A Caprino-Ovinocultura Como Instrumento de ... - Embrapa
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Guimarães Filho, C.<br />
IV SEMANA DA CAPRINOCULTURA E OVINOCULTURA BRASILEIRAS<br />
<strong>Embrapa</strong> <strong>Caprino</strong>s - Sobral, 20 a 24 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2004<br />
A <strong>Caprino</strong>-<strong>Ovinocultura</strong> <strong>Como</strong> <strong>Instrumento</strong> <strong>de</strong> Fortalecimento do Agricultor <strong>de</strong><br />
Base Familiar do Semi-Árido<br />
1. Introdução<br />
Clovis Guimarães Filho<br />
Consultor SEBRAE/PE<br />
clovisgf@uol.com.br<br />
Parece ser consenso a necessida<strong>de</strong> e urgência <strong>de</strong> serem i<strong>de</strong>ntificadas e ampliadas<br />
as experiências promissoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento local existentes na região semi-árida,<br />
consolidando-as como espaços <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s múltiplas e dinâmicas e não, simplesmente,<br />
como meros espaços acessórios para fornecimento <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra e <strong>de</strong> alimentos ou,<br />
como atribuído mais recentemente, como simples "reservas ambientais". O<br />
<strong>de</strong>senvolvimento local integrado e sustentável requer a formação <strong>de</strong> uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
iniciativas e empreendimentos que, sem intervir na racionalida<strong>de</strong> própria do mercado, se<br />
complementem, maximizando as potencialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção, comércio, serviços e<br />
consumos locais. Ou seja, diversida<strong>de</strong> e complementarida<strong>de</strong> são as palavras-chave.<br />
Nesse sentido, alguns espaços do Semi-Árido, on<strong>de</strong> predominam as ativida<strong>de</strong>s capriovínicolas<br />
<strong>de</strong> base familiar, parecem satisfazer plenamente os requerimentos básicos<br />
para implementar um processo <strong>de</strong>ssa natureza, consi<strong>de</strong>rando a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ativida<strong>de</strong>s que lá ocorrem, algumas já consolidadas e outras ainda incipientes.<br />
2. As Potencialida<strong>de</strong>s e Limitações da <strong>Caprino</strong>-<strong>Ovinocultura</strong> <strong>de</strong> Base Familiar do<br />
Semi-Árido<br />
O Nor<strong>de</strong>ste possui mais da meta<strong>de</strong> dos estabelecimentos rurais <strong>de</strong> base familiar<br />
do país. Esses estabelecimentos correspon<strong>de</strong>m a 88% do total da região, porém ocupam<br />
menos da meta<strong>de</strong> da área total e produzem apenas 43% do valor da produção (INCRA-<br />
FAO, 1999). Esses números po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados como também representativos da<br />
realida<strong>de</strong> da região semi-árida, on<strong>de</strong> constata-se uma gran<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adaptação<br />
da unida<strong>de</strong> familiar à dinâmica acentuada ali observada. Esta adaptabilida<strong>de</strong> é traduzida,<br />
segundo Guanziroli (2001), na busca <strong>de</strong> uma diversificação que lhe possa trazer, antes<br />
<strong>de</strong> tudo, uma diluição dos riscos climático e <strong>de</strong> mercado. Isso é confirmado pelos dados<br />
<strong>de</strong> um estudo recente da <strong>Embrapa</strong> Semi-Árido (Holanda Júnior, 2004), ainda não<br />
publicados, mostrando que no sertão baiano, a região mais importante da caprinoovinocultura<br />
nacional, com cerca <strong>de</strong> 1,5 milhão <strong>de</strong> cabeças, correspon<strong>de</strong>nte a 20% do<br />
rebanho nor<strong>de</strong>stino, é praticada por diferentes tipologias, todas caracterizadas pela<br />
extrema diversificação <strong>de</strong> suas receitas. Estas incluem, internamente, além da caprinoovinocultura,<br />
as oriundas da criação <strong>de</strong> bovinos, <strong>de</strong> lavouras e <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s extrativas e,<br />
externamente, as oriundas da venda <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, aposentadoria e remessas <strong>de</strong><br />
familiares (Quadro 1). Apenas para o tipo 1, o mais pauperizado, as receitas das<br />
ativida<strong>de</strong>s agropecuárias e extrativistas são superadas pelas receitas externas. Nos<br />
<strong>de</strong>mais tipos essas receitas externas se situam entre 28 e 38% da receita total.<br />
Consi<strong>de</strong>rando, contudo, apenas as receitas internas, a caprino-ovinocultura constitui,<br />
para três dos quatro tipos i<strong>de</strong>ntificados, a sua principal fonte.<br />
Analisadas como agronegócios, as ca<strong>de</strong>ias produtivas <strong>de</strong> caprinos e ovinos da<br />
região são ainda bastante incipientes, apresentando acentuadas <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong>s, tanto no
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segmento <strong>de</strong> criação como nos segmentos transformador e distribuidor. Apesar <strong>de</strong><br />
extremamente eficientes em suas estratégias <strong>de</strong> relacionamento com os aspectos<br />
<strong>de</strong>sfavoráveis do ambiente natural (Caron et al., 1992), falta ao caprino-ovinocultor <strong>de</strong><br />
base familiar uma visão mais objetiva do contexto econômico em que vive e das<br />
estratégias <strong>de</strong> valorização dos seus produtos capazes <strong>de</strong> lhe propiciar uma base mais<br />
segura para consolidar o caminho para uma maior inserção no mercado. Mesmo assim,<br />
as ca<strong>de</strong>ias da caprinocultura e da ovinocultura ten<strong>de</strong>m a se consolidar, em função <strong>de</strong><br />
uma maior articulação entre os diversos segmentos e da incorporação <strong>de</strong> novos atores<br />
no processo (Guimarães Filho & Correia, 2001).<br />
Quadro 1. Estrutura <strong>de</strong> renda <strong>de</strong> diferentes tipologias <strong>de</strong> caprino-ovinocultor no<br />
sertão baiano do São Francisco<br />
INDICADORES TIPO 1 TIPO 2 TIPO 3 TIPO 4<br />
Renda Bruta (salários mínimos / mês) 1,36 2,10 3,46 4,11<br />
COMPOSIÇÃO DA RENDA (%) 100,0 100,0 100,0 100,0<br />
• Produção vegetal 12,4 16,0 13,3 31,8<br />
• <strong>Caprino</strong>-ovinocultura 18,4 21,7 30,8 16,5<br />
• Bovinocultura mista 7,5 17,0 20,0 15,4<br />
• Venda <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra 10,6 2,9 0,8 1,2<br />
• Outras receitas da proprieda<strong>de</strong> 6,7 7,2 7,7 5,0<br />
• Aposentadoria 28,2 22,8 18,0 24,1<br />
• Outras receitas 16,2 12,4 9,4 6,0<br />
Fonte: adaptado <strong>de</strong> Holanda Júnior (2004)<br />
Há um efetivo potencial <strong>de</strong> mercado para os produtos caprinos e ovinos,<br />
representado por uma <strong>de</strong>manda não satisfeita e crescente, mesmo com as conhecidas<br />
limitações <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> oferta irregular <strong>de</strong>sses produtos. As carnes caprina e ovina,<br />
vêm apresentando, sem o apoio <strong>de</strong> campanhas promocionais, incrementos anuais <strong>de</strong><br />
consumo superiores a 10%. Com base em projeções do trabalho <strong>de</strong> Moreira et al.<br />
(1996), é possível estimar que, somente para aten<strong>de</strong>r os cerca <strong>de</strong> 300 mil habitantes<br />
urbanos do eixo Juazeiro-Petrolina, são abatidas diariamente mais <strong>de</strong> 700 cabeças, o que<br />
correspon<strong>de</strong>ria a um consumo superior a 7,0 kg/habitante/ano. Embora não se possa<br />
falar ainda <strong>de</strong> um mercado para o leite caprino, são animadoras as experiências com o<br />
produto nas regiões do Cabugi (RN) e do Cariri Oci<strong>de</strong>ntal (PB) apesar da sua forte<br />
<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> compradores institucionais públicos. As perspectivas apontam para um<br />
nicho <strong>de</strong> mercado bem mais favorável para os queijos <strong>de</strong> leite <strong>de</strong> cabra nos gran<strong>de</strong>s<br />
centros urbanos, resguardado o seu padrão <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> para um consumidor bem mais<br />
exigente. Um novo cenário <strong>de</strong> zona vitivinícola que está surgindo no vale do São<br />
Francisco, por exemplo, favorece essas perspectivas em função da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
associação <strong>de</strong>sses queijos com um gran<strong>de</strong> programa <strong>de</strong> eno-turismo que começa a ser<br />
implantado naquela região.<br />
A esses mercados potenciais se associam outros fatores favoráveis a<br />
dinamização <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>stacando-se entre eles:<br />
a própria vocação natural e histórica do bioma caatinga para essas ativida<strong>de</strong>s;<br />
os expressivos efetivos <strong>de</strong> rebanhos caprino e ovino da região, estimados,<br />
conjuntamente, em mais <strong>de</strong> 15 milhões <strong>de</strong> cabeças;<br />
a disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tecnologias <strong>de</strong> baixo custo capazes <strong>de</strong> elevar<br />
substancialmente os níveis <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> dos sistemas <strong>de</strong> criação;
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a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interação com os perímetros <strong>de</strong> irrigação, em número crescente<br />
e hoje disseminados em praticamente todos os estados, o que multiplica a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> elevar os níveis <strong>de</strong> eficiência biológica e econômica <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sempenho dos rebanhos;<br />
a infraestrutura agroindustrial em expansão, no caso <strong>de</strong> abatedouros e laticínios,<br />
e já consolidada e altamente eficiente, no caso dos curtumes;<br />
as políticas públicas <strong>de</strong> apoio, especialmente <strong>de</strong> crédito, em contínuo processo<br />
<strong>de</strong> expansão e <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação às circunstâncias do caprino-ovinocultor <strong>de</strong> base<br />
familiar.<br />
Por outro lado, as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> caprinos e ovinos também sofrem forte<br />
influência <strong>de</strong> fatores que limitam e, algumas vezes impe<strong>de</strong>m, a plena expressão das<br />
potencialida<strong>de</strong>s mencionadas. Entre essas limitantes <strong>de</strong>vem ser citadas a <strong>de</strong>bilida<strong>de</strong><br />
organizativa do caprino-ovinocultor familiar e o seu nível insatisfatório <strong>de</strong> capacitação<br />
tecnológica e gerencial. Esse quadro é agravado pela quase total ausência <strong>de</strong> um sistema<br />
<strong>de</strong> assistência técnica e extensão rural efetivamente qualificado e pelas condições ainda<br />
<strong>de</strong>ficientes <strong>de</strong> crédito que lhe são oferecidas, apesar das recentes melhoras. Além<br />
<strong>de</strong>sses, outros obstáculos precisam ser equacionados e removidos se o objetivo for uma<br />
maior inserção <strong>de</strong>sses produtores nesse promissor mercado. São obstáculos mais<br />
facilmente superados com o fortalecimento da organização do produtor e a melhoria da<br />
sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> articulação com os <strong>de</strong>mais atores envolvidos no processo. Alinhamse<br />
entre eles:<br />
• o abate informal clan<strong>de</strong>stino e generalizado;<br />
• a extrema <strong>de</strong>sarticulação entre os segmentos da ca<strong>de</strong>ia produtiva, o que torna<br />
quase inacessíveis os canais <strong>de</strong> distribuição;<br />
• as limitações <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m social, <strong>de</strong>stacando-se o preconceito contra o “bo<strong>de</strong>”,<br />
visto como “produto <strong>de</strong> pobre” e o crescente problema <strong>de</strong> roubo <strong>de</strong> animais que<br />
ten<strong>de</strong> a inviabilizar a ativida<strong>de</strong> em algumas regiões<br />
3. O Pseudo Antagonismo Agricultura Familiar x Agronegócio<br />
A busca da geração <strong>de</strong> emprego e renda através da dinamização da economia das<br />
áreas <strong>de</strong> predomínio da caprino-ovinocultura <strong>de</strong>ve procurar conciliar os tradicionais<br />
enfoques <strong>de</strong> agronegócio e agricultura familiar, associando a produção <strong>de</strong>ssas espécies,<br />
como ativida<strong>de</strong>s base, a outras opções produtoras <strong>de</strong> bens e serviços agrícolas e nãoagrícolas<br />
e explorando as inúmeras vantagens <strong>de</strong> suas complementarida<strong>de</strong>s.<br />
A rigor o fortalecimento do agronegócio <strong>de</strong> qualquer produto implica a<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> especialização. Por outro lado, o fortalecimento dos sistemas produtivos<br />
<strong>de</strong> base familiar implica o oposto, a diversificação. Segundo Veiga (2001), as duas<br />
estratégias não são antagônicas e a própria realida<strong>de</strong> da região semi-árida mostra isto<br />
perfeitamente. As ativida<strong>de</strong>s já são diversificadas, <strong>de</strong>ntro da proprieda<strong>de</strong>, existindo<br />
naturalmente, entre elas, uma ou duas que se <strong>de</strong>stacam pela sua maior inserção no<br />
mercado. O que a proposta <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ve privilegiar, é a busca <strong>de</strong> formas <strong>de</strong><br />
maximização da eficiência <strong>de</strong>sses sistemas que impliquem, simultaneamente, maior<br />
interação entre os subsistemas <strong>de</strong>ntro da unida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sta com as <strong>de</strong>mais ativida<strong>de</strong>s<br />
agrícolas e não-agrícolas fora da unida<strong>de</strong> produtiva. É perfeitamente possível o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sistemas diversificados <strong>de</strong> base familiar, oferecendo ao mercado,<br />
pelo menos um dos produtos com as qualificações mercadológicas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m sanitária,<br />
sensorial e <strong>de</strong> uso exigidas pelo consumidor. As dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso aos mercados
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pelos produtos da agricultura familiar <strong>de</strong>correm muito mais da sua incapacida<strong>de</strong> em<br />
aten<strong>de</strong>r os requisitos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e regularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferta do que propriamente da<br />
natureza <strong>de</strong> organização da produção que lhe é peculiar. Melhorar o nível <strong>de</strong><br />
organização e enfatizar a capacitação em gestão da unida<strong>de</strong> produtiva são os<br />
instrumentos <strong>de</strong> ação que <strong>de</strong>vem ser empregados para reduzir ou eliminar essas<br />
<strong>de</strong>ficiências.<br />
Segundo Cerdan & Sautier (2001), a agricultura familiar do Nor<strong>de</strong>ste se<br />
caracteriza por uma forte capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adaptação às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> mercado e uma<br />
flexibilida<strong>de</strong> e uma dinâmica <strong>de</strong> inovação no que concerne a produtos e procedimentos,<br />
que po<strong>de</strong>m ser expressas tanto a uma escala territorial como a uma escala <strong>de</strong> unida<strong>de</strong><br />
produtiva. O requisito básico seria o estabelecimento <strong>de</strong> políticas públicas que<br />
realmente permitissem valorizar a diversida<strong>de</strong> do potencial existente, através da<br />
mobilização dos atores econômicos e da valorização dos produtos locais.<br />
O objetivo principal da busca por maior inserção no mercado <strong>de</strong>verá ainda estar<br />
vinculado ao aumento da oferta <strong>de</strong> empregos agrícolas e não-agrícolas através do<br />
fortalecimento da natureza pluriativa da produção <strong>de</strong> base familiar e da exploração do<br />
potencial <strong>de</strong> sinergias entre os distintos setores da economia. As suas relações com o<br />
mercado precisam ser estabelecidas em novas bases. O PAMSA, Programa <strong>de</strong> Acesso a<br />
Mercado no Semi-Árido Brasileiro (CRS-DED-MLAL-OXFAM, 2003), iniciativa <strong>de</strong><br />
quatro agências <strong>de</strong> cooperação internacional, consi<strong>de</strong>ra que não se trata simplesmente<br />
<strong>de</strong> garantir um maior acesso aos mercados, mas, também, <strong>de</strong> qualifica-lo, <strong>de</strong> modo que<br />
essa inserção se proceda em base mais justas e transparentes, assegurando a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> uma região com produtos e culturas próprias como principal força <strong>de</strong> inserção nos<br />
mercados. A base <strong>de</strong> apoio a esse enfoque se fortalece com os crescentes movimentos<br />
<strong>de</strong> consumo consciente, comércio justo e solidário que se observa a nível mundial.<br />
4. Certificação <strong>de</strong> Origem, uma Estratégia <strong>de</strong> Valorização<br />
Uma proposta regional <strong>de</strong> apoio a caprino e a ovinocultura <strong>de</strong> base familiar do<br />
Semi-Árido representaria um primeiro passo <strong>de</strong> um plano mais abrangente <strong>de</strong> integração<br />
<strong>de</strong> diferentes alternativas, consolidando eixos econômicos associados a apicultura, a<br />
criação <strong>de</strong> aves caipiras, ao extrativismo racional e/ou cultivo sistemático do umbuzeiro<br />
e a <strong>de</strong>terminados cultivos <strong>de</strong> sequeiro (sisal, caju, algodão, mandioca, mamona), aos<br />
cultivos irrigados e ao agro-ecoturismo, perfeitamente factíveis em espaços<br />
diferenciados da região semi-árida.<br />
A valorização dos produtos locais é, no contexto da globalização, o gran<strong>de</strong><br />
instrumento estratégico para alcançar os objetivos principais <strong>de</strong> preservar os recursos<br />
da caatinga e assegurar, ao mesmo tempo, o bem estar das populações que nela vivem e<br />
<strong>de</strong>la <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m. Produtos diferenciados, a partir da incorporação <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
territorial e cultural, constituem uma alternativa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> potencial no Semi-Árido. É<br />
simplesmente uma questão <strong>de</strong> um pouco mais <strong>de</strong> esforço em conhecer melhor o que<br />
temos e do que dispomos, <strong>de</strong> conhecer e reconhecer os conhecimentos locais,<br />
associando-os, a partir daí, ao conhecimento científico necessário a plena expressão do<br />
potencial do bioma.<br />
A estratégia mais indicada <strong>de</strong> implementação do processo <strong>de</strong>ve se basear na<br />
diferenciação dos produtos a ser fundamentada no estabelecimento <strong>de</strong> normas que<br />
<strong>de</strong>finam e orientem o processo <strong>de</strong> sua certificação. O DOC - Denominação <strong>de</strong> Origem<br />
Controlada e o IGP (Indicação Geográfica Protegida), tipos <strong>de</strong> certificação que já<br />
existem em vários países, sobretudo na Europa, seriam não apenas esses instrumentos
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<strong>de</strong> agregação <strong>de</strong> valor a esses produtos, mas, sobretudo, constituiriam os requisitos<br />
básicos para o seu reconhecimento e proteção. São certificados com o DOC, por<br />
exemplo, todos os produtos cujas qualida<strong>de</strong>s ou características se <strong>de</strong>vam exclusiva ou<br />
essencialmente ao meio geográfico, incluídos aí fatores naturais (solo, clima) e/ou<br />
humanos (tradição, cultura). Em outras palavras, <strong>de</strong>ve haver uma clara ligação<br />
estabelecida entre o produto, o território e o talento do homem (o “saber-fazer”).<br />
A concepção <strong>de</strong>sses produtos a certificar <strong>de</strong>ve resultar <strong>de</strong> um processo natural <strong>de</strong><br />
construção social, refletida na sua i<strong>de</strong>ntificação com o território <strong>de</strong> origem em suas<br />
dimensões geográfica, histórica e cultural. O produto, apresentaria forte apelo<br />
mercadológico, especialmente em função da sua relação harmônica com o meio<br />
ambiente. Entretanto, características como essas, precisam ainda <strong>de</strong> uma construção<br />
pelo “marketing” (CNEARC-CIRAD-INRA, 1998), posicionando-o no mercado através<br />
<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> comunicação mais amplo sobre sua imagem. É isso que é praticado por<br />
um sem número <strong>de</strong> países com vários produtos das regiões mais <strong>de</strong>sfavorecidas, on<strong>de</strong><br />
predominam pequenos agricultores familiares. Quase toda as partes norte e leste <strong>de</strong><br />
Portugal estão zoneadas para produção <strong>de</strong> caprinos e ovinos com <strong>de</strong>nominações <strong>de</strong><br />
origem e indicações geográficas protegidas (Teixeira, 2003). São sete “marcas” <strong>de</strong><br />
ovinos (“borrego Serra da Estrela”, “borrego da Beira”, “cor<strong>de</strong>iro Bragançano”, etc.),<br />
ilustradas na Figura 1, e cinco <strong>de</strong> caprinos (“cabrito Transmontano”, “cabrito da Beira”,<br />
etc.). A Espanha exibe o seu famoso cor<strong>de</strong>iro “ternasco <strong>de</strong> Aragón” e o “lechal <strong>de</strong><br />
Churra”. Na França po<strong>de</strong>m ser citados os queijos “roquefort“ (<strong>de</strong> leite <strong>de</strong> ovelha) e<br />
“chabichou du Poitou” (<strong>de</strong> leite <strong>de</strong> cabra). Dezesseis porcento da produção queijeira da<br />
França tem certificação <strong>de</strong> origem. Na Argentina conta com o “cor<strong>de</strong>ro patagón” .<br />
Embora não possa ser caracterizada exatamente como um produto com <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong><br />
origem, no Brasil existe uma iniciativa similar, na região <strong>de</strong> Herval, RS, com a<br />
comercialização do “cor<strong>de</strong>iro Herval Premium”. Esta experiência po<strong>de</strong> evoluir para um<br />
DOC efetivo, estabelecidos os requisitos fundamentais <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir melhor as<br />
especificida<strong>de</strong>s do produto e <strong>de</strong> certificação in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, ainda ausentes no caso. No<br />
país só existe um produto com certificação <strong>de</strong> origem, o vinho do Vale dos Vinhedos,<br />
RS. Outras iniciativas em busca <strong>de</strong>ssa certificação estão em andamento, entre elas o mel<br />
<strong>de</strong> abelhas da região <strong>de</strong> São Raimundo Nonato, PI, o queijo <strong>de</strong> coalho do Ceará e o<br />
queijo da Serra da Canastra, MG.<br />
Para obter o reconhecimento e utilizar o selo <strong>de</strong> <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong> origem o<br />
produto <strong>de</strong>ve aten<strong>de</strong>r um conjunto <strong>de</strong> exigências contidas no “ca<strong>de</strong>rno <strong>de</strong> normas e<br />
especificações”. Nele <strong>de</strong>vem estar registrados o nome do produto, sua <strong>de</strong>scrição,<br />
<strong>de</strong>limitação da área geográfica, provas <strong>de</strong> origem, <strong>de</strong>scrição dos métodos <strong>de</strong> obtenção<br />
do produto (alimentação, genótipos, manejo reprodutivo, controle sanitário, etc.),<br />
sistema <strong>de</strong> controle e as exigências a serem cumpridas para obtenção do certificado e<br />
uso do selo. O cumprimento <strong>de</strong>ssas normas e especificações é normalmente fiscalizado<br />
por certificadoras in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes cre<strong>de</strong>nciadas pelo órgão oficiais que tratam da<br />
agropecuária. Embora os primeiros passos para normatizar todos esses procedimentos já<br />
estejam sendo dados, estamos ainda muito atrasados nesse processo. Santa Catarina,<br />
como sempre, partiu na frente e, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2002, já tem a sua legislação específica e o seu<br />
serviço estadual <strong>de</strong> selos e certificações <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> . Quem duvidaria, atendidas as<br />
exigências, do sucesso <strong>de</strong> um “cabrito <strong>de</strong> Uauá”, <strong>de</strong> um “queijo <strong>de</strong> leite <strong>de</strong> cabra do<br />
Cabugí”, <strong>de</strong> um “mel do Araripe” ou <strong>de</strong> um “suco <strong>de</strong> umbu do São Francisco”<br />
certificados com o DOC?. Seria um agronegócio diferente dos convencionais, na<br />
medida em que elegeria como premissas básicas a preservação do ecossistema e a<br />
equida<strong>de</strong> social na distribuição dos benefícios gerados.
Lisboa<br />
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<strong>Embrapa</strong> <strong>Caprino</strong>s - Sobral, 20 a 24 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2004<br />
Viana do Castelo<br />
Braga<br />
Leiria<br />
Setúbal<br />
Porto<br />
Santarém<br />
Coimbra<br />
4<br />
Vila Real<br />
Viseu<br />
7<br />
1<br />
Guarda<br />
5<br />
6<br />
Bragança<br />
2<br />
Castelo Branco<br />
Portalegre<br />
Montemor-o-Novo<br />
3 Évora<br />
Faro<br />
Beja<br />
1<br />
2<br />
3<br />
4<br />
5<br />
6<br />
7<br />
Se<strong>de</strong> <strong>de</strong> distrito<br />
Outras localida<strong>de</strong>s<br />
Limite <strong>de</strong> distrito<br />
Borrego Serra da Estrela<br />
Borrego Terrincho<br />
Borrego <strong>de</strong> Montemor-o-Novo<br />
Borrego do Baixo Alentejo<br />
Borrego da Beira<br />
Cor<strong>de</strong>iro Bragançano<br />
Borrego do Nor<strong>de</strong>ste Alentejo<br />
Figura 1. Zonas produtoras <strong>de</strong> ovinos em Portugal, com <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong> origem<br />
5. O Que Certificar na <strong>Caprino</strong>-<strong>Ovinocultura</strong> do Semi-Árido?<br />
Concentrando a discussão no segmento da caprino-ovinocultura, seria também<br />
necessária uma análise bem criteriosa para <strong>de</strong>finir as alternativas <strong>de</strong> produção que
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melhor se ajustariam aos critérios implícitos na visão <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento exposta<br />
anteriormente. Evi<strong>de</strong>ntemente, que para cada espaço geográfico diferenciado, em<br />
termos agro-ecológicos e sócio-econômicos, haveria uma ou duas opções mais<br />
a<strong>de</strong>quadas. Consi<strong>de</strong>rando as zonas mais secas, on<strong>de</strong> as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interação com<br />
outras ativida<strong>de</strong>s são mais escassas, as alternativas disponíveis são mais limitadas. Uma<br />
<strong>de</strong>las seria a produção semi-extensiva <strong>de</strong> cabritos e borregos <strong>de</strong> corte e outra a<br />
caprinocultura <strong>de</strong> leite, na perspectiva da produção <strong>de</strong> queijos e outros <strong>de</strong>rivados para<br />
nichos <strong>de</strong> mercado bem <strong>de</strong>finidos.<br />
<strong>Como</strong> seria, por exemplo, um cabrito com certificação <strong>de</strong> origem protegida<br />
(DOC) que a agricultura familiar do semi-árido pu<strong>de</strong>sse ofertar ao mercado? Antes <strong>de</strong><br />
tudo, o produto precisaria ter uma “marca”, tipo "cabrito ecológico da caatinga", mais<br />
abrangente, ou tipo "cabrito <strong>de</strong> Uauá”, circunscrita a um espaço menor. O importante<br />
para o produto seria <strong>de</strong>finir suas especificida<strong>de</strong>s e vincula-las a uma ou mais<br />
características próprias daquele espaço. O meio geográfico marca e personaliza o<br />
produto pelo que a <strong>de</strong>limitação da zona <strong>de</strong> produção torna-se pré-requisito<br />
indispensável. O “sabor da caatinga” implícito na carne do cabrito viria da associação<br />
com a vegetação <strong>de</strong> caatinga <strong>de</strong> que se alimenta, pelo menos em parte <strong>de</strong> sua vida<br />
(po<strong>de</strong>ria ser um “cabrito do Cariri”), ou com uma <strong>de</strong>terminada raça ou ecotipo nativo<br />
e/ou (“cabrito do Moxotó”, no vale do mesmo nome), ou ainda, a uma maneira<br />
tradicional e peculiar <strong>de</strong> abater e processar o animal, como a “manta seca retalhada”.<br />
Este tipo <strong>de</strong> “saber-fazer” po<strong>de</strong>ria ser valorizado como uma especificida<strong>de</strong>,<br />
contribuindo na <strong>de</strong>finição, por exemplo, do “cabrito <strong>de</strong> Uauá”, ou <strong>de</strong> qualquer outro<br />
espaço geográfico on<strong>de</strong> essa prática se <strong>de</strong>stacasse. O zoneamento do Semi-Árido,<br />
portanto, torna-se um procedimento essencial para fundamentar um processo <strong>de</strong><br />
i<strong>de</strong>ntificação e espacialização das potenciais marcas <strong>de</strong> cabritos e borregos, com base<br />
em suas especificida<strong>de</strong>s ligadas a fatores naturais e/ou culturais <strong>de</strong> cada espaço.<br />
A criação <strong>de</strong> uma ou mais marcas <strong>de</strong> “cabrito ecológico da caatinga”, a exemplo<br />
do “vitelo do Pantanal”, que começa s ser produzido no Centro-Oeste, enfatizaria as<br />
relações do animal com o bioma, utilizaria um mínimo <strong>de</strong> insumos externos e<br />
valorizaria e preservaria as raças nativas, mesmo que esses fatores limitassem a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um abate mais precoce, em função <strong>de</strong> um <strong>de</strong>senvolvimento pon<strong>de</strong>ral um<br />
pouco mais lento. Isto não constituiria problema, já que essa aparente <strong>de</strong>svantagem<br />
po<strong>de</strong>ria ser neutralizada pela produção <strong>de</strong> carcaças mais leves ou largamente<br />
compensada tanto pelo nível menor <strong>de</strong> investimento necessário quanto pelo valor<br />
agregado ao produto pelas suas especificida<strong>de</strong>s mercadológicas. As <strong>de</strong>mais qualida<strong>de</strong>s<br />
do produto, a nutritiva (teor menor <strong>de</strong> colesterol e <strong>de</strong> calorias), a sanitária<br />
(saudabilida<strong>de</strong>) e <strong>de</strong> uso (cortes especiais resfriados e congelados, ou transformados)<br />
complementariam o elenco <strong>de</strong> “qualida<strong>de</strong>s mercadológicas”, embora não caracterizem<br />
propriamente especificida<strong>de</strong>s.<br />
Um produto com essas características aten<strong>de</strong>ria os fundamentos das crescentes<br />
<strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> mercado e pressões sociais, representados pelo uso sustentável dos<br />
recursos naturais, nos aspectos <strong>de</strong> segurança alimentar, geração <strong>de</strong> emprego e renda,<br />
conservação ambiental e envolvimento e participação popular (Mansvelt et al., 1993).<br />
Um produto efetivamente diferenciado e impossível <strong>de</strong> ser imitado como esse (on<strong>de</strong> não<br />
há caatinga não se po<strong>de</strong> produzir o “sabor da caatinga”) po<strong>de</strong>ria se constituir em<br />
importante alternativa <strong>de</strong> resgate social e econômico do caprinocultor da região semiárida<br />
e <strong>de</strong> reversão do acentuado processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>gradação dos recursos naturais que<br />
atinge esta região. Contatos preliminares mantidos com re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> supermercados<br />
confirmaram o interesse <strong>de</strong>ssas organizações em trabalhar com um produto caprino ou<br />
ovino <strong>de</strong>ssa natureza, com certificação <strong>de</strong> origem.
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Isto também po<strong>de</strong>ria ser feito com a carne ovina, porém com maiores<br />
dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> associação do produto com o ambiente da caatinga e com limitações <strong>de</strong><br />
competitivida<strong>de</strong>, em função da forte concorrência <strong>de</strong> outros estados (além do Sul, a<br />
ovinocultura se expan<strong>de</strong> rapidamente no Centro-Oeste e no Su<strong>de</strong>ste) e dos países do<br />
Mercosul. Embora o mercado hoje seja mais favorável aos ovinos, a médio e longo<br />
prazos, as perspectivas para o caprino, como produto <strong>de</strong> maior potencial <strong>de</strong><br />
diferenciação para o mercado, seriam mais favoráveis. Outra opção seria a produção<br />
orgânica, com potencial para as carnes e queijos caprinos e ovinos. Projetos nesse<br />
sentido já se acham em andamento com caprinos (Guimarães Filho et al., 2001) e com<br />
ovinos (Araújo Filho & Marinho, 2003). Este caminho, contudo, além da maior<br />
complexida<strong>de</strong> do processo <strong>de</strong> certificação, mormente para produtores <strong>de</strong> baixo nível <strong>de</strong><br />
organização, apresenta a <strong>de</strong>svantagem <strong>de</strong> não ser uma solução massiva.<br />
A carne e o leite não <strong>de</strong>vem ser encarados como produtos únicos para a ativida<strong>de</strong><br />
capri-ovinícola praticada pelas organizações <strong>de</strong> agricultores familiares. Há muito boas<br />
perspectivas ainda para as peles, enfatizando o artesanato (artigos <strong>de</strong> montaria,<br />
indumentária para vaquejadas, sandálias, casacos, bolsas, móveis, etc.) e associando-o a<br />
um tipo <strong>de</strong> “capri-turismo” ou “circuito do bo<strong>de</strong>”, em que estariam também inseridas<br />
unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> criação e <strong>de</strong> beneficiamento com interesse técnico, ecológico,<br />
gastronômico, cultural ou <strong>de</strong> lazer, transformáveis em pequenas unida<strong>de</strong>s hoteleiras.<br />
Em suma, a implantação <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong> origem controlada<br />
para os produtos do semi-árido, como o caprino e o ovino, po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada como<br />
inserida no processo <strong>de</strong> “<strong>de</strong>senvolvimento local” proposto por Turner & Búrigo (1999),<br />
já que busca a valorização <strong>de</strong> uma especificida<strong>de</strong> local, transformando-o em um<br />
“produto do território” capaz <strong>de</strong> servir como instrumento tanto <strong>de</strong> inserção econômicosocial<br />
como <strong>de</strong> reafirmação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> local. Seria uma forma alternativa <strong>de</strong> inserção<br />
do produtor <strong>de</strong> base familiar na lógica adversa do mercado convencional (Schrö<strong>de</strong>r et<br />
al., 2002).<br />
6. Consi<strong>de</strong>rações Finais<br />
As linhas iniciais <strong>de</strong> ação para o sucesso <strong>de</strong> um programa regional com esse<br />
enfoque abrangeriam, além, naturalmente, do estabelecimento <strong>de</strong> normas e serviços que<br />
regulamentem e operacionalizem o processo, o fortalecimento das associações <strong>de</strong><br />
produtores (não há certificação para pessoa física), a estruturação <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s locais <strong>de</strong><br />
apoio técnico, uma linha <strong>de</strong> crédito específica, a<strong>de</strong>quada a capacida<strong>de</strong> remuneratória <strong>de</strong><br />
capital <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s, e a estruturação <strong>de</strong> um programa <strong>de</strong> P&D que inclua, como<br />
ação inicial, um zoneamento <strong>de</strong> toda área ocupada pelo bioma caatinga, i<strong>de</strong>ntificando,<br />
para cada produto, as zonas diferenciadas ou territórios potenciais para obtenção <strong>de</strong><br />
DOC e IGP.<br />
As ações <strong>de</strong>ssa natureza <strong>de</strong>verão ter como referência balizadora a conservação da<br />
biodiversida<strong>de</strong>, procurando conciliar a intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada uma das ativida<strong>de</strong>s com as<br />
restrições ambientais necessárias a neutralizar a erosão <strong>de</strong>ssa diversida<strong>de</strong> biológica. O<br />
<strong>de</strong>senvolvimento da caprinocultura e da ovinocultura <strong>de</strong> base familiar <strong>de</strong>ve, por<br />
conseguinte, se basear em sistemas diversificados que atendam esse requerimento, que<br />
enfatizem suas interações com os <strong>de</strong>mais setores da economia e que o integre,<br />
simultaneamente, às <strong>de</strong>mais políticas já existentes para o campo, segundo recomendam<br />
Del Grossi & Graziano da Silva (2002).<br />
O conjunto <strong>de</strong> ações <strong>de</strong>ve ser implantado em espaços supramunicipais ocupados<br />
pela agricultura familiar, on<strong>de</strong> haja elementos potenciais <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> coletiva e outros
Guimarães Filho, C.<br />
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ativos e fatores diferenciais que permitam <strong>de</strong>senvolver novos negócios relacionados<br />
com agregação <strong>de</strong> valor, com aproveitamento <strong>de</strong> tipicida<strong>de</strong>s locais/regionais e dos<br />
patrimônios culturais e sociais específicos (Flores, 2003). Se assim concebido e<br />
operado, o programa <strong>de</strong> fortalecimento da caprino e da ovinocultura nesse espaço rural<br />
contribuirá, sem dúvidas, para a obtenção <strong>de</strong> resultados efetivamente impactantes no<br />
que tange:<br />
• Ao aumento da oferta quantitativa e qualitativa dos produtos caprinos e ovinos<br />
(carne e pele, principalmente) para um mercado crescente e insatisfeito;<br />
• A melhoria nos processos <strong>de</strong> utilização dos recursos naturais <strong>de</strong> solo, água,<br />
planta e animal do bioma caatinga e <strong>de</strong> gestão do espaço rural como um todo;<br />
• A retenção e/ou criação <strong>de</strong> um maior número <strong>de</strong> empregos nas unida<strong>de</strong>s<br />
produtivas e das vilas e povoados, reduzindo o fluxo migratório <strong>de</strong>sses locais<br />
para as cida<strong>de</strong>s maiores e para os perímetros irrigados;<br />
• A elevação da participação da caprino-ovinocultura na composição da renda das<br />
unida<strong>de</strong>s produtivas <strong>de</strong> base familiar, assegurando melhores condições para a<br />
reprodução e a acumulação dos seus meios <strong>de</strong> produção;<br />
• A maior valorização da cultura e do saber-fazer locais, impondo-se como<br />
instrumento efetivo <strong>de</strong> reafirmação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> local; e<br />
• Ao melhor or<strong>de</strong>namento e maior equilíbrio no processo <strong>de</strong> integração econômica<br />
e social entre as distintas condições agroecológicas existentes nessa zona.<br />
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