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QUA 2 AGO 2017 | SAÚDE | 1<br />
DR. JOÃO MARQUES<br />
Farmacêutico da Farmácia do Caniço<br />
joao.marquesfarmaciadocanico.pt<br />
PRISÃO DE VENTRE<br />
— QUANDO OS INTESTINOS VÃO DE FÉRIAS<br />
Amudança de ambientes e<br />
de hábitos (incluindo os<br />
alimentares) que as férias<br />
normalmente propiciam<br />
muitas vezes acarretam alterações<br />
digestivas, das quais a<br />
“prisão de ventre” não será a menos<br />
comum. Pode, assim, ocorrer<br />
uma redução da frequência da defecação<br />
com diminuição do volume<br />
fecal ou dificuldade em evacuar<br />
fezes duras e escassas. Podem<br />
mesmo instalar-se desconforto abdominal,<br />
com a sensação de “inchaço”,<br />
e dores nas costas, assim<br />
como alguma falta de apetite e/ou<br />
náuseas.<br />
Trata-se de uma situação esporádica,<br />
facilmente identificável por<br />
qualquer indivíduo conhecedor<br />
dos seus ritmos habituais e, na<br />
maioria das vezes, ultrapassável<br />
com alguns ajustes alimentares,<br />
maior ingestão de fibra e de líquidos,<br />
ou com o recurso temporário<br />
a um laxante de venda livre.<br />
Questão mais difícil se coloca<br />
quando o quadro acima apresentado<br />
é o “normal”, a vivência quotidiana<br />
descrita por expressões<br />
como “os meus in<strong>test</strong>inos são preguiçosos”<br />
ou “normalmente sou<br />
um bocado dureiro(a)”. Nestes casos,<br />
o recurso repetido e prolongado<br />
a laxantes sem qualquer<br />
aconselhamento especializado e<br />
sem a adoção de hábitos saudáveis,<br />
pode tornar-se numa das causas<br />
do problema - o uso crónico de<br />
laxantes estimulantes pode conduzir<br />
a um agravamento da situação,<br />
com perda de tónus muscular<br />
liso abdominal e da enervação<br />
intrínseca.<br />
Como lidar, então, com a “preguiça”<br />
in<strong>test</strong>inal? Antes de mais,<br />
é necessário recordar que o mito<br />
instalado de que é obrigatória<br />
uma dejeção diária é falso, a verdade<br />
é que os ritmos individuais<br />
são diferentes e tanto pode ser<br />
considerado normal defecar duas<br />
vezes por dia, como três vezes por<br />
semana, desde que se trate do ritmo<br />
pessoal habitual e não implique<br />
qualquer mal-estar. Posto isto, nos<br />
casos de “defecação insatisfatória<br />
que resulta em evacuação pouco<br />
frequente, passagem difícil de fezes<br />
ou ambas” [Sintomas que, para<br />
The American College of Gastroenterology,<br />
se inscrevem na definição<br />
de obstipação] que não é devida<br />
nem a patologia existente, que deverá<br />
ser tratada (como no caso<br />
das hemorroidas que podem provocar<br />
o receio de defecar), nem a<br />
condição específica (a gravidez<br />
acarreta frequentemente problemas<br />
de obstipação), nem a medicamentos<br />
em toma prolongada<br />
(alguns analgésicos, suplementos<br />
de ferro, antiácidos com alumínio,<br />
anticonvulsivantes, alguns laxantes,<br />
etc.), cuja substituição poderá<br />
ser avaliada pelo médico prescritor,<br />
há quatro regras de ouro a seguir:<br />
Bons hábitos de casa de banho<br />
– Ignorar repetidamente a necessidade<br />
de defecar, pode estar na<br />
origem da obstipação: aumentar<br />
o tempo de permanência das fezes<br />
no cólon vai fazê-las secar e endurecer,<br />
além de que o organismo é<br />
“É necessário<br />
recordar que o mito<br />
instalado de que é<br />
obrigatória uma<br />
dejeção diária é falso,<br />
a verdade é que os<br />
ritmos individuais são<br />
diferentes e tanto<br />
pode ser considerado<br />
normal defecar duas<br />
vezes por dia, como<br />
três vezes por semana,<br />
desde que se trate do<br />
ritmo pessoal habitual<br />
e não implique<br />
qualquer mal-estar”.<br />
ensinado a ignorar o estímulo nervoso;<br />
Pelo contrário, deve procurar<br />
educar os seus in<strong>test</strong>inos, visitando<br />
regularmente a casa de banho (de<br />
manhã, após o pequeno-almoço,<br />
é um momento particularmente<br />
favorável), sem pressas e assumindo<br />
uma postura correcta.<br />
Alimentação rica em fibra – Os<br />
alimentos ricos em fibra (vegetais,<br />
fruta e cereais integrais) são fundamentais<br />
para um funcionamento<br />
regular dos in<strong>test</strong>inos: as fibras<br />
retêm água, aumentando o volume<br />
fecal e tornando as fezes brandas,<br />
o que facilita a sua progressão<br />
através do in<strong>test</strong>ino grosso; Além<br />
disso, são alimentos que aumentam<br />
o tempo de mastigação, o que<br />
também contribui para a resolução<br />
do problema; Tomar um suplemento<br />
de fibra pode ser útil nestes<br />
casos, podendo ser usado prolongadamente<br />
sem causar prejuízos,<br />
otimizando até a sua eficácia, e<br />
com o benefício adicional de contribuir<br />
para a redução dos níveis<br />
do colesterol no sangue.<br />
Suficiente ingestão de água e<br />
outros líquidos – Manter o organismo<br />
hidratado contribui para a<br />
manutenção de movimentos in<strong>test</strong>inais<br />
regulares e um cólon saudável,<br />
além de que o consumo diário<br />
de 1,5 a 2 litros de água vai<br />
permitir que a fibra ingerida produza<br />
os seus benefícios.<br />
Atividade física regular – Caminhar,<br />
correr, nadar, andar de bicicleta,<br />
ou outro exercício praticado<br />
regularmente ajuda a manter o<br />
tónus muscular, designadamente<br />
o abdominal, necessário à facilitação<br />
do trânsito in<strong>test</strong>inal, evitando<br />
o endurecimento das fezes.<br />
Ocasionalmente poderá mesmo<br />
haver necessidade de recorrer a<br />
laxantes. Neste caso, devem preferir-se<br />
os que aumentam o volume<br />
fecal ou a sua hidratação aos que<br />
estimulam o peristaltismo in<strong>test</strong>inal<br />
ou aos salinos, que provocam<br />
grande chamada de água ao in<strong>test</strong>ino.<br />
O uso de laxantes mais<br />
potentes, ao levar ao esvaziamento<br />
completo do in<strong>test</strong>ino, pode ocasionar<br />
a falta de defecação por alguns<br />
dias (resíduo insuficiente) levando<br />
à tentação de retomar o<br />
uso do laxante e, uma vez mais,<br />
não podemos esquecer que o abuso<br />
de laxantes pode agravar o quadro<br />
de obstipação inicial, sendo mesmo<br />
uma das suas principais causas.<br />
Peça sempre aconselhamento<br />
na altura de escolher um laxante,<br />
mas não deixe de procurar o seu<br />
médico se constatar qualquer alteração<br />
persistente dos seus hábitos<br />
in<strong>test</strong>inais, se a obstipação tiver<br />
uma duração superior a três semanas,<br />
se for acompanhada de<br />
dor abdominal ou se surgir sangue<br />
nas fezes. JM