melanose racial e outras lesões pigmentadas da ... - Revista Sobrape
melanose racial e outras lesões pigmentadas da ... - Revista Sobrape
melanose racial e outras lesões pigmentadas da ... - Revista Sobrape
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
R. Periodontia - Setembro 2009 - Volume 19 - Número 03<br />
MELANOSE RACIAL E OUTRAS LESÕES PIGMENTADAS<br />
DA CAVIDADE BUCAL - REVISÃO DE LITERATURA<br />
Racial Melanosis and pigmentation of melanin in the oral cavity - Review of Literature<br />
Natália Soares de Oliveira Egg 1 , Carmine D’ Luca Silva Castro 1 , Fernan<strong>da</strong> Natali Rodrigues 1 , Vanessa Frazão Cury 2<br />
RESUMO<br />
As lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na cavi<strong>da</strong>de bucal podem ser<br />
desencadea<strong>da</strong>s por uma série de fatores locais e sistêmicos,<br />
fisiológicos ou patológicos. A melanina é um pigmento granular<br />
endógeno que pode apresentar colorações que variam<br />
do amarelo ao negro sendo produzi<strong>da</strong> pelos melanócitos<br />
presentes na cama<strong>da</strong> basal do epitélio bucal. As alterações<br />
ou distúrbios relacionados à melanina e outros pigmentos<br />
podem ser iniciados por trauma, infecção, hábitos (fumo,<br />
gomas, alimentos), uso de medicamentos (antimaláricos,<br />
minociclinas) e por alguns fatores sistêmicos como a doença<br />
de Addison, síndrome de Peutz-Jeghers e tumores. A<br />
pigmentação melânica fisiológica gengival, também chama<strong>da</strong><br />
de <strong>melanose</strong> <strong>racial</strong>, é uma condição não patológica<br />
com prevalência variável em diferentes grupos étnicos. Recentemente,<br />
várias técnicas cirúrgicas de despigmentação<br />
gengival têm sido propostas com o objetivo de remover<br />
lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> fisiológicas do tecido gengival. Entretanto,<br />
a decisão e indicação para a sua remoção devem ser<br />
basea<strong>da</strong>s, principalmente, em um correto diagnóstico de<br />
pigmentação fisiológica, determinando diagnósticos diferenciais<br />
com <strong>outras</strong> alterações que também podem manifestar<br />
lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na cavi<strong>da</strong>de bucal. O objetivo<br />
deste trabalho é apresentar uma revisão de literatura <strong>da</strong>s<br />
possíveis alterações locais e sistêmicas que podem apresentar<br />
lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na mucosa bucal, auxiliando o<br />
cirurgião-dentista no correto diagnóstico dessas alterações.<br />
UNITERMOS: Gengiva, Pigmentação, Melanose, Cavi<strong>da</strong>de<br />
bucal, Diagnóstico diferencial. R Periodontia 2009;<br />
19:49-55.<br />
1<br />
Graduan<strong>da</strong>s do curso de Odontologia do Centro Universitário Newton Paiva, Belo Horizonte, Minas<br />
Gerais, Brasil.<br />
2<br />
Doutora em Farmacologia Bioquímica e Molecular. Professora de Periodontia do Centro Universitário<br />
Newton Paiva, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.<br />
Recebimento: 07/07/08 - Correção: 30/09/08 - Aceite: 19/03/09<br />
INTRODUÇÃO<br />
As lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na cavi<strong>da</strong>de bucal representam<br />
um grupo de diversas enti<strong>da</strong>des clínicas que<br />
podem variar desde a pigmentação fisiológica até<br />
lesões mais graves, como o melanoma maligno.<br />
A pigmentação melânica gengival é bem documenta<strong>da</strong><br />
na literatura e é considera<strong>da</strong> uma condição<br />
fisiológica ou patológica causa<strong>da</strong> por diferentes<br />
fatores locais ou sistêmicos. É caracteriza<strong>da</strong> por manchas<br />
escureci<strong>da</strong>s devido ao excesso de deposição de<br />
melanina na cama<strong>da</strong> basal do epitélio, e que na cavi<strong>da</strong>de<br />
bucal acometem especialmente a gengiva<br />
marginal livre e gengiva inseri<strong>da</strong> (Deepak et al., 2005).<br />
A <strong>melanose</strong> <strong>racial</strong> representa uma condição<br />
gengival não patológica, sem predileção por sexo e<br />
é influencia<strong>da</strong> pelas características étnicas <strong>da</strong>s pessoas<br />
de raça negra, asiática e seus descendentes<br />
(Ashri et al., 1990). A intensi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> pigmentação é<br />
resultante <strong>da</strong> quanti<strong>da</strong>de de grânulos de melanina<br />
produzidos pelos melanócitos. Quanto maior for a<br />
ativi<strong>da</strong>de dos melanoblastos, maior será a quanti<strong>da</strong>de<br />
de melanina deposita<strong>da</strong>.<br />
As lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> <strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de bucal podem<br />
ser dividi<strong>da</strong>s em dois grupos de acordo com<br />
sua origem: endógena e exógena. A varie<strong>da</strong>de<br />
endógena pode ser causa<strong>da</strong> por diversas razões, se-<br />
49
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
jam elas relaciona<strong>da</strong>s a distúrbios sistêmicos ou não. Em caso<br />
de deposição fisiológica pode-se citar o exemplo de <strong>melanose</strong><br />
<strong>racial</strong> que acomete mais comumente indivíduos de origem<br />
africana. A pigmentação melânica pode ain<strong>da</strong> indicar presença<br />
de síndromes, como a síndrome de Peutz-Jeghers e a<br />
doença de Addison. A varie<strong>da</strong>de exógena está associa<strong>da</strong> ao<br />
uso do tabaco, medicamentos como a fenolftaleína e também<br />
com a implantação acidental de resíduos de amálgama<br />
nos tecidos gengivais (Gaeta et al., 2002; Mobio et al., 2008).<br />
Em algumas culturas existe o costume de fazer o uso de<br />
ervas para substituir a escovação. Essas plantas são usa<strong>da</strong>s<br />
para a mastigação e/ou coloca<strong>da</strong>s no fundo do vestíbulo<br />
durante horas, promovendo uma pigmentação bem localiza<strong>da</strong>,<br />
servindo como um possível diagnóstico diferencial para<br />
outros tipos de pigmentação (Ashri et al., 1990).<br />
A deman<strong>da</strong> pela despigmentação geralmente ocorre por<br />
aspectos estéticos e, particularmente, em pacientes que<br />
possuem a linha do sorriso alta. Apesar <strong>da</strong> pigmentação <strong>racial</strong><br />
ser benigna, é grande o desejo dos pacientes de fazer<br />
sua remoção (Deepak et al., 2005).<br />
Várias técnicas cirúrgicas têm sido propostas com a finali<strong>da</strong>de<br />
de promover a despigmentação gengival. Entretanto,<br />
é importante que o cirurgião-dentista estabeleça um correto<br />
diagnóstico <strong>da</strong> lesão pigmenta<strong>da</strong> determinando ain<strong>da</strong><br />
diagnósticos diferenciais com <strong>outras</strong> lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> que<br />
também acometem os tecidos bucais, especialmente o tecido<br />
gengival.<br />
Assim, o objetivo deste trabalho é fazer uma revisão de<br />
literatura sobre as principais lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> que podem<br />
acometer os tecidos bucais, orientando o cirurgião-dentista<br />
em um correto diagnóstico dessas alterações.<br />
REVISÃO DE LITERATURA<br />
1. Alterações Melanóticas Fisiológicas<br />
1.1 - Pigmentação Racial (Melanose Racial)<br />
A pigmentação fisiológica <strong>racial</strong> <strong>da</strong> mucosa bucal é<br />
a alteração mais comum, sem predileção por sexo,<br />
caracteriza<strong>da</strong> como pigmentação melânica multilocal e difusa<br />
com prevalência variável em diferentes grupos étnicos,<br />
especialmente indivíduos de raça negra, asiática,<br />
mediterrânea e seus descendentes (Amir et al., 1991; Meleti<br />
et al., 2008).<br />
Embora a pigmentação melânica seja o tipo mais comum,<br />
caroteno, hemoglobina e oxihemoglobina, foram identificados<br />
também como causadores <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça de cor dos<br />
tecidos gengivais (Perlmutter et al., 1986). A pigmentação<br />
melânica é um resultado <strong>da</strong> deposição de grânulos de<br />
melanina, produzidos pelos melanócitos dispostos entre as<br />
Figura 1 – Melanose Racial<br />
células epiteliais, na cama<strong>da</strong> basal do epitélio. Os<br />
grânulos são observados em todos os níveis do epitélio<br />
gengival. A pigmentação clínica <strong>da</strong> gengiva pode ou não ser<br />
vista, mas as células formadoras de melanina estão<br />
presentes. O grau de pigmentação depende <strong>da</strong> ativi<strong>da</strong>de<br />
dos melanoblastos (Perlmutter et al., 1986). É geralmente<br />
limita<strong>da</strong> à gengiva inseri<strong>da</strong> (Westbury & Najera, 1997)<br />
(figura 1).<br />
Esta pigmentação é adquiri<strong>da</strong> geneticamente. A quanti<strong>da</strong>de<br />
e a distribuição dos grânulos são determina<strong>da</strong>s por<br />
vários genes. Fatores físicos, químicos e hormonais podem<br />
aumentar a quanti<strong>da</strong>de de melanina. Não há necessi<strong>da</strong>de<br />
de tratamento, a não ser por razões exclusivamente estéticas<br />
(Gaeta et al., 2002; Meleti et al., 2008). Atualmente,<br />
várias técnicas cirúrgicas têm sido propostas para a<br />
despigmentação melânica gengival. Entretanto esta<br />
indicação poderá ser realiza<strong>da</strong> após a queixa do paciente,<br />
associado ao correto diagnóstico de <strong>melanose</strong> <strong>racial</strong> (Rosa<br />
et al., 2007).<br />
1.2 – Efélides<br />
São máculas que variam de um tom castanho-amarelado<br />
ao marrom, com tamanho menor que 5 mm. Aparecem<br />
devido à exposição solar <strong>da</strong> região oral, perioral e <strong>da</strong> pele. A<br />
luz ultravioleta escurece estas lesões e as mesmas se tornam<br />
mais claras no período de não exposição (Gaeta et al., 2002).<br />
Não existe tratamento indicado para esta lesão. Sua importância<br />
é insignificante, a menos que esteja associa<strong>da</strong> a condições<br />
sistêmicas (Bastiaens et al., 1999).<br />
1.3 - Mácula Melanótica<br />
É uma lesão que envolve lábios, gengiva, mucosa vestibular,<br />
palato duro e palato mole. É uma lesão plana, de<br />
coloração marrom, produzi<strong>da</strong> pelo aumento local de deposição<br />
de melanina e, possivelmente, um concomitante au-<br />
50
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
Figura 3 – Melanose Induzi<strong>da</strong> pelo Tabaco<br />
de reversibili<strong>da</strong>de já foi previamente documenta<strong>da</strong>, mas esse<br />
evento é considerado raro (Contreras & Carlos, 2005).<br />
Figura 2 – Mácula Melanótica<br />
mento do número de melanócitos (Gaeta et al., 2002; Meleti<br />
et al., 2008). Esta lesão não é dependente <strong>da</strong> exposição solar.<br />
É caracteriza<strong>da</strong> por um depósito bem circunscrito de<br />
melanina e na grande maioria <strong>da</strong>s vezes a lesão é única,<br />
com um diâmetro que pode variar até 7 mm (figura 2). A<br />
mácula melanótica não necessita de nenhum tipo de terapia<br />
(Carlos-Bregni et al., 2007), entretanto, como o melanoma<br />
precoce apresenta características clínicas semelhantes, uma<br />
biópsia excisional pode ser requeri<strong>da</strong> para o diagnóstico diferencial<br />
(Kaugars et al., 1993).<br />
1.4 – Melanoacantoma<br />
É uma lesão pigmenta<strong>da</strong> incomum, benigna, caracteriza<strong>da</strong><br />
por melanócitos dendríticos dispersos através do<br />
epitélio, podendo apresentar células inflamatórias com<br />
eosinófilos no tecido subjacente (Contreras & Carlos, 2005).<br />
Clinicamente é caracteriza<strong>da</strong> por lesões negras, planas ou<br />
levemente eleva<strong>da</strong>s, com predileção pelo sexo feminino,<br />
geralmente manifestando-se na terceira ou quarta déca<strong>da</strong><br />
de vi<strong>da</strong>. O sítio mais comum de aparecimento <strong>da</strong> lesão é a<br />
mucosa bucal (Carlos-Bregni, 2007). A lesão apresenta um<br />
rápido crescimento de tamanho, alcançando vários centímetros<br />
em poucas semanas. Por causa desse rápido crescimento,<br />
muitas vezes uma biópsia incisional deve ser indica<strong>da</strong><br />
no sentido de descartar <strong>outras</strong> enti<strong>da</strong>des, como o melanoma.<br />
Uma vez estabelecido o diagnóstico de melanoacantoma<br />
não há necessi<strong>da</strong>de de tratamento (Landwehr et al., 1997;<br />
Fatahzadeh et al., 2002). É uma lesão reativa e sua natureza<br />
2. Alterações Induzi<strong>da</strong>s por Agentes Químicos<br />
2.1 - Melanose Induzi<strong>da</strong> pelo Tabaco<br />
Também conheci<strong>da</strong> por <strong>melanose</strong> do fumante está relaciona<strong>da</strong><br />
aos componentes do tabaco que estimulam a produção<br />
de melanina. Existe uma predileção pelo sexo feminino,<br />
provavelmente pela presença dos hormônios femininos.<br />
Tradições e hábitos variam em diferentes socie<strong>da</strong>des, como<br />
na Índia e no Paquistão, com o hábito de mastigar ervas<br />
diferentemente dos latino-americanos, que fazem uso do<br />
cigarro comum (Ashri et al., 1990; Nwhator et al., 2007).<br />
Embora qualquer superfície <strong>da</strong> cavi<strong>da</strong>de bucal possa ser acometi<strong>da</strong>,<br />
existe uma predileção pelo tecido gengival vestibular<br />
<strong>da</strong> bateria labial anterior (figura 3). As áreas de pigmentação<br />
aumentam com o aumento do consumo de tabaco. Os<br />
indivíduos devem ser encorajados a parar de consumir o tabaco<br />
(Hedin et al., 1993; Ramer & Burakoff, 1997). A remoção<br />
desta pigmentação não é indica<strong>da</strong> caso o paciente não<br />
cesse completamente o hábito de fumar.<br />
2.2 - Melanose Induzi<strong>da</strong> por Drogas<br />
O uso crescente de drogas tem sido relacionado com a<br />
hiperpigmentação <strong>da</strong> mucosa bucal. Embora muitos medicamentos<br />
estimulem a produção de melanina, <strong>outras</strong> substâncias<br />
podem ser deposita<strong>da</strong>s, alterando a coloração<br />
tecidual (Thavarajah et al., 2006).<br />
Algumas drogas como: antimaláricos, antivirais (AZT),<br />
minociclinas, tranquilizantes, estrógeno e fenotiazinas podem<br />
causar hiperpigmentação, especialmente na mucosa<br />
gengival e bucal. As drogas antimaláricas podem produzir<br />
pigmentos que variam do azul ao negro, especialmente no<br />
tecido gengival (Gazi et al., 1986). A ciclofosfami<strong>da</strong>, um agen-<br />
51
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
Figura 5 – Tatuagem de Amálgama<br />
Figura 4 – Pigmentação Induzi<strong>da</strong> por Ciclofosfami<strong>da</strong><br />
te imunossupressor, também pode causar pigmentação nos<br />
tecidos bucais (figura 4). Como na maioria dos casos de<br />
hiperpigmentação, as mulheres são mais afeta<strong>da</strong>s, especialmente<br />
pelas interações sinérgicas com hormônios sexuais<br />
(Granstein & Sober, 1981).<br />
2.3 - Tatuagem de Amálgama<br />
A tatuagem de amálgama é um tipo de pigmentação<br />
exógena, facilmente reconheci<strong>da</strong> pelo dentista, geralmente<br />
localiza<strong>da</strong> próxima a áreas onde foram realiza<strong>da</strong>s restaurações<br />
em amálgama (Westbury & Najera, 1997;<br />
Buchner, 2004).<br />
O amálgama produz uma pigmentação preto-azula<strong>da</strong>,<br />
geralmente bem localiza<strong>da</strong> e circunscrita (Gazi et al., 1986).<br />
A reação tecidual contra os restos de amálgama varia com o<br />
tamanho <strong>da</strong>s partículas implanta<strong>da</strong>s. Pouco se sabe sobre a<br />
ativação de células inflamatórias nesse tipo de lesão (Leite et<br />
al., 2004). Na maioria dos casos um sítio isolado é afetado,<br />
embora múltiplos sítios também possam estar presentes.<br />
As regiões mais comuns são a mucosa gengival e<br />
mucosa alveolar (figura 5). Radiografias <strong>da</strong> região pigmenta<strong>da</strong><br />
podem ser importantes no diagnóstico <strong>da</strong> lesão<br />
(figura 6). Uma vez diagnostica<strong>da</strong> como tatuagem de<br />
amálgama, não há necessi<strong>da</strong>de de tratamento. Entretanto,<br />
se houver dúvi<strong>da</strong> quanto ao diagnóstico, uma biópsia<br />
pode ser indica<strong>da</strong> (Buchner & Hansen, 1980; Martín<br />
et al., 2005).<br />
3. Melanose Associa<strong>da</strong> a Condições Patológicas<br />
3.1 - Melanoma Oral (Maligno)<br />
Origina-se <strong>da</strong> transformação neoplásica de melanócitos<br />
ou de células névicas. A quanti<strong>da</strong>de de exposição à luz solar,<br />
o grau de pigmentação natural e de lesões precursoras como<br />
nevos de junção, são fatores predisponentes para o<br />
melanoma. Não há predileção por sexo e melanoma bucal é<br />
pouco comum. Quando em boca, essa lesão acomete palato<br />
duro e gengiva, mas também pode ser localiza<strong>da</strong> na<br />
mucosa jugal e lábios. A hiperpigmentação pode variar entre<br />
castanho, negro, azul e vermelho, e sua margem é irregular<br />
(Gaeta et al., 2002, Kemp et al., 2008).<br />
Este tipo de câncer deve sempre ser considerado em<br />
casos de lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong>. Algumas características clínicas<br />
importantes devem ser considera<strong>da</strong>s para o diagnóstico<br />
do melanoma, denomina<strong>da</strong> características clínicas “ABCD”:<br />
A de assimetria; B (Border) contorno irregular; C de coloração<br />
varia<strong>da</strong> entre marrom, preto, azul, vermelho e branco e<br />
D de diâmetro maior que 6.0 mm (Friedman et al., 1985). Na<br />
maioria dos casos as lesões são preto-azula<strong>da</strong>s ou marrons<br />
escuras e começam como uma lesão macular focal que progride<br />
rapi<strong>da</strong>mente (Westbury & Najera, 1997; Mobio et al.,<br />
2008).<br />
3.2 - Doença de Addison<br />
É causa<strong>da</strong> pela diminuição na produção do hormônio<br />
corticosteróide devido à destruição do córtex adrenal. À<br />
etiologia relacionam-se os seguintes eventos: destruição<br />
autoimune; infecções (principalmente tuberculose e doen-<br />
52
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
Figura 6 – Exame radiográfico mostrando fragmentos de amálgama<br />
ças fúngicas) em pacientes portadores <strong>da</strong> síndrome <strong>da</strong><br />
imunodeficiência adquiri<strong>da</strong> (AIDS); e mais raramente tumores<br />
metastásicos, sarcoidoses, hemocromatose ou amiloidose<br />
(Shah et al., 2005). As características clínicas <strong>da</strong> Doença de<br />
Addison aparecem apenas em fase avança<strong>da</strong>, quando o tecido<br />
glandular já foi destruído quase totalmente. Com isso<br />
pode-se observar a diminuição <strong>da</strong> produção de ACTH, a presença<br />
de irritabili<strong>da</strong>de, depressão, hipotensão e fraqueza após<br />
alguns meses (Brosnan & Gowing, 1996; Gavren et al., 2002).<br />
Na cavi<strong>da</strong>de bucal máculas e placas marrons difusas podem<br />
ser observa<strong>da</strong>s na mucosa geralmente como uma manifestação<br />
primária <strong>da</strong> doença, sendo segui<strong>da</strong> pela pigmentação<br />
cutânea. Alguns autores caracterizam esta pigmentação oral<br />
sob a forma de manchas “café com leite”, podendo ser mais<br />
frequentemente observa<strong>da</strong>s na gengiva, língua, mucosa jugal<br />
e palato duro (Gaeta et al., 2002). As lesões são<br />
amarronza<strong>da</strong>s, multi-locais ou difusas e ocorrem devido<br />
à diminuição do hormônio adenocorticotrófico.<br />
A hiperpigmentação é proeminente nos cotovelos,<br />
joelhos, nuca, etc. (Westbury & Najera, 1997; Gavren<br />
et al., 2002).<br />
3.3 - Síndrome de Peutz-Jeghers<br />
A síndrome de Peutz-Jeghers (SP-J) é uma rara condição<br />
de base genética que integra quatro importantes aspectos:<br />
(1) pólipos gastrointestinais múltiplos de tipo hamartoma,<br />
(2) pigmentação melânica mucocutânea, (3) transmissão<br />
autossômica dominante, e (4) risco significativo de<br />
malignização em múltiplos órgãos (Lopes et al., 2004).<br />
As manifestações clínicas são bem defini<strong>da</strong>s, caracteriza<strong>da</strong>s<br />
por lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> nas mãos, pés, região<br />
periorofacial e mucosa oral em conjunto com a polipose intestinal.<br />
Os pólipos intestinais podem sofrer transformação<br />
maligna para adenocarcinomas. Podem ain<strong>da</strong> sofrer ulcerações<br />
e hemorragias e causar dores abdominais e melena,<br />
bem como obstrução intestinal e vômitos (Goldberg &<br />
Goldhaber, 1954; Pereira et al., 2005).<br />
As lesões de pele são muito semelhantes às sar<strong>da</strong>s, sendo<br />
as lesões orais representa<strong>da</strong>s por uma extensão dessas<br />
sar<strong>da</strong>s. As manchas melânicas caracterizam-se por sua cor<br />
acastanha<strong>da</strong>, são planas e de superfície lisa, geralmente ovala<strong>da</strong>s<br />
e irregulares. Localizam-se preferencialmente nos lábios<br />
inferiores e mucosa bucal, poupando a língua (Costa et<br />
al., 1987; Gutierrez et al., 2001).<br />
Microscopicamente o epitélio é caracterizado como normal,<br />
exceto por uma área de modera<strong>da</strong> acantose. O tecido<br />
mostra áreas com proliferação e elementos de outros tecidos<br />
e com áreas de inflamação crônica (Goldberg &<br />
Goldhaber, 1954). A localização perioral de máculas<br />
multifocais de pigmentação melânica é o diagnóstico essencial<br />
(Westbury & Najera, 1997).<br />
3.4 - Nevo Melanocítico<br />
É uma lesão congênita pigmenta<strong>da</strong> composta de células<br />
névicas. Estas células que se diferem dos melanócitos,<br />
pela tendência de formar “ninhos”, podem ser encontra<strong>da</strong>s<br />
em tecido epitelial, conjuntivo de sustentação ou em ambos.<br />
A origem não é bem compreendi<strong>da</strong>, mas supõe-se que<br />
sejam células deriva<strong>da</strong>s <strong>da</strong> migração <strong>da</strong> crista neural do<br />
epitélio do córion (Gaeta et al., 2002; Mobio et al., 2008).<br />
Nevos intrabucais são lesões raras que se apresentam como<br />
pápulas eleva<strong>da</strong>s, às vezes não <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong>, no palato duro.<br />
São menos frequentes na mucosa jugal, labial, na gengiva,<br />
crista alveolar e no vermelhão dos lábios (Ide et al., 2007).<br />
Aproxima<strong>da</strong>mente dois terços <strong>da</strong>s lesões são encontra<strong>da</strong>s<br />
em mulheres, cuja média de i<strong>da</strong>de está em torno de 35 anos<br />
(Buchner et al., 1990).<br />
CONCLUSÃO<br />
Esta revisão de literatura enfatiza a importância de um<br />
correto diagnóstico <strong>da</strong>s lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na cavi<strong>da</strong>de<br />
bucal, tendo em vista a grande varie<strong>da</strong>de etiológica <strong>da</strong>s<br />
mesmas.<br />
A decisão e indicação para a remoção <strong>da</strong>s lesões<br />
<strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> devem ser basea<strong>da</strong>s principalmente na queixa<br />
do paciente, associa<strong>da</strong>s ao correto diagnóstico de pigmentação<br />
fisiológica, estabelecendo assim diagnósticos diferenciais<br />
com <strong>outras</strong> alterações locais e sistêmicas que também<br />
podem manifestar lesões <strong>pigmenta<strong>da</strong>s</strong> na cavi<strong>da</strong>de bucal.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Agradecemos ao professor Leandro Napier pelas<br />
53
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
fotos dos casos apresentados. Ao professor Rodrigo <strong>da</strong><br />
Costa Seabra e a professora Diele Carine Barreto pelas<br />
contribuições.<br />
ABSTRACT<br />
Pigmented lesions in the oral cavity can be caused by a<br />
number of local and systemic factors, either physiological or<br />
pathological. Melanin is an endogenous granular pigment,<br />
producing colors that may range from yellow to black,<br />
secreted by basal layer melanocytes of the oral epithelium.<br />
Melanin and other pigment related changes can be triggered<br />
by trauma, infection, habits (smoking, gum chewing, types<br />
of food), medicine intake (antimalarials, minociclin) and some<br />
systemic factors such as Addison’s disease, Peutz Jeghers<br />
Syndrome and tumors. The physiological gingival melanotic<br />
pigmentation, also called Racial Melanosis, is not<br />
a pathological condition, which prevalence varies<br />
according to ethnic groups. Several surgical techniques for<br />
gingival depigmentation have been recently proposed,<br />
aiming at removing physiological pigmentation from<br />
gingival tissue. However, decision and indications for<br />
its removal should be based on a precise differential<br />
diagnosis, established against other findings that may also<br />
express pigmented lesions in the oral cavity. The purpose of<br />
this paper is to present a literature review on local and<br />
systemic changes that may lead to the occurrence of<br />
pigmented lesions in the oral mucosa, helping the dental<br />
surgeon (or practitioner) on finding the correct diagnosis for<br />
these changes.<br />
UNITERMS: Gingival, Pigmentation, Melanosis, Oral<br />
cavity, Differential diagnosis.<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />
1- Amir E, Gorsky M, Buchner A, Sarnat H, Gat H. Physiologic pigmentation<br />
of the oral mucosa in Israeli children. Oral Surgery Oral Medicine Oral<br />
Pathology 1991; 71: 396-398.<br />
2- Ashri N, BDS, Gazi M, MScD, FDSRCPS. More unusual pigmentations<br />
of the gingiva. Oral Surgery Oral Medicine Oral Pathology 1990; 70:<br />
445-449.<br />
3- Bastiaens MT, Westendorp RG, Vermeer BJ, Bavinck JN. Ephelides are<br />
more related to pigmentary constitutional host factors than solar<br />
lentigines. Pigment Cell Res 1999; 12: 316-22.<br />
4- Brooks JK, Nikitakis NG. Gingival pigmentation of recent origin. Oral<br />
melanoacanthoma.Gen Dent 2008; 56:105, 108.<br />
5- Brosnan CM, Gowing NF. Addison’s disease. BMJ 1996; 27: 1085-7.<br />
6- Buchner A, Hansen LS. Amalgam pigmentation (amalgam tattoo) of<br />
the oral mucosa. A clinicopathologic study of 268 cases. Oral Surg<br />
Oral Med Oral Pathol. 1980; 49: 139-47.<br />
7- Buchner A, Leider AS, Carpenter WM, Littner MM. Melanocytic nevi of<br />
the oral mucosa—a clinicopathologic study of 60 new cases. Refuat<br />
Hashinayim 1990; 8: 3-8.<br />
8- Buchner A. Amalgam tattoo (amalgam pigmentation) of the oral mucosa:<br />
clinical manifestations, diagnosis and treatment. Refuat Hapeh<br />
Vehashinayim. 2004;21:25-8.<br />
9- Carlos-Bregni R, Contreras F, Netto AC et al. Oral melanoacanthoma<br />
and oral melanotic macule: a report of 8 cases, review of the literature,<br />
and immunohistochemical analysis. Med Oral Patol Oral Cir Bucal.<br />
2007;12:374-9.<br />
10- Contreras E, Carlos R. Oral Melanoacanthosis (melanoachantoma):<br />
Report of a case and review of the literature. Med Oral Patol Oral Cir<br />
Bucal 2005; 10: 9-11.<br />
11- Costa JHG, Azevedo IF, França MAV, Maia HP, Gama RC, Primo CC,<br />
Prudente A. Síndrome de Peutz-Jeghers. Apresentação de um caso.<br />
Rev Bras Colo-Proct 1987; 7: 153-158.<br />
54
R. Periodontia - 19(3):49-55<br />
12- Deepak P, Sunil S, Mishra R, Sheshadri. Treatment of gingival<br />
pigmentarion: A case series. Indian Journal of Dental Research 2005;<br />
16: 171-176.<br />
13- Fatahzadeh M, Sirois DA. Multiple intraoral melanoacanthomas: a<br />
case report with unusual findings. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral<br />
Radiol Endod. 2002;94:54-6.<br />
14- Friedman RJ, Rigel DS, Kopf AW. Early detection of malignant<br />
melanoma: the role of physician examination and self-examination of<br />
the skin. CA Cancer J Clin 1985; 35: 130-51.<br />
15- Gaeta GM, Satriano RA, Baroni A. Oral pigmented lesions. Clinics in<br />
Dermatology 2002; 20: 286-288.<br />
16- Gavren BA, Lumerman H, Cardo VA et al. Multiple pigmented lesions<br />
of the lower lip. J Oral Maxillofac Surg. 2002;60:438-45.<br />
17- Gazi MI. Unusual pigmentation of the Gingiva. Oral Surgery Oral<br />
Medicine Oral Pathology 1986; 62: 646-649.<br />
18- Golberg H., Goldhaber P. Hereditary intestinal polyposis with oral<br />
pigmentation. Oral Surgery Oral Medicine Oral Pathology 1954; 7: 378-<br />
382.<br />
19- Granstein RD, Sober AJ. Drug- and heavy metal-induced<br />
hyperpigmentation. J Am Acad Dermatol 1981; 5: 1-18.<br />
20- Gutiérrez BA, Rojo Garcia J, Aguilera Llovet MA et al. Peutz-Jegher’s<br />
syndrome. An Esp Pediatr. 2001;55:161-4.<br />
21- Hedin CA, Pindborg JJ, Axéll T. Disappearance of smoker’s melanosis<br />
after reducing smoking. J Oral Pathol Med. 1993;22:228-30.<br />
22- Ide F, Mishima K, Yama<strong>da</strong> H et al. Neurotized nevi of the oral mucosa:<br />
an immunohistochemical and ultrastructural analysis of nevic corpuscles.<br />
J Oral Pathol Med. 2007 ;36:505.<br />
29- Meleti M, Vescovi P, Mooi WJ et al. Pigmented lesions of the oral<br />
mucosa and perioral tissues: a flow-chart for the diagnosis and some<br />
recommen<strong>da</strong>tions for the management. Oral Surg Oral Med Oral Pathol<br />
Oral Radiol Endod. 2008;105:606-16.<br />
30- Mobio S, Noujeim Z, Boutigny H et al. Pigmentation and pigmented<br />
lesions of the gingival mucosa. Rev Belge Med Dent. 2008;63:15-28.<br />
31- Nwhator SO, Winfunke-Savage K, Ayanbadejo P et al. Smokers’<br />
melanosis in a Nigerian population: a preliminary study. J Contemp<br />
Dent Pract. 2007;8:68-75.<br />
32- Pereira CM, Coletta RD, Jorge J et al. Peutz-Jeghers syndrome in a 14-<br />
year-old boy: case report and review of the literature. Int J Paediatr<br />
Dent. 2005;15:224-8.<br />
33- Perlmutter S, Tal H. Repigmentation of the gingiva following surgical<br />
injury. Journal Periodontol 1986; 57: 48-50.<br />
34- Ramer M, Burakoff RP. Smoker’s melanosis. Report of a case. N Y<br />
State Dent J. 1997; 63: 20-1.<br />
35- Rosa DS, Aranha AC, Eduardo C de P et al. Esthetic treatment of<br />
gingival melanin hyperpigmentation with Er:YAG laser: short-term<br />
clinical observations and patient follow-up. J Periodontol. 2007;<br />
78:2018-25.<br />
36- Shah SS, Oh CH, Coffin SE et al. Addisonian pigmentation of the oral<br />
mucosa. Cutis. 2005; 76:97-9.<br />
37- Thavarajah R, Rao A, Raman U et al. Oral lesions of 500 habitual<br />
psychoactive substance users in Chennai, India. Arch Oral Biol. 2006<br />
Jun; 51(6):512-9.<br />
38- Westburg LW, Najera A. Minocycle – induced intraoral pharmacogenic<br />
pigmentation: case reports and review of the literature. Journal<br />
Periodontol 1997; 68: 84-91.<br />
23- Kaugars GE, Heise AP, Riley WT, Abbey LM, Svirsky JA. Oral melanotic<br />
macules. A review of 353 cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol 1993;<br />
76: 59-61.<br />
24- Kemp S, Gallagher G. Kabani S et al. Persistent melanoma in situ:<br />
case report and review. J Oral Maxillofac Surg. 2008;66:1945-8.<br />
25- Landwehr DJ, Halkias LE, Allen CM. A rapidly growing pigmented<br />
plaque. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 1997; 84:<br />
332-4.<br />
26- Leite CMA, Botelho AS, Oliveira JR, Cardoso SV, Loyola AM, Gomez<br />
RS, Vaz RR. Immunolocalization of HLA-DR and Metallothionein on<br />
Amalgam Tattoos. Braz Dent J 2004; 15: 99-103.<br />
27- Lopes AI, Gonçalves J, Palha AM, Furtado F, Marques A. Síndrome de<br />
Peutz-Jeghers Diversi<strong>da</strong>de de Expressão Gastrointestinal em I<strong>da</strong>de<br />
Pediátrica e Considerações sobre a sua Abor<strong>da</strong>gem Clínica. Acta Med<br />
Port 2004; 17: 445-450.<br />
28- Martín JM, Nagore F, Cremades A et al. An amalgam tattoo on the<br />
oral mucosa related to a dental prosthesis. J Eur Acad Dermatol<br />
Venereol. 2006; 20: 1352-3.<br />
Endereço para correspondência:<br />
Dra. Vanessa Frazão Cury<br />
Rua Olímpio de Assis, 406 - Ci<strong>da</strong>de Jardim<br />
CEP: 30380-150 - Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil<br />
E-mail: vanessafg@bol.com.br<br />
55