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A subversao social na trilogia de Joao Cesar Monteiro: uma análise ...

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A <strong>subversao</strong> <strong>social</strong> <strong>na</strong> <strong>trilogia</strong> <strong>de</strong> <strong>Joao</strong> <strong>Cesar</strong> <strong>Monteiro</strong>: <strong>uma</strong> análise sociológica<br />

conservação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> são <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos pela estrutura <strong>social</strong>. Inversamente, as<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s produzidas pela interacção do organismo, da consciência individual e da<br />

estrutura <strong>social</strong> reagem sobre a estrutura <strong>social</strong> dada, mantendo-a, modificando-a ou<br />

mesmo remo<strong>de</strong>lando, as socieda<strong>de</strong>s têm histórias no curso das quais emergem<br />

particulares i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s. 2<br />

O realizador João César <strong>Monteiro</strong> falando da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da sua perso<strong>na</strong>gem dizia: “<strong>de</strong><br />

facto, havia <strong>uma</strong> osmose muito gran<strong>de</strong>, um investimento muito gran<strong>de</strong> <strong>na</strong>quela<br />

perso<strong>na</strong>gem que não é um alter ego mas <strong>uma</strong> perso<strong>na</strong>gem hiperbolizada. Nós somos<br />

seres <strong>social</strong>mente condicio<strong>na</strong>dos e aquela perso<strong>na</strong>gem po<strong>de</strong> fazer tudo o que lhe passa<br />

pela cabeça e também tem um lado insolente e quase insuportável. É <strong>uma</strong> perso<strong>na</strong>gem<br />

excessiva, sem limites.” 3 (Gili Apud Nicolau, 2005: 411)<br />

Uma perso<strong>na</strong>gem hiperbolizada criada por <strong>Monteiro</strong> que, ao longo da <strong>trilogia</strong>, tenta<br />

continuamente subverter as regras sociais. O seu corpo, do outsi<strong>de</strong>r portanto, ganha<br />

visibilida<strong>de</strong> no seu próprio cinema. E este corpo <strong>na</strong>da mais é que o registo orgânico <strong>de</strong><br />

estilos <strong>de</strong> vida, em geral, resistentes ao status quo. A quase totalida<strong>de</strong> das suas<br />

perso<strong>na</strong>gens apresentam alguns traços comportamentais <strong>de</strong>sviantes.<br />

Dentro do conceito da Sociologia do Desvio, cujos principais autores <strong>de</strong> referência são<br />

Becker, Goffman e Elias, <strong>uma</strong> <strong>de</strong>finição canónica <strong>de</strong> <strong>de</strong>svio o indica como um<br />

comportamento que viola as expectativas institucio<strong>na</strong>lizadas <strong>de</strong> <strong>uma</strong> data norma<br />

<strong>social</strong>, ou seja, <strong>uma</strong> ausência <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> face às normas ou obrigações sociais.<br />

Contudo, só po<strong>de</strong>mos estabelecer que um comportamento é <strong>de</strong>sviante relativamente<br />

a <strong>uma</strong> dada socieda<strong>de</strong>, em que esse comportamento emerge, porque em cada<br />

socieda<strong>de</strong> existem os comportamentos <strong>social</strong>mente aceitáveis. O <strong>de</strong>svio, portanto é<br />

criado pela socieda<strong>de</strong>, ou seja, as causas do <strong>de</strong>svio estão localizadas <strong>na</strong> situação <strong>social</strong><br />

do <strong>de</strong>sviante ou nos “factores sociais” que incitam a sua acção. (...) o <strong>de</strong>svio não é<br />

<strong>uma</strong> qualida<strong>de</strong> do acto que a pessoa comete, mas <strong>uma</strong> consequência da aplicação por<br />

outros <strong>de</strong> regras e sanções a um “infractor” 4 . (Becker, 1963: 21)<br />

O <strong>de</strong>svio não é <strong>uma</strong> qualida<strong>de</strong> que resi<strong>de</strong> no próprio comportamento, mas <strong>na</strong><br />

interacção entre a pessoa que comete um acto e aquelas que reagem a esse mesmo<br />

acto. (Becker, 27)<br />

Não po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> sublinhar que o estudo do <strong>de</strong>svio é anterior ao aparecimento<br />

da sociologia, já <strong>na</strong> Antiguida<strong>de</strong> clássica se <strong>de</strong>senvolveram as primeiras teorias pelos<br />

filósofos como Sócrates, Pitágoras, Platão e Aristóteles. Na Ida<strong>de</strong> Média realizaram-se<br />

alguns estudos médicos para pesquisar crimes isolados. Nos séculos XVIII e XIX,<br />

com a chegada do positivismo, apareceram várias teorias, entre as quais a teoria<br />

clássica e a escola positiva. Pelo o que concerne a primeira, o autor mais<br />

representativo foi <strong>Cesar</strong>e Beccaria (Dei <strong>de</strong>litti e <strong>de</strong>lle pene, 1764), o qual achou que o<br />

homem <strong>na</strong>sce livre, mas estabelece um contrato com o Estado pelo que renuncia a<br />

parte da sua liberda<strong>de</strong> em nome da Segurança.<br />

2<br />

BERGER, Peter L. y LUCKMANN, Thomas (1999): A construção Social da Realida<strong>de</strong>.<br />

Petrópilis, Editora Vozes.<br />

3<br />

GILI, Jean “Um cineasta <strong>na</strong> cida<strong>de</strong>” en NICOLAU, João (2005): João César <strong>Monteiro</strong>. Lisboa,<br />

Cinemateca Portuguesa, p. 411.<br />

4<br />

BECKER, Howard S. (1963): Outsi<strong>de</strong>rs: Studies in the Sociology of Deviance. New York: The<br />

Free Press, 1963. (Trad. em Pt Outsi<strong>de</strong>rs. Estudos <strong>de</strong> sociologia do <strong>de</strong>svio. Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

Zahar, p. 21.<br />

Revista Comunicación, Nº10, Vol.1, año 2012, PP.558-571. ISSN 1989-600X 560

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