PDF da matéria completa - Global Garbage
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G biodiversi<strong>da</strong>de<br />
G<br />
Meu n o m e n ã o é<br />
Uns são chamados de golfinhos, outros têm apelido de baleia, e<br />
alguns têm nomes especiais, como toninha ou orca. Mas todos são<br />
igualmente encantadores e merecem ser mais conhecidos por suas<br />
características reais do que por imagens fantasiosas de mídia<br />
TERRA DA GENTE<br />
26<br />
texto Ma u r a Ca m pa n i l i<br />
Norbert Wu/minden pictures<br />
Golfinho-nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus)
Flipper<br />
TERRA DA GENTE<br />
27
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
28<br />
nham em brinquedos, jogos, livros,<br />
figurinhas, filmes e seriados de TV.<br />
A expressão travessa e simpática<br />
desses bichos nos faz sonhar em ter<br />
um deles como amigo íntimo, como<br />
nas várias versões envolvendo o golfinho<br />
Flipper, que se tornou o nome<br />
mais conhecido dos golfinhos-narizde-garrafa<br />
(Tursiops truncatus), bastante<br />
comuns na costa brasileira.<br />
A literatura e o cinema também<br />
tornaram vilãs algumas espécies,<br />
como é o caso <strong>da</strong> orca (Orcinus orca),<br />
injustamente imortaliza<strong>da</strong> como<br />
‘baleia assassina’, e do cachalote (Physeter<br />
macrocephalus), a famosa ‘baleia’<br />
Moby Dick <strong>da</strong> obra de Herman Melville<br />
e a Dona Monstro <strong>da</strong> animação<br />
Pinóquio dos Estúdios Walt Disney.<br />
O que pouca gente sabe é que ambas<br />
as espécies, apesar de grandes, não<br />
são baleias, mas golfinhos.<br />
Baleias e golfinhos são agrupados<br />
Os perigos do lixo marinho<br />
Uma <strong>da</strong>s grandes ameaças aos golfinhos – e também a to<strong>da</strong>s<br />
as espécies que dependem do mar para viver e se alimentar – é<br />
o lixo marinho. Formado por todo tipo de resíduo sólido manufaturado,<br />
pode permanecer no oceano por milhares de anos. No<br />
Pacífico Norte, há registro de imensas ‘ilhas’ flutuantes de lixo,<br />
mas não se sabe se elas também existem no Atlântico Sul.<br />
“Esse lixo pode ser de fontes terrestres – jogado por usuários<br />
de praias e rios, sistemas de drenagem e esgoto, enchentes, lixões<br />
e aterros próximos a corpos d’água – e de fontes marinhas,<br />
como navios e plataformas oceânicas de petróleo e gás”, diz a<br />
oceanógrafa Juliana Assunção Ivar do Sul, <strong>da</strong> Associação Praia<br />
Local, Lixo <strong>Global</strong>.<br />
Uma vez no ambiente, o lixo formado por plástico, isopor,<br />
metal, papel e vidro causa diferentes impactos nos golfinhos.<br />
Curiosos, os animais gostam de interagir com as redes de pesca<br />
abandona<strong>da</strong>s e acabam morrendo afogados. Ou permanecem<br />
indefini<strong>da</strong>mente enre<strong>da</strong>dos (enrolados à rede), com vários efeitos<br />
subletais: ficam debilitados, com dificul<strong>da</strong>des para se defenderem,<br />
alimentarem-se e se reproduzirem.<br />
Outro problema é a ingestão dos produtos pequenos.<br />
“Eles comem de tudo e não se sabe a razão. Há teorias de<br />
que confundiriam o lixo com presas ou outros alimentos”,<br />
acrescenta Juliana. “A ingestão desses objetos pode causar<br />
sensação de sacie<strong>da</strong>de e o animal não busca mais alimento.<br />
Se o item é maior, pode causar obstrução gastrointestinal,<br />
com efeitos letais e subletais”.<br />
epraticamente impossível<br />
encontrar quem<br />
não goste deles, seja<br />
pela reconheci<strong>da</strong><br />
inteligência e capaci<strong>da</strong>de de comunicação,<br />
seja pela graça com que se<br />
exibem, às vezes bem pertinho <strong>da</strong><br />
costa ou em shows de parques aquáticos<br />
ao redor do mundo. Os golfinhos<br />
também fazem parte do imaginário<br />
popular. Figuram há pelo<br />
menos 2 mil anos ao lado de deuses<br />
e seres fantásticos nos mosaicos do<br />
Império Romano. E nos acompa-<br />
em uma só ordem de mamíferos<br />
marinhos, a dos cetáceos (Cetacea).<br />
Porém, as baleias se encaixam em<br />
uma subordem conheci<strong>da</strong> como<br />
misticetos (Mysticeti), cuja característica<br />
principal é a presença de<br />
barbatanas de queratina, que ficam<br />
presas na mandíbula pelos dois lados<br />
<strong>da</strong> boca e servem para filtrar<br />
alimentos: peixes e crustáceos bem<br />
pequenos. Já os golfinhos são odontocetos<br />
(Odontoceti) e possuem dentes<br />
para se alimentarem de animais<br />
maiores: lulas, peixes – às vezes<br />
bem grandes, como tubarões – e<br />
até baleias bem maiores do que os<br />
próprios golfinhos. Além <strong>da</strong> presença<br />
de dentes, o que possibilita aos<br />
golfinhos essa eficiência na captura<br />
de alimento é a capaci<strong>da</strong>de de caçar<br />
em grupo.<br />
O maior misticeto é a baleia-azul,<br />
que pode chegar a 33 metros de comprimento<br />
quando adulta e o menor, a<br />
baleia-franca-anã (Caperea marginata)<br />
de 5 a 6 metros. O maior odontoceto é<br />
o cachalote, que atinge até 18 metros<br />
de comprimento quando adulto, e o<br />
menor, a vaquita (Phocoena sinus) e seu<br />
máximo de metro e meio.<br />
Com uma linha de costa muito<br />
grande, o Brasil se dest aca na diver-
Golfinho-pintado-do-atlântico (Stenella frontalis)<br />
MANCHAS DA IDADE<br />
As manchas identificam o<br />
golfinho-pintado-do-atlântico:<br />
quanto mais velho, mais manchas.<br />
O golfinho-nariz-de-garrafa (pág. 27)<br />
é a espécie de maior ocorrência<br />
e a mais conheci<strong>da</strong> por causa<br />
do personagem Flipper<br />
Hiroya Minakuchi/minden pictures<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
29
Família numerosa<br />
A maioria <strong>da</strong>s espécies de golfinhos registra<strong>da</strong>s em águas brasileiras é <strong>da</strong> família Delphini<strong>da</strong>e. Dela fazem parte:<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
30<br />
Ba l e i a-p i l o t o-d e-peitor ais-c u r ta s<br />
(Globicephala macrorhynchus) – Ingere cerca de 45<br />
kg de comi<strong>da</strong> por dia. O principal componente <strong>da</strong> dieta é<br />
lula, apesar de comer também pequenos peixes<br />
Ba l e i a-p i l o t o-d e-peitor ais-l o n g a s<br />
(Globicephala melas) – Não habita regiões muito quentes,<br />
por isso as populações do Norte e do Sul não se misturam<br />
Bo t o-c i n z a<br />
(Sotalia guianensis) – O mais comum em todo o litoral<br />
brasileiro<br />
Fa l s a-o r c a<br />
(Pseudorca crassidens) – Apesar do nome é confundi<strong>da</strong><br />
com o golfinho-nariz-de-garrafa, embora seja maior<br />
Go l f i n h o-c a b e ç a-d e-m e l ã o<br />
(Peponocephala electra) – De corpo cinza escuro e ‘lábios’<br />
geralmente brancos, alguns têm ‘tapa-olho’ escuro.<br />
Difícil de distinguir <strong>da</strong> orca-anã<br />
Go l f i n h o-c ly m e n e<br />
(Stenella clymene) – É pequeno, com 1,8 metro de<br />
comprimento, em média. Tem ‘bico’ curto, barriga<br />
branca e marcas escuras acima do olho e abaixo <strong>da</strong><br />
na<strong>da</strong>deira dorsal<br />
Go l f i n h o-c o m u m -d e-b ic o-c u r t o<br />
(Delphinus delphis) – É um dos menores e mais comuns<br />
em todo o mundo<br />
Go l f i n h o-c o m u m -d e-b ic o-l o n g o<br />
(Delphinus capensis) – Distingue-se do anterior pelo<br />
‘bico’ longo<br />
Go l f i n h o-d e-d e n t e s-r u g o s o s<br />
(Steno bre<strong>da</strong>nensis) – Possui 20 a 27 dentes em ca<strong>da</strong> linha,<br />
com pequenas ‘rugas’ (sulcos verticais)<br />
Go l f i n h o-d e-p e r o n<br />
(Lissodelphis peronii) – Não tem barbatana dorsal. Habita<br />
águas frescas e profun<strong>da</strong>s no Hemisfério Sul<br />
Go l f i n h o-d e-ri s s o<br />
(Grampus griseus) – Apresenta um sulco leve e côncavo<br />
na cabeça, uma característica exclusiva <strong>da</strong> espécie<br />
Go l f i n h o-d e-ri s s o<br />
(Lagendodelphis hosei) – É mais comum no Oceano Pacífico,<br />
mas raramente também aparece no Atlântico<br />
Go l f i n h o-l i s t r a d o<br />
(Stenella coeruleoalba) – Apresenta uma listra azul escuro<br />
em todo seu comprimento<br />
Go l f i n h o-n a r i z-d e-g a r r a fa<br />
(Tursiops truncatus) – É o Flipper. Ocorre em zonas tropicais<br />
e tempera<strong>da</strong>s de todo o mundo<br />
Go l f i n h o-p i n ta d o -d o-a t l â n t i c o<br />
(Stenella frontalis) – Tem um padrão manchado e conforme<br />
envelhece aparecem mais manchas, até predominar o branco<br />
Go l f i n h o-p i n ta d o -pa n t r o p ic a l<br />
(Stenella attenuata) – Possui dorso cinza escuro com manchas<br />
claras e focinho branco. Fica mais manchado conforme envelhece.<br />
Go l f i n h o-r o ta d o r<br />
(Stenella longirostris) – Dá saltos espetaculares, ro<strong>da</strong>ndo<br />
como um pião, em pleno ar<br />
Or c a<br />
(Orcinus orca) – Vive em socie<strong>da</strong>des matriarcais e caça<br />
grandes presas em grupos, mas não ataca humanos<br />
Or c a-a n ã<br />
(Feresa attenuata) – Muito pareci<strong>da</strong> com a falsa-orca. É<br />
mais comum nas costas do Japão, Havaí e Índia<br />
matheus jeremias fortunato<br />
Golfinho-rotador (Stenella longirostris)
saltador<br />
O golfinho-rotador<br />
(nesta e na pág. anterior), que gira no ar<br />
como um pião, tem a maior população<br />
residente conheci<strong>da</strong> em Fernando de<br />
Noronha, mas a espécie se espalha por<br />
grande parte do litoral brasileiro<br />
si<strong>da</strong>de de<br />
golfinhos. Dentre<br />
mais de 70 espécies conheci<strong>da</strong>s<br />
no mundo, quase 50% já foram<br />
registra<strong>da</strong>s ao menos uma vez no<br />
nosso litoral e na Bacia Amazônica,<br />
onde vivem o boto-cor-de-rosa (Inia<br />
geoffrensis) e o boto-tucuxi (Sotalia<br />
fluvialitis), nossas duas espécies fluviais.<br />
Segundo o biólogo Marcos<br />
Santos, coordenador do Laboratório<br />
de Biologia <strong>da</strong> Conservação de Cetáceos<br />
do Departamento de Zoologia<br />
<strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Estadual Paulista<br />
(Unesp) de Rio Claro, originalmente<br />
as duas espécies mais comuns no<br />
litoral brasileiro eram o boto-cinza<br />
(Sotalia guianensis), ain<strong>da</strong> abun<strong>da</strong>nte,<br />
e a toninha (Pontoporia blainvillei),<br />
hoje ameaça<strong>da</strong>. “O boto-cinza ocorre<br />
em águas costeiras, muitas vezes<br />
adentrando estuários, desde o estado<br />
de Santa Catarina e, rumando<br />
ao Norte, até Honduras, na América<br />
Central. Poderíamos dizer que é a<br />
‘mais brasileira’ <strong>da</strong>s espécies de cetáceos.<br />
A toninha ocorre em águas<br />
costeiras desde o Espírito Santo e,<br />
rumando ao Sul, até a Baía Blanca<br />
na Argentina”, diz.<br />
Onde tem<br />
peixe, tem<br />
golfinho,<br />
que precisa<br />
comer muito<br />
A bióloga Liliane Lodi, do Instituto<br />
Aqualie, estu<strong>da</strong> o golfinhonariz-de-garrafa<br />
no litoral do Rio<br />
de Janeiro e conta que os golfinhos<br />
são animais bastante sociais, “mas<br />
entre eles”. Ela recomen<strong>da</strong>: “Para<br />
observá-los, é melhor permanecer<br />
dentro do barco ou na praia e não<br />
tentar tocá-los na água, pois dificilmente<br />
se consegue”. Esses animais<br />
an<strong>da</strong>m sempre em grupos, de tamanhos<br />
variados, conforme a espécie.<br />
As orcas, por exemplo, vivem em<br />
alto-mar, em socie<strong>da</strong>des matriarcais,<br />
onde a fêmea mais velha é a líder<br />
do grupo. “Formam famílias de<br />
até quatro gerações. Os grupos, em<br />
geral, são pequenos, mas eventualmente<br />
podem chegar a 50 indivíduos”,<br />
diz Liliane.<br />
Grupos de golfinhos oceânicos<br />
são bem maiores e chegam a ter<br />
centenas de indivíduos. As espécies<br />
costeiras vivem em grupos menores.<br />
“Mas já vi grupo de boto-cinza<br />
na baía de Parati, onde há boa disponibili<strong>da</strong>de<br />
de alimentos, de até<br />
450 indivíduos”, conta a bióloga.<br />
Algumas espécies possuem socie<strong>da</strong>des<br />
mais flui<strong>da</strong>s e mu<strong>da</strong>m de grupo<br />
o tempo todo, como é o caso do próprio<br />
nariz-de-garrafa e do golfinhorotador<br />
(Stenella longirostris), que<br />
habita grande parte do litoral brasileiro,<br />
mas tem a maior população<br />
residente conheci<strong>da</strong> no arquipélago<br />
de Fernando de Noronha.<br />
Golfinhos costumam ser poligâmicos,<br />
com machos e fêmeas cruzando<br />
com vários indivíduos do<br />
sexo oposto. A gestação dura em<br />
torno de 12 meses na maioria <strong>da</strong>s<br />
espécies e o filhote é amamentado<br />
matheus jeremias fortunato<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
31
Suzi Eszterhasminden pictures<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
32<br />
Golfinho-comum-de-bico-curto (Delphinus delphis)<br />
contrastes<br />
O de-bico-curto (acima) é um dos golfinhos menores e mais comuns; o golfinho-de-risso (pág. seguinte) é espécie<br />
rara e tem a característica exclusiva do sulco côncavo na cabeça<br />
por até 18 meses. “Mesmo depois de<br />
desmamar, costuma acompanhar a<br />
mãe por um longo tempo”, explica<br />
André Barreto, doutor em Oceanografia<br />
e professor <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de<br />
do Vale do Itajaí (Univali). A comunicação<br />
entre eles é feita principalmente<br />
através do som. Possuem<br />
uma audição muito sensível e produzem<br />
sons de alta frequência para<br />
se comunicar e explorar o ambiente.<br />
“Os golfinhos utilizam pulsos de<br />
ultrassom do mesmo modo que um<br />
barco utiliza o sonar. Ouvindo os<br />
ecos, eles conseguem saber a distância<br />
para obstáculos e identificar as<br />
suas presas”, diz Barreto.<br />
Além disso, possuem um metabolismo<br />
alto e precisam comer muito.<br />
Mesmo entre os golfinhos menores,<br />
costeiros, ca<strong>da</strong> indivíduo necessita<br />
ingerir 5 quilos de alimento por dia.<br />
Por isso, gastam muita energia procurando<br />
alimentos e frequentam<br />
áreas de grande importância econômica<br />
para o País por suas características<br />
piscívoras, ou seja, onde há<br />
peixe, há golfinhos. E há problemas<br />
As toninhas<br />
podem ser<br />
extintas em<br />
todo mundo<br />
com a captura acidental (by catch)<br />
em redes de pesca, um impacto que<br />
afeta mundialmente as populações<br />
costeiras de golfinhos.<br />
“Nenhum pescador quer capturar<br />
golfinhos. Porém, acidentalmente,<br />
eles se envolvem com redes de pesca<br />
e morrem afogados. Por esse motivo,<br />
as toninhas hoje são considera<strong>da</strong>s<br />
mundialmente ameaça<strong>da</strong>s de extinção<br />
e, segundo a última revisão<br />
do estado de conservação <strong>da</strong> fauna<br />
brasileira, ficaram na subcategoria<br />
‘em perigo’”, observa Marcos Santos.<br />
Um Plano para Mamíferos Aquáticos,<br />
editado pelo Ibama, em 2001,<br />
inclui como ameaçados também o<br />
golfinho-rotador e o golfinho-nariz-
Brandon Cole/getty images<br />
Golfinho-de-risso (Grampus griseus)<br />
Pescadores matam<br />
golfinhos para usar<br />
a carne dura como<br />
isca de tubarão<br />
de-garrafa.<br />
Segundo o advogado Cristiano<br />
Pacheco, diretor executivo do<br />
Instituto Justiça Ambiental e voluntário<br />
<strong>da</strong> organização não governamental<br />
Sea Shepherd Brasil,<br />
porém, nem sempre a captura de<br />
golfinhos é acidental. “Em 2007,<br />
soubemos de um massacre de golfinhos<br />
no Amapá, quando 83 animais<br />
foram mortos. Na ocasião,<br />
entramos com ação de indenização<br />
pedindo embargo <strong>da</strong>s embarcações<br />
– para a qual conseguimos<br />
uma liminar – e uma ação civil<br />
pública contra o Ibama (Instituto<br />
Brasileiro de Meio Ambiente e dos<br />
Recursos Naturais Renováveis),<br />
por omissão de informações”.<br />
Depois, Pacheco soube que<br />
os golfinhos são capturados no<br />
Amapá e no Pará para servirem<br />
de isca de tubarão, “porque possuem<br />
uma carne dura, que demora<br />
mais para amolecer na água”.<br />
Não há estimativas do número<br />
marcos de o. santos<br />
Famílias<br />
pequenas<br />
Só existem registros em águas brasileiras<br />
de uma espécie <strong>da</strong> família Phocoeni<strong>da</strong>e<br />
e uma <strong>da</strong> família Pontopori<strong>da</strong>e.<br />
São elas:<br />
Bo t o-d e-b u r m e i s t e r<br />
(Phocoena spinipinnis) – Possui a na<strong>da</strong>deira<br />
dorsal extremamente afia<strong>da</strong>.<br />
Sua pele escurece logo após a morte, por<br />
isso ele é apeli<strong>da</strong>do de boto-preto<br />
To n i n h a<br />
(Pontoporia blainvillei, foto acima)<br />
– É provavelmente o golfinho mais ameaçado<br />
no Atlântico Sul Ocidental, com<br />
alta mortali<strong>da</strong>de acidental em redes de<br />
espera<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
33
Suzi Eszterhas/minden pictures<br />
Orca (Orcinus orca)<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
34<br />
na paz<br />
A orca ganhou, no cinema, a fama<br />
injusta de assassina, mas ela não<br />
ataca humanos, só grandes presas.<br />
Vive em alto-mar, em grupos, sob a<br />
liderança <strong>da</strong> fêmea mais velha<br />
de golfinhos caçados para este fim,<br />
mas o advogado lembra que a pesca<br />
de tubarão inclui espécies comuns<br />
na mesa do brasileiro, como cação,<br />
caçonete, anjo e viola.<br />
A lista de ameaças aos golfinhos<br />
não se limita às redes de<br />
pesca. Eles também são vítimas<br />
de atropelamento por embarcações,<br />
<strong>da</strong> diminuição dos estoques<br />
pesqueiros, <strong>da</strong> poluição, do lixo<br />
marinho e <strong>da</strong>s mu<strong>da</strong>nças climáticas,<br />
que já alteram a temperatura<br />
e as correntes marítimas, mexendo<br />
com a cadeia alimentar. “A<br />
Os cetáceos<br />
são pouco<br />
pesquisados<br />
no Brasil<br />
poluição sonora, provoca<strong>da</strong> pelo<br />
grande volume de embarcações<br />
também pode influir no sensível<br />
sistema auditivo dos golfinhos e<br />
interferir na comunicação entre<br />
eles”, explica Liliane.<br />
Para estimar a importância <strong>da</strong>s<br />
ameaças, no entanto, faltam informações<br />
no Brasil. Mesmo que as<br />
pesquisas sobre os cetáceos tenham<br />
crescido consideravelmente no País<br />
desde o início <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1980 –<br />
caso do golfinho-rotador em Noronha,<br />
onde há pesquisa, educação<br />
ambiental e integração social com<br />
comuni<strong>da</strong>des pesqueiras – há muitas<br />
lacunas a serem preenchi<strong>da</strong>s.<br />
“Faltam estimativas de tamanhos<br />
<strong>da</strong> maioria <strong>da</strong>s populações, seus<br />
hábitos alimentares, seus aspectos<br />
reprodutivos, dentre outros. Essas<br />
informações são espaça<strong>da</strong>mente<br />
distribuí<strong>da</strong>s ao longo <strong>da</strong> costa e se<br />
concentram apenas em pequenos<br />
núcleos onde existe pesquisa há<br />
mais tempo”, diz Santos.<br />
Uma <strong>da</strong>s espécies em melhor<br />
condição, neste sentido, é o narizde-garrafa<br />
(Tursiops truncatus). Além<br />
<strong>da</strong>s pesquisas de Liliane Lodi do<br />
Instituto Aqualie, no arquipélago<br />
<strong>da</strong>s Cagarras, em frente à praia de<br />
Ipanema, no Rio de Janeiro, existe<br />
o programa Botos do Itajaí, coorde-
Boto-cinza (Sotalia guianensis)<br />
willy ertel<br />
TERRA DA GENTE | biodiversi<strong>da</strong>de<br />
35<br />
A ‘MAIS BRASILEIRA’<br />
O boto-cinza pode ser avistado no litoral<br />
brasileiro, de Santa Catarina para<br />
o Norte, e chega a entrar nos estuários.<br />
O exemplar acima foi fotografado no<br />
Lagamar, no litoral Sul de São Paulo<br />
nado por André Barreto, <strong>da</strong> Univali,<br />
com o registro <strong>da</strong> presença desses<br />
golfinhos na foz do rio Itajaí, em<br />
Santa Catarina. “Desde 2001 temos<br />
monitorado a ocorrência dos animais<br />
na área, onde há um grande<br />
tráfego de embarcações, analisando<br />
seu comportamento e ocorrência.<br />
E, desde 2008, começamos a<br />
identificá-los individualmente”, relata<br />
o oceanógrafo.<br />
Os estudos em Santa Catarina<br />
mostram certa tolerância dos animais<br />
às perturbações no local, mas<br />
também que há um limite para<br />
Observar<br />
um golfinho<br />
depende<br />
de sorte<br />
essa tolerância. “Em um período<br />
que houve uma dragagem intensa<br />
e explosões para quebrar rochas<br />
embaixo d’água, os golfinhos desapareceram<br />
<strong>da</strong> área por quase um<br />
ano. Atualmente estão de volta,<br />
mas apareceu uma série de doenças<br />
de pele em diversos animais”, continua<br />
Barreto.<br />
Segundos os especialistas, uma<br />
forma de evitar o declínio de populações<br />
de cetáceos pelo mundo<br />
deve ter como princípio o mesmo<br />
lema desta revista – ‘conhecer para<br />
conservar’ – e é uma corri<strong>da</strong> contra<br />
o tempo.<br />
Para os fãs de golfinhos, ain<strong>da</strong> há<br />
oportuni<strong>da</strong>des de ver de perto esses<br />
incríveis mamíferos em ambiente<br />
natural, em várias locali<strong>da</strong>des do<br />
País. Embora não exista um turismo<br />
estruturado para a observação<br />
de golfinhos, as boas dicas são: Fernando<br />
de Noronha para golfinhosrotadores;<br />
Praia do Pipa (RN), estuário<br />
de Cananéia (SP) e Baía Norte<br />
(SC) para boto-cinza; o farol de Laguna<br />
(SC) e a foz do rio Traman<strong>da</strong>í<br />
(RS) para golfinhos-nariz-de-garrafa.<br />
As demais espécies distribuemse<br />
pela costa e vê-las depende de<br />
sorte, portanto é bom manter os<br />
olhos abertos, sobretudo quando se<br />
está embarcado.