegou a ser espancado cinco vezes num mesmo dia.<br />

Freqüentemente era acordado à noite para ser torturado.<br />

Em agosto de 1998 – por estar o BINFA com muitos presos – foi transferido para a prisão da Base<br />

A<strong>é</strong>rea do Galeão (RJ), onde permaneceu at<strong>é</strong> novembro do mesmo ano. Lá tamb<strong>é</strong>m foi torturado, “só que<br />

com mais cautela” (depoimento do próprio soldado), sofrendo agressões físicas, coações e tendo que fazer<br />

exercícios físicos at<strong>é</strong> a exaustão. À noite era freqüentemente acordado, tendo suas roupas de cama<br />

retiradas e seu colchão molhado. Ficou cerca de 10 dias sem ver sua família. A alimentação vinha remexida<br />

e salgada. Solicitou m<strong>é</strong>dico e dentista e <strong>seus</strong> pedidos foram ignorados.<br />

Ao voltar para o BINFA do IIIº COMAR, ainda junto com Nazareno e outros dois presos, suas<br />

torturas continuaram. Num determinado dia, foi tão espancado que perdeu os sentidos. Por vezes, ficavam<br />

dias sem água. Aberto inqu<strong>é</strong>rito na Justiça Militar, por denúncia do soldado, nada foi apurado. Foi aberto<br />

tamb<strong>é</strong>m um inqu<strong>é</strong>rito policial na Polícia Federal e seu caso vem sendo acompanhado, desde janeiro de<br />

2001, pela Procurador Federal dos Direitos do Cidadão, no Rio de Janeiro, Dr. Daniel Sarmento.<br />

10. S<strong>é</strong>rgio Wanderley Macedo da Costa, 25 anos ( possível suicídio )<br />

O terceiro sargento do Ex<strong>é</strong>rcito S<strong>é</strong>rgio teria se suicidado no refeitório do Batalhão – Escola de<br />

Engenharia do Ex<strong>é</strong>rcito, em Santa Cruz (RJ) com um tiro na cabeça, em 11 de setembro de 1999. As fotos<br />

vistas pela família, mostravam um tiro por trás da orelha direita de S<strong>é</strong>rgio. Segundo <strong>seus</strong> pais ele nunca se<br />

suicidaria e vinha reclamando de que o estavam perseguindo no Batalhão.<br />

11. Fernando Romel Fernandes de Oliveira, 18 anos - (tortura e morte)<br />

Em 02 de junho de 1996, o soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Romel foi espancado e torturado para dizer onde se<br />

encontrava uma arma desaparecida no 26 o Batalhão de Infantaria Pára-quedista (RJ). Morreu oito horas<br />

depois no CTI do Hospital Central do Ex<strong>é</strong>rcito. Seu pai relata que soube que seu filho havia sido<br />

barbaramente espancado. Segundo dois amigos de Fernando, em 14 de maio, acusado pelo<br />

desaparecimento de uma pistola privativa das Forças Armadas, foi detido e impedido de se comunicar com<br />

a família. “Após o expediente , dois homens entraram na cela, supervisionados pelo sargento J. Gonçalves<br />

(...) (que) mandava bater com uma borracha e perguntava a quem Romel tinha dado a pistola. Como ele<br />

negava o furto, as pancadas não paravam (...). No dia seguinte ao espancamento, Romel recebeu<br />

novamente a visita do sargento na cela (...), foi mais uma vez espancado. Dia 16, o soldado começava<br />

passar mal (...). Três dias depois, como o estado de saúde do rapaz piorou, o comando determinou a<br />

5


6<br />

internação” (Jornal O Dia, 28/09/97, p. 24). Três dias depois de ser levado ao Hospital Central do Ex<strong>é</strong>rcito,<br />

em 19 de maio, Romel entrou em coma.<br />

responsáveis.<br />

A família entrou com ação contra o Ex<strong>é</strong>rcito, pedindo à Auditoria Militar o indiciamento dos<br />

12. Marcos Jos<strong>é</strong> de Sales Cantuária, 19 anos – (tortura)<br />

Em 10 de julho de 2000, o soldado Marcos e um grupo de recrutas da Brigada Pára-quedista do<br />

Ex<strong>é</strong>rcito estavam na Serra do Mendanha (zona oeste do Rio de Janeiro) para exercícios. Marcos não<br />

conseguindo executar esses exercícios, foi espancado com grande violência durante quatro dias, pois havia<br />

passado mal e não pode continuar. A família pensou entrar com processo contra o Ex<strong>é</strong>rcito, mas não foi<br />

adiante.<br />

13. Jeremias Pedro da Silva, 23 anos – (morte – provável morte não acidental)<br />

O soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Jeremias foi morto, em 07 de julho de 2000, segundo informações, por um<br />

tiro disparado por um colega num Quartel da Vila Militar (RJ). O caso foi narrado de forma estranha e<br />

confusa, pois a família de Jeremias chegou, a pedido das autoridades <strong>militar</strong>es, a assinar um termo de<br />

perdão ao autor do disparo, o tamb<strong>é</strong>m soldado Wagner Vital Pegado, amigo de Jeremias.<br />

14. S<strong>é</strong>rgio Rodrigo Pereira Gomes, 20 anos - ( morte)<br />

O corpo do soldado da Aeronáutica S<strong>é</strong>rgio foi encontrado, em 30 de junho de 2000, com um tiro de<br />

calibre 9 mm na cabeça, em terreno da Aeronáutica , no Galeão (Ilha do Governador/RJ). Havia<br />

desaparecido, em 29 de junho, quando dava guarda na Prefeitura do Galeão. O estranho <strong>é</strong> que <strong>seus</strong><br />

familiares, no mesmo dia 29, foram procurados por soldados da Aeronáutica em busca de uma pistola Imbel<br />

9 mm (pistola de uso exclusivo da Aeronáutica) que estava em poder do soldado.<br />

15. Vilson Coelho Inácio – (tratamento de saúde)<br />

Em 1993, familiares do soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Vilson foram obrigados a entrar na Justiça para que o<br />

rapaz recebesse tratamento m<strong>é</strong>dico, pois sofria de febre reumática, doença que pode ser fatal se não<br />

houver tratamento adequado. Apesar disso, o comando do 1º Batalhão Logístico do Ex<strong>é</strong>rcito (RJ), onde<br />

Vilson servia, impediu que um m<strong>é</strong>dico civil o examinasse.<br />

16. Celestino Jos<strong>é</strong> Rodrigues Neto, 14 anos – (suicídio)<br />

Em 15 de maio de 1990, o aluno da oitava s<strong>é</strong>rie do Col<strong>é</strong>gio Militar, do Rio de Janeiro, suicidou-se<br />

depois de ter sido submetido a humilhação pública diante dos colegas e da mãe no pátio do Col<strong>é</strong>gio.<br />

Motivo: o garoto consultou um livro enquanto fazia a prova de Geografia, tendo sido suspenso por seis dias.<br />

Suicidou-se dois dias depois, deixando uma carta com um pedido de desculpas para a mãe, que<br />

acompanhara toda a cena no pátio da escola.


17. João Vicente Santana – (possível suicídio)<br />

Em maio de 1992, no Rio de Janeiro, o soldado da Aeronáutica João Vicente teria cometido<br />

suicídio. A Aeronáutica apenas informou que o soldado se matara com um tiro de fuzil no pescoço.<br />

Entretanto, no atestado de óbito, a causa da morte foi atribuída a uma “contusão com fratura de crânio” .<br />

18. Paulo Roberto Vieira Barbosa, 19 anos – (tentativa de suicídio)<br />

Em 22 de agosto de 1993, o soldado Paulo, após três meses servindo na 1ª Companhia do<br />

Batalhão de Polícia do Ex<strong>é</strong>rcito (Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro), tentou o suicídio com quatro tiros.<br />

Segundo <strong>seus</strong> companheiros, ele recebia sua segunda punição por não ter se submetido à revisão do corte<br />

de cabelo. No dia 22, apesar de estar bastante deprimido, foi obrigado a fazer a conferência de armas no<br />

Batalhão, quando atirou contra si. Al<strong>é</strong>m de perder um rim, Paulo quebrou uma costela e os tiros tamb<strong>é</strong>m<br />

atingiram o fígado e o pulmão.<br />

19. João Antonio Caputo, 31 anos – (assassinato)<br />

O capitão – m<strong>é</strong>dico Caputo foi assassinado a tiros, em São Gonçalo/RJ, em 13 de novembro de<br />

1990. Segundo documento confidencial do Ex<strong>é</strong>rcito, que o Jornal O Globo teve acesso, o oficial denunciou,<br />

em 23 de julho de 1990, ao Minist<strong>é</strong>rio do Ex<strong>é</strong>rcito, em Brasília, e ao Comando Militar do Leste, no Rio, o<br />

desaparecimento de várias caixas de medicamentos e de material cirúrgico do Hospital Central do Ex<strong>é</strong>rcito.<br />

Ao investigar o caso, Caputo descobriu que por trás dos roubos no hospital havia uma quadrilha tamb<strong>é</strong>m<br />

dedicada a contrabando de armas e munição.<br />

Seu corpo foi encontrado na mala de seu carro abandonado, com as mãos amarradas e com três<br />

perfurações de pistola 45. O Ex<strong>é</strong>rcito não investigou, afirmando que o esclarecimento do assassinato<br />

competia à Justiça comum.<br />

20. Alexander Cristiano da Silva – (provável suicídio)<br />

O soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Alexander que servia no Batalhão de Aviação do Ex<strong>é</strong>rcito, de Taubat<strong>é</strong>/SP,<br />

suicidou-se em 05 de dezembro de 1993. Estava preso no quartel há uma semana por tentativa de<br />

deserção e, segundo informações do próprio Ex<strong>é</strong>rcito, se enforcou com o cadarço de seu coturno.<br />

21. Carlos Rodrigo da Rocha Flores, 18 anos – (morte)<br />

O soldado do Ex<strong>é</strong>rcito Flores que servia no 16º Grupo de Artilharia de Campanha, na cidade de São<br />

Leopoldo (Rio Grande do Sul), morreu, em 09 de abril de 2000, com leptospirose (doença transmitida por<br />

bact<strong>é</strong>rias encontradas na urina de ratos). Mais 23 soldados do Batalhão de Carlos foram internados com os<br />

mesmos sintomas de leptospirose, dias depois. Todos os soldados fizeram treinamentos em um terreno<br />

onde foram localizadas várias tocas de ratos e esgotos que contaminam os córregos e lagos da região.<br />

7


O Ex<strong>é</strong>rcito pagou uma indenização à família de Flores e o caso foi simplesmente encerrado.<br />

22. Anderson Hilário de Souza, 21 anos à <strong>é</strong>poca da prisão – (tortura)<br />

Acusado de tentar estuprar uma <strong>militar</strong> da Aeronáutica, o civil Anderson foi preso, em 17/02/1997,<br />

sendo levado para o BINFA no III COMAR (RJ). Ali permaneceu por quase dois anos, sendo torturado<br />

diariamente, at<strong>é</strong> 29/01/1999, quando foi transferido, bastante desequilibrado emocionalmente, para o<br />

Hospital Penitenciário Heitor Carrilho onde cumpre pena.<br />

No BINFA ficou na mesma cela que o cabo Nazareno Vargas e o soldado Anderson G. Monteiro,<br />

passando pelas mesmas violentas e bárbaras torturas que os dois sofreram (agressões, espancamentos,<br />

estrangulamentos, sevícias sexuais, choques el<strong>é</strong>tricos). Por vezes, as torturas eram tão fortes que ficava<br />

desacordado.<br />

Seus familiares relatam as marcas de torturas visíveis em seu corpo quando iam visitá-lo.<br />

Foi aberto inqu<strong>é</strong>rito policial na Polícia Federal para apurar as responsabilidades dessas torturas no<br />

IIIº COMAR e, desde janeiro de 2001, seu caso vem sendo acompanhado pela Procurador Federal dos<br />

Direitos dos Cidadãos, no Rio de Janeiro, Dr. Daniel Sarmento.<br />

23. Andr<strong>é</strong> Luiz Oliveira da Silva, 45 anos à <strong>é</strong>poca da prisão – (torturas)<br />

Sargento da Aeronáutica, Andr<strong>é</strong> estava lotado em Manaus. Em meados de 1997, saiu de lá por<br />

estar sendo perseguido em razão de denunciar que aviões da FAB estavam sendo utilizados para o tráfico<br />

de armas e drogas na região. Veio para o Rio com licença de saúde e foi obrigado a voltar por ter sido<br />

acusado de deserção. Voltou ao Rio, após ter sido absolvido no processo e, atrav<strong>é</strong>s de uma ação judicial,<br />

conseguiu permanecer nesta cidade, junto de <strong>seus</strong> familiares, para tratamento de saúde (<strong>é</strong> hipertenso e<br />

cardíaco).<br />

Em 31/03/1999, um automóvel foi a sua residência com homens à paisana, fortemente armados e,<br />

diante de <strong>seus</strong> dois filhos menores, foi agredido e jogado dentro do carro. Foi levado para o IIIº COMAR e<br />

ficou 22 dias na cela do BINFA junto com o cabo Nazareno e o soldado Anderson Monteiro. Por sua patente<br />

deveria ficar em alojamento <strong>militar</strong> e não em uma cela<br />

Hipertenso e cardíaco, passou mal quase que diariamente (dores no peito, falta de ar, suores, boca<br />

mole, babando) sem que lhe fosse dado qualquer medicamento e nem a presença de um m<strong>é</strong>dico. Era<br />

freqüentemente ameaçado de morte.<br />

Como os dois outros presos, não teve direito a banho de sol e a comida quando era servida vinha fria,<br />

salgada e com presença de animais queimados (baratas e lagartixas). A água servida era amarelada com<br />

cheiro de urina.<br />

Um sargento da Aeronáutica, em depoimento dado ao Minist<strong>é</strong>rio Público Federal do Rio de Janeiro,<br />

afirmou que, no BINFA do IIIº COMAR, al<strong>é</strong>m dos presos serem “privados de água, às vezes por vários dias,<br />

por crueldade”, na alimentação deles era comum se misturar “urina, cuspe, esperma e at<strong>é</strong> restos de<br />

animais”. Al<strong>é</strong>m disso, este <strong>militar</strong>, confirmou as denúncias anteriormente feitas pelo cabo Nazareno, pelo<br />

soldado Anderson Monteiro e pelo civil Anderson Hilário de que naquele local as torturas e maus tratos aos<br />

presos eram comuns, que os agressores normalmente usavam capuz e que não há denúncias porque as<br />

pessoas têm medo.<br />

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9<br />

<strong>Ainda</strong> sobre o sargento Andr<strong>é</strong> Luiz, após ter sido liberado, apesar de bastante debilitado física e<br />

psicologicamente (tem medo de sair à rua) fez denúncia ao Minist<strong>é</strong>rio Público Militar, tendo sido aberto<br />

Inqu<strong>é</strong>rito Policial Militar, onde passou de vítima a r<strong>é</strong>u.<br />

Em janeiro de 2001, seu caso começou a ser acompanhado pelo Procurador Federal dos Direitos dos<br />

Cidadãos, no Rio de Janeiro, Dr. Daniel Sarmento.<br />

Estes são apenas alguns casos tornados públicos. Supõe-se que muitos outros aconteçam no cotidiano dos<br />

quart<strong>é</strong>is e durante os treinamentos. Entretanto, o silêncio e a impunidade têm sido a norma.<br />

B – A Espionagem do Ex<strong>é</strong>rcito e a Questão dos Mortos e Desaparecidos Políticos.<br />

No mês de junho do corrente ano, por solicitação da Procuradoria Geral da República do RJ -<br />

atrav<strong>é</strong>s de petição feita pelo Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e outras entidades de direitos humanos - os<br />

Procuradores da República Guilherme Schelb (DF), Marlon Alberto Weinchert (SP), Ubiratan Cazzeta e<br />

Felício pontes (PA) instalaram Inqu<strong>é</strong>rito Civil Público visando esclarecer fatos relacionados à Guerrilha do<br />

Araguaia (episódio sempre negado pelo Ex<strong>é</strong>rcito e que ocorreu no sul do estado do Pará, de 1972 a 1974,<br />

quando aconteceu o massacre de 69 militantes políticos do PC do B, fora dezenas de moradores da região<br />

que foram exterminados e transformados em desaparecidos. Nesta operação foram utilizados cerca de<br />

3.500 homens do Ex<strong>é</strong>rcito)<br />

Em diligências feitas na cidade de Marabá (sul do Pará), o Minist<strong>é</strong>rio Público Federal e a Polícia<br />

Federal apreenderam documentos, divulgados pela Folha de São Paulo, que revelam o desrespeito à<br />

ordem democrática e à própria Constituição Brasileira.<br />

Estes pap<strong>é</strong>is apareceram por acaso, durante um inqu<strong>é</strong>rito do Minist<strong>é</strong>rio Público para localizar os<br />

restos mortais dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia. Os procuradores realizaram uma operação de<br />

busca numa instalação do Ex<strong>é</strong>rcito, disfarçada de agência de notícias, onde os "jornalistas" eram, em<br />

realidade, agentes secretos.<br />

O conteúdo desses documentos mostram que muitos dispositivos e serviços de informação, tão<br />

fortalecidos durante a <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong>, perduram at<strong>é</strong> hoje. Desde o primeiro mandato de Fernando Henrique<br />

Cardoso, o termo "subversivo", utilizado nos anos 60 e 70, foi trocado por "forças adversas" para designar<br />

movimentos populares e organizações sociais. Eles são equiparados ao crime organizado e ao narcotráfico.<br />

Um dos textos afirma que a polícia, para assegurar a ordem e o bem públicos, se permite "arranhar direitos<br />

dos cidadãos numa esp<strong>é</strong>cie de arbítrio necessário".**<br />

Nos documentos descobertos, a definição de forças adversas aparece como "grupos, movimentos<br />

sociais, entidades e ONGs (...) que provocam reflexos negativos para a segurança nacional (..). No<br />

momento atual, verificam-se exemplos dessas entidades no crime organizado, no narcotráfico e nos<br />

movimentos populares como o MST".<br />

O Ex<strong>é</strong>rcito ainda coloca a hipótese destes grupos realizarem "atos de sabotagem" contra suas<br />

instalações. Caso isso ocorra, a recomendação aos agentes <strong>é</strong> clara: "repelir e/ou eliminar a força adversa<br />

que tenha se infiltrado". Nessas ocasiões, deve-se fornecer ao Órgão de Inteligência "armamento e munição<br />

a todos os integrantes" .<br />

** Reportagens de 2 a 17/08/2001 no Caderno Brasil do jornal Folha de São Paulo.


10<br />

Em 1998, o Ex<strong>é</strong>rcito deflagrou um plano secreto para espionar o MST, chamado de "Operação<br />

Pescado". Esse plano <strong>é</strong> financiado com verbas públicas ocultas e possui duração "indeterminada". Com o<br />

objetivo de justificar esse plano, o Ex<strong>é</strong>rcito traçou um perfil revolucionário do MST em <strong>seus</strong> documentos,<br />

que dizem: [O MST tem] "objetivo definido de tumultuar a ordem vigente e comprometer a confiança nas<br />

instituições e no regime atual do governo". A cada novo relatório, os agentes recomendam o<br />

prosseguimento dessa operação. Em 30 de agosto de 2000, o capitão Andr<strong>é</strong> Luiz Silva anotou: " A<br />

Operação Pescado deve continuar, devido (...) à importância de manter um constante acompanhamento do<br />

alvo, que pode se tornar, a qualquer momento, força adversa em operações de garantia da lei e da ordem".<br />

Al<strong>é</strong>m do MST, outros movimentos estão sob vigilância: MLT (Movimento de Luta pela Terra), MTRB<br />

(Movimento dos Trabalhadores Rurais Brasileiros), MNT (Movimento Nacional dos Trabalhadores),<br />

MMBTRST (Movimento Muda Brasil dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e CPT (Comissão Pastoral da<br />

Terra).<br />

No início de 2000, o Ex<strong>é</strong>rcito iniciou outra operação secreta contra o MST, chamada "Tempestade".<br />

Segundo documentos divulgados pela Folha de S. Paulo, o objetivo desta missão era "levantar a localização<br />

e a data de invasões, manifestações e ocupações" do MST. A operação durou at<strong>é</strong> setembro de 2000.<br />

Al<strong>é</strong>m disso, os documentos divulgados revelam que o Ex<strong>é</strong>rcito montou outra operação secreta,<br />

denominada "Poseidon", para espionar ONGs. Esses textos indicam que a inteligência do Ex<strong>é</strong>rcito tem<br />

interesse especial por entidades de defesa do meio ambiente, de direitos humanos e que trabalham com a<br />

questão indígena.<br />

Foi descoberta tamb<strong>é</strong>m uma tabela de preços usada por pistoleiros na região norte do país. Essa<br />

tabela revela que, em Marabá, "a morte de um trabalhador rural pode não valer mais do que uma dose de<br />

cachaça. Se [o trabalhador] for ligado ao MST, o custo costuma ser de R$ 5.000". A morte de um fiscal do<br />

Ibama considerado rigoroso pode chegar a R$ 10 mil e a morte de um delegado de polícia pode custar R$<br />

15 mil. Al<strong>é</strong>m disso, a tabela indica que comerciantes, vereadores, fazendeiros e políticos em geral podem<br />

ser assassinados por recompensas que variam de R$ 5.000 a R$ 10.000.<br />

A correta atitude do Minist<strong>é</strong>rio Público Federal de trazer a público a espionagem que, em pleno<br />

início do s<strong>é</strong>culo XXI, ainda acontece sofreu um duro golpe. Em final de agosto do corrente ano, atendendo a<br />

um mandato de segurança da Advocacia Geral da União, foi concedida liminar pelo juiz João Batista Gomes<br />

Moreira, do Tribunal Regional Federal, que determinou a imediata devolução de toda a documentação do<br />

Serviço de Inteligência do Ex<strong>é</strong>rcito, apreendida em Marabá.<br />

Estes documentos foram tamb<strong>é</strong>m encontrados em outras duas casas (uma em Brejo Grande e outra<br />

em Nova Marabá) utilizadas pelo Ex<strong>é</strong>rcito como escritórios clandestinos com vistas ao monitoramento das<br />

atividades na região. Como já afirmado, tal quadro demonstra claramente, a manutenção do aparato<br />

repressivo relativo ao sistema de inteligência do governo federal, não obstante a reformulação de sua<br />

estrutura, ocorrida em 1994.<br />

Antes da expedição do mandato de segurança, em agosto do ano corrente, o Comandante Militar da<br />

Amazônia, General Vald<strong>é</strong>cio Guilherme de Figueiredo oficiou à Justiça Federal de Marabá, queixando-se da<br />

apreensão dos documentos, referindo-se aos funcionários que procederam à apreensão – em decorrência<br />

de autorização judicial – de “supostos agentes do Departamento de Polícia Federal e supostos<br />

Procuradores da República” (Folha de São Paulo, 27/08/01)<br />

Parte da documentação, encontrada no sul do Pará, apontou tamb<strong>é</strong>m para a chamada “Operação<br />

Anjos da Guarda”, ou seja, a vigilância e o monitoramento aos ex-colaboradores do Ex<strong>é</strong>rcito na região que


11<br />

atuaram na repressão à Guerrilha do Araguaia. Tal operação tem consistido em fornecer cestas de<br />

alimentos, armas consideradas frias e ajuda em dinheiro para os que colaboraram com o Ex<strong>é</strong>rcito, naquela<br />

região, no período da <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong>.<br />

Entre os documentos que dizem respeito à guerrilha do Araguaia constam relatórios com detalhes<br />

do ponto de vista estrat<strong>é</strong>gico-<strong>militar</strong>, fazendo parte das Operações “Papagaio” (1972) e “Sucuri” (1973-<br />

1974). Foram tamb<strong>é</strong>m encontradas listagens com nomes de guerrilheiros mortos e presos, de moradores da<br />

região e dos <strong>militar</strong>es, com identidades plantadas, que fizeram parte das duas operações. Outros<br />

documentos apontam, o que as entidades de direitos humanos há muito denunciavam, que os corpos dos<br />

opositores políticos mortos, at<strong>é</strong> hoje desaparecidos, não foram jogados a esmo na selva. Depois de<br />

identificados, acabaram em covas selecionadas (Folha de São Paulo, 19/08/01, p. A14).<br />

Enquanto isto, o Ex<strong>é</strong>rcito, em 07/08/01, em nota oficial divulgada afirmava que: “ Quanto aos<br />

desaparecidos nos combates travados naquela região, <strong>é</strong> importante salientar o que o Ex<strong>é</strong>rcito tem reiterado<br />

exaustivamente quando consultado a respeito do assunto: “nos arquivos existentes, nada foi encontrado<br />

que pudesse indicar a localização de <strong>seus</strong> corpos” (Folha de São Paulo, Idem)<br />

Outros documentos do Centro de Informações do Ex<strong>é</strong>rcito, de abril de 1973, apresentam os nomes<br />

e codinomes de 32 <strong>militar</strong>es mobilizados para espreitar a guerrilha que contaram com o apoio de 21 civis,<br />

muitos dos quais recrutados na área.<br />

O Grupo Tortura Nunca Mais/RJ pesquisando em suas listagens e nas do Projeto Brasil Nunca<br />

Mais, coordenado pela Arquidiocese de São Paulo, levantou que 5 desses <strong>militar</strong>es já haviam sido<br />

denunciados como torturadores e membros do aparato de repressão. E’ importante enfatizar que o Projeto<br />

Brasil Nunca Mais – uma das radiografias mais completas sobre o regime <strong>militar</strong> – <strong>é</strong> o resultado da<br />

microfilmagem de todos os processos vinculados à questão da “segurança nacional” que se encontram no<br />

Superior Tribunal Militar, abarcando o período de 1964 a 1979. Trata-se, portanto, de documentação oficial<br />

que não pode ser rotulada de facciosa. Os 5 <strong>militar</strong>es cujos nomes constam nesse Projeto Brasil Nunca<br />

Mais são: Armando Honório da Silva (3 O Sargento do Ex<strong>é</strong>rcito, servindo em Brasília); Milhurges Alves<br />

Ferreira (2 O . Sargento, do Ex<strong>é</strong>rcito, servindo em Goiânia); Aluízio Madruga de Moreira e Souza (1 o Tenente<br />

da Aeronáutica, servindo no Rio de Janeiro); Jos<strong>é</strong> dos Reis (3 o Sargento do Ex<strong>é</strong>rcito, servindo em Brasília);<br />

Joaquim Artur Lopes de Souza (3 o Sargento do Ex<strong>é</strong>rcito, servindo em Brasília).<br />

Os documentos demonstram, ainda, que as duas operações realizadas pelo Ex<strong>é</strong>rcito na região contaram<br />

com o apoio da Marinha, da Aeronáutica e de policiais <strong>militar</strong>es do Maranhão, Pará e Goiás (Folha de São<br />

Paulo, idem).<br />

Todas essas informações oficiais, cujo teor foi ainda muito pouco divulgado, demonstram<br />

cabalmente duas questões. A primeira, diz respeito à existência dos chamados arquivos secretos da<br />

repressão (SNI, DOI-CODIs, Serviços Secretos da Marinha, Ex<strong>é</strong>rcito e Aeronáutica) que at<strong>é</strong> agora não<br />

foram trazidos a público. At<strong>é</strong> hoje as autoridades <strong>militar</strong>es e civis de nosso país teimam em afirmar que tais<br />

arquivos não existem. Com esses documentos começa a ser revelada a história das violências cometidas,<br />

com o carimbo oficial, em um dos mais sangrentos episódios de nosso passado recente: a guerrilha do<br />

Araguaia. Segredos, entretanto, que ainda estão longe de serem totalmente revelados e trazidos ao<br />

conhecimento de toda a sociedade.<br />

A segunda questão, continuidade desta primeira, <strong>é</strong> a de que a história das mortes e<br />

desaparecimentos ocorridos durante o período de terrorismo de Estado, em nosso país, <strong>é</strong> uma questão em


12<br />

aberto. O esclarecimento desses assassinatos cometidos em nome da Segurança Nacional, e a<br />

responsabilização de <strong>seus</strong> mandantes e executores ainda não se fez.<br />

Vale ressaltar o trabalho desenvolvido, de 1996 a 1998, pela Comissão Especial criada pela Lei<br />

9.140/95 sobre mortos e desaparecidos políticos, que reconheceu - apesar das limitações da Lei - centenas<br />

de militantes mortos sob a guarda do Estado, trazendo ao conhecimento público as circunstâncias de<br />

algumas de suas mortes. Entretanto, a segunda parte dos trabalhos – prevista pela própria Lei – que<br />

deveria ser a investigação dos locais onde estariam os restos mortais dos desaparecidos e de alguns<br />

mortos e o depoimento de várias autoridades elencadas nas petições feitas pelos familiares para prestarem<br />

esclarecimentos, at<strong>é</strong> hoje não aconteceu. Desde 1998 esta Comissão não mais se reuniu. No exterior as<br />

autoridades brasileiras têm afirmado, inclusive em instâncias de direitos humanos internacionais, que a<br />

questão das mortes e desaparecimentos políticos ocorridos durante o período da <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong> <strong>é</strong> uma<br />

página virada de nossa história; <strong>é</strong> uma questão já resolvida.<br />

Em alto e bom som afirmamos que não. Todos aqueles que defendem os direitos humanos e o<br />

resgate de nossa história continuam lutando pela:<br />

responsáveis.<br />

1 - imediata abertura de todos os arquivos da repressão.<br />

2- Esclarecimento das circunstâncias em que se deram as mortes e os desaparecimentos e os <strong>seus</strong><br />

3- Localização dos restos mortais desses militantes desaparecidos e mortos.<br />

4- Ampliação da Lei 9.140/95 que deverá contemplar os mortos em manifestações públicas durante<br />

a <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong>; que não deverá restringir o prazo para os familiares requererem os <strong>seus</strong> direitos; que<br />

deverá estender o período de sua abrangência at<strong>é</strong> o final da <strong>ditadura</strong>, em 1985 e que deverá colocar o ônus<br />

das provas nas mãos do Estado e não na dos familiares, como ainda se encontra na letra da referida Lei.<br />

C- Os Terrorismos de Estado e as Doutrinas de Segurança Nacional Globalizadas.<br />

Diante do horror e da barbárie provocados pelos atos terroristas contra o povo norte-americano,<br />

ocorridos no dia 11 de setembro último, deve-se, lamentar, se solidarizar e se unir à dor dos familiares das<br />

vítimas. Entretanto, não se pode aceitar a escalada terrorista a nível mundial, encabeçada pelo governo dos<br />

Estados Unidos, que vem ferindo profundamente os direitos dos cidadãos.<br />

Não se pode esquecer que o governo norte-americano, desde há muito, tem desenvolvido uma<br />

política externa belicista e de desrespeito aos direitos humanos. Sua ação imperialista tem provocado um<br />

quadro de imensa pobreza nos países do terceiro mundo.<br />

Pode-se evidenciar sua participação ativa, não só apoiando, como financiando governos ditatoriais e<br />

terroristas, com medo de que o surgimento de governos democráticos possam produzir regimes que sejam<br />

hostis a <strong>seus</strong> interesses. Talvez por ironia, no dia 11 de setembro, dia do ataque terrorista às torres gêmeas<br />

do Word Trade Center, em Nova York, e ao Pentágono, em Washington, há 28 anos atrás, o Chile perdia<br />

sua democracia em um golpe <strong>militar</strong> que o governo americano alimentou e sustentou.<br />

<strong>Ainda</strong> estão presentes na memória de todos os bombardeios efetuados pelos Estados Unidos à<br />

Hiroshima e Nagasaki, à Cor<strong>é</strong>ia do Norte, ao Vietnã, Bagdá e Belgrado.


13<br />

Não se pode deixar de citar o embargo econômico criminoso, liderado pelo governo americano à<br />

Cuba e ao Iraque que, neste país, nos últimos dez anos, provocou a morte de 500 mil crianças com menos<br />

de 5 anos. Todos esses fatos, são sem dúvida, exemplos do terrorismo de Estado que vem sendo praticado<br />

há anos pelo governo norte – americano.<br />

Ao lembrar esses acontecimentos não se está, em hipótese alguma, justificando o crime contra a<br />

humanidade ocorrido, no último dia 11 de setembro, mas, mostrando que a demonização dos mulçumanos<br />

<strong>é</strong> hipócrita e vem sendo produzida porque <strong>é</strong> útil e necessário, neste momento, encontrar um culpado. Algum<br />

lugar deverá ser invadido, pois a indústria b<strong>é</strong>lica precisa mais ainda se fortalecer e, com toda a certeza, está<br />

festejando.<br />

Com a justificativa de que qualquer pessoa pode ser um inimigo, apressam-se em editar leis<br />

anulando as garantias dos cidadãos. Todos passam a ser terroristas em potencial e, por isso, devem ser<br />

monitorados e vigiados. Leis que , ao arrepio das que vigoram nos países ditos civilizados, ferem<br />

brutalmente os direitos civis tão duramente conquistados. Leis anti-terror proclamadas pelo governo Bush<br />

que poderão permitir, por exemplo, que qualquer estrangeiro nos Estados Unidos possa ser detido por<br />

tempo indeterminado, sem a necessidade de autorização judicial; muitos estudantes já vêm sendo<br />

monitorados e alguns estão detidos. “A detenção costumava ser limitada a 24 horas at<strong>é</strong> que a Casa Branca<br />

estendeu-a para 48 horas na semana passada, na esteira do clamor antiterrorista” (Jornal do Brasil,<br />

26/09/01, p.3).<br />

Leis que prevêm tamb<strong>é</strong>m “uma maior desenvoltura dos agentes de segurança para monitorar<br />

ligações telefônicas e mensagens via internet – um velho desejo dos conservadores que, at<strong>é</strong> hoje, vinha<br />

sendo derrotado no Congresso” (Jornal do Brasil, idem.)<br />

E, pasmem, propõe-se que sejam válidas perante os tribunais gravações e confissões obtidas por<br />

meios ilegais, inclusive tortura, desde que fora do território norte-americano. Quanta hipocrisia!<br />

Em final de setembro, dois generais norte-americanos receberam de Bush o poder de ordenar o<br />

abatimento de aviões comerciais suspeitos, mesmo que não consigam contatá-lo.<br />

“Nesse impulso, Bush projetou os Estados Unidos como força imperial declarada, voz única a ser<br />

seguida ou punida. `A vingança` e o `extermínio de santuários e at<strong>é</strong> de Estados` passaram a ser, na hora e<br />

na forma, deliberações de uma só vontade, que deu por anuladas as leis e os tratados internacionais”,<br />

afirma o colunista Jânio de Freitas (“Silêncio no Mundo”, Folha de São Paulo, 30/09/01, p. A5).<br />

Mais adiante, neste mesmo artigo, este colunista alerta para o que a política belicista-expansionista<br />

do governo Bush vem produzindo, em especial com relação à ONU: “toma-lhe as atribuições, esvazia-a,<br />

nega-a como poder normativo das relações internacionais e como foro deliberativo e interveniente quando,<br />

como, e onde a convivência pacífica a requeira” (idem).<br />

A liberdade de expressão, em solo norte-americano, tamb<strong>é</strong>m vem sofrendo s<strong>é</strong>rios, perigosos e<br />

preocupantes revezes: jornalistas têm sido demitidos por fazer críticas ao governo Bush; anunciantes<br />

suspendem patrocínio a programas mais questionadores e o porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer,<br />

afirmou que as organizações noticiosas e os americanos, “em tempos como estes”, devem “prestar atenção<br />

ao que dizem e ao que fazem” (Jornal do Brasil, 29/09/2001, p.12).<br />

Em final de setembro, grupos <strong>militar</strong>es americanos e ingleses já haviam invadido o Afeganistão no<br />

encalço do terrorista saudita Osama Bin Ladem. “Embora não tenham dado detalhes sobre as missões,<br />

fontes do Pentágono confirmaram que a guerra começou longe dos olhos do público” (O Globo, 29/09/01,<br />

p.1). Daí para criminalizar as entidades de direitos humanos <strong>é</strong> um passo.


14<br />

O governo norte-americano tem assegurado que grupos terroristas estão explorando o<br />

contrabando e usando entidades de caridade falsas para arrecadar recursos na região da tríplice fronteira<br />

entre Brasil, Paraguai e Argentina”(Folha de São Paulo, 28/09/01, p. A12). Em resposta às fortes pressões<br />

exercidas pelo governo Bush, o Brasil formou com a Argentina, o Paraguai e o Uruguai um grupo de<br />

trabalho permanente para combater o terrorismo no continente (Jornal do Brasil, 29/09/01, p.7).<br />

Já se analisou anteriormente a quem, por exemplo, os serviços de informações no Brasil,<br />

consideram como forças “adversas”: os movimentos populares e as organizações sociais, em especial o<br />

MST, sendo, por isso, cabível “arranhar direitos dos cidadãos”.<br />

Nesta escalada terrorista global abriu-se, no Brasil, em final de setembro último, um escritório do<br />

serviço secreto norte-americano, na cidade de São Paulo. Informam que operações semelhantes já<br />

funcionam em Paris, Londres, Moscou e Hong Kong.” Ele se destinaria a aprofundar a colaboração entre os<br />

governos dos dois países para reprimir a lavagem de dinheiro e, se for o caso, trocar informações sobre<br />

movimentos terroristas” (Elio Gaspari, O Globo, 26/09/01, p.7)<br />

Ou seja, já funcionam no Brasil, escritórios da DEA (combate ao tráfico de drogas), do FBI e da CIA<br />

e agora um outro da comunidade de informações da embaixada norte-americana.<br />

Assiste-se, assim, capitaneada pelo governo Bush, a uma perigosa exacerbação das políticas<br />

<strong>militar</strong>izadas de segurança pública e a uma abusiva intromissão nos países ocidentais, considerados aliados<br />

dos Estados Unidos.<br />

No estado do Rio de Janeiro, acompanhando essa perversa e perigosa conjuntura que vem sendo<br />

produzida a nível internacional, o atual Secretário de Segurança Pública, coronel Josias Quintal, ex-analista<br />

de informações do DOI-CODI/RJ, em setembro do corrente, apressou-se em criar uma unidade anti-<br />

terrorismo. Importante esclarecer que seu nome já foi denunciado pelo Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e o<br />

Centro de Justiça Global diante do Comitê Contra a Tortura da ONU e que, sob sua gestão, a segurança<br />

pública em nosso estado vem sendo gradativamente <strong>militar</strong>izada. Esta unidade anti-terrorismo ficará sob o<br />

comando do tamb<strong>é</strong>m ex-membro do aparato de repressão da <strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong>, o tenente-coronel da PM,<br />

Paulo C<strong>é</strong>sar Amêndola de Souza, cujo nome consta no Projeto Brasil Nunca Mais, coordenado pela<br />

Arquidiocese de São Paulo, como envolvido em diligências e investigações, no início dos anos 70, período<br />

em que mais se torturou em nosso país. Este senhor, em 1993 foi indicado pelo prefeito à <strong>é</strong>poca, Sr. C<strong>é</strong>sar<br />

Maia, para a Superintendência da Guarda Municipal da cidade do Rio de Janeiro, <strong>militar</strong>izando-a e<br />

colocando-a para desempenhar funções que fugiam aos <strong>seus</strong> preceitos legais. Ou seja, sob seu comando a<br />

Guarda Municipal foi colocada para reprimir trabalhadores e movimentos sociais em nossa cidade.<br />

A unidade anti-terrorismo, que funcionará na Secretaria de Segurança Pública, agregada à<br />

Coordenação Geral de Controle de Contigências, foi criada com a intenção de identificar grupos, conhecer<br />

sua composição, sua ideologia, modo de agir e sua área de atuação.<br />

Certamente, essa unidade anti-terrorismo, chefiada por dois membros do aparato de repressão da<br />

<strong>ditadura</strong> <strong>militar</strong> de 1964, comunga das mesmas id<strong>é</strong>ias que o pacote de Leis antiterror proposto pelo governo<br />

Bush e o Serviço de Informações do Ex<strong>é</strong>rcito de nosso país.<br />

Entidades de direitos humanos têm repudiado a unidade anti-terrorismo criada, com toda a certeza,<br />

para reprimir os movimentos sociais organizados, como tamb<strong>é</strong>m a presença desses elementos do aparato<br />

repressivo ocupando cargos públicos, pagos com o dinheiro do contribuinte.<br />

Entende-se que tais pessoas deveriam, no mínimo, ser afastadas de suas funções públicas e não<br />

continuar atuando como se estiv<strong>é</strong>ssemos em pleno terrorismo de Estado.


15<br />

Assim, deve-se estar atento, pois uma nova era, que marca o início do s<strong>é</strong>culo XXI, vem se<br />

anunciando. Uma era preocupante onde as doutrinas de segurança nacional e os terrorismos de Estado se<br />

globalizam, se tornam mundiais.<br />

As entidades de direitos humanos devem procurar ferramentas para combatê-los; não temê-los,<br />

mas conhecê-los e tamb<strong>é</strong>m globalizarem-se atrav<strong>é</strong>s de redes de solidariedade e de apoio mútuo. Isto sem<br />

dúvida vem ocorrendo, quando percebemos que, apesar das limitações à liberdade de expressão, apesar<br />

do poderio dos meios de comunicação no sentido de nos fazerem crer que uma guerra iminente <strong>é</strong><br />

necessária, resistências estão acontecendo. Intelectuais, articulistas têm realizado análises lúcidas e<br />

importantes para que possamos entender melhor este momento. Manifestações pela paz contra a política<br />

belicista de Bush vêm ocorrendo em diferentes partes do mundo e no próprio coração dos Estados Unidos.<br />

A primeira grande passeata, em solo norte-americano, contra o envio de tropas para lutar no<br />

Afeganistão e por uma outra alternativa à guerra aconteceu, em 29 de setembro, em Washington. Uma<br />

grande faixa abria esta passeata: “Anticapitalistas contra a guerra, o racismo, o terrorismo e a propriedade”<br />

(O Globo, 30/09/01, p.35).

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