VOLUME 19, NÚMERO 4 • OUTUBRO, NOVEMBRO ... - SBNPE
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Publicação Oficial<br />
Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (<strong>SBNPE</strong>)<br />
Federación latinoamericana de Nutrición Parenteral y Enteral (Felanpe)<br />
Indexada no Index Medicus<br />
Latino Americano (Lilacs)<br />
ISSN 0103-7<strong>19</strong>6<br />
<strong>VOLUME</strong> <strong>19</strong>, <strong>NÚMERO</strong> 4 <strong>OUTUBRO</strong>, <strong>NOVEMBRO</strong>, DEZEMBRO DE 2004<br />
ARTIGOS ORIGINAIS<br />
A contribuição de líquido das frutas em 160-164<br />
dietas com restrição hídrica<br />
The contribution of liquid of fruits in<br />
water-restricted diets<br />
La contribución de líquidos de las frutas en<br />
dietas con restricción de agua<br />
Lis Proença Vieira, Miyoko Nakasato,<br />
Eun Yee Hong, Mitsue Isosaki<br />
Avaliação da ingestão energética e 165-169<br />
protéica de pacientes oncológicos<br />
Assessment of energy and protein intake<br />
in oncological patients<br />
Evaluación de la ingestión energética y<br />
proteica en pacientes oncológicos<br />
Simone Côrtes Coelho, Ana Clara Acar Novaes,<br />
Maria de Fátima França, Alexandra Faria dos Santos,<br />
Maríta Martins Lamas<br />
Consumo e padrões alimentares de pacientes 170-177<br />
com bulimia nervosa antes e depois de<br />
tratamento multiprofissional<br />
Food intake and eating pattern of bulimic patients before<br />
and after multiprofessional treatment<br />
Consumo alimenticio y estándares de alimentación de<br />
pacientes con bulimia nerviosa antes y después del<br />
tratamiento multiprofesional<br />
Marle dos Santos Alvarenga, Fernanda Baeza Scagliusi,<br />
Sonia Tucunduva Philippi<br />
Deficiência antioxidante em pacientes HIV+: 178-183<br />
deficiência global ou específica de nutrientes?<br />
Antioxidant deficiency in HIV+ patients: a global or<br />
specific deficiency of nutrients?<br />
Deficiencia antioxidante en pacientes VIH+: ¿ deficiencia<br />
global o específica de nutrientes?<br />
Maria Dorotéia Borges dos Santos, Paulo Câmara Marques<br />
Pereira, Roberto Carlos Burini<br />
Efetividade da intervenção fonoaudiológica 184-188<br />
em neonatos de unidade de terapia intensiva<br />
Effectiveness of the speech therapy intervention in a<br />
neonatal intensive care unit<br />
Efectividad de la intervención del logopeda en unidad de<br />
terapia intensiva para neonatos<br />
Lorena Kozlowski, Edilici Ribeiro dos Santos,<br />
Jair Mendes Marques<br />
Microscopia eletrônica como técnica para 189-<strong>19</strong>5<br />
avaliação de misturas 3 em 1 na<br />
nutrição parenteral<br />
Electronic microscopy as technique to assess of all-in-one<br />
mixtures in parenteral nutrition<br />
Técnica para el microscopia electrónica en la evaluación<br />
de las mezclas tres en uno para nutrición parenteral<br />
Carla Souto, Denise Bueno<br />
ARTIGOS DE REVISÃO<br />
Fibra alimentar na redução da incidência do <strong>19</strong>6-202<br />
câncer de cólon: existem evidências conclusivas?<br />
Dietary fiber in the reduction of the incidence of colon<br />
cancer: are there any conclusive evidences?<br />
Fibra dietética en la reducción dela incidencia del cáncer<br />
de colon: ¿Hay evidencias conclusivas?<br />
Denise Machado Mourão, Josefina Bressan Resende<br />
Monteiro, Cristina Maria Ganns Chaves Dias,<br />
Neuza Maria Brunoro Costa<br />
Influência da nutrição e atividade física 203-208<br />
na prevenção da osteoporose<br />
Influence of nutrition and physical activity in the<br />
prevention of osteoporosis<br />
Influencia de la nutrición y actividad física en la<br />
prevención de la osteoporosis<br />
Amanda de Morais Oliveira, Maria Anunciada Leal Porto<br />
Obesidade e dislipidemia: uma preocupação 209-215<br />
cada vez mais precoce<br />
Obesity and dyslipidemia: a precocious concern<br />
Obesidad y dislipidemia: una preocupación<br />
cada vez más precoz<br />
Edeli Simioni de Abreu, Mônica Glória Neumann Spinelli<br />
O refluxo na terapia nutricional por 216-223<br />
via enteral de pacientes graves<br />
The high gastric residual volume in enteral<br />
nutrition of critically ill patients<br />
El reflujo en la terapia nutricional por vía<br />
enteral de pacientes graves<br />
Celina Andrade Buzzo, Ana Lúcia Neves Duarte da Silva,<br />
Lúcia Caruso
Publicação oficial<br />
Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (<strong>SBNPE</strong>)<br />
Federación Latinoamericana de Nutrición Parenteral y Enteral (FELANPE)<br />
Indexada no Index Medicus<br />
Latino Americano (LILACS)<br />
Assinaturas:<br />
A Revista é distribuida gratuitamente a todos os sócios da <strong>SBNPE</strong>.<br />
Assinaturas avulsas podem ser feitas por meio da ficha publicada no<br />
final desta edição<br />
Editor Chefe: Joel Faintuch<br />
ISSN 0103-7<strong>19</strong>6<br />
Editor Associado: Mário Cícero Falcão<br />
Endereço Editorial:<br />
SciPress Serviços Editoriais<br />
Rua Padre João Manuel, 774 / 41<br />
CEP 01411-000 - São Paulo - SP<br />
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Corpo Editorial: Antônio Carlos L. Campos - Hospital Universitário do Paraná - Curitiba - PR<br />
C. Daniel Magnoni - Hospital do Coração - São Paulo - SP<br />
Celso Cukier - Hospital do Coração - São Paulo - SP<br />
Dan L. Waitzberg - Faculdade de Medicina da USP - São Paulo - SP<br />
Fabio Ancona Lopez - UNIFESP - São Paulo - SP<br />
Fernando José de Nóbrega - UNIFESP - São Paulo - SP<br />
Joel Faintuch - Faculdade de Medicina da USP - São Paulo - SP<br />
Maria Isabel Ceribelli - PUCCAMP - Campinas - SP<br />
Maria Isabel T. Davisson Correia - Fundação Mário Pena - Hospital das Clínicas - Belo Horizonte - MG<br />
Mário Cícero Falcão - Faculdade de Medicina da USP - São Paulo - SP<br />
Nicole O. Machado - Instituto da Criança - Hospital das Clínicas - São Paulo - SP<br />
Paulo Roberto Leitão de Vasconcelos - Universidade Federal do Ceará - Fortaleza - CE<br />
Roberto Carlos Burini - UNESP - Botucatu - SP<br />
Rubens Feferbaum - Instituto da Criança - FMUSP - São Paulo - SP<br />
Uenis Tannuri - FMUSP - São Paulo - SP<br />
Jornalista Responsável: Renata Barco Leme (MTb 11177)
ARTIGO ORIGINAL<br />
Resumo<br />
A contribuição de líquido das frutas em dietas com restrição hídrica<br />
The contribution of liquid of fruits in water-restricted diets<br />
La contribución de líquidos de las frutas en dietas con restricción de agua<br />
Lis Proença Vieira 1 , Miyoko Nakasato 2 , Eun Yee Hong 3 , Mitsue Isosaki 4<br />
Introdução: A quantidade de líquido das frutas nem sempre é<br />
computada em dietas com restrição hídrica (RH). O objetivo deste<br />
trabalho é identificar a quantidade média de líquido por porção de<br />
fruta, classificando-a em grupos de acordo com seu conteúdo<br />
hídrico, para adequar a orientação de seu consumo nessas dietas.<br />
Metodologia: Foram calculadas as médias do teor de líquido das<br />
porções de frutas, utilizando-se três tabelas de composição<br />
nutricional, e classificadas em quatro grupos de acordo com seu<br />
conteúdo hídrico. Resultados: Foram estudadas 52 frutas, cuja<br />
média de líquido por porção foi 110 mL. As médias dos grupos<br />
foram 80 mL, 120 mL, 170 mL e 220 mL, para baixo, médio, alto<br />
e muito alto teor de líquido, respectivamente. Conclusão: As frutas<br />
podem ser classificadas de acordo com o teor de líquido por<br />
porção e computadas nas dietas com RH conforme sua ingestão.<br />
(Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):161-164)<br />
UNITERMOS: ingestão de líquidos, restrição de líquidos, fruta, dieta,<br />
terapia nutricional.<br />
Resumen<br />
Abstract<br />
Introduction: The amount of liquid of fruits is not always<br />
computed in water-restricted diets. The objective of this study is to<br />
identify the average amount of liquid by fruit portion, classifying<br />
it in groups according to their water content, and to adjust the<br />
recommendation counselling of its consumption in these diets.<br />
Methods: The means of the liquid content of fruits portions were<br />
calculated, by means of three nutritional composition tables, and<br />
the fruits were classified in four groups according to their water<br />
content. Results: Fifty-two fruits were studied, whose average of<br />
liquid by portion was 110 mL. The groups average were 80 mL,<br />
120 mL, 170 mL e 220 mL, to low, medium, high and very high<br />
liquid contents, respectively. Conclusion: Fruits can be classified<br />
according to their liquid content by portion and computed in waterrestricted<br />
diets according to their ingestion. (Rev Bras Nutr Clin<br />
2004; <strong>19</strong>(4):161-164)<br />
KEY WORDS: liquid ingestion, liquid restriction, fruit, diet, nutrition<br />
therapy<br />
Introducción: La cantidad de líquido en las frutas ni siempre se computa en dietas con restricción de agua. El objetivo de este estudio<br />
es identificar el promedio de la cantidad de líquido por porción de fruta, mientras clasificándolas en grupos según su volumen de agua,<br />
y ajustar las recomendaciones de consumo en estas dietas. Metodología: Los promedios del volumen de líquido de porciones de frutas fueron<br />
calculados, por lo que se empleó tres tablas de composición nutricional. Las frutas fueron clasificadas en cuatro grupos según su contenido<br />
de agua. Resultados: Se estudiaron 52 frutas cuyo promedio de líquido por porción era 110 mL y la mediana era 100 mL. Los promedios<br />
de los grupos fueron 80 mL, 120 mL, 170 mL y 220 mL, para los volúmenes de líquido bajo, medio, alto y muy alto, respectivamente.<br />
Conclusión: Las frutas pueden ser clasificadas según su volumen de líquido por porción y pueden computarse en las dietas con restricción<br />
de agua según su ingestión. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):161-164)<br />
UNITÉRMINOS: ingestión de líquidos, restricción de agua, fruta, dieta, tratamiento dietético.<br />
1. Nutricionista do Serviço de Nutrição e Dietética do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade São Paulo (HC<br />
– FMUSP), com Especialização em Nutrição Hospitalar em Cardiologia; 2. Nutricionista chefe do Serviço de Nutrição e Dietética do InCor – HC - FMUSP, Mestre<br />
em Ciências na área de Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 3. Nutricionista graduada pela Faculdade de Saúde<br />
Pública da Universidade de São Paulo, Ex-estagiária curricular no Serviço de Nutrição e Dietética do InCor – HC - FMUSP; 4. Diretor técnico do Serviço de Nutrição<br />
e Dietética do InCor – HC - FMUSP, Mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.<br />
Instituição: Instituição: Serviço de Nutrição e Dietética - InCor – HC - FMUSP - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 CEP: 05403-000 - São Paulo-SP<br />
Endereço Endereço par para par a cor cor correspondência:<br />
cor cor respondência: Lis Proença Vieira - Serviço de Nutrição e Dietética - InCor – HC - FMUSP - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44, 05403-000 -<br />
São Paulo-SP. Fone: 3069 5226<br />
e-mail: lis.vieira@incor.usp.br<br />
Submissão: 27 de janeiro de 2004<br />
Aceito para publicação: 20 de dezembro de 2004<br />
161
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):161-164<br />
162<br />
Introdução<br />
Nos pacientes com quadro de insuficiência cardíaca crônica<br />
(ICC), a retenção de água depende de vários fenômenos,<br />
como o aumento dos níveis séricos de angiotensina, com liberação<br />
de hormônio antidiurético e diminuição do fluxo<br />
plasmático renal. Além disso, um sintoma freqüente nos pacientes<br />
com ICC grave é a sede. Ao consumir líquidos em<br />
excesso, os pacientes podem contribuir para elevar a água<br />
corporal e, conseqüentemente, a volemia 1 .<br />
A água é o principal componente do corpo humano,<br />
constituindo cerca de 60% do peso corporal de um adulto, o<br />
que representa cerca de 42 L num indivíduo de 70 kg. Aproximadamente<br />
2/3 desse total formam os líquidos<br />
intracelulares e 1/3, os extracelulares. O espaço extracelular<br />
é constituído pelo plasma, cerca de 3 L, e pelo espaço<br />
intersticial, cerca de 11 L, além de uma pequena fração distribuída<br />
pelas cavidades pleural, peritoneal, sinoviais e secreções<br />
digestivas. Há ainda o espaço intravascular, que equivale<br />
ao volume sangüíneo, cerca de 5 L, formado pela soma do<br />
volume plasmático (componente extracelular) e volume de<br />
hemáceas (componente intracelular) 2 .<br />
A alteração do volume intravascular pode causar graves<br />
conseqüências ao organismo, como nos casos de edema pulmonar<br />
agudo, devido ao aumento desse volume, ou choque<br />
circulatório, por diminuição de volume 2 .<br />
No adulto normal, a perda diária de água é de aproximadamente<br />
2500 mL, contando 1500 mL pela urina, 700 mL<br />
pela perspiração insensível, 200 mL pelas fezes e 100 mL pela<br />
transpiração 3 . A carga de soluto, formado por compostos<br />
nitrogenados excretados pelos rins, determina o volume mínimo<br />
de água necessário para formação da urina 4 . Em indivíduos<br />
que ingerem alimentos muito ricos em sal, requer-se<br />
maior quantidade de água, para evitar a hiperosmolaridade<br />
e facilitar a eliminação do excesso de sódio pelos rins 5 .<br />
O balanço hídrico depende da água ingerida, da água<br />
contida nos alimentos e da água derivada dos processos metabólicos.<br />
A água ingerida compõe-se de todos os tipos de líquidos<br />
consumidos, desde infusões de chá, café, sucos e a<br />
própria água, e é aproximadamente igual à quantidade de<br />
urina excretada 5 .<br />
O conteúdo hídrico dos alimentos é variável. As carnes<br />
contêm de 50% a 75% e os vegetais verdes até 95% de água<br />
(Figura 1).<br />
Alimentos Percentual de água (%)<br />
Açúcar 1<br />
Manteiga 20<br />
Pão 36<br />
Carne de boi 6 6<br />
Batata 80<br />
Laranja 86<br />
Leite de vaca 8 8<br />
Alface 95<br />
Figura 1- Percentual de água nos alimentos. Fonte: Pedroso 6<br />
A água derivada dos processos metabólicos é formada<br />
pela oxidação dos carboidratos, proteínas e gorduras dentro<br />
Nutriente Quantidade de água produzida<br />
1g de proteína 0,41 mL de água<br />
1g de gordura 1,07 mL de água<br />
1g de carboidrato 0,55 mL de água<br />
Figura 2 - Quantidade de água produzida pelo metabolismo dos nutrientes.<br />
Fonte: Pedroso 6<br />
do organismo (Figura 2).<br />
A quantidade de água formada pelo metabolismo dos<br />
nutrientes é pequena e utilizada pelo organismo 5 , com pouca<br />
significação para a investigação do balanço hídrico.<br />
A média de ingestão de água recomendada para um adulto<br />
saudável é de 1 mL/Caloria 4 . Entretanto, o estado de edema<br />
interfere no consumo de líquidos. Há aumento da retenção<br />
de sal e de água, movimentando o líquido do sistema vascular<br />
para o interstício, ou do componente arterial do espaço<br />
vascular para as câmaras cardíacas ou para a própria circulação<br />
venosa 7 .<br />
O edema pode ser localizado, como nas insuficiências<br />
venosas periféricas, ou generalizado, como na ICC, síndrome<br />
nefrótica e cirrose hepática 8 . Nos casos de insuficiência cardíaca<br />
grave, a capacidade de eliminação de água pode estar<br />
prejudicada pelo aumento de hormônio antidiurético<br />
circulante, acarretando hiponatremia dilucional, sendo<br />
indicada a restrição hídrica para que a concentração de sódio<br />
plasmático não se reduza a menos de 130 mEq/L 9 . Para a instituição<br />
da restrição hídrica, o quadro clínico deve ser observado<br />
junto com o balanço hidroeletrolítico e o uso de<br />
diuréticos 10 .<br />
Na literatura, as restrições de líquidos variam de 1 L a 1,5<br />
L/dia, nos casos de insuficiência cardíaca avançada, com ou<br />
sem hiponatremia 11 , 1,5 L a 2 L/dia, em pacientes com sintomas<br />
severos, com altas doses de diuréticos ou com tendência<br />
a consumir líquidos em excesso 12 , ou simplesmente até 1,5 L/<br />
dia nos casos de ICC 13 .<br />
Na prática clínica, normalmente, orienta-se o paciente<br />
com restrição hídrica a controlar o volume de líquidos em<br />
geral, como a água, leite, infusões, sucos de frutas e refrigerantes,<br />
os quais devem ser medidos em recipiente graduado ou de<br />
volume conhecido. É comum pedir que se evite o consumo de<br />
frutas com muito líquido, mas não se conhece, ainda, o quanto<br />
elas representam dentro da restrição hídrica estabelecida,<br />
configurando caráter mais subjetivo do que quantitativo.<br />
As frutas são classificadas em frescas, que apresentam<br />
cerca de 60% a 90% de água, e secas com 2% a 10% de água 14 .<br />
Para uma alimentação saudável, de acordo com a pirâmide<br />
alimentar adaptada à população brasileira, recomenda-se o<br />
consumo de 3 a 5 porções de fruta por dia 15 , o que implica<br />
numa quantidade considerável de líquido nas dietas em que<br />
este é restrito, pois o elevado teor de água na maioria das frutas<br />
fornece água ao organismo 14 .<br />
Assim, este trabalho vem ao encontro da necessidade de<br />
uma orientação dietética mais específica e objetiva quanto<br />
ao consumo de frutas, numa dieta com restrição hídrica, e se<br />
impõe, na medida em que o controle de líquidos é um importante<br />
fator precipitante de descompensação clínica, especialmente<br />
em pacientes com ICC, caso não seja realizado corretamente<br />
16 .
O objetivo foi identificar a quantidade média de líquido<br />
fornecida por uma porção de fruta, classificar as frutas em<br />
grupos de acordo com sua quantidade de líquido e adequar<br />
a orientação do consumo de frutas nas dietas com restrição<br />
hídrica.<br />
Metodologia<br />
Foram calculadas as médias, com base em três fontes de<br />
dados, do conteúdo hídrico das porções das frutas mais<br />
consumidas no Brasil e com dados de composição centesimal<br />
disponíveis.<br />
As tabelas utilizadas para comparação dos teores de<br />
umidade das frutas por porção foram a Tabela Brasileira de<br />
Composição de Alimentos da Universidade de São Paulo<br />
(TBCA-USP) 17 , banco de dados do Programa de apoio à<br />
decisão em nutrição da Escola Paulista de Medicina (EPM)<br />
– versão 2,5 a 18 - e a Tabela de Composição de Alimentos do<br />
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) <strong>19</strong> .<br />
A padronização do tamanho das porções de frutas foi de<br />
acordo com o software Virtual Nutri 20 da USP ou, na falta do<br />
mesmo, a quantidade correspondente a 70 calorias, que equivale<br />
a uma porção de fruta pela pirâmide alimentar brasileira 15 .<br />
Calculou-se a média de uma porção de fruta e, em seguida,<br />
as frutas foram classificadas quanto ao seu conteúdo<br />
hídrico em grupos com intervalos de 50 mL por porção.<br />
Aquelas com até 50 mL de água por porção foram consideradas<br />
de teor muito baixo de líquido, sem necessidade de<br />
descontá-las numa dieta de restrição hídrica. Os grupos com<br />
51 a 100 mL, 101 a 150 mL, 151 a 200 mL e 201 a 250 mL por<br />
porção foram considerados de teor baixo, médio, alto e muito<br />
alto de líquido, respectivamente (Figura 3). A média de<br />
água de cada um desses grupos foi utilizada para definir a<br />
quantidade de líquido a ser descontada de determinadas frutas<br />
na orientação de dietas com restrição hídrica.<br />
Teor de líquido Conteúdo hídrico por<br />
porção (mL)<br />
Muito baixo 0 a 50<br />
Baixo 51 a 100<br />
Médio 101 a 150<br />
Alto 151 a 200<br />
Muito alto 201 a 250<br />
Figura 3 - Critérios de classificação das frutas quanto ao teor de<br />
líquido por porção.<br />
Resultados<br />
Foram estudadas 52 frutas, cuja média de líquido por<br />
porção encontrada foi de 110 mL. Para que pudessem ser<br />
computadas adequadamente dentro de um controle hídrico,<br />
elas foram classificadas de acordo com o seu teor de líquidos<br />
(Tabelas 1 a 5). Os valores encontrados na coluna do conteúdo<br />
hídrico das tabelas referem-se às médias de líquido por<br />
porção de fruta das três tabelas de composição nutricional, e<br />
a última linha das tabelas constitui a média de líquido daquele<br />
grupo, respectivamente.<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):161-164<br />
Tabela 1 - Frutas com muito baixo teor de líquido (0 a 50 mL/porção)<br />
Fruta Porção Conteúdo hídrico (mL)<br />
Açaí 9 unidades (28 g) 13<br />
Abacate 2 colheres de sopa (50 g) 3 9<br />
Tamarindo 12 unidades (24 g) 6<br />
Média 20<br />
Tabela 2 - Frutas com baixo teor de líquido (51 a 100 mL/porção)<br />
Fruta Porção Conteúdo hídrico (mL)<br />
Araçá 100 g 83<br />
Banana prata 1 unidade grande (80 g) 59<br />
Banana nanica 1 unidade (86 g) 65<br />
Banana maçã 1 unidade (86 g) 60<br />
Caqui 1 unidade (113 g) 90<br />
Cereja 25 unidades ( 100 g) 82<br />
Ciriguela 100 g 76<br />
Coco 1 colher de sopa (20 g) 7 6<br />
Cupuaçu 100 g 81<br />
Figo 2 unidades (120 g) 100<br />
Fruta do conde Meia unidade (75 g) 5 7<br />
Goiaba 1 unidade (95 g) 80<br />
Graviola 100 g 85<br />
Guabiroba 100 g 83<br />
Ingá 100 g 83<br />
Jaca 3 bagos (100 g) 77<br />
Kiwi 1 unidade grande (116 g) 96<br />
Manga haden Meia unidade (111 g) 92<br />
Maracujá 77 g 58<br />
Romã 1 unidade (100 g) 81<br />
Uva niágara 22 bagos (100 g) 84<br />
Uva itália 8 bagos (100 g) 81<br />
Uva rubi 8 bagos (100 g) 81<br />
Média 80<br />
Tabela 3 - Frutas com médio teor de líquido (101 a 150 mL/porção)<br />
Fruta Porção Conteúdo hídrico (mL)<br />
Abacaxi 1 fatia (130 g) 113<br />
Ameixa 4 unidades (140 g) 121<br />
Amora 130 g 111<br />
Cajá manga 150 g 130<br />
Caju 2 unidades ( 120 g) 105<br />
Damasco 4 unidades (140 g) 1<strong>19</strong><br />
Jabuticaba 35 unidades (140 g) 123<br />
Laranja 1 unidade (137 g) 121<br />
Laranja lima 1 unidade grande (164 g) 149<br />
Maçã 1 unidade (130 g) 109<br />
Mamão papaia Meia unidade (142 g) 127<br />
Mamão formosa 1 fatia grossa (240 g) 124<br />
Mangaba 1 unidade grande (150 g) 132<br />
Melão cantaloupe 1 fatia (160 g) 144<br />
Mexerica murcote 1 unidade (150 g) 131<br />
Mexerica cravo 2 unidades (130 g) 114<br />
Pêra 1 unidade ( 133 g) 113<br />
Média 120<br />
Discussão<br />
Com base nesses resultados, o nutricionista poderá ter mais<br />
segurança ao orientar uma dieta com controle de líquidos, passando<br />
as informações de forma mais adequada e objetiva.<br />
163
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):161-164<br />
Tabela 4 - Frutas com alto teor de líquido (151 a 200 mL/porção)<br />
Fruta Porção Conteúdo hídrico (mL)<br />
Acerola 67 unidades (200 g) 181<br />
Carambola 200 g 183<br />
Grape fruit 200 g 178<br />
Nectarina 2 unidades (180 g) 151<br />
Pêssego 2 unidades (200 g) 175<br />
Pitanga 25 unidades (175 g) 158<br />
Média 170<br />
Tabela 5 - Frutas com muito alto teor de líquidos (201 a 250 mL/<br />
porção)<br />
Fruta Porção Conteúdo hídrico (mL)<br />
Melancia 1 fatia grossa (250 g) 233<br />
Melão 1 fatia grossa (230 g) 211<br />
Morango 20 unidades (240 g) 218<br />
Média 220<br />
A quantidade média do teor de líquido por porção de<br />
fruta aponta uma medida importante para se ter noção da<br />
quantidade de líquidos que as frutas fornecem, porém não é<br />
ideal para a orientação dietética nas restrições hídricas devido<br />
a grande variabilidade na quantidade de líquido encontrada<br />
nas diferentes frutas, observando-se o mínimo de 6 mL<br />
(tamarindo) e o máximo de 233 mL (melancia) por porção.<br />
A classificação das frutas em grupos, de acordo com a<br />
quantidade de líquido, nos permite uma melhor divisão das<br />
mesmas para orientar os pacientes que necessitam de dietas<br />
com controle hídrico. Por questões de praticidade, para os<br />
pacientes não internados ou para o planejamento de esquemas<br />
alimentares de pacientes hospitalizados, sugere-se que<br />
sejam consideradas as quantidades médias de líquido segundo<br />
os grupos, ou seja, 80 mL, 120 mL, 170 mL e 220 mL para<br />
1.Oliveira Jr MT, Barretto ACP. Tratamento não-farmacológico da<br />
insuficiência cardíaca. Arq Bras Cardiol <strong>19</strong>94;63(6):5<strong>19</strong>-20.<br />
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IV:1–30.<br />
164<br />
Referências bibliográficas<br />
a ingestão de frutas com baixo, médio, alto e muito alto teor<br />
de líquido, respectivamente.<br />
Não raro, os pacientes entendem o controle de líquidos<br />
apenas como medida de água, esquecendo-se das outras fontes<br />
dietéticas, além de excederem no consumo de frutas. Uma<br />
porção de fruta com teor muito alto de líquido pode representar<br />
20% do total de líquido permitido, considerando, por<br />
exemplo, uma dieta com restrição hídrica de 1000 mL. Nesse<br />
sentido, é imperativo que o nutricionista reforce e oriente<br />
corretamente como manter um controle adequado, por meio<br />
de uma dieta equilibrada com consumo de 3 a 5 porções de<br />
frutas diárias, computando-se seu teor de líquido. As frutas secas<br />
e as com teor muito baixo de líquidos podem ser liberadas.<br />
Vale ressaltar que, algumas frutas, dificilmente, são consumidas<br />
nas quantidades que correspondem a uma porção, como por<br />
exemplo, a acerola, cujo consumo mais comum é na forma de<br />
suco, o qual pode ser mais facilmente medido, utilizando-se um<br />
recipiente graduado ou de volume conhecido.<br />
Dessa forma, este trabalho contribui para melhor<br />
monitorização das dietas com restrição hídrica e melhor adesão<br />
ao tratamento não medicamentoso de pacientes com ICC 1<br />
ou daqueles que têm outra patologia, mas necessitem dessa<br />
restrição.<br />
Conclusão<br />
As frutas podem ser classificadas de acordo com o teor de<br />
líquido por porção, de modo que as secas ou com muito baixo<br />
teor de líquido (até 50 mL por porção) podem ser liberadas<br />
nas dietas com restrição hídrica e aquelas com teor baixo<br />
(80 mL por porção), médio (120 mL por porção), alto (170<br />
mL por porção) e muito alto (220 mL por porção) devem ser<br />
computadas conforme sua ingestão, sem exceder as recomendações<br />
de 3 a 5 porções de frutas diárias.<br />
10.Costa RP, Meale MMS. Terapia nutricional oral em cardiologia. In:<br />
Waitzberg DL. Nutrição oral, enteral e parenteral na prática clínica. 3ª<br />
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20. Virtual Nutri [computer program] Versão 1,0 São Paulo: USP; <strong>19</strong>96.
ARTIGO ORIGINAL<br />
Resumo<br />
O estudo teve como objetivo avaliar a ingestão calórica e protéica<br />
dos pacientes oncológicos em tratamento contínuo. O padrão alimentar<br />
dos pacientes estudados foi obtido através de diário alimentar<br />
de três dias, complementado com um protocolo de dados para<br />
avaliação nutricional. Observou-se que os hábitos alimentares dos<br />
pacientes estavam em desacordo com as recomendações da FAO, ou<br />
seja, 25 (63%) pacientes estavam abaixo de 70% da adequação<br />
calórica e, em relação às proteínas, 28 (70%) pacientes estavam<br />
deficientes. Dentre aos tipos de câncer, foi observada prevalência<br />
de câncer de mama e próstata, caracterizando nove (23%) e 11<br />
(28%) pacientes, respectivamente. No que se refere a hábitos alimentares,<br />
a preferência maior foi encontrada nos alimentos<br />
energéticos. Conclui-se que a assistência nutricional constante a<br />
este grupo favorece o tratamento da doença. (Rev Bras Nutr Clin<br />
2004; <strong>19</strong>(4):165-169)<br />
UNITERMOS: ingestão energética e protéica, câncer, hábitos alimentares.<br />
Resumen<br />
Avaliação da ingestão energética e protéica de pacientes oncológicos<br />
Assessment of energy and protein intake in oncological patients<br />
Evaluación de la ingestión energética y proteica en pacientes oncológicos<br />
Simone Côrtes Coelho 1 , Ana Clara Acar Novaes 2 , Maria de Fátima França 3 , Alexandra Faria dos Santos 4 ,<br />
Maríta Martins Lamas 4<br />
Abstract<br />
The study had the objective of evaluating the energy and protein<br />
ingestion of cancer patients in continuous treatment. The<br />
alimentary pattern of the studied patients was obtained by means<br />
of a three-day food record, complemented with a data protocol for<br />
nutritional evaluation. It was observed that the eating habits of the<br />
patients were in disagreement with the FAO recommendations, that<br />
is, 25 (63%) patients were below of 70% of caloric adequacy in<br />
relation to proteins while 28 (70%) patients were deficient.<br />
Amongst the types of cancer, prevalence of breast and prostate<br />
cancers, characterizing nine (23%) and 11 (28%) patients<br />
respectively was observed. In relation to the eating habits, the major<br />
preference was found in energetic food. In conclusion, the steady<br />
nutritional assistance to this group favors the treatment of the<br />
illness. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):165-169)<br />
KEY WORDS: protein and energy intake , cancer, eating habits.<br />
El objetivo de la investigación fue evaluar la ingestión calórica y proteica de pacientes oncológicos en tratamiento continuo. El estándar<br />
alimentario del grupo de pacientes investigados fue obtenido a través de registro alimentario de tres días, complementado con un protocolo<br />
de datos para la evaluación nutricional. Se observó que los hábitos alimentarios de los pacientes no estaban de acuerdo con las<br />
recomendaciones de la FAO, o sea, 25 (el 63%) pacientes eran deficitarios en el 70% en la adecuación calórica. Se observó que 28 (el<br />
70%) pacientes eran deficientes en la ingestión de proteínas. Con relación a los tipos de cáncer, ha sido observada prevalencia de cáncer<br />
de mama en nueve (el 23%) pacientes y de cáncer de próstata en 11 (el 28%) Con relación a los hábitos alimentarios, se encontró mayor<br />
prevalencia en el consumo de alimentos energéticos. Se concluye que la asistencia nutricional constante a este grupo favorece el tratamiento<br />
de la enfermedad. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):165-169)<br />
UNITÉRMINOS: ingestión calórica y proteica, cáncer, hábitos alimentarios.<br />
1. Nutricionista especialista em Terapia Nutricional Enteral e Parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, especialista em Nutrição Clínica<br />
pelo Instituto de Nutrição da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, mestranda em Atenção à Saúde e as Doenças Ligadas ao Processo de Desenvolvimento<br />
Humano pela Pós-graduação em Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, docente do curso de Pós Graduação em Nutrologia e Terapia Nutricional<br />
da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro; 2. Nutricionista da PRONEP, monitora em Nutrição Clínica do Hospital Central do Exército; 3. Médica Docente do<br />
Curso de Pós Graduação em Nutrologia e Terapia Nutricional da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, Professora Assistente do Curso de Graduação em Nutrição<br />
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 4. Estagiárias de Nutrição Clínica da Sessão de Nutrição e Dietética do Hospital Central do Exército.<br />
Sessão de Nutrição e Dietética do Hospital Central do Exército – Rua Francisco Manuel, 126 – Benfica – Rio de Janeiro – RJ – CEP 20911 270 – Tel: (21) 38917157<br />
Endereço para correspondência: Nutr. Simone Côrtes Coelho – Rua Mariz e Barros, 121 apt 2003 A – Icaraí – Niterói – RJ – CEP 24220 120 – Tel: 21 27158806/<br />
21 99632140 Fax: 21 27158290 – E-mail: sc_coelho@uol.com.br<br />
Submissão: 9 de junho de 2004<br />
Aceito para publicação: 23 de dezembro de 2004<br />
165
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):165-169<br />
166<br />
Introdução<br />
A desnutrição protéico-calórica é indício freqüente da<br />
presença de tumor maligno 1 . Há registros indicadores sobre a<br />
desnutrição em câncer que apresenta uma incidência entre<br />
30% a 50% dos casos. Tal anomalia conhecida como<br />
caquexia tem como manifestações clínicas a anorexia, perda<br />
tecidual, atrofia da musculatura esquelética, miopatia, perda<br />
de tecido gorduroso, atrofia de órgãos viscerais e anergia 2 .<br />
A origem da desnutrição no câncer é multifatorial e<br />
oriunda da anorexia decorrente de fatores produzidos pelo<br />
tumor ou hospedeiro, dor e/ou obstrução do trato<br />
gastrintestinal. Pacientes oncológicos, devido a desnutrição<br />
freqüente, necessitam de cuidados especiais. O objetivo desta<br />
pesquisa foi avaliar se as calorias e, principalmente, as proteínas<br />
da dieta ingerida atendem às recomendações<br />
nutricionais dos doentes 2 .<br />
A má nutrição, geralmente, resulta de vários fatores isolados<br />
ou combinados como diminuição da ingestão alimentar,<br />
déficit de absorção, perdas acentuadas ou aumento de<br />
requerimentos nutricionais, secundários ao hipercatabolismo<br />
presente na doença.<br />
Pesquisas constataram que a perda de peso nos pacientes<br />
oncológicos é resultado de balanço energético negativo, que<br />
pode ter a sua origem na diminuição da ingestão calórica ou<br />
no aumento dos gastos energéticos. O paciente com câncer<br />
tem taxa metabólica basal e gasto energético total elevados.<br />
O principal objetivo da terapia nutricional é fornecer<br />
calorias, proteínas e micronutrientes para manter, ou melhorar,<br />
o estado nutricional antes, durante e após a terapia específica<br />
para o câncer 3 . A terapia nutricional melhora o estado<br />
geral dos pacientes cancerosos debilitados, tornando-os me-<br />
Protocolo de Avaliação Nutricional<br />
lhores candidatos para o tratamento oncológico adequado,<br />
além da melhora da qualidade de vida com manutenção das<br />
atividades diárias 1 .<br />
Para o tratamento do câncer, a dieta deverá suprir todas<br />
as necessidades nutricionais, de forma a satisfazer o aumento<br />
da demanda energética de uma taxa metabólica alta, prevenindo<br />
a perda de peso, reconstituindo os tecidos do corpo e<br />
promovendo sensação de bem estar durante o tratamento em<br />
geral 4 .<br />
Destarte, a intervenção nutricional torna-se importante<br />
fator adjunto do tratamento, pois constitui-se instrumento<br />
poderoso para prevenir ou reverter os sintomas, favorecendo<br />
o controle da caquexia.<br />
Este trabalho tem como propósito analisar a ingestão das<br />
calorias e proteínas das dietas dos pacientes assistidos no<br />
ambulatório (Hospital Dia), de um hospital militar localizado<br />
no Rio de Janeiro, e comparar com as recomendações<br />
nutricionais da Food Agriculture Organization FAO, identificando<br />
as falhas que induzam o aparecimento de carências<br />
nutricionais em pacientes oncológicos.<br />
Metodologia<br />
O estudo foi realizado em um hospital localizado na zona<br />
norte da cidade do Rio de Janeiro.<br />
A amostra constituiu-se de 40 pacientes oncológicos<br />
assistidos no Hospital Dia deste hospital, onde submetiam-se<br />
a quimioterapia ou radioterapia.<br />
Para avaliar a ingestão calórica e protéica, utilizou-se<br />
formulário de registro alimentar e um questionário para tomada<br />
de dados complementares de avaliação nutricional, como<br />
mostra a figura 1.<br />
Data:<br />
Nome: Idade: Sexo: ( ) M ( ) F<br />
Peso: Altura:<br />
- Localização do câncer: ( ) mama ( ) gástrico ( ) cabeça e pescoço<br />
( ) pâncreas ( ) intestino ( ) pulmão<br />
( ) pele ( ) próstata ( ) outros ————-<br />
- Tratamento: ( ) quimioterapia ( ) radioterapia ( ) cirúrgico<br />
- Quanto tempo possui a doença: (<br />
- Modalidade de atividade física:<br />
( ) normal<br />
) < 2 anos ( ) 2 a 5 anos ( ) > 5 anos<br />
( ) capaz de realizar satisfatoriamente atividades fora da cama<br />
( ) incapaz de realizar maioria das atividades fora da cama<br />
( ) capaz de pouca atividade<br />
( ) acamado<br />
- História nutricional:<br />
( ) ganho de peso ( ) aumento da ingestão alimentar<br />
( ) dificuldade de mastigação ( ) vômitos<br />
( ) perda de peso ( ) diarréia<br />
( ) constipação ( ) perda olfativa<br />
( ) diminuição da ingestão alimentar ( ) flatulência<br />
( ) distensão ( ) edema<br />
( ) náuseas ( ) perda de paladar ( ) disfagia<br />
- Preferência da consistência da dieta:<br />
- Preferência alimentar: (<br />
- Intolerância alimentar:<br />
) doce ( ) salgado<br />
Figura 1 - Questionário para coleta de informações sobre os pacientes incluídos no estudo.
Os doentes foram orientados para o preenchimento do<br />
registro alimentar de três dias, que podia ser feito pelo próprio<br />
paciente ou por algum acompanhante da refeição. A avaliação<br />
do registro alimentar foi feita de modo semi-qualitativo,<br />
tendo sido considerados os alimentos em três grandes grupos,<br />
sendo eles energéticos, construtores e reguladores. Para<br />
tanto se estabeleceu que açúcares, gorduras, farinhas, cereais<br />
seriam alimentos energéticos; carnes, leite e ovos seriam construtores<br />
enquanto que frutas e hortaliças seriam alimentos<br />
reguladores. Os alimentos como refrescos e infusos, nos quais<br />
foram adicionados quantidades de açúcar, foram incluídos no<br />
grupo dos energéticos. A escolha desta classificação foi para<br />
melhor ilustrar os desvios alimentares dos pacientes, apontando<br />
o papel de cada grupo no tratamento dietético orientado.<br />
Resultados<br />
A amostra foi composta por 40 pacientes, sendo 18<br />
(45%) do sexo feminino e 22 (55%) do sexo masculino, que<br />
faziam tratamento contínuo no Hospital Militar do Rio de<br />
Janeiro (Tabela I).<br />
Tabela I - Distribuição da amostra por sexo e faixa etária<br />
Idade Masculino Feminino<br />
N % n %<br />
20 a 29 4 10 2 5<br />
30 a 49 4 10 4 10<br />
50 a 69 11 27,5 7 17,5<br />
> 70 3 7,5 5 12,5<br />
Entre os homens, o câncer de próstata foi mais freqüente,<br />
presente em 11 (28%) pacientes, enquanto que nas mulheres<br />
a prevalência maior foi de câncer de mama, acometendo<br />
nove (23%) mulheres (Figura 2).<br />
Figura 2 - Localização do câncer<br />
Quanto ao componente calórico da dieta, 29 (72%)<br />
pacientes ingeriram menos que 70% do recomendado e apenas<br />
nove (23%) apresentaram percentual de adequação<br />
satisfatório (Figura 3).<br />
Em relação às proteínas, oito (20%) pacientes ultrapassaram<br />
suas necessidades protéicas; apenas seis (15%) apresentavam<br />
percentual de adequação satisfatório e 26 (65%) pacientes<br />
faziam ingestão menor que 70% do recomendado em<br />
proteína. Foi observado também que 13 (32%) pacientes não<br />
comiam nenhum tipo de carne (Figura 4).<br />
O estudo apresentou a média das porções dos alimentos<br />
usados pelos doentes conforme os resultados dos diários alimentares<br />
de três dias. A ingestão de alimentos construtores foi<br />
insatisfatória em todas as refeições, apesar de apresentar fre-<br />
Figura 3 - Adequação da ingestão calórica<br />
Figura 4 - Adequação da ingestão protéica<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):165-169<br />
qüência maior no desjejum. Os alimentos reguladores foram<br />
ingeridos com maior freqüência no almoço, sendo que nas<br />
outras refeições, o consumo não foi satisfatório. Os energéticos<br />
foram ingeridos adequadamente na maioria das refeições. Foi<br />
observada baixa freqüência no consumo dos grupos de alimentos<br />
na colação e ceia, o que pode ser explicado através da<br />
ausência dessas refeições para a maioria dos pacientes (Figura<br />
5,6 e7).<br />
Verificou-se também a preferência da consistência da<br />
dieta e observou-se que 23 (57%) pacientes adotavam a<br />
consistência normal, dez (25%) consistência branda, enquanto<br />
que sete (18%) apresentavam dificuldade para mastigação<br />
ou deglutição, preferindo a consistência pastosa (Figura 8).<br />
Figura 5 - Ingestão de alimentos reguladores<br />
167
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):165-169<br />
Figura 6 - Ingestão de alimentos energéticos<br />
Figura 7 - Ingestão de alimentos construtores<br />
Figura 8 - Preferência da consistência da dieta<br />
Com relação às preferências alimentares dos pacientes,<br />
foi observado que 26 (65%) preferiam as dietas ricas em açúcares,<br />
enquanto que 14 (35%), os alimentos salgados (Figura<br />
9).<br />
Figura 9 - Perfil de preferências e intolerâncias alimentares quanto à<br />
doce e salgado<br />
168<br />
Quanto às intercorrências causadas pelo tratamento<br />
oncológico, a perda de peso foi a mais expressiva, caracterizando<br />
29 (73%) pacientes, seguida de náuseas em 23 (58%),<br />
vômitos em 18 (45%) e diminuição da ingestão alimentar em<br />
15 (38%), além dos outros problemas (Figura 10).<br />
Figura 10 - Prevalência de complicações associadas ao tratamento<br />
oncológico<br />
Quanto a causas não nutricionais que pudessem alterar o<br />
atendimento das necessidades calóricas e protéicas, investigou-se<br />
o tempo de doença dos pacientes estudados, onde <strong>19</strong><br />
(47%) pacientes tinham a doença à menos de dois anos, 17<br />
(43%) variavam de dois a cinco anos e somente quatro (10%)<br />
pacientes apresentavam a doença há mais de cinco anos (Figura<br />
11).<br />
Figura 11 - Tempo de doença<br />
Discussão<br />
O consumo calórico-protéico inadequado e os efeitos<br />
adversos do tratamento servem de base para evidenciar clinicamente<br />
a depleção nutricional contribuem para agravar o<br />
quadro de desnutrição 5 .<br />
A qualidade da dieta foi avaliada a partir da ingestão de<br />
alimentos reguladores, energéticos e construtores. Foi observado<br />
que a concentração mais elevada de alimentos<br />
energéticos estava no desjejum, almoço, lanche e jantar e os<br />
alimentos reguladores apresentaram-se mais no almoço e jantar.<br />
Mas essas preferências não estão relacionadas aos sintomas<br />
da doença, pois os pacientes sempre tiveram esses hábitos<br />
alimentares. Em relação às fibras, os pacientes fazem pouca
ingestão e a principal causa para este consumo inadequado de<br />
alimentos ricos em fibras está relacionada com o tratamento,<br />
visto que os pacientes submetidos ao tratamento oncológico<br />
apresentam freqüentemente episódios de diarréia 7 . Alguns<br />
pacientes do estudo apresentaram relatos de diarréia.<br />
Os alimentos reguladores atuam como intermediários de<br />
todas as funções orgânicas do organismo. Os pacientes<br />
oncológicos necessitam de aporte apropriado desses alimentos,<br />
não só para que o organismo funcione adequadamente,<br />
mas também para minimizar os efeitos causados pelo tratamento.<br />
Os alimentos energéticos são responsáveis pelo fornecimento<br />
de energia química, essencial na produção do trabalho<br />
do corpo e os alimentos construtores destinam-se à síntese,<br />
reparo e manutenção dos tecidos corporais 8 . Por isso, o<br />
alimento construtor é imprescindível para o paciente com<br />
câncer, junto da refeição mais calórica, o que não se conseguiu<br />
no almoço da amostra. Sendo característica da doença,<br />
verifica-se que as fontes de proteínas ingeridas pelos pacientes<br />
estavam sendo convertidas em energia, diminuindo sua<br />
capacidade de aproveitamento para realizar suas funções estruturais<br />
10 .<br />
Foi observado que há elevada incidência de câncer de<br />
próstata nos homens, enquanto que nas mulheres, o câncer de<br />
mama. Em ambos os sexos o tempo de doença esteve entre 2<br />
a 5 anos de aparecimento e, em faixa etária superior a 60 anos,<br />
o que contribui para outros agravantes como desgaste<br />
hormonal do envelhecimento 11 .<br />
Como já esperado, não foi verificada harmonia perfeita<br />
na dieta ingerida pelos pacientes, pois a própria doença contribui<br />
para esse desequilíbrio. Percebeu-se consumo pequeno<br />
de carnes, frutas e vegetais e aumento da ingestão de doces,<br />
resultando numa perda de qualidade nutricional da dieta,<br />
podendo interferir com ingestão inadequada de energia, ferro,<br />
vitaminas (principalmente vitamina C), folato e<br />
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betacaroteno, o que poderá levar a uma deficiência de vitaminas,<br />
minerais e até mesmo calórica e protéica 8 . Os alimentos<br />
doces melhoram o gasto amargo causado por alguns medicamentos<br />
e as frituras só aumentam o desconforto e enjôo<br />
nos pacientes 7 .<br />
O estudo mostrou prevalência na perda de peso, náuseas<br />
e vômitos. Esses efeitos ocorrem devido à administração de<br />
alguns medicamentos, tais como, midazolan, Haloperidol e<br />
clorpromazina que visam agredir os agentes cancerígenos 9 .<br />
O objetivo do cuidado nutricional em pacientes com<br />
câncer é sempre manter o estado nutricional, a saúde funcional<br />
e a composição corporal 5 .<br />
Conclusão<br />
Nas condições deste estudo, pode-se concluir que:<br />
1- A perda de apetite ocorre como principal causa dos hábitos<br />
alimentares inadequados com evolução para perda<br />
de peso.<br />
2- Náuseas e vômitos também foram importantes neste processo.<br />
Desta forma, a prescrição dietoterápica deve respeitar<br />
preferências e intolerâncias alimentares.<br />
3- Os pacientes têm preferência por alimentos doces devido<br />
à mudança do paladar, onde eles não toleram muito<br />
os alimentos salgados.<br />
4- Constatou-se nos hábitos alimentares, deficiência de<br />
nutrientes no que se refere ao aspecto quantitativo de um<br />
modo geral e qualitativo referente à parte dos alimentos<br />
construtores.<br />
5- Tal deficiência prejudica o tratamento desses doentes,<br />
pois estes devem se manter fora do risco de desnutrição e<br />
precisam adquirir quantidade suficiente de proteínas para<br />
auxiliar o tratamento.<br />
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14. Reccomended Dietary Allowance –RDA, 2000.<br />
169
170<br />
ARTIGO ORIGINAL<br />
Consumo e padrões alimentares de pacientes com bulimia nervosa antes e<br />
depois de tratamento multiprofissional<br />
Food intake and eating pattern of bulimic patients before and after multiprofessional treatment<br />
Consumo alimenticio y estándares de alimentación de pacientes con bulimia nerviosa antes y después del<br />
tratamiento multiprofesional<br />
Resumo<br />
Marle dos Santos Alvarenga 1 , Fernanda Baeza Scagliusi 2 , Sonia Tucunduva Philippi 3<br />
A bulimia nervosa é um transtorno alimentar caracterizado por<br />
episódios compulsivos e comportamentos compensatórios para evitar<br />
ganho de peso. O padrão alimentar é caótico, variando entre<br />
fases restritivas e compulsivas. Objetivo: avaliar alterações no<br />
padrão de refeições e ingestão nutricional de pacientes com bulimia<br />
antes e depois de tratamento. Método: foram acompanhadas pacientes<br />
do gênero feminino, em um ambulatório de transtornos<br />
alimentares. Os dados foram obtidos a partir de diários alimentares<br />
de sete dias; os valores de energia e nutrientes estimados por meio<br />
de software de análise nutricional. Resultados: encontrou-se<br />
aumento no número de refeições e ingestão energética média de ±<br />
1500 kcal. Houve alteração significativa apenas do consumo<br />
protéico (em porcentagem do valor energético total). Não foi observada<br />
melhoria da adequação de ingestão de micronutrientes.<br />
Conclusão: não houve mudança notável na ingestão de energia<br />
e nutrientes. Provavelmente, é necessário maior tempo de tratamento<br />
e seguimento para que ocorram haja alterações detectáveis. (Rev<br />
Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177)<br />
UNITERMOS: bulimia nervosa, padrões alimentares, consumo alimentar,<br />
ingestão de energia, nutrientes.<br />
Resumen<br />
Abstract<br />
Bulimia nervosa is an eating disorder characterized by binge eating<br />
episodes and compensatory methods to prevent weight gain. The<br />
eating pattern is chaotic and it varies according to the phase of the<br />
disease (restrictive or compulsive). Objective: To evaluate changes<br />
in meal patterns and nutritional intake in patients with bulimia<br />
nervosa, before and after treatment. Methods: Female patients<br />
were followed in an outpatient setting. Data were obtained from<br />
7-day food records, and energy and nutrients intake were estimated<br />
by nutrition software. Results: Higher number of meals was found<br />
after treatment; the mean energy intake was within ± 1500 kcal.<br />
There was a significant change in only percent of energy from<br />
protein. It was not observed an improve of the micronutrients<br />
adequacy. Conclusion: There was no significant improve in the<br />
energy and nutrients intake. Probably, more time of treatment and<br />
follow-up is needed to observe significant alterations. (Rev Bras<br />
Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177)<br />
KEY WORDS: bulimia, food pattern, eating, energy intake, nutrients.<br />
La bulimia nerviosa es un trastorno de la conducta alimenticia caracterizado por episodios compulsivos y comportamientos compensatorios<br />
para evitar aumento de peso. La conducta alimenticia es caótica, con variaciones de acuerdo con la fase restrictiva o compulsiva. Objetivo:<br />
Evaluar alteraciones en la ingestión de energía y nutrientes en pacientes con bulimia, antes y después del tratamiento. Método: Seguimiento<br />
de pacientes (femenino) en tratamiento en ambulatorio especializado. Los datos se obtuvieron de los registros diarios de los alimentos<br />
consumidos durante siete días. Los valores de energía y nutrientes fueron estimados por software de análisis nutricional. Resultados: Se<br />
encontró un aumento en el número de comidas y de la ingestión energética, en un promedio de ± 1500 Kcal. Se detectó variación significativa<br />
en el porcentaje de energéticos de origen proteico. No se observó ninguna mejora cuanto a la adecuada ingestión de<br />
micronutrientes. Conclusión: No hubo mejora significativa en cuanto a la ingestión de energía y nutrientes. Es probable que sea necesario<br />
más tiempo de tratamiento y seguimiento para obtener modificaciones significativas. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177)<br />
UNITÉRMINOS: bulimia, conducta alimentaria, ingestión de alimentos, ingestión de energia, nutrimentos.<br />
1. Nutricionista, doutora em Nutrição Humana pela USP. Supervisora do grupo de nutrição do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares – AMBULIM HC-<br />
FMUSP; 2. Nutricionista, doutoranda em Educação física pela Escola de Educação Física e Esporte da USP, coordenadora científica da equipe de nutrição AMBULIM;<br />
3. Pesquisadora e Professora Livre Docente do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP.<br />
Instituição onde o trabalho foi realizado: Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares – AMBULIM – Instituto de psiquiatria (IpQ) do Hospital das Clínicas da<br />
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo- HC-FMUSP. Rua Ovídeo de Campos, 785 – CEP 01060-970.<br />
Endereço para correspondência: Marle Alvarenga. Rua Cotoxó, 303, sala 127, Pompéia, CEP 05021-000, São Paulo, SP. Fone: (011) 3672-3869 / 9<strong>19</strong>6-<strong>19</strong>94 -<br />
Fax: (011) 3672-3869 / E-mail: marlealv@uol.com.br<br />
Submissão: 6 de agosto de 2004<br />
Aceito para publicação: 22 de dezembro de 2004
Introdução<br />
A bulimia nervosa (BN) é um transtorno alimentar caracterizado<br />
por episódios compulsivos seguidos por comportamentos<br />
inadequados para evitar ganho de peso, tais como os<br />
vômitos provocados e abuso de laxantes e diuréticos 1 .<br />
Os primeiros estudos sobre a nutrição na BN tiveram<br />
início na década de <strong>19</strong>80, essencialmente nos países desenvolvidos<br />
2,3,4,5 . No Brasil, os transtornos alimentares (TA)<br />
começaram a ser tratados efetivamente com a criação do<br />
Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares -<br />
AMBULIM, no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas<br />
da Faculdade de Medicina da Universidade de São<br />
Paulo (HC-FMUSP) em <strong>19</strong>92, e desde então foram realizados<br />
três estudos nutricionais com pacientes bulímicas 6,7, 8 .<br />
Descreve-se na BN um padrão alimentar caótico, que<br />
oscila entre uma alimentação altamente restritiva, e episódios<br />
- ou dias - extremamente calóricos 9 . O ciclo restrição –<br />
compulsão – purgação ilustra a patologia alimentar na BN. Os<br />
pacientes insistem em iniciar dietas ou períodos de alimentação<br />
restritiva, consumindo quantidades extremamente pequenas<br />
de alimentos, com qualidade comprometida devido<br />
à restrição, evitando alimentos que julgam mais calóricos ou<br />
“engordativos” (os chamados “alimentos proibidos”). Esta<br />
restrição acaba por desencadear um episódio bulímico, no<br />
qual o valor energético ingerido é alto 10 .<br />
Os alimentos mais presentes nas compulsões são aqueles<br />
de alto valor energético que o paciente tende a excluir de sua<br />
dieta habitual por medo de ganho de peso (doces, chocolate,<br />
leite condensado, biscoito) 5, 8, 11 .<br />
Acredita-se que o padrão alimentar patológico é uma<br />
característica geral da BN e não apenas restrito aos episódios<br />
bulímicos ou à restrição alimentar - o que explica a dificuldade<br />
em normalizar a alimentação dos pacientes 12, 13 .<br />
Sabe-se ainda que estes pacientes têm comportamentos<br />
alimentares perturbados que necessitam ser abordados, como<br />
dificuldade para selecionar o que comer, padrões de fome e<br />
saciedade anormais, expressiva repugnância aos alimentos,<br />
um “comer social” prejudicado, medos e preconceitos em<br />
relação ao alimento e controle de peso 12,13,14 .<br />
Estudos descritos na literatura, feitos em laboratório, com<br />
refeições-teste ou com pacientes hospitalizadas, observaram<br />
ingestões energéticas nos episódios compulsivos que variam<br />
de um mínimo de 1.436 kcal a um máximo de 8.585 kcal,<br />
apresentando vômitos seguidos na grande maioria dos casos.<br />
Estes episódios duram em média 59 minutos, com distribuição<br />
de macronutrientes de 49% de carboidratos, 43% de<br />
gordura e 8% de proteínas. Sem compulsões, as pacientes têm<br />
uma variação de consumo de 69 a 10.620 kcal 2,3,4,5,13,15 . A<br />
natureza artificial e a pouca validade ecológica destas pesquisas,<br />
no entanto, podem influenciar os resultados sobre os<br />
padrões alimentares, as compulsões e purgações obtidos em<br />
tais estudos, limitando a generalização dos resultados. De<br />
qualquer forma, a diferença nos valores mínimos e máximos<br />
mostram grande variabilidade nos dados de consumo alimentar<br />
de pacientes com BN.<br />
No Brasil, os transtornos alimentares são estudados e tratados<br />
há pouco tempo, sendo que alguns grupos estudam TA<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
e há alguma assistência pública 8,16 , mas medidas de resultado<br />
de tratamento não são conduzidas sistematicamente.<br />
Mesmo internacionalmente, os estudos que descrevem padrão<br />
alimentar na BN na literatura são todos transversais, e se desconhece<br />
algum que tenha descrito a ingestão energética e de<br />
nutrientes em um seguimento. Os estudos de seguimento na<br />
BN limitam-se a seguir variáveis de comportamento bulímico<br />
e preditores de recuperação 17,18 .<br />
Métodos<br />
O presente estudo foi realizado como parte do projeto<br />
temático do AMBULIM –HC-FMUSP, que objetivava estudar<br />
resultados de tratamento na BN. Do ponto de vista<br />
nutricional, o objetivo foi investigar mudanças no padrão e<br />
consumo alimentares depois de abordagem multiprofissional.<br />
Os resultados de consumo alimentar compreendem a constituição<br />
da dieta, seu aporte energético, distribuição de<br />
macronutrientes e adequação de micronutrientes. O resultado<br />
de padrão alimentar refere-se ao número e tipos de refeições<br />
apresentadas por dia durante o seguimento.<br />
Participaram do estudo 39 pacientes do sexo feminino,<br />
diagnosticadas com BN de acordo com os critérios do DSM-<br />
IV 1 . O tratamento consistia de um grupo de abordagem<br />
cognitivo comportamental de duração de 12 semanas, com<br />
seguimento em ambulatório aberto por mais três meses. Neste<br />
programa, os pacientes passavam por tratamento com médico<br />
psiquiatra, grupo de terapia e abordagem nutricional.<br />
As pacientes foram instruídas a preencher um diário alimentar,<br />
no qual deveriam registrar os alimentos consumidos,<br />
as quantidades, os horários e a duração das refeições <strong>19</strong> . Além<br />
disto, deveriam assinalar se a refeição era considerada um<br />
episódio compulsivo e se havia alguma forma de purgação,<br />
especificando-a.<br />
Estes diários foram avaliados para se obter dados de<br />
ingestão energética e de nutrientes em três diferentes momentos:<br />
no ingresso da paciente no ambulatório (Fase 1), após a<br />
abordagem de 12 semanas (Fase 2) e após três meses de seguimento<br />
(Fase 3); obtendo-se a média destes aspectos nas três<br />
diferentes fases.<br />
Os diários alimentares das semanas 2, 12 e 24 foram analisados<br />
para comparação dos padrões nutricionais. Optou-se<br />
pelo diário da segunda semana (inicial) para o início da<br />
avaliação, pois o diário da primeira semana serviu para verificar<br />
adequação de preenchimento; no caso de a paciente não<br />
ter feito o diário das semanas selecionadas para avaliação,<br />
utilizou-se o diário da semana imediatamente anterior ou<br />
posterior. Foram usados os dias com registros completos. Se a<br />
paciente não descreveu adequadamente uma refeição ou<br />
deixou um dia incompleto, este dia foi retirado da análise.<br />
Todos os alimentos registrados no diário foram convertidos<br />
em unidades de peso ou porções de acordo com a base<br />
de dados de programa de cálculo nutricional que inclui alimentos<br />
nacionais – Virtual Nutri 20 . Para preparações ou receitas<br />
específicas não constantes da base de dados do Virtual<br />
Nutri, foram listados os ingredientes e calculadas as receitas.<br />
Quando a paciente registrava uma ingestão alimentar e<br />
marcava na seqüência que aquela refeição foi compulsiva e<br />
171
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
que ela havia provocado vômito depois, estes alimentos eram<br />
separados dos demais ingeridos no dia e calculados à parte.<br />
Assim, para os valores de energia e macronutrientes, os valores<br />
serão apresentados em duas categorias:<br />
valores diários totais, excluindo os episódios alimentares<br />
seguidos de vômito (VET);<br />
valores dos episódios alimentares seguidos de vômito, separadamente<br />
(VOM).<br />
As contribuições percentuais dos macronutrientes para o<br />
valor energético total da ingestão VET foram comparada com<br />
as contribuições da ingestão VOM.<br />
Foram ainda analisados o total ingerido das vitaminas<br />
retinol, B1, B6, D, C, E e dos minerais sódio, potássio,<br />
magnésio, cálcio e ferro em cada uma das fases para a ingestão<br />
sem os episódios seguidos de vômitos (VET).<br />
Cada uma das três fases do programa gerou um arquivo<br />
com as pacientes que entraram/permaneceram no programa<br />
de tratamento. Através do software Statistical Package for Social<br />
Sciences (SPSS) for Windows v. 6.0, os arquivos foram<br />
linearizados com o pareamento de todas variáveis. Obtiveram-se<br />
as seguintes estatísticas descritivas: freqüência, média,<br />
mediana e desvio-padrão.<br />
Para se verificar se existiu evolução entre as fases do programa,<br />
foram aplicados os testes de Friedman e Bonferoni. Foi<br />
utilizado também o teste de Wilcoxon Matched-Pairs Signed-<br />
Ranks Test para verificar diferenças dentro de cada fase. O<br />
nível de significância adotado foi p £ 0,05.<br />
A adequação de energia e macronutrientes foi verificada<br />
de acordo com as Recommended Dietary Allowances - RDA 21 ,<br />
e a adequação de micronutrientes foi verificada de acordo<br />
com as Dietary Reference Intakes - DRIs 22,23,24 .<br />
As pacientes assinaram termo de consentimento e foram<br />
informadas sobre o caráter de seguimento da pesquisa. O projeto<br />
foi aprovado pela Comissão de Ética CAPPesp da Diretoria<br />
Clínica do Hospital das Clínicas da FMUSP e pela<br />
Comissão de Ética da Faculdade de Saúde Pública – FSP/USP.<br />
172<br />
Resultados<br />
Iniciaram o estudo 39 pacientes (Fase 1), ao final de três<br />
meses (Fase 2), 20 permaneciam em tratamento e, ao final de<br />
seis meses, havia 15 pacientes (Fase 3); resultando numa taxa<br />
de abandono de 61,54%.<br />
Encontrou-se que 90% das pacientes eram do subtipo<br />
bulímico da BN, 70% estavam sem companheiro, 65% tinham<br />
grau de instrução superior (completo ou incompleto).<br />
Outras características da população encontram-se na tabela<br />
1.<br />
Tabela 2 - Dados de padrão alimentar durante o seguimento (fases 1, 2 e 3)ª<br />
Tabela 1- Dados descritivos das pacientes - com relação à idade, peso,<br />
idade de início da dieta, compulsões e vômitos, no início do tratamento.<br />
Característica Média ± Desvio-Padrão Mediana<br />
Idade (anos) 27,7 ± 6,3 25<br />
Índice de massa corporal (kg/m 2 ) 22,9 ± 3,9 22,4<br />
Peso corporal (kg) 61,8 ± 10,8 62,8<br />
Peso desejado (kg) 54,6 ± 6,4 54,5<br />
Variação de peso ao longo 15,2 ± 7,9 14<br />
da vida (kg)<br />
Ao final dos seis meses de seguimento, a média da freqüência<br />
de compulsões e vômitos demonstrou que este grupo<br />
de pacientes não mais preenchia critério diagnóstico para<br />
BN 1 (dados não demonstrados). Em relação ao padrão alimentar,<br />
houve alteração significativa apenas do número de<br />
almoços por semana, como mostra a tabela 2.<br />
As tabelas 3 e 4 apresentam os valores de energia e<br />
macronutrientes das diferentes fases, para as ingestões VET e<br />
VOM, respectivamente.<br />
Quando as porcentagens dos macronutrientes foram<br />
comparadas para a ingestão sem os episódios compulsivos<br />
seguidos de vômito (VET) e dos episódios compulsivos seguidos<br />
de vômitos (VOM), não se detectou diferença estatisticamente<br />
significativa para a porcentagem de carboidratos e<br />
proteínas, em nenhuma das fases; encontrou-se apenas diferença<br />
estatisticamente significativa (p = 0,03) para os lipídios na<br />
FASE 1 - ingestão VOM maior que ingestão VET (Tabelas 3<br />
e 4).<br />
Os valores encontrados na análise da ingestão das vitaminas<br />
e minerais, bem como a porcentagem de adequação da<br />
ingestão em relação à recomendação em cada uma das fases<br />
podem ser visualizados na Tabela 5.<br />
Discussão<br />
As pacientes apresentaram perfil semelhante ao descrito<br />
para a população com BN na literatura internacional: mulheres<br />
jovens, sem companheiro, com grau de instrução superior<br />
e com maior prevalência do subtipo purgativo 15,25 .<br />
Encontrou-se que a faixa etária mediana das pacientes é<br />
jovem (25 anos) e um pouco mais alta do que a literatura<br />
estabelece como padrão para a doença – 16 a 20 anos 26 . Este<br />
fato pode ser explicado pelo tempo de doença, que variou de<br />
1 a 20 anos, e pelo fato de que a demora das pacientes para<br />
procura do tratamento médico é de cerca de cinco anos, por<br />
sentimentos de culpa e vergonha, bem como da idéia de que<br />
a bulimia não seja um problema médico 27 . Outros trabalhos<br />
com pacientes bulímicas também encontraram uma média de<br />
Número de refeições+ Desjejum+ Lanche da manhã+ Almoço+ Lanche da tarde+ Jantar+ Lanche da noite+<br />
Fase 1 25,8 ± 10 4,1 ± 2 2,9 ± 2 4,3 ± 2 3,4 ± 2 4,5 ± 1 2,3 ± 2<br />
(23; 5-50) (4; 0-6) (3; 0-6) (5; 0-7)* (4; 0-6) (4; 2-7) (3; 0-6)<br />
Fase 2 25,4 ± 7 4,7 ± 2 2,3 ± 2 5,2 ± 1 4, 0 ± 2 3,7 ± 1 3,1 ± 2<br />
(23; 18-40) (5; 0-7) (2; 0-7) (6; 3-7)* (4; 1-6) (4; 1-7) (3; 0-7)<br />
Fase 3 31 ± 13 6,3 ± 2 2,3 ± 2 6,5 ± 2 4,7 ± 3 5,1 ± 2 3,0 ± 2<br />
(27; 11-65) (3-8) (2; 0-7) (7; 1-8) (5; 0-9) (6; 0-9) (3; 0-6)<br />
a: dados apresentados como média ± desvio-padrão (mediana; mínimo-máximo). + por semana. * p < 0,05, em relação à fase 3
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
Tabela 3 - Consumo de energia e de macronutrientes (em porcentagem do valor energético total) dos dias desconsiderando os episódios<br />
compulsivos seguidos de vômitos – VET, nas três fases do programa.ª<br />
Valor energético total Porcentagem de proteínas Porcentagem decarboidratos Porcentagem delipídios<br />
Fase 1 1529,2 ± 945 14,6 ± 3 53,5 ± 8 32,1 ± 7<br />
(1<strong>19</strong>7; 337- 4094) (14; 10-21)* (51; 44-72) (32; <strong>19</strong>-43)<br />
Fase 2 1475,1 ± 771 15,8 ± 3 50,8 ± 6 32,6 ± 5<br />
(1277; 577-3853) (15; 12-21) (49; 44-65) (32; 24-40)<br />
Fase 3 1337,0 ± 5<strong>19</strong> 17,6 ± 3 50,4 ± 6 31,6 ± 6<br />
(1393; 641-2131) (18; 13-21) (50; 40-60) (31; 22-42)<br />
a: dados apresentados como média + desvio-padrão (mediana; mínimo-máximo). * p < 0,05, em relação à fase 3<br />
Tabela 4 - Consumo de energia e de macronutrientes (em porcentagem do valor energético total) dos episódios compulsivos seguidos de vômitos<br />
– VOM, nas três fases do programa.ª<br />
Valor energético total Porcentagem de proteínas Porcentagem decarboidratos Porcentagem delipídios<br />
Fase 1 1310,0 ± 686 17,5 ± 7 47,4 ± 6 35,3 ± 4<br />
(1274; 460-2689) (14; 7-32) (49; 37-55) (36; 26-41)<br />
Fase 2 1401,9 ± 707 17,2 ± 7 45,9 ± 15 34,2 ± 7<br />
(1320; 584-2664) (16; 10-33) (44; 21-69) (35; 21-43)<br />
Fase 3 1210,7 ± 226 10,1 ± 5 60,7 ± 3 28,1 ± 3<br />
(1238; 927-1440) (9; 6-17) (60;57-65) (28; 24-31)<br />
a: dados apresentados como média + desvio-padrão (mediana; mínimo-máximo).<br />
Tabela 5 - Consumo de micronutrientes e adequação destes, dos dias desconsiderando os episódios compulsivos seguidos de vômitos – VET, nas três<br />
fases do programa.<br />
Nutriente Fase Valoresa Ingestão recomendadab Adequaçãoc (%)<br />
Retinol (mcg) 1 710 + 377 (680; 27 - 1632) 800 89<br />
2 774 + 337 (765; 2<strong>19</strong> - 1612) 97<br />
3 1117 + 460 (990; 656 - 2050) 140<br />
Vitamina C (mg) 1 88 + 74 (69; 1 - 258) 7 5 118<br />
2 84 + 44 (85; 16 - 186) 112<br />
3 217 + 259 (124; 60 - 992) 289<br />
Vitamina B1 (mg) 1 1 + 0,7 (0,7; 0,4 – 3,2) 1,1 9 5<br />
2 1 + 0,6 (0,8; 0,3 – 2,7) 9 1<br />
3 0,9 + 0,4 (0,7; 0,5 – 1,5) 8 1<br />
Vitamina B6 (mg) 1 0,8 + 0,4 (0,7; 0,1 – 1,4) 1,3 5 8<br />
2 0,9 + 0,4 (0,8; 0,4 – 2,0) 6 8<br />
3 0,9 + 0,4 (0,8; 0,5 – 1,7) 7 2<br />
Vitamina D (mcg) 1 18 + 29 (0,8; 0 – 95) 5 351<br />
2 10 + 15 (1; 0 – 55) <strong>19</strong>9<br />
3 8 + 20 (0,6; 0 – 68) 166<br />
Vitamina E (mg) 1 7 + 5 (6; 0 – 22) 1 5 4 9<br />
2 9 + 7 (7; 2 – 25) 5 7<br />
3 7 + 5 (5; 3 – 16) 4 9<br />
Sódio (mg) 1 1551 + 1156 (1236; 68 – 4406) 2400 65<br />
2 1604 + 1125 (1123; 598 – 4917) 67<br />
3 1397 + 669 (1427; 483 – 2652) 58<br />
Cálcio (mg) 1 552 + 289 (481; 99 – 1081) 1000 55<br />
2 855 + 960 (569; <strong>19</strong>6 – 4178) 86<br />
3 632 + 288 (578; 344 – 1414) 63<br />
Magnésio (mg) 1 113 + 54 (1<strong>19</strong>; <strong>19</strong> – 241) 310 37<br />
2 132 + 79 (116; 43 – 356) 43<br />
3 132 + 39 (133; 73 – <strong>19</strong>9) 42<br />
Potássio (mg) 1 1<strong>19</strong>5 + 539 (1128; 211 – 2433) 3500 34<br />
2 1265 + 513 (1061; 508 – 2625) 36<br />
3 1493 + 382 (1390; 1015 – 2150) 43<br />
Ferro (mg) 1 6 + 4 (5; 0,4 – 15) 1 8 3 4<br />
2 7 + 3 (6; 2 – 15) 3 7<br />
3 6 + 3 (5; 3 – 12) 3 5<br />
a b média + desvio-padrão (mediana; mínimo - máximo). Valores de ingestão recomendados para mulheres jovens. Dietary Reference Intake – DRI - Institute<br />
of Medicine. cPercentual obtido na ingestão média em relação à recomendação.<br />
173
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
idade maior, em torno dos 25 anos e também um tempo longo<br />
de doença 2,3,11,12,18,28 .<br />
É preciso considerar também que, no Brasil, os TAs só<br />
estão sendo efetivamente tratados muito recentemente. As<br />
pessoas desconhecem os serviços existentes e a espera para<br />
tratamento gratuito costuma ser longa. Não se tem no Brasil,<br />
ainda, a tradição de trabalhos de prevenção de TAs e atendimento<br />
destas doenças nos serviços de atenção primária à saúde<br />
e, portanto, nem sempre é possível constatar os quadros no<br />
seu início.<br />
Em relação aos parâmetros antropométricos, observou-se<br />
que o IMC inicial se encontrava dentro da normalidade,<br />
como apontado por outros autores 11,25 . O peso desejado foi<br />
8,3 kg abaixo do peso da mediana, evidenciando o desejo<br />
persistente de perder peso característico desta doença. O histórico<br />
de variação de peso mostra uma oscilação média muito<br />
alta nos últimos anos (15,2 kg), ilustrando o histórico de<br />
tentativas bem e mal sucedidas de perder peso, que caracterizam<br />
o ciclo “dieta/compulsão/purgação” da BN 10 . Kell et<br />
al. 29 encontraram oscilação média de 16 kg no histórico das<br />
pacientes, e Sunday & Halmi 13 afirmaram que as bulímicas de<br />
seu estudo haviam sido mais pesadas no passado.<br />
Obteve-se ao final dos seis meses de seguimento, um total<br />
de 61,5% de desistência. Sabe-se, que a taxa de abandono<br />
de pacientes bulímicas é grande. Elmore & Castro 14 encontraram<br />
26,9% de abandono, Agras et al. 17 encontraram 26%<br />
de desistência depois de uma média de 4,6 semanas;<br />
Bacaltchuk & Hay 30 encontraram em um estudo de revisão<br />
que as taxas de abandono foram de mais de 30% em curto<br />
prazo; estes dados são semelhantes às taxas de abandono encontradas<br />
neste trabalho após 12 semanas (48,72%).<br />
Na avaliação do número de refeições durante o seguimento,<br />
observou-se que, após seis meses, a mediana para o<br />
número de almoços alcançou o número 7, significando almoços<br />
todos os dias da semana. Para todas as demais refeições,<br />
não houve diferença significativa: para o café da manhã, a<br />
mediana, após este mesmo período, também alcançou o número<br />
7, significando a presença desta refeição todos os dias;<br />
para o lanche da tarde, jantar e lanche da noite, observou-se<br />
medianas um pouco maiores no final. Para o número de refeições<br />
semanais observou-se que no início do tratamento e após<br />
este, a média de refeições/dia foi mais próxima de três e que,<br />
após seis meses de seguimento, a média de refeições/dia foi<br />
mais próxima de quatro, o que é considerado mais adequado<br />
de acordo com a recomendação de uma dieta equilibrada 31 .<br />
Em relação à ingestão energética e de nutrientes, a separação<br />
da análise dos episódios alimentares seguidos de vômitos<br />
se fez porque para discutir adequação destes parâmetros,<br />
os episódios seguidos de vômitos não poderiam ser totalmente<br />
considerados. Segundo Gendall et al. 25 , até 50% do que foi<br />
ingerido numa compulsão pode ser retido após vômito, mas<br />
esta determinação exigiria um estudo fisiológico bastante<br />
complexo. Optou-se, portanto, pela separação para observação<br />
das diferenças e, considerou-se a ingestão nutricional sem<br />
os episódios compulsivos seguidos de vômitos (VET), já que<br />
não era possível estimar quanto do alimento ingerido previamente<br />
ao vômito foi absorvido e quanto foi eliminado.<br />
Os resultados indicaram que a ingestão média de energia<br />
174<br />
no VET ficou bem abaixo da recomendação de energia para<br />
as mulheres jovens – ± 2.200 kcal – 21,32 . Este dado é consistente<br />
com a observação de Wallin et al. 11 e de Gendall et al. 25 ,<br />
que concluíram que a energia consumida durante as<br />
compulsões indicava que as pacientes bulímicas usam as<br />
compulsões para normalizar sua alimentação errônea. De<br />
modo geral, as pacientes ingerem menos do que sua necessidade<br />
fisiológica e acabam por ter uma compulsão para compensar<br />
este déficit, assim a restrição gera a compulsão.<br />
Os estudos de padrão alimentar na BN mostram resultados<br />
diversos. Segundo Gendall et al. 25 , estudos empíricos têm<br />
registrado a variação média do conteúdo de energia entre 605-<br />
4.800 kcal, enquanto que o conteúdo de macronutrientes<br />
parece ser igual ao da dieta americana típica. Estudo de Woell<br />
et al. 28 encontrou ingestão energética média de 3.100 kcal por<br />
dia (considerando-se as compulsões). Estudo de Wallin et al. 9<br />
encontrou a variação de ingestão energética de 762 (± 560)<br />
kcal/dia. O estudo de Sunday & Halmi 33 mostrou que<br />
bulímicas consumiam menos energia do que anoréxicas em<br />
fase de manutenção de peso.<br />
Observando estes estudos encontra-se grande variabilidade<br />
nos resultados. Esse dado era esperado, por se conhecer que<br />
as pacientes bulímicas apresentam um padrão de ingestão<br />
alimentar atípico, tendendo a ser caótico e variando entre e<br />
intra pacientes, dependendo da fase, restritiva ou compensatória;<br />
ou seja, entre as refeições compulsivas ou não<br />
5,9,11,15,25,28,34 . Segundo Gayle 34 , as flutuações extremas de<br />
ingestão energética interrompem a regulação do apetite e das<br />
demais respostas fisiológicas. O autor postula que a baixa<br />
ingestão de energia leva a uma perda de controle, apesar da<br />
maior quantidade energética consumida subseqüentemente.<br />
É por conta destes padrões caóticos que se recomenda que o<br />
tratamento deva incluir a estabilização do padrão alimentar<br />
para prevenir flutuações no comportamento bulímico.<br />
Para o valor energético no VOM, encontrou-se a variação<br />
de 460 - 2.690 kcal. Os resultados indicam, portanto, que a<br />
ingestão energética média dos episódios compulsivos seguidos<br />
de vômitos não foi tão grande (como apontado pelo critério do<br />
DSM-IV), havendo episódios de até 460 kcal. Este dado é<br />
consistente com o estudo de Woell et al. 28 que encontraram 1/<br />
3 dos pacientes declarando como “compulsivo” o consumo de<br />
menos de 500 kcal (a maioria registrou, em média, episódios de<br />
2.000 kcal); os autores apontam que a declaração da ingestão<br />
como um episódio compulsivo pode depender da quantidade,<br />
do conteúdo energético do alimento consumido, e também da<br />
disposição psicológica do paciente.<br />
Também para os episódios compulsivos, os estudos registram<br />
grande variabilidade; pesquisa de Mitchell et al. 35 encontrou<br />
média de 3.415 kcal nas compulsões (com variação de<br />
1.200 -11.500 kcal); Mitchell & Laine 4 observaram média de<br />
4.394 kcal (1.436 - 8.585 kcal). Rosen et al. 36 notaram que<br />
um terço das compulsões continha 600 kcal ou menos.<br />
Elmore & Castro 14 afirmaram que as compulsões maiores são<br />
mais prováveis de serem purgadas e que com o aumento da<br />
duração da doença aumenta o tamanho das compulsões.<br />
Segundo Gendall et al. 25 , parece que quanto mais freqüentes<br />
são os episódios compulsivos, maiores são as ingestões de<br />
energia ou maiores os episódios; e também que as refeições
não compulsivas têm menos energia que as compulsivas, mas<br />
não diferem em macronutrientes.<br />
Analisando, no presente trabalho, o perfil de<br />
macronutrientes (em medianas) encontrado no VOM, observam-se<br />
valores semelhantes aos da pesquisa de Woell et al. 28 ,<br />
com 42% de carboidratos, 12% de proteínas e 43% de<br />
lipídios; pode-se observar que a porcentagem de<br />
macronutrientes durante os episódios não é realmente muito<br />
diferente da ingestão não compulsiva (Tabela 3). Para checar<br />
melhor este dado, as porcentagens de adequação dos<br />
macronutrientes do VET foram comparadas com as porcentagens<br />
da ingestão do VOM. Na verdade, encontrou-se diferença<br />
estatisticamente significativa na fase 1 para os lipídios<br />
(ingestão do VOM maior do que a ingestão do VET). Tal<br />
diferença não permaneceu nas fases 2 e 3 e não foi encontrada<br />
para carboidratos e proteínas.<br />
A porcentagem de macronutrientes nas três fases (em<br />
medianas) para o VET teve valores que se aproximaram da<br />
recomendação do RDA; encontrou-se diferença apenas para<br />
a porcentagem de proteínas em relação ao valor energético<br />
total da dieta (diferença entre as fases 1 e 3). Na figura 1,<br />
observa-se as porcentagens encontradas nas três fases e o valor<br />
recomendado para mulheres jovens pelo NRC (National<br />
Research Council) 21 nas RDAs, os valores encontrados em<br />
estudos de outros pesquisadores 4,9,28 e um estudo da autora<br />
deste trabalho realizado com um grupo de pacientes do<br />
AMBULIM, em <strong>19</strong>97 8 .<br />
Para a ingestão de micronutrientes, os resultados indicaram<br />
que a maior parte das vitaminas e minerais apresentou<br />
valores abaixo das recomendações das DRIs 21,22,23 .<br />
Na comparação com a recomendação, os nutrientes que<br />
se apresentaram mais adequados foram o retinol e a vitamina<br />
C. Os micronutrientes que se apresentaram mais inadequados<br />
foram: sódio, cálcio, magnésio, potássio e ferro. Observa-se,<br />
ainda, que praticamente não houve mudança neste padrão de<br />
inadequação ao longo das fases.<br />
Assim como para os macronutrientes, não é possível afirmar<br />
que este padrão de inadequação seja uma característica<br />
exclusiva de pacientes bulímicas; este trabalho não usou um<br />
grupo controle e, portanto, não se sabe se a ingestão de<br />
micronutrientes de mulheres saudáveis na mesma faixa etária<br />
é tão inadequada quanto.<br />
A inadequação da ingestão de sódio e potássio foi grande<br />
em todas as fases e deve contribuir, juntamente com os<br />
comportamentos compensatórios de vômitos, abuso de<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
diuréticos e/ou laxantes, para o freqüente achado clínico de<br />
alterações hidroeletrolíticas nestas pacientes 37 .<br />
O resultado não expressivo de mudança neste padrão de<br />
inadequação ao longo das fases indica que o tratamento foi<br />
ineficaz na melhora da adequação de micronutrientes. É<br />
importante apontar que, para a vitamina B1 e o ferro, houve<br />
aumento da inadequação, levando a pensar onde o tratamento<br />
nutricional falhou, e de que forma esta inadequação pode<br />
ser corrigida.<br />
Em função desta densidade reduzida de micronutrientes<br />
na ingestão de bulímicas, constatou-se que o tratamento deve<br />
encorajar o consumo de refeições regulares, em particular de<br />
alimentos ricos em vitaminas e minerais.<br />
Pode-se também afirmar que o perfil nutricional das<br />
pacientes bulímicas estudadas no AMBULIM é muito semelhante<br />
ao descrito na literatura para outras populações em<br />
países desenvolvidos. Como o AMBULIM é o serviço de<br />
referência nacional pode-se imaginar que este perfil seja a<br />
realidade da bulimia no Brasil, embora trabalhos regionais<br />
sejam necessários para confirmar esta hipótese.<br />
Algumas considerações devem ser feitas sobre este estudo;<br />
primeiramente, ele foi realizado com um grupo pequeno<br />
de pacientes, que se tornou ainda menor devido à alta taxa de<br />
abandono. Acredita-se, no entanto, que o número de pacientes<br />
acompanhadas até o final do processo foi suficiente, uma<br />
vez que são poucos os estudos com TAs, particularmente de<br />
seguimento de pacientes bulímicas, no Brasil, e ainda mais<br />
sobre aspectos nutricionais.<br />
As limitações do uso do diário alimentar também devem<br />
ser consideradas. Há sempre a possibilidade de erros quando<br />
se usa diários alimentares 38 ; mas segundo Gayle 34 , é a “única<br />
forma viável de se obter dados de ingestão energética e identificação<br />
de compulsões em um ambiente natural”, ou seja, fora do<br />
laboratório.<br />
Os indivíduos que preenchem diários alimentares podem<br />
alterar sua ingestão alimentar quando sabem que seus registros<br />
serão verificados, pois associam à alimentação um sentimento<br />
de culpa e vergonha. Os possíveis vieses relacionados ao<br />
uso de diários são que eles podem ser distorcidos: existe a<br />
possibilidade de erros de codificação de dados; os programas<br />
nutricionais não contêm todos os alimentos; o conteúdo<br />
nutricional de alguns alimentos pode não ser calculado, entre<br />
outros.<br />
Poucos estudos avaliaram estratégias para minimizar esta<br />
tendência de alteração da ingestão alimentar em função do<br />
FASE Porcentagem de carboidratos Porcentagem de proteínas Porcentagem de lipídios<br />
1 51,43 13,82 32,49<br />
2 49,48 14,77 31,79<br />
3 50,23 17,57 30,68<br />
RDA 21 50-60 10-15 20-30<br />
Mitchell & Laine4 * 49 8 43<br />
Woell et al. 28 41 14 38<br />
Wallin et al. 9 57 21 22<br />
Alvarenga et al. 8 50,77 17,90 32,30<br />
* pacientes hospitalizadas<br />
Figura 1 - Quadro da porcentagem dos macronutrientes sem os episódios compulsivos seguidos de vômito (VET) encontrada nas três diferentes<br />
fases, recomendação destes macronutrientes segundo RDA e os valores encontrados em estudos com pacientes bulímicas.<br />
175
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):170-177<br />
registro da mesma. Goris & Westerterp 39 observaram que<br />
confrontar os sujeitos com os resultados de diários anteriores<br />
diminui tal erro; no Brasil, Scagliusi et al. 38 verificaram que,<br />
além de tal confrontação, treinar os sujeitos de forma mais<br />
intensiva, atenua este erro, porém ele ainda permanece muito<br />
alto.<br />
No presente estudo algumas medidas foram tomadas para<br />
minimizar o registro inadequado por parte das pacientes: elas<br />
foram instruídas a preencher o diário imediatamente após as<br />
refeições e orientadas em como medir, estimar porções e registrar<br />
a ingestão dos alimentos. A revisão semanal dos diários foi<br />
feita pela nutricionista responsável a fim de esclarecer dúvidas.<br />
Assim, os erros associados ao método podem ser<br />
minimizados pelas instruções e verificações sucessivas. Para<br />
diminuir a variabilidade na interpretação (erros de<br />
codificação e distorção de dados) todos os diários alimentares<br />
desta pesquisa foram analisados por um pesquisador previamente<br />
treinado.<br />
Mesmo com estes vieses, segundo Woell et al. 28 , é possível<br />
encontrar as características de padrão alimentar por meio<br />
da análise de diários. Vários outros autores também utilizaram<br />
diários em seus estudos e os descreveram como uma boa<br />
medida de pesquisa com sujeitos saudáveis e com bulímicos;<br />
eles justificam o uso do diário na BN e afirmam que este é um<br />
método válido para medir ingestão alimentar 14,25,28 .<br />
Desta forma, este estudo apresenta dados inéditos sobre<br />
evolução da ingestão alimentar de pacientes com BN no<br />
Brasil, sendo que se desconhecem estudos de seguimento que<br />
tenham avaliado especificamente variáveis nutricionais.<br />
De qualquer modo, o resultado e a eficácia de intervenções<br />
nutricionais específicas usadas no tratamento não podem<br />
ser testadas em estudos controlados, isoladamente, porque são<br />
apenas um componente do programa de tratamento total 40 .<br />
Utilizar apenas a intervenção nutricional, sem os devidos<br />
acompanhamentos clínicos, psiquiátricos, psicológicos e<br />
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176<br />
Referências bibliográficas<br />
terapêuticos, seria uma imperdoável falha ética.<br />
Acredita-se que o tratamento efetivo de todas as questões<br />
alimentares na BN leva muito tempo e só será possível como<br />
uma ampla compreensão do significado da alimentação na<br />
vida do indivíduo e com uma abordagem multiprofissional<br />
intensiva e diferenciada. Há de se considerar, ainda, a provável<br />
impossibilidade de alteração de todos estes padrões.<br />
Conclusão<br />
1. Observou-se que a intervenção multiprofissional para<br />
tratamento da bulimia nervosa teve impacto no quadro clínico<br />
da mesma, reduzindo seus sintomas.<br />
2. Esta melhora não foi acompanhada pela evolução<br />
nutricional. Foram verificadas apenas algumas mudanças na<br />
organização geral do padrão alimentar, como horários mais<br />
estabelecidos, refeições mais adequadas e inclusão de alimentos<br />
mais variados, e nenhuma ou pouca mudança detectável<br />
quantitativamente na ingestão de energia, macro e<br />
micronutrientes.<br />
3. Abordagens de intervenção com maior ênfase nos<br />
aspectos nutricionais, bem como maior tempo de tratamento,<br />
podem ser necessárias para o estabelecimento de melhores<br />
práticas alimentares.<br />
4. Finalmente, estudos de seguimento com maior duração<br />
podem ser necessários para se observar possíveis mudanças<br />
e também para avaliar a estabilidade temporal de tais<br />
mudanças.<br />
Agradecimentos<br />
Os autores gostariam de agradecer as nutricionistas<br />
Roberta Coutinho Martini, Cimani Cristina dos Santos e<br />
Karin Louise Lenz Dunker pela ajuda com a tabulação dos<br />
dados e análise nutricional.<br />
recovery process. Maryland: Aspen Publishers; <strong>19</strong>92. p.313-14.<br />
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177
Resumo<br />
178<br />
Abstract<br />
ARTIGO ORIGINAL<br />
Deficiência antioxidante em pacientes HIV+: uma deficiência global ou<br />
específica de nutrientes?<br />
Antioxidant deficiency in HIV+ patients: a global or specific deficiency of nutrients?<br />
Deficiencia antioxidante en pacientes VIH+: una deficiencia global o específica de nutrientes?<br />
Maria Dorotéia Borges dos Santos1, 2 , Paulo Câmara Marques Pereira3, 4 1, 5<br />
, Roberto Carlos Burini<br />
Com o objetivo de investigar as conseqüências do HIV sobre o estado<br />
pró oxidante/antioxidante e possíveis associações com a imunidade<br />
celular e estado nutricional protéico-energético, foram estudados<br />
32 pacientes (20 homens e 12 mulheres) de 22 a 64 anos<br />
atendidos em Hospital Universitário. Os pacientes foram comparados<br />
com 20 controles sadios (10 homens e 10 mulheres), voluntários<br />
de 27 a 65 anos de idade. Todos foram submetidos à avaliação<br />
antropométrica (peso, estatura, adiposidade e circunferências)<br />
e medidas derivadas: índice de massa corpórea (IMC em kg/m2 With the aim of investigating the HIV+ impacts on either proteinenergy<br />
and antioxidant status and their relationships 32 patients<br />
(20 males and 12 females), with ages ranging from 22 to 64 years<br />
were studied. They attended the Universitary Hospital and were<br />
matched for sex and age to 20 healthy volunteer controls (10 males<br />
and 10 females), with ages ranging from 27 to 65 years. All<br />
subjects were submitted to direct anthropometrical evaluation<br />
(weight, height, adiposity and circumferences) and derivative<br />
), measures: body mass index (BMI in kg/m<br />
circunferência muscular do braço (CMB) e porcentagem de gordura<br />
corporal (%G). Foi realizada coleta de sangue em jejum para a<br />
quantificação dos níveis plasmáticos de albumina (método<br />
colorimétrico), pró-oxidantes malonildialdeído(MDA) e glutationa<br />
oxidada (GSSG), antioxidantes (α-tocoferol, β-caroteno, ácido<br />
ascórbico e glutationa total (GSH)) e aminoácidos homocisteína<br />
e cisteína (Hcy e Cys) por cromatografia líquida de alta eficiência.<br />
+ +<br />
Os pacientes tiveram os níveis de linfócitos T CD e CD8<br />
4<br />
quantificados por citometria de fluxo. As diferenças entre grupos<br />
foram analisadas estatisticamente pelos testes de Student (t) ou<br />
Mann-Whitney para p
Resumen<br />
Introdução<br />
Na infecção pelo HIV, tanto a doença como suas<br />
intercorrências constituem elementos agravantes do estado<br />
nutricional dos pacientes. Por sua vez, a deficiência<br />
nutricional do hospedeiro pode ser determinante da carga<br />
viral e/ou virulência do agressor e/ou de germes oportunistas.<br />
A tríade da infecção pelo HIV, estado nutricional e função<br />
imunitária está intimamente relacionada com cada componente,<br />
exercendo efeito sobre os outros dois. Nesse sentido,<br />
até recentemente, o efeito dominante desta tríade era a desnutrição<br />
protéico-energética do paciente, com acentuado<br />
desgaste de massa celular (muscular e linfocitária) acompanhada<br />
de hipoalbuminemia e perda de peso, ambos de dimensões<br />
prognósticas à sobrevida do paciente 1 .<br />
Com o advento da terapia anti-retroviral potente<br />
(HAART), houve melhora do estado nutricional e maior<br />
sobrevida do paciente HIV+. Por outro lado, esses medicamentos,<br />
particularmente o inibidor de protease, introduziram<br />
novas anormalidades metabólicas como a síndrome metabólica<br />
ou lipodistrofia 1, 2 .<br />
Mesmo com a HAART e conseqüentes obesidade (com<br />
lipodistrofia) e síndrome metabólica, alguns pacientes<br />
infectados pelo HIV continuam a apresentar desgaste muscular<br />
2 . Não há associação dessa perda com o tempo da doença,<br />
mas sim com episódios agudos associados às infecções oportunistas,<br />
como por P. carinii e pneumonia 3 . Assim, o desgaste<br />
de massa magra constitui mau prognóstico de sobrevida e não<br />
é, necessariamente, conseqüência inevitável da aids, podendo<br />
ser detectado na ausência de perda de peso, mesmo em<br />
pessoas nos estágios iniciais da infecção pelo HIV 4 .<br />
O estresse oxidativo acompanha as infecções pelo HIV<br />
5, 6 , beneficiando tanto a ativação quanto à transcrição do<br />
mRNA do HIV e replicação do vírus 7, 8 como a apoptose das<br />
células T CD4 + 3 . Adicionalmente, o estresse oxidativo induzido<br />
pelo HIV (Tat e gp 120) aumenta a produção de<br />
citocinas, principalmente o TNF-α, que participa dos proces-<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):178-183<br />
Con el objetivo de investigar las consecuencias del VIH+ sobre el estado pro-oxidante/antioxidante y posibles asociaciones con la inmunidad<br />
celular y estado nutricional proteico-energético, fueron estudiados 32 pacientes (20 hombres y 12 mujeres), con edades entre 22 a 64<br />
años atendidos en Hospital Universitario. Los pacientes fueron pareados con 20 controles voluntarios saludables (10 hombres y 10 mujeres),<br />
con edades entre 27 a 65 años. Todos fueron sometidos a evaluación antropométrica (peso, talla, adiposidad y circunferencias) y medidas<br />
derivadas: índice de masa corporal (IMC en kg/m2 ), circunferencia muscular del brazo (CMB) y porcentaje de grasa corporal (%G).<br />
Fue realizada colecta de sangre en ayuno para cuantificar los niveles plasmáticos de albúmina (método colorimétrico), pro-oxidantes<br />
malonildialdehído (MDA) y glutatión oxidado, antioxidantes (α-tocoferol, β-caroteno, ácido ascórbico y glutatión total) y aminoácidos<br />
+<br />
homocisteína y cisteína (Hcy y Cys) por cromatografía líquida de alta eficiencia. Los pacientes tuvieron los niveles de linfocitos T CD4 + y CD cuantificados por citometría de flujo. Las diferencias entre grupos fueron analizadas estadísticamente por las pruebas t de Student<br />
8<br />
o de Mann-Whitney y se ha adoptado nivel de significación estadística p
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):178-183<br />
glutationa total e oxidada 16 , homocisteína e cisteína total 17<br />
e malonildialdeído 18 .<br />
As comparações entre grupos foram feitas pelo teste t de<br />
Student (amostras homogêneas) ou Mann-Whitney (amostras<br />
heterogêneas) <strong>19</strong> . O nível de significância adotado foi de 5%.<br />
180<br />
Resultados<br />
As características etária, antropométricas e de<br />
albuminemia dos grupos controle sadio (G1) e de pacientes<br />
HIV+ (G2) encontram-se na tabela 1. Houve semelhança<br />
entre grupos para todas as variáveis, exceto para a adiposidade<br />
corporal, mais elevada no G1.<br />
Quanto às variáveis indicativas dos estados pró-oxidante/<br />
antioxidante, os pacientes apresentaram maiores níveis de<br />
malonildialdeído (MDA), glutationa oxidada (GSSG) e βcaroteno<br />
(carot) associadamente, as concentrações plasmáticas<br />
menores de α-tocoferol (Toc), glutationa reduzida (GSH),<br />
cisteína (Cys) e relação Cys/Hcy, em comparação aos controles<br />
sadios (Tabela 1, Figura 1). Houve semelhança entre grupos<br />
para os níveis de glutationa total (GSHt), homocisteína<br />
(Hcy) e ácido ascórbico (AA) (Tabela 1, Figura 1).<br />
Tabela 1 - Caracterização quanto à idade, estado nutricional, pró-oxidante e defesa antioxidante de indivíduos controle (G1) e infectados pelo HIV<br />
(G2).<br />
Grupos Estatística (valor de p) Interpretação<br />
G1 G2<br />
Idade (anos) 35 (31-38) * 33 (29-41) 0,529 G1 = G2<br />
IMC (kg/m 2 ) 24,5 ± 3,34 22,5 ± 4,41 0,084 G1 = G2<br />
CMB (cm) 24,3 ± 3,97 23,4 ± 3,63 0,439 G1 = G2<br />
%G 28,5 ± 6,9 22,0 ± 5,97 0,001 G1 > G2<br />
Alb (g/dL) 4,3 ± 4,0 4,1 ± 3,3 0,268 G1 = G2<br />
MDA (mmol/L) 0,04 (0,04-0,555) 2,63 (1,2-8,6)
O valor mediano de linfócitos T CD4+ do grupo de<br />
pacientes foi de <strong>19</strong>2 (39-410), e a relação CD4/CD8 de 0,23.<br />
Dentre eles, 64,3% apresentavam níveis de CD4+ menores de<br />
350 cél/mm 3 , sendo 57% abaixo de 200 cél/mm 3 .<br />
Houve associação significativa entre as freqüências de<br />
pacientes infectados pelo HIV portadores de<br />
hipoalbuminemia (3,5 g/dL 5 10 15<br />
Total 1 2 1 0 2 2<br />
p= 0,005 (Teste de Fisher), CMB = circunferência muscular do braço.<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):178-183<br />
mostraram diferenciação estatística de acordo com os níveis<br />
de albuminemia (Tabela 3) nem com os da massa muscular do<br />
braço (Tabela 4). De modo análogo, não houve associação<br />
significativa da massa muscular com a peroxidação lipídica<br />
(níveis de MDA) (Tabela 5), ou com a linfopenia (Tabela 6).<br />
Discussão<br />
Gravidade da doença e estado nutricional dos pacientes<br />
HIV+<br />
+ Tendo os níveis de CD como indicadores de gravida-<br />
4<br />
de da doença, a amostra de pacientes foi classificada como<br />
grave25 , pois 64% apresentaram CD4
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):178-183<br />
Com o desenvolvimento e implementação da terapia<br />
anti-retroviral incluindo inibidores da protease e drogas antiretrovirais<br />
altamente ativas, houve aumento da sobrevida dos<br />
pacientes, desaparecimento da DPE e surgimento das<br />
síndromes de lipodistrofia com hiperlipidemia e<br />
hipercolesterolemia 2 e síndrome metabólica com obesidade<br />
abdominal e resistência à insulina 3, 22 . No presente trabalho,<br />
longe da lipodistrofia verificada em outros pacientes locais,<br />
em uso de inibidores de protease 23 , a adiposidade corporal do<br />
grupo de pacientes foi menor do que a do grupo controle. Essa<br />
diferença é de pouco significado biológico, pois ambos os<br />
grupos apresentaram valores de adiposidade normais ou até<br />
mesmo acima da normalidade 13 .<br />
Assim, os pacientes foram caracterizados pelo bom estado<br />
protéico-energético associadamente aos baixos níveis de<br />
CD4+, ilustrativos da forma grave da doença. Paralelamente,<br />
pode-se observar que os pacientes apresentaram níveis<br />
maiores de variáveis pró-oxidantes (MDA e GSSG) e menores<br />
de antioxidantes (Toc e GSH) do que os controles sadios,<br />
conforme o já referido pela literatura 6, 24, 25 .<br />
Defesa antioxidante diminuída e sua relação com a<br />
gravidade da doença e estado nutricional do paciente.<br />
O estresse oxidativo é essencial à ativação 9 e proliferação<br />
8 do HIV. Nos processos infecciosos, o estresse oxidativo<br />
pode ser decorrente da atuação de fagócitos em atividade<br />
bactericida 6, 10 . A presença de estresse oxidativo é comum nas<br />
infecções 26 e uma constante na presença do retrovírus 6 . No<br />
presente trabalho, a elevação de indicadores pró-oxidantes<br />
esteve acompanhada da redução de nutrientes antioxidantes,<br />
exceto o ácido ascórbico e o β-caroteno. Este último pode<br />
estar elevado devido às suplementações dietéticas e/ou efeito<br />
da HAART 27 .<br />
O α-tocoferol inibe a peroxidação lipídica neutralizando<br />
os radicais peroxil e leva à produção de hidroperóxidos<br />
lipídicos e radical tocoferil. Esse radical poderá ser reduzido<br />
novamente a tocoferol, tanto pelo ácido ascórbico como pela<br />
GSH. No presente caso, parece que os níveis consumidos de αtocoferol<br />
não foram suficientes para impedir a peroxidação<br />
lipídica (e formação de MDA). Assim, também, as ações restauradoras<br />
de ácido ascórbico e da GSH não foram adequadas a<br />
reconversão do tocoferil à sua forma reduzida (tocoferol). Desta<br />
forma, os níveis de α-tocoferol apresentaram-se reduzidos.<br />
O β-caroteno tem como principal função antioxidante a<br />
remoção de oxigênio singlet 28 , atuando também na diminuição<br />
da peroxidação lipídica causada pelos radicais livres em indivíduos<br />
HIV+ 6, 24 . Entretanto, apesar dos seus níveis aumentados<br />
nos pacientes deste estudo, não se observou a diminuição<br />
1.Pereira PCM. Impacto nutricional da síndrome de imunodeficiência<br />
adquirida (SIDA). relação com o estado clínico-imunitário dos indivíduos.<br />
<strong>19</strong>92. 102p. Tese (doutorado) – Faculdade de Medicina, Universidade<br />
Estadual Paulista, Botucatu.<br />
2.Kotler DP, Thea DM, Heo M, Allison DB, Engelson ES, Wang J, Pierson JR RN,<br />
Louis M, Keusch GJ. Relative influences of sex, race, environment and HIV<br />
182<br />
Referências bibliográficas<br />
dos níveis de MDA. Outra possível causa para os níveis aumentados<br />
de β-caroteno seria a diminuição da sua conversão a<br />
retinol, como já demonstrado em indivíduos saudáveis 29 .<br />
A glutationa peroxidase compartilha com a catalase a<br />
metabolização dos hidroperóxidos gerados pela dismutação<br />
do superóxido 28 .<br />
A glutationa, o principal antioxidante intracelular, apresentou<br />
seus níveis plasmáticos semelhantes ao grupo controle,<br />
apesar da menor produção de cisteína demonstrada pela<br />
redução da relação Cys/Hcy, com conseqüente redução da<br />
Cys plasmática. Entretanto, como os níveis de glutationa<br />
oxidada (GSSG) estavam significativamente aumentados, há<br />
suspeita de deficiência na atividade da glutationa redutase<br />
(conversora de GSSG a GSH), enzima dependente de vitamina<br />
B 2 30 . Assim, houve evidência de menor capacidade<br />
antioxidante hidrossolúvel (via GSH), acompanhada de<br />
níveis diminuídos do aminoácido precursor (Cys) e da atividade<br />
redutase, acumulando GSSG. As conseqüências dos<br />
baixos níveis de GSH seriam o acúmulo de hidroperóxidos<br />
(MDA) e maior consumo de α-tocoferol, com a redução dos<br />
seus níveis plasmáticos.<br />
Os pacientes do presente experimento mostraram a gravidade<br />
do HIV associada à deficiência específica de<br />
micronutrientes, sem comprometimento do estado protéicoenergético<br />
global.<br />
A associação existente entre hipoalbuminemia e deficiência<br />
de massa muscular observada nos pacientes HIV+, apesar<br />
da terapia anti-retroviral, é descrita pela literatura como<br />
indicadores da mortalidade desses pacientes 31 . Na presente<br />
casuística, as três citocinas pró-inflamatórias apresentaram-se<br />
com valores acima da normalidade 32 . Dentre elas, o TNF-α,<br />
com as maiores elevações, é o mais relacionado com o desgaste<br />
muscular da síndrome da caquexia 10 . Essa síndrome é caracterizada<br />
por anorexia, anemia, hipoalbuminemia, dificuldade<br />
de cicatrização, imunossupressão e desgaste muscular, todos<br />
presentes na Aids e tendo o TNF-α e o estresse oxidativo<br />
como determinantes, em animais de experimentação 11 . Entretanto,<br />
não houve, no presente trabalho, associação do estresse<br />
oxidativo com a hipoalbuminemia ou com o déficit de massa<br />
muscular dos pacientes. Assim, o estado pró-oxidante encontrado<br />
parece independer do estado nutricional protéicoenergético<br />
e do grau de linfopenia (CD4) e ser mais dependente<br />
da menor defesa antioxidante.<br />
Agradecimentos<br />
FAPESP proc. 98/06<strong>19</strong>6-1 e 99/01716-0 e ao<br />
nutricionista Erasmo Benício Santos de Moraes Trindade<br />
pelas avaliações nutricionais dos pacientes.<br />
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oxidativo de pacientes HIV+. Submetido, 2004.<br />
183
184<br />
ARTIGO ORIGINAL<br />
A efetividade da intervenção fonoaudiológica em neonatos de unidade de<br />
terapia intensiva<br />
The effectiveness of the speech therapy intervention at the new born intensive care unit<br />
Efectividad de la intervención del logopeda en la unidad de terapia intensiva para recién nacido<br />
Resumo<br />
Resumen<br />
Lorena Kozlowski 1 , Edilici Ribeiro dos Santos 2 , Jair Mendes Marques 3<br />
Introdução: a intervenção fonoaudiológica em recém-nascidos<br />
prematuros em unidade de terapia intensiva neonatal oferece assistência<br />
à alimentação do neonato, contribuindo para diminuir os<br />
efeitos da desnutrição. Objetivo: avaliar a efetividade da intervenção<br />
fonoaudiológica em neonatos de unidade de terapia intensiva.<br />
Método: realizou-se estimulação sensório motora-oral em neonatos<br />
com mais de 32 semanas gestacionais e que utilizavam sonda<br />
nasogástrica. Participaram da pesquisa dois grupos de neonatos,<br />
sendo onze no grupo experimental e dez no grupo controle. Duas<br />
variáveis controladas entre os grupos: variação de peso e tempo de<br />
internação. Resultados e conclusão: na amostra pesquisada,<br />
houve variação significante de peso a favor do grupo experimental<br />
(p = 0,008) porém, quanto ao tempo de internação, não houve<br />
diferença significante entre os grupos analisados. (Rev Bras Nutr<br />
Clin 2004; <strong>19</strong>(4):184-188)<br />
UNITERMOS: neonatos, prematuro, sucção.<br />
Abstract<br />
Introduction: speech therapy intervention in premature newborns<br />
in intensive care unit (ICU) offers feeding assistance to the<br />
newborn nutrition, contributing to decrease the malnutrition<br />
effects. Objective: to evaluate the effectiveness of speech therapy<br />
intervention in a neonatal intensive care unit. Method: sensorial<br />
motor-oral stimulation was carried out in newborn infants born at<br />
more than 32 weeks of gestational age and fed by nasogastric tube.<br />
The research included two groups of newborn infants: the experimental<br />
group with eleven subjects and the control group with ten.<br />
Two controlled variables were observed in the groups: weight<br />
variation and length of hospital stay. Results and conclusion: the<br />
experimental group (p = 0,008) displayed significant variation of<br />
weight but no significant difference for the length of hospital stay<br />
when compared to the control group. (Rev Bras Nutr Clin 2004;<br />
<strong>19</strong>(4):184-188)<br />
KEY WORDS: newborn, premature infant, sucking behavior.<br />
Introducción: la intervención logopedica en neonatos prematuros en unidad de terapia intensiva ofrece asistencia a la alimentación del<br />
neonato, ayudando la disminución de los efectos de la desnutrición. Objetivo: evaluar la efectividad de intervención de la terapia<br />
fonoaudiológica en neonatos en la unidad de cuidado intensivo. Método: estimulación motor-oral sensorial en neonatos nacidos con más<br />
de 32 semanas de edad gestacional y alimentados por sonda nasogástrica. La investigación incluyó dos grupos de recién nacidos: el grupo<br />
experimental con once neonatos y el grupo control con diez. Se observaron dos variables controladas en los grupos: la variación del peso<br />
y período de hospitalización. Resultados y conclusión: el grupo experimental (P = 0,008) presentó variación significante de peso pero<br />
ninguna diferencia significante para el período de hospitalización cuando comparado al grupo control. (Rev Bras Nutr Clin 2004;<br />
<strong>19</strong>(4):184-188)<br />
UNITÉRMINOS: neonato, prematuro, succión<br />
1. Pós doutora na Universidade de Montreal, Canadá; Professora do Mestrado em Distúrbios da Comunicação da Universidade Tuiuti do Paraná; 2. Graduada em<br />
Fonoaudiologia, Universidade Tuiuti do Paraná; 3. Matemático e Engenheiro, Doutor em Ciências Geodésicas, Professor do Mestrado em Distúrbios da Comunicação<br />
da Universidade Tuiuti do Paraná<br />
Instituição: Universidade Tuiuti do Paraná – Mestrado em Distúrbios da Comunicação<br />
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Submissão: 18 de agosto de 2004<br />
Aceito para publicação: 8 de dezembro de 2004
Introdução<br />
A fonoaudiologia é uma área relativamente nova e que<br />
vem despertando juntamente com outras áreas da saúde, o interesse<br />
pela pesquisa do funcionamento de recém-nascidos<br />
normais e de risco, buscando detectar, minimizar e até mesmo<br />
prevenir alterações de desenvolvimento destes neonatos.<br />
Antes de se iniciar o trabalho com crianças de risco é importante<br />
conhecer os aspectos do desenvolvimento normal,<br />
permitindo assim que o profissional perceba a complexidade<br />
da atuação hospitalar e possa dirigir seus objetivos 1 .<br />
A equipe multidisciplinar (pediatras, fonoaudiólogos,<br />
enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, entre outros) tem<br />
como objetivo conferir ao neonato, além da sobrevida uma<br />
melhoria da qualidade de vida 2,3 .<br />
A intervenção fonoaudiológica na UTI neonatal é recente,<br />
sendo que o fonoaudiólogo pode atuar neste setor com<br />
diferentes abordagens, incluindo a assistência à alimentação<br />
e triagem auditiva neonatal 4,5 . A assistência à alimentação<br />
ocorrerá quando o recém-nascido nasce prematuramente ou<br />
apresenta alguma alteração no processo de alimentação,<br />
como por exemplo ausência de reflexos orais, a sucção é fraca<br />
ou inexistente, vedamento labial inadequado, entre outros<br />
6,7,8 .<br />
Segundo Basseto & Ramos 7 , os recém-nascidos pré-termo<br />
apresentam ausência de alguns reflexos, dentre eles o reflexo<br />
de procura, sucção e alerta que geralmente os recém-nascidos<br />
a termo apresentam logo que se inicia a estimulação. Mesmo<br />
sendo estimulados na hora em que sempre recebem o leite, os<br />
neonatos pré-termo geralmente apresentam ausência de reflexo<br />
até que atinjam a maturidade suficiente.<br />
Os neonatos pré-termo apresentam, geralmente, maior<br />
dificuldade de ganho de peso, o que aumenta o período de<br />
internação hospitalar e os riscos de desnutrição.<br />
Diferentes estudos na área da nutrição têm demonstrado<br />
que a intervenção fonoaudiológica oferece benefícios para<br />
os recém-nascidos (RN) de risco 9 .<br />
Esta pesquisa teve como objetivo verificar a efetividade<br />
da intervenção fonoaudiológica voltada para a assistência à<br />
alimentação (ganho de peso e alta hospitalar precoce), propiciando<br />
melhor qualidade de vida ao neonato de risco.<br />
Material e método<br />
Fizeram parte desta pesquisa 21 neonatos que foram divididos,<br />
aleatoriamente, em dois grupos de estudos:<br />
1. o grupo controle (GC), que não recebeu estimulação<br />
oral.<br />
2. o grupo experimental (GE), que grupo recebeu a<br />
estimulação fonoaudiológica.<br />
A idade para que se iniciasse a estimulação não precedeu<br />
32 semanas de idade gestacional, já esta é a idade mínima para<br />
que haja a maturação necessária para a sucção efetiva e coordenação<br />
da sucção/deglutição/respiração. As condições clínicas<br />
gerais do RN também foram consideradas para que o<br />
mesmo pudesse fazer parte do estudo.<br />
O trabalho de estimulação fonoaudiológica foi realiza-<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):184-188<br />
da diariamente (de segunda a sexta-feira), duas vezes ao dia<br />
no mínimo (manhã e tarde), com duração de dez minutos em<br />
cada RN, até a alta hospitalar. Os RNs que fizeram parte do GE<br />
receberam, em média, oito dias de estimulação (total médio<br />
de 16–22 estimulações).<br />
Foi utilizado um protocolo de acompanhamento, relatando<br />
todas as intercorrências do dia, as estimulações realizadas<br />
(intra e extra-orais), volume aceito x volume prescrito de<br />
leite materno, ritmo da sucção não-nutritiva, sucção nutritiva<br />
x coordenação da sucção, respiração e deglutição, aspectos<br />
gerais sobre alimentação e tônus global e oral.<br />
A estimulação fonoaudiológica consistiu nos seguintes<br />
procedimentos:<br />
1. sucção nutritiva: realizada através de mamadeira, gaze ou<br />
cotonete (embebida em água destilada ou soro glicosado<br />
a 5%), que possibilita o desenvolvimento da coordenação<br />
da sucção/deglutição/respiração, favorecendo a prevenção<br />
de engasgos, asfixia e aspiração. Este tipo de<br />
estimulação ocorria quando o RN estava sendo alimentado<br />
via sonda nasogástrica (SNG), possibilitando desta<br />
forma com que o recém-nascido fizesse a relação entre o<br />
ato de sugar e o saciamento, podendo acelerar a<br />
maturação do reflexo de sucção e também a passagem<br />
mais rápida à alimentação via oral.<br />
2. sucção não nutritiva: realizada com o dedo da terapeuta<br />
envolto por uma luva, sendo que consistiu em fazer<br />
estimulações na região intra-oral, com movimentos na<br />
língua, do centro para a região anterior, pressionando-a<br />
levemente para baixo.<br />
3. estimulação tátil: realizada com diferentes materiais na<br />
bochecha, língua, lábios, gengivas, mucosa da boca e<br />
região sub-hioídea.<br />
4. estimulação extra-oral: se deu através das mãos da<br />
terapeuta, realizando massagens na musculatura perioral<br />
em movimentos circulares, na região orbicular, nas bochechas<br />
e movimentos começando das orelhas em direção à<br />
boca.<br />
5. estimulação intra-oral: realizada com o dedo da terapeuta<br />
envolto por uma luva, na região interna da boca.<br />
Durante a estimulação e alimentação, o RN permanecia<br />
com a cabeça semi-inclinada e apoiada, evitando que ficasse<br />
caída para trás. Esta posição favorece a força da gravidade<br />
que traz a língua para frente. Os membros permaneciam<br />
fletidos na linha média e estabelecia-se também o contato<br />
visual entre o RN e a pessoa que o estava manipulando. Além<br />
do posicionamento adequado, eram respeitadas as horas de<br />
sono, realizando-se o mínimo de manuseio.<br />
Sendo o tempo de estimulação um fator importante a ser<br />
considerado, a estimulação não era realizada por tempo prolongado<br />
para que não comprometesse o estado geral do<br />
neonato (em média 10 minutos), evitando assim o estresse do<br />
RN. O neonato deveria apresentar estado clínico geral bom<br />
para que a intervenção ocorresse.<br />
Desde o primeiro contato com o RN, a terapeuta compartilhava<br />
sempre informações junto à equipe multidisciplinar<br />
da UTI neonatal, incluindo também os familiares do RN,<br />
possibilitando assim um trabalho mais eficiente.<br />
185
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):184-188<br />
A mãe tinha acesso à UTI nos horários de alimentação,<br />
o que permitia receber orientações quanto à estimulação,<br />
postura e a alimentação do seu recém-nascido.<br />
Acompanhou-se a variação de peso de cada RN durante<br />
o programa de estimulação, verificando-se sua efetividade.<br />
Esta variável foi controlada diariamente, comparando-se a<br />
média do GE e a média do GC.<br />
A segunda variável controlada foi a data da alta hospitalar,<br />
verificando-se a necessidade de maior ou menor período<br />
de internamento para ambos os grupos.<br />
As hipóteses eram de que o grupo experimental (GE)<br />
apresentasse um ganho de peso mais precoce que o grupo<br />
controle (GC) , diminuindo o tempo de internação hospitalar.<br />
A alta hospitalar precoce acarretaria uma melhora na<br />
qualidade de vida desses RNs e de suas famílias.<br />
Utilizou-se o teste t de Student, ao nível de significância<br />
de 5%, para a comparação das médias dos dois grupos independentes<br />
(GC e GE).<br />
186<br />
Resultados<br />
Na tabela 1, observa-se a variação de peso individual dos<br />
10 recém-nascidos do GC e dos 11 do GE. No GC houve 5<br />
RNs com perda de peso e 5 RNs que obtiveram entre 0 e 175<br />
gramas de aumento de peso. No GE, observa-se que nenhum<br />
recém-nascido apresentou perda de peso (11 recém-nascidos<br />
variando de 50 a 185 gramas de ganho de peso). Houve portanto<br />
uma coerência de ganho de peso entre os 11 recémnascidos.<br />
Tabela 1 - Variação de peso (em g) dos grupos controle (GC) e<br />
experimental (GE)<br />
Recém-nascidos GC GE<br />
1 0 150<br />
2 -175 95<br />
3 45 130<br />
4 50 105<br />
5 -35 130<br />
6 -70 50<br />
7 -240 185<br />
8 175 <strong>19</strong>0<br />
9 65 55<br />
10 110 130<br />
11 - 50<br />
Os resultados obtidos em relação à variação de peso entre<br />
o GC e o GE mostram que a variação de peso do GE em<br />
relação ao GC é significante (p=0,008) demonstrando, portanto,<br />
a efetividade da estimulação fonoaudiológica.<br />
A Figura 1 compara o grupo controle e o grupo experimental<br />
em relação à variação média de peso, onde observase<br />
que o grupo controle teve em média uma perda de peso de<br />
14 gramas e o grupo experimental teve ganho de peso de 106<br />
gramas.<br />
Na Figura 2 são apresentados os resultados do GC com<br />
relação ao tempo de internamento, sendo que observou-se<br />
variação de 3 a 12 dias de internação dos RNs.<br />
A Figura 3 mostra o tempo de internação dos RNs do GE,<br />
o qual apresentou variação de internação de 4 a 11 dias.<br />
Figura 1 - Comparação da variação média de peso<br />
Figura 2 - Grupo Controle – Tempo de Internação<br />
Figura 3 - Grupo Experimental – Tempo de Internação.<br />
A análise estatística dos resultados obtidos mostrou que,<br />
em relação ao tempo de internação entre o GC e o GE, não<br />
houve diferença estatisticamernte significativa (p= 0,4734)<br />
A Figura 4 mostra gráfico comparativo o grupo controle<br />
e o grupo experimental em relação ao tempo médio de<br />
internação, no qual nota-se que o grupo controle ficou, em<br />
média, sete dias internados e o grupo experimental ficou, em<br />
média, oito dias internados.<br />
Discussão<br />
Este trabalho teve como objetivo analisar a efetividade<br />
da intervenção fonoaudiológica voltada a assistência à alimentação<br />
de RN de risco de UTI neonatal.
Figura 4 - Comparação do tempo médio de internação.<br />
Os recém-nascidos que foram submetidos ao protocolo<br />
experimental apresentavam no mínimo 32 semanas de idade<br />
gestacional e peso superior a 1500 gramas, além de estado clínico<br />
geral bom, sendo estes fatores fundamentais para se iniciar<br />
a estimulação.<br />
No decorrer das intervenções, observou-se que os RNs<br />
apresentaram boa aceitação das estimulações. No que diz respeito<br />
à sucção, todos os RNs estimulados apresentavam melhora<br />
significante a cada estimulação (maior força de sucção<br />
e ritmo). Notou-se que, durante as estimulações, os neonatos<br />
que apresentavam tônus e postura oral hipotônicas passavam,<br />
após as estimulações, a ter musculatura e postura mais adequadas.<br />
Outros estudos 10,11 também demonstraram que a<br />
estimulação sensório motor oral normaliza reflexos orais<br />
diminuindo os sinais de sucção inadequada e aumentando o<br />
volume de leite ingerido.<br />
Em relação à variação de peso entre os grupos, observouse<br />
que o GC teve, em média, perda de peso de 14 gramas e os<br />
RNs submetidos ao protocolo experimental tiveram, em<br />
média, 106 gramas de aumento de peso. Desta forma, podese<br />
destacar que a estimulação fonoaudiológia é fundamental<br />
na aquisição e manutenção do peso. Verificou-se, portanto,<br />
nesta pesquisa, que existe diferença significante em relação<br />
a variação de peso nos grupos analisados, demostrando a<br />
efetividade da intervenção fonoaudiológica. Caetano et al. 12<br />
demonstraram que programas de estimulação resultam em alta<br />
precoce e aumento de peso em neonatos.<br />
Com relação ao tempo de internação, observa-se que não<br />
há diferença significante quanto aos resultados entre o GC e<br />
o GE, destacando-se que foi considerado para ambos os grupos<br />
tempo de internação de até 12 dias.<br />
Uma pesquisa semelhante ao estudo foi realizada por<br />
Bernbaum et al. 13 , que estudaram o efeito da sucção não nutritiva<br />
em 30 neonatos com peso de nascimento inferior a<br />
1.Xavier C. Assistência à alimentação de bebês hospitalizados. In: Bassetto<br />
MCA., Brock R, Wajnsztenj R, eds. Neonatologia – Um convite à atuação<br />
fonoaudiológica. São Paulo: Ed. Lovise, <strong>19</strong>98; 255-75.<br />
2.Friche AL. A Importância da intervenção fonoaudiológica em neonatos<br />
de alto risco. Rev. Fonoaud. Belo Horizonte <strong>19</strong>95, 2: 17-25.<br />
3.Santos WA. O terapeuta ocupacional e o trabalho junto a neonatos<br />
Referências bibliográficas<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):184-188<br />
1.500g. Concluíram que a sonda nasogástrica e a estimulação<br />
da sucção aceleram a maturação do reflexo de sucção, facilitam<br />
a transição de alimentação por gavagem para via oral,<br />
levam a um maior ganho de peso e diminuem o tempo de<br />
estadia hospitalar.<br />
Resultados divergentes aparecem na literatura 12,13,14<br />
quanto a alta hospitalar de neonatos submetidos ou não a<br />
estimulação oral sendo necessários estudos mais detalhados<br />
quanto a este aspecto.<br />
Os resultados desta pesquisa demonstram que a intervenção<br />
fonoaudiológica é efetiva em relação à variação de peso,<br />
mas não se pôde observar influência quanto à diminuição do<br />
tempo de internação hospitalar. Acredita-se que este último<br />
dado não tenha apresentado diferença significante devido a<br />
outros fatores que podem interferir e que não foram analisados<br />
nesta pesquisa.<br />
Vale aqui mencionar que publicações nesta área são<br />
bastante restritas sendo absolutamente necessário novos estudos<br />
para realizar estudos comparativos.<br />
Com a realização deste tipo de trabalho dentro da UTI<br />
neonatal, existe a possibilidade de conscientizar os profissionais<br />
atuantes no hospital da importância do encaminhamento<br />
dos recém-nascidos de risco para o fonoaudiólogo e, desta<br />
forma, difundir a intervenção fonoaudiológica em recémnascidos<br />
prematuros, proporcionando uma melhor qualidade<br />
de vida a estes neonatos e suas famílias. Os riscos de desnutrição<br />
do neonato podem ser minimizados com a estimulação<br />
fonoaudiológica garantindo o ganho de peso.<br />
Visando que a saúde não é só ausência de doenças, mas<br />
também o bem estar, justifica-se assim a detecção e prevenção<br />
de desordens e a estimulação precoce. A fonoaudiologia atuante<br />
dentro da UTI neonatal busca proporcionar ao neonato<br />
melhor qualidade de vida. Além disso, a intervenção<br />
fonoaudiológica esta ligada diretamente a nutrição que tem<br />
papel vital e relevante na vida destas crianças.<br />
Conclusão<br />
Nas condições do presente trabalho pode-se concluir que<br />
os neonatos que receberam estimulação fonoaudiológica<br />
apresentaram melhora quanto a sucção, tônus e postura oral,<br />
aquisição e manutenção de peso, diminuindo assim os riscos<br />
da desnutrição e desta forma proporcionando uma melhora<br />
na qualidade de vida.<br />
Não foi encontrada diferença estatisticamente<br />
significante quanto ao período de internação para os dois<br />
grupos estudados, sendo necessários novos estudos que possam<br />
analisar fatores que interferem neste processo.<br />
de alto risco. In: Bassetto MCA., Brock R, Wajnsztenj R, eds. Neonatologia<br />
– Um convite à atuação fonoaudiológica. São Paulo, Ed. Lovise <strong>19</strong>98:<br />
347-51.<br />
4.Simonek C, Esmeraldo M. Ampliação para os critérios de risco para<br />
perdas auditivas em neonatos. Lug. Fonoaud. <strong>19</strong>92, 7: 20-2.<br />
5.Hernandez AM. Atuação fonoaudiológica em neonatologia: Uma<br />
187
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):184-188<br />
proposta de intervenção. In: Andrade CRF, eds. Fonoaudiologia em berçário<br />
normal e de risco. São Paulo: Lovise, <strong>19</strong>96: 43-98.<br />
6.Tirado Ar, Denzin P. Sucção não nutritiva e alimentação do recémnascido<br />
pré-termo. In: Bassetto MCA., Brock R, Wajnsztenj R, eds.<br />
Neonatologia – Um convite à atuação fonoaudiológica. São Paulo, Ed.<br />
Lovise <strong>19</strong>98: 285-88.<br />
7.Bassetto MCA, Ramos CC. Estruturação de um serviço de<br />
fonoaudiologia em berçário. In: Andrade CRF, eds. Fonoaudiologia em<br />
Berçário Normal e de Risco. São Paulo: Lovise, <strong>19</strong>96: 269-80.<br />
8.Buhler KEB, Limongi SCO. Fatores associados à transição da alimentação<br />
via oral em recém-nascidos pré-termo. Pró-fono 2004, 16 (3): 301-10.<br />
9.Almeida ST, Delgado SE, Késke MC. A eficiência da intervenção<br />
fonoaudiológica em UTI neonatal na assistência à alimentação. Prófono<br />
<strong>19</strong>98, 10 (1): 30-3.<br />
188<br />
10.Rendon-Macias ME, Cruz-Perez LA, Mosco-Peralta MR, Saraiba-Russe<br />
MM, Levi-Tajfeld S, Morales-Lopez MG. Assessment of sensorial oral<br />
stimulation in infants with suck feeding disabilities. Indian J Pediatr. <strong>19</strong>99,<br />
66 (3):3<strong>19</strong>-29.<br />
11.Einarssson-Backes LM, Deitz J, Price R, Glass R, Hays R. The effect of<br />
oral support on sucking efficiency in preterm infant. Am J Occup Ther.<br />
<strong>19</strong>94, 48 (6):490-8.<br />
12.Caetano LC, Fujinaga CI, Scochi CG. Non-nutritious sucking in preterm<br />
babies: bibliographic study. Rev Lat Am Enfermagem 2003, 11(2): 232-6.<br />
13.Bernbaum JC. Nonnutritive sucking during gavage feeding enhances<br />
growth and maturation in premature infants. Pediatrics <strong>19</strong>83, 71 (1):41-<br />
5.<br />
14.Fucile S, Gisel E, Lau C. Oral stimulation accelerates the transmition<br />
from tube to oral feeding in preterm infants. J Pediatr 2002, 141 (5):743.
ARTIGO ORIGINAL<br />
Microscopia eletrônica como técnica para avaliação de misturas 3 em 1 na<br />
nutrição parenteral<br />
Electronic microscopy as technique to assess of all-in-one mixtures in parenteral nutrition<br />
Técnica para el microscopia electrónica en la evaluación de las mezclas tres en uno para nutrición parenteral<br />
Resumo<br />
Mistura 3 em 1 é um termo utilizado para descrever a combinação<br />
de carboidrato, proteína e lipídio em um frasco para administração<br />
intravenosa. O objetivo do presente trabalho foi o de estabelecer<br />
uma técnica adequada para visualização na microscopia eletrônica<br />
das misturas 3 em 1. A uranila a 2% com gota adicional foi a<br />
técnica mais adequada, quando comparada com o ácido<br />
fosfotungístico e com uranila 2% sem gota adicional. Além da<br />
escolha do contrastante, foram observadas 3 soluções de nutrição<br />
parenteral em períodos de tempo de pós preparo de 24 e 48 horas<br />
utilizando uma emulsão de lipídios a 20% para comparação. As<br />
imagens foram comparadas quanto ao padrão de tamanho das<br />
formações lipídicas, à tendência à homogeneidade e à dispersão das<br />
formas lipídicas. Os períodos de tempo pós preparo de 24 e 48 horas<br />
parecem contribuir na desestabilização da solução, com imagens que<br />
sugerem a formação de grumos e tendência a heterogeneidade. (Rev<br />
Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5)<br />
UNITERMOS: microscopia eletrônica, nutrição parenteral, misturas<br />
3 em 1.<br />
Resumen<br />
Carla Barcelos Souto 1 , Denise Bueno 2<br />
Abstract<br />
All-in-one formulation is one several terms used to describe the<br />
combination of carbohydrate, protein, and fat into one container<br />
for intravenous administration. The objective of the present study<br />
was to assess a technique to electronic microscopy of all-in-one. The<br />
uranyl 2% with additional gout was the technique more adequate<br />
when compared to uranyl 2% without additional gout and with<br />
acid phosphotungstate. In addition, the study observed three<br />
solutions of parenteral nutrition in periods of time after 24 and 48hour<br />
preparation, using 20% lipid emulsion for comparison.The<br />
images were compared for standard size of lipid. formations, and<br />
tendency to homogeneity and dispersion of lipid forms. It was<br />
concluded that the 24 and 48-hour post-preparation period of time<br />
seems to contribute for the solution destabilization, with the images<br />
suggesting clot formation and tendency to heterogeneity. (Rev Bras<br />
Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5)<br />
KEY WORDS: electronic microscopy, parenteral nutrition, all-in-one<br />
mixtures<br />
Las mezclas tres en uno son preparaciones extemporáneas; estériles con glucosa, aminoácidos y lípidos en envase único para administración<br />
intravenosa. El objetivo de esto estudio fue establecer técnica adecuada para lectura de las mezclas tres en uno en lo microscopio electrónico.<br />
La uranila 2% con gota adicional fue la técnica más adecuada cuando se la compara con la técnica con ácido fosfotungistico y con la<br />
técnica sin gota adicional. Además, el estudio observó tres soluciones de nutrición parenteral en los períodos de tiempo de 24 y 48 horas<br />
luego la preparación, usando emulsión de lípidos a el 20% para la comparación. Las imágenes se compararon cuanto al estándar de tamaño<br />
de formaciones de lípidos, tendencia a la homogeneidad y dispersión de las formas lipídicas. Se concluyó que los periodos de tiempo de 24y<br />
48 horas luego la preparación parecen contribuir para la desestabilización de la solución, con imágenes que sugieren la formación de grumos.<br />
(Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5)<br />
UNITÉRMINOS: microscopia electrónica, nutrición parenteral, tres en uno<br />
1. Farmacêutica , formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS Email: carlasouto@pop.com.br<br />
2. Doutora em ciências Biológicas - Bioquímica, Professora Adjunta do Departamento de Produção e Controle de Medicamentos da Faculdade de Farmácia da Universidade<br />
Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS<br />
Endereço para correspondência: Dra. Denise Bueno - Av Ipiranga 2752 sala 602 - Porto Alegre - CEP 90610-000 - RS. Tel: 51- 33165305/ 5<strong>19</strong>9685262 - Email:<br />
bdenise@farmacia.ufrgs.br<br />
Submissão: 23 de julho de 2004<br />
Aceito para publicação: 8 de dezembro de 2004<br />
189
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
<strong>19</strong>0<br />
Introdução<br />
A nutrição parenteral consiste na administração total ou<br />
parcial, por via intravenosa, dos nutrientes necessários à sobrevivência<br />
do paciente, em regime hospitalar, ambulatorial<br />
ou domiciliar, quando inviabilizada total e/ou parcialmente<br />
a via oral e/ou enteral 1 . Além disso, é uma terapia<br />
farmacológica que fornece nutrientes, eletrólitos, traços de<br />
minerais e vitaminas diretamente na corrente sangüínea 2 .<br />
Vários avanços surgiram desde o início da elaboração da<br />
nutrição parenteral até os dias atuais, como o uso de glicose<br />
50%, as soluções de aminoácidos com tipos diferentes de<br />
formulações para satisfazer às diversas exigências patológicas,<br />
as emulsões de gordura e a inclusão de micronutrientes, como<br />
as vitaminas, os eletrólitos e os oligoelementos 3 .<br />
Na prática clínica, há dois tipos de nutrição parenteral<br />
em uso. A nutrição glicídica, que possui em sua fórmula, os<br />
macronutrientes aminoácidos e glicose e a solução conhecida<br />
como mistura 3 em 1, que em sua formulação tem como<br />
macronutrientes os aminoácidos, glicose e lipídios 4 .<br />
Solassol & Joyeux, em <strong>19</strong>72, utilizaram a mistura 3 em 1<br />
pela primeira vez na França, sendo difundida, então, para<br />
alguns centros da Europa e Canadá. Somente em <strong>19</strong>82, a Food<br />
and Drug Administration aprovou para uso clínico a solução.<br />
No Brasil as misturas 3 em 1 começaram a ser utilizadas a partir<br />
de <strong>19</strong>85 5 .<br />
A mistura 3 em 1 é a associação de aminoácidos, glicose<br />
e lipídios na quantidade adequada para administração diária.<br />
O uso desse sistema tem se estabelecido principalmente quando<br />
o uso de glicose hipertônica não é desejado, como nos<br />
casos de intolerância a glicose, anormalidades das provas das<br />
funções hepáticas, deficiência de ácidos graxos e coma<br />
hiperosmolar não cetótico.<br />
O principal problema das misturas 3 em 1 é a manutenção<br />
da estabilidade da emulsão de lipídios, que é uma<br />
emulsão óleo em água, cujas partículas estão dispersas em<br />
meio aquoso. A sua desestabilização ocorre, inicialmente,<br />
com agregação e aumento das partículas de gordura 3 .<br />
As emulsões lipídicas para administração intravenosa são<br />
sistemas heterogêneos estabilizados. A fase interna oleosa<br />
forma glóbulos de tamanho de partículas que oscilam entre<br />
0,25-0,41mm, dispersos na fase aquosa. O excesso de energia<br />
presente na superfície dos glóbulos lipídicos caracteriza um<br />
sistema termodinamicamente instável, os glóbulos tendem a<br />
se agrupar com tempo e com situações relacionadas à mudança<br />
de pH, temperatura e outras situações extremas, podendo<br />
ocasionar uma separação de fases 6 . A estabilidade das<br />
emulsões lipídicas depende do agente emulsificante que<br />
normalmente é a lecitina da gema do ovo que tem como<br />
função minimizar a tendência de agrupamento 3 .<br />
Alterações nas características físicas das emulsões<br />
lipídicas iniciam com a agregação e aumento das gotículas de<br />
gordura, com agregados maiores migrando à superfície, caracterizando<br />
a cremalização 7 . A continuidade desse ocasiona a<br />
coalescência que é irreversível e, se continuar evoluindo,<br />
leva à separação de fases do sistema, com óleo sobrenadando<br />
a camada aquosa 3 . Na fase de coalescência, pequenas<br />
gotículas de lipídios se unem formando grandes gotas que<br />
podem ter o tamanho variando de 5 a 50mm e que não são<br />
detectáveis visualmente. O risco mais crítico de incompatibilidades<br />
nas misturas para nutrição parenteral surge quando<br />
se formam os macroprecipitados de mais de 5mm na mistura<br />
e passam para a circulação sangüínea do paciente, sendo associadas<br />
a embolismo pulmonar 8 . As gotículas submicrônicas<br />
de lipídio devem manter-se dispersas na mistura 3 em 1 durante<br />
todo o período de infusão, para assegurar a estabilidade 9 .<br />
A grandeza numérica atribuída à microscopia eletrônica<br />
a torna um método a ser utilizado para o estudo de estabilidade<br />
de misturas 3 em 1, pois a alta resolução e as imagens obtidas<br />
mostram uma riqueza de detalhes importante para a garantia<br />
de qualidade de tais soluções 10 .<br />
A mistura 3 em 1 quando formulada deve levar em consideração<br />
a sua estabilidade para assegurar a combinação dos<br />
aditivos antes do uso. O maior conteúdo de cátions divalentes<br />
pode reduzir o potencial zeta das partículas (carga superficial<br />
negativa) produzindo assim a coalescência. Além disso,<br />
devemos observar as quantidades de cálcio e fosfato, pois<br />
podem aumentar em algumas situações clínicas, elevando o<br />
risco de precipitado, o qual pode ser mascarado, já que as<br />
misturas contendo lipídios não são translúcidas 9 .<br />
O objetivo do presente trabalho foi estabelecer uma técnica<br />
adequada para visualização na microscopia eletrônica de<br />
misturas 3 em 1. Foram escolhidos três soluções de nutrição<br />
parenteral, utilizadas na prática clínica, em períodos de tempo<br />
de vinte e quatro e quarenta e oito horas pós preparo para<br />
visualização na microscopia eletrônica.<br />
Métodos<br />
Na realização do estudo foram preparadas nove telas,<br />
para serem lidas no microscópio eletrônico; as telas eram de<br />
cobre, cobertas com formvar e foram lidas no microscópio<br />
eletrônico de transmissão JEOL - JEM 1200ExII no Centro de<br />
Microscopia Eletrônica da Universidade Federal do Rio<br />
Grande do Sul. Depois de preparadas, para não danificar o<br />
microscópio eletrônico, antes de serem lidas, as telas ficaram<br />
em temperatura ambiente (25ºC) por vinte e quatro horas<br />
para evaporação do contrastante.<br />
Para montagem da técnica de observação de lipídios na<br />
mistura 3 em 1 foram utilizadas três amostras de nutrição<br />
parenteral, que foram preparadas em uma câmara de fluxo<br />
laminar e um controle de emulsão lipídica 20% .<br />
A composição de cada solução levou em consideração<br />
as prescrições de neonatologia utilizadas na cidade onde se<br />
realizou o estudo, transformando a escala numérica de litro<br />
para mililitro conforme quadro (Figura1).<br />
Componentes Controle Padrão 1 Padrão 2 Padrão 3<br />
Emulsão Lipídica 20% 2ml 2ml 2ml 4ml<br />
Aminoácidos 2ml 4ml 7ml<br />
Pediátricos 10%<br />
Glicose 2ml (10%) 13ml (18%) 8ml (50%)<br />
NaCl 3,4mEq/ml 0,18ml 0,18ml<br />
KCl 1,3mEq/ml 0,18ml 0,18ml<br />
MgSO 4 4 mEq/ml 0,04ml 0,04ml<br />
K 2 HPO 4 2mEq/ml 0,18ml 0,18ml<br />
Figura 1 - Quadro da composição das soluções utilizadas.
O detalhamento dos componentes das soluções utilizadas<br />
apresenta-se nas Figuras 2 e 3.<br />
Para comparação das imagens, foi utilizado o padrão de<br />
tamanho das formações lipídicas e a tendência à homogenei-<br />
Solução de aminoácidos pediátricos<br />
Concentração 10%<br />
Nitrogênio (g/l) 14,43<br />
Aminoáciods (g/l)<br />
L-Isoleucina 6,4<br />
L-Leucina 10,75<br />
L-Lisina acetato 7,09<br />
L-Metionina 4,62<br />
L-Fenilalanina 4,57<br />
L-Treonina 5,15<br />
L-Triptofano 1,83<br />
L-Valina 7,09<br />
L-Histidina 4,14<br />
L-Alanina 7,16<br />
L-Arginina 6,4<br />
L-Cisteína HCl 0,38<br />
Glicina 4,14<br />
L-Prolina 16,<strong>19</strong><br />
L-Serina 9,03<br />
Ácido L-Glutâmico -<br />
Ácido L-Aspártico -<br />
L-Asparagina -<br />
N-Acetil L-Tirosina 5,49<br />
L-Ornitina.HCl -<br />
Taurina -<br />
Figura 2 - Quadro da composição da solução de aminoácidos 10%<br />
pediátricos<br />
Composição da emulsão lipídica<br />
Concentração 20%<br />
Óleo de soja(g/100 ml) 10,0<br />
Triglicerídio de Cadeia Média (g/100 ml) 10,0<br />
Fosfatídeo de ovo (g/100 ml) 1,2<br />
Glicerol (g/100 ml) 2,5<br />
Quilocalorias/100 ml <strong>19</strong>0,8<br />
Osmolaridade(mOsm/l) 380<br />
Figura 3 - Quadro da composição da emulsão lipídica 20%<br />
Figura 4 - Imagens geradas a partir da solução controle, técnica da uranila c/ gota adicional<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
dade e dispersão das formas lipídicas, sendo que a formação<br />
de aglomerados identifica tendência a coalescência. O<br />
National Advisory Group on Standards and Pratice<br />
Guidelines for Parenteral Nutrition (<strong>19</strong>98) adverte que, na<br />
fase de coalescência, pequenas gotas de lipídios se unem formando<br />
grumos que podem ter tamanhos variados.<br />
A tela nº1 (tela controle) foi confeccionada utilizandose<br />
duas gotas da emulsão de lipídios a 20%, diluídas em dez<br />
gotas de solução salina 0,85% e acrescida de seis gotas de<br />
solução aquosa de uranila 2%. Uma gota dessa solução foi<br />
aplicada na tela nº1 e o excesso de solução foi seco com<br />
papel filtro. Aplicou-se então uma gota adicional de solução<br />
aquosa de uranila 2% sobre a tela e foi deixada por um minuto,<br />
protegida da luz; logo após, secou-se o excesso da uranila<br />
com papel filtro. Para registro dos resultados, foi gerada a<br />
Figura 4.<br />
A segunda tela foi preparada usando-se a solução padrão<br />
1, imediatamente, após o preparo desta solução. Para a montagem<br />
da tela nº2, foi preparada uma solução contendo 2<br />
gotas da solução de nutrição parenteral, seguindo a mesma<br />
técnica anterior. Para o registro desta tela, foram geradas imagens,<br />
no tempo de vinte e quatro horas (Figura 5) e imagem<br />
no tempo quarenta e oito horas (Figura 6) após o preparo da<br />
tela.<br />
A tela n°3 foi preparada utilizando-se duas gotas da solução<br />
de nutrição parenteral padrão 1, que estava sob refrigeração<br />
(8°C) por vinte e quatro horas, utilizando a técnica de<br />
uranila 2%, mas sem gota adicional da mesma. O registro da<br />
tela foi feito através de imagem (Figura 7).<br />
A tela nº4 foi montada adicionando-se duas gotas de<br />
solução de nutrição parenteral padrão 1, que estava sob refrigeração<br />
(8ºC) por vinte e quatro horas, em dez gotas de solução<br />
salina 0,85%. Desta solução, foi retirada uma gota que foi<br />
aplicada na tela; o excesso de solução foi retirado com papel<br />
filtro. Logo em seguida, foi colocada sobre a tela uma gota de<br />
solução de ácido fosfotungístico (PTA) a 2%, foi deixada por<br />
um minuto, protegida da luz e o excesso de PTA foi novamente<br />
retirado. Para registro da tela foi realizada imagem(Figura<br />
8).<br />
<strong>19</strong>1
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
Figura 5 - Imagens geradas a partir da solução 1, tempo de pós preparo 24 h técnica da uranila c/ gota adicional<br />
Figura 6 - Imagem gerada a partir da solução 1, tempo de pós preparo<br />
48 h, técnica da uranila c/ gota adicional.<br />
Figura 7 - Imagem gerada a partir da solução 1, tempo de pós preparo<br />
de 24 h, técnica da uralina sem gota adicional.<br />
<strong>19</strong>2<br />
Figura 8 - Imagem gerada a partir da solução 1, tempo de pós preparo<br />
de 24 h, técnica do PTA diluído.<br />
A tela nº5 foi montada usando-se a solução padrão 1,<br />
logo após o preparo. Duas gotas da solução padrão 1 foram<br />
colocadas sobre a tela nº5, o excesso de solução foi seco com<br />
papel filtro e logo após foi adicionado, sobre a tela, uma gota<br />
de PTA, deixando-se agir por um minuto, protegido da luz, e<br />
o excesso de PTA foi retirado com papel filtro. Devido ao<br />
contraste excessivo, houve formação de uma massa preta e<br />
não foi possível a realização de registros, não havendo imagem.<br />
A tela nº6 foi confeccionada utilizando-se duas gotas da<br />
solução de amostra de padrão 2, empregando a técnica da<br />
uranila 2% com gota adicional de uranila. Para fins de registro<br />
da tela, foram obtidas as imagens ( Figura 9).<br />
A tela de nº7 foi preparada a partir de duas gotas da solução<br />
de nutrição parenteral padrão 3, utilizando a técnica da<br />
uranila 2% com gota adicional. Para fins de registro, foi realizada<br />
imagem (Figura 10).<br />
A tela nº8 foi preparada utilizando-se duas gotas da solução<br />
de nutrição parenteral padrão 2 que havia sido mantida
sob refrigeração (8°C) por vinte e quatro horas, utilizando a<br />
técnica da uranila 2% com gota adicional . Para fins de registro,<br />
foi realizada imagem (Figura 11).<br />
A tela nº9 foi preparada utilizando-se duas gotas da so-<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
lução de nutrição parenteral padrão 3 que havia ficado sob<br />
refrigeração (8°C) por vinte e quatro horas, utilizando a técnica<br />
da uranila 2% com gota adicional. O registro da tela foi<br />
realizado através de imagens (Figura 12) .<br />
Figura 9 - Imagem gerada a partir da solução 2, tempo de pós preparo de 24 h, técnica da uranila c/ gota adicional.<br />
Figura 10 - Imagem gerada a partir da solução 3, tempo de pós preparo<br />
de 24 h, técnica da uranila com gota adicional.<br />
Figura 11 - Imagem gerada a partir da solução 2, tempo de pós preparo<br />
48 h, técnica da uranila c/ gota adicional.<br />
Figura 12 - Imagem gerada a partir da solução 3, tempo de pós preparo 48 h, técnica da uranila c/ gota adicional.<br />
<strong>19</strong>3
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
<strong>19</strong>4<br />
Discussão<br />
O excesso de energia presente na superfície dos glóbulos<br />
lipídicos das misturas 3 em 1, caracteriza um sistema instável<br />
e, como conseqüência, as formações lipídicas tendem a se<br />
agrupar.<br />
A presença de qualquer forma de gotícula de óleo em<br />
uma mistura para nutrição parenteral indica que ela não está<br />
em condições para ser administrada ao paciente. Portanto, as<br />
gotículas submicrônicas de lipídio devem manter-se dispersas<br />
na mistura 3 em 1 durante todo o período de infusão, para<br />
assegurar a estabilidade.<br />
A adição de lipídios torna a mistura 3 em 1 leitosa, podendo<br />
haver o mascaramento de possíveis instabilidades físico-químicas.<br />
Desta forma, tornam-se cada vez mais relevantes<br />
estudos relacionados à qualidade das formulações utilizadas<br />
na prática clinica. A microscopia eletrônica parece ser um<br />
método apropriado para análise da dispersão lipídica nas<br />
misturas 3 em 1, objetivando a visualização de gotículas<br />
submicrônicas.<br />
A uranila e o ácido fosfotungístico são empregados para<br />
fixação de lipídios celulares na microscopia eletrônica, justificando<br />
a escolha destes dois contrastantes nos testes realizados<br />
com misturas 3 em 1.<br />
A emulsão lipídica a 20%, utilizada como controle, contrastou,<br />
adequadamente, com a solução aquosa de uranila a 2%<br />
com gota adicional de uranila, apresentando imagem homogênea,<br />
sem coalescência e com formações lipídicas com tamanho<br />
máximo de 0,17mm. Dada a clareza das imagens, não houve<br />
necessidade de fixação com ácido fosfotungístico (PTA).<br />
O PTA, quando utilizado como contraste na mistura 3 em<br />
1, após diluído a 2%, não possibilitou visualização de formações<br />
lipídicas de forma tão clara como a técnica uranila a 2%,<br />
com gota adicional de uranila.<br />
O contraste, quando feito com uranila a 2% sem gota<br />
adicional, não apresentou resultados tão satisfatórios quanto<br />
com a gota adicional de uranila.<br />
As imagens feitas das soluções padrões 1, 2 e 3, após fixação<br />
com uranila 2% com gota adicional de uranila, mostraram,<br />
de forma clara, as formações lipídicas.<br />
As soluções padrão 1, 2 e 3, contrastaram, adequadamente,<br />
com a solução de uranila 2% com gota adicional de<br />
uranila, gerando imagens adequadas, independentemente da<br />
composição das mesmas.<br />
Outro parâmetro testado nas misturas 3 em 1 ( padrão 1,<br />
2 e 3 ), foi o tempo de pós preparo em períodos de 24 e 48<br />
horas.<br />
No período de 24 horas pós preparo, observando as imagens<br />
comparativamente a solução controle: a solução 1<br />
mostrou um diâmetro lipídico de 2,06mm e menor<br />
heterogeneidade, a solução 2 mostrou uma distribuição<br />
lipídica, tendendo a formação de aglomerados, impossibilitando,<br />
a medida de diâmetro; a solução 3 mostrou uma imagem<br />
heterogênea e com diâmetro lipídico de 3,01mm . Desta<br />
forma, pode-se concluir que no período de pós preparo de<br />
24 horas houve uma tendência a heterogeneidade e formação<br />
de grumos sugerindo instabilidade relacionada aos componentes<br />
das mesmas.<br />
No período de 48 horas, pós preparo, observando as<br />
imagens comparativamente a solução controle : a solução 1<br />
apresentou um diâmetro lipídico de 2,31mm e maior<br />
heterogeneidade; na solução 2 houve formação de aglomerados<br />
lipídicos, não havendo possibilidade de medida de<br />
diâmetro; a solução 3 apresentou formação de grumos, impossibilitando<br />
a medida de diâmetro. Desta forma, pode-se concluir<br />
que no período de pós preparo de 48 horas, houve tendência<br />
a heterogeneidade e formação de grumos sugerindo<br />
instabilidade relacionada aos componentes das mesmas.<br />
Quando comparados os dois períodos de tempo, observa-se<br />
que a solução padrão 1 aumentou seu grau de<br />
heterogeneidade e diâmetro lipídico proporcionalmente ao<br />
tempo , 24 horas (2,06mm) e 48 horas(2,31mm). A solução<br />
padrão 2, no período de tempo de 24 horas após seu preparo,<br />
já havia apresentado formação de aglomerados, impossibilitando<br />
medidas, o que se repetiu nas 48 horas subseqüentes.<br />
A solução padrão 3, no período de 24 horas pós preparo<br />
mostrou heterogeneidade e diâmetro lipídico de 3,01mm e,<br />
no período de 48 horas pós preparo, observou-se heterogeneidade<br />
e formação de grumos. O preparo das soluções de<br />
nutrição parenteral deve sempre levar em consideração que<br />
a maior complexidade da mistura final aumenta a possibilidade<br />
de alterações físicas e químicas. Portanto, a maior conveniência<br />
para o paciente de ter todos os componentes que<br />
ele necessita em um só frasco deve ser ponderada, com o risco<br />
de ocorrer uma alteração ainda não relatada na bibliografia.<br />
O tempo de conservação da nutrição parenteral com<br />
lipídios, misturas 3 em 1, exerce um efeito desfavorável à<br />
conservação da mesma, visto ser ele uma variável físico-química<br />
de instabilidade para qualquer sistema termodinâmico,<br />
observando-se redução de cargas negativas dos glóbulos<br />
como conseqüência da hidrólise lenta dos fosfolipídios.<br />
O período de tempo pós preparo das misturas 3 em 1<br />
parecem interferir na estabilidade das formulações de nutrição<br />
parenteral, agindo no potencial zeta. A nutrição<br />
parenteral, por ser uma terapia efetiva na redução da<br />
morbidade e mortalidade dos pacientes, deve considerar os<br />
riscos potenciais a que as misturas 3 em 1 podem submeter os<br />
mesmos. O farmacêutico deve participar, ativamente, na seleção<br />
dos componentes, na formulação, na preparação e, também,<br />
na elaboração do plano terapêutico, visando<br />
monitorização total desses pacientes.<br />
Em virtude das inúmeras prescrições diárias de nutrição<br />
parenteral, com vários componentes prescritos que, ainda<br />
acarretam dúvidas sobre seu potencial de instabilidade, novos<br />
estudos devem ser delineados, garantindo, dessa forma,<br />
maior segurança a esta terapêutica tão importante em nosso<br />
meio.<br />
Conclusão<br />
A técnica da uranila a 2% com gota adicional de uranila,<br />
na microscopia eletrônica, mostrou imagens mais nítidas para<br />
estudo de misturas 3 em 1 de nutrição parenteral, quando<br />
comparada à técnica do ácido fosfotungístico e à técnica da<br />
uranila 2% sem gota adicional de uranila.
Quando comparadas as imagens dos dois períodos de<br />
tempo pós preparo, 24 e 48 horas, com a solução controle,<br />
observou-se que a solução 1, contendo glicose a 10 % e sem<br />
eletrólitos, apresentou imagens mais heterogêneas e de maior<br />
diâmetro lipídico de forma proporcional ao tempo de 2,06<br />
m (24 horas) para 2,31 m (48 horas). A solução 2 , contendo<br />
eletrólitos e glicose a 18%, no período de 24 horas de pós<br />
preparo apresentou imagens com aglomerados lipídicos que<br />
impossibilitaram leitura, repetindo os resultados nas 48 horas.<br />
A solução 3 contendo glicose a 10% e eletrólitos no período<br />
de 24 horas pós preparo apresentou imagens heterogêneas e<br />
1.Gomes MJVM, Reis AMM. Ciências farmacêuticas. Uma abordagem em<br />
farmácia hospitalar. São Paulo (SP) : Atheneu, 2001.<br />
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ed. São Paulo: Atheneu, 2000.<br />
Referências bibliográficas<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):189-<strong>19</strong>5<br />
com diâmetro lipídico de 3,01 m, sendo que nas 48 horas<br />
houve aumento de heterogeneidade e formação de grumos<br />
lipídicos. Desta foram o tempo de pós preparo contribuiu na<br />
desestabilização das misturas 3 em 1, com imagens que comparadas<br />
ao controle mostram a tendência a heterogeneidade<br />
e formação de grumos.<br />
Quando comparadas as imagens das três soluções com o<br />
controle , observou-se a influência dos eletrólitos e da concentração<br />
da glicose na desestabilização da solução, observando<br />
heterogeneidade crescente das misturas e tendência a<br />
formação de grumos.<br />
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Guanabara Koogan, <strong>19</strong>99.<br />
<strong>19</strong>5
Resumo<br />
Resumen<br />
<strong>19</strong>6<br />
ARTIGO DE REVISÃO<br />
Fibra alimentar na redução da incidência do câncer de cólon: existem<br />
evidências conclusivas?<br />
Dietary fiber in the reduction of the incidence of colon cancer: are there any conclusive evidences?<br />
Fibra dietética en la reducción dela incidencia del cáncer de colon: ¿Hay evidencias conclusivas?<br />
Denise Machado Mourão 1 , Josefina Bressan Resende Monteiro 2 , Cristina Maria Ganns Chaves Dias 3 ,<br />
Neuza Maria Brunoro Costa 4<br />
O câncer do cólon aflige cerca de um milhão de pessoas em todo<br />
mundo, causando a morte de mais de meio milhão de indivíduos<br />
anualmente. É o tipo de câncer mais afetado pela dieta, e, por isso,<br />
sua prevenção pela dietética tem recebido grande atenção. O consumo<br />
de fibras é um dos fatores mais importantes neste aspecto,<br />
porém ainda muito controverso. Esta revisão enfoca os principais<br />
aspectos do efeito das fibras relacionado à prevenção deste câncer,<br />
analisando as evidências que suportam o papel positivo do consumo<br />
das fibras na redução da incidência do câncer de cólon. (Rev<br />
Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202)<br />
UNITERMOS: fibra alimentar, câncer de cólon, butirato<br />
Abstract<br />
Colon cancer afflicts near one million people around the world,<br />
causing more than half a million of deaths annually. This is the type<br />
of cancer most affected by diet and, because of that, its prevention<br />
by dietary manipulation has received large attention. Though<br />
controversial, the consumption of fibers is one of the most important<br />
factors in this aspect. This paper emphasizes the main aspects related<br />
to the effect of dietary fiber in the prevention of this cancer, by<br />
analyzing the evidences that support the positive aspects of dietary<br />
fiber consumption in the reduction of the incidence of colon cancer.<br />
(Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202)<br />
KEY WORDS: dietary fiber, colon cancer, butyrate<br />
El cáncer de colon atinge prácticamente uno millón de personas alrededor del mundo, causando más de medio millón de muertes anualmente.<br />
Ese es el tipo de cáncer más afectado por la alimentación, y por eso, su prevención por medio del manejo adecuado de la dieta ha<br />
recibido una gran atención. Aunque polémico, el consumo de fibras es uno de los factores más importantes en este aspecto. Esta revisión<br />
enfatiza los aspectos principales relacionados al efecto de las fibras dietéticas en la prevención de este cáncer, analizando las evidencias<br />
que apoyan el papel positivo del consumo de fibras dietéticas en la reducción de la incidencia del cáncer de colon. (Rev Bras Nutr Clin<br />
2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202)<br />
UNITÉRMINOS: fibra, cáncer de colon, butirato<br />
1. Nutricionista. Mestre em Ciência e Tecnologia de Alimentos. Doutoranda do Curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Viçosa, MG; 2.<br />
Nutricionista. MSc, PhD em Fisiologia e Nutrição. Professora Adjunto do Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa, MG; 3. Médica. MSc,<br />
Doutorado em Patologia. Professora Adjunto do Departamento de Biologia Animal, Universidade Federal de Viçosa, MG; 4. Nutricionista. MSc, PhD em Nutrição Humana.<br />
Professora Adjunto do Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa, MG.<br />
Endereço para correspondência: Denise Machado Mourão, Dep. de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa, Av. PH Rolfs s/ n., 36571-000, Viçosa – MG,<br />
Brasil. (jbrm@ufv.br)<br />
Submissão: 29 de outubro de 2003<br />
Aceito para publicação: 12 de dezembro de 2004
Introdução<br />
Com as grandes mudanças que têm ocorrido nos hábitos<br />
alimentares e no estilo de vida cada vez mais estressante, mais<br />
tem sido reconhecido que a saúde do sistema digestivo é essencial<br />
para uma qualidade de vida adequada. Isso se reflete<br />
também no fato de que o trato gastrintestinal (TGI) tem uma<br />
grande superfície e capacidade metabólica. Este reconhecimento<br />
tem levado pesquisadores a desenvolver alimentos e<br />
produtos alimentícios que contribuam para a saúde deste sistema<br />
e, indiretamente, para o bem estar geral da saúde, como<br />
os produtos ricos em fibra alimentar 1 .<br />
Um dos fatores que tem sido reconhecido como de grande<br />
importância para manutenção da saúde do sistema digestivo<br />
é a microbiota colônica, especialmente com relação aos<br />
tipos de microrganismos predominantes e aos tipos de nutrientes<br />
que são metabolizados por esses. Essa microbiota é importante<br />
pela síntese de nutrientes, como vitaminas do complexo<br />
B e vitamina K, e pela competição com bactérias nocivas.<br />
Através do consumo de carboidratos fermentáveis, a<br />
flora é capaz de criar um ambiente metabolicamente favorável,<br />
o qual auxilia na eliminação de toxinas e de substâncias<br />
carcinogênicas 1 .<br />
O câncer do cólon é uma doença que aflige cerca de um<br />
milhão de pessoas em todo mundo, causando a morte anual de<br />
mais de meio milhão de pessoas. Entre os diferentes tipos de<br />
câncer, este é o tipo mais afetado pela dieta e sua prevenção, através<br />
da manipulação dietética, tem recebido grande atenção 2 .<br />
O consumo de fibras é um dos fatores mais importantes,<br />
porém ainda controverso, relacionado ao câncer coloretal<br />
(CCR).<br />
Esta revisão enfoca os principais aspectos do efeito das<br />
fibras relacionado à prevenção deste câncer, analisando as<br />
evidências que suportam o papel positivo do consumo das<br />
fibras na redução da incidência do câncer de cólon.<br />
Visão geral da carcinogênese e do câncer<br />
do cólon<br />
O câncer é considerado uma doença genética, resultante<br />
de mutações cumulativas que alteram pontos específicos do<br />
DNA. De acordo com a hipótese mais aceita para a<br />
carcinogênese, as mutações afetam dois tipos de genes<br />
cancerígenos, os chamados supressores de tumores, que normalmente<br />
refreiam a habilidade das células em se dividir, ou regulam<br />
o processo de morte programada (apoptose), como por<br />
exemplo mutações nos genes RB, p53, e APC; e as mutações<br />
em oncogenes, que estimulam a divisão celular, como por<br />
exemplo mutações nos genes BRAF, c-fos ou c-erbb3. Assim,<br />
o mecanismo que assegura que o número de células permaneça<br />
balanceado, pela regulação da divisão celular e apoptose, é<br />
subvertido no câncer, acarretando o aumento no número de<br />
células transformadas 3 .<br />
Novas teorias têm surgido para explicar o aparecimento<br />
do câncer, postulando aumento e acúmulo de mutações<br />
randômicas em genomas de células pré-cancerosas, ou pelo<br />
papel da aneuploidia, com aberrações cromossômicas em larga<br />
escala 3 .<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202<br />
Assim, o processo carcinogênico pode vir tanto pelo<br />
aumento da habilidade das células em se proliferarem, como<br />
no decréscimo da suscetibilidade da célula à apoptose. Os<br />
tumores malignos, ou câncer, são de natureza clonal, composto<br />
por agregados de células, todas derivadas de uma célula<br />
aberrante original. Células cancerosas diferem das células<br />
normais por fenótipos específicos, como alta taxa de divisão<br />
celular, invasão de novos territórios celulares, altas taxas<br />
metabólicas e forma celular anormal 4 .<br />
O câncer do cólon é um das principais doenças do mundo<br />
ocidental, sendo o segundo tipo de câncer em nível de<br />
mortalidade nos EUA. A maioria dos casos de câncer do cólon<br />
(80%-90%) não são herdados geneticamente, sendo caracterizados<br />
como esporádicos, originados pela combinação da<br />
dieta com o efeito do ambiente, resultando em mutações<br />
somáticas 5 .<br />
As células do cólon são especialmente sensíveis a perturbações<br />
no controle da divisão celular e apoptose. As criptas<br />
do intestino grosso são compostas por células que estão em<br />
continuo processo de auto-renovação. Células colônicas<br />
possuem atividade mitótica na parte inferior da cripta e adquirem<br />
seu fenótipo diferenciado durante uma migração linear<br />
para a região superior 6 .<br />
À medida em que ocorre o envelhecimento das células<br />
colônicas, estas sofrem apoptose e são liberadas no lúmen do<br />
cólon. Esse epitélio colônico é renovado completamente a<br />
cada quatro a oito dias. Cerca de 60% da proliferação normal<br />
dos colonócitos ocorre na parte basal das criptas, e 40% na<br />
parte superior. Entretanto, o processo de proliferação paralisa-se<br />
normalmente, em determinados momentos, e os<br />
colonócitos se tornam plenamente diferenciados, para serem<br />
então liberados depois de aproximadamente sete dias de um<br />
processo de migração ascendente. A expansão do compartimento<br />
proliferativo da superfície da cripta (hiperproliferação,<br />
envolvendo 40% acima do comprimento da cripta) é<br />
considerada um indicativo pré-neoplásico.<br />
A constância do número de células na cripta está sob<br />
forte controle para garantir um balanço rigoroso entre a taxa<br />
de produção de novas células e de morte celular, e ainda<br />
muito pouco se conhece sobre a natureza desse mecanismo de<br />
controle 6 .<br />
Um vasto número de evidências indicam a desregulação<br />
da apoptose como uma das principais causas ligadas ao desenvolvimento<br />
dessa neoplasia. A apoptose é observada predominantemente<br />
na região superior das criptas colônicas e a<br />
interpretação prevalente é de que esta regulação, restringindo<br />
espacialmente a apoptose, depende de um balanço complexo<br />
entre fatores indutores da apoptose e fatores de sobrevivência<br />
celular. A indução programada da morte celular<br />
pode também representar um mecanismo pelo qual os<br />
colonócitos, quando possuem danos no DNA, possam ser<br />
eliminados 5 . Desta forma, quando as taxas de proliferação<br />
colônica são aumentadas e a apoptose é reduzida ou<br />
inativada, aumenta o risco de perpetuação de danos no DNA<br />
e da incidência do câncer 7 .<br />
Dentre os vários fatores que regulam positivamente a<br />
apoptose está a família bcl-2, da qual faz parte o gene BAX,<br />
o qual é expresso predominantemente nas zonas superiores da<br />
<strong>19</strong>7
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202<br />
cripta colônica. A citocina TGF- beta, a qual inibe a divisão<br />
celular, apresenta um gradiente em seu nível de expressão<br />
gênica, possuindo maior expressão na região superior e menor<br />
expressão na base da cripta, exercendo importante controle<br />
no balanço entre apoptose e divisão celular nas células<br />
colônicas 5 .<br />
<strong>19</strong>8<br />
Fibras e seu papel fisiológico<br />
Fibras são componentes de origem vegetal que não constituem<br />
fontes de energia consideráveis para os seres humanos.<br />
Uma definição precisa e de consenso mundial de fibra ainda<br />
não existe, principalmente devido à diversidade de métodos<br />
de determinação utilizados. O Instituto de Medicina dos Estado<br />
Unidos propõe a diferenciação entre fibra alimentar,<br />
fibra funcional e fibra total. A fibra alimentar (FA) consiste<br />
em carboidratos não digeríveis e lignina, que estão intrínsecos<br />
e intactos na planta. Já a fibra funcional é considerada<br />
como sendo um isolado de carboidratos não digeríveis, que<br />
apresentam efeitos fisiológicos benéficos em humanos. A fibra<br />
total seria a soma das duas 8 .<br />
As fibras apresentam propriedades diferentes, resultando<br />
conseqüentemente em efeitos fisiológicos distintos. A fibra<br />
viscosa, por exemplo, retarda o esvaziamento gástrico, provocando<br />
uma grande sensação de saciação. Elas podem também<br />
interferir, de forma a reduzir, a absorção de lipídios, assim<br />
como a recirculação dos ácidos biliares. Ainda, o consumo da<br />
fibra alimentar e certas fibras funcionais, particularmente<br />
aquelas que são pouco fermentadas, apresentam um grande<br />
potencial em aumentar o volume fecal, e melhora da constipação.<br />
A recomendação de uma ingestão adequada de fibras<br />
totais é de 38 e 25 g/dia para homens e mulheres jovens, respectivamente<br />
8 .<br />
Efeitos dos carboidratos de baixa<br />
digestibilidade (CBD) no trato<br />
gastrintestinal<br />
Carboidratos de baixa digestibilidade representam um<br />
grupo de substâncias heterogêneas, com a principal característica<br />
de não sofrerem degradação enzimática no intestino<br />
delgado. Uma vez atingido o cólon, o destino dos CBD é<br />
determinado pelos processos de fermentação bacteriana. Os<br />
ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), produzidos como<br />
produtos finais da quebra anaeróbica dos CBD, principalmente<br />
o acetato, propionato, e butirato, afetam o epitélio<br />
colônico de várias formas. Outros constituintes das fibras<br />
pouco degradáveis também agem especialmente no cólon<br />
distal, através da sua alta capacidade de retenção de água 9 .<br />
Alguns efeitos da fibra no intestino grosso, como aumento<br />
da massa do bolo fecal, redução do tempo de trânsito, diluição<br />
dos constituintes colônicos e estimulação da fermentação<br />
bacteriana reduzem o contato entre os constituintes<br />
intestinais e a mucosa e levam à produção dos AGCC, os quais<br />
reduzem o pH e a conversão dos ácidos biliares primários em<br />
secundários 9, 10 .<br />
Tem sido relatado que um longo tempo de trânsito intestinal<br />
pode levar a uma grande interferência no metabolismo<br />
e fisiologia das bactérias. O tipo de dieta ingerida também<br />
acarreta diferentes proporções de AGCC produzidos pela<br />
microbiota colônica 11 .<br />
Experimentos de fermentação in vitro com bactérias fecais<br />
têm demonstrado que diferentes polissacarídeos podem ser<br />
catabolizados com diferentes velocidades. O amido e a pectina,<br />
por exemplo, são degradados mais rapidamente que xilanas ou<br />
arabinogalactanas. O acetato é o principal produto da quebra<br />
de pectina e xilanas, enquanto que o acetato e o propionato são<br />
os principais produtos do catabolismo de arabinogalactanas. Já<br />
o butirato é o único produto formado em quantidades substanciais<br />
pela degradação do amido resistente 11 .<br />
A proporção da produção de diferentes AGCC oriundos<br />
da fermentação do amido resistente e dos polissacarídeos não<br />
amiláceos (PSNA) é diferente. A fermentação do amido resistente<br />
geralmente resulta em maior produção de butirato, em<br />
torno de 20 a 28 mol%, comparado com a média de 10 a 15<br />
mol% para a fermentação de PSNA 12 . Existem algumas evidências<br />
de que os frutoligosacarideos possam também originar<br />
butirato na fermentação intestinal 13 .<br />
Em particular, o butirato é a fonte de energia preferencial<br />
dos colonócitos, e tem sido implicado na proteção contra<br />
colites e câncer colorretal, agindo como fator essencial para<br />
o crescimento e saúde destas células. Há inúmeras evidências<br />
de que o butirato seja o principal mediador dos efeitos<br />
positivos das fibras na mucosa intestinal, o qual pode atingir<br />
concentrações no cólon de até 30 mM 6 . Mas, como conciliar<br />
o efeito positivo no crescimento das células da mucosa com<br />
o efeito negativo do butirato no desenvolvimento da célula<br />
tumorais? Aparentemente, o butirato tem efeitos opostos e<br />
pode atuar diferentemente em células normais quando comparado<br />
com células transformadas, podendo potencialmente<br />
também ser diferentemente metabolizado 6 .<br />
Estudos da microbiota intestinal têm apontado espécies<br />
dos gêneros Clostridium, Eubacterium e Fusobacterium como os<br />
principais organismos produtores de butirato, mas uma considerável<br />
diversidade na microbiota colônica pode ocorrer<br />
nos humanos 13 .<br />
Várias rotas fermentativas podem coexistir no intestino,<br />
e o balanço do ecossistema colônico pode afetar o nível de<br />
produção do butirato, e este equilíbrio pode ser afetado pelo<br />
potencial redox, pelas taxas de transporte da mucosa, e pelo<br />
nível de digestão e mobilidade do alimento no trato<br />
gastrintestinal. Certos substratos podem afetar essas variáveis,<br />
direta ou indiretamente. Os efeitos dessas variáveis na incidência<br />
do câncer de cólon permanecem ainda pouco esclarecido<br />
13 .<br />
Fisiologia das criptas colônicas e efeito<br />
dos carboidratos de baixa digestibilidade<br />
(CBD) no câncer colorretal (CCR)<br />
Grande tem sido a discussão acerca dos efeitos das fibras<br />
na prevenção do câncer de cólon. Uma das primeiras hipóteses<br />
postuladas sobre esta questão foi a de Burkitt (<strong>19</strong>69), que<br />
verificou uma baixa incidência de câncer colorretal (CCR)<br />
na população rural africana que consumia dieta rica em fibra<br />
14 .
Estudos epidemiológicos têm demonstrado que a população<br />
que consome uma grande proporção de PSNA apresenta<br />
uma menor incidência de doenças gastrintestinais, especialmente<br />
CCR. A dieta parece contribuir para a redução do<br />
risco deste câncer em cerca de 25% a 35% pelo aumento do<br />
consumo de fibra alimentar 15 .<br />
Vários estudos 10, 16 reportaram uma associação inversa<br />
entre o risco de CCR e consumo da fibra alimentar. Entretanto,<br />
outros estudos não encontraram esta associação 17, 18 .<br />
Em uma revisão sobre os potenciais mecanismos do efeito<br />
da fibra na redução do CCR, Hill <strong>19</strong> verificou que este<br />
mecanismo depende da reduzida digestão da fibra no intestino<br />
delgado, chegando então ao cólon onde sofre fermentação,<br />
podendo resultar em efeitos positivos, pelo aumento do<br />
bolo fecal e conseqüente aumento da defecção, ou seja, diminuído<br />
o tempo de trânsito desse bolo no intestino, reduzindo<br />
assim a ação de substâncias carcinogênicas, ou mesmo pela<br />
diluição da concentração destas substâncias carcinogênicas<br />
no intestino. Outros mecanismos que poderiam também estar<br />
envolvidos incluem: (1) alteração do metabolismo<br />
energético, (2) mudanças na microbiota intestinal, levando<br />
à redução na síntese de ácidos biliares secundários, os quais<br />
são possíveis agentes carcinogênicos, (3) conjugação dos<br />
ácidos biliares com outras substâncias, reduzido seu potencial<br />
carcinogênico, (4) produção de AGCC, os quais reduzem<br />
o pH do lúmen intestinal, reduzindo a ionização de ácidos<br />
graxos e biliares, e conseqüentemente, o potencial efeito<br />
promotor do câncer dessas substancias, (5) efeito direto antiproliferativo<br />
e estimulador da apoptose pelos AGCC.<br />
Estudos têm revelado que, juntamente com os<br />
polissacarídeos não amiláceos (PSNA), a maioria dos componentes<br />
da fibra alimentar, amido resistente chega ao cólon<br />
não digerido. Em uma dieta rica em amido, a quantidade<br />
deste nutriente pode exceder a quantidade de PSNA que<br />
chega ao cólon 20 . Devido à falta de dados oriundos de estudos<br />
epidemiológicos, a relação entre amido resistente e risco<br />
de câncer ainda é incerta 21 .<br />
Em estudos com animais, verificou-se que os<br />
frutoligossacarídeos (FOS) reduzem a ocorrência de tumores<br />
de cólon 22, 23 . Entretanto, ainda é desconhecido se este efeito<br />
é devido ao aumento do número de bifidobactérias, aumentando<br />
a produção de butirato, ou se é devido a outros mecanismos<br />
9 .<br />
Algumas evidências experimentais têm indicado que os<br />
AGCC, particularmente o n-butirato, possam ter um papel<br />
protetor e fundamental no processo da carcinogênese, por<br />
meio de seus distintos efeitos na proliferação, apoptose e<br />
expressão gênica 9 .<br />
O butirato diminui a hiperproliferação da mucosa em<br />
colonócitos de pacientes com colites ulcerativas, e doenças<br />
com potencial neoplásico reconhecidas. Em mucosas sem<br />
inflamação, o butirato antagonizou a hiperproliferação<br />
induzida por incubação com ácido deoxicólico<br />
cocarcinogênico 24 .<br />
Hague et al. verificaram aumento no nível de apoptose em<br />
adenoma de cólon em células cancerosas quando incubadas<br />
com butirato 25 . O efeito foi menos pronunciado com o decréscimo<br />
do comprimento da cadeia dos AGCC, n-<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202<br />
butirato>propionato>acetato 26 . A ação dos AGCC pode estar<br />
relacionada a ativação da expressão gênica de genes que favoreçam<br />
a ocorrência da apoptose (como por exemplo, os genes<br />
Bax e Bak), e, ou, concomitantemente, pode também estar<br />
relacionado a redução de outros gens antagonistas da apoptose<br />
(como por exemplo, dos genes genes Bcl-2, Bcl-X L ) 27 .<br />
Alguns dados indicam que gorduras e fibras podem<br />
interagir sinergisticamente na redução de tumores do cólon.<br />
Dietas ricas em óleo de peixe têm efeito oposto ao das dietas<br />
ricas em óleo de milho, onde o óleo de peixe possui um pronunciado<br />
efeito estimulador da apoptose 28 . A dieta com óleo<br />
de peixe demonstrou reduzir a expressão do gene da enzima<br />
ciclooxigenase 2 (também chamada de sintase da prostaglandina<br />
H ou Cox2), a qual é alvo de medicamentos antiinflamatórios,<br />
e também inibidora da apoptose. O uso desses<br />
medicamentos reduz a incidência do câncer de cólon, assim<br />
como dietas ricas em óleo de peixe, o que pode favorecer o<br />
efeito do butirato na promoção da apoptose e conseqüente<br />
inibição desse tipo de carcinogênese 28 .<br />
Vários trabalhos relataram a inibição induzida pelo<br />
butirato no crescimento de linhagens de células cancerosas<br />
no cólon. Nestas células isoladas de tumor, o butirato suprime<br />
a proliferação, quando presente em uma concentração<br />
entre 1 a 5 mmol/L, sem prejudicar as outras células. Existem<br />
evidências de que o butirato não inibe o crescimento das<br />
células cancerosas do cólon apenas pela ação citotóxica.<br />
Alternativamente, a ação deste ácido graxo pode ocorrer pela<br />
indução de sinais de diferenciação, ao mesmo tempo em que<br />
inibe a proliferação. Na presença de butirato, as células do<br />
tumor assumem um fenótipo mais parecido com o tecido<br />
original não-neoplásico. Entre outros sinais de diferenciação<br />
induzidos pelo butirato, estão incluídos o aumento da expressão<br />
da fosfatase alcalina e outras hidrolases 29, 30 . Os efeitos do<br />
butirato podem estar relacionados à indução da síntese de um<br />
número limitado de outras proteínas, como glicoproteínas,<br />
receptores de hormônios e de metalotiononas. Pouco ainda<br />
é conhecido sobre o papel dessas proteínas especificamente<br />
reguladas pelo butirato nos mecanismos supressores do câncer<br />
em células tumorais. Contudo, sabe-se que um dos possíveis<br />
efeitos do butirato na inibição da proliferação destas<br />
células no cólon, provavelmente, ocorra já na inibição da fase<br />
inicial G1 do ciclo de divisão celular. Isto poderia, pelo menos<br />
em parte, resultar do efeito do butirato na expressão de genes<br />
envolvidos no controle do ciclo da célula, incluindo os<br />
oncogenes 31 .<br />
O sódio-butirato (NaB) exerce efeito na atividade antiproliferativa<br />
de vários tipos de células, como em linhagens<br />
de carcinoma de cólon 32, 33 . Várias evidências têm sugerido<br />
que a indução da via de programação da morte celular produz<br />
uma significativa proteção contra a carcinogênese pela<br />
remoção das células geneticamente danificadas antes que<br />
estas possam causar/originar uma lesão pré-cancerosas.<br />
Outros resultados sugerem que a ingestão de farelo de<br />
trigo promove a acetilação de histonas, provavelmente pela<br />
ação do butirato, processo este envolvido na indução in vivo<br />
da apoptose de células epiteliais de ratos 34 .<br />
Um trabalho experimental in vitro mostrou que ocorre<br />
diminuição nos níveis de peróxido de hidrogênio quando<br />
<strong>19</strong>9
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):<strong>19</strong>6-202<br />
células cancerosas do cólon humano foram incubadas com<br />
butirato 35 . Um alto nível deste radical livre pode danificar o<br />
DNA e estar relacionado ao processo de carcinogênese. Adicionalmente,<br />
foi mostrado que o butirato melhorou a função<br />
da barreira intestinal a células da linhagem Caco2, derivadas<br />
de tumor de cólon, pela redução da permeabilidade<br />
paracelular à estas células, após uma lesão epitelial 36 .<br />
O butirato parece também estimular a imunogenicidade<br />
de células cancerosas. O fenótipo de células malignas de<br />
cólon de ratos (PROb), imunogeneticamente enfraquecidas,<br />
foi modificado pelo sódio-butirato, e a regressão do crescimento<br />
da massa tumoral foi atribuída aos efeitos induzidos do<br />
butirato na apoptose e no aumento da imunogenecidade das<br />
células 1 .<br />
Essas evidências que suportam a hipótese de que a<br />
ingestão de carboidratos de baixa digestibilidade como fonte<br />
indireta de butirato para o intestino grosso tenha importantes<br />
benefícios na redução dos fatores de risco do câncer<br />
colorretal 1 .<br />
Em estudos com animais, o farelo de trigo é a única fonte<br />
de fibras apresentando efeitos protetores contra o câncer do<br />
cólon, podendo reduzir em até 40% a incidência do câncer<br />
em ratos 37 . Entretanto, resultados contraditórios foram obtidos,<br />
e podem ser advindos do uso de extirpes diferentes de<br />
ratos; efeitos artificiais associados ao uso de potentes agentes<br />
carcinogênicos; diferenças nos efeitos entre os agentes<br />
carcinogênicos estudados; diferenças na rota pela qual a substância<br />
carcinogênica foi aplicada ou devido a efeitos associados<br />
a dietas semi-purificadas ou comerciais, as quais são de<br />
difícil controle 2 .<br />
O efeito positivo do butirato não se limita à promoção<br />
da apoptose protegendo contra o câncer do cólon. Ele também<br />
abaixa o pH do cólon e, em conseqüência, pode inibir<br />
a transformação bacteriana de ácidos biliares primários em<br />
secundários (como o ácido deoxicólico, DCA), os quais<br />
podem apresentar atividade carcinogênica em animais 38 .<br />
Entretanto, são contraditórios os dados que, de um lado<br />
mostram que o farelo de trigo seja mais protetor do que o de<br />
aveia contra o câncer de cólon induzido experimentalmente,<br />
com outros que, de outro lado, mostram que a fermentação<br />
de dieta baseada em farinha de aveia produz maiores níveis<br />
de butirato do que quando do uso de farelo de trigo 39 .<br />
A maioria destes estudos com humanos basearam-se na<br />
alimentação de indivíduos com dietas de diferentes níveis de<br />
fibra (ou componentes específicos da fibra), sendo realizadas<br />
determinações como massa e trânsito fetal; concentração fecal<br />
de ácidos biliares; pH fecal; produção de AGCC; estudos de<br />
proliferação e da apoptose em células do epitélio retal 2 .<br />
Estudos clínicos de caso-controle mostram o efeito protetor<br />
da fibra no câncer do cólon 10, 16, 40 . Mas, a validade desses<br />
resultados também tem sido sujeita a críticas. Hill estimou<br />
que a quantidade necessária de polissacarídeos que deve<br />
chegar ao cólon para uma suficiente fermentação bacteriana<br />
seja de 50 a 70g/dia <strong>19</strong> . Entretanto, na maioria desses estudos<br />
tem-se estabelecido numa faixa entre 15 a 25 g/dia, o que pode<br />
subestimar os verdadeiros efeitos da fibra nesse processo.<br />
Várias outras críticas têm sido apresentadas por Schatzkin 2 ,<br />
quanto à qualidade de dados dessa natureza: freqüência ina-<br />
200<br />
dequada dos questionários sobre à ingestão alimentar, o qual<br />
é um importante instrumento nesse tipo de análise, e têm se<br />
baseado em períodos de 24 h; falta de controle na variabilidade<br />
e no teor de fibras nos próprios alimentos utilizados; falta<br />
de marcadores específicos para a ingestão de fibras, e falta de<br />
informação sobre os hábitos no passado de ingestão de fibras,<br />
os quais podem ter sério efeito residual.<br />
O estudo que tem sido mais relatado em discordar sobre<br />
o efeito protetor das fibras contra o câncer do cólon foi publicado<br />
por Fuchs et al. 18 . Este trabalho baseou-se em estudo<br />
da análise de questionários e outros dados feitos sobre a saúde<br />
de enfermeiras e reuniu dados de 80.000 enfermeiras, entre<br />
34 a 59 anos, durante 16 anos. Aproximadamente 800 casos<br />
de câncer de cólon foram detectados nessa população e o<br />
maior consumo em fibras, nesse estudo, foi associado a um<br />
ligeiro aumento na incidência do câncer de cólon. Outros<br />
estudos prospectivos também não foram capazes de mostrar a<br />
relação inversa entre consumo de fibras e grau de incidência<br />
de carcinogênese no cólon 41-45 . Estes resultados sofreram forte<br />
crítica, baseado em vários argumentos como: amostra não<br />
representativa da população; estimativa do consumo de fibra<br />
foi feito apenas durante um ano; erros na precisão das perguntas<br />
feitas nos questionários, entre outros. Ainda, um outro<br />
argumento pode ser atribuído à uma grande variedade de<br />
aspectos dietéticos ou características de estilo de vida de<br />
indivíduos com alto consumo de fibras em relação aos de<br />
baixo consumo, as quais podem ter forte influência na incidência<br />
deste tipo de câncer 2 .<br />
Além disso, existem vários resultados desapontadores,<br />
quanto ao efeito da suplementação da dieta com fibra, para<br />
prevenir a recorrência de adenoma coloretal 46, 47 . Explicações<br />
para esses resultados negativos, apresentados pela Associação<br />
Americana de Nutricionistas, foram as de que o tempo de<br />
intervenção não foi longo suficientemente (três anos); de que<br />
o teor de fibra não tenha sido adequado para produzir os resultados<br />
esperados; de que o fenótipo de recorrência do<br />
adenoma não seja uma determinação adequada para validar<br />
a eficiência da fibra em prevenir o cólon de câncer; que os<br />
indivíduos controle utilizados (dieta pobre em fibra) já teriam<br />
modificado sua dieta normal durante o estudo, visto que<br />
sua ingestão em fibra é superior a media americana 48 . Outra<br />
explicação plausível seria a de que existem diferenças genéticas<br />
ainda não caracterizadas, as quais introduziriam grande<br />
erro nas análises, tornando as diferenças relativas ao efeito da<br />
fibra estatisticamente não significantes 49 .<br />
Entretanto, resultados preliminares da Investigação<br />
Prospectiva Européia sobre o Câncer e Nutrição (EPIC -<br />
www.srl.cam.ac.uk/epic), apresentados no congresso internacional<br />
intitulado “Food, Nutrition and the Prevention of<br />
Cancer”, em 2002, na Inglaterra, utilizando 500 mil homens<br />
e mulheres de dez países europeus, indicaram que pessoas<br />
consumindo dieta rica em frutas e vegetais (456g/dia) apresentam<br />
risco 45% menor de desenvolver câncer do trato digestivo<br />
superior ou do cólon, quando comparadas com pessoas<br />
com uma baixa ingestão desses alimentos (287g/dia) 50 .<br />
Os resultados conflitantes de vários estudos podem ser<br />
devido, em parte, aos vários tipos de fibra alimentar utilizados,<br />
ou em falhas baseadas na desconsideração do efeito de
outros elementos presentes na dieta testada, tais como gorduras<br />
e minerais 6 . Também, resultados contraditórios podem ter<br />
sido originados em diferenças nos protocolos experimentais,<br />
na quantidade e tipo de substância carcinogênica utilizada<br />
para induzir o tumor 6 .<br />
Hill <strong>19</strong> concluiu que muitos erros têm sido cometidos nos<br />
estudos sobre o efeito das fibras no câncer do cólon, entre eles<br />
especialmente a negligência sobre o efeito diferencial que<br />
fibras de diferentes origens têm no processo cancerígeno.<br />
A análise do efeito das fibras no câncer também não tem<br />
abordado a complexidade e variabilidade do câncer do cólon,<br />
o qual possui diferentes etiologias, dependendo se localizado<br />
no cólon proximal, distal ou no cólon retal, de forma<br />
que o aparecimento de adenomas não pode ser utilizado para<br />
predizer a habilidade de um nutriente em proteger contra o<br />
câncer de cólon 51 . Outra deficiência a ser sanada é a falta de<br />
estudos do butirato in vivo 39 .<br />
A mudança no foco dos estudos sobre o efeito da nutrição<br />
no câncer tem sido proposto por Rock et al. 52 , os quais<br />
argumentam que a recente e maior disponibilidade de dados<br />
sobre a origem da suscetibilidade ao câncer baseada em fatores<br />
genéticos, deve agora ser acompanhada da focalização dos<br />
efeitos da intervenção da dieta em indivíduos mais prováveis<br />
em serem beneficiários dessa dieta. Os mesmos autores apontam<br />
que historicamente, as estratégias para prevenir doenças<br />
como o câncer, objetivam e são desenvolvidas para a população<br />
em geral, envolvendo muito debate e discussão de prioridades,<br />
foco esse não adequado frente a limitação de recursos<br />
e ao efeito negativo da diluição dos esforços. Contudo,<br />
essa sugestão deve ser considerada de validade limitada para<br />
o caso do câncer do cólon, onde o fator genético tem pequena<br />
contribuição frente ao efeito da dieta.<br />
A aplicação das metodologias de estudo funcional do<br />
genoma pode também contribuir com importantes informações<br />
39 . A definição mais completa dos genes e mecanismos<br />
envolvidos poderá ser caracterizada mais detalhadamente por<br />
análises do transcriptoma e do proteoma em diferentes fases<br />
e tipos de câncer do cólon com o uso de diferentes níveis e<br />
tipos de fibras. Uma grande força tarefa para o estudo do<br />
genoma funcional do câncer já foi estabelecida em nível<br />
mundial e, provavelmente, tornará este tipo de informação<br />
disponível em breve, o que certamente fornecerá um quadro<br />
mais complexo e holístico dos mecanismos envolvidos.<br />
Desta forma, ainda não há um consenso satisfatório para<br />
a hipótese do efeito protetor das fibras na carcinogênese do<br />
cólon, visto a inconsistência dos dados que, de um lado,<br />
baseados em estudos clínicos e experimentais, demonstram<br />
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um claro efeito benéfico das fibras no câncer de cólon, e, por<br />
outro lado, alguns estudos epidemiológicos e de intervenção<br />
dietética mostram dados da inexistência do efeito da mesma.<br />
Sugestões para novas estratégias para esclarecer essas inconsistências<br />
foram propostas por Schatzkin 2 , como, por<br />
exemplo: estudos do efeito da fibra em modelos espontâneos<br />
de câncer animal (utilizando o camundongo MIN, por<br />
exemplo); investigações adicionais da complexidade ecológica<br />
e da fisiologia do cólon proximal; desenvolvimento de<br />
ensaios de carboidratos alcançando o cólon, com os dados das<br />
modificações resultantes na composição dos nutrientes; novos<br />
estudos da determinação da estrutura do erro nos instrumentos<br />
de análise da ingestão da fibra alimentar; estudos<br />
adicionais de prospecção envolvendo populações com<br />
ingestão heterogênea de fibra, conduzidos em áreas geográficas<br />
diversas, de forma a refletir a diversidade das fontes de<br />
fibra; estudos de intervenção da fibra alimentar em pessoas<br />
com predisposição hereditária para o câncer colorretal, de<br />
forma a testar o paradigma da interação dieta/gene neste tipo<br />
de câncer; repetição dos estudos feitos por Funchs et al. 18 , e<br />
estudos de intervenção da fibra alimentar em diversas áreas<br />
geográficas.<br />
Considerações finais<br />
Como conclusão, pode-se enfatizar que, apesar de não<br />
existir ainda um nível de consenso satisfatório sobre o efeito<br />
protetor das fibras na redução da carcinogênese do cólon, a<br />
maioria dos estudos bem conduzidos apontam para a confirmação<br />
desta hipótese e ademais que este efeito possa também<br />
depender da interação de outros fatores de forma sinérgica,<br />
ainda por serem desvendados.<br />
Analisado sob uma perspectiva mais ampla, pode-se<br />
considerar o consumo de fibras como eficiente na redução de<br />
risco do câncer somente quando acompanhado de outras<br />
estratégias ou estilos de vida, como aquelas definidas como<br />
estratégias para a prevenção do câncer pelo Fundo Mundial<br />
para a Pesquisa em câncer (World Cancer Research Fund,<br />
WCRF - www.wcrf-uk.org): 1) dieta rica em uma variedade<br />
de alimentos de origem vegetal; 2) alto consumo de vegetais<br />
e frutas; 3) manter um peso corporal saudável e um estilo de<br />
vida ativo; 3) não beber ou beber álcool com moderação; 4)<br />
dietas com baixo teor de gordura e sal; 5) preparo e<br />
armazenamento adequado dos alimentos. Neste contexto, há<br />
um consenso global na comunidade cientifica sobre a eficiência<br />
dessas estratégias na redução da incidência do câncer<br />
em geral.<br />
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ARTIGO DE REVISÃO<br />
Resumo<br />
Resumen<br />
Influência da nutrição e atividade física na prevenção da osteoporose<br />
Influence of nutrition and physical activity in the prevention of osteoporosis<br />
Influencia de la nutrición y actividad física en la prevención de la osteoporosis<br />
Amanda de Morais Oliveira 1 , Maria Anunciada Leal Porto 2<br />
Osteoporose é uma doença sistêmica caracterizada pela redução da<br />
massa óssea e deterioração da microarquitetura do tecido ósseo, levando<br />
a sua conseqüente fragilidade e a maior susceptibilidade a<br />
fraturas. O papel atribuído à nutrição e à atividade física está relacionado<br />
ao desenvolvimento da maior e melhor massa óssea possível<br />
durante o crescimento e à proteção do esqueleto contra a perda<br />
de cálcio em longo prazo. Embora a deficiência de vitamina D<br />
também tenha influência no desenvolvimento de menor massa óssea<br />
em algumas populações, a atividade física também atua como um<br />
dos principais coadjuvantes na terapêutica da osteoporose. (Rev<br />
Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208)<br />
UNITERMOS: alimentação, exercício físico, tratamento e prevenção.<br />
Abstract<br />
Osteoporosis is a systemic disease characterised by reduction of bone<br />
mass and deterioration of the microarchitecture of bone tissue<br />
leading to its subsequent frailty and stronger susceptibility to<br />
fractures. The role of nutrition and physical activity is related to the<br />
development of a possible bigger and better bone mass during body<br />
growth and to the protection of the skeleton against calcium loss in<br />
the long run. Although in some populations deficiency of vitamin<br />
D also leads to a low bone mass, physical activity is also one of the<br />
most important aids in the therapeutics of osteoporosis. (Rev Bras<br />
Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208)<br />
KEY WORDS: nutrition, physical exercise, treatment and prevention.<br />
La osteoporosis es una enfermedad sistemica caracterizada por la reducción de la masa ósea y deterioración de la microarquitectura del tejido<br />
óseo las cuales llevan a su consecuente fragilidad y a una mayor susceptibilidad a fracturas. El papel atribuido a la nutrición y la actividad<br />
física se relaciona con el desarrollo de la mayor y mejor masa ósea posible durante el crecimiento y a la protección del esqueleto contra la<br />
pérdida de calcio a largo tiempo. Aunque la deficiencia de vitamina D tenga también su papel en el desarrollo de una baja masa ósea en<br />
algunas poblaciones, la actividad física también actua como uno de los principales coadyuvantes en la terapéutica de la osteoporosis. (Rev<br />
Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208)<br />
UNITÉRMINOS: alimentación, ejercício físico, tratamiento y prevención.<br />
1. Nutricionista formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); 2. Especialista em Atividade Física e suas Bases Nutricionais pela Universidade Veiga<br />
de Almeida (UVA).<br />
Instituição: PSH – Produtos e Serviços Hospitalares. Avenida Norte, 2577, CEP: 52041-080, Recife PE – Brasil.<br />
Endereço para correspondência: Maria Anunciada Leal Porto – Rua Desembargador Antônio Silva Guimarães, n° 44, Apto 302, Casa Caiada, Olinda-PE. CEP: 53030-<br />
010. Telefone: (81) 3431-1896 – E-mail: lili.leal@gmail.com.<br />
Submissão: 27 de fevereiro de 2004<br />
Aceito para publicação: 15 de dezembro de 2004<br />
203
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208<br />
204<br />
Introdução<br />
A atrofia óssea é um problema não só de astronautas e<br />
pacientes acamados, mas também para um número cada vez<br />
maior de idosos e mulheres atletas. Correspondendo à doença<br />
metabólica mais comum, a osteoporose é uma doença caracterizada<br />
pela perda da massa óssea, que afeta especialmente<br />
as mulheres idosas ou com mais de cinqüenta anos de idade,<br />
podendo também afetar aos homens 1 .<br />
A perda óssea normal, que ocorre com o envelhecimento<br />
em ambos os sexos, está ligada à deterioração do colágeno<br />
formador da matriz orgânica dos ossos, bem como ao gradual<br />
desequilíbrio com o processo de remodelação. A aceleração<br />
do processo, que ocorre em mulheres após a menopausa, está<br />
diretamente relacionada com a diminuição de estrogênio. A<br />
perda óssea em homens também acelera-se com o avançar da<br />
idade, mas cerca de 10 anos mais tarde do que em mulheres,<br />
e pode relacionar-se com a diminuição de androgênios 2 .<br />
Para Pinheiro & Szejnfeld 3 , osteoporose é uma “doença<br />
silenciosa”, pois o desgaste do osso pode ocorrer de forma<br />
assintomática. De modo geral, a maioria dos pacientes com<br />
osteoporose generalizada apresenta o primeiro sintoma quando<br />
houve perda de 30% a 40% da massa óssea, o que ocorre<br />
na sexta década de vida ou mais tarde.<br />
Um grande número de fatores de risco pode ser identificado<br />
para osteoporose, como inatividade física, baixa ingestão de<br />
cálcio ou hiperparatireoidismo primário, tabagismo, consumo<br />
de álcool, pouca exposição ao sol, menopausa precoce (antes<br />
dos 40 anos de idade), amenorréia prolongada, entre outros 4 .<br />
Assim, constata-se que a osteoporose não é uma doença de<br />
início agudo, nem um efeito secundário do envelhecimento,<br />
mas de uma vida inteira de hábitos que vão destruindo o sistema<br />
esquelético. Bloomfield 5 relata que, há apenas vinte anos,<br />
alguns profissionais da área de saúde, tais como, nutricionistas,<br />
preparadores físicos e fisiologistas, começaram a se preocupar<br />
com a saúde dos ossos. Nesta época, também, poucos eram os<br />
profissionais que trabalhavam com idosos e poucos os grupos<br />
populacionais que eram diagnosticados tendo osteoporose.<br />
Fernandes et al. 6 dizem que a osteoporose ocupa lugar de<br />
destaque na saúde pública e que o custo do tratamento de fraturas<br />
decorrentes desta patologia é alto. A carência de medidas<br />
preventivas reflete-se no atual quadro da osteoporose, onde o<br />
diagnóstico é feito, normalmente, quando a patologia já está<br />
em fase avançada. Tais fraturas, principalmente as da coluna ou<br />
do quadril, levam a redução da qualidade de vida do paciente,<br />
tendo como resultado a perda da independência de andar.<br />
O isolamento social traz como conseqüências, alterações no<br />
comportamento psicossocial podendo levar à depressão.<br />
Várias são as formas de prevenção da osteoporose, podendo-se<br />
incluir dieta e prática de atividade física. Bloomfield 5<br />
recomenda que seja realizado um programa de exercícios para<br />
reduzir a perda óssea em mulheres idosas, o qual seja baseado<br />
em exercícios com movimentos rápidos alternados aos lentos;<br />
movimentos estáticos; exercícios de natureza aeróbia ou de<br />
resistência, que exceda a 70% da capacidade máxima; exercícios<br />
de impacto como caminhadas, jogging ou salto; exercícios<br />
que envolvam grandes grupos musculares e deslocamentos<br />
em várias direções.<br />
Para Powers 7 , as atividades físicas que envolvam certo<br />
impacto e sustentação do próprio peso corpóreo, como caminhada<br />
e jogging, são melhores do que aquelas em que o peso<br />
corpóreo seja sustentado e que sejam de menor impacto, como<br />
ciclismo e natação, embora estas sejam preferenciais para<br />
aqueles que tenham nível baixo de condicionamento físico<br />
e fraturas pré-existentes.<br />
Quanto aos parâmetros nutricionais, os indivíduos idosos<br />
apresentam alguns desafios, tais como: diminuição na<br />
ingestão de alimentos, diminuição na capacidade de absorção<br />
dos nutrientes e redução na necessidade energética. Estes<br />
fatos explicam porque a dosagem diária de cálcio é maior em<br />
indivíduos com mais de cinqüenta anos. A recomendação da<br />
ingestão de cálcio é de 880 mg/dia, passando a ser recomendada<br />
1000 mg/dia, podendo chegar a 1500 mg/dia, segundo<br />
Paschoal & Raso 8 , para pacientes idosos, sendo necessário, em<br />
alguns casos, suplementação deste mineral.<br />
Com base nas diversas opiniões da literatura científica,<br />
pode-se questionar se o tratamento da osteoporose está relacionado<br />
a uma boa nutrição e prática de atividade física em<br />
pacientes, uma vez que qualquer intervenção em pacientes<br />
osteoporóticos deve propor o aumento da densidade óssea,<br />
prevenção de fraturas e diminuição da dor.<br />
Epidemiologia da osteoporose<br />
Osteoporose é representada como um distúrbio<br />
osteometabólico caracterizado pela diminuição da densidade<br />
mineral óssea (DMO), com deterioração da<br />
microarquitetura óssea, levando a aumento da fragilidade<br />
esquelética e do risco de fraturas 9, 10 .<br />
Estima-se que a incidência de osteoporose na população<br />
brasileira abranja 2,5 milhões de pacientes osteoporóticos 6 .<br />
Entretanto, acredita-se que, nos Estados Unidos, o número de<br />
pessoas com osteoporose atinja níveis de 25 milhões, levando<br />
a uma incidência anual média de 1,5 milhões de fraturas,<br />
com o custo aproximado de 10 bilhões de dólares no cuidado<br />
com à saúde 2 . Segundo Junqueira 36 , deste montante, 80%<br />
das quais são mulheres, sendo que 10 milhões já apresentam<br />
a doença, que mata 37.500 pessoas por ano, em decorrência<br />
de complicações posteriores a fraturas. Projetam-se gastos de<br />
62 bilhões de dólares com fraturas de quadril, nos Estados<br />
Unidos, para o ano de 2020.<br />
Sabe-se, portanto, que as principais manifestações clínicas<br />
da osteoporose são as fraturas, sendo mais freqüentes as de<br />
vértebras, fêmur e antebraço. Porém, as de coluna ou quadril<br />
implicam em uma séria deterioração da qualidade de vida do<br />
paciente. A perda de independência, decorrente da incapacidade<br />
de deambular, é a principal conseqüência da fratura<br />
de quadril, seja pela limitação funcional, seja pelo medo de<br />
quedas. Estas têm grande importância na sociedade brasileira<br />
considerando o seu envelhecimento progressivo com graves<br />
conseqüências físicas, financeiras e psicossociais, afetando<br />
o indivíduo, a família e a comunidade 3, 9 .<br />
Estudos consideram que a prevalência de osteoporose e<br />
incidência de fraturas variam de acordo com o sexo e a raça.<br />
Em pesquisa realizada no sul do Brasil, Volkmann & Castro 11<br />
evidenciaram que a incidência é encontrada especialmente
na população branca; porém, deve-se considerar a grande<br />
miscigenação da população brasileira, tendo em vista a menor<br />
incidência de fraturas nos indivíduos da raça negra.<br />
Assim, Fernandes et al. 6 ressaltam, que mulheres, em geral<br />
de raça branca, de baixa estatura e magras, com história<br />
familiar, menopausa prematura ou cirúrgica e com ausência<br />
da terapia de reposição estrogênica, são tradicionalmente<br />
consideradas como fatores de risco para a osteoporose. Pinto<br />
Neto et al. 9 também confirmam a possibilidade de que, a partir<br />
dos 50 anos, 30% das mulheres e 13% dos homens poderão<br />
sofrer algum tipo de fratura por osteoporose ao longo da vida.<br />
Segundo Waitzberg 12 , fatores hormonais, nutricionais e<br />
ambientais superpõem-se aos fatores genéticos favorecendo<br />
ou impedindo o desenvolvimento de um pico de massa óssea<br />
adequada e a posterior manifestação da doença.<br />
Para Lanzillotti et al. 4 , o pico de massa óssea, geralmente,<br />
não é alcançado antes dos 30 anos e o estilo de vida é um<br />
importante determinante da probabilidade de desenvolver<br />
osteoporose. Entretanto, Wiggins & Wiggins 13 , afirmam que<br />
este pico ocorre geralmente entre 18 e 25 anos de idade, sendo,<br />
no sexo feminino, por volta dos 20 anos e talvez 16 anos<br />
nas mulheres com puberdade precoce. Em contrapartida,<br />
Nattiv & Armsey 14 e West 15 afirmam que até os 18 anos 90%<br />
da massa óssea já se formou, pois o ápice ocorre durante o<br />
estirão da adolescência.<br />
A maior causa de perda óssea e osteoporose na mulher é a<br />
redução do nível dos estrógenos circulantes, geralmente associados<br />
à menopausa; entretanto, qualquer causa de deficiência<br />
estrogênica pode levar à osteoporose, uma vez que tais<br />
hormônios mantêm o equilíbrio metabólico do tecido ósseo 12 .<br />
Assim, acredita-se que, entre 40 anos e a menopausa, as<br />
mulheres perdem em média 0,3% a 0,5% de massa óssea<br />
cortical por ano, após a menopausa o risco acelera para 2% a<br />
3% ao ano podendo acelerar novamente após os 70 anos 12 .<br />
Segundo Bloomfield 5 , a aceleração das perdas ósseas dos três<br />
a cinco primeiros anos após a detecção no declínio dos<br />
estrógenos, causados pela ausência de menstruação, está muito<br />
bem documentada e resulta em uma perda de massa óssea da<br />
ordem de 3 a 5% por ano nesse período.<br />
Mahan & Escott-Stump 2 explicam que, na meia idade, a<br />
baixa ingestão de cálcio e a falta de atividade física levam à<br />
diminuição progressiva de massa óssea. Na menopausa, o fator<br />
crítico é a queda dos níveis de estrógeno, o que diminui a<br />
absorção intestinal de cálcio e aumenta a sensibilidade dos<br />
ossos à ação do paratormônio 22 .<br />
No homem, entretanto, a perda óssea é mais lenta e uniforme<br />
em todos os sítios esqueléticos, alcançando níveis anuais<br />
médios de 0,2 a 0,5%, sendo a idade crítica para os homens<br />
os 80 anos 12 e, como os homens costumam manter atividade<br />
física de maneira mais consistente do que as mulheres e como<br />
não há queda abrupta na produção de hormônios sexuais, os<br />
problemas da osteoporose aparecem em idade mais avançada<br />
no sexo masculino.<br />
Osteoporose e nutrição<br />
A massa óssea adequada a cada indivíduo está associada a<br />
uma boa nutrição, que deve ser constituída de uma dieta ba-<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208<br />
lanceada, com quantidade de calorias adequada e<br />
suplementação de cálcio e vitamina D, quando necessário. Em<br />
relação ao esqueleto, o nutriente mais importante é o cálcio.<br />
Sua ingestão está relacionada com a obtenção do pico de massa<br />
óssea, assim como a prevenção e o tratamento da osteoporose 9 .<br />
Muitos fatores nutricionais tem sido examinados em associação<br />
com a osteoporose e a massa óssea. O cálcio, o fósforo,<br />
os minerais traço e a proteína são componentes do tecido<br />
ósseo. A vitamina D regula o balanço de cálcio e vários<br />
outros nutrientes interagem com a absorção e excreção de<br />
cálcio. Assim, a ingestão dietética desses nutrientes pode afetar<br />
a massa óssea, contudo espera-se que a força de associação<br />
possa variar de acordo com a fase em desenvolvimento, o<br />
status da menopausa e a ingestão habitual dos indivíduos 8 .<br />
A vitamina D, além de ser importante para a absorção de<br />
cálcio, também age diretamente para estimular o aumento de<br />
cálcio pelos ossos. Por essa razão, alta ingestão de vitamina D<br />
mostra-se relacionada à melhora da saúde óssea. O hormônio<br />
calcitonina, que é produzido pela glândula tireóide, está também<br />
envolvido na regulação do cálcio sérico 16 .<br />
Fatores endógenos e exógenos controlam a biodisponibilidade<br />
de cálcio. Os fatores endógenos são: idade, sexo,<br />
gravidez e lactação. Os exógenos incluem variáveis dietéticas<br />
que podem influenciar a absorção de cálcio, como a vitamina<br />
D, fibra dietética, fitato, oxalato, fosfopeptídeos, gordura,<br />
lactose e inúmeras variáveis dietéticas que podem influenciar<br />
a excreção urinária de cálcio, como sódio, fósforo, proteína,<br />
clorido de amônia, álcool e cafeína 8 .<br />
Alimentos que são naturalmente ricos em fitato e fibras<br />
tendem a ter maiores conteúdos de mineral que alimentos<br />
refinados, pois a quantidade total de cálcio disponível pode<br />
ser maior nos alimentos não processados 17 . Os fitatos representam<br />
compostos formados durante o processo de maturação de<br />
sementes e grãos de cereais integrais e feijões, podendo se<br />
complexar com minerais como cálcio, o ferro, o zinco e com<br />
as proteínas. Em virtude de presença de fitato, o balanço de<br />
cálcio tem sido alterado por dietas ricas em fibras 18 .<br />
Avenell et al. <strong>19</strong> demonstraram que o uso de dietas ricas em<br />
fibras na redução de peso em mulheres na pós-menopausa<br />
aumenta significativamente a perda óssea, pois a ingestão<br />
excessiva de fibras pode interferir na absorção de cálcio conduzindo<br />
ao risco de desenvolvimento de osteoporose 2 .<br />
Considerando a população que não consome produtos<br />
lácteos, a média de ingestão de cálcio deve ser maior que<br />
3000 mg/dia, pois em média, somente cerca de 20% do cálcio<br />
dos legumes é absorvido, embora dos vegetais verdes,<br />
cerca de 50% do cálcio seja absorvido 20 .<br />
Estudos têm estimado que a ingestão excessiva de proteína<br />
poderia responder por uma perda de 10% a 15% de massa<br />
óssea por ano, que é tipicamente observado em mulheres<br />
na pré-menopausa. O efeito hipercalciúrico da proteína é<br />
geralmente atribuído aos aminoácidos sulfurosos metionina<br />
e cisteína, os quais são metabolizados para sulfato e hidrogênio,<br />
resultando em um ácido cinza. A suplementação de<br />
metionina resulta em diminuição do pH urinário e em aumento<br />
da excreção urinária de cálcio. A proteína também causa<br />
aumento no índice de filtração glomerular, que aumenta a<br />
excreção de cálcio 8 .<br />
205
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):203-208<br />
Proteínas animais são relativamente altas em<br />
aminoácidos sulfurosos, enquanto que as proteínas de origem<br />
vegetal como as dos legumes, são relativamente baixas. Conseqüentemente,<br />
estas resultarão em menor excreção de cálcio.<br />
Alta ingestão de sódio aumenta o risco de osteoporose,<br />
pois aumenta a excreção de cálcio por inibir a reabsorção<br />
renal tubular de cálcio: para cada grama ou mais de sódio<br />
ingerido, a perda urinária de cálcio aumenta entre 20 mg a 40<br />
mg. Nordim et al. 21 estimam que uma mulher jovem, que<br />
consome uma dieta pobre em proteína e sódio, necessita somente<br />
de 450 mg de cálcio para manter o balanço de cálcio,<br />
enquanto que a mesma mulher, consumindo uma dieta rica<br />
em proteína e sódio, necessitará de mais de 2000 mg de cálcio<br />
por dia 8 .<br />
O papel atribuído à nutrição relaciona-se ao desenvolvimento<br />
da maior e melhor massa óssea possível, durante o<br />
crescimento, e à proteção do esqueleto contra a perda de<br />
cálcio a longo prazo, embora a deficiência de vitamina D<br />
também influencie no desenvolvimento de uma baixa massa<br />
óssea em algumas populações 9 .<br />
206<br />
Osteoporose e atividade física<br />
A atividade física atua como um dos principais coadjuvantes<br />
na terapêutica da osteoporose. Níveis adequados de<br />
atividade física na adolescência também são importantes<br />
para que as pessoas alcancem massa óssea máxima, que se<br />
admite ser o parâmetro mais importante para se prever a futura<br />
osteoporose 8, 22 .<br />
A aquisição de massa óssea é gradual durante a infância<br />
e acelerada durante a adolescência, até o indivíduo atingir a<br />
maturidade sexual. Quase 50% da massa óssea é adquirida<br />
nessa fase, pois o acúmulo de cálcio é triplicado 23 .<br />
Wolinsky & Hickson Jr. 24 explicam que a atividade física<br />
tem efeito benéfico sobre a manutenção de minerais ósseos<br />
e que o conteúdo desses minerais é maior em indivíduos<br />
ativos e atléticos do que entre os sedentários. Assim, constata-se<br />
que o sedentarismo não é somente fator do risco para<br />
doenças cardiovasculares, mais também para as doenças do<br />
sistema esquelético, sendo um dos fatores que predispõem o<br />
desenvolvimento da osteoporose 25 .<br />
Muitos fatores são discutidos tais como se a atividade<br />
física produz mudanças no nível do osso, aumentando a massa<br />
óssea. Supõe-se que durante a atividade física, com a contração<br />
da musculatura, ocorre deformação óssea e o osso interpreta<br />
esta deformação como um estímulo à formação 9 .<br />
Para Mahan & Escott-Stump 2 , o exercício com suporte de<br />
peso acrescentados como na musculação, que envolve o<br />
puxão do músculo contra o osso e ambos contra a gravidade,<br />
protegem contra a perda de massa óssea, estimulando a atividade<br />
do osteoblasto – célula associada à formação óssea.<br />
Mussoline et al. 26 , em estudo realizado com a associação<br />
da atividade física e a densidade mineral óssea (DMO) em<br />
homens, constataram que 23,3% praticaram atividade física<br />
no mês anterior ao estudo e a atividade física foi associada<br />
com o aumento da DMO. A DMO média foi 5,5% maior<br />
naqueles que praticaram atividade física comparados com<br />
aqueles que não praticaram e 7,7% maior comparado com os<br />
sedentários. Os que praticaram atividade física nove ou mais<br />
vezes por mês apresentaram maiores níveis de DMO comparados<br />
com aqueles que praticaram atividade física uma a oito<br />
vezes por mês.<br />
Mais recentemente, Pinto Neto et al. 9 verificaram a vantagem<br />
da atividade física com carga sobre a atividade aeróbia<br />
em indivíduos idosos. Para os autores, a atividade física deve<br />
ser feita por pelo menos três vezes por semana, em dias alternados,<br />
durante no mínimo 30 minutos. Exercícios mais leves<br />
podem ser realizados diariamente (caminhadas), enquanto<br />
que exercícios mais pesados (exercícios repetidos por até<br />
quinze vezes, com dificuldade média), devem ser realizados<br />
entre 24 horas e 48 horas de intervalo.<br />
Bloomfield 5 ressalta a importância das atividades físicas,<br />
pois, com a prática de exercícios variados de intensidade<br />
moderada e alta ao invés de só um tipo de exercício, mulheres<br />
na pós-menopausa obtiveram melhores resultados com<br />
relação ao ganho de massa óssea. Para Santarém 22 , exercícios<br />
com pesos não são apenas os mais eficientes para aumentar a<br />
massa óssea, mas também para aumentar a massa e a força dos<br />
músculos esqueléticos. Adicionalmente, melhoram a flexibilidade<br />
e a coordenação, evitando quedas em pessoas idosas,<br />
que poderiam produzir fraturas em ossos osteoporóticos.<br />
Velásquez 25 confirma que o tipo de atividade física relacionada<br />
ao aumento na densidade da massa óssea é o treinamento<br />
da força, pois o treinamento aeróbio, embora produza<br />
outros benefícios ao organismo, não está muito associado com<br />
a melhoria e o aumento na massa óssea.<br />
Michel et al. 27 advertem, porém, que enquanto o exercício<br />
moderado de levantamento de peso aumenta a densidade<br />
óssea, o exercício extremamente vigoroso pode realmente<br />
ser danoso à densidade do osso. Deve-se tomar cuidado<br />
especial com os indivíduos que apresentam osteoporose grave<br />
e fragilidade óssea pois, nestes casos, podem ocorrer lesões<br />
de coluna cervical, mesmo com exercícios sem impacto, e isto<br />
também pode ocorrer com exercícios de flexão 5 .<br />
Apesar de não haver dúvidas quanto aos benefícios do<br />
exercício para a saúde, em geral, não existem evidências de<br />
que o exercício isoladamente possa afastar os efeitos negativos<br />
do hipoestrogenismo 9 .<br />
Para Vilardi et al. 28 , as conseqüências, a longo prazo, de<br />
um estado hipoestrogênico crônico em atletas jovens incluem<br />
a perda de massa óssea, muitas vezes irreversível. Atletas<br />
jovens amenorréicas podem apresentar massa óssea menor do<br />
que as que sempre mantiveram ciclos menstruais normais,<br />
menor até mesmo do que muitas mulheres na pós-menopausa<br />
e, conseqüentemente, risco aumentado de osteoporose.<br />
Peterson et al. 29 , estudando corredoras com idade entre 16 e<br />
30 anos, concluíram que as atletas amenorréicas com<br />
hipoestrogenismo possuíam menor quantidade de massa óssea<br />
em relação a outras atletas.<br />
Atualmente, observa-se grande adesão às atividades físicas<br />
realizadas no meio líquido, como natação e hidroginástica,<br />
especialmente pelas propriedades físicas da água, que<br />
permitem a indivíduos, com as mais diversas limitações, realizarem<br />
movimentos dentro das suas capacidades físicas, sem<br />
o mesmo risco de sobrecarga que ocorreria se estivessem se<br />
exercitando em terra 30 .
Uma pesquisa realizada em Israel, relata aumentos<br />
significantes na DMO, em mulheres pós-menopausa, após<br />
participarem de um programa de exercícios aquáticos por 15<br />
meses, três vezes por semana, apresentando aumento maior do<br />
que o grupo que realizou o exercício em terra e do que o grupo<br />
controle 31 .<br />
A natação é considerada uma atividade não traumática,<br />
pois não envolve o levantamento de peso, mas que pode<br />
contribuir para a densidade até certo ponto 2,24 .<br />
Embora ainda não se saiba qual a melhor atividade física<br />
para o combate da osteoporose, pode-se afirmar que o<br />
exercício físico exerce influência forte e positiva na prevenção<br />
e recuperação parcial da doença. Com a prática de atividades<br />
físicas, pode-se inferir que o condicionamento e o treinamento<br />
sistemático das capacidades e qualidades físicas -<br />
força, flexibilidade, resistência, equilíbrio, coordenação<br />
motora e capacidade cardiorrespiratória - poderão influir na<br />
prevenção de quedas. Destarte, a hidroginástica pode ser classificada<br />
como uma atividade importante no combate aos<br />
efeitos deletérios da diminuição da massa óssea 32 .<br />
Tratamento e prevenção<br />
Predispõem à osteoporose fatores que induzem a um baixo<br />
pico de massa óssea e aqueles que são responsáveis por<br />
perda excessiva ou baixa produção.<br />
Uma feição comum do paciente osteoporótico é o balanço<br />
de cálcio negativo, devido à maior perda do que retorno<br />
deste mineral no esqueleto. A ingestão de cálcio, a partir do<br />
nascimento, principalmente na infância e juventude, aliada<br />
ao exercício físico regular é um fator de prevenção de<br />
desmineralização óssea posterior, pois se o exercício está vinculado<br />
ao suplemento de cálcio, atingindo um consumo diário<br />
de aproximadamente 1800 mg/dia, reduz-se<br />
significantemente a perda óssea no sítio dos quadris 4 .<br />
Segundo Pinto Neto et al. 9 , suplementos de cálcio e alimentos<br />
fortificados são fontes importantes deste mineral. Tais<br />
suplementos são disponíveis em vários tipos de sais. A absorção<br />
do citrato de cálcio é menos dependente da presença de<br />
ácido gástrico, e o carbonato de cálcio necessita da presença<br />
do ácido gástrico para sua dissolução.<br />
No idoso, o maior objetivo da prevenção é minimizar as<br />
perdas de massa óssea e evitar as quedas. Dados estatísticos têm<br />
sistematicamente demonstrado que 30% das pessoas com<br />
mais de 65 anos, na maioria das comunidades, caem pelo<br />
menos uma vez por ano, sendo que esta incidência pode chegar<br />
a 50% quando idades mais avançadas são consideradas<br />
(acima de 85 anos) ou com idosos residentes em instituições<br />
33 .<br />
Para Spirduso 34 , o exercício contribui para a prevenção<br />
de quedas na população idosa, mediante diferentes mecanismos,<br />
os quais incluem o fortalecimento dos músculos das<br />
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corporal; melhora da mobilidade e diminuição do risco de<br />
doença cardiovascular. Segundo Carvalhaes et al. 37 , projetos<br />
de exercícios com duração de 10 semanas a 9 meses mostraram<br />
que há um redução em 10% da probabilidade de queda<br />
entres os que se exercitam em comparação com sedentários;<br />
além de que o treinamento específico para equilíbrio motivou<br />
uma redução de 25% de quedas; e aulas de Tai Chi Chuan<br />
(um exercício de equilíbrio), reduzem o risco de cair em<br />
37%.<br />
Lanzillotti et al. 4 relatam que o sucesso na prevenção da<br />
osteoporose está na adoção de novos hábitos de vida, buscando<br />
a interação entre a terapia de reposição hormonal (nas<br />
mulheres), dieta e exercício físico. O consumo de dieta que<br />
atenda as recomendações de cálcio deve ser incentivado na<br />
prevenção da osteoporose primária, tornando-se necessário<br />
investir em educação nutricional para crianças, jovens e<br />
adultos.<br />
Segundo Waitzberg 12 , a terapia de reposição hormonal<br />
ainda pode ser considerada a melhor forma terapêutica para<br />
a osteoporose pós-menopausa, pois a fase acelerada de perda<br />
óssea que acomete 40% das mulheres após a menopausa é<br />
responsável por 30% a 50% de todo osso perdido ao longo de<br />
suas vidas. Portanto, o tratamento deve ser iniciado precocemente<br />
a fim de prevenir a queda inicial de massa óssea; desta<br />
forma, consegue-se diminuir em 50% a incidência de fraturas.<br />
A reposição hormonal deve ser mantida pelo menos cinco<br />
a oito anos, correspondendo ao período do climatério em<br />
que o remodelamento ósseo é mais acelerado.<br />
Algumas pessoas, geralmente mulheres brancas, apresentam<br />
geneticamente poucos receptores para vitamina D, o que<br />
leva à diminuição da absorção intestinal de cálcio. Nessas<br />
pessoas, a ingestão ideal de cálcio e vitamina D pode ser<br />
importante para a manutenção de massa óssea, que posteriormente<br />
tende a diminuir 22 . Assim, exposição solar adequada<br />
é necessária para a produção de vitamina D na pele. Embora<br />
considerada atualmente um hormônio, permanece chamada<br />
de vitamina, pois acredita-se ser proveniente da dieta sua<br />
maior fonte de origem externa 9 .<br />
Feskanich et al. 35 , avaliando a relação entre risco de fratura<br />
óssea e o consumo de vitamina D em mulheres pós-menopausa,<br />
identificaram 603 incidentes de fraturas derivadas<br />
de trauma leves e moderados. As mulheres que consumiram<br />
12,5 mg ou mais de vitamina D por dia, derivada de alimentos<br />
e suplementos dietéticos, apresentaram risco 37% menor<br />
de fratura do que as mulheres que consumiram menos do que<br />
3,5 mg por dia. Os autores concluíram que a ingestão de suplementos<br />
e alimentos ricos em vitamina D pode beneficiar<br />
as mulheres que não ingerem as necessidades recomendadas<br />
desta vitamina 35 .<br />
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e Gerontologia - GERP’98, São Paulo, 24 a 27/06/<strong>19</strong>98, p.5-18.
ARTIGO DE REVISÃO<br />
Resumo<br />
Resumen<br />
Obesidade e dislipidemia: uma preocupação cada vez mais precoce<br />
Obesity and dyslipidemia: a precocious concern<br />
Obesidad y dislipidemia: una preocupación cada vez más precoz<br />
A obesidade impõe uma série de riscos para enfermidades crônicas<br />
não transmissíveis, entre os quais as dislipidemias. A prevalência de<br />
obesidade e sobrepeso está aumentando mundialmente, até mesmo<br />
nos países emergentes e isso tem sido observado não só em adultos,<br />
como em crianças de todas as idades. Há evidências que o consumo<br />
dietético na primeira infância está relacionado à obesidade e aos<br />
fatores de risco de doenças coronarianas e, nessa fase, altos níveis<br />
de colesterol sérico são preditores para altos níveis na fase<br />
adulta.Vários estudos apontam para aumento do consumo de<br />
gordura total na dieta de crianças e adolescentes, fato que merece<br />
atenção e intervenção, considerando que a consolidação dos hábitos<br />
alimentares durante a infância será fundamental para a formação<br />
do estilo de vida na idade adulta. O melhor conhecimento das<br />
alterações metabólicas na obesidade e nas dislipidemias possibilita<br />
a prevenção e tratamento nutricional mais adequado o que motivou<br />
a elaboração da presente revisão. (Rev Bras Nutr Clin 2004;<br />
<strong>19</strong>(4):209-215)<br />
UNITERMOS: obesidade, dislipidemia, colesterol, infância, hábito<br />
alimentar, gordura dietética.<br />
Edeli Simioni de Abreu 1 , Mônica Glória Neumann Spinelli 2<br />
Abstract<br />
Obesity imposes several risks to non-transmissible chronic diseases,<br />
among them the dyslipidemias. The obesity and overweight<br />
prevalence is increasing all around the world, even in developing<br />
countries, affecting adults and children. There are evidences that<br />
infant dietetic consume is related to obesity and cardiovascular<br />
diseases, and high serum cholesterol levels in childhood can predict<br />
high levels further on. A lot of studies point out a total fat consume<br />
raise among children and adolescents, what deserves attention<br />
and intervention, considering that dietetic habits consolidated in<br />
childhood will develop life style in adulthood. Better knowledge of<br />
obesity and dyslipidemic metabolic changes allows prevention and<br />
more adequate nutritional treatment, what motivated this review.<br />
(Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215)<br />
KEY WORDS: obesity, dyslipidemia, cholesterol, childhood, dietetic<br />
habits, dietetic fat.<br />
La obesidad impone una serie de riesgos para enfermedades crónicas no transmisibles, entre ellos las dislipidemias. La prevalencia de obesidad<br />
y sobrepeso está aumentando mundialmente, hasta mismo en países emergentes e esto está siendo observado no solamente en adultos, como<br />
en niños de todas las edades. Hay evidencias que el consumen dietético en la primera infancia está relacionado con la obesidad y los factores<br />
de riesgo de enfermedades coronarianas y, en esta fase altos niveles de colesterol sérico pronostican altos niveles en la edad adulta. Varios<br />
estudios apuntan para un aumento de la ingestión de grasa total en la dieta de los niños y adolescentes, hecho que merece atención y<br />
intervención, considerando que la consolidación de los hábitos alimentares durante la infancia es fundamental para la formación del estilo<br />
de vida en la edad adulta. El mejor conocimiento de las alteraciones metabólicas en la obesidad y en las dislipidemias posibilita la prevención<br />
y tratamiento nutricional más adecuado lo que motivó la elaboración de esta revisión. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215)<br />
UNITÉRMINOS: obesidad, dislipidemia, colesterol, infancia, hábito alimentar, grasa dietética.<br />
1. Professora Doutora em Nutrição em Saúde Pública, pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo. Professora Adjunta do Curso de<br />
Nutrição da UniABC; 2. Professora Doutora em Nutrição em Saúde Pública, pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo. Professora<br />
Assistente dos Cursos de Nutrição da UMC e da UMESP e Professora Adjunta do Curso de Nutrição da UNIP.<br />
Endereço para correspondência: Mônica Glória Neumann Spinelli - Rua Itacolomi, 293 – apto. 81 - São Paulo – CEP 01239 020 - Telefone: 3129-3696 - E-mail:<br />
spinelli@usp.br<br />
Submissão: 22 de julho de 2003<br />
Aceito para publicação: 15 de dezembro de 2004<br />
209
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215<br />
210<br />
Introdução<br />
O termo obesidade refere-se a uma doença crônica, recorrente,<br />
que afeta milhões de pessoas no mundo e descreve o excesso<br />
de gordura corpórea armazenada, enquanto que<br />
sobrepeso é simplesmente o excesso de peso corpóreo em<br />
relação à altura. Na prática, entretanto, estas duas condições<br />
são mais freqüentemente tratadas como estágios dentro de<br />
uma série contínua de relações entre peso e altura 1 .<br />
A obesidade pode ser decorrente de causas endógenas<br />
(provocadas por síndromes somáticas dismórficas, lesões do<br />
sistema nervoso central, endocrinopatias) ou exógenas (resultantes<br />
da ingestão excessiva, quando comparada ao consumo<br />
energético do indivíduo). A distinção entre as duas é de grande<br />
importância, visto que as provocadas por causas endógenas<br />
devem ser tratadas no sentido de corrigir os distúrbios de base,<br />
com a normalização dos índices ponderais. As causas exógenas<br />
são as responsáveis pela maior parte dos casos de obesidade.<br />
Estudos relacionados com gêmeos mono e dizigóticos têm<br />
permitido uma separação entre os fatores genéticos (que exercem<br />
um papel de primordial importância na etiologia) e os<br />
ambientais (que são apenas agravantes) 2 .<br />
O excesso de gordura corpórea ocorre quando o total de<br />
consumo de energia, na forma de alimentos, excede o seu<br />
dispêndio, na forma de metabolismo em repouso e atividades<br />
físicas adicionais. Tanto a ingestão excessiva quanto o baixo<br />
dispêndio energético podem ser o fator causador, porém, em<br />
muitos casos, parece que ambos atuam conjuntamente 3 . É<br />
quase certo, portanto, que haja um elemento genético na<br />
variação de peso corpóreo 4,5 . Qualquer que seja a natureza de<br />
qualquer predisposição genética à obesidade está claro que<br />
os níveis relativos de ingestão e dispêndio de energia são<br />
cruciais no desenvolvimento do excesso de peso. Da mesma<br />
forma, não há evidência que a taxa de dispêndio de energia<br />
durante exercícios de alto rendimento esteja relacionada com<br />
a hereditariedade 6 .<br />
Ao mesmo tempo é impossível que a genética sozinha seja<br />
suficiente para explicar o aumento maciço da obesidade como<br />
tem ocorrido mundialmente nos últimos 20 anos e, inquestionavelmente,<br />
o meio ambiente desempenha um papel importante,<br />
quando permite a expressão da predisposição genética 7 .<br />
Neste contexto, a mudança ambiental mais importante<br />
dos últimos tempos pode ser a bem documentada alteração<br />
no padrão típico da dieta e atividades físicas que têm ocorrido<br />
nos países industrializados. Tem havido um grande aumento<br />
no consumo de gorduras acompanhado do sedentarismo<br />
da vida da maioria das pessoas. Essas tendências foram<br />
percebidas primeiramente nos Estados Unidos e se espalharam<br />
desde então para outros países 8 .<br />
Mesmo nos países com dietas tradicionalmente mais saudáveis,<br />
como no sul da Europa, as pessoas estão comendo mais<br />
gordura do que no passado 9 . Parte do problema pode ser<br />
explicada por uma preferência inata por alimentação gordurosa,<br />
sendo a gordura responsável pelo sabor e prazer de comer.<br />
Acredita-se que a gordura envie apenas sinais fracos de<br />
saciedade do trato gastrintestinal para os centros controladores<br />
do apetite no cérebro. Essa situação se contrasta intensamente<br />
com a de outros macronutrientes. Há um consenso<br />
geral que a proteína tem um efeito poderoso de saciedade e<br />
há evidências de que os carboidratos produzem uma eficaz<br />
inibição do apetite a curto prazo 9 . Em outras palavras, uma<br />
refeição rica em proteínas e carboidratos gera sinais que são<br />
enviados para o cérebro e freiam o apetite, enquanto que a<br />
gordura, o macronutriente que menos gera saciedade, faz com<br />
que o indivíduo continue comendo por mais tempo e, conseqüentemente,<br />
coma mais.<br />
Em longo prazo, a obesidade impõe uma série de perigos<br />
médicos, entre os quais a resistência à insulina e o desenvolvimento<br />
do diabetes mellitus não insulino-dependente; diminuição<br />
da tolerância à glicose; hiperinsulinemia; hiperlipidemias,<br />
em geral, elevados níveis de triglicérides e de<br />
colesterol, em especial a fração LDL e hirpertensão arterial 10 .<br />
Epidemiologia nutricional<br />
A prevalência de obesidade e sobrepeso não apenas está<br />
aumentando mundialmente, como também está incidindo<br />
em faixas etárias mais jovens. Tem-se observado maior<br />
prevalência de obesidade em crianças de todas as idades. A<br />
proporção de pré-escolares, escolares e adolescentes classificados<br />
como sobrepeso tem sofrido grande aumento nos anos<br />
90, após relativa estabilidade entre as décadas de 60 e 70 11 .<br />
Esta obesidade é difícil de ser tratada e pode ter conseqüências<br />
adversas tanto físicas quanto emocionais e sociais. Crianças<br />
com sobrepeso têm maior chance de se tornarem adultos<br />
obesos. Um escolar com um dos pais obeso tem 70% de chance<br />
de se tornar um adulto obeso.<br />
Estudos na Inglaterra mostraram sobrepeso e obesidade,<br />
em pré-escolares, acima dos estimados 15% e 5% de uma<br />
distribuição normal. Nos Estados Unidos, alguns estudos<br />
mostram que a prevalência de obesidade aumentou 54% em<br />
crianças de 6 a 11 anos e 39% em adolescentes de 12 a 17<br />
anos, entre as décadas de 60 e 80 12 e outros, de 8% a 14% em<br />
crianças de 6 a 12 anos e de 6% a 12% em adolescentes de 13<br />
a 17 anos, entre <strong>19</strong>76 e <strong>19</strong>94 13 . Os dados disponíveis para<br />
estimar prevalência estão longe de estarem completos e representam<br />
apenas respostas a inquéritos limitados, apesar de<br />
disponibilizarem informações importantes. A diferença de<br />
métodos, de pontos de corte e material de referência utilizados,<br />
limitam até o presente momento, o valor desses estudos,<br />
pela falta da possibilidade de comparação internacional 14 .<br />
Apesar disto, a França, os Países-Baixos, os Estados Unidos, o<br />
Reino Unido têm apontado recentes aumentos na prevalência<br />
de sobrepeso entre crianças e adolescentes.<br />
Nos países em desenvolvimento, as causas deste aumento<br />
ainda são pouco estudadas, porém, provavelmente, incluam<br />
mudanças rápidas e extremas no estilo de vida, na atividade<br />
física e no padrão da dieta que acompanham a urbanização<br />
e o desenvolvimento econômico.<br />
Na medida em que aumenta a disponibilidade de energia<br />
nos países emergentes, o risco da obesidade também aumenta.<br />
Hoje em dia são gastos centenas de milhões de dólares<br />
para abordar a questão da perda de peso, refletindo a preocupação<br />
existente com as conseqüências fisiológicas, sociais<br />
e psicológicas acarretadas pelo excesso de peso 15 .<br />
Estudos epidemiológicos mostram que o sobrepeso na
idade jovem está associado com o sobrepeso no adulto e a<br />
obesidade na infância aumenta de 50% a 80% a taxa de<br />
mortalidade do adulto. Por este motivo e pelo aumento dos<br />
riscos de morbi-mortalidade, o estudo do sobrepeso em crianças<br />
e adolescentes está se tornando uma preocupação da saúde<br />
pública 16,17,18,<strong>19</strong>,20 e as intervenções para prevenir a obesidade<br />
devem ser iniciadas mais precocemente, começando na<br />
idade do pré-escolar ou mesmo no nascimento 21 .<br />
Obesidade na infância e adolescência<br />
Definir obesidade ou sobrepeso para crianças e adolescentes<br />
é difícil e não há uma definição geral aceita. Uma variedade<br />
de critérios têm sido utilizados para avaliar prevalências<br />
e tendências entre crianças e adolescentes 2,17,22 . Em determinadas<br />
situações, a condição de obesidade é tão óbvia, que é<br />
possível identificá-la sem o uso de índices específicos. O<br />
acúmulo excessivo e generalizado de gordura subcutânea e<br />
em outros tecidos define a obesidade e pode ser quantificado<br />
de várias formas, como o estudo da composição corporal, em<br />
que se separa a massa magra (principalmente músculo) da<br />
massa gorda (tecido adiposo). Isto pode ser feito por absorção<br />
diferencial de dois feixes de raios X com energias diferentes,<br />
método DEXA (dual emission X-Ray absorptionmetry), por<br />
impedanciometria, ou pelo uso de índices ou pregas<br />
cutâneas 2 . Mulligan & Voss 23 consideram a distribuição de<br />
gordura visceral como melhor preditor de subseqüente<br />
morbidade.<br />
Em <strong>19</strong>95, a Organização Mundial da Saúde recomendou<br />
a utilização do índice de massa corporal (IMC) para crianças,<br />
pois é um índice que oferece inúmeras vantagens por ser estabelecido<br />
a partir de medidas simples (peso/estatura), colhidas<br />
rotineiramente. Contrário às curvas peso/idade e peso/<br />
altura, as curvas do IMC segundo idade compreendem simultaneamente<br />
as três variáveis: peso, altura e idade. Entretanto,<br />
como todos os métodos baseados em peso e altura apresenta<br />
suas limitações. Particularmente, esse método não distingue<br />
a parte de massa gorda e da massa magra como fariam os<br />
métodos mais elaborados. A utilização do IMC não pode ser<br />
considerada como um novo método de avaliação da composição<br />
corporal, e sim, como uma melhoria dos métodos clássicos<br />
existentes baseados no peso e altura. A evolução do IMC<br />
reflete bem a evolução da massa gorda avaliada por outros<br />
métodos, como, por exemplo, o das pregas cutâneas 24 . Há pelo<br />
menos três fatores que potencialmente podem confundir o uso<br />
do IMC em diferentes populações. Primeiro – é necessário um<br />
número maior de estudos com grupos étnicos para que este<br />
índice seja utilizado com maior segurança para populações.<br />
Segundo – estudos comparativos do IMC com a porcentagem<br />
de gordura corporal realizados, não excluem a possibilidade<br />
de que IMC acima do percentil 95 possa fornecer uma medida<br />
mais acurada para identificar crianças e adolescentes com<br />
aumento de gordura corporal. Por último, uma desnutrição<br />
pregressa pode comprometer a validade do IMC 25 .<br />
O índice de massa corporal na infância muda substancialmente<br />
com a idade. Cole et al. 26 propõem pontos de corte<br />
relacionados com a idade utilizando como referência<br />
percentis e baseados no ponto de corte para adultos,<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215<br />
referenciado internacionalmente, de 25 e 30 kg/m 2 . Os Estados<br />
Unidos e a Inglaterra recomendam os percentis 85 e 95 de<br />
IMC para idade e sexo como pontos de corte para sobrepeso<br />
e obesidade, respectivamente. Essa definição estabelece que<br />
se espera encontrar 15% de crianças com sobrepeso e 5%<br />
obesas. O corte utilizado para definir obesidade não é arbitrário:<br />
crianças com índice de massa corporal acima do percentil<br />
95 são excessivamente gordas e a obesidade definida nesses<br />
termos tem uma grande possibilidade de persistir na idade<br />
adulta e estar relacionada a vários efeitos adversos na saúde<br />
12,26 .<br />
A falta de evidência de aumento generalizado de consumo<br />
energético, em jovens, apesar de aumento na prevalência<br />
de obesidade, sugere que a inatividade física é o maior desafio<br />
de saúde pública para esta faixa etária 11 . Deve ser enfatizado<br />
o gasto energético, aumentando-se a atividade física,<br />
uma vez que a excessiva restrição calórica ou a eliminação de<br />
refeições podem ter efeito negativo no crescimento da criança<br />
14 .<br />
Tanto o sobrepeso, quanto a obesidade na infância, estão<br />
relacionados com um aumento nos lipídios séricos, na pressão<br />
arterial, com intolerância à glicose, com dificuldades<br />
psicossociais e com aumento de risco da persistência da obesidade<br />
no adulto 11 .<br />
Dislipidemias<br />
As dislipidemias são as causas fundamentais de enfermidades<br />
coronarianas ateroscleróticas 27 .<br />
Essas enfermidades destacam-se nos dias atuais como a<br />
mais freqüente causa de óbito 28 , são a principal causa de<br />
morbimortalidade na população adulta e parecem estar aumentando<br />
em países que tradicionalmente tinham baixa<br />
prevalência 29,30 . A doença isquêmica do coração é a principal<br />
causa de óbito no Estado de São Paulo, dentre as doenças<br />
crônico-degenerativas 31 .<br />
As dislipidemias são definidas como distúrbios do transporte<br />
dos lipídios que resultam de anormalidades metabólicas<br />
na síntese ou degradação das lipoproteínas plasmáticas,<br />
que alteram as concentrações dos seus diferentes componentes<br />
na circulação 32,33 . Quando os níveis séricos das lipoproteínas<br />
estão acima dos valores de referência (vide Tabelas 1,<br />
2 e 3), a dislipidemia é chamada de hiperlipidemia, se estiver<br />
acima de determinados valores, se abaixo, é denominada<br />
hipolipidemia. A hipercolesterolemia ocorre pelo aumento<br />
do colesterol total e/ou de LDL-colesterol e a hipertrigliceridemia<br />
pela elevação dos triglicérides 33,34 .<br />
Segundo Schimitz et al. 39 , a aterogênese é caracterizada<br />
por uma sucessão de desordens nas camadas íntima e média<br />
das paredes dos vasos, sendo que o metabolismo desordenado<br />
das gorduras é apontado como um agente causador desse distúrbio.<br />
Dentre as desordens nas paredes dos vasos, estão o<br />
aumento da permeabilidade do endotélio, infiltração de<br />
monócitos, proliferação de células musculares lisas adjacentes,<br />
agregação plaquetária e acúmulo de lipídios. O colesterol<br />
livre e ésteres de colesterol, triglicérides, ceróide, ferro e cálcio<br />
são gradualmente depositados nas áreas envolvidas e elementos<br />
fibrosos invadem a placa em crescimento.<br />
211
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215<br />
Tabela 1 - Valores de referência dos lipídios séricos.<br />
Lipídios Valores> 20 anos a Categoria Valores< 20 anos Categoria<br />
Colesterol total – CT (mg/dL) < 200 Ótimo > 170 e < 185 b Leve<br />
200-239 Limítrofe > 185 e < 200 b Moderado<br />
e 240 Alto > 200 b Grave<br />
LDL-colesterol (mg/dL) < 100 Ótimo<br />
100-129 Desejável < 110 c Aceitável<br />
130-159 Limítrofe 110-129 c Limítrofe<br />
160-189 Alto > 130 c Alto<br />
e <strong>19</strong>0 Muito alto<br />
HDL-colesterol (mg/dL) < 40 Baixo LDL/HDL = 2 a 3,5 d Razão adequada<br />
> 60 Alto CT/HDL = 3,3 a 5 d Razão adequada<br />
Triglicérides (mg/dL) < 150 Ótimo < 150 d Normal<br />
150-200 Limítrofe<br />
201-499 Alto<br />
e 500 Muito alto<br />
Fonte: a. NCEP 33 e SBC 34 ; b. Moura et al. 35 ; c. Baker et al. 30 ; d. NIH 36<br />
Tabela 2 - Valores de referência dos lipídios séricos de 0 a <strong>19</strong> anos.<br />
Sexo masculino Sexo feminino<br />
Idade (anos) Colesterol (mg/dL) Triglicérides (mg/dL) Idadeanos Colesterol (mg/dL) Triglicérides(mg/dL)<br />
P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95<br />
0 a 4 114 155 203 29 56 99 0 a 4 112 156 200 34 64 112<br />
5 a 9 121 160 203 30 56 101 5 a 9 126 164 205 32 60 105<br />
10 a 14 1<strong>19</strong> 158 202 32 66 125 10 a 14 124 160 201 37 75 131<br />
15 a <strong>19</strong> 113 150 <strong>19</strong>7 37 78 148 15 a <strong>19</strong> 120 158 203 39 75 132<br />
Idade anos HDL(mg/dL) LDL(mg/dL) VLDL(mg/dL) Idade anos HDL(mg/dL) LDL(mg/dL) VLDL(mg/dL)<br />
P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95 P5 P50 P95<br />
5 a 9 38 56 5 63 93 129 0 8 18 5 a 9 36 53 73 68 100 140 1 10 24<br />
10 a 14 37 55 74 64 97 133 1 10 22 10 a 14 37 52 70 68 97 136 2 11 23<br />
15 a <strong>19</strong> 40 46 63 62 94 130 2 13 26 15 a <strong>19</strong> 35 52 74 59 96 137 2 12 24<br />
Fonte: AHA 37<br />
Tabela 3 - Valores de referência dos lipídios séricos de 2 a <strong>19</strong> anos.<br />
Lipídios Idade (anos) Valores (mg/dL)<br />
Desejáveis Limítrofes Aumentados<br />
CT ≥ 170 170 – <strong>19</strong>9 ≥ 200<br />
LDL-C ≥ 110 110 - 129 ≥ 130<br />
HDL-C < 10 ≥ 40<br />
10 – <strong>19</strong> ≥ 35<br />
TG < 10 ≥ 100 ≥ 100<br />
10 - <strong>19</strong> ≥ 130 ≥ 130<br />
[* O filtro não suporta esse formato de arquivo | incorporado.TIF *]<br />
Fonte: Kwiterovich Jr 38<br />
A aterosclerose se inicia na infância e é acelerada em<br />
alguns indivíduos. A correlação do colesterol sangüíneo com<br />
a incidência de doenças cardiovasculares demonstra que há<br />
um risco aumentado quando o colesterol é maior que 200mg/<br />
100ml de sangue 35 . O colesterol é um éster. A quantidade de<br />
colesterol no plasma sangüíneo é determinada parcialmente<br />
por herança genética e parcialmente pela gordura e colesterol<br />
veiculados pela dieta 40 .<br />
Os lipídios são insolúveis no meio aquoso. Sendo assim,<br />
para que sejam transportados na circulação sistêmica, organizam-se<br />
em estruturas macromoleculares denominadas<br />
lipoproteínas. Estas se compõem de uma proteína específica<br />
(apoproteína) ligada a um agregado lipídico, onde<br />
triglicérides e colesterol esterificado estão envolvidos por<br />
212<br />
fosfolipídios e colesterol livre. As lipoproteínas transportam<br />
os lipídios até os tecidos onde desempenharão suas funções<br />
como reservatório de energia, componentes de membranas<br />
celulares e como precursores de hormônios esteróides ou<br />
ácidos biliares 41 .<br />
Existem cinco classes principais de lipoproteínas: os<br />
quilomícrons, as lipoproteínas de muito baixa densidade<br />
(VLDL-c), as lipoproteínas de densidade intermediária (IDLc),<br />
as lipoproteínas de baixa densidade (LDL-c) e as<br />
lipoproteínas de alta densidade (HDL-c) 42 . As lipoproteínas<br />
de baixa densidade estão mais relacionadas com a formação<br />
do processo da aterogênese, enquanto as lipoproteínas de alta<br />
densidade, com sua redução.<br />
Assim como na obesidade, a dislipidemia na infância e<br />
adolescência é fator gerador de hipertensão, intolerância à<br />
glicose e complicações ateroscleróticas na idade adulta 43 .<br />
Embora o desenvolvimento das doenças cardíacas ateroscleróticas<br />
seja atribuído geralmente a fatores genéticos, a doença<br />
cardíaca está comprovadamente relacionada também ao<br />
ambiente, como foi observado entre os japoneses, que migraram<br />
para o Hawai ou para os Estados Unidos, com aumento<br />
da prevalência dessas doenças 44 .<br />
Foi demonstrada uma clara relação entre a dieta e o risco<br />
da doença cardiovascular como demonstram vários estudos<br />
experimentais em humanos e animais 44,45,46,47 . Ornish et<br />
al. 48 , tiveram resultados semelhantes aos das drogas
aterogênicas fazendo uma rígida modificação na dieta e administrando<br />
o stress.<br />
Variações na dieta de diferentes culturas têm correlação<br />
com a prevalência de doenças coronárias e seus fatores de<br />
risco, de acordo com estudos transversais internacionais. Em<br />
contraste, estudos com populações mostram uma fraca associação<br />
entre a dieta e os fatores de risco, subestimando uma<br />
base genética para diferença interindividual, dentro de uma<br />
população exposta, com padrões dietéticos similares. Embora<br />
exista essa fraca associação, quando a relação entre dieta e<br />
lesões das coronárias foi examinada em estudos com autópsias,<br />
verificou-se que uma alta ingestão de amido e proteínas<br />
vegetais estava associada com um índice menor de<br />
aterosclerose do que quando a ingestão provinha de alimentos<br />
ricos em proteína animal e/ou gordura. A aterosclerose<br />
começa como um processo silencioso. Pacientes são geralmente<br />
assintomáticos até estados avançados da doença. Anormalidades<br />
no perfil lipídico como, níveis elevados de<br />
colesterol sérico e de LDL-c, e baixos de HDL-c, são importantes<br />
determinantes no desenvolvimento desta enfermidade.<br />
O termo dislipidemia tem substituído hiperlipidemia para<br />
definir estas desordens resultantes do baixo HDL-colesterol 30 .<br />
Um seguimento das concentrações de colesterol<br />
sangüíneo entre crianças e jovens tem sido documentado por<br />
alguns autores como Porkka et al. 49 e Webber et al. 50 . A prevenção<br />
precoce da aterosclerose é uma preocupação de saúde<br />
pública e, nos Estados Unidos, o Programa Nacional de<br />
Educação sobre o Colesterol tem recomendado uma dieta de<br />
intervenção em crianças com níveis plasmáticos de colesterol<br />
elevados 51 .<br />
O estudo do consumo de lipídios por crianças é de interesse<br />
porque se sabe que as experiências iniciais com os alimentos<br />
podem definir os padrões definitivos de alimentação.<br />
Há também evidências que o consumo dietético na primeira<br />
infância esteja relacionado aos fatores de risco de doenças<br />
coronarianas, embora esta relação seja mais fraca para crianças<br />
mais velhas do que para as mais novas 11 . Apesar disto, são<br />
poucos os estudos destinados a avaliá-los nesta faixa etária 28 .<br />
Um estudo recente do Departamento de Agricultura dos<br />
Estados Unidos, com crianças de um a quatro anos, mostrou<br />
consumo de gordura total na dieta de 34% das calorias, sendo<br />
13% destas calorias provenientes de gordura saturada. Estudos<br />
com escolares mostraram consumo total de gordura entre 38%<br />
a 41% das calorias. Guias alimentares para adultos recomendam<br />
limitar o consumo de gordura a no máximo 30% das calorias<br />
e gorduras saturadas a menos de 10% das calorias. Parece haver<br />
um crescente consenso que recomendações similares são apropriadas<br />
para crianças maiores de dois anos. Nos Estados Unidos,<br />
87% das crianças de dez anos excedem ao consumo destas recomendações<br />
para lipídios. Altos níveis de colesterol em crianças<br />
são preditores de altos níveis na fase adulta e aumento do<br />
risco de doença cardíaca coronária. Estudos mostram que cerca<br />
de 20% das crianças em idade escolar têm valores de<br />
colesterol sérico maior que 185 mg/dl (percentil 90). Prega<br />
cutânea acima do percentil 70 em crianças está associada com<br />
nível elevado de colesterol sérico 52 .<br />
Dietas com baixo teor de gorduras, de gorduras saturadas<br />
e de colesterol, podem diminuir o LDL-c em adultos, porém,<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215<br />
poucos estudos têm demonstrado este efeito em crianças,<br />
havendo preocupação sobre a segurança em diminuir o<br />
colesterol da dieta destas, particularmente nos anos em que há<br />
picos de crescimento. Esta preocupação está relacionada a<br />
possíveis deficiências no crescimento e na adequação de<br />
nutrientes, especificamente consumo de ferro. Em <strong>19</strong>87, teve<br />
início, nos Estados Unidos, um estudo clínico controlado, para<br />
testar a eficácia e segurança de uma intervenção dietética de<br />
longo prazo, para redução do LDL-c de crianças em crescimento.<br />
Concluiu-se que a modificação da gordura pode ser realizada<br />
em crianças com alto nível de LDL-c, sem que afete o<br />
crescimento normal e melhorando estes níveis 53,54 .<br />
A definição e a pesquisa de fatores novos e não investigados<br />
até o momento, são de suma importância na formulação<br />
de estratégias para neutralizar fatores conhecidos e para<br />
a prevenção primária da aterosclerose. Medidas simples e<br />
efetivas de prevenção incluem aumento da preocupação com<br />
as doenças, manutenção do peso corporal ideal, exercícios<br />
físicos regulares, consumo de dieta balanceada, evitar o fumo<br />
e o controle da pressão e do estado metabólico desde cedo.<br />
Estas medidas iniciando na infância devem ser aplicadas a<br />
todos e em particular aos indivíduos predispostos e populações<br />
43 .<br />
Framingham indicou uma contínua elevação de risco<br />
para doença cardíaca coronária à medida que o colesterol<br />
ultrapassa o nível de 180 mg% 55 . A meta de epidemiologistas,<br />
nos Estados Unidos, é que as crianças deste país atinjam uma<br />
média de colesterol plasmático de 150 mg% 56 . No estudo de<br />
Muscatini, 24% das crianças possuíam colesterol acima de<br />
220 mg% 57 .<br />
No Brasil, há os estudos de Moura et al. 35 , com escolares<br />
de 8 e 9 anos, na cidade de Campinas, SP, apontando<br />
prevalência de 13,5% de hipercolesterolemia, maior em<br />
meninas do que em meninos, com valores médios de<br />
colesterol-143 mg/dl, HDL-colesterol – 35mg/dl, LDLcolesterol<br />
– 96mg/dl, VLDL-colesterol – 12mg/dl e<br />
trglicerídeos – 61mg/dl. Em Bento Gonçalves (RS), Gerber<br />
& Zielinsky 28 encontraram 27,98% de estudantes de 6 a 16<br />
anos com colesterol > 180 mg%. Moura et al. 58 referem valores<br />
médios de 160mg/dl de colesterol, 96 mg/dl de LDLcolesterol,<br />
16 mg /dl de VLDL-colesterol, 79 mg/dl de<br />
triglicerídeos, 3,5 para a razão colesterol/HDL-colesterol e 2,1<br />
para a razão LDL-colesterol/HDL-colesterol, em escolares de<br />
7 a 14 anos na cidade de Campinas (SP). Apresentam ainda<br />
uma prevalência, nesta mesma população, de 35% de<br />
hipercolesterolemia dividida em 15,7% leve, 9,8% moderada<br />
e 9,5% grave, sendo que a prevalência no sexo feminino<br />
foi maior que a do masculino.<br />
Apesar da alta mortalidade por doenças cardiovasculares,<br />
no Brasil não há dados sobre o nível de colesterol em crianças<br />
e, por este motivo, os padrões utilizados para classificar o<br />
teor de colesterol é o mesmo utilizado para adultos 35 .<br />
O tratamento e a detecção da dislipidemia, em crianças,<br />
é altamente controverso. Uns são favoráveis a que se avaliem<br />
todas as crianças, outros que se faça uma avaliação seletiva<br />
para as de risco e uns poucos são contrários a avaliação. O<br />
consenso do NCEP (National Cholesterol Education Panel)<br />
e da Academia Americana de Pediatria, é de que se faça a<br />
213
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):209-215<br />
avaliação seletiva para crianças a partir de dois anos, não se<br />
recomendando antes desta idade, pois não se conhecem os<br />
riscos da restrição de gorduras para crianças pequenas.<br />
A avaliação seletiva é feita baseada na história familiar<br />
e nos fatores de risco individuais É recomendada para crianças<br />
com história familiar de doença coronariana prematura<br />
(menos de 55 anos em pais ou avós), hiperlipidemia<br />
(TC>240mg/dl em um dos pais), morte súbita ou xantomas,<br />
ou ainda, história familiar incompleta ou impossível de ser<br />
obtida 30,59 . Crianças e adolescentes com fatores de risco individual<br />
tais como, obesidade, hipertensão, diabetes mellitus, ou<br />
história de doença de Kawasaki, também devem ser investigados.<br />
A proposta da avaliação seletiva se baseia nos altos<br />
custos de uma avaliação generalizada e na falta de padronização<br />
dos testes, que podem gerar interpretações errôneas 30 .<br />
A avaliação generalizada de colesterol pode ter ainda<br />
conseqüências adversas, tais como déficits nutricionais,<br />
advindos de uma dieta restritiva. Há registros de evidências<br />
de desenvolvimento inadequado devido a restrições alimentares,<br />
impostas em razão de nível de colesterol elevado encontrado<br />
em exames de rotina. O retardo do crescimento se deve<br />
a uma aplicação não supervisionada de dieta baixa em gordura<br />
e baixa em colesterol. Crianças que ingerem menos de<br />
30% das calorias provindas de gorduras consomem dietas<br />
inadequadas com aumento de ingestão de carboidratos e<br />
sacarose e diminuição de vitaminas e sais minerais, tais como,<br />
ácido fólico e ferro 59 .<br />
Baker et al. 30 recomendam usar, inicialmente, o nível de<br />
colesterol total para crianças que têm pelo menos um dos pais<br />
com colesterol sangüíneo alto, apesar de que uma avaliação<br />
inicial do colesterol e do HDL-c (como recomendado para<br />
adultos), evita um novo exame de sangue caso o colesterol<br />
alto seja devido a um HDL-c alto. Se o colesterol total da<br />
criança for maior de 200 mg/dl deve ser exigido um exame<br />
mais detalhado. Se a criança tiver uma história familiar de<br />
doença aterosclerótica prematura, o teste inicial deverá ser<br />
completo.<br />
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a uma alteração do metabolismo de lipídios de forma diferente<br />
para os sexos e que, a associação entre esta dieta e a concentração<br />
do nível de colesterol no sangue, parece independente<br />
da colesterolemia dos pais e talvez, embora sem confirmação,<br />
até da dieta atual da criança 60 .<br />
Crianças com história familiar de síndromes hiperlipidêmicas,<br />
colocadas em dietas altamente restritas em gorduras,<br />
podem ter aumento na variação e no paladar dos alimentos<br />
utilizando substitutos de gordura. Estudos em adultos<br />
mostraram que a ingestão de olestra pode reduzir os<br />
triglicérides séricos, o colesterol total, e as lipoproteínas de<br />
baixa densidade 52 .<br />
Washino et al. 61 , em estudos realizados no Japão, concluíram<br />
que a combinação do índice aterogênico e de porcentagem<br />
de gordura corporal são bons indicadores para avaliação<br />
do risco de obesidade, hiperlipidemia e de doença<br />
coronariana cardíaca no futuro.<br />
Considerações finais<br />
A importância da dieta na etiologia das enfermidades<br />
crônicas não transmissíveis está bem reconhecida, mas, em<br />
estudos epidemiológicos, esbarra na confiabilidade das medidas<br />
de consumo nutricional 62 .<br />
Medidas acuradas de consumo de alimentos são o prérequisito<br />
mais importante para o estudo do metabolismo de<br />
nutrientes no organismo e sua correlação com os efeitos na<br />
saúde 63 .<br />
Os pais têm influência na formação dos padrões de hábitos<br />
de alimentação 64,65 e de atividade física na infância 66 . Seu<br />
envolvimento é fundamental para o sucesso da prevenção da<br />
obesidade e das dislipidemias na idade pré-escolar, pois, nesta<br />
fase, estes ainda têm o controle sobre a disponibilidade dos<br />
alimentos e sobre a atividade física 21 , sendo que a consolidação<br />
desses hábitos durante a infância será fundamental para<br />
a formação do estilo de vida na idade adulta.<br />
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215
Resumo<br />
Resumen<br />
216<br />
ARTIGO DE REVISÃO<br />
O refluxo na terapia nutricional por via enteral de pacientes graves<br />
The high gastric residual volume in enteral nutrition of critically ill patients<br />
El reflujo en la terapia nutricional por vía enteral de pacientes graves<br />
Celina Andrade Buzzo 1 , Ana Lúcia Neves Duarte da Silva 2 , Lúcia Caruso 3<br />
A importância da terapia nutricional no paciente grave deve-se ao<br />
quadro de intenso catabolismo promovido pelas citocinas. O suporte<br />
nutricional não irá prevenir as alterações metabólicas no paciente<br />
crítico, mas minimizará o desgaste protéico. O resíduo gástrico elevado<br />
é uma complicação da terapia nutricional enteral muito freqüente<br />
em pacientes críticos e sua ocorrência pode levar à aspiração<br />
pulmonar e/ou ao alcance parcial da meta nutricional<br />
estabelecida. Esta revisão inclui estudos recentes encontrados na<br />
base de dados MEDLINE e livros-texto, com o intuito de elaborar<br />
um protocolo para prevenir o refluxo, devido a grande incidência<br />
desta complicação nos pacientes da unidade de terapia intensiva<br />
(UTI) de adultos do Hospital Universitário da Universidade de São<br />
Paulo. Em levantamento prospectivo realizado em 2002, sobre a<br />
terapia nutricional dos pacientes exclusivamente com via enteral<br />
através de método intermitente, o refluxo foi a principal causa da<br />
interrupção da nutrição. No presente estudo, são levantados os<br />
diversos volumes residuais considerados como sinal de intolerância<br />
à dieta enteral administrada, bem como outros fatores<br />
intervenientes. Entretanto, embora não exista consenso na literatura<br />
nos assuntos citados e diante da necessidade da realização de<br />
mais estudos que possam indicar um protocolo eficaz na presença<br />
do refluxo na terapia nutricional enteral, foram reunidas algumas<br />
recomendações a serem seguidas nestes casos. (Rev Bras Nutr Clin<br />
2004; <strong>19</strong>(4):216-223)<br />
UNITERMOS: nutrição enteral, terapia intensiva, complicações<br />
Abstract<br />
The importance of the nutritional therapy for the critically ill patient<br />
lies on the intense catabolism caused by cytokines. The nutritional<br />
support does not prevent the metabolic changes in the critically ill<br />
patient, but decreases the rate of protein erosion. The high gastric<br />
residuals is a complication of enteral nutritional therapy often found<br />
in critically ill patients, and it can cause pulmonary aspiration and/<br />
or partial reach of the established nutritional goal. This review<br />
includes recent studies found in MEDLINE and in textbooks with<br />
the objective of establishing a protocol to prevent the high gastric<br />
residual, because of the high incidence of this complication in<br />
patients in the adult intensive care unit (ICU) of Hospital Universitário<br />
of Universidade de São Paulo. In a prospective survey<br />
accomplished in 2002 about the nutrition support of patients with<br />
only enteral nutrition through the intermittent method, it was<br />
observed that the high gastric residuals was the principal cause of the<br />
discontinuance of nutrition. In this review, different residual volumes<br />
considered as enteral diet intolerance are presented as well as<br />
other interfering factors. However, though there is not a consensus<br />
in the literature about this subject, and despite the necessity of more<br />
studies to determine an efficient protocol in case of high gastric<br />
residuals in enteral nutrition, this review gathers recommendations<br />
to be followed in these cases. (Rev Bras Nutr Clin 2004;<br />
<strong>19</strong>(4):216-223)<br />
KEY WORDS: enteral nutrition, critical care, complication<br />
La importancia de la terapia nutricional para los pacientes graves se fundamenta en el intenso catabolismo causado por las citosinas. El<br />
soporte nutricional no previene las alteraciones metabólicas en el paciente grave, pero favorece disminuciones del catabolismo proteico.<br />
Los residuos gástricos altos son una de las complicaciones del soporte nutricional enteral que se encuentra a menudo en los pacientes graves,<br />
y puede llevar a la aspiración pulmonar y/o al alcance parcial de la meta nutricional establecida. Esta revisión comprende estudios recientes<br />
encontrados en la base de datos MEDLINE y en los libros de texto con el objetivo de establecer un protocolo para evitar el reflujo, debido<br />
a la incidencia alta de esta complicación en los pacientes en la unidad de cuidados intensivos (UCI) adulta de Hospital Universitário de<br />
Universidade de São Paulo. En un estudio prospectivo realizado en 2002 sobre soporte nutricional enteral a través del método intermi-<br />
1. Nutricionista graduada pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo e ex- estagiária (ano 2002) do Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital<br />
Universitário da Universidade de São Paulo. 2. Orientadora, Nutricionista do Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo,<br />
Especialista em Nutrição Clínica pelo Centro Universitário São Camilo. 3. Orientadora, Nutricionista do Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital Universitário da<br />
Universidade de São Paulo, Especialista em Nutrição Clínica pelo Centro Universitário São Camilo, Mestre em Nutrição Humana Aplicada pela Universidade de São<br />
Paulo, Especialista em Nutrição Enteral e Parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, Docente do Centro Universitário São Camilo e Coordenadora<br />
do Curso de Especialização em Nutrição Clínica do Centro Universitário São Camilo.<br />
Endereço para correspondência: Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo – Avenida Professor Lineu Prestes, 2565<br />
- Cidade Universitária - São Paulo - SP CEP: 05508-900<br />
e-mail: snd_1@hu.usp.br, cebuzzo@hotmail.com , luciacaruso@yahoo.com.br<br />
Submissão: 6 de fevereiro de 2003<br />
Aceito para publicação: 21 de dezembro de 2004
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):216-223<br />
tente en pacientes exclusivamente con nutrición enteral, fue observado que el reflujo era la causa principal de la interrupción de nutrición.<br />
En la presente revisión, se mostró los volúmenes residuales diferentes considerados como señal de intolerancia a la dieta enteral administrada<br />
así como otros factores interferentes. Sin embargo, aunque no hay un consenso en la literatura sobre este asunto, y es necesario realizar<br />
más estudios que puedan originar un protocolo eficaz en caso de reflujo en la nutrición enteral, esta revisión recoge recomendaciones a<br />
ser seguidas en estos casos. (Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):216-223)<br />
UNITÉRMINOS: nutrición enteral, terapia intensiva, complicaciones<br />
Introdução<br />
A importância da terapia nutricional no paciente grave<br />
deve-se ao quadro de intenso catabolismo promovido pelas<br />
citocinas. O suporte nutricional não irá prevenir ou reverter<br />
as alterações metabólicas no paciente crítico (como o<br />
hipermetabolismo, lipólise aumentada e catabolismo<br />
protéico, decorrentes das alterações do quadro de sepse, que<br />
é presente em grande número de pacientes críticos), mas<br />
minimizará o desgaste das reservas corporais protéicas 1 .<br />
A nutrição enteral é a melhor opção para pacientes críticos<br />
que necessitem de suporte nutricional especializado 1 ,<br />
uma vez que a nutrição parenteral deve ser reservada para os<br />
pacientes, para os quais a terapia nutricional enteral (TNE)<br />
não é possível 1 .<br />
A TNE é mais acessível economicamente e mais fisiológica,<br />
quando comparada à nutrição parenteral 2,3,4 .<br />
A nutrição por via nasoenteral ou por ostomias não é<br />
isenta de complicações que, uma vez conhecidas, podem ser<br />
tratadas ou prevenidas, monitorizando-se de forma adequada<br />
os pacientes 5 . Essas complicações podem ser agrupadas em<br />
quatro principais categorias: infecciosas, gastrointestinais,<br />
mecânicas e metabólicas 6 (Tabela 1).<br />
Tabela 1 - Complicações em terapia nutricional enteral<br />
Categoria das complicações Problemas observados<br />
Infecciosas aspiração<br />
colonização gástrica<br />
contaminação de fórmulas enterais<br />
Gastrointestinais diarréia<br />
náuseas<br />
distensão abdominal<br />
resíduos gástricos elevados/refluxo<br />
vômitos<br />
retardo do esvaziamento gástrico<br />
obstipação<br />
Mecânicas erosão nasal<br />
abcesso septonasal<br />
sinusite aguda, otite, rouquidão<br />
obstrução da sonda<br />
saída ou migração acidental da sonda<br />
ruptura de varizes esofágicas<br />
faringite<br />
Metabólicas hipocalemia<br />
hiponatremia<br />
hiperglicemia<br />
hipofosfatemia<br />
interações medicamentosas<br />
Fonte: adaptado de Coppini & Waitzberg 5 , Janu et al. 6<br />
Um levantamento prospectivo realizado durante 44 dias,<br />
em 2002, no Hospital Universitário (HU) da Universidade<br />
de São Paulo (USP), com o objetivo de coletar dados sobre<br />
o suporte nutricional enteral na Unidade de Terapia Intensiva<br />
(UTI) de adultos e as dificuldades em alcançar as metas<br />
nutricionais, analisou 22 pacientes com dieta enteral exclusiva,<br />
sendo que a maior parte tinha como diagnóstico principal<br />
as doenças neurológicas, principalmente representadas<br />
pelo acidente vascular cerebral (AVC) (Tabela 2). A população<br />
analisada era predominantemente idosa (59,1% dos<br />
pacientes com idade ≥ 65 anos).<br />
Tabela 2 - Diagnóstico dos pacientes analisados no levantamento na<br />
UTI de adultos do HU-USP<br />
Diagnósticos % Pacientes<br />
Neurológico 23,0<br />
Respiratório 18,0<br />
Respiratório + Neurológico 18,0<br />
Renal 14,0<br />
Respiratório + ICC 9,0<br />
Neoplasias 4,5<br />
Hepatopatia 4,5<br />
Coma Hiperosmolar 4,5<br />
TEP 4,5<br />
Total 100,0<br />
ICC- Insuficiência Cardíaca Congestiva; TEP- Tromboembolismo Pulmonar<br />
A administração da dieta enteral na UTI do HU foi feita<br />
através do método de infusão intermitente, com sete horários<br />
ao dia e com pausa noturna de cinco horas. Em relação ao<br />
volume administrado da dieta enteral dos pacientes analisados,<br />
27,3% recebeu volume menor que 70% do proposto. A<br />
principal causa observada pelo não recebimento da dieta<br />
enteral foram as complicações gastrointestinais devido a<br />
nutrição enteral, representadas principalmente pelo refluxo.<br />
A segunda causa do não recebimento da dieta enteral foi o<br />
jejum para exames, que é fato constante no atendimento ao<br />
paciente internado em uma UTI.<br />
Os pacientes estudados permaneceram em média 10,17<br />
dias recebendo dieta exclusivamente enteral, e a média de<br />
permanência observada foi de 11,58 dias na UTI. A partir<br />
disto, foi possível concluir que é de grande importância o<br />
acompanhamento adequado das complicações observadas<br />
nestes pacientes, devido à dieta enteral, visto que estes permanecem<br />
o maior tempo da internação na UTI com nutrição<br />
enteral.<br />
Refluxo em nutrição enteral<br />
Complicações na terapia nutricional enteral dos<br />
pacientes graves<br />
Pacientes graves que recebem dieta enteral necessitam de<br />
acompanhamento clínico e metabólico da mesma forma<br />
daqueles que recebem dieta via parenteral 11 .<br />
217
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):216-223<br />
A elevada freqüência de complicações gastrointestinais<br />
é provavelmente o fator mais importante que limita o uso da<br />
terapia nutricional enteral em pacientes críticos 7, 8 . Há, na<br />
literatura, a falta de protocolos uniformes nas complicações<br />
e as conseqüências da intolerância da dieta não estão claramente<br />
estabelecidas 9 .<br />
As complicações gastrointestinais em pacientes críticos<br />
diminuem a ingestão de nutrientes, e, se persistirem, podem<br />
contribuir para o processo de desnutrição. Intolerâncias<br />
gastrointestinais devido à dieta enteral podem estar associadas<br />
ao prolongamento da estada do paciente na UTI e aumentar<br />
o índice de mortalidade 9 .<br />
O atraso do esvaziamento gástrico, cujas manifestações<br />
são episódios de vômitos e resíduos gástricos elevados 10 , é a<br />
causa mais freqüente de interrupção da TNE ou redução do<br />
volume administrado na dieta enteral de pacientes críticos 7 .<br />
A monitorização diária dos resíduos gástricos, a verificação da<br />
presença de regurgitação da dieta, diarréia e obstipação são<br />
essenciais 11 .<br />
218<br />
Volume residual gástrico<br />
Não há consenso na literatura sobre o volume residual<br />
gástrico exato para interromper a administração da dieta por<br />
via enteral 12 .<br />
O volume residual (VR) é usado por médicos,<br />
nutricionistas e enfermeiros como um indicador para avaliar<br />
a tolerância ou intolerância na nutrição enteral total 13 . Volumes<br />
residuais elevados sugerem a possibilidade de esvaziamento<br />
gástrico inadequado, risco potencial de refluxo e aspiração<br />
14, 15,16 . Antes de administrar a dieta por sonda localizada<br />
no estômago, é necessário checar se há estase gástrica,<br />
através da aspiração do conteúdo gástrico, registrando o volume<br />
da fórmula administrada e o fluído obtido 13,17 . A seringa<br />
de 60 mL é considerada uma boa alternativa para este<br />
procedimento 13 .<br />
Em nenhuma circunstância, a presença de um único episódio<br />
de VR elevado sem a avaliação clínica 12 e de radiografia,<br />
pode resultar em suspensão automática da terapia<br />
nutricional enteral 13 .<br />
The Society of Critical Care Medicine 46 considera os<br />
seguintes dados clínicos para monitorização de pacientes<br />
recebendo dieta enteral: examinar o abdome para verificar<br />
distensão e ruídos hidroaéreos; registrar a freqüência, consistência,<br />
cor, odor, peso e volume das fezes; anotar queixas dos<br />
pacientes devido à dor abdominal e plenitude.<br />
O escaneamento com radionucleotídeo é provavelmente<br />
o padrão ouro para determinação do esvaziamento gástrico<br />
lento, mas não é possível ser usado na prática clínica 13 .<br />
Causas do volume residual<br />
A retenção gástrica pode ser resultado de diminuição da<br />
motilidade causada por narcóticos ou outros medicamentos,<br />
gastroparesia, alimentação rica em gordura, taxas de infusão<br />
altas, envenenamento, imobilização, sepse, trauma ou desnutrição<br />
18,<strong>19</strong> .<br />
As drogas usuais em tratamento intensivo, como sedati-<br />
vos e analgésicos, fundamentalmente opiáceos, têm reconhecido<br />
poder de reduzir o esvaziamento gástrico e a motilidade<br />
intestinal como um todo 20 .<br />
Há situações clínicas e condições pré-mórbidas dos pacientes<br />
que colaboram para menor esvaziamento gástrico, tais<br />
como: cirurgias ocorridas durante a internação ou prévias;<br />
íleo gástrico prolongado, como nas pancreatites, gastroparesia<br />
do diabetes mellitus e outras situações clínicas menos freqüentes,<br />
como miopatias, neuropatias, amiloidose, doenças do<br />
colágeno, trauma cranioencefálico, alterações metabólicas e<br />
eletrolíticas 20<br />
Apesar de se evitar o uso de fórmulas hiperosmolares 16 ,<br />
não há evidências de que a osmolalidade influencie o esvaziamento<br />
gástrico em dietas administradas em infusão contínua<br />
21 .<br />
Volume residual na literatura, sua verificação,<br />
uso de pró-cinéticos e posição da sonda na terapia<br />
nutricional enteral<br />
O valor do VR usado para indicar intolerância à dieta<br />
enteral varia muito na literatura. Os autores sugerem diferentes<br />
valores, mas não há nenhum dado conclusivo. A Figura 1<br />
mostra uma relação de volumes residuais considerados como<br />
refluxo na literatura.<br />
1. Ao passar a sonda de alimentação, checar sua posição através de<br />
radiografia.<br />
2. Manter o paciente em decúbito elevado entre 30º e 45º para<br />
evitar o refluxo e a aspiração.<br />
3. Avaliar as condições clínicas (examinar o abdome para verificar<br />
distensão e ruídos hidroaéreos; freqüência e volume das fezes,<br />
etc.) do paciente antes de administrar a dieta.<br />
4. Checar se há diminuição do esvaziamento gástrico, através da<br />
aspiração do conteúdo do estômago com o uso de seringa, dentro<br />
do intervalo de 3 a 4 horas.<br />
5. Considerar como refluxo o valor de aproximadamente 150 mL.<br />
6. Analisar se há necessidade do uso de pró-cinéticos ( cisaprida,<br />
metoclopramida, etc.) antes, ou só após a ocorrência de volume<br />
residual gástrico elevado.<br />
7. Caso o método de infusão seja em bolo, na constatação de refluxo,<br />
substituir pelo contínuo. Se a dieta já estiver sendo administrada<br />
pelo método de infusão contínua e ocorrer gastroparesia, diminuir<br />
a velocidade de administração.<br />
8. Nos casos de persistência do refluxo, verificar se há possibilidade<br />
de posicionamento da sonda pós-pilórica. Checar sua posição<br />
através de radiografia.<br />
9. Se houver volume residual gástrico elevado, mesmo com sonda<br />
pós-pilórica, analisar mais detalhadamente o caso, e se há indicação<br />
de pausa na administração da fórmula (levar em conta o<br />
déficit nutricional), ostomia ou ainda nutrição parenteral.<br />
Figura 2 - Quadro das recomendações para prevenção do refluxo na<br />
nutrição enteral<br />
Para Carvalho 22 , mais de 60% do volume da última infusão<br />
é considerado como refluxo.<br />
Hewmark et al. 14 consideram que valores de VR acima de<br />
150 mL sugerem esvaziamento gástrico lento, intolerância à<br />
fórmula enteral e aumento do risco de regurgitação e aspiração.<br />
Segundo McClave et al. 13 , o valor apropriado de resíduo<br />
gástrico que pode estar relacionado com um esvaziamento
gástrico inadequado é de 200 mL em pacientes com sonda<br />
nasogástrica (SNG) e 100 mL em pacientes com gastrostomia<br />
endoscópica ou cirúrgica em um período de 2 horas com o<br />
início da dieta. Os pacientes com gastrostomia têm um VR<br />
bem menor do que aqueles com SNG, e os que recebem um<br />
volume maior a cada infusão apresentam VR maiores, isto<br />
tanto nos pacientes com SNG, quanto nos gastrostomizados.<br />
Muitos estudos usam os valores de 100 mL 8,10,15,23,24 ou<br />
150 mL 14,25,26,27,28 como VR, mas outros sugerem a medida em<br />
porcentagem de hora em hora (de 50% a 115%) 24,29 .<br />
Para Bernard et al. 30 , os resíduos gástricos são checados<br />
antes de cada horário da administração no método intermitente<br />
e a dieta é suspensa, se os resíduos forem superiores a 150<br />
mL. Duas horas depois, verifica-se novamente e se os valores<br />
ainda forem maiores que 150 mL, o paciente deverá ser<br />
reavaliado (à procura de esvaziamento gástrico tardio).<br />
Para Coppini & Waitzberg 5 , há estase gástrica nos casos<br />
em que o resíduo gástrico tem valor maior que 50% do volume<br />
da dieta após 2 horas da infusão. Nestes casos é recomendado<br />
reduzir a oferta em bolo (intermitente) e usar drogas<br />
gastrocinéticas.<br />
O uso de agentes pró-cinéticos é uma estratégia empregada<br />
para melhorar a tolerância gastrointestinal e tem sido usada,<br />
geralmente, após episódios de intolerância à dieta<br />
enteral 31 .<br />
A American Dietetics Association 32 também estimula o<br />
uso de agentes pró cinéticos para estimular a motilidade gástrica,<br />
nos casos de diminuição de seu esvaziamento.<br />
MacLaren et al. 33 concluíram que a metoclopramida<br />
(pró-cinético) tem uma capacidade de reduzir o VR gástrico<br />
maior que a cisaprida em pacientes críticos com ventilação<br />
mecânica e SNG de nutrição enteral.<br />
Já Altmayer et al. 34 , indicam o uso da cisaprida para os<br />
casos de gastroparesia e refluxo em pacientes com<br />
traumatismo craniano.<br />
Chapman et al. 35 em um estudo prospectivo, duplo cego<br />
e randomizado observaram pacientes graves com ventilação<br />
mecânica que recebiam dieta enteral por SNG e apresentavam<br />
VR elevados (maior ou igual a 250 mL checados a cada<br />
quatro horas), com o objetivo de avaliar o efeito da eritromicina<br />
intravenosa (pró-cinético) no esvaziamento gástrico<br />
e no sucesso da TNE. A conclusão do estudo australiano foi<br />
que estes pacientes se beneficiaram com o fármaco e isto<br />
permitiu a continuidade da TNE.<br />
Um estudo prospectivo e randomizado, realizado por<br />
Pinilla et al. 31 , analisou pacientes críticos, que recebiam dieta<br />
enteral por SNG ou sonda orogástrica, com o objetivo de<br />
comparar a tolerância gastrointestinal e o tempo para alcançar<br />
a meta nutricional proposta, através de dois protocolos. O<br />
protocolo utilizado na UTI do Royal University Hospital, no<br />
Canadá, utilizava 150 mL como VR elevado e o uso de agentes<br />
pró-cinéticos, apenas depois da ocorrência de um episódio de<br />
intolerância gastrointestinal. Este protocolo atual foi comparado<br />
com um novo protocolo que usava o VR de 250 mL e o<br />
uso obrigatório de pró-cinéticos antes de a intolerância ocorrer.<br />
O VR era checado a cada 4 horas e os pró-cinéticos administrados<br />
no estudo foram: a metaclopramida, cisaprida e a<br />
domperidona.<br />
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):216-223<br />
Pinilla et al. 31 concluíram que a incidência de intolerância<br />
a TNE foi menor nos pacientes que foram acompanhados<br />
pelo novo protocolo, ou seja, o aumento do VR que indica<br />
intolerância (de 150 mL para 250 mL) e o uso de agentes prócinéticos<br />
diminuíram os casos de elevados VR. Em relação ao<br />
alcance das metas nutricionais, o grupo acompanhado pelo<br />
novo protocolo recebeu 76% das necessidades nutricionais<br />
em 15 horas e o grupo do protocolo atual recebeu 70% em um<br />
período de 22 horas.<br />
Este estudo 31 realizado na UTI do Royal University Hospital<br />
defende a adoção do protocolo atual para acompanhamento<br />
dos pacientes graves. Mas é preciso mais pesquisas para<br />
descobrir que mudanças devem ser feitas, nos casos de pacientes<br />
graves com alto risco de intolerância gastrointestinal<br />
(por exemplo: pacientes com traumatismo craniano).<br />
Apesar de estudos recentes mostrarem a eficácia da<br />
cisaprida 34,38,39,40 , metoclopramida 31,33,36 e eritromicina 35,37 no<br />
aumento da motilidade gastrointestinal, entretanto, com<br />
exceção da cisaprida 38 , há dados limitados que mostram a<br />
validez desses medicamentos na melhora da tolerância à<br />
TNE 41 .<br />
Montejo et al. 9 realizaram um estudo prospectivo de<br />
coorte, no qual analisaram durante 1 mês pacientes de UTI<br />
recebendo dieta enteral com SNG através de sistema contínuo<br />
com bomba de infusão, com o intuito de identificar a<br />
freqüência de complicações gastrointestinais devido à terapia<br />
nutricional enteral. A complicação mais encontrada foi<br />
o alto resíduo gástrico. O VR foi checado a cada seis horas e<br />
considerado alto quando estivesse igual ou acima de 200 mL.<br />
Foi utilizado o seguinte protocolo para os casos de altos resíduos<br />
gástricos: a infusão da dieta é interrompida por seis horas<br />
depois de cada episódio. A retirada definitiva da dieta enteral<br />
é feita se o protocolo seguido não for capaz de controlar os<br />
sintomas gastrointestinais em um período de três dias.<br />
Há controvérsias na literatura sobre a eficácia de se verificar<br />
o resíduo gástrico. Pacientes estáveis, especialmente aqueles<br />
em longos períodos com nutrição enteral, não necessitam<br />
verificação dos resíduos do estômago e estes podem conter, mais<br />
secreções e fluidos gástricos que alimentação. A aspiração do<br />
resíduo gástrico é mais relevante em pacientes críticos e em<br />
risco de gastroparesia 42 . Em pacientes graves, os resíduos devem<br />
ser verificados a cada 4 horas ou quando necessário 43,44 .<br />
Santhi 45 recomenda verificar o resíduo gástrico a cada 4<br />
horas.<br />
The Society of Critical Care Medicine 46 aconselha que<br />
o esvaziamento gástrico deve ser checado, medindo o VR<br />
gástrico em intervalos regulares. Em pacientes com VR altos,<br />
a alimentação enteral deve ser reduzida ou interrompida até<br />
o esvaziamento gástrico normalizar.<br />
McClave et al. 13 acreditam que não é preciso a checagem<br />
do VR nos pacientes que têm sonda em posição pós-pilórica<br />
e que a freqüência pode ser reduzida nos pacientes que estão<br />
tolerando bem a dieta, sem complicações, exames físicos e<br />
radiografias abdominais normais.<br />
Apesar de alguns estudiosos considerarem o uso do VR<br />
na monitoração da nutrição enteral 15,25,47 , não há ensaios<br />
controlados para validar este parâmetro 13 . Os profissionais da<br />
saúde ainda usam o VR como um dogma e param a admi-<br />
2<strong>19</strong>
Rev Bras Nutr Clin 2004; <strong>19</strong>(4):216-223<br />
nistração da dieta enteral, se caso o VR ultrapassar os valores<br />
designados como elevados, sem levar em consideração o estado<br />
clínico do paciente 10,24,25 .<br />
Há autores na literatura que recomendam a interrupção<br />
da dieta enteral nos casos de volumes gástricos iguais ou acima<br />
de 150 mL, pois até na administração da dieta no<br />
duodeno, pode ocorrer aspiração pulmonar significativa, se<br />
o estômago estiver distendido 48 .<br />
Alguns estudiosos recomendam segurar reter o alimento<br />
no estômago até 2 horas após obtido um VR alto 10,15,23,25 . Há<br />
também aqueles que sugerem que o VR seja segurado até que<br />
este caia a valores abaixo dos designados 10 . Outros estudos<br />
sugerem diminuir a medida, concentração e volume da dieta<br />
enteral 14,15,29 , posicionar a sonda em localização póspilórica<br />
29,32 ou passar para nutrição parenteral total 10,24 ao<br />
encontrarem VR elevados.<br />
É esperado que a infusão da dieta enteral no duodeno gere<br />
um VR desprezível, quando se compara com a administração<br />
de uma mesma fórmula no estômago 13 . A TNE por bolo é<br />
mais propensa à formação de altos VR, enquanto que a infusão<br />
contínua diminui as chances da ocorrência de VR 14 .<br />
A posição da sonda no fundo ou antro do estômago não<br />
influencia no valor do VR 13 .<br />
Napolitano et al. 49 observaram que sonda nasoentérica<br />
pós-pilórica via esofagogastroduodenoscopia teve sucesso<br />
em sua colocação (o oposto do obtido com a passagem não<br />
endoscópica) e permitiu, que pacientes graves com íleo gástrico<br />
alcançassem as metas nutricionais estabelecidas.<br />
Davies et al. 41 realizaram estudo prospectivo e<br />
randomizado, e analisaram pacientes críticos recebendo TNE<br />
através de sistema contínuo com bomba de infusão com SNG<br />
e outros com sonda nasojejunal (SNJ), colocada por<br />
endoscopia, com o propósito de verificar a tolerância da dieta<br />
através do VR. Os pacientes que possuíam SNJ, também contavam<br />
com a presença de uma SNG para medir o VR. A verificação<br />
do VR era feita a cada 6 horas e nenhum agente prócinético<br />
foi utilizado.<br />
Este estudo clínico australiano 41 adotou como protocolo<br />
para cessação da dieta em ambos os grupos, a ocorrência de<br />
qualquer uma das seguintes complicações: vômitos; VR maior<br />
que 250 mL, desde a última verificação do conteúdo gástrico;<br />
presença da dieta ou conteúdo gástrico no aspirado do<br />
tubo endotraqueal ou da traqueostomia e presença de contraste<br />
no conteúdo aspirado do estômago em qualquer paciente<br />
com SNJ. O VR adotado para interromper a TNE é bem mais<br />
alto do que os valores, geralmente utilizados na literatura.<br />
Apesar desta discrepância, as complicações, como pneumonia<br />
e episódios de SIRS, foram raras. A conclusão foi que a<br />
TNE por SNJ é associada com a redução significante do VR,<br />
aumentando sua tolerância e diminuindo a necessidade de<br />
nutrição parenteral.<br />
220<br />
Aspiração pulmonar<br />
O sucesso do suporte nutricional é um aspecto importante<br />
no cuidado ao paciente grave 41 . A nutrição enteral é mais<br />
barata 50 , preserva a função do trato gastrointestinal e reduz<br />
complicações infecciosas. Por estas características, é preferí-<br />
vel à nutrição parenteral 51,52 . Apesar destes benefícios, a aspiração<br />
da dieta nos pulmões é considerada o maior risco da<br />
terapia nutricional enteral 53 .<br />
A pneumonia de aspiração é considerada a complicação<br />
de maior gravidade em nutrição enteral e potencialmente<br />
fatal 11,21 . Sua incidência pode variar de 21% a 95% 54 . A aspiração<br />
pulmonar geralmente ocorre como conseqüência do<br />
refluxo 21 . Entretanto, se a sonda for colocada incorretamente<br />
na traquéia, a aspiração irá ocorrer como resultado da infusão<br />
da dieta na árvore traqueobronquial 21 . As fórmulas<br />
enterais podem ser regurgitadas até quando as sondas estão<br />
posicionadas corretamente no estômago, geralmente quando<br />
o esvaziamento gástrico está reduzido 21 .<br />
Os pacientes em risco de aspiração são aqueles com história<br />
de aspiração, estado mental alterado, refluxo<br />
gastroesofágico, esvaziamento gástrico retardado,<br />
gastroparesia, reflexo vagal diminuído, reflexo diminuído da<br />
tosse e deglutição e com ventilação mecânica 21,55 .<br />
Deve-se considerar alimentar pacientes com risco de aspiração<br />
após o ângulo de Treitz 18,56 . A posição pós-pilórica<br />
apresenta o problema da migração da sonda até o estômago 57 .<br />
Pacientes críticos correm o risco de sofrer aspiração da<br />
dieta enteral quando administrada em SNG; por isso, esta<br />
localização não é recomendada 45 . A passagem de sonda póspilórica<br />
é defendida por muitos autores para evitar resíduos<br />
gástricos altos 5,18,20,45,58 e também por diminuir as chances de<br />
ocorrer aspiração pulmonar 18,58 .<br />
Nos casos de dieta enteral contínua, recomenda-se diminuir<br />
a velocidade de gotejamento quando há gastroparesia,<br />
caso contrário, poderá haver aspiração pulmonar 59 .<br />
A posição do paciente evita o refluxo e a aspiração<br />
pulmonar?<br />
McClave et al. 13 mostraram que a posição do paciente<br />
(decúbito dorsal x decúbito lateral direito) não afeta na<br />
ocorrência de aspiração e VR.<br />
Cabré et al. 60 defendem que levantar a cabeceira da cama<br />
é obrigatório em todos os pacientes com sonda para prevenir<br />
a aspiração pulmonar.<br />
Ibáñez et al. 61 estudaram a incidência de refluxo em um<br />
grupo de pacientes com intubação orotraqueal e com dieta<br />
enteral administrada por sonda nasogástrica em decúbito<br />
dorsal e em decúbito elevado entre 30° e 45°. A pesquisa<br />
concluiu que o decúbito elevado não previne o refluxo, mas<br />
há maior incidência de refluxo em decúbito dorsal.<br />
Orozco-Levi et al. 62 também concluíram, que a posição<br />
do paciente com TNE por SNG e intubação orotraqueal, não<br />
o protege completamente da ocorrência de refluxo.<br />
Van der Voort et al. 63 estudaram pacientes críticos com<br />
ventilação mecânica, com o intuito de determinar a tolerância<br />
da dieta enteral medindo o VR (maior ou igual a 150 mL)<br />
nas posições de decúbito dorsal e decúbito elevado. O resultado<br />
sugere que a posição do paciente não teve significância<br />
na tolerância da dieta.<br />
Já Ciosak et al. 9 concordam que manter o paciente em<br />
decúbito elevado em Fowler 30° - 45° e/ou com tacos de 15<br />
cm sob os pés da cabeceira da cama previne acidentes decor-
entes de regurgitação e vômitos, com conseqüente aspiração<br />
pulmonar, principalmente em pacientes inconstantes, idosos<br />
ou neurológicos.<br />
Segundo Bastow 16 , se o paciente tiver uma sonda de alimentação<br />
em posição nasogástrica, a cabeceira da cama deve<br />
estar elevada para evitar a aspiração pulmonar e o refluxo.<br />
The Society of Critical Care Medicine 46 defende que a<br />
aspiração pulmonar pode ser evitada elevando a cabeceira da<br />
cama em 30° a 45° em todos os pacientes que estiverem recebendo<br />
dieta enteral em bolo (intermitente) ou em<br />
gotejamento contínuo.<br />
Recomendações para prevenção do refluxo na nutrição<br />
enteral<br />
Apesar de não haver consenso na literatura sobre o refluxo<br />
na terapia nutricional enteral de pacientes graves para o<br />
estabelecimento de um protocolo ideal, recomendamos checar<br />
os seguintes fatores para prevenção da complicação (Figura<br />
2).<br />
Comentários finais<br />
A intolerância da dieta enteral, com relação ao refluxo,<br />
é muito difícil de definir. A verificação do VR, exame físico<br />
e radiografia são parâmetros que não podem ser considerados<br />
como padrão ouro para distinguir a tolerância e a intolerância<br />
na terapia enteral 14 , mas são aqueles mais acessíveis, pois<br />
métodos como o radionucleotideo scanning escaneamento<br />
com radionucleotídeos, não são viáveis na prática clínica.<br />
A presença de um único episódio de VR elevado sem a<br />
avaliação clínica e de radiografia não pode resultar em suspensão<br />
da terapia nutricional enteral.<br />
Não há consenso na literatura sobre qual o valor mais<br />
apropriado do VR que indica intolerância a TNE. Os valores<br />
estão entre 100 mL e 250 mL. Nos estudos citados a<br />
checagem do VR está entre 2 e 6 horas.<br />
A SNG foi a posição em que foram encontrados maiores<br />
valores de VR, e a posição pós-pilórica parece ser a mais<br />
indicada. Nos casos de pacientes com risco de aspiração pulmonar,<br />
a melhor posição da sonda é após o ângulo de Treitz.<br />
Apesar de não haver concordância a respeito de qual é a<br />
melhor posição para evitar o refluxo e a aspiração pulmonar,<br />
recomenda-se o decúbito elevado entre 30° e 45°.<br />
Apesar de estudos recentes mostrarem a eficácia dos prócinéticos<br />
no aumento da motilidade gastrointestinal, com<br />
exceção da cisaprida, não há dados suficientes que mostram<br />
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última infusão<br />
Heitkemper & Williams24 , <strong>19</strong>85; 50% a 115% do volume da<br />
última<br />
Taylor29 , <strong>19</strong>89 infusão<br />
Cataldi-Betcher et al. 8 , <strong>19</strong>83 100 mL<br />
Norton et al. 10 , <strong>19</strong>88 100 mL<br />
Heitkemper & Williams24 , <strong>19</strong>85 100 mL<br />
Payne-James & Silk23 , <strong>19</strong>88 100 mL<br />
Metheny15 , <strong>19</strong>85 100 mL<br />
Mc Clave et al. 13 , <strong>19</strong>92 100 mL (com gastrostomia)<br />
Rombeau & Caldwell25 , <strong>19</strong>84 150 mL<br />
Breach & Saldanha27 , <strong>19</strong>88 150 mL<br />
Rombeau e Barot26 , <strong>19</strong>81 150 mL<br />
Irwin28 , <strong>19</strong>86 150 mL<br />
Bernard et al. 30 , <strong>19</strong>88 150 mL<br />
Pinilla et al. 31 , 2001 150 mL<br />
Hewmark et al. 14 , <strong>19</strong>87 150 mL<br />
Van der Voort et al. 63 , 2001 150 mL<br />
Montejo et al. 9 , <strong>19</strong>99 200 mL<br />
McClave et al. 13 , <strong>19</strong>92 200 mL<br />
Pinilla et al. 31 , 2001 250 mL ( uso obrigatório de<br />
pró-cinéticos)<br />
Davies et al. 41 , 2002 250 mL<br />
Chapman et al. 35 , 2000 250 mL ( com uso de<br />
eritromicina)<br />
Figura 1 - Quadro indicativo de volumes residuais considerados como<br />
refluxo na literatura<br />
a validez desses medicamentos na melhora da tolerância.<br />
A TNE por bolo é mais propensa a episódios de altos<br />
volumes residuais; já a infusão contínua, diminui as chances<br />
de a complicação ocorrer. Nos casos de gastroparesia, recomenda-se<br />
diminuir a velocidade de gotejamento da bomba<br />
de infusão, evitando futuros quadros de refluxo e aspiração<br />
pulmonar.<br />
Os esforços no sentido de garantir a tolerância do suporte<br />
nutricional por via enteral são essenciais para que a meta<br />
nutricional estabelecida seja alcançada, e a padronização de<br />
condutas é parte integrante desse processo.<br />
Agradecimentos<br />
Agradecemos à nutricionista Soraia Covelo Goulart e às<br />
estagiárias de nutrição Yuki Takahashi e Monica del Carmen<br />
Montenegro Cedeño, que tiveram importante participação<br />
para realização deste trabalho.<br />
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223
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inglês e espanhol, voltados ao interesse de profissionais e pesquisadores<br />
da área de nutrição clínica.<br />
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unitérminos). Os resumos devem ser estruturados e não devem exceder a<br />
250 palavras ou 1500 toques cada um. O resumo deverá ser muito claro e<br />
preciso, pois ele é o chamariz para a leitura do artigo na íntegra.<br />
3) Os trabalhos originais devem conter introdução, objetivo,<br />
casuística, material e métodos, resultados, discussão e conclusão e os textos<br />
mais especializados, aqueles itens que forem apropriados.<br />
4) As citações bibliográficas, no texto, devem ser sobrescritas e numeradas<br />
na ordem em que são citadas. As referências bibliográficas, ao final<br />
do trabalho, devem seguir as normas de Vancouver (Revista de Saúde<br />
Pública <strong>19</strong>99; 33 (1):6-15). Nas citações, no texto, com mais de dois autores,<br />
deve-se citar o primeiro autor seguido da expressão latina “et al.” e da<br />
numeração respectiva de sua referência. Nos artigos de revisão, as referências<br />
não devem exceder a 80 referências.<br />
5) Os trabalhos devem trazer, no início, o nome completo e a titulação<br />
principal dos autores, local onde foi realizado e endereço para correspondên-<br />
✓<br />
Instruções para os Autores<br />
Preparo dos Manuscritos<br />
Lista para conferência:<br />
Exemplo de referências bibliográficas<br />
estando assinalados o local, a data e a assinatura original de todos os autores.<br />
5) Os estudos envolvendo humanos e animais devem se adequar aos<br />
princípios estabelecidos respectivamente pelas Declarações de Tóquio e<br />
Helsinque respectivamente ou normatização ética equivalente sancionada<br />
por entidades nacionais.<br />
6) Pacientes envolvidos em estudos e pesquisas devem ter assinado o<br />
Consentimento Informado e a pesquisa deve ter a aprovação do conselho<br />
de ética e pesquisa da instituição à qual os autores pertençam.<br />
7) A publicação de um artigo está condicionada à aprovação do<br />
Conselho Editorial.<br />
8) Os editores se reservam o direito de editar e revisar os textos dos<br />
trabalhos aceitos para publicação, a fim de adaptá-los ao formato da Revista,<br />
remover redundâncias e deixar os textos mais claros e compreensíveis, sem<br />
alterar o significado e o conteúdo dos trabalhos. Os manuscritos editados serão<br />
enviados aos autores responsáveis pelo trabalho para aprovação final.<br />
cia do autor responsável, incluindo telefone, fax e e-mail atualizados.<br />
6) O trabalho deve ser enviado em disquete novo no formato<br />
Microsoft Word 95 ou 97 junto com uma cópia completa do trabalho, incluindo<br />
ilustrações e legendas, impressa em papel branco no tamanho A-4<br />
(212 mm x 297mm). Os autores devem certificar-se de que os disquetes não<br />
contém nenhum tipo de vírus, nem outros arquivos que não o artigo em<br />
questão.<br />
7) Os trabalhos podem incluir tabelas, gráficos, figuras, fotografias e<br />
outros tipos de ilustrações. Os gráficos devem ser no formato Excel ou outro<br />
formato compatível com o Windows. As figuras podem ser no formato<br />
(GIF, JPEG, BITMAP). As fotografias devem ser originais, em preto e branco,<br />
de boa qualidade, em papel brilhante, que permitam digitalização ou devem<br />
ser enviadas já digitalizadas em disquete ou CD - ROM, devidamente<br />
identificados. Todas as formas de ilustrações, gráficos e tabelas devem constar<br />
da cópia impressa e trazer legendas. Os símbolos e abreviações empregados<br />
devem ser explicados nas legendas. Ilustrações e fotografias previamente<br />
publicadas devem trazer a permissão dos autores ou dos editores da publicação<br />
anterior para reprodução na Revista Brasileira de Nutrição Clínica.<br />
Aquelas envolvendo pacientes identificáveis devem vir acompanhadas de<br />
autorização assinada pelos respectivos indivíduos. A Revista Brasileira de<br />
Nutrição Clínica se reserva o direito de limitar a quantidade de ilustrações.<br />
8) Os agradecimentos devem ser apresentados de forma sucinta e<br />
devem ser colocados após as conclusões, assim como a indicação de financiamento<br />
da pesquisa, o nome da agência financiadora e o número do processo.<br />
Nome completo do autor principal (sem abreviações)<br />
Nome completo do autor principal (sem abreviações) e dos co-autores<br />
Titulação principal dos autores<br />
Endereço para correspondência do autor responsável, incluindo telefone e e-mail atual<br />
Título, resumo estruturado e unitermos em português, inglês e espanhol com 250 palavras ou 1500 toques cada um.<br />
Entrega da versão impressa do texto, figuras, tabelas, gráficos e legendas.<br />
Indicação dos unitermos constantes na lista de descritores do LILACS<br />
(http://decs.bvs.br/P/decswebp.htm.)<br />
Entrega do texto digitado em Microsoft Word (95 ou 97) em disquete.<br />
(Certifique-se que o disquete não contém nenhum tipo de vírus)<br />
Entrega do texto das legendas de figuras, tabelas e quadros em Microsoft Word ou Microsoft Excel, no mesmo<br />
disquete.<br />
Referências bibliográficas segundo as normas de Vancouver<br />
Citações bibliográficas no texto numeradas de modo seqüencial e sobrescritas, sem datas entre parênteses.<br />
Periódico:<br />
1. Capella RF, Capella J, Mandac H, Nath P. Vertical banded gastroplasty - gastric bypass. Obes Surg <strong>19</strong>91; 1:2<strong>19</strong>-20.<br />
Livro:<br />
2. Phillips SJ. Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner BM. eds. Hypertension: pathophysiology, diagnosis, and management. 2nd.<br />
ed. New York, Raven Press; <strong>19</strong>95. p.465-78.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE NUTRIÇÃO<br />
PARENTERAL E ENTERAL<br />
Fone: (0xx 11) 3889.9909/ 3889.8774<br />
FICHA DE ATUALIZAÇÃO DE DADOS / PROPOSTA DE NOVOS SÓCIOS<br />
Atualização de Dados Proposta de Sócio<br />
Nome completo: ..............................................................................................................................<br />
Sexo: ............................................................................................. Data de Nascimento: ...............<br />
Endereço: .........................................................................................................................................<br />
CEP: ......................................... Cidade/Estado: ............................................................................<br />
Telefone residencial: (...........) ................................................... Fax: (...........) ............................<br />
Profissão: ....................................................................... E-mail: .....................................................<br />
Especialidade: ..............................................................................Data de graduação: ..................<br />
Endereço comercial: ........................................................................................................................<br />
Telefone comercial: (...........) ..................................................... Fax: (...........) ............................<br />
CEP: ......................................... Cidade/Estado: ............................................................................<br />
Enviar correspondência para endereço Residencial Comercial<br />
Participa de Equipe Multidisciplinar de Suporte Nutricional? Sim Não<br />
Membro da Indústria ? Não Sim Qual ? ..........................................................<br />
Professor Universitário ? Não Sim Nome da Faculdade ....................................<br />
..........................................................................................................................................................<br />
Assinatura do Proponente<br />
Publicação Oficial<br />
Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (<strong>SBNPE</strong>)<br />
Federación latinoamericana de Nutrición Parenteral y Enteral (Felanpe)<br />
Indexada no Index Medicus<br />
Latino Americano (Lilacs)<br />
Ficha de Assinatura<br />
ISSN 0103-7<strong>19</strong>6<br />
Nome completo: ..............................................................................................................................<br />
Sexo: ............................................................................................. Data de Nascimento: ...............<br />
Endereço: .........................................................................................................................................<br />
CEP: ......................................... Cidade/Estado: ............................................................................<br />
Telefone residencial: (...........) ................................................... Fax: (...........) ............................<br />
Telefone comercial: (...........) ..................................................... Fax: (...........) ............................<br />
Profissão: ....................................................................... E-mail: .....................................................<br />
É sócio da <strong>SBNPE</strong>? Sim Não<br />
Estou enviando cheque nominal à Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral<br />
referente à assinatura anual da Revista Brasileira de Nutrição Clínica<br />
Aquisição de exemplares<br />
Desejo adquirir exemplar(es) avulso(s) para o que incluo cheque nominal à Sociedade<br />
Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral<br />
Exemplares pedidos<br />
Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____<br />
Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____<br />
Recorte e envie para a <strong>SBNPE</strong><br />
por fax (0xx 11) 3889-9909 ou<br />
para o seguinte endereço:<br />
Rua Abílio Soares, 233 – Cj 144<br />
Paraíso – São Paulo – SP<br />
CEP 04005-000<br />
Preços<br />
Pessoa física*<br />
Assinatura anual<br />
Profissional R$ 120,00<br />
Estudante R$ 60,00<br />
Números avulsos R$ 30,00<br />
Pessoa jurídica*<br />
Assinatura anual R$ 170,00<br />
Números avulsos R$ 50,00<br />
* Sócios da <strong>SBNPE</strong> recebem a revista<br />
gratuitamente<br />
Recorte e envie para a <strong>SBNPE</strong> por<br />
fax (0xx 11) 3889-9909 ou para:<br />
Rua Abílio Soares, 233 – Cj 144<br />
Paraíso – São Paulo – SP<br />
CEP 04005-000<br />
Assinatura<br />
Aquisição de exemplares<br />
Assinatura do proponente
BRAZILIAN SOCIETY OF PARENTAL<br />
AND ENTERAL NUTRITION<br />
Phone: (0xx 11) 3889.9909/ 3889.8774<br />
PERSONAL DATA UPDATE / NEW MEMBERS PROPOSAL<br />
f Data Update Proposta de Sócio<br />
Name: ...............................................................................................................................................<br />
Sex: ............................................................................................... Date of Birth: ...........................<br />
Address: ............................................................................................................................................<br />
Zip Code: ................................. City/State: ...................................................................................<br />
Home Phone Number: ................................................................Fax: ...........................................<br />
Profession: ..................................................................... E-mail: .....................................................<br />
Specialty: .....................................................................................Graduated in: ...........................<br />
Commercial address: .......................................................................................................................<br />
Commercial phone: .....................................................................Fax: ...........................................<br />
Zip Code: ................................. City/State: ...................................................................................<br />
Send mail to Home Commercial Address<br />
Are you a member of a nutritional support team? Yes No<br />
Member of Industry ? No Yes Which ? ............................................................<br />
University Professor ? No Yes College: ............................................................<br />
..........................................................................................................................................................<br />
Proposer’s signature<br />
Official Publication of Brazilian Society of Parental and Enteral<br />
Nutrition (<strong>SBNPE</strong>) and of Federación Latinoamericana de Nutrición<br />
Parenteral y Enteral (Felanpe)<br />
Indexed by the Index Medicus<br />
Latino Americano (Lilacs)<br />
Subscription form<br />
ISSN 0103-7<strong>19</strong>6<br />
Name: ...............................................................................................................................................<br />
Sex: ............................................................................................... Date of Birth: ...........................<br />
Address: ............................................................................................................................................<br />
Zip Code: ................................. City/State: ...................................................................................<br />
Home Phone Number: ................................................................Fax: ...........................................<br />
Commercial phone: .....................................................................Fax: ...........................................<br />
Profession: ..................................................................... E-mail: .....................................................<br />
Member of the Society? Yes No<br />
I am enclosing a Brazilian bank account check payable to the Brazilian Society of Parenteral and<br />
Enteral Nutrition for an annual subscription of the Brazilian Journal of Clinical Nutrition.<br />
Single number acquisition<br />
Please send me the following numbers of the Journal for what I want to be charged:<br />
Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____<br />
Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____ Vol ____(No. ___) <strong>19</strong>_____<br />
Send this to the Society by fax:<br />
(55 11 3889-9909) or to<br />
the address below:<br />
Rua Abílio Soares, 233 – Cj 144<br />
Paraíso – São Paulo – SP<br />
CEP 04005-000 – Brazil<br />
Prices<br />
Private<br />
Annual<br />
Professional R$ 120,00<br />
Student R$ 60,00<br />
Single issues R$ 30,00<br />
Institutional<br />
Annual R$ 170,00<br />
Single issues R$ 50,00<br />
Send this to the Society by fax<br />
(55 11 3889.9909) or to<br />
the following address:<br />
Rua Abílio Soares, 233 – Cj 144<br />
Paraíso – São Paulo – SP<br />
CEP 04005-000 – Brazil<br />
Signature<br />
Single number acquisition<br />
Proposer’s signature