PDF, 424KB - CEAS | Centro de Estudos de Antropologia Social
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Manuela Ribeiro Sanches<br />
a <strong>de</strong> viajar entre países, culturas, disciplinas, <strong>de</strong>partamentos e universida<strong>de</strong>s<br />
sem se sentir pertencente a nenhuma. Nómada mas pertencendo a uma<br />
diáspora.<br />
E o que é que a diáspora <strong>de</strong> língua alemã po<strong>de</strong>rá ensinar aos estudos<br />
culturais predominantemente anglófonos A herança <strong>de</strong> uma intelligentsia<br />
judaica, oscilando entre disciplinas e países, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Simmel, esse teorizador<br />
da errância e do estranho por excelência, passando por Horkheimer e<br />
Adorno e a sua <strong>de</strong>núncia, lúcida e por vezes unilateral, da “indústria da<br />
cultura”, até W. Benjamin e a hesitação entre a militância construtivista e<br />
a perda da aura ou Siegfried Kracauer, na sua atenção à cultura quotidiana<br />
e banal, lendo atentamente as gran<strong>de</strong>s manifestações mediáticas e<br />
populares na República <strong>de</strong> Weimar, até à <strong>de</strong>núncia em Günther An<strong>de</strong>rs dos<br />
simulacros televisivos e o reconhecimento do papel central dos media na<br />
agitação da opinião pública durante a guerra do Vietname ou na evocação<br />
do Holocausto. Acompanhe-se o <strong>de</strong>bate acérrimo em <strong>de</strong>fesa da racionalida<strong>de</strong><br />
e da metafísica face ao perigo pós-mo<strong>de</strong>rno nos anos 80 em<br />
Habermas e reflicta-se com Manfred Frank sobre a herança do i<strong>de</strong>alismo<br />
alemão e do seu gran<strong>de</strong> edifício metafísico contra os impasses do<br />
<strong>de</strong>sconstrutivismo. Porque os estudos culturais não celebram o popular<br />
por populismo e não têm <strong>de</strong> ignorar os gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>bates epistemológicos<br />
em curso.<br />
Também a Germanística se repensa, agora não apenas em relação à<br />
primazia a dar aos estudos literários, mas ao modo <strong>de</strong> os articular com os<br />
culturais (Hansen 1993, Böhme e Scherpe 1996, Glaser e Luserke 1996),<br />
entendidos não só mas também à luz <strong>de</strong> uma tradição específica, recuperando<br />
mais uma vez a sociologia <strong>de</strong> Norbert Elias, a análise dos media<br />
proposta por Benjamin, a antropologia filosófica <strong>de</strong> Gehlen ou a teoria dos<br />
símbolos <strong>de</strong> Cassirer, e mesmo a sua etnologia <strong>de</strong>svirtuada e caída em<br />
<strong>de</strong>scrédito com o nacional-socialismo, em consequência e em articulação com<br />
os <strong>de</strong>safios provindo da margem esquerda do Reno e do outro lado do<br />
Atlântico, re<strong>de</strong>finindo-se/diluindo-se a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> disciplinar à luz dos<br />
novos <strong>de</strong>safios da socieda<strong>de</strong> globalizada e do pós-colonialismo. Esse é um<br />
<strong>de</strong>safio tanto mais difícil e estimulante quanto também questiona uma<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> nacional construída não só em torno <strong>de</strong> uma língua, mas também<br />
(na ausência <strong>de</strong> um império) <strong>de</strong> uma filosofia e <strong>de</strong> uma metafísica “genuinamente”<br />
alemãs, <strong>de</strong> uma tradição que apenas soube conce<strong>de</strong>r um papel<br />
minoritário ao popular – entenda-se popular em que sentido se quiser –,<br />
como algo <strong>de</strong> menor e fenómeno <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>, mas sabendo celebrar as<br />
essências e as genuida<strong>de</strong>s étnicas <strong>de</strong> forma tanto mais contun<strong>de</strong>nte quanto<br />
mais o imaginário nacional teve <strong>de</strong> ser construído em oposição a outros<br />
colonialismos, antes <strong>de</strong> adquirir – como será fatal – o sinal exactamente<br />
oposto.<br />
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