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A autonomia social da arte no caso brasileiro - ArtCultura

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3<br />

HARRISON, Charles, op. cit.,<br />

p. 222.<br />

4<br />

Ver BÜRGER, Peter. Teoria <strong>da</strong><br />

vanguar<strong>da</strong>. Lisboa: Vega, 1993,<br />

p. 73 e 74.<br />

5<br />

Cf., entre outros, BOUR-<br />

DIEU, Pierre. A conquista <strong>da</strong><br />

<strong>auto<strong>no</strong>mia</strong>. In: As regras <strong>da</strong><br />

<strong>arte</strong>. São Paulo: Companhia<br />

<strong>da</strong>s Letras, 1996; idem, A lógica<br />

do processo de auto<strong>no</strong>mização.<br />

In: A eco<strong>no</strong>mia <strong>da</strong>s<br />

trocas simbólicas. São Paulo:<br />

Perspectiva, 1999; idem, Algumas<br />

proprie<strong>da</strong>des dos campos.<br />

In: Questões de sociologia. Rio<br />

de Janeiro: Marco Zero, 1983, e<br />

idem, Gênese histórica de uma<br />

estética pura. In: O poder simbólico.<br />

Lisboa: Difel, 1989.<br />

de evocação e referência, uma vez que o estético estaria contido na coerência<br />

dos valores formais de uma obra de <strong>arte</strong> e não na sua capaci-<strong>da</strong>de de<br />

correspondência com a aparência <strong>da</strong>s coisas do mundo, tam-pouco na capaci<strong>da</strong>de<br />

de apreciação e experiência. Não decorre <strong>da</strong>í, como <strong>no</strong>s lembra<br />

Harrison, que a representação seja avessa aos fins <strong>da</strong> <strong>arte</strong>, mas simplesmente que<br />

ela é inessencial e em última instância irrelevante 3 . Segundo essa premissa, a<br />

<strong>arte</strong> teria uma sintaxe específica, ou seja, seria detentora de uma linguagem<br />

autô<strong>no</strong>ma.<br />

E por fim, como última categoria, temos a <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> como condição<br />

de produção <strong>da</strong> <strong>arte</strong>. Auto<strong>no</strong>mia, nesse sentido, é a capaci<strong>da</strong>de que o<br />

meio artístico — com seus agentes, instituições e valores — possui de regular<br />

seu próprio funcionamento a partir de critérios inter<strong>no</strong>s ao próprio<br />

meio. As pressões políticas, econômicas ou midiáticas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de em<br />

geral não são aqui considera<strong>da</strong>s como determinantes <strong>da</strong>s práticas artísticas,<br />

críticas ou institucionais. O trabalho poético do artista, as escolhas<br />

teóricas do crítico e do curador e a gerência institucional de museus,<br />

salões e bienais devem estar sujeitos, em primeira instância, às respectivas<br />

necessi<strong>da</strong>des. O trabalho do artista e do crítico, por exemplo, ain<strong>da</strong> segundo<br />

essa <strong>no</strong>ção de <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong>, deve guiar-se em primeiro lugar por critérios<br />

poéticos e críticos, independentemente de posição <strong>social</strong> ou <strong>da</strong>s relações<br />

de mercado — <strong>da</strong> mesma forma que, por outro lado, um museu ou uma<br />

bienal de <strong>arte</strong> não deve igualmente seguir parâmetros exter<strong>no</strong>s ditados<br />

seja pela cultura política do Estado, seja pela lógica comercial <strong>da</strong> mídia<br />

ou do capital privado.<br />

É claro, contudo, que essa <strong>no</strong>ção de <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> está intimamente<br />

relaciona<strong>da</strong> a to<strong>da</strong>s as outras, sendo ela, <strong>no</strong> entanto, aquela pela qual é<br />

possível melhor compreender os vínculos entre <strong>arte</strong> e socie<strong>da</strong>de. É, portanto,<br />

a partir dessa terceira categoria — que de<strong>no</strong>mi<strong>no</strong> <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> <strong>social</strong><br />

— que pretendo aqui sugerir, em linhas gerais, uma breve discussão sobre<br />

a utilização deste amplo conceito de interpretação.<br />

A <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> <strong>social</strong> <strong>da</strong> <strong>arte</strong> e a formação<br />

do campo artístico europeu<br />

Como bem destacou Peter Bürger, quando se entende o conceito<br />

de <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> <strong>da</strong> <strong>arte</strong> como sendo uma forma de independência <strong>da</strong> <strong>arte</strong><br />

em relação à socie<strong>da</strong>de, existem pelo me<strong>no</strong>s dois equívocos operacionais<br />

bastante comuns: a aceitação ou a negação absoluta <strong>da</strong> <strong>no</strong>ção de <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong>,<br />

sendo que nesses <strong>caso</strong>s, <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> surge ora como um conceito<br />

separado de exemplos históricos concretos, ora como um comprometido<br />

slogan ideológico 4 . De um lado, portanto, a aceitação inconteste <strong>da</strong> separação<br />

absoluta <strong>da</strong> <strong>arte</strong> em relação às determinações sociais externas ao<br />

ambiente artístico; de outro, a negação de qualquer especifici<strong>da</strong>de desse<br />

ambiente bem como de seus produtos e instituições.<br />

Segundo o sociólogo francês Pierre Bourdieu, a <strong>auto<strong>no</strong>mia</strong> relativa<br />

<strong>da</strong> <strong>arte</strong> deve ser interpreta<strong>da</strong> enquanto um processo histórico recente<br />

através do qual uma determina<strong>da</strong> esfera moderna e européia <strong>da</strong> <strong>arte</strong><br />

desenhou suas margens em detrimento <strong>da</strong>s diversas esferas do poder 5 .<br />

Como Bourdieu, o historiador e crítico de <strong>arte</strong> italia<strong>no</strong> Giulio Carlo Argan<br />

aponta o Iluminismo e, na seqüência, o século XIX europeu como o momento<br />

histórico que assistiu a esse fabuloso fenôme<strong>no</strong>: a emancipação<br />

200<br />

<strong>ArtCultura</strong>, Uberlândia, v. 7, n. 11, p. 197-211, jul.-dez. 2005

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