algum veto prévio ou punição posterior. Os cartazes, por ex<strong>em</strong>plo, estavamassi<strong>na</strong>dos, obedecendo, assim, ao parágrafo 12 do artigo 72 da Constituiçãobrasileira, o qual determi<strong>na</strong>va que a manifestação do pensamento era livre<strong>em</strong> qualquer assunto, mas o anonimato não era permitido. Também se develevar <strong>em</strong> consideração o fato de os manifestantes ter<strong>em</strong>-se dirigido ao postopolicial a fim de pedir permissão para colar os cartazes. Atendiam, assim,a uma determi<strong>na</strong>ção passada havia t<strong>em</strong>pos de que boletins distribuídos ouafixados, que não foss<strong>em</strong> simples reclame ou propaganda de produtos e serviços,deveriam ser apresentados à chefatura de polícia, “para que dela sejamlogo sabidos os intuitos de tais publicações” 21 .No entanto, o resultado alcançado por essa iniciativa foi o oposto do almejadopelos a<strong>na</strong>rquistas por causa da atitude ambígua da autoridade policialque os atendeu: ao afirmar que “não podia proibir n<strong>em</strong> consentir” a colag<strong>em</strong>dos cartazes, mesmo tendo-os sob os olhos e conhecendo “os intuitos de taispublicações”, o tenente comandante do posto do Bom Retiro de certa formaconsentiu que eles o fizess<strong>em</strong>, orde<strong>na</strong>ndo, <strong>em</strong> seguida, que um sargento daquel<strong>em</strong>esmo posto apreendesse os cartazes 22 . É possível que se tratasse deuma estratégia utilizada para detê-los: caso simplesmente se proibisse a distribuiçãodos cartazes, não haveria base para sua prisão; liberando-os parafazer<strong>em</strong> o que julgass<strong>em</strong> mais apropriado, s<strong>em</strong> o consentimento, mas tambéms<strong>em</strong> o veto, abriu-se a oportunidade para flagrá-los <strong>em</strong> uma atividadeconsiderada subversiva.Vale mencio<strong>na</strong>r ainda que os cartazes teriam servido de justificativanão ape<strong>na</strong>s para a prisão de Colombo, <strong>em</strong> flagrante, pelas <strong>rua</strong>s do Bom Retiro,mas para a detenção de seus companheiros: somente depois de o terceirodelegado e seu acompanhante ter<strong>em</strong> lido os cartazes é que determi<strong>na</strong>ram queos d<strong>em</strong>ais a<strong>na</strong>rquistas foss<strong>em</strong> recolhidos ao xadrez. Não foi possível recuperaro impresso, mas, a julgar pelos outros cartazes afixados e distribuídos nosúltimos anos e que não necessariamente resultaram <strong>na</strong> detenção daquelesque os compuseram e espalharam pela cidade, é provável que o conteúdo doimpresso não tivesse motivado a ação policial, servindo talvez, e ape<strong>na</strong>s, paraidentificar a filiação política dos suspeitos.Havia, no entanto, mais detalhes do caso, os quais viriam anexados aoinquérito aberto por ocasião da colag<strong>em</strong> de cartazes e que dariam um viéssensacio<strong>na</strong>lista ao ocorrido: a pedido do terceiro delegado, foi anexado o inquérito“sobre o rapto da menor Gabriela”, ocorrido <strong>em</strong> agosto daquele ano.Segundo os depoimentos da mãe e do irmão da menor, Gabriela Margarida deAndrada Mesquita, de 17 anos, filha de Gabriela Frederica de Andrada Diasde Mesquita e de Teófilo Dias de Mesquita, já falecido, fugira da <strong>casa</strong> de suamãe, localizada <strong>na</strong> <strong>rua</strong> Sólon, número 126, <strong>na</strong> freguesia do Bom Retiro, <strong>na</strong>Nº 2, Ano 2, 2008 129
manhã de 19 de agosto <strong>na</strong> companhia do italiano Armando Fermani, ex-<strong>em</strong>pregadoda Companhia Lidgerwood e vizinho da família Mesquita 23 . O casoseria ape<strong>na</strong>s mais um de tantos de menores seduzidas e conduzidas para longeda <strong>casa</strong> de seus pais, não foss<strong>em</strong> alguns el<strong>em</strong>entos que a imprensa da épocaexplorou ao máximo, os quais se pod<strong>em</strong> notar logo <strong>na</strong> manchete da notíciaque ocupou por diversos números a primeira pági<strong>na</strong> de O Commercio de SãoPaulo: “Caso Excepcio<strong>na</strong>l – A<strong>na</strong>rquistas <strong>em</strong> S. Paulo – Conspirações Descobertas.Rapto de uma moça de família – Queixa ao dr. Chefe de Polícia – Busca eApreensão de máqui<strong>na</strong>s infer<strong>na</strong>is – Revelações” 24 .Neste momento, vale propor uma breve digressão para poder a<strong>na</strong>lisaresse “Caso excepcio<strong>na</strong>l” a partir do processo de construção dos espaços deatuação política dos a<strong>na</strong>rquistas, s<strong>em</strong> o viés sensacio<strong>na</strong>lista que a imprensapaulista<strong>na</strong> buscou imprimir nele e a fim de entender a presença dos militantesno cotidiano dos trabalhadores e da cidade de São Paulo, assim como avigilância a que foram então submetidos. Daí a necessidade de pensar, primeiramente,<strong>na</strong> presença pública dos a<strong>na</strong>rquistas pelas <strong>rua</strong>s e espaços públicosda cidade.A<strong>na</strong>rquistas <strong>na</strong>s <strong>rua</strong>sManifestações de trabalhadores organizados não eram novidade <strong>em</strong>São Paulo e <strong>em</strong> vários centros urbanos brasileiros. Pelo menos desde 1891,o 1 o de Maio era celebrado <strong>na</strong> Capital Federal e a capital paulista tambémtest<strong>em</strong>u nhou <strong>na</strong>quele ano os festejos promovidos pelo Centro do PartidoOperário de São Paulo 25 . <strong>Em</strong> 1892, a imprensa deu conta de com<strong>em</strong>oraçõesocorridas <strong>na</strong>quelas duas cidades e também <strong>em</strong> Porto Alegre, onde, <strong>na</strong> “completapaz”, ouviram-se discursos <strong>em</strong> al<strong>em</strong>ão, italiano e <strong>em</strong> português, atendendoas diversas <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lidades dos trabalhadores. No Rio de Janeiro, até opresidente marechal Floriano Peixoto comparecera às festas com<strong>em</strong>orativase, <strong>em</strong> São Paulo, os festejos novamente contaram com a organização daqueleCentro Operário 26 .O dia de 1 o de Maio de 1893, por sua vez, a “data escolhida pelos socialistaspara a celebração da festa do trabalho”, com cortejos por <strong>toda</strong> a capitalpaulista 27 , transcorreu “numa ord<strong>em</strong> e harmonia invejáveis” 28 . No entanto,durante a noite, explosões <strong>em</strong> dois pontos da cidade de São Paulo fizeram saltarnão ape<strong>na</strong>s <strong>parte</strong> dos edifícios, mas as autoridades e a opinião pública, noque a imprensa chamou de “a primeira manifestação material do a<strong>na</strong>rquismo<strong>em</strong> São Paulo” 29 . A polícia paulista<strong>na</strong>, porém, não conseguiu identificar intençõesou envolvimento de a<strong>na</strong>rquistas <strong>na</strong>s explosões, conforme foi indicado<strong>em</strong> inquérito aberto para apurar o incidente 30 .130
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