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livro completo - CiFEFiL

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Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos<br />

trazia o medo do desconhecido, para depois se configurar num “obscuro<br />

objeto do desejo”.<br />

Redescobertas, as letras dão forma às reminiscências, traçando<br />

uma memória que evoca, ficcionalmente, a infância e a juventude<br />

da figura madura que se transforma em personagem de si mesma.<br />

Autobiograficamente, é construído um relato do sujeito formado na<br />

coletividade e reconhecido como Madre, o qual, sozinho com sua folha<br />

de papel, reencontra-se com as imagens que o produziram. O<br />

pronome “nós”, definidor de alguém que com outro alguém conjuga<br />

seus atos, é empregado sob uma perspectiva semântica na qual o individual,<br />

o subjetivo, é resgatado após haver-se conformado como<br />

uma resposta conjuntiva de enfrentamento.<br />

Um retorno ao estado poético (Morin, 1999) esboça um período<br />

em que o amor é transcrito e transformado em poesia, após a i-<br />

nevitável prosaidade decorrente das obrigações desse novo sujeito<br />

transeunte entre códigos e leis estampadas em panfletos e discursos<br />

políticos. A figura da mãe que ocupa a Plaza por primeira vez, em<br />

abril de 1977, e de ali não sai, dando voltas capazes de desestabilizar<br />

o público, ressurge tonificada pelo amor ao ente desaparecido e à luta,<br />

concebida como legado invencível, que a personagem madura revive<br />

e ressignifica em seu pacto escritural.<br />

Sem o lenço branco (véu que desvela e sagra a união transcendente<br />

e inquebrantável com os desaparecidos), elas se reconhecem<br />

em memórias e testemunhos que, assim como o lenço, compõem<br />

a performance da resistência. Resistindo à prosa do mundo e se<br />

rendendo à poesia – ressemantizada num estado que permite expressões<br />

subjetivas, geradas pelo simbólico e pelo metafórico –, o encontro<br />

com a escritura se manifesta como uma alternativa na qual a comunhão<br />

literária reitera a noção de que “a verdadeira novidade nasce<br />

sempre de uma volta às origens” (Idem, p. 43).<br />

A imagem recuperada da criança e da adolescente, partícipes<br />

na constituição do ator político identificado coletivamente como<br />

Madre, é um tema que define grande parte do percurso poético traçado<br />

nas oficinas. Ao redescobrir as letras, é delas agora o papel sobre<br />

o qual serão modeladas as linhas testemunhais, traçados biográficos<br />

que dialogam entre o imaginário e o fictício, propondo-nos uma<br />

realidade que respira poesia.<br />

RIO DE JANEIRO: CIFEFIL, 2009 83

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