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DA ESCUTA À ESCRITA: a construção do caso clínico em psicanálise

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Da escuta à escrita: a construção <strong>do</strong> <strong>caso</strong> clínico <strong>em</strong> psicanáliseOliveira (2004) coloca, por sua vez, que a escrita <strong>do</strong> <strong>caso</strong> clínico pode ser situadacomo uma forma de elaborar os restos irredutíveis de uma análise, os detritos que comportamos el<strong>em</strong>entos resistenciais da escuta. Ao citar Edson de Souza pontua que o <strong>caso</strong> não ésomente um exercício de teoria, mas sim um trabalho de movimento resistencial daquele queescuta. Assim, pode-se entender que a escrita pode ser uma tentativa de elaborar o que restoucomo questão de uma análise, aquilo que clama por uma simbolização.[...] a formulação desse enigma ou dessa interrogação é papel fundamental nosso.[...] o que justificaria ainda o nome de clínico ou de analista é o fato de que “sepossa lidar precisamente com este buraco que, além <strong>do</strong> mais, é o que faz com queesse <strong>caso</strong>, que ali se transforma num <strong>caso</strong>, seja precisamente neste ponto que setorna <strong>caso</strong>: onde bordejamos esse buraco de ignorância e nos decidimos a lidar comele. (ZANETTI; KUPFER, 2006, p.173).Para isso, trata-se de retraçar com detalhe os caminhos, construções e saberesmobiliza<strong>do</strong>s no decorrer da análise, consideran<strong>do</strong> o t<strong>em</strong>po <strong>do</strong>s efeitos para produzir umasignificação. A pesquisa deve então apreender esse movimento <strong>em</strong> seus des<strong>do</strong>bramentos,possibilitan<strong>do</strong> além da compreensão <strong>do</strong> <strong>caso</strong>, qu<strong>em</strong> sabe uma nomeação <strong>em</strong> relação aodiagnóstico – este entendi<strong>do</strong> de forma estrutural conforme proposto pela teoria psicanalítica(o mo<strong>do</strong> de cada sujeito lidar com a castração), e não no senti<strong>do</strong> nosológico, psiquiátrico(FIGUEIREDO; MACHADO, 2000). Ou seja, trata-se, ao escrever um <strong>caso</strong>, de poder situar aposição <strong>do</strong> sujeito na constituição de sua fantasia fundamental (ZANETTI; KUPFER, 2006).De acor<strong>do</strong> com Mezan (1998), escrever é provavelmente catarse e elaboração aomesmo t<strong>em</strong>po – uma catarse elaborativa, porque no movimento de retomar, pensar, procurarligar as imagens <strong>em</strong> frases, opera-se um certo distanciamento.seguinte história:No que compete à distância com relação à situação transferencial, Clément narra a[...] havia duas tribos de índios que viviam na mesma marg<strong>em</strong> <strong>do</strong> rio; viviambrigan<strong>do</strong>, às turras uma com a outra. Um belo dia, os <strong>do</strong>is caciques se reún<strong>em</strong> edecid<strong>em</strong> que uma das tribos vai atravessar o rio e se instalar na marg<strong>em</strong> oposta. Masaté onde a segunda tribo deve se afastar da primeira? Depois de pensar, o cacique datribo que fica na primeira marg<strong>em</strong> diz para o cacique da que atravessará o rio: vocêsatravess<strong>em</strong> o rio e comec<strong>em</strong> a andar. And<strong>em</strong> até chegar a um ponto de onde já nãopossam avistar a nossa aldeia, mas de onde se possa ainda ver a fumaça <strong>do</strong> nossofogo: essa vai ser a distância ótima. N<strong>em</strong> tão perto que fiqu<strong>em</strong>os brigan<strong>do</strong> o t<strong>em</strong>poto<strong>do</strong>, n<strong>em</strong> tão longe que vocês não possam ver a nossa fumaça, n<strong>em</strong> nós vermos afumaça de vocês (MEZAN, 1998, p. 239).Assim, Mezan (1998) coloca que escrever serve justamente para estabelecer essadistância ótima, a partir da qual o analista retoma o seu lugar de analista. O escrito, então,Psicanálise & Barroco <strong>em</strong> revista v.10, n.2 : 42-61, dez.2012 48

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