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Rosa do abismo

9ª coletânea da Academia Peruibense de Letras

9ª coletânea da Academia Peruibense de Letras

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ORGANIZAÇÃO:<br />

Academia Peruibense de Letras<br />

ROSA DO ABISMO<br />

( 9ª Coletânea da Academia Peruibense de Letras )<br />

Primeira edição<br />

São Paulo - SP<br />

2018


Copyright © 2018 Academia Peruibense de Letras (Coletânea)<br />

O conteú<strong>do</strong> desta obra é de responsabilidade <strong>do</strong>s autores e<br />

proprietários <strong>do</strong>s Direitos Autorais.<br />

Proibida a reprodução parcial ou todal para comercialização<br />

sem autorização <strong>do</strong>s autores.<br />

Autorizada a reprodução parcial para fins não comerciais desde<br />

que citada a fonte.<br />

COORDENACÃO, DIAGRAMAÇÃO E CAPA:<br />

Jorge Braga da Silva<br />

REVISÃO:<br />

Edwal<strong>do</strong> Camargo Rodrigues<br />

Da<strong>do</strong>s Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)<br />

(Câmara Brasileira <strong>do</strong> Livro, SP - Brasil)<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong> - 9ª Coletânea da Academia Peruibense<br />

de Letras / Organização: Academia Peruibense de<br />

Letras. -- São Paulo - SP: All Print Editora, 2018.<br />

Vários autores.<br />

ISBN 978-85-411-1523-0<br />

1. Contos brasileiros - Coletâneas 2. Crônicas brasileiras<br />

- Coletâneas 3. Poesia brasileira - Coletâneas I.<br />

Academia Peruibense de Letras.<br />

CDD-869.308<br />

18-21113 -869.3<br />

-869.108<br />

Índices para catálogo sistemático:<br />

1. Antologia: Contos: Literatura brasileira 869.308<br />

1. Antologia: Crônicas: Literatura brasileira 869.3<br />

1. Antologia: Poesia: Literatura brasileira 869.108<br />

Cibele Maria Dias - Bibliotecária - CRB-8/9427


Avenida Padre Anchieta<br />

(Por volta <strong>do</strong> final da década de 50 e início da década de 60)<br />

Avenida Padre Anchieta<br />

(2018, cerca de 58 anos depois)


Sumário<br />

Apresentação9<br />

Carolina Ramos 15<br />

Peruíbe 15<br />

Darcio Pasotto 17<br />

O sonho de uma família paulistana 17<br />

Ecilla Bezerra 22<br />

Natureza e ser humano 22<br />

Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes - O Abarebebê 24<br />

Edwal<strong>do</strong> Camargo Rodrigues 29<br />

Com perdão <strong>do</strong>s historia<strong>do</strong>res 29<br />

Ensino ao ar livre: Estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> meio 30<br />

Morar no litoral 38<br />

Elizabeth Cury Bechir Watanabe 39<br />

Itanhaém de ontem 39<br />

Trovas40<br />

Barra <strong>do</strong> Una 41<br />

Rio Itanhaém 42<br />

Esther Felicidade R. Romano 43<br />

Mistérios de Peruíbe 43<br />

Perfume de âmbar 46<br />

Poesia caipira 47<br />

João Libero <strong>Rosa</strong> Marques 49<br />

A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo 49<br />

Peruíbe, cidade amor 52<br />

O Lobisomem 53<br />

O Retorno 57<br />

O burro e o leiteiro 58<br />

Jorge Braga da Silva 60<br />

Sombras sonoras 60


José Muniz de Carvalho 72<br />

Encantos72<br />

Gratidão73<br />

Uma Bela Visão 74<br />

José Romeu Dutra 75<br />

Minha Jovem 75<br />

O Terreno de meu Avô 76<br />

Martha Zelia Zachar Fujita 78<br />

Crendices <strong>do</strong> Itatins 78<br />

Muito além 79<br />

Grande segre<strong>do</strong> 80<br />

Ricar<strong>do</strong> Ernesto Rose 82<br />

Dona Nena 82<br />

Terezinha F. <strong>do</strong> Nascimento Dantas 84<br />

O pássaro e a rosa 84<br />

A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo 87<br />

Poesia88<br />

Thereza Costa 89<br />

<strong>Rosa</strong> ou Rainha 89<br />

Wellington Lima Amorim 93<br />

Flanan<strong>do</strong> no Rio de Janeiro 93<br />

Yolanda de Santis Bello 96<br />

Peruíbe 96<br />

SOBRE A ACADEMIA 99<br />

EFEMÉRIDES & AL. 107


Apresentação<br />

Caro leitor<br />

Permita-nos, nesta 9ª Coletânea, iniciar a apresentação da<br />

obra em um estilo um pouco diferente. Somos uma Academia<br />

integrada à vida de nossa cidade, aos seus problemas e também<br />

as benesses que ela nos concede. Somos regionais, mas é<br />

intrínseco da natureza literária certo pen<strong>do</strong>r para o universal,<br />

o global, como é costume hoje em nosso tempo cheio de conexões,<br />

de informações, de multiplicidades. Comecemos então<br />

pelas multiplicidades <strong>do</strong> clima cultural nos tempos atuais,<br />

aqui no Brasil.<br />

Um conto de multiplicidades<br />

É o melhor <strong>do</strong>s tempos, é o pior <strong>do</strong>s tempos, é a idade da<br />

sabe<strong>do</strong>ria, é a idade da estupidez, é a época da crença, é a<br />

época da incredulidade, é a estação da luz, é a estação das<br />

trevas, é a primavera da esperança, é o inverno <strong>do</strong> desespero,<br />

tem-se tu<strong>do</strong> e nada se tem, seguimos to<strong>do</strong>s diretamente para o<br />

Céu, seguimos to<strong>do</strong>s diretamente pelo outro caminho... Com<br />

perdão de Charles Dickens por essa paráfrase <strong>do</strong> seu famoso<br />

trecho inicial de “Um conto de duas cidades”, de 1859. Talvez<br />

exageran<strong>do</strong> um pouco, mas o cenário aqui no Brasil tem<br />

certas semelhanças com aquele nos tempos que antecederam<br />

a Revolução Francesa, o pano de fun<strong>do</strong> <strong>do</strong> romance de Dickens.<br />

Afinal, os fatos históricos têm o péssimo hábito de reaparecerem,<br />

volta e meia sain<strong>do</strong> das brumas <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>. Senão<br />

iguais, mas semelhantes. Muito semelhantes.<br />

Semelhanças pioradas em nosso caso brasileiro. Aqui o clima<br />

também é de pouco sol e paira sobre nossas cabeças um<br />

céu cinzento e tenso. Talvez um céu artificial como certos clamores<br />

engendra<strong>do</strong>s numa tentativa cínica de opor norte e sul,<br />

ricos e pobres, negros e brancos...<br />

Mas há também o clamor real <strong>do</strong> povo confuso em meio à<br />

cacofonia da disputa pelo poder. Decerto que esse clamor vem<br />

de um povo excluí<strong>do</strong> <strong>do</strong>s benefícios da imensa riqueza gerada


pelo seu próprio trabalho. Ironicamente o povo reclama de<br />

já lhe faltarem as migalhas costumeiras e nem faz ideia <strong>do</strong><br />

direito que tem à maior fatia <strong>do</strong> bolo. Outra semelhança deformada:<br />

aqui até os brioches se multiplicaram, tornaram-se<br />

as escassas migalhas não apenas para os estômagos pobres.<br />

Também há os brioches na educação, na segurança, na saúde,<br />

no trabalho e até mesmo na cultura em geral.<br />

Há o me<strong>do</strong> secreto de tu<strong>do</strong> dar erra<strong>do</strong>, de os ânimos exaltarem-se,<br />

fugirem <strong>do</strong> controle. Tiros e facadas em lugar de guilhotina.<br />

Me<strong>do</strong> de um <strong>abismo</strong> insinuan<strong>do</strong>-se por baixo da relva<br />

que ainda preserva parte <strong>do</strong> seu verde. Na borda <strong>do</strong> <strong>abismo</strong>,<br />

a rosa se sustenta como pode. O povo se sustenta como pode.<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo<br />

E para não dizer que não falamos das flores, foi na forma<br />

de uma rosa que decidimos, nesta 9ª Coletânea, homenagear<br />

nossa encanta<strong>do</strong>ra cidade. Peruíbe é única. Tão única quanto<br />

a rosa de uma lenda que parece haver por essas bandas aqui<br />

<strong>do</strong> Litoral Sul de São Paulo. Talvez nem seja uma rosa, pode<br />

ser outra flor, não importa. Como também em nada afeta se a<br />

lenda existir ou não. Importa que, para to<strong>do</strong>s nós detentores<br />

da felicidade de morarmos em Peruíbe, esta cidade é a nossa<br />

flor, uma rosa, uma margarida... Uma rosa única no mun<strong>do</strong>,<br />

uma flor que viveria exclusivamente nas bordas <strong>do</strong>s precipícios<br />

entre as sinuosidades da Serra <strong>do</strong>s Itatins, esta parte da<br />

Serra <strong>do</strong> Mar que emoldura o horizonte Peruibense, que nos<br />

acalenta em um berço único e gentil à beira <strong>do</strong> grande Oceano<br />

Atlântico.<br />

Majoritariamente, esta é uma coletânea de textos de ficção,<br />

então, as histórias da <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo serão contadas em prosa<br />

e versos. E isso é o que basta para que ela ganhe sua existência<br />

já em nossa imaginação, como provam os 16 autores<br />

que se sucedem nas próximas páginas:<br />

Em sua crônica “Peruíbe“, Carolina Ramos nos informa


sobre as muitas lendas “que circulam meio às belezas naturais<br />

de Peruíbe”.<br />

Darcio Pasotto nos leva a um passeio pela exuberância<br />

<strong>do</strong>s recantos naturais de Peruíbe. É só embarcar em seu conto<br />

“O sonho de uma família paulistana“.<br />

Quer saber quem foi o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes? Fácil. Leia<br />

o texto de Ecilla Bezerra “Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes - O Abarebebê“<br />

Edwal<strong>do</strong> Camargo, em seu conto “Ensino ao ar livre:<br />

Estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> meio”, faz de Peruíbe o cenário de uma aula ao<br />

ar livre na qual um aluno esperto parece ter estuda<strong>do</strong> bem<br />

a lição de história da colonização <strong>do</strong> Brasil e a contribuição<br />

<strong>do</strong>s padres.<br />

Em haicais e poemas Elizabeth Watanabe mostra seu encantamento<br />

pelas belezas naturais de Peruíbe e Itanhaém.<br />

Em “Mistérios de Peruíbe”, Esther Felicidade também<br />

traz informações sobre lendas e a presença alienígena em Peruíbe.<br />

O amor proibi<strong>do</strong> entre um homem branco e uma índia termina<br />

em tragédia. Fique saben<strong>do</strong> a história da <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo<br />

len<strong>do</strong> o conto “A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo”, de João Líbero.<br />

Afinal, por que tantos discos voa<strong>do</strong>res são avista<strong>do</strong>s em<br />

Peruíbe? Em “Sombras sonoras”, Jorge Braga apresenta o<br />

caso <strong>do</strong> Dr. Abduzi<strong>do</strong>, biólogo, ufólogo e... abduzi<strong>do</strong>.<br />

José Muniz estreia nesta edição com seus poemas “Encantos”,<br />

“Gratidão” e “Uma bela visão”, to<strong>do</strong>s eles para<br />

louvar os encantos da natureza em Peruíbe e a sua gratidão<br />

por toda essa bela visão. José está certo.<br />

José Dutra é outro josé estreante. Esta é a coletânea <strong>do</strong>s<br />

josés. E este nos brinda com o poema “Minha Jovem” no qual<br />

confessa seu amor por uma linda jovem: Peruíbe. Depois, na<br />

crônica “O terreno de meu avô”, Dutra faz uma viajem no


tempo, voltan<strong>do</strong> ao passa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> era garoto e brincava nas<br />

ruas de terra de Peruíbe<br />

No poema “Crendices <strong>do</strong> Itatins”, Martha Fujita nos reconduz<br />

aos mistérios, aos deuses e extraterrestres que vivem<br />

numa dimensão ocasionalmente visível, segun<strong>do</strong> alguns contam,<br />

mas que ela diz: “Tu<strong>do</strong> não passa / De crendice popular”.<br />

Será?<br />

Ricar<strong>do</strong> Rose com seu conto “Dona Nena” faz o leitor<br />

mergulhar numa atmosfera nostálgica, misteriosa e um pouco<br />

melancólica também. Afinal, to<strong>do</strong>s nós já tivemos um mora<strong>do</strong>r<br />

das vizinhanças de hábitos muito discretos e reserva<strong>do</strong>s,<br />

viven<strong>do</strong> quase recluso nalguma casinha meio escondida entre<br />

árvores, lá no final da rua onde quase ninguém vai. Em<br />

Peruíbe, Dona Nena foi uma dessas figuras solitárias. Vivia<br />

tão perto <strong>do</strong>s outros, mas ao mesmo tempo tão distante que<br />

naturalmente as lendas cresceram em torno dela. Mas seriam<br />

mesmo apenas lendas?<br />

Em “O pássaro e a rosa”, conto de Terezinha Dantas,<br />

também outra estreante em nossas coletâneas, somos espiritualmente<br />

teletransporta<strong>do</strong>s para uma cândida fantasia sobre um<br />

pássaro azul. Quan<strong>do</strong> a história termina, o leitor volta dessa<br />

viajem sentin<strong>do</strong>-se mais leve. Experimente.<br />

Thereza Costa já de início deixa claro: <strong>Rosa</strong> ou Rainha?<br />

“Tanto faz”. Mas seu texto “<strong>Rosa</strong> ou Rainha”, cheio de memórias<br />

de infância, cita que sua mãe lhe “falava de uma distante<br />

[flor] Rainha <strong>do</strong> Abismo”.<br />

E agora responda esta: “Você já flanou hoje por aí? Se não<br />

flanou, não se desespere: Wellington Amorim, em “Flanan<strong>do</strong><br />

no Rio de Janeiro”, tem uma boa dica para você flanar na<br />

Cidade Maravilhosa. E o melhor, você poderá flanar guia<strong>do</strong><br />

pelo muito bem elabora<strong>do</strong> roteiro <strong>do</strong> confrade, cujo diferencial<br />

é listar diversos pontos turísticos <strong>do</strong> Rio pouco explora<strong>do</strong>s<br />

pelo turismo convencional. E tu<strong>do</strong> isso reven<strong>do</strong> fatos


históricos liga<strong>do</strong>s a esses lugares que, muitas vezes, vamos<br />

esquecen<strong>do</strong> aos poucos. Boa flanagem para você.<br />

E para terminar, lembre-se: faz parte da vida acumularmos<br />

memórias que vamos coletan<strong>do</strong> ao longo da viajem. Yolanda<br />

Bello escreve as suas lembranças mais <strong>do</strong>ces e felizes de<br />

criança e a<strong>do</strong>lescente em “Peruíbe”. Leia e recorde.<br />

E então, ainda duvida que existe a <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo? Nós<br />

somos as testemunhas que ela existe sim. E está bem aqui, ao<br />

alcance de suas mãos.<br />

Boa leitura e bem-vin<strong>do</strong> ao sonho.<br />

Jorge Braga da Silva<br />

Presidente da Academia Peruibense de Letras<br />

Setembro de 2018


Carolina Ramos<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Carolina Ramos<br />

Santista. Livros publica<strong>do</strong>s- (16) de: Contos,<br />

Poesias, Trovas, Crônicas, Contos natalinos,<br />

Biografias. E vários inéditos. Premiações<br />

no Brasil e Exterior. Presidiu o IHGSantos,<br />

de 2000 a 2008 e é Pres.da UBT/ Seção de<br />

Santos; Pertence: Acad.Santista de Letras;<br />

AFCLAS, Acd..Cristã de Letras/SP e outras.<br />

carolinaramos@gmail.com<br />

Peruíbe<br />

Peruíbe – “Cidade Alegre” – como a classifica, em seus<br />

versos, Maya Alice Ekman, pesquisa<strong>do</strong>ra e divulga<strong>do</strong>ra entusiasta<br />

das belezas e lendas, fartas, por lá.<br />

Chegamos a conhecer pessoalmente Maya Ekman, em<br />

seus derradeiros anos, quan<strong>do</strong>, no livro – Peruíbe – História<br />

de suas Origens, Lendas e Contos, definia a cidade como<br />

sen<strong>do</strong> “ Cidade Turística <strong>do</strong> litoral sul, conhecida pelas belas<br />

praias limpas, não poluídas, ar ozoniza<strong>do</strong>, rios, cachoeiras e<br />

montanhas ainda não exploradas”. E ainda: - “Peruíbe é uma<br />

cidade encantada, que recebe to<strong>do</strong>s os dias a reconstituinte<br />

e reforma<strong>do</strong>ra neblina orgânica, ozonífera, que faz dela um<br />

centro de rejuvenescimento, através <strong>do</strong> ar que respiramos.”<br />

À misteriosa montanha, chamava de “a morada <strong>do</strong>s deuses.”<br />

Entre as lendas que circulam meio às belezas naturais de<br />

Peruíbe, há aquela chamada “Lenda da Pedra”, ou, “O Mistério<br />

da Porta e da Janela”,onde costumam aparecer “seres e<br />

luzes estranhas”.<br />

Contam os indígenas e repetem os historia<strong>do</strong>res, que, naquele<br />

local, havia uma gruta a expelir fogo e fumaça sen<strong>do</strong><br />

que essa gruta fora fechada pelos“deuses” e marcada em sua<br />

porta a figura de uma serpente. A crendice popular acrescenta<br />

que, vez ou outra, circula por ali “uma jovem muito alta (mais<br />

de <strong>do</strong>is metros), de longos cabelos louros, envergan<strong>do</strong>, ora um<br />

macacão pratea<strong>do</strong>, ora uma túnica branca, trazen<strong>do</strong> sempre,<br />

15


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

à altura <strong>do</strong> peito, a figura de uma serpente”. A aparição entra<br />

pelo portal <strong>do</strong> roche<strong>do</strong> e desaparece, enquanto luzes e brilhos<br />

estranhos saem da pedra.<br />

A prevenir surpresas, corre de boca a boca o aviso: - “Quem,<br />

por perto, observe a cena, acaba por não se sentir bem” - o<br />

que, cren<strong>do</strong> ou não, é bom saber, “para que se deixem as<br />

barbas de molho”!<br />

“Castelinho da Prainha” - Este é outro fato que enriquece<br />

o folclore de Peruíbe. É voz corrente que um bruxo reside no<br />

tal “Castelinho da Prainha”, e, que, algumas vezes, tal bruxo<br />

aparece à janela que se abre para o mar. Há até quem jure<br />

tê-lo visto!<br />

“Noiva da Praia” – Aban<strong>do</strong>nada pelo noivo, no dia <strong>do</strong> casamento,<br />

reza a tradição que a triste noiva, vez ou outra, passeia<br />

solitária pela praia deParnapuã e alguns garantem tê-la visto...<br />

e mais de uma vez!<br />

A Lenda <strong>do</strong>s Vagalumes, minuciada por Maynard, e outras<br />

mais, comprovam a fertilidade <strong>do</strong> imaginário peruibense, preserva<strong>do</strong>r<br />

da aura mágica que cerca de misterioso encanto esta<br />

bonita cidade praiana.<br />

16


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Darcio Pasotto<br />

Natural de São Paulo-Capital, nasci<strong>do</strong> no ano de<br />

1952. Residente em Peruíbe há 18 anos. Administra<strong>do</strong>r<br />

Con<strong>do</strong>minial, Representante Comercial, Jornalista,<br />

Escritor e atualmente Editor e Colunista da<br />

Revista “Toy-Mel & Cia – Histórias que os animais<br />

contam”. Publicou o livro “É Primavera no Jardim de<br />

Minha Casa” e participou da Antologia Literária “O<br />

Sonho”. Membro da Academia Peruibense de Letras.<br />

darcio.pasotto@yahoo.com.br<br />

O sonho de uma família paulistana<br />

Eu e minha esposa sempre conversávamos sobre a possibilidade<br />

de mudarmos da Capital para uma cidade menor, com<br />

menos problemas. Numa noite especial, iluminada por Deus<br />

tive um sonho, que terei o prazer de compartilhar com vocês<br />

leitores, pois seria egoísmo guardá-lo só para mim.<br />

Convi<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s a viajarem comigo, pois cada ponto turístico<br />

representa uma estação. Desligue-se de tu<strong>do</strong> e ligue-se<br />

em nossa viagem, dê um minuto para si mesmo.<br />

Sonhei que depois de ter sofri<strong>do</strong> mais de dez assaltos na<br />

Capital Paulista, não iria criar meus <strong>do</strong>is filhos nesta guerra<br />

interminável entre o bem e o mal.<br />

Meu sonho continuou, estávamos na cidade de Peruíbe,<br />

localizada no litoral Sul de São Paulo. Peruíbe significa “no<br />

rio <strong>do</strong>s tubarões”. Imaginem uma cidade, tipo <strong>do</strong> interior,<br />

com 32 quilômetros de belas praias. Uma delas é a praia <strong>do</strong><br />

Costão com sua famosa ducha natural. Ainda temos a Desertinha,<br />

a Tatuíra, a Guarauzinho, da Baleia, <strong>do</strong> Arpoa<strong>do</strong>r, Parnapuã,<br />

Brava, Juquiazinho, Preta, Caramborê e Barra <strong>do</strong> Una,<br />

todas com o menor índice de poluição <strong>do</strong> Litoral Paulista. Peruíbe<br />

também é privilegiada com belas cachoeiras, rios com<br />

águas cristalinas e com a Ilha das Cobras, que possui uma<br />

das maiores populações de víboras conhecidas no mun<strong>do</strong>. Por<br />

17


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

esta razão, está no ranking das ilhas mais perigosas <strong>do</strong> planeta.<br />

Peruíbe inclusive tem o melhor ar que existe no mun<strong>do</strong> e<br />

paisagens encanta<strong>do</strong>ras, e foi para essa cidade que resolvemos<br />

nos mudar.<br />

Já instala<strong>do</strong>s, começamos a desbravar e a conhecer tu<strong>do</strong><br />

que a cidade nos oferecia. Cada dia era uma novidade. Decidimos<br />

conhecer a praia <strong>do</strong> Guaraú, mas antes de chegarmos à<br />

serra que nos leva até essa praia, passamos pela ponte sobre<br />

o Rio Preto, onde avistamos o Portinho com seus barcos colori<strong>do</strong>s<br />

e, logo à esquerda, encontramos o portal da serra <strong>do</strong><br />

Guaraú em forma de “Folha” e adentramos uma estradinha<br />

estreita que serpenteia a Reserva Ecológica da Jureia Itatins,<br />

uma Unidade de Conservação Brasileira de Proteção à Natureza,<br />

com território distribuí<strong>do</strong> pelos municípios de Iguape,<br />

Miracatu, Itariri, Pedro de Tole<strong>do</strong> e Peruíbe, sen<strong>do</strong> uma das<br />

mais importantes áreas de preservação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de São Paulo.<br />

Cercada por jacarandás, ipês, orquídeas e bromélias, e com<br />

pássaros diversos, saíras sete cores, tiés sangues, pica paus,<br />

tucanos, canários da terra e outros. Continuamos a subir, e à<br />

esquerda encontramos a Prainha, alguns metros depois avistamos<br />

o mar, deita<strong>do</strong> sobre tu<strong>do</strong>, lin<strong>do</strong>, maravilhoso...uma paisagem<br />

exuberante que fez nossos olhos ficarem encanta<strong>do</strong>s<br />

com tamanha beleza.<br />

Estava muito calor e para refrescar paramos nas corredeiras<br />

da cachoeira <strong>do</strong> “Perequê”, com águas límpidas e rasas,<br />

onde dava para apreciar inúmeros peixes. E assim fomos conhecen<strong>do</strong><br />

algumas praias e cachoeiras. Como já estava tarde,<br />

voltamos para casa exaustos, mas felizes com as belezas da<br />

natureza.<br />

No dia seguinte, fomos conhecer outros pontos turísticos<br />

como o Sítio Arqueológico <strong>do</strong> Abarebebê, onde se encontram<br />

as ruínas de uma das primeiras igrejas <strong>do</strong> país. Depois subimos<br />

no Mirante; construí<strong>do</strong> no topo <strong>do</strong> Morro <strong>do</strong>s Pra<strong>do</strong>s,<br />

na entrada da cidade, o Panorâmico de Peruíbe permite uma<br />

18


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

visão de 360º da região, abrangen<strong>do</strong> desde os contornos de<br />

Itanhaém até Parnapuã, mais as ilhas de Queimada Grande e<br />

Pequena e as encostas da Serra <strong>do</strong> Mar.<br />

Também conhecemos o Rio Preto, em cujas margens estão<br />

localizadas as jazidas da Lama Negra de Peruíbe que possui<br />

propriedades terapêuticas e dermatológicas.<br />

A cidade conta com uma extensa área Rural onde encontramos<br />

pesqueiros, haras e mais cachoeiras. Queria que meu<br />

sonho não terminasse, pois estava muito bom.<br />

Na hora <strong>do</strong> almoço fomos ao merca<strong>do</strong> de peixes que fica<br />

às margens <strong>do</strong> Portinho comprar algo para comer, local muito<br />

visita<strong>do</strong> por turistas.<br />

Peruíbe também abriga diversas aldeias e etnias indígenas<br />

em seu território. Essas tribos ajudam a contar a história <strong>do</strong><br />

Brasil e de nossa cultura, com seus hábitos e costumes que<br />

foram preserva<strong>do</strong>s durante séculos, de incalculável riqueza.<br />

No meu sonho esta cidade chamada Peruíbe tinha um governo<br />

justo, bom e honesto, as pessoas viviam em harmonia<br />

plena, não havia diferenças, to<strong>do</strong>s conviviam com respeito<br />

mútuo, to<strong>do</strong>s eram um e um eram to<strong>do</strong>s, uma única família.<br />

Os profissionais da cidade foram transforma<strong>do</strong>s em construtores<br />

de lares. O objetivo era somente ver pessoas felizes e<br />

sorrin<strong>do</strong>.<br />

O respeito e o amor era a matéria mais estudada na sociedade.<br />

Respeito entre mari<strong>do</strong> e mulher, pais e filhos, parentes,<br />

amigos, vizinhos, enfim, to<strong>do</strong>s sabiam onde começavam<br />

seus direitos e deveres. Neste governo as <strong>do</strong>enças não mais<br />

existiam, as lágrimas de tristeza foram enxugadas. Não havia<br />

morte, <strong>do</strong>r, nem pranto, as coisas anteriores já haviam passa<strong>do</strong>.<br />

Nesta cidade não havia criminalidade, era uma maravilha.<br />

O dinheiro que é a raiz de to<strong>do</strong>s os males foi extinto e,<br />

com ele, aqueles que não mediam esforços para alcançá-lo. A<br />

única moeda existente era chamada AMOR, amor ao próximo.<br />

Dentro deste governo, acabaram-se todas as carências, e<br />

19


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

o amor recíproco era aplica<strong>do</strong>. Também não existiam animais<br />

aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>s nas ruas, eles eram trata<strong>do</strong>s com respeito e dignidade.<br />

Na cidade existia uma Lei rígida para quem aban<strong>do</strong>nasse<br />

ou maltratasse os bichos, a multa era alta e dava cadeia<br />

mesmo. Havia várias placas alertan<strong>do</strong> sobre a “Proibição <strong>do</strong><br />

aban<strong>do</strong>no de animais”.<br />

Uma parte importante <strong>do</strong> meu sonho foi quan<strong>do</strong> fui convida<strong>do</strong><br />

a participar da Academia Peruibense de Letras, fato que<br />

me deixou muito lisonjea<strong>do</strong>.<br />

Outra, foi quan<strong>do</strong> a<strong>do</strong>tamos o Tigrão, um gato lin<strong>do</strong> e <strong>do</strong>is<br />

cachorros o Toy e a Mel, extremamente amorosos.<br />

Atualmente sou editor da revista Pet de nome “Toy-Mel &<br />

Cia - Histórias que os animais contam”.<br />

Estava me esquecen<strong>do</strong>, visitamos também a cachoeira Paraíso,<br />

que é um lugar maravilhoso, que nos faz imaginar como<br />

será o verdadeiro paraíso aqui na Terra, onde poderemos viver<br />

em paz e harmonia.<br />

Não poderia deixar de citar que pesquisa<strong>do</strong>res encontraram<br />

uma espécie de flor rara que só existe em Peruíbe, batizada<br />

com o nome de <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo.<br />

Que belo sonho que tive! Sim, foi formidável e espero que<br />

to<strong>do</strong>s também tenham um sonho como o meu.<br />

Espera aí! Eu acordei ou estou <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong>? Não sei se tu<strong>do</strong><br />

aqui relata<strong>do</strong> foi real ou só um sonho. Outra vez, quan<strong>do</strong> eu<br />

estiver restabeleci<strong>do</strong> saberei o que realmente aconteceu....<br />

Quem parou de sonhar é porque já perdeu a ilusão e, desta<br />

feita, não percebeu, também parou de viver.<br />

“Nunca mate o sonho de uma pessoa, só porque você não<br />

consegue <strong>do</strong>rmir.”<br />

Estou acorda<strong>do</strong> para o futuro,<br />

Sonho o sonho da humanidade,<br />

Penso e tenho a confiança,<br />

Que um dia teremos o amor de verdade.<br />

20


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Sonhar é lin<strong>do</strong>,<br />

Quan<strong>do</strong> vem <strong>do</strong> coração,<br />

Ficamos inebria<strong>do</strong>s por dentro,<br />

Viven<strong>do</strong> só de ilusão.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Ecilla Bezerra<br />

Nasceu em São Paulo. É formada em teatro,<br />

língua inglesa, gerontologia. Autora <strong>do</strong>s livros<br />

Impie<strong>do</strong>so Vento Triste, O Chá da Meia-Noite e<br />

Memórias de Alice e de várias peças de teatro.<br />

Acadêmica funda<strong>do</strong>ra da Academia Peruibense<br />

de Letras, ocupa a cadeira nº. 36, cujo Patrono<br />

é o escritor local Oswal<strong>do</strong> Herrera. É, também,<br />

acadêmica correspondente da Academia Itanhaense<br />

de Letras.<br />

ecillabezerra@gmail.com<br />

Natureza e ser humano<br />

Domingo preguiçoso, muito quente, na praia de Peruíbe.<br />

Eu caminhava na beira da água. Manhã de verão. Turistas<br />

alegres coloriam a areia. Lá <strong>do</strong> jardim vinha o som da<br />

música, que era diferente em cada barraca e misturava-se aos<br />

gritos das crianças e <strong>do</strong>s joga<strong>do</strong>res de frescobol. O mar de<br />

Peruíbe nunca é azul por causa da areia monazítica e da lama<br />

negra e brincava de ton sur ton com o céu azul sem nuvens.<br />

As ondas vinham vagarosas e formavam um barra<strong>do</strong> de renda<br />

branca que se renovava a cada instante sobre a areia. Meus<br />

olhos passeavam pela paisagem. A Jureia, majestosa e verde<br />

ao fun<strong>do</strong>. As duas ilhas, Queimada Grande e Queimada Pequena,<br />

cercadas pelo oceano à esquerda. À direita, o jardim<br />

colma<strong>do</strong> de palmeiras e coqueiros. À minha frente um casal<br />

i<strong>do</strong>so andava de mãos dadas chutan<strong>do</strong> a água. Uma família<br />

havia construí<strong>do</strong> um castelo de areia enorme que chamava a<br />

atenção <strong>do</strong>s que passavam. Ambulantes vendiam sorvetes,<br />

óculos de sol, redes, saídas de praia, milho verde, algodão<br />

<strong>do</strong>ce, pipas...<br />

De repente, um grupo de crianças e a<strong>do</strong>lescentes surgiu<br />

não sei de onde. Como formigas que avançam sobre um<br />

bolo de açúcar, confiscavam celulares, relógios, dinheiro...<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Tu<strong>do</strong> tão rápi<strong>do</strong> que, num piscar de olhos, a turba ensandecida<br />

ia longe, emudecen<strong>do</strong> a manhã <strong>do</strong>mingueira de verão.<br />

As pessoas foram recolhen<strong>do</strong> seus filhos e suas barracas<br />

e saíram em direção aos seus carros. Um véu de tristeza<br />

cobriu a praia. Uma bruma branca escondeu a Jureia. Uma<br />

nuvem negra encobriu o sol. O vento colaborou sopran<strong>do</strong> forte,<br />

fazen<strong>do</strong> crescer as ondas <strong>do</strong> mar, que se tornaram violentas.<br />

As palmeiras, <strong>do</strong>bradas quase até o chão, pareciam pedir<br />

perdão pelo ocorri<strong>do</strong>. To<strong>do</strong>s corremos em busca de abrigo,<br />

quan<strong>do</strong> os relâmpagos chegaram, acompanha<strong>do</strong>s de raios e<br />

trovões.<br />

Eu tive me<strong>do</strong>. A natureza tornou-se violenta, como se<br />

quisesse castigar a to<strong>do</strong>s – seres humanos – por não respeitarem<br />

a beleza e a paz que ela nos oferece.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes - O Abarebebê<br />

Quem foi o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes<br />

O Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes nasceu em São Vicente da Beira,<br />

Diocese da Guarda, em Portugal, em 21 de setembro de 1509,<br />

filho de Simão Álvares Guimarães e Izabel Fernandes Guimarães.<br />

Entrou para a Cia. De Jesus, em Coimbra, em 06 de<br />

fevereiro de 1546, aos 37 anos.<br />

Por que o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes veio ao Brasil<br />

Veio para as terras brasileiras lançar as primeiras sementes <strong>do</strong><br />

cristianismo entre os gentios. Na época, eram muitas as notícias<br />

que chegavam até o Rei, D. João III, sobre o fracasso da<br />

implantação das capitanias hereditárias e sobre os saltea<strong>do</strong>res,<br />

que percorriam a Costa Brasileira para roubar gentios. Aproveitan<strong>do</strong>-se<br />

da ingenuidade <strong>do</strong>s índios, eles os atraíam para os<br />

navios e os aprisionavam, para vendê-los em outros lugares.<br />

Por esse motivo, as tribos começaram a se rebelar e a declarar<br />

guerra contra as capitanias.<br />

Como era o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes<br />

O primeiro Apóstolo de São Vicente, como ficou conheci<strong>do</strong>,<br />

não tem uma bibliografia pois os “Anais da Cia. De Jesus”,<br />

escritos por Canarino, se perderam.<br />

Era partidário de que to<strong>do</strong>s deveriam esmolar, para cumprir<br />

sua missão de humildade e sacrifício. Certa vez, saiu às ruas<br />

de sua cidade tão roto, a pedir esmolas, que os seus familiares<br />

se escondiam de vergonha de o encontrarem.<br />

Ele foi, também, cantor e músico.<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Os caminhos <strong>do</strong> Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes<br />

Logo após o desembarque, os padres iniciaram sua missão de<br />

evangelizar, catequizar e arregimentar o rebanho que estava<br />

aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong> e perdi<strong>do</strong> nesta terra desconhecida. Após passar<br />

um longo perío<strong>do</strong> em Ilhéus resolven<strong>do</strong> questões indígenas,<br />

Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes rumou para o Sul.<br />

Rumo ao Sul<br />

Incansável, o Padre conseguiu arregimentar muitos meninos<br />

para o Colégio, filhos de índios, mamelucos e filhos de colonos<br />

portugueses e, mais tarde, os órfãos trazi<strong>do</strong>s da Bahia<br />

pelo Padre Manoel da Nóbrega. Os meninos aprendiam a ler<br />

e escrever, cantar e tocar flauta.<br />

Assim que pôde, Padre Leonar<strong>do</strong> embrenhou-se pelo sertão.<br />

Seu companheiro de viagem foi Manoel Chaves, pois era perito<br />

em línguas e precisava servir de intérprete para que o Padre<br />

pudesse comunicar-se com os índios.<br />

Nesse perío<strong>do</strong>, sem referências diretas, consta que o Padre<br />

Leonar<strong>do</strong> Nunes esteve no campo, a 14 ou 15 léguas de São<br />

Vicente, onde cristãos muito difíceis de lidar viviam com índios.<br />

Tu<strong>do</strong> leva a crer que esse campo seria Santo André.<br />

Avançan<strong>do</strong> mais cinco léguas, chegou à Aldeia de Tibiriçá,<br />

onde fez grande amizade e prometeu regressar. Conta-se que<br />

nessa segunda viagem, durante missa rezada por Leonar<strong>do</strong><br />

Nunes, João Ramalho, excomunga<strong>do</strong> por estar amanceba<strong>do</strong><br />

com a índia Bartira, filha <strong>do</strong> Cacique Tibiriçá, e que teimava<br />

em não se casar, foi impedi<strong>do</strong> de entrar na igreja. Ira<strong>do</strong>, João<br />

Ramalho saiu, acompanha<strong>do</strong> de seus <strong>do</strong>is filhos mamelucos,<br />

25


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

esperan<strong>do</strong> pelo Padre, a quem ameaçou surrar com porretes.<br />

O Padre postou-se de joelhos perante os três, pedin<strong>do</strong> que lhe<br />

batessem, desarman<strong>do</strong>-os de suas intenções.<br />

Além disso, João Ramalho aprisionava e vendia índios. Pêro<br />

Corrêa era um <strong>do</strong>s maiores compra<strong>do</strong>res de escravos de João<br />

Ramalho, que também contava com a complacência de Martim<br />

Afonso de Souza. Foi, portanto, muito difícil conquistar<br />

a simpatia de João Ramalho, mas o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes<br />

conseguiu.<br />

As Ruínas <strong>do</strong> Abarebebê em Peruíbe<br />

A primeira notícia de Peruíbe data da chegada de Padre Leonar<strong>do</strong><br />

Nunes para iniciar a catequese indígena, reunin<strong>do</strong> silvícolas<br />

num reduto civiliza<strong>do</strong>, aos pés da Serra de Itatins.<br />

As Ruínas <strong>do</strong> Abarebebê, em Peruíbe, são o maior testemunho<br />

da obra de Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes: ali ele celebrou missa,<br />

<strong>do</strong>utrinou indígenas e morou, ao la<strong>do</strong> de solda<strong>do</strong>s.<br />

Quan<strong>do</strong> aqui chegou, Leonar<strong>do</strong> Nunes encontrou uma igrejinha,<br />

cuja nave tinha o tamanho de oito por quinze passos. Na<br />

frente, uma varanda permitia aos jesuítas anteciparem qualquer<br />

ataque. Voltada para o norte, a cerca de um quilômetro<br />

<strong>do</strong> litoral, quan<strong>do</strong> avistada <strong>do</strong> oceano, a construção dava<br />

a ideia de uma fortificação ou muralha, mas nunca de uma<br />

igreja. Ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> altar havia um aposento amplo, onde os<br />

jesuítas <strong>do</strong>rmiam junto à “soldadesca”, que protegia o local.<br />

A construção apresentava alguns aspectos interessantes: a forma<br />

de seteiras dada às janelas, permitin<strong>do</strong> a entrada de ar e<br />

a claridade, mas capaz de impedir a entrada de intrusos, por<br />

menores que fossem. Tinha, ainda, pequenos furos quadra<strong>do</strong>s<br />

26


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

nas paredes, próprios para dar passagem às “besteiras” – armas<br />

da época.<br />

Outro aspecto inespera<strong>do</strong>: a igreja foi edificada com material<br />

que hoje seria considera<strong>do</strong> muito singular – cascalho de ostras,<br />

óleo de tubarão e de baleia e pedra. Uma combinação<br />

que resultou tão resistente que até hoje, quatro séculos depois,<br />

lá ainda permanecem algumas partes das grossas muralhas,<br />

sobre as quais avançaram as ervas e gravatás.<br />

Do centro de Peruíbe até as Ruínas, percorre-se uma distância<br />

de oito quilômetros, rumo a Itanhaém. Da praia até lá, passa-<br />

-se por estrada cheia de cajueiros, bananeiras e pés de abricó,<br />

até a pequena ladeira que conduz aos paredões.<br />

Em Peruíbe, Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes não permaneceu muito<br />

tempo. Enquanto lá esteve, orientan<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s, ausentou-se<br />

para cumprir missão no Rio da Prata.<br />

Segun<strong>do</strong> os historia<strong>do</strong>res, a história de Peruíbe está ligada à<br />

Capitania de São Vicente. A cidade teria surgi<strong>do</strong> na Praia de<br />

Tapirema, receben<strong>do</strong> o nome de Aldeamento São João Batista<br />

ou São João D’Aldeia.<br />

Como o Padre tinha a capacidade de ir a vários lugares em<br />

tempo recorde, ganhou o apeli<strong>do</strong> de Abarebebê, que, em tupi-<br />

-guarani significa PADRE VOADOR.<br />

O fim<br />

Nóbrega decidiu enviar o Padre Leonar<strong>do</strong> Nunes a Portugal<br />

e a Roma, a fim de explicar ao Rei o esta<strong>do</strong> da catequese no<br />

Brasil e as dificuldades enfrentadas.<br />

27


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

A 30 de junho uma tempestade fortíssima engoliu o navio.<br />

Alguns sobreviventes testemunharam seus derradeiros instantes,<br />

permanecen<strong>do</strong> ao pé <strong>do</strong> mastro, numa das mãos seguran<strong>do</strong><br />

o crucifixo e, com a outra, abençoan<strong>do</strong> os que morriam.<br />

28


Edwal<strong>do</strong> Camargo Rodrigues<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Edwal<strong>do</strong> Camargo Rodrigues<br />

Natural da capital de São Paulo, bacharelou-se em Filosofia<br />

pela Universidade de São Paulo. Realizan<strong>do</strong> uma<br />

antiga aspiração, mu<strong>do</strong>u-se para Peruíbe na década de<br />

1980. Vincula<strong>do</strong> ao ensino, graduou-se em Educação pela<br />

Universidade Católica de Santos. Poeta e prosa<strong>do</strong>r, por reverência<br />

aos clássicos, base de sua formação intelectual,<br />

seus trabalhos remetem a formas tradicionais de expressão<br />

literária, quer no discurso narrativo ou pela escolha da versificação<br />

escandida. É membro cofunda<strong>do</strong>r da Academia<br />

Peruibense de Letras.<br />

thales.ecr@hotmail.com<br />

Com perdão <strong>do</strong>s historia<strong>do</strong>res<br />

(Pelo aniversário da cidade de Peruíbe)<br />

A história regional soa confusa.<br />

Antes <strong>do</strong> Norte, afirmam que estas bandas<br />

bordejaram primeiro as velas pandas<br />

das naus trazidas pela gente lusa.<br />

Verdade ou não, também não se recusa<br />

a versão <strong>do</strong> jesuíta e as venerandas<br />

estrofes rabiscadas em guirlandas<br />

sobre a areia da praia. Pouco se usa<br />

contestar o teimoso: isso é carinho,<br />

orgulho desta terra, e é só o passa<strong>do</strong><br />

afinal, o presente é que tem graça.<br />

Pois foi agora que encontrei meu ninho,<br />

como velho navio mal fundea<strong>do</strong><br />

vin<strong>do</strong> aqui recostar minha carcaça.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Ensino ao ar livre: Estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> meio<br />

- Veja que panorama lin<strong>do</strong> esse, você não concorda? –<br />

E abrangeu com um gesto amplo da mão a paisagem marinha,<br />

que se estendia até perder-se de vista, muito longe, confundida<br />

pela névoa. – Já pensou então como devia ser naquele tempo,<br />

poucas décadas após o Descobrimento? Basta só imaginar,<br />

garoto... Até então, tu<strong>do</strong> por aqui era desconheci<strong>do</strong> e intoca<strong>do</strong>,<br />

natureza pura, algo que devia parecer com um paraíso remoto,<br />

faltan<strong>do</strong> apenas o Adão e a Eva: somente uns poucos nativos<br />

povoavam toda esta extensa região. Aos quais os coloniza<strong>do</strong>res<br />

portugueses logo chamaram pagãos, ou seja, segun<strong>do</strong> a visão<br />

preponderante naquela época, tratava-se de um ban<strong>do</strong> de<br />

infelizes que desconheciam a religião cristã professada pelo<br />

europeu. E por causa dessa condição, conforme acreditavam<br />

os coloniza<strong>do</strong>res, todas aquelas pobres almas, homens, mulheres,<br />

crianças, estariam, com certeza, condenadas à danação<br />

<strong>do</strong> fogo eterno, caso não fossem logo catequizadas.<br />

- Que coisa horrível, não, professor Padilha! – respondeu<br />

o moço distraidamente, pois apenas prestava atenção na<br />

tela <strong>do</strong> celular, da qual não desviava os olhos nem por um<br />

segun<strong>do</strong>.<br />

- E – acrescentou o mestre – por considerarem missão<br />

sagrada intervir junto a Deus em favor da salvação desses inocentes<br />

que por aqui viviam em selvagem ignorância, e a fim de<br />

livrá-los de tão tenebroso destino, chegaram por aqui os inacianos,<br />

com o propósito de <strong>do</strong>utrinar os ímpios infelizes sobre<br />

a única crença redentora que lhes pudesse finalmente garantir<br />

a imortalidade da alma. Começaram difundin<strong>do</strong>-a através da<br />

educação, incutin<strong>do</strong>-lhes com essa estratégia, gradativamente,<br />

princípios e valores que provinham daquilo que acreditavam<br />

ser a verdadeira fé. Hoje em dia, somos obriga<strong>do</strong>s a admitir:<br />

aqueles bravos religiosos, sem nem sequer terem um teto<br />

sobre suas cabeças, muito menos escolas montadas ou uma<br />

30


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

lousa, mísera que fosse, em que rabiscar lições; nenhum papel<br />

ou livros que pudessem usar, a não levar em conta a despojada<br />

bíblia, foram, entretanto, os primeiros mestres desta nação, e a<br />

respeito disso, não resta qualquer dúvida...<br />

E apontan<strong>do</strong> mais além, prosseguiu:<br />

- Diz a lenda que o padre Anchieta descansou naquele<br />

lugar logo ali. Está ven<strong>do</strong> a rocha em formato horizontal?<br />

Trata-se agora de um sítio histórico, meu caro! É de arrepiar,<br />

quan<strong>do</strong> a gente pensa que foi exatamente lá, sem tirar nem pôr,<br />

que o heroico jesuíta reclinou a cabeça sobre a pedra, que nem<br />

fosse um travesseiro de plumas, até enfim a<strong>do</strong>rmecer, completamente<br />

entregue à exaustão. Já imaginou o esta<strong>do</strong> emocional<br />

<strong>do</strong> coita<strong>do</strong>, depois de ter si<strong>do</strong> persegui<strong>do</strong> ao longo de um<br />

interminável percurso por ferozes tupinambás, come<strong>do</strong>res de<br />

carne humana? Pena que agora não está dan<strong>do</strong> para enxergar<br />

direito, por causa da maré que hoje está muito alta, além de o<br />

dia continuar nubla<strong>do</strong>. Mas foi ali mesmo onde o missionário,<br />

então ainda muito jovem, ficou bem escondidinho, arquejante,<br />

quase sem fôlego. Embora, com toda a razão, devesse estar<br />

apavora<strong>do</strong> – afinal era um ser humano, carne e osso como nós<br />

– que indivíduo corajoso terá si<strong>do</strong> aquele! Que têmpera, que<br />

resistência, temos de reconhecer! Tanto que, mesmo depois de<br />

ter passa<strong>do</strong> por tu<strong>do</strong> isso, nem pensou em desistir: continuou<br />

com afinco em suas sacrificadas obrigações de evangeliza<strong>do</strong>r,<br />

converten<strong>do</strong> os gentios à palavra <strong>do</strong> cristianismo.<br />

Neste meio tempo, o discípulo persistia em ocupar-se<br />

com matérias mais atuais, a batucar com rapidez os polegares<br />

contra o smartphone, minúsculos alto-falantes encrava<strong>do</strong>s<br />

nos orifícios de ambas as orelhas. Parecia desse mo<strong>do</strong> não ter<br />

escuta<strong>do</strong> uma única palavra <strong>do</strong> que lhe fora dito até então, de<br />

mo<strong>do</strong> que o homem acabou por irritar-se e repreendeu:<br />

- Ó, Frederico! Não pode largar nem por um instante<br />

que seja dessa geringonça? Olhe que isto aqui é atividade<br />

de recuperação. Suas notas estão péssimas, caramba! Quer ou<br />

31


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

não ser promovi<strong>do</strong>? Lembre-se de que o fim <strong>do</strong> ano já está<br />

chegan<strong>do</strong>, e rapidinho. Desse jeito, posso até ouvir por antecipação<br />

o barulho da bomba que você vai tomar.<br />

Mas o moleque não se intimi<strong>do</strong>u de to<strong>do</strong> com a bronca.<br />

Apenas levemente desenxabi<strong>do</strong>, por temer talvez a possibilidade<br />

de mais outra repetência, procurou com desajeita<strong>do</strong><br />

acato justificar-se: que estava, sim, prestan<strong>do</strong>, atenção às explicações,<br />

por sinal muito interessantes. E para comprová-lo,<br />

buscou no fun<strong>do</strong> da memória uma menção qualquer que ao<br />

longo da discurseira <strong>do</strong>cente lhe tivesse, por mero descui<strong>do</strong>,<br />

penetra<strong>do</strong> a cachimônia, fican<strong>do</strong> nela retida, mesmo que vagamente.<br />

E... Eureca! Veio-lhe em socorro, bem a calhar, a tal<br />

da pedra sobre a qual o sujeito havia-se deita<strong>do</strong>. Quem sabe,<br />

acompanha<strong>do</strong> de uma índia, suspeitou a imaginação criativa.<br />

- Mas, afinal – interpelou, entusiasma<strong>do</strong> com a solução<br />

inteligente que achava haver encontra<strong>do</strong> para aquele embaraço<br />

–, o tal de Anchieta foi até ali na pedra pra descansar<br />

<strong>do</strong> quê, p’sor? Por que ele se meteu nessa fria, pode alguém<br />

me dizer? – quis saber o estudante. – Ao que me consta, esses<br />

caras sempre foram uns tremen<strong>do</strong>s de uns folga<strong>do</strong>s.<br />

E prosseguiu, dan<strong>do</strong>-se conta de que, por algum mistério,<br />

uma coisa, assim que lembrada, puxava por outra: – Fugir<br />

<strong>do</strong>s canibais, grande tragédia! Queria ter a vida que os<br />

dana<strong>do</strong>s desses padrecos levam. Nunca que precisam trabalhar:<br />

comida de graça, <strong>do</strong> bom e <strong>do</strong> melhor, tu<strong>do</strong> servi<strong>do</strong> na<br />

hora certa. Até vinho de primeira, o tal <strong>do</strong> sangue de Cristo.<br />

Quan<strong>do</strong> está to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> de olho no altar, os caras disfarçam,<br />

fingem que bebem só um golinho, beiço estica<strong>do</strong> como se tivessem<br />

nojo. Mas, acabou a missa, botam o garrafão ali na<br />

mesa, ó, dá pra encharcar a goela até dizer chega. E quan<strong>do</strong><br />

é caso de afastar a solidão, pimba! É maneiro! A gente aqui,<br />

que é pobre, fica só nos cinco contra um. Mas os maganões,<br />

é claro que não: sempre podem contar com a generosidade de<br />

algumas freirinhas gostosas, ou mesmo das <strong>do</strong>nas boazudas<br />

32


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

que só dão as caras no confessionário pra falar de sacanagens<br />

que elas bem gostariam de fazer, “mas os brochas <strong>do</strong>s mari<strong>do</strong>s<br />

não conseguem mais dar conta”, sabe como é. Isso sem falar<br />

naquele negócio de batina ou sotaina, ou sabe lá como se deve<br />

chamar o saiote que os negos costumam usar. Goza<strong>do</strong> que eu<br />

escutei essas duas palavras uma vez só, na aula de História e,<br />

não sei por que diacho, me amarrei nelas. Quem sabe é porque<br />

faz lembrar nome de madame: “Pois não, <strong>do</strong>na Batina!<br />

Às ordens, senhorita Sotaina!” Não soa bonito? Ah, deixa pra<br />

lá – desprezou com um gesto, mas logo continuou:<br />

- A esse respeito, tenho de dar o braço a torcer: sortu<strong>do</strong>s<br />

deles...<br />

- Deles quem? – interpôs o Padilha, algo ator<strong>do</strong>a<strong>do</strong><br />

com o chorrilho de disparates que acabara de ouvir.<br />

- Os padrecos, ora essa! Quem mais?– veio a explicação<br />

bonachona. – É deles que nós estamos falan<strong>do</strong>, não?<br />

Maior moleza, que não precisam nem vestir cueca por baixo,<br />

especialmente quan<strong>do</strong> faz um calorão como este que nestes<br />

últimos dias anda fazen<strong>do</strong>, por exemplo. Melhor ainda:<br />

imagino que os folga<strong>do</strong>s se livram <strong>do</strong> incômo<strong>do</strong> de lavar os<br />

próprios trapos íntimos, quan<strong>do</strong> acabam fe<strong>do</strong>rentos... Já imaginou?<br />

Não é como acontece com a gente, tu<strong>do</strong> aperta<strong>do</strong> lá<br />

embaixo, suan<strong>do</strong> depois de um dia inteiro de trabalho duro.<br />

Ao contrário: o troço deles fica solto numa boa, ventiladão, ao<br />

deusdará. E quem passa, nem repara ou se escandaliza, pois<br />

não dá pra enxergar nada, fica tu<strong>do</strong> bem escondidinho! – E,<br />

empolga<strong>do</strong> com o rumo das próprias tolices, o rapaz emen<strong>do</strong>u:<br />

- Tem até aquela velha ane<strong>do</strong>ta da batina de metal. Por<br />

acaso já disseram ela pro senhor?<br />

- Não, não conheço, não. Vá lá, não se acanhe, não<br />

faça cerimônia – incentivou o condescendente professor. –<br />

Está na cara mesmo que está <strong>do</strong>idinho pra contar. Também<br />

gosto de rir de vez em quan<strong>do</strong>. Além <strong>do</strong> mais, depois de ouvir<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

tantas bobagens como essas que você acaba de despejar nos<br />

meus ouvi<strong>do</strong>s, como se estes fossem um penico, não me custa<br />

muito escutar mais uma das suas, meu amigo.<br />

Dada a deixa, o outro não se fez esperar:<br />

- Pois diz que, muito antigamente – se dá pra acreditar<br />

no que contou a <strong>do</strong>na Melica, a velhinha que ensina Sociologia,<br />

o senhor conhece –, quan<strong>do</strong> estourava uma guerra,<br />

os padres agiam diferente naquela época. Não era como hoje<br />

em dia, não senhor, que os safa<strong>do</strong>s se escondem na sacristia,<br />

amedronta<strong>do</strong>s como ratos. Nada disso, eles eram valentes pra<br />

chuchu: acompanhavam os solda<strong>do</strong>s nas batalhas, que era pra<br />

dar apoio moral e religioso, qualquer coisa assim, não entendi<br />

bem qual o baba<strong>do</strong> <strong>do</strong>s malucos. Pode até ser que acontecia<br />

mesmo desse jeito que ela falou, quem vai saber? Pois ninguém<br />

sobreviveu desde aquele tempo até hoje pra testemunhar,<br />

não é mesmo? O cazzo é que aquela gente toda não passava<br />

de um ban<strong>do</strong> de <strong>do</strong>idões, só tinha que ser; nem duvi<strong>do</strong><br />

que cheiravam uma carreirinha de vez em quan<strong>do</strong>, sei lá. Mas,<br />

quan<strong>do</strong> isso acontecia, isto é, quan<strong>do</strong> iam pra batalha, a coisa<br />

era séria, mas nunca que podiam usar batina que fosse feita<br />

de ferro, bronze ou latão, sabe como é que é?, feita <strong>do</strong> mesmo<br />

material de que eram moldadas aquelas armaduras <strong>do</strong>s cavaleiros<br />

medievais. E sabe por quê?<br />

- Não, não sei por quê. Diga lá de uma vez.<br />

- Porque senão, cada vez que algum padreco vesti<strong>do</strong><br />

dessa maneira passasse junto de uma <strong>do</strong>na boa, toda a gente<br />

por perto ia escutar um monte de badaladas, parecen<strong>do</strong> repique<br />

<strong>do</strong> sino da matriz na época <strong>do</strong> Natal! – E, dito isso, o<br />

debocha<strong>do</strong> caiu na gargalhada.<br />

Entretanto, perceben<strong>do</strong> que o mestre não o acompanhava<br />

na hilaridade e que, pelo contrário, o fitasse de cima<br />

com ar reprovativo, questionou, a enxugar as lágrimas:<br />

- Que foi, p’sor Padilha? Calma lá, não é possível!<br />

Será que não sacou o espírito da coisa, caramba? – E o aluno<br />

34


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

põe-se a explicar com didatismo: – Fácil, veja só: o padre,<br />

vesti<strong>do</strong> como um sino, vem vin<strong>do</strong> e... bem ali, a cocotinha<br />

vem chegan<strong>do</strong>, toda, toda, logo ao alcance da mão, se esfregan<strong>do</strong><br />

muito de perto, tá saben<strong>do</strong>?, aquela lomba avantajada<br />

e tu<strong>do</strong> mais, passa por ele raspan<strong>do</strong>... Desse jeito, o badalo <strong>do</strong><br />

malandro não resiste mesmo, endurece e bate que nem <strong>do</strong>i<strong>do</strong><br />

no que está pela frente, que por acaso é a batina, que é de metal,<br />

e que faz um barulhão <strong>do</strong>s diabos que acaba despertan<strong>do</strong><br />

a vizinhança toda. Poxa, não é uma boa, não é uma verdadeira<br />

loucura de piada? Um gênio, quem bolou essa! Ah, ah, ah...<br />

- He, he, he... – arreme<strong>do</strong>u o outro com má vontade.<br />

– Quer saber, Fred? Achei a ane<strong>do</strong>ta de muito mau gosto. Se<br />

ao menos fosse inteligente... Que apelação forçada e idiota!<br />

Onde já se viu: batina feita de metal? Tenha dó! Uma porcaria<br />

grosseira, típica de gentinha de baixa categoria, sem educação.<br />

Devia sentir vergonha de ficar repetin<strong>do</strong> esse lixo por aí.<br />

Vão pensar que você é retarda<strong>do</strong>.<br />

- A professora Rita buzinou a mesma coisa, igualzinho<br />

– fungou um tanto despeita<strong>do</strong> o comediante. – Vocês é que<br />

não têm nenhum senso de humor. Deu a maior cagada: ela<br />

queria chamar meus pais na marra, só por causa da brincadeira.<br />

Tive de cabular umas duas semanas até bruaca esquecer<br />

o caso, senão o bicho lá em casa ia pegar. Mas no fim foi até<br />

bom, a aula dela enche o saco mesmo.<br />

- Também é muita cara de pau sua dizer essas poucas-<br />

-vergonhas a uma pessoa de idade, que poderia ser sua avó.<br />

Ela devia ter exigi<strong>do</strong> que o expulsassem da escola.<br />

- Pois eu tinha conta<strong>do</strong> a mesma sacanagem antes pra<br />

minha avó, e ela riu muito. Quase que a velhinha deixa cair a<br />

dentadura.<br />

- O problema é de família, mesmo; não tem jeito –<br />

conformou-se o educa<strong>do</strong>r. Mas exortou: – Vamos lá, direto<br />

ao que realmente interessa, rapaz. E depressinha, só para encerrar<br />

o dia, que está começan<strong>do</strong> a chover. De acor<strong>do</strong> com o<br />

35


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

capítulo da apostila que pedi que estudasse para a atividade de<br />

hoje, duas questões. Primeira: Além de Anchieta, que outros<br />

jesuítas tiveram desempenho destaca<strong>do</strong> na catequese <strong>do</strong>s índios<br />

que habitavam esta parte <strong>do</strong> litoral? Segunda: Onde e em<br />

que circunstâncias foi escrito o Poema à Virgem, e quem foi<br />

seu autor?<br />

- Se eu acertar, vale 10, p’sor?<br />

- Combina<strong>do</strong>, garoto. – Ouviu-se a resposta benevolente.<br />

- Deixa ver... – E o sabatina<strong>do</strong> espreme os olhos, num<br />

suspense de concentração. – Um foi o tal de Manuel da Nóbrega<br />

– tentou. – Já o outro se chamava, parece, “Leopar<strong>do</strong>”<br />

Nunes...<br />

- Leonar<strong>do</strong> – corrigiu o examina<strong>do</strong>r, abrin<strong>do</strong> o guarda-<br />

-chuva e consultan<strong>do</strong> o relógio com impaciência.<br />

- Agora... O “Poema da Virgínia”...<br />

- Poema à Virgem, Frederico. Poema à Virgem, pelo<br />

amor de Deus! – explodiu impaciente o homem.<br />

- É isso aí, é isso aí. Calminha, prófi, que eu chego lá.<br />

Um momentinho... – pediu, comprimin<strong>do</strong> as mãos contra as<br />

orelhas, como se um intenso esforço mental o exaurisse de<br />

vez – ... e o poeta é aquele mesmo que o senhor não parou de<br />

falar, desde quan<strong>do</strong> a gente chegou aqui esta tarde: o carinha<br />

é o Anchieta. Certo?<br />

Sem conseguir disfarçar a surpresa, o Padilha teve de<br />

anuir, oscilan<strong>do</strong> o queixo, a boca entreaberta numa ponta de<br />

admiração. Porém, exigente, quis saber ainda de que mo<strong>do</strong><br />

especial o texto havia si<strong>do</strong> escrito.<br />

- Ora bolas, na areia, é claro – O moço não se faz roga<strong>do</strong>.<br />

- E onde?<br />

- Onde! Essa é boa! Lá, em Peruíbe, onde agente mora.<br />

Qualquer um sabe disso – desdenhou o interroga<strong>do</strong> com arrogância.<br />

36


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

- Peguei você, malandro! Diz a tradição que Anchieta<br />

teria escrito seu poema com uma varinha, sulcan<strong>do</strong> a areia da<br />

praia, é verdade; porém isso aconteceu em Iperoig, que fica<br />

em Ubatuba, muito longe, a norte daqui. Confusão que, de<br />

resto, até muita gente boa costuma fazer, por causa da semelhança<br />

entre os nomes, que são topônimos da língua tupi. Por<br />

isso, está per<strong>do</strong>a<strong>do</strong> – condescendeu o Padilha.<br />

- Não! Quer dizer que é “rap dez”?<br />

Seguran<strong>do</strong> como pôde a haste <strong>do</strong> guarda-chuva entre o<br />

ombro e o pescoço de mo<strong>do</strong> a permitir que as mãos ficassem<br />

livres, o educa<strong>do</strong>r transcreveu a nota na caderneta escolar. E<br />

confirmou:<br />

- Sim, Fred. Fez por merecer.<br />

O jovem, já to<strong>do</strong> ensopa<strong>do</strong>, indiferente à chuva que a<br />

esta altura engrossara bastante, dava pinotes e chicoteava o ar<br />

com os punhos fecha<strong>do</strong>s, em plena euforia.<br />

- Eu passei de ano! – repetia aos berros.<br />

Foi quan<strong>do</strong>, em meio a to<strong>do</strong> esse frenesi, os fones se<br />

lhe despegaram das orelhas, cain<strong>do</strong>-lhe sobre o peito, colan<strong>do</strong>-se<br />

à camiseta molhada. Das pequenas conchas, ouviu-se<br />

que sussurravam. O pilantra havia manti<strong>do</strong> o maldito celular<br />

o tempo to<strong>do</strong> em mo<strong>do</strong> de diálogo. E alguém <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> da<br />

linha lhe passara cola, provavelmente alguma namorada.<br />

37


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Morar no litoral<br />

A casa tão sonhada à beira-mar. Da rede<br />

estendida no alpendre ensombra<strong>do</strong> por densas<br />

samambaias, diviso as gradações extensas<br />

das serras a distância esvaírem-se. Cede<br />

aos poucos o calor da tarde. Vin<strong>do</strong> a sede<br />

saciar, os colibris das campânulas pensas<br />

<strong>do</strong>s lises ao re<strong>do</strong>r voam. Tornam-se intensas<br />

as sombras vesperais. E a calma que precede<br />

a noite enfim se instala, ao cessar repentina<br />

a arenga da cigarra. Acen<strong>do</strong> a lamparina,<br />

e logo a multidão de frementes falenas<br />

espalha em torno a mim misteriosa alternância<br />

de sombras e clarões. E é como desde a infância<br />

eu tenho deseja<strong>do</strong>: esta ventura apenas.<br />

38


Elizabeth Cury Bechir Watanabe<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Elizabeth Cury Bechir Watanabe<br />

Natural de Santos, Esta<strong>do</strong> de São Paulo, itanhaense de<br />

coração. Filha de Wady Dias Bechir e Laurinda Cury Bechir.<br />

Graduada em Administração de Empresas; Pós-Graduação<br />

em Didática para o Ensino Superior e Professora com<br />

Formação Pedagógica de Docentes. Membro efetiva da<br />

Academia Itanhaense de Letras - AIL, membro Correspondente<br />

da Academia Peruibense de Letras - APL e integrante<br />

<strong>do</strong> Grêmio Caminho das Águas de Haicais de Santos, participação<br />

em várias antologias, artigos de jornais e revistas.<br />

betty_cbw@yahoo.com.br<br />

Itanhaém de ontem<br />

Itanhaém de ontem...<br />

Das ruas de areias,<br />

nas calçadas, cadeiras.<br />

O conversar com a vizinhança,<br />

numa existência cheia de confiança.<br />

O entardecer cheio de magias,<br />

que enfeitava as noites.<br />

Vivíamos de sonhos e fantasias,<br />

livres, sem me<strong>do</strong>s,<br />

sentin<strong>do</strong> o cheiro da maresia.<br />

De um simples viver, to<strong>do</strong>s se conheciam.<br />

A fonte luminosa,<br />

alegria da garotada,<br />

que a sua volta brincava<br />

de esconde, esconde,<br />

numa grande correria.<br />

De poucos carros e muitas carroças,<br />

onde to<strong>do</strong>s se encontravam.<br />

De praias virgens e encanta<strong>do</strong>ras...<br />

Cresceu, desenvolveu-se,<br />

mas continua a mesma,<br />

Itanhaém, que a to<strong>do</strong>s encanta!<br />

39


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Trovas<br />

Peruíbe, encanta<strong>do</strong>ra,<br />

entre a serra, a praia e o mar,<br />

atraente e acolhe<strong>do</strong>ra,<br />

eu cheguei para te amar!<br />

Conhecen<strong>do</strong> outros lugares,<br />

a saudade sempre vem.<br />

Dessa terra, de seus ares.<br />

Minha amada Itanhaém.<br />

40


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Barra <strong>do</strong> Una<br />

Visão <strong>do</strong> paraíso<br />

De um la<strong>do</strong> Serra <strong>do</strong> Guaraú<br />

Do outro, Barra <strong>do</strong> Una<br />

Com praia de águas claras<br />

De natureza intacta<br />

Fica inesquecível a visão<br />

Sinto a presença divina<br />

Tal paz que se tem!<br />

Vislumbran<strong>do</strong> e sentin<strong>do</strong> a exuberância da natureza!<br />

41


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Rio Itanhaém<br />

Vislumbran<strong>do</strong> a beleza<br />

da boca da barra,<br />

o rio, que realeza!<br />

Barcos retornan<strong>do</strong>,<br />

fim de pescaria<br />

temporal anuncian<strong>do</strong>...<br />

Admirada paisagem<br />

refletida no espelho<br />

das águas <strong>do</strong> rio.<br />

Momento prazeroso,<br />

profunda paz...<br />

Sapucaitava mais verdejante<br />

cerca<strong>do</strong> de seus habitantes<br />

nesta tarde pacata,<br />

esbanjan<strong>do</strong> tranquilidade...<br />

42


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Esther Felicidade R. Romano<br />

Nasceu na cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro e atualmente reside<br />

em Peruíbe. Dedica-se à poesia, artesanato e artes plásticas.<br />

Livros publica<strong>do</strong>s: Caprichos <strong>do</strong> Destino (romance<br />

psicografa<strong>do</strong>), Poetisa <strong>do</strong> Amor, CD Emoções Poéticas<br />

Vol. I e II. Participou das antologias Delicatta I, II, III e<br />

IV. Obteve o 1º lugar no Mapa Cultural Paulista de 2009,<br />

fase municipal. Ocupa a cadeira nº 13, cuja patronesse é a<br />

poetisa Cora Coralina.<br />

estherfelicidade@yahoo.com.br<br />

Mistérios de Peruíbe<br />

A Cidade de Peruíbe além de linda tem histórias e lendas<br />

misteriosas.<br />

Estranho Portal<br />

Dizem que, nos tempos antigos, Peruíbe não tinha estradas,<br />

andava-se por picadas. Abaixo <strong>do</strong> atual caminho via-se<br />

em certas noites o portal aberto de onde saiam fumaça e fogo<br />

na encosta da montanha.<br />

Certo dia apareceu fecha<strong>do</strong> parecia estar solda<strong>do</strong> por<br />

uma energia estranha. A partir desta data nunca mais foi avista<strong>do</strong><br />

aberto, e, até os dias de hoje, mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Guaraú consideram<br />

este local sagra<strong>do</strong>. Dizem que dentro da montanha há<br />

vida com mora<strong>do</strong>res invisíveis que protegem Peruíbe.<br />

Se alguma pessoa passar pela estrada a meia -noite, verá<br />

o vulto de um homem muito alto vesti<strong>do</strong> de branco, feições<br />

de luz tênue como luar. Ele costuma ficar no meio da estrada<br />

observan<strong>do</strong> o céu e o mar, olha ao re<strong>do</strong>r, depois retorna para<br />

a porta lentamente. É considera<strong>do</strong> o protetor e guardião de<br />

Peruíbe.<br />

Fala-se muito de bolas de fogo e pássaros de metal, que<br />

saem e entram na montanha, as pedras ficam suspensas no ar,<br />

como que envolvidas pelo campo magnético.<br />

43


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Há milhões de anos, teriam chega<strong>do</strong> naves vindas de outros<br />

planetas e sistemas que trouxeram máquinas e cultivavam<br />

as terras. Usavam pedras em suas construções e as cortavam<br />

como tábuas. Tinham um chefe que se chamava Jurupara,<br />

que usava um emblema de uma cobra negra no peito.<br />

Entre muitas histórias antigas indígenas, podemos encontrar<br />

referências de séculos atrás, seres oriun<strong>do</strong>s das estrelas,<br />

teriam chega<strong>do</strong> em suas naves. Segun<strong>do</strong> uma lenda, terremotos<br />

e erupções de um extinto vulcão na Serra de Itatins<br />

teriam destruí<strong>do</strong> as construções de épocas imemoriais, onde<br />

hoje é Peruíbe. Entidades celestiais que ali viviam partiram<br />

em suas naves prateadas.<br />

Lendas <strong>do</strong> Guaraú<br />

Dama de Parnapuã<br />

A dama de Parnapuã é tida como um ser benfazejo. Além<br />

da Praia <strong>do</strong> Arpoa<strong>do</strong>r existe, no caminho, uma picada pela<br />

mata que leva a uma praia belíssima: Parnapuã. Lá existe<br />

uma cachoeira, pequena e silenciosa, que tem água fresca<br />

e gelada. Muitas pessoas afirmam que viram surgir entre as<br />

árvores uma bela jovem de longos cabelos loiros enfeita<strong>do</strong>s<br />

com flores brancas, usan<strong>do</strong> um vesti<strong>do</strong> longo enfeita<strong>do</strong> de<br />

rendas to<strong>do</strong> branco e esvoaçante. Ela surge silenciosamente e<br />

fica olhan<strong>do</strong> para as pessoas.<br />

Dizem os caiçaras, que ela traz boa sorte e felicidade para<br />

quem a vê. Se tentam aproximação, ela desaparece como nuvem<br />

entre as folhas verdes. Deram-lhe o nome de Dama de<br />

Parnapuã.<br />

Contam os caiçaras <strong>do</strong> Una que existe uma cachoeira bem<br />

escondida na mata, que quan<strong>do</strong> alguém chega perto ouvem-se<br />

vozes que aparentemente surgem <strong>do</strong>s roche<strong>do</strong>s. Vozes com<br />

idiomas desconheci<strong>do</strong>s mas bem audíveis, vozes misteriosas.<br />

Rio Verde<br />

Existe uma linda cachoeira onde banham-se mulheres<br />

44


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

de rara beleza loiras de cabelos soltos e compri<strong>do</strong>s, cantan<strong>do</strong><br />

canções estranhas em linguagem que ninguém conhece.<br />

Riem felizes e brincam nas águas, se alguém se aproxima desaparecem<br />

atrás da queda d´água da cachoeira entran<strong>do</strong> pelo<br />

paredão da rocha.<br />

Peruibe, Una, Rio Verde, Juréia, Itatins, Guaraú, e toda<br />

a região são um santuário mágico. Um paraíso misterioso e<br />

encanta<strong>do</strong>r.<br />

45


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Perfume de âmbar<br />

Teu suave perfume de âmbar<br />

Inebria meus senti<strong>do</strong>s<br />

Teu corpo vibra<br />

Ao toque de tua mão<br />

Me perco no universo<br />

Desse amor tão lin<strong>do</strong><br />

Envolvida em teus braços<br />

Nessa mágica paixão<br />

A<strong>do</strong>rmeço serena<br />

Nesta noite inebriante<br />

Sentin<strong>do</strong> em teu peito meu abrigo<br />

Ouvin<strong>do</strong> o pulsar <strong>do</strong> teu coração<br />

Essa <strong>do</strong>ce lembrança<br />

Guardarei comigo<br />

Desses momentos sublimes<br />

Que passei contigo.<br />

46


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Poesia caipira<br />

Vô conta como é triste<br />

Vê a veíce chega<br />

Vê os cabelo caino<br />

Vê a vista encurtá<br />

Vê as perna trumbicano<br />

Com preguiça de andá<br />

Vê aquilo esmoreceno<br />

Sem força prá levantá<br />

As carne vão sumino<br />

Vai pareceno as veia<br />

As vista diminuino<br />

E cresceno as sobrancêia<br />

As oiça vão encurtano<br />

Vão aumentano as oreia<br />

Os ôvo dipindurano<br />

E diminuin<strong>do</strong> a pêia<br />

A veíce é uma <strong>do</strong>ença<br />

Qui dá em to<strong>do</strong> cristão<br />

Dói os braço, dói as perna<br />

Dói os de<strong>do</strong>, dói as mão<br />

Dói o figo e a barriga<br />

Dói o rim, dói o purmão<br />

Dói o fim <strong>do</strong> espinhaço<br />

Dói a corda <strong>do</strong> cunhão<br />

Quan<strong>do</strong> a gente fica véio<br />

Tu<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong> acontece<br />

Vai passano pelas rua<br />

E as menina se oferece<br />

A gente óia tu<strong>do</strong><br />

47


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Benza Deus e agradece<br />

Corren<strong>do</strong> ligeiro pra casa<br />

Procurano o INSS<br />

No tempo que eu era moço<br />

O sol pra mim briava<br />

Eu tinha mir namorada<br />

Tu<strong>do</strong> de bão me sobrava<br />

As menina mais bonita<br />

Da cidade eu bolinava<br />

Eu fazia to<strong>do</strong> dia<br />

Chega bichim desbotava<br />

Mas tu<strong>do</strong> isso passô<br />

Faz tempo ficô pra tráiz<br />

As coisa qui eu fazia<br />

Hoje não sô capaiz<br />

O tempo me robô tu<strong>do</strong><br />

De uma maneira sagaiz<br />

Prá fala mesmo a verdade<br />

Nem trepá eu trepo mais<br />

Quan<strong>do</strong> chega os setenta<br />

Tu<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong> embaraça<br />

Pega a muié vai pra cama<br />

Aparpa, beija e abraça<br />

Porém só faz duas coisa<br />

Sorta pei<strong>do</strong> e acha graça!<br />

48


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

João Libero <strong>Rosa</strong> Marques<br />

Nasceu em Sorocaba-SP em 04/06/1946, escreve<br />

desde os 15 anos. Artesão, poeta e contista. Vence<strong>do</strong>r<br />

<strong>do</strong> Primeiro Concurso Literário da USE Peruíbe. Tem<br />

poemas publica<strong>do</strong>s em jornais e revistas. É Membro<br />

Efetivo da Academia Peruibense de Letras, ocupa a<br />

Cadeira 31/Patrono Mario Quintana. Mantem o blog:<br />

- ”joaoliberopoemas.blogspot.com”<br />

joaolibero46@gmail.com.<br />

A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo<br />

A aldeia estava localizada na Jureia, em Peruíbe, litoral de<br />

São Paulo-Brasil, em uma clareira mais ou menos no meio da<br />

montanha e dela se avistava o mar. Era uma tribo da etnia tupi-guarani,<br />

uma das maiores <strong>do</strong> Brasil, desde sempre. A figura<br />

primária na maioria das lendas guaranis da criação é Iamandu<br />

ou Tupã, o Deus trovão e realiza<strong>do</strong>r de toda a criação. Com a<br />

ajuda da deusa Jaci ou Araci, Tupã desceu à Terra num lugar<br />

descrito como um monte na região de Areguá, no Paraguai e,<br />

desse local, criou tu<strong>do</strong> sobre a face da Terra, incluin<strong>do</strong> o oceano,<br />

florestas e animais.<br />

Também as estrelas foram colocadas no céu nesse momento.<br />

Tupã, então, criou a humanidade (de acor<strong>do</strong> com a maioria<br />

<strong>do</strong>s mitos guaranis, eles foram, naturalmente, a primeira<br />

raça criada, com todas as outras civilizações nascidas deles)<br />

em uma cerimônia elaborada, forman<strong>do</strong> estátuas de argila <strong>do</strong><br />

homem e da mulher com uma mistura de vários elementos da<br />

natureza. Depois de soprar vida nas formas humanas, deixou-<br />

-os com os espíritos <strong>do</strong> bem e <strong>do</strong> mal e partiu.<br />

A administração de uma tribo era formada basicamente<br />

pelo cacique ou morubixaba, que era o chefe supremo da aldeia,<br />

e pelo pajé ou curandeiro. O cacique era Guarini [Guer-<br />

49


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

reiro Luta<strong>do</strong>r] e era respeita<strong>do</strong> por ser o mais sábio e quan<strong>do</strong><br />

moço, o mais forte. O pajé era Angaba [Assombração] e era<br />

respeita<strong>do</strong> e às vezes temi<strong>do</strong>. Fazia curas com ervas que só ele<br />

conhecia e esse conhecimento era transmiti<strong>do</strong> ao seu sucessor.<br />

Anahi [Pequena Flor <strong>do</strong> Céu], era filha de Guarini e estava<br />

prometida ao guerreiro que substituiria seu pai como cacique,<br />

Ubirajara [Senhor da Lança] Esse era o costume. Sua mãe era<br />

Angatu [Alma Boa], gostava bastante de Ubirajara e queria<br />

celebrar logo esse casamento. Anahi ainda relutava a isso.<br />

Um dia fatídico, apareceu um bote a deriva, que veio aportar<br />

na praia. Os índios o viram e arma<strong>do</strong>s de arco e flecha e<br />

também de lanças, se aproximaram. Havia um homem branco<br />

quase morto dentro <strong>do</strong> bote. Os índios não se surpreenderam<br />

com o branco, pois já tinham visto os bandeirantes e inclusive<br />

negocia<strong>do</strong> com eles. Houve discussão sobre o que fazer, e no<br />

fim o levaram para a aldeia. Lá, foi trata<strong>do</strong> pelo pajé e através<br />

de mímica, mais ou menos se comunicou com o cacique, que<br />

entendeu que o navio em que ele estava afun<strong>do</strong>u e ele conseguiu<br />

escapar com mais <strong>do</strong>is companheiros que morreram e ele<br />

os jogou no mar.<br />

Os índios admiravam a coragem e acolheram bem o homem<br />

branco que se chamava Antonio e era português. Aos<br />

poucos Antonio se integrou no dia a dia da aldeia e aprendeu<br />

rudimentos da língua, o suficiente para se comunicar. Ele<br />

era um homem alegre, brincalhão e generoso. As crianças o<br />

a<strong>do</strong>ravam e as mulheres também pois ele as ajudava, diferentemente<br />

<strong>do</strong>s índios, que por costume não faziam trabalho de<br />

mulher.<br />

Anahi se apaixonou por Antonio, to<strong>do</strong>s perceberam, menos<br />

Antonio, se bem que este já tivesse nota<strong>do</strong> aquela india tão<br />

bonita. Isso criou um sério problema. Seus pais não gostaram<br />

de ver isso e Ubirajara menos ainda. Guarini resolveu assim<br />

a questão: man<strong>do</strong>u uns guerreiros, durante a noite, pegarem<br />

Antonio e o levarem para longe, perto de um acampamento<br />

50


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

de bandeirantes no Vale <strong>do</strong> Ribeira. dan<strong>do</strong>-lhe alimento, uma<br />

lança e uma faca.<br />

Na manhã seguinte, Anahi acor<strong>do</strong>u e não viu Antonio. A<br />

mulher de um <strong>do</strong>s guerreiros que levaram Antonio contou a<br />

ela o que aconteceu à noite. Saiu a procura dele. Ubirajara foi<br />

atrás dela, que foi até o alto <strong>do</strong> penhasco mais alto para ver<br />

se via onde estavam levan<strong>do</strong> Antonio. Eles já estavam muito<br />

longe e ela não viu nada. Sentou-se em uma pedra e pôs-se a<br />

chorar. Ubirajara, que a seguira, se aproximou e falou: “Agora<br />

que o branco foi embora, você vai ser minha mulher como tem<br />

que ser”.<br />

“Não”, ela gritou, “nunca vou ser sua”. E ameaçou pular<br />

<strong>do</strong> penhasco. Ubirajara, agilmente deu um salto e agarran<strong>do</strong>-a<br />

caiu no chão, arrastan<strong>do</strong>-a com ele. Anahi caiu e bateu a cabeça<br />

em uma pedra. Ubirajara, desespera<strong>do</strong>, ven<strong>do</strong> to<strong>do</strong> aquele<br />

sangue que saía da cabeça da amada, pegou-a no colo e correu<br />

para a aldeia. O pajé tentou de todas as formas ressuscitar<br />

Anahi, mas, ela já chegou morta na aldeia. Ubirajara, sentin<strong>do</strong>-se<br />

culpa<strong>do</strong> pela morte de Anahi, uns dias depois saiu da<br />

aldeia e nunca mais se soube dele.<br />

Uns meses depois, Angatu foi ao local onde a filha morreu.Lá<br />

chegan<strong>do</strong>, teve uma surpresa: debaixo da pedra onde<br />

Anahi bateu a cabeça e morreu, e pendurada na beirada <strong>do</strong> penhasco,<br />

saía a rosa mais linda que ele já vira. Chamou Guarini<br />

e Angaba, que disse ser aquela rosa o espirito de Anahi. Com<br />

o tempo aquela flor se tornou uma lenda e ficou conhecida<br />

como A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo.<br />

51


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Peruíbe, cidade amor<br />

Te conheci quan<strong>do</strong> era menino<br />

Quan<strong>do</strong> estava de férias<br />

Anos cinquenta, poucas casas<br />

Era apenas uma pequena vila<br />

Criada a partir da estação<br />

Com os anos a perdi de vista<br />

Mas, você ficou no meu coração<br />

Anos depois voltei a vê-la<br />

Quarenta e cinco, na verdade<br />

Que alegria, que surpresa<br />

Você já era uma bela cidade<br />

Aqui resolvi terminar meus dias<br />

Aqui vivi os últimos cinco anos de vida<br />

Da mulher que foi meu grande amor.<br />

Suas belezas naturais praia, mar, floresta,<br />

Me consolaram naquela grande <strong>do</strong>r.<br />

Me equilibrei, acalmei meu coração<br />

Realizei o sonho de me tornar escritor<br />

E por isso tu<strong>do</strong> eu digo com paixão<br />

Sou Sorocabano de nascimento, mas,<br />

Com orgulho, Peruibense de coração.<br />

52


53<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

O Lobisomem<br />

Boa Tarde, amigos ouvintes. Esta é a Rádio Virtual de São<br />

Pedro <strong>do</strong>s Patos, a rádio que só noticia fatos! Aqui fala Jatir<br />

Marques, são 18 horas e esta é a Hora <strong>do</strong> Espanto, que sempre<br />

traz uma reportagem externa de um assunto relevante e<br />

estranho.<br />

Como já foi noticia<strong>do</strong> nas rádios e tevês da região, apareceu<br />

um lobisomem no vilarejo de Água Santa, e a Rádio Virtual<br />

não poderia deixar de investigar. Para isso, foi mandada<br />

uma equipe de reportagem, chefiada pelo experiente repórter<br />

Joel Pereira, com técnicos de som, fotógrafos e cinegrafistas,<br />

da nossa TV Virtual e <strong>do</strong> Jornal Virtual. Lá, entrevistaram o<br />

senhor Juvenal Vieira que nos relatou essa história impressionante!<br />

É verdade? Não é? Julguem vocês mesmos após ouvirem<br />

o senhor Juvenal. Esta reportagem será mostrada ainda<br />

hoje no Jornal das Dez na TV Virtual.<br />

Vamos aos fatos!<br />

Boa noite, Joel, você está com o senhor Juvenal aí, certo?<br />

Estamos ao vivo na Hora <strong>do</strong> Espanto. Boa noite senhor Juvenal,<br />

seja bem-vin<strong>do</strong> ao nosso programa. A partir de agora, os<br />

amigos ouvintes e telespecta<strong>do</strong>res ficam com o Joel Pereira<br />

entrevistan<strong>do</strong> o senhor Juvenal Vieira de Água Santa.<br />

Boa noite, Jatir, boa noite a to<strong>do</strong>s. Estou aqui com o seu Juvenal<br />

e decidimos que ele vai nos relatar essa impressionante<br />

história <strong>do</strong> lobisomem de Água Santa, sem ser interrompi<strong>do</strong><br />

para ele não perder o fio da meada!. Ouçam o relato!<br />

- Tarde, pessoar! Eu chamo Juvenar Viera, fio <strong>do</strong> coronér<br />

Epitaço Viera e da <strong>do</strong>na Marvina Viera. Sô casa<strong>do</strong> cuma muié<br />

santa que se chama Maria! Já moro em Água Santa há munto<br />

tempo já. Liáis, desde que nasci! Re,re,re...Mais, vamo no que<br />

interessa, né emo? A minina Cacirda, fia <strong>do</strong> coronér Inocenço,<br />

um belo de um dia, apareceu de barriga, prenhe mesmo! Ah!<br />

Fartô gente pra vê o coronér brabo! O bicho ficava vermeio<br />

iguar a língua <strong>do</strong> Totó quan<strong>do</strong> lambe a xoxota da cadelinha da<br />

<strong>do</strong>na Ditinha, re,re,re. O coronér ficô iguar possuí<strong>do</strong> <strong>do</strong> Sem<br />

Nome, cruiz cre<strong>do</strong>.<br />

Ele gritava: - eu vô matá o fiadaputa que emprenho minha<br />

fia, vô corta o bagúio <strong>do</strong> tar e fazê ele comê! Já pensô isso, seu<br />

Joer? Inté arrupiô os cabelo de iscuitá!


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Mais, aí qua a coisa fedeu! Cacirdinha falô “pai, foi um<br />

lubisome!” Cruiz cre<strong>do</strong>, vai de reto! Nos dia seguinte, apareceu<br />

mais muié falano que foi atacada pelo bicho pelu<strong>do</strong>! As<br />

muiérada nem num sai mais suzinha de casa, de me<strong>do</strong> <strong>do</strong> tar<br />

lubisome!<br />

Uma noite o bicho atacô o Arcide, <strong>do</strong>no da farmácia! O<br />

que? Falaro...agora o bicho tá atacano inté os home? [pesar<br />

que o Arcide nem num é home home, ceis intende né]. Pode<br />

falá isso seu Joer? O policiamento correto num prende nóis?<br />

Tem certeza?<br />

Intão nóis os home da vila, formemo uma patrúia, pra morde<br />

guardá as muié desse tar de lubisome. Seu Joer <strong>do</strong> Céu, vô<br />

conta procê, fico inté arrupia<strong>do</strong> de alembrá. Era sexta-fera,<br />

noite limpinha, iguar minhas camisa quan<strong>do</strong> Maria lava e coara.<br />

Nem num tinha uma nuve no céu, só estrelinha alumiano e<br />

uma luona cheia, bunita. Lua de lubisome! Despois de patrúiá,<br />

eu tô vortano pra casa, assucega<strong>do</strong>, filiz que tava vortano pra<br />

abraçá Maria que já tava inté durmino acho.<br />

Mais, quano passei de debaxo da janela <strong>do</strong> meu quarto,<br />

aí Jesuiz, Maria e José, iscuitei a voiz de Maria gemen<strong>do</strong> e falan<strong>do</strong><br />

sufocada: “ai,ai, não pára, vô morrê”, e uns ronco iguar<br />

de um bicho estripa<strong>do</strong>! Coisa me<strong>do</strong>nha seu Joer!!<br />

Sô home de corage, mais, vô falá, farto pôco pra mim sujá<br />

nas carça. O tar já tava drento da minha casa, atacano a Maria.<br />

Jesuiz Cristo, me ajude! Gritei: “ Maria, guenta firme fia, que<br />

já vô te sarvá”.<br />

Entrei ca espingarda engatiada, pronto pra matá o morrê!<br />

Entrei no quarto, vejo Maria quase pelada na cama e um<br />

vurto caí<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong> da cama Pontei a garrucha pro vurto que<br />

só estremilicava no chão e ia atirá quan<strong>do</strong> Maria [O muié santa]<br />

sartô na frente <strong>do</strong> cano e grito: “Num atire Juvenar, é o<br />

cumpadre Antenor!”<br />

Fiquei abesta<strong>do</strong>! O cumpadre Antenor era o lubisome!<br />

Mais ele nem num tava pelu<strong>do</strong>! Tava pela<strong>do</strong>, segurano os bagúio<br />

dele, cum me<strong>do</strong> que eu dava um tiro e rancava inté o<br />

saco! Num intendi mais nada! Intão Maria ixpricô, chorano,<br />

nervosa. Nunca havéra visto Maria desse jeito! Coitada de<br />

Maria que susto que ela passô!<br />

- Juvenar, o cumpadre chegô de lubisome, me atacô, inté<br />

rasgo minha carcinha, óia e me comeu! Uma, duas, treiz veiz,<br />

54


55<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

iguar um loco, mais, quan<strong>do</strong> ocê entrô, ele já tava acabano e<br />

desvirô de lubisome pro cumpadre Antenor.<br />

O fiadaputa estrupô minha Maria! Quiria matá o desgrama<strong>do</strong>,<br />

mais Maria me acarmô!<br />

- Ele é seu amigo de criança home! Eu falei prela:<br />

- Maria, minha santinha, o que nóis faiz? Se contá pro<br />

povo eles vai matá o cumpadre. Ô meu Deus! Eu se lembro<br />

quan<strong>do</strong> nóis era minino, o cumpadre foi mordi<strong>do</strong> pelo cachorro<br />

<strong>do</strong> Coronér Inocenço. Vaí vê o bicho infetô o cumpadre, por<br />

isso ele vira lubisome! Só pode ser isso Maria.<br />

Maria que intendia das coisa [ela fez um ano de escola na<br />

vila, um ano, já pensô!], falô: “é isso mesmo Juvenar, mais,<br />

óia, o cumpadre tá acordano. Vamos cunversá coele e vê o que<br />

nóis faiz.”<br />

Prendemo o cumpadre Antenor no quartinho de visita<br />

[o bicho tava cos zóio arregala<strong>do</strong> e respirano mar! Coita<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> cumpadre, dava pena!] Ele tava cum me<strong>do</strong> que eu atirava<br />

nele. E eu tava cum ódio <strong>do</strong> tar, purque ele atacô a muié mais<br />

dereita, a mais santa desse mun<strong>do</strong>! Uma muié que nunca nem<br />

num fez mar pra ninguém, só tinha zóio pra mim e agora tava<br />

agoniada cum tu<strong>do</strong> aquilo.<br />

Chamamo o padre Bento e contamo tu<strong>do</strong> prêle. Ele oiô<br />

pra Maria [achei esquisito o jeito que ele oiô, mais, ele era o<br />

padre. Acho que padre óia assim mesmo, né?]. Mandô ela na<br />

igreja notro dia, se confessá e fazê penitença coele.<br />

Ficô arresorvi<strong>do</strong> ansim: o padre falô co prefeito, que falô<br />

co <strong>do</strong>tô delega<strong>do</strong> e reuniô o pessoar da vila na igreja e expricô<br />

que o cumpadre Antenor era o lubisome. Tu<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> queria<br />

pega o cumpadre e matá, mais o <strong>do</strong>tô delega<strong>do</strong> num dexô! Ele<br />

falô:<br />

- A <strong>do</strong>na Maria pediu e nós decidimos deixar o Antenor<br />

na responsabilidade dela e <strong>do</strong> Juvenal.Ele vai ficar preso no<br />

quarto e só vai sair pra ir no banheiro e quan<strong>do</strong> for o Juvenal<br />

vai atrás, de espingarda na mao, no caso <strong>do</strong> bicho virar lubisomem<br />

de novo. Estou entran<strong>do</strong> em contato com uma universidade<br />

federal para levarem o Antenor para estu<strong>do</strong>. Até eles<br />

decidirem, ele fica na responsabilidade da Maria e <strong>do</strong> Juvenal<br />

e ninguém vai interferir nisso, ou vai preso!<br />

Estranho que ele falô isso rin<strong>do</strong>, mais acho que <strong>do</strong>tô delega<strong>do</strong><br />

acha graça em tu<strong>do</strong> né?


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

E ansim foi feito. O lubisome ficô preso na minha casa.<br />

Seu Joer <strong>do</strong> céu, já tá fazeno mais de ano que isso aconteceu e<br />

o lubisome inda tá lá im casa,<br />

Coitada de Maria!! Quan<strong>do</strong> o tar se transforma, [umas três<br />

veiz por semana] e começa a uivá, eu fico intero arrupia<strong>do</strong>.<br />

Maria não [ô muié santa], seu Joer. Maria se alevanta da cama<br />

e vai de camisola memo pro quartinho e lá fica acarman<strong>do</strong> ele.<br />

O bicho ronca, geme e Maria, a pobre, acarma ele. Eu iscuito<br />

ela falá [parece inté que ela chora de moção] “não para,<br />

não, agora, agora, isso pronto, quietinho agora, devagar, isso,<br />

agora <strong>do</strong>rme”. E, por esse zóio que a terra vai comê, seu Joer,<br />

o bicho se acarma. Dispois de quase uma hora dessa agonia,<br />

Maria vorta pra cama cansada, o rosto vermeio e <strong>do</strong>rme na<br />

hora. Num falei que é uma santa! Ela que tá aguantano tu<strong>do</strong>!<br />

Quan<strong>do</strong> será que eles vem buscá o lubisome, hein, seu Joer,<br />

ocê sabe?<br />

Assim termina a história <strong>do</strong> lobisomem de Água Santa.<br />

Nosso repórter Joel Pereira tem mais informação sobre o caso.<br />

Fala Joel:<br />

- È o seguinte, a Cacilda, filha <strong>do</strong> coronel Inocencio, teve<br />

um lin<strong>do</strong> bebê, chinês, que acabou por contar que era filho <strong>do</strong><br />

Chang, da loja de 1,99. O coronel obrigou Chang a casar com<br />

Cacilda, na mira de um 38! As outras mulheres que disseram<br />

que foram atacadas, não quiseram dar entrevista e o farmacêutico<br />

mu<strong>do</strong>u para a capital. Quanto ao lobisomem, ainda vai<br />

ficar um tempo na casa <strong>do</strong> Juvenal e da Maria!<br />

Boa noite pessoal, boa noite Jatir. Joel Pereira direto de<br />

Água Santa.<br />

Aqui encerramos A Hora <strong>do</strong> Espanto de hoje. Boa noite<br />

amigos ouvintes!<br />

56


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

O Retorno<br />

Lentamente o homem abriu o portão.<br />

Parou, resistiu à imensa vontade de voltar,<br />

E angustia<strong>do</strong> pensou como seria a reação dela,<br />

Ao vê-lo voltar depois de tanto tempo.<br />

O cachorro latiu, alerta, quan<strong>do</strong> abriu o portão.<br />

Ao reconhecê-lo, o amigo fiel parou de latir<br />

E começou a pular freneticamente, contente.<br />

O homem ajoelhou, abraçou o cachorro,<br />

E, emociona<strong>do</strong>, começou a soluçar.<br />

Após se recompor, levantou-se, olhou,<br />

E lentamente foi em direção a casa.<br />

Passou pela porta devagar e estacou.<br />

A sala estava silenciosa e fresca,<br />

Com um leve cheiro de cera e lavanda,<br />

Exatamente como ele sempre lembrava.<br />

Olhou feliz e com os olhos mareja<strong>do</strong>s<br />

Para os quadros e fotos na parede,<br />

De tantas lembranças e tão familiares.<br />

A mulher parada na porta <strong>do</strong> corre<strong>do</strong>r<br />

Olhava ansiosamente para ele, que,<br />

Absorto, olhan<strong>do</strong> as fotos e os quadros,<br />

Não a ouviu entrar, quan<strong>do</strong> de repente,<br />

Um soluço baixo o fez olhar em sua direção.<br />

Soluçan<strong>do</strong>, a mulher abriu os braços amorosa,<br />

Dizen<strong>do</strong> que o amava e que era bem vin<strong>do</strong>!<br />

Ele rompeu num choro convulsivo e liberta<strong>do</strong>r,<br />

E toda sua angustia e me<strong>do</strong> se foram.<br />

Quan<strong>do</strong> ela o abraçou com grande amor,<br />

Disse que estava arrependi<strong>do</strong> e pediu perdão.<br />

E choran<strong>do</strong> falou:- eu te amo Mãe e voltei pra ficar!<br />

57


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

O burro e o leiteiro<br />

O burro é um animal híbri<strong>do</strong>, resulta <strong>do</strong> acasalamento de<br />

um jumento com uma égua. Ele é estéril, por isso não é usa<strong>do</strong><br />

para reprodução. Só para serviços de transporte, carregamento,<br />

etc... Seu <strong>do</strong>no, já conhecen<strong>do</strong> a espécie, era paciente, não<br />

chicoteava o animal como muitos o fazem. Tratava-o bem,<br />

afinal ele era seu companheiro de trabalho!<br />

O homem veio de um país europeu, que forneceu ao mun<strong>do</strong><br />

mentes brilhantes, grandes pensa<strong>do</strong>res, escritores, poetas,<br />

grandes navega<strong>do</strong>res e desbrava<strong>do</strong>res, joga<strong>do</strong>res de futebol<br />

geniais, e... pessoas como ele, o Leiteiro.<br />

Era um homem grande, forte, tinha um imenso bigode e era<br />

muito cordial.<br />

Ele tinha um pequeno sítio na periferia da cidade, meia<br />

duzia de vacas, um boi e alguns porcos, e to<strong>do</strong>s os dias saía<br />

entregan<strong>do</strong> leite de casa em casa, com sua carroça, puxada<br />

pelo burro sonolento e turrão, que de tanto fazer o mesmo<br />

caminho, fazia-o automaticamente, com a rédea solta, sem<br />

que seu <strong>do</strong>no precisasse instá-lo a andar.<br />

Iam e voltavam às turras.<br />

Às vezes, enquanto o homem descarregava o leite, o burro<br />

<strong>do</strong>rmia em pé, pois afinal um cochilozinho vai bem, né?<br />

Assim que o homem sentava na carroça, como se tocasse<br />

um desperta<strong>do</strong>r imaginário, o burro acordava e saía a andar...<br />

Mas, o burro, teimoso como to<strong>do</strong> burro tem que ser, às vezes,<br />

mesmo depois de acordar, insistia em não sair <strong>do</strong> lugar.<br />

- Anda, burro, estamos atrasa<strong>do</strong>s, rapaz, temos muitas<br />

entregas ainda - falava o homem, primeiro calmamente e<br />

depois exaspera<strong>do</strong>.<br />

O burro, para demonstrar que ele iria se quisesse, dava um<br />

58


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

tempo e quan<strong>do</strong> o homem ameaçava descer da carroça, saia<br />

andan<strong>do</strong>.<br />

- Um ainda te <strong>do</strong>u uma lição, seu orelhu<strong>do</strong>, dizia o homem.<br />

Esse dia não demorou a chegar. Subin<strong>do</strong> uma ladeira, o<br />

burro empacou. E quem disse que o bicho andava? Puxou as<br />

rédeas, usou o chicotinho de leve, pois ele gostava de animais<br />

e não judiava <strong>do</strong> seu burro, e nada! Ele desceu calmamente da<br />

carroça, foi na frente <strong>do</strong> burro, olhou-o bem dentro <strong>do</strong>s olhos<br />

e falou:<br />

-Tu podes ser mais inteligente <strong>do</strong> que eu, mas, mais forte<br />

tu não és! E deu um tremen<strong>do</strong> murro bem no meio da testa <strong>do</strong><br />

burro, que desabou desacorda<strong>do</strong>.<br />

O homem então, pegou uma cesta que levava na carroça,<br />

sentou-se na guia da calçada e comeu um lanche que trazia<br />

sempre com ele. Depois de um tempo, o burro voltou a si, um<br />

pouco ator<strong>do</strong>a<strong>do</strong> na verdade e zurrou baixinho para seu <strong>do</strong>no.<br />

O homem levantou calmamente, olhou o burro nos olhos e<br />

falou:<br />

- Agora tu sabes quem manda, sabichão? Deu-lhe uma<br />

suculenta maçã, subiu na carroça e o burro subiu a ladeira<br />

mastigan<strong>do</strong> alegremente a deliciosa maçã.<br />

A partir desse dia, defini<strong>do</strong> quem manda e quem obedece,<br />

continuaram sua jornada diária sem mais incidentes! Só os<br />

cochilinhos básicos, afinal nenhum burro é de ferro!<br />

59


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Jorge Braga da Silva<br />

Publicou os livros de poesia “Amanhece um<br />

sorriso” e “Loucas vacas voa<strong>do</strong>ras” e contos e poemas<br />

em dezenas de coletâneas. Seu último livro,<br />

“Contos entre a vida e a morte“ (2018), pode ser<br />

acessa<strong>do</strong> em https://issuu.com/jhorgebraga. Mantém<br />

o blog de escritor https://jhorgebraga.blogspot.com e<br />

ocupa a cadeira número 15 da Academia Peruibense de<br />

Letras cujo patrono é Dalmar Americano <strong>do</strong>s Santos.<br />

jhorgebraga@gmail.com<br />

Sombras sonoras<br />

“Esses discos voa<strong>do</strong>res<br />

Me preocupam demais“<br />

(Música “Esses discos voa<strong>do</strong>res me preocupam demais”, de Zé Ramalho)<br />

“No cume calmo<br />

Do meu olho que vê<br />

Assenta a sombra sonora<br />

De um disco voa<strong>do</strong>r”<br />

(Música “Ouro de tolo”, de Raul Seixas)<br />

A <strong>do</strong>cilidade é o hábito natural das noites em Peruíbe. De costume,<br />

elas pousam mansamente sobre a cidade, dissolven<strong>do</strong><br />

gradualmente as cores de tu<strong>do</strong> até que se tornem meras silhuetas<br />

negras em contraste com o céu imóvel e com o contorno sinuoso<br />

das montanhas no horizonte. Trinta e <strong>do</strong>is quilômetros<br />

de praias ornam o litoral Peruibense acariciadas eternamente<br />

pelas águas arfantes <strong>do</strong> Oceano Atlântico. Dessa imensidão<br />

aquífera, coberta por conserva<strong>do</strong>ras noites mansas, ouve-se o<br />

ronronar oceânico como se o ouvi<strong>do</strong> lhe auscultasse a imensa<br />

concha ondulante e imersa na trama da noite. Normalmente o<br />

Sol desce avermelha<strong>do</strong> e lento como viscosa calda escorren<strong>do</strong><br />

por trás da Serra <strong>do</strong> Itatins. Porém, hoje, a noite irrompe<br />

60


61<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

por to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s, repentina, como se desaban<strong>do</strong> <strong>do</strong> céu. E<br />

no impacto contra as ruas, praças e casas, se desintegra em<br />

mil sombras estilhaçadas. Mesmo assim, a noite ainda parece<br />

servil ao preciso relógio da mecânica celeste, mas nela se<br />

engendra algo estranhamente belicoso, pois suas escuridades<br />

e penumbras avançam céleres sobre a cidade como solda<strong>do</strong>s<br />

de uma legião fantasmagórica em ataque ao inimigo. Entrincheiram-se<br />

nos terrenos baldios; esgueiram-se junto aos<br />

muros que o tempo trinca e devora enquanto caem por cima<br />

de calçadas; escondem-se nas viradas de esquinas solitárias;<br />

rastejam por debaixo de moitas de mato cerra<strong>do</strong> e de árvores<br />

ao longo <strong>do</strong>s canais que sangram suas águas para dentro<br />

<strong>do</strong> mar. A abóbada celeste opaca e negra emborca-se sobre<br />

a cidade abaixo totalmente subjugada. Houvesse, nesta noite<br />

enigmática, um observa<strong>do</strong>r interessa<strong>do</strong> em estrelas e ele veria<br />

uma multidão estelar incalculável abarrotan<strong>do</strong> o céu com seus<br />

brilhos diamantinos, se a maioria não estivesse encoberta por<br />

nuvens ocultas na escuridão que <strong>do</strong> céu desce para a terra. As<br />

poucas estrelas visíveis esparramam-se como fracos borrões<br />

de luminescências. A iluminação pública, mesmo precária e<br />

mal distribuída, ofusca ainda mais essas claridades estelares<br />

sobreviventes. Estes são os sinais de que esta noite, de fato,<br />

difere <strong>do</strong>s costumes naturais aqui no Litoral Sul <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de<br />

São Paulo.<br />

Os transeuntes, vicia<strong>do</strong>s em noites cálidas e delicadas que se<br />

prenunciam pela descida preguiçosa <strong>do</strong> Sol rumo ao horizonte<br />

da esfera mundial, toma<strong>do</strong>s de surpresa por esta escuridão súbita<br />

no fim da tarde, apressam os passos atravessan<strong>do</strong> praças,<br />

ruas e calçadas como se fugin<strong>do</strong> de alguma ameaça furtiva<br />

que os rondassem de dentro <strong>do</strong>s infinitos escuros das muitas<br />

ruas mal iluminadas. Até mesmo a praça da Igreja Matriz parecia<br />

mais escura e mais silenciosa que o normal.<br />

Mesmo perdi<strong>do</strong> nessas divagações urbanísticas <strong>do</strong>s anoitece-


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

res neste canto da baixada, esgueiro-me rapidamente pela Rua<br />

Tucuruvi, no centro da cidade. Chego à esquina com a Rua<br />

<strong>do</strong>s Pesca<strong>do</strong>res e, nesse ponto estratégico, paro e observo toda<br />

a praça; as escadarias da igreja à minha esquerda, a banca de<br />

jornais fechada, à direita. Tento conter meu coração nervoso,<br />

tumultua<strong>do</strong>, explodin<strong>do</strong> no peito e o fole barulhento da respiração,<br />

temen<strong>do</strong> que denunciem a minha presença, mas claro<br />

que exagero. Detenho-me nesta esquina não apenas devi<strong>do</strong> as<br />

obvias fraquezas da minha forma física, mas também porque<br />

ainda tenho algum bom senso residual.<br />

Quan<strong>do</strong> chegarem aqueles aos quais procuro, também seus<br />

inimigos podem vir no encalço deles. E ai eu correria o risco<br />

de ficar entre possível fogo cruza<strong>do</strong>. Péssimo, pois estragaria<br />

to<strong>do</strong> meu plano. Por isso me acautelo e son<strong>do</strong> o movimento<br />

que acontece lá na praça.<br />

Aparentemente, tu<strong>do</strong> normal. Os últimos lojistas fecham suas<br />

portas e desaparecem pelas ruas adjacentes ou que desembocam<br />

no logra<strong>do</strong>uro. Nenhum movimento, por enquanto, nem<br />

de amigos nem de inimigos, nem na praça nem no céu. Encosto-me<br />

à parede e continuo quieto observan<strong>do</strong>.<br />

Antes de vir aqui para encontrá-los, deliberei comigo mesmo<br />

por muito, muito tempo. Até que tomei uma decisão e aqui<br />

estou. Se eles vierem, e é quase certo que virão, será a ocasião<br />

perfeita em to<strong>do</strong>s os senti<strong>do</strong>s. Finalmente mostrarei ao mun<strong>do</strong><br />

que não sou nenhum maluco alucina<strong>do</strong> por alienígenas. Tu<strong>do</strong><br />

está acontecen<strong>do</strong> exatamente da forma que eu, por décadas,<br />

previ e alertei ao mun<strong>do</strong>. Embora em vão, pois nunca me ouviram.<br />

Ao contrário, ainda riem e me chamam de “Dr. Abduzi<strong>do</strong>”.<br />

Se não quiseram ouvir a verdade ou não se importaram,<br />

então irei sozinho na viagem. Vou embora <strong>do</strong> país. Mais que<br />

isso, vou embora <strong>do</strong> planeta!<br />

62


63<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Cansei deste país das nulidades triunfantes. A raiva <strong>do</strong> povo<br />

está lacrada dentro de uma panela de pressão ao fogo inapagável<br />

de cozinheiros maléficos, os corruptos <strong>do</strong> crime organiza<strong>do</strong><br />

e infiltra<strong>do</strong> em todas as instâncias políticas. Não sei se<br />

um dia a panela explodirá. A corrupção é uma <strong>do</strong>ença devoran<strong>do</strong><br />

vidas, esperanças, empregos e o futuro dessa gente. Sou<br />

uma vítima desse câncer incurável. Depois de anos dedica<strong>do</strong>s<br />

aos estu<strong>do</strong>s, buscan<strong>do</strong> qualificar-me, sempre com muito sacrifício,<br />

foi tu<strong>do</strong> em vão. De que vale ser <strong>do</strong>utor em biologia,<br />

pós-<strong>do</strong>utor na Europa, se, ao retornar ao Brasil para dar a contrapartida<br />

social, não há emprego? Os tecnocratas e políticos<br />

demagogos e incompetentes esbanjaram dinheiro <strong>do</strong> povo em<br />

programas educacionais destituí<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mínimo cuida<strong>do</strong> quanto<br />

a capacidade <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de trabalho absorver tantos <strong>do</strong>utores!<br />

Hoje sou um deles, altamente qualifica<strong>do</strong>, mas desemprega<strong>do</strong>.<br />

Minhas gavetas estão repletas de diplomas enquanto<br />

há anos perambulo de um subemprego ao outro, tentan<strong>do</strong> uma<br />

vaga para fazer aquilo em que fui treina<strong>do</strong> às custas de pesada<br />

carga de impostos. Sem opção, voltei a morar com minha<br />

mãe. Até que um dia, desespera<strong>do</strong>, cai na tentação de fugir<br />

dessa triste realidade.<br />

Foi quan<strong>do</strong> eles me abduziram pela primeira vez. Viajei para<br />

outras dimensões, experimentei uma paz, uma tranquilidade<br />

que já havia esqueci<strong>do</strong> que existisse. Eles mexeram no meu<br />

DNA e tornei-me dependente da maravilhosa liberdade, quan<strong>do</strong><br />

me transportavam para outras realidades. É fácil fugir num<br />

disco voa<strong>do</strong>r pratea<strong>do</strong> e multicolori<strong>do</strong>. Desde então já perdi a<br />

conta das abduções.<br />

De fato, fui abduzi<strong>do</strong> muitas vezes. E quanto mais abduzi<strong>do</strong>,<br />

mais queria ser arrebata<strong>do</strong>. Mais eu precisava deles e <strong>do</strong><br />

chip. Por isso implorei que o chip fosse implanta<strong>do</strong> sob minha<br />

pele. Ele me faria feliz vinte e quatro horas por dia. A viajem<br />

duraria muito tempo mais. Mas eles cobram caro pela passa-


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

gem. Um pós-<strong>do</strong>utor desemprega<strong>do</strong> nesta pós-modernidade<br />

não tem dinheiro nem para o pão, quem dirá para sair viajan<strong>do</strong><br />

entre as galáxias. Então me aban<strong>do</strong>naram. Depois de me seduzirem,<br />

de exaurirem meus últimos centavos, eles me aban<strong>do</strong>naram.<br />

Não me receberam mais no disco voa<strong>do</strong>r! Mas era<br />

tarde. Tornara-me dependente da alienação. Só o que quero é<br />

ser abduzi<strong>do</strong> para sempre.<br />

Em crise de abstinência e em delírios interetelares, fui arrebata<strong>do</strong>,<br />

mas, agora, pelo ódio. Desejei vingança. Por isso vim<br />

aqui, para cobrar, para acertar as contas. Quem eles pensam<br />

que são? Donos <strong>do</strong> Universo? Acham que podem sair por aí<br />

invadin<strong>do</strong> os planetas e mexen<strong>do</strong> no DNA das pessoas? Implantam<br />

desejos, plenitude e paz e, quan<strong>do</strong> ficamos dependentes<br />

<strong>do</strong> chip, temos um alto preço a pagar se quisermos fugir<br />

<strong>do</strong> imenso vazio interior. Estou aqui para mostrar a eles que<br />

isso não se faz.<br />

Problema é que não sou da<strong>do</strong> a cultivar mágoas. A princípio<br />

vim pela vingança. Mas agora... Não sei... Perdi a raiva, o<br />

ímpeto. O que iria fazer não seria certo. Ainda gosto deles,<br />

apesar de tu<strong>do</strong>.<br />

Toco levemente com as pontas <strong>do</strong>s de<strong>do</strong>s na arma que carrego<br />

na cintura. Ela não faz mais senti<strong>do</strong>. Não quero machucá-los.<br />

Desisto, não vai ter vingança! Só quero que me implantem<br />

aquele maldito chip.<br />

Desde a primeira abdução que minha vida transformou-se em<br />

tediosa espera. Estou sempre esperan<strong>do</strong>, sempre ansioso, tentan<strong>do</strong><br />

imaginar onde estarão na próxima vez. “Esses discos<br />

voa<strong>do</strong>res me preocupam demais”.<br />

Ainda me resta um chip desde o último contato imediato, mas<br />

sei que o efeito vai acabar e vou precisar de mais, de cada vez<br />

64


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

mais.<br />

Então meus ouvi<strong>do</strong>s detectam um som bizarro cuja direção<br />

não identifico a princípio. Mas, no instante seguinte, minha<br />

atenção é atraída para aquela enorme sombra no céu que se<br />

denuncia por seu leve tremor. Concluo que aquele som é proveniente<br />

dela, da sombra sonora.<br />

“Uma sombra sonora!”, ora, direis. “E por que não, se até<br />

estrelas podem ser ouvidas?”, diria um atento astrônomo.<br />

Parcialmente divisada por trás <strong>do</strong>s contornos <strong>do</strong>s prédios e<br />

casas, a sombra sonora parecia estar pairan<strong>do</strong> acima <strong>do</strong> topo<br />

escuro de uma montanha na Serra <strong>do</strong>s Itatins. Então lembrei-<br />

-me <strong>do</strong>s versos de Raul Seixas: “No cume calmo / Do meu<br />

olho que vê / Assenta a sombra sonora / De um disco voa<strong>do</strong>r”.<br />

Meu coração, que já havia se acalma<strong>do</strong>, acelera novamente.<br />

“Eles chegaram!”, quase gritei. Cautelosamente, avanço para<br />

o centro da praça.<br />

Na minha cabeça martela uma pergunta: Por que nesta cidade?<br />

Por que não em Nova Iorque ou, por que não em São Paulo<br />

ou no Rio de Janeiro? Só pode ser por uma razão: energia.<br />

Sem energia não tem solução. E aqui em Peruíbe eles têm<br />

isso de sobra. Não é à toa que estão aqui há séculos, talvez<br />

milênios. Os sinais da presença aparecem nos mais inusita<strong>do</strong>s<br />

lugares. São tantos que acabaram motivan<strong>do</strong> o encontro anual<br />

ufológico em Peruíbe. Ufólogos internacionais e brasileiros<br />

reúnem-se aqui para discutir o fenômeno e suas casuísticas.<br />

Eu mesmo já participei de muitos desses encontros. Muitas<br />

noites observan<strong>do</strong> o céu. Esperan<strong>do</strong>. Procuran<strong>do</strong> sinais. E escreven<strong>do</strong><br />

tu<strong>do</strong> num blog.<br />

Muitos artistas têm sensibilidade para os sinais. Como Marcelo<br />

Senna, por exemplo, que expõe a presença alienígena em<br />

65


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

uma grande pintura no muro da pousada Saray.<br />

A mídia registra relatos das aparições. Mostra as marcas deixadas<br />

por eles em Peruíbe. Marcas no chão, nas pessoas, nos<br />

bichos. Marcas na Serra <strong>do</strong>s Itatins. Eles se sentem bem recepciona<strong>do</strong>s,<br />

como se fossem seres de a<strong>do</strong>rável graça. Estão<br />

aqui desde tempos imemoriais, quan<strong>do</strong> Peruíbe ainda teria<br />

que esperar séculos para existir. Foram amigos <strong>do</strong>s antigos<br />

povos sambaquis e depois <strong>do</strong>s indígenas da região. Eu vi o<br />

imenso geo<strong>do</strong> por dentro, uma vez. Centenas de anos eles nos<br />

visitaram e, discretamente, estabeleceram uma colossal infraestrutura<br />

alienígena.<br />

Suas bases estão muito bem escondidas. Não são visíveis ao<br />

olho humano comum, nem aos instrumentos tecnológicos atuais.<br />

Eles se sentem seguros. Andam entre nós e, quem puder<br />

pagar, pode até fazer uma viagem no disco voa<strong>do</strong>r.<br />

Mas falar com eles é quase como garimpar os diamantes de<br />

Lucy no céu. Depois de rejeita<strong>do</strong>, só depois de certos protocolos,<br />

consegui contato com um deles e descobri que haveria<br />

uma espetacular aparição hoje, nesta praça. Por isso vim<br />

prepara<strong>do</strong>, a princípio, para um confronto, mas agora estou<br />

mesmo é pronto para uma grande viagem, dessa vez será para<br />

sempre. Vou embora daqui carrega<strong>do</strong> pelos ETs.<br />

Paro no meio da praça, mas é estranho, tu<strong>do</strong> parece monótono<br />

como sempre. Sento-me em um banco e espero. Jogo a cabeça<br />

66


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

para trás e espio os movimentos sutis na atmosfera <strong>do</strong> céu.<br />

Cada mínima estrela que ousasse um brilho a mais eu a detectaria.<br />

E saberia que não era uma estrela. Seriam eles chegan<strong>do</strong><br />

em seus discos voa<strong>do</strong>res.<br />

Embora meus olhos não desgrudassem <strong>do</strong> céu, não pude perceber<br />

o momento exato da aparição. Quan<strong>do</strong> dei por conta já<br />

estavam descen<strong>do</strong> em uma nave prateada, reluzente. Como<br />

chegaram tão de repente, sem eu nem perceber? Esses discos<br />

voa<strong>do</strong>res e seus aliens sagazes são mesmo muito ágeis. Eles<br />

nunca estão onde você pensa, embora estejam por to<strong>do</strong>s os<br />

lugares oferecen<strong>do</strong> arrebatamento barato, mas só no começo.<br />

A porta da nave se abre e um deles desce pela rampa que se<br />

estende até o solo. Aproximo-me devagar, mas não consigo<br />

ver com clareza por causa das luzes da nave que me ofuscam.<br />

Converso mentalmente com o alien, digo o que preciso. Alguns<br />

outros aproximam-se. Quero muito dessa vez. Ele me<br />

olha, quer saber o que tenho a oferecer em troca. Tenho o<br />

bastante para pagar o que peço. Dessa vez vendi a geladeira da<br />

minha mãe. Coloco o dinheiro na mão da criatura.<br />

Percebo a chegada de mais naves. Para que tantas? Bem, não<br />

importa. Parece que a festa será boa. Para comemorar minha<br />

despedida. Vou embora deste país.<br />

Os aliens comigo se assustam com a súbita chegada de mais<br />

naves. Seriam seus inimigos? Os crocodilianos ou greys? Tentam<br />

fugir, mas elas descem em alta velocidade e, antes de conseguirem<br />

escapar, estamos to<strong>do</strong>s cerca<strong>do</strong>s por muitos aliens<br />

nos apontan<strong>do</strong> pistolas fhasers. Eu nem consegui me mexer<br />

<strong>do</strong> lugar. Ainda bem que não parecem ser os crocodilianos.<br />

Estes são cinzentos, eu acho. Se bem que à noite to<strong>do</strong> alien é<br />

cinza. Noto o formato esquisito da cabeça desses aliens intru-<br />

67


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

sos que lembra um boné ou um capacete.<br />

Permaneço para<strong>do</strong>, sem reação. Vários <strong>do</strong>s recém chega<strong>do</strong>s<br />

se abrigam atrás <strong>do</strong>s trens de pouso das naves. Outros deslocam-se<br />

furtivamente para pontos estratégicos. Estão fechan<strong>do</strong><br />

o cerco. Isso não é nada bom.<br />

Eles falam pelo rádio. Estão se comunican<strong>do</strong> com outras naves<br />

que ainda não desceram. O que eu mais temia está prestes<br />

a acontecer: Ficar preso no meio <strong>do</strong> fogo cruza<strong>do</strong> de duas raças<br />

alienígenas inimigas. Isso vai complicar tu<strong>do</strong>. E o pior, se<br />

eu perder essa oportunidade não sei se haverá outra. Aqui no<br />

Brasil tu<strong>do</strong> é cada vez mais difícil. Até ser abduzi<strong>do</strong>. Preciso<br />

reagir de alguma forma. Então grito para os cinzentos intrometi<strong>do</strong>s:<br />

–– Aliens filhos da puta!<br />

Meu grito causou certo alvoroço nas hostes inimigas. Pode<br />

ter si<strong>do</strong> uma iniciativa meio louca, mas as coisas estão in<strong>do</strong><br />

muito rápidas por aqui.<br />

Eles tentam me acalmar. Esses greys não são confiáveis. Gritam<br />

o tempo to<strong>do</strong> na minha cabeça. Não consigo entender<br />

bem o que dizem. Mas sei que estão tentan<strong>do</strong> me iludir com o<br />

canto de sereia. Acho que evitam barulho agora, no início da<br />

invasão. Assim as coisas ficam mais fáceis para eles. Mas não<br />

vou ceder. Não vou perder tu<strong>do</strong> agora.<br />

Com a chegada de uma van da TV Praia das Artes, fico mais<br />

confiante. É a chance de dar o meu reca<strong>do</strong> ao mun<strong>do</strong>, mas<br />

primeiro preciso me livrar <strong>do</strong>s cinzentos. Eles mantêm a imprensa<br />

à distância, pois cercaram a área com uma fita que gera<br />

um escu<strong>do</strong> de energia.<br />

Então parto para o desespero total e saco minha arma. Atiro<br />

68


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

no alien mais próximo, mas ele tem sorte (ou eu que atiro mal,<br />

pois não foi atingi<strong>do</strong>). Só não enten<strong>do</strong> por que ele não usou<br />

a pistola fhaser contra mim. Seria fácil acertar-me. Viro-me<br />

para a luz vermelha giratória piscan<strong>do</strong> no disco voa<strong>do</strong>r mais<br />

próximo. Ao la<strong>do</strong>, escuda<strong>do</strong> atrás da porta da nave, um aliem<br />

me tem na mira. Sem me importar, com a arma na mão, avanço<br />

na direção dele. Nesse momento, ouço o disparo e sinto<br />

meu corpo deter-se com o impacto.<br />

“Mas que merda de fhaser é esse que faz barulho de pistola?”<br />

penso enquanto sinto as pernas fraquejarem. Agarra<strong>do</strong> ao retrovisor<br />

<strong>do</strong> disco voa<strong>do</strong>r tento manter-me de pé, mas é inútil,<br />

escorrego lentamente para o chão.<br />

Ouço a correria <strong>do</strong>s cinzentos bem próxima e o alari<strong>do</strong> deles.<br />

Outra coisa estranha: Aliens geralmente são telepáticos, mas<br />

esses cinzentos falam como se fossem humanos! Talvez estejam<br />

nos mimetizan<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> bem, mas desde quan<strong>do</strong> vestem<br />

uniformes cinzas ao estilo da polícia militar?<br />

— Polícia! Larguem as armas, to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> no chão!<br />

Os aliens que iriam me fornecer o chip jogam-se ao chão<br />

como bandi<strong>do</strong>s terráqueos comuns. Sequer tiveram tempo de<br />

entrarem nos ... carros... Carros? Nem consegui um chip e já<br />

estou numa viagem insana? Para onde foram os alienígenas?<br />

E de onde saiu, de repente, tanta polícia?<br />

Minha consciência me aban<strong>do</strong>na, mas estou surpreendentemente<br />

lúci<strong>do</strong>. A sensação é de paz. O que me injetaram dessa<br />

vez? Esses aliens mexeram no meu DNA de novo? Não sei,<br />

mas vou querer mais. Estranho mesmo é ver meu corpo no<br />

chão. Acho que começou a viagem...<br />

Contu<strong>do</strong> me incomoda uma serpente de sangue rastejan<strong>do</strong><br />

69


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

debaixo <strong>do</strong> meu corpo, em busca das partes baixas <strong>do</strong> chão.<br />

Sou biólogo, mas odeio cobras. Na verdade tenho fobia a to<strong>do</strong><br />

animal peçonhento. Esse ofídio liquefeito, ondulante, rubro e<br />

quente avança libertan<strong>do</strong>-se das minhas artérias e veias, aos<br />

poucos se expandin<strong>do</strong> além de mim, aos poucos levan<strong>do</strong> minha<br />

vida para alguma região estranha, alguma dimensão além<br />

da imaginação que tento compreender.<br />

Mesmo com toda a confusão e corre-corre à minha volta, a<br />

noite está tão calma e sem pressa que relaxo e espero. Olho<br />

para o céu e me surpreen<strong>do</strong>, pois tu<strong>do</strong> nele é luz e movimento.<br />

Todas as estrelas estão visíveis. Toda a cidade brilha. É<br />

uma noite iluminada e o céu desce. Está perto. Os verdadeiros<br />

aliens estão chegan<strong>do</strong> por um túnel de luz. Aceno para eles.<br />

Olho pela última vez meu corpo sem vida e entro na nave prateada<br />

transparente. Deixo lá embaixo as viaturas policiais e o<br />

nervosismo de seus giroflex. As vozes vão fican<strong>do</strong> distantes,<br />

dissipan<strong>do</strong>-se como num fade out.<br />

–– Central, viatura <strong>do</strong>is, quatro, nove. Homem feri<strong>do</strong>, possivelmente<br />

usuário de drogas, reagiu à prisão efetuan<strong>do</strong> disparos<br />

contra a equipe durante abordagem, na Praça <strong>do</strong>s Germânios.<br />

Necessita socorro urgente, positivo?<br />

–– ... Tráfico de drogas não é um fato inusita<strong>do</strong> aqui em Peruíbe,<br />

mas explicitamente, e na praça <strong>do</strong> centro da cidade é. Solicitada,<br />

a polícia chegou para flagrar traficantes e usuários em<br />

atividade ilícitas tão à vontade como se estivessem trocan<strong>do</strong><br />

figurinhas. Entre eles, o dependente químico, conheci<strong>do</strong> como<br />

Dr. Abduzi<strong>do</strong>, famoso por suas espalhafatosas campanhas na<br />

mídia defenden<strong>do</strong> que o poder político mundial deveria ser<br />

entregue aos alienígenas escondi<strong>do</strong>s em bases na Serra <strong>do</strong>s<br />

Itatins. Já foi preso algumas vezes por estar descontrola<strong>do</strong> e<br />

pon<strong>do</strong> a própria vida em perigo. Segun<strong>do</strong> o Tenente Eteval<strong>do</strong>,<br />

que coman<strong>do</strong>u a equipe da polícia, desta vez o Dr. Abduzi-<br />

70


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

<strong>do</strong> parecia muito mais alucina<strong>do</strong>. Estava arma<strong>do</strong> e enfrentou<br />

a polícia a tiros. Aos gritos ele se referia aos policiais como<br />

ETs. Inevitavelmente foi feri<strong>do</strong> e acabou morto no local, há<br />

poucos minutos, ao resistir a prisão, durante a operação policial<br />

na Praça <strong>do</strong>s Germânios.<br />

Este é o seu repórter <strong>do</strong> “Na Verdade”, da TV Praia das artes.<br />

Amanhã, novos detalhes de mais essa história de desgraças<br />

impostas a sociedade pelas drogas e seus traficantes que<br />

jamais se importam com a destruição de milhares de vidas<br />

<strong>do</strong>minadas pela dependência química. Para eles tu<strong>do</strong> que interessa<br />

é o lucro.<br />

71


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

José Muniz de Carvalho<br />

José Muniz de Carvalho<br />

Natural de Guararapes SP. Gradua<strong>do</strong> em Letras<br />

e Pós-gradua<strong>do</strong> em Docência da Segurança<br />

pública. Titular da cadeira nº10 da Academia<br />

Peruibense de Letras. Autor de diversos contos<br />

e poemas, que retratam o cotidiano <strong>do</strong> povo<br />

brasileiro. Participante de diversas Antologias<br />

da Câmara brasileira de jovens escritores.<br />

jmunizcarvalho@bol.com.br<br />

Encantos<br />

Dos lugares por onde andei só saudades tenho senti<strong>do</strong><br />

Pois eu vi tantas belezas e deixei muitos amigos<br />

Mas lugar encanta<strong>do</strong>r como este não se encontra<br />

Peruíbe tu és mágica a história assim nos aponta<br />

Lá nos tempos de Cabral já encantava os navegantes<br />

Com suas praias e o esplen<strong>do</strong>r da muralha <strong>do</strong> gigante<br />

Por suas terras caminhou o tal padre voa<strong>do</strong>r<br />

Ensinan<strong>do</strong> suas crenças os índios catequizou<br />

Pobres escravos africanos aqui chegavam às centenas<br />

E a praia <strong>do</strong> Guaraú os abrigava em quarentena<br />

Dali seguia o calvário naqueles navios negreiros<br />

Na praça no porto de Santos os trocavam por ouro ou dinheiro<br />

Pra fugir <strong>do</strong> stress da metrópole Peruíbe tornou-se o destino<br />

Sinta-se bem turista amigo pois tu sempre serás bem-vin<strong>do</strong><br />

Não posso deixar de falar das estrelas e corpos celestes<br />

Peruíbe recebe visita até de seres extraterrestres.<br />

72


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Gratidão<br />

Peruíbe eu lhe sou grato<br />

Por em seus braços me acolher<br />

Pois cheguei um tanto acanha<strong>do</strong><br />

Mas logo me apaixonei<br />

São tantas as maravilhas<br />

Que em teu solo encontrei<br />

Belas praias sol natureza<br />

E tantas outras riquezas<br />

Que o cria<strong>do</strong>r a ti concedeu<br />

Ser humano ambicioso<br />

Insiste em ameaçar<br />

O ambiente em que vive<br />

Para milhões poder ganhar<br />

Porém os planos falharam<br />

Eu faço questão de contar<br />

Quiseram construir uma usina<br />

Que seria um erro fatal<br />

Porém concebeu-se a Jureia<br />

Patrimônio mundial.<br />

73


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Uma Bela Visão<br />

Vou falar da alegria que sinto to<strong>do</strong>s os dias bem ce<strong>do</strong> a me levantar<br />

Quan<strong>do</strong> abro esta janela e vejo a imagem tão bela da nossa serra<br />

<strong>do</strong> mar<br />

Eu contemplo este gigante majestoso e elegante<br />

Que com o verde <strong>do</strong> seu manto através desta moldura<br />

Completa a bela pintura <strong>do</strong> mestre celestial<br />

Sua flora é muito rica é o pulmão deste planeta<br />

A fauna compõe a riqueza deste parque estadual<br />

Por aqui temos Arara Cotia Onça Capivara<br />

Vea<strong>do</strong> Bugio Sucuri Tucano Jacu e Urutau<br />

Pra manter este presente que o bom Deus criou pra gente<br />

Só nos resta conservar<br />

Vou gritar bem alto agora proteja a fauna e a flora deste berço<br />

ambiental<br />

O Brasil dispõe de riquezas vejam só quantas belezas<br />

Agora vou descrever<br />

Amazônia Mata atlântica caatinga e o Cerra<strong>do</strong><br />

Os grandes rios e lagos lá <strong>do</strong> belo pantanal.<br />

74


José Romeu Dutra<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

José Romeu Dutra<br />

Paulistano, filho de Farmacêuticos, após<br />

aprender a profissão <strong>do</strong>s pais, seguiu carreira na<br />

Polícia Militar, aposentan<strong>do</strong>-se Major PM. Escreve<br />

desde sua a<strong>do</strong>lescência, com inspirações<br />

em Carlos Drummond de Andrade, lançan<strong>do</strong> ao<br />

papel palavras em pequenos versos. É membro<br />

da Academia Peruibense de Letras e ocupa a cadeira<br />

22. Seu patrono é Graciliano Ramos<br />

dutra@jrdutra.com.br<br />

Minha Jovem<br />

Deitei em teu colo,<br />

Em tuas areias,<br />

A<strong>do</strong>rmeci.<br />

Na brisa que o vento traz,<br />

A mistura de aromas,<br />

Da mata,<br />

Do mar.<br />

Aos olhos,<br />

O imponente,<br />

O majestoso,<br />

Sempre inspira<strong>do</strong>r,<br />

Itatins.<br />

Verdejante sentinela,<br />

Guardan<strong>do</strong> às costas,<br />

A terra procurada,<br />

Riqueza de teu seio,<br />

Peruibe,<br />

Minha jovem amada.<br />

75


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

O Terreno de meu Avô<br />

Naquela rua de terra me criei, embora não fosse onde morava,<br />

era lá que minha alma vivia to<strong>do</strong> seu esplen<strong>do</strong>r.<br />

Corria e brincava com minha infância, que por vezes era<br />

minha infância que comigo brincava, com tanta intensidade,<br />

que ora fazia <strong>do</strong> tempo seu subordina<strong>do</strong> e outra se subordinava<br />

a ele.<br />

Aquela terra da rua até hoje empoeira minhas lembranças,<br />

não para fazer esquecê-las, mas marcan<strong>do</strong>-as como um pó<br />

mágico, com as travessuras inocentes de criança.<br />

Meu tempo era to<strong>do</strong> preenchi<strong>do</strong>. Do abrir <strong>do</strong>s olhos às bênçãos<br />

de minha querida Mãe, meus dias eram feitos de estu<strong>do</strong>s,<br />

o mais precioso tesouro que meus Pais me deram, brincadeiras,<br />

café da manhã, brincadeiras, almoço, brincadeiras, café<br />

da tarde, brincadeiras, algumas tarefas diárias, brincadeiras,<br />

brincadeiras, brincadeiras...<br />

Era nesta rua de terra que meus Avós maternos moravam e<br />

onde to<strong>do</strong> <strong>do</strong>mingo a família se reunia, com adultos tentan<strong>do</strong><br />

voltar a serem crianças e nós, as crianças, sen<strong>do</strong> crianças. De<br />

futebol, taco, de pipas e peões, de macarrão, vinho, risadas e<br />

alegria.<br />

Era nesta rua de terra que meu Avô rotineiramente se dirigia<br />

a um terreno de sua propriedade, no qual nunca entrávamos<br />

sozinhos, mas sempre aguardávamos o seu chama<strong>do</strong>:<br />

_ O Vô “vai” no terreno buscar verduras (ou frutas ou ferramentas...<br />

tinha de tu<strong>do</strong>), me acompanhe, para me ajudar?<br />

Não me recor<strong>do</strong>, se alguma vez perdi a oportunidade de<br />

acompanhá-lo dizen<strong>do</strong> “Não” a ele.<br />

Aquele terreno era mágico. Ele era maior <strong>do</strong> que o mun<strong>do</strong><br />

que existia fora dele. Árvores frutíferas: banana, laranja,<br />

mexerica, cidra, maracujá. Dali saíam abóboras e figos que<br />

viravam verdadeira perdição, nos <strong>do</strong>ces que Vovó fazia, além<br />

<strong>do</strong>s morangos, que se escondiam por debaixo de suas folhas.<br />

76


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Possuía uma trilha, que o cortava desde o portão de madeira<br />

com ferrolho feito pelo meu Avô, até “lá no fun<strong>do</strong>”, onde<br />

as bananeiras encobriam o muro da divisa. Era nessa trilha<br />

que corríamos sob os alertas de “não pise na horta”, “cuida<strong>do</strong><br />

com o arame farpa<strong>do</strong>” e aquele que nunca cumpríamos: “as<br />

mexericas estão verdes, deixa amadurecer para apanhá-las”.<br />

Impossível cumprir essa ordem, se é que você conhece mexerica<br />

carioquinha... e verde.<br />

Alguns metros da entrada havia um barracão de madeira<br />

coberto de telhas de latão, que de tão alto e tão grande, fazia<br />

pender em seu teto, fileiras de arruelas, porcas, <strong>do</strong>bradiças,<br />

que formavam uma enorme fieira, que mesmo pesadas, tilintavam<br />

quan<strong>do</strong> o vento soprava mais forte.<br />

Ah... o vento!<br />

Quantas pipas trouxera caprichosamente àquele terreno.<br />

Cada qual, uma estória, que de contos em encantos, formaram<br />

a minha história.<br />

Das pipas, falarei outro dia.<br />

77


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Martha Zelia Zachar Fujita<br />

Martha Zelia Zachar Fujita<br />

Nascida em Mogi das Cruzes, SP. Artista Plástica,<br />

Poeta... Suas Obras: Aleatórias I, Aleatórias<br />

II, Aleatórias III, Noturno, Poucas palavras, Caminhos,<br />

Sons perdi<strong>do</strong>s, Nostalgia, Águas claras.<br />

É uma das funda<strong>do</strong>ras da Academia Peruibense<br />

de Letras, onde ocupa a cadeira de nº 18, e tem<br />

por patrono Érico Veríssimo.<br />

Crendices <strong>do</strong> Itatins<br />

Envolta em mistérios<br />

a majestosa Serra <strong>do</strong> Itatins<br />

com suas lendas<br />

e contos populares<br />

é “Morada de Deuses”...<br />

De lá surgem<br />

seres extraterrestres,<br />

aberrações...<br />

seres invisíveis<br />

Que atravessam<br />

O “Portal da Pedra”<br />

Que emana<br />

grande poder de energia<br />

sagrada ampara a cura...<br />

Bolas de fogo<br />

Percorrem o mar<br />

e somem montanha adentro...<br />

Pontos de luzes<br />

sobem e descem <strong>do</strong> céu...<br />

Tu<strong>do</strong> não passa<br />

De crendice popular...<br />

Podemos acreditar ?....<br />

78


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Muito além<br />

Sonhei que andava na praia,<br />

e nas águas via passar<br />

cenas da minha vida...<br />

Nas ondas que quebravam,<br />

via os momentos difíceis,<br />

onde me sentia morrer...<br />

Mas, a vida continua<br />

e somos eternos aprendizes...<br />

Amar a si mesmo,<br />

para saber amar ao próximo...<br />

Não viver sem ver a vida.<br />

Não sofrer pelo passa<strong>do</strong>.<br />

O presente é passageiro...<br />

A existência perde<br />

o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> existir.<br />

Forte diante da vida,<br />

aceito o tempo que sobra<br />

para ainda ser feliz.<br />

A vida não é em vão...<br />

79


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Grande segre<strong>do</strong><br />

Toda e qualquer esperança<br />

some no horizonte.<br />

Vejo além <strong>do</strong> mar<br />

tu<strong>do</strong> o que reprime, desconserta...<br />

O triste la<strong>do</strong> das coisas,<br />

das certezas e incertezas...<br />

Vejo algo além <strong>do</strong> mar,<br />

além <strong>do</strong> céu<br />

e flertan<strong>do</strong> com o passa<strong>do</strong><br />

sinto angústia<br />

de um tempo ausente,<br />

<strong>do</strong>s tombos da vida<br />

pelo mun<strong>do</strong>...<br />

Do sonho que inspira<br />

ao vício que cresce<br />

ante a morte...<br />

Aquele que não vive,<br />

apenas espera<br />

o próximo minuto...<br />

E quan<strong>do</strong> o espelho <strong>do</strong> destino<br />

mostra a outra face,<br />

perde-se o rumo da coerência.<br />

Sem chão,<br />

o tombo é inevitável.<br />

Os caminhos tornam-se<br />

mais difíceis...<br />

As soluções parecem<br />

não existir...<br />

Surgem barreiras...dificuldades...<br />

Mas... as saídas existem...<br />

Basta acreditar<br />

que somos capazes<br />

80


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

E que podemos vencer<br />

os momentos ruins.<br />

Sempre existe o recomeço.<br />

E como os raios <strong>do</strong> sol<br />

no amanhecer<br />

existe uma vida esperan<strong>do</strong>...<br />

81


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Ricar<strong>do</strong> Ernesto Rose<br />

Jornalista, escreve sobre sustentabilidade,<br />

ten<strong>do</strong> publica<strong>do</strong> <strong>do</strong>is livros sobre o tema.<br />

Gradua<strong>do</strong> e pós-gradua<strong>do</strong> em Filosofia, é<br />

autor de ensaios de filosofia e sociologia,<br />

lança<strong>do</strong>s na mídia especializada e em livro.<br />

rerzeit@hotmail.com<br />

Dona Nena<br />

Ela vivia sozinha numa casa de madeira, sem pintura, no final<br />

de um caminho de areia grossa e amarelada, ladea<strong>do</strong> pelos<br />

enferruja<strong>do</strong>s postes <strong>do</strong> telégrafo, onde mais tarde seria o início<br />

da avenida Anchieta. O terreno, sem cerca, era toma<strong>do</strong><br />

por goiabeiras, cajueiros, chapéus de sol, e compartilha<strong>do</strong> por<br />

galinhas, alguns gatos e três cachorros. De lá, caminhava-se<br />

uns quinze minutos para chegar ao centro da vila de Peruíbe.<br />

Mesmo afastada <strong>do</strong> convívio da vila, <strong>do</strong>na Nena era conhecida<br />

no núcleo de ruas em torno da praça e da pequena igreja.<br />

Na modesta vila de pesca<strong>do</strong>res, relativamente isolada, com<br />

pouca comunicação com os grandes centros, a velha senhora<br />

despertava curiosidade e um certo temor.<br />

Ninguém conhecia as origens de <strong>do</strong>na Nena. Os antigos lembravam<br />

que quan<strong>do</strong> eram jovens ela já tinha certa idade, e<br />

sempre vivera ali naquela casa isolada, perto da praia e junto<br />

ao rio Preto. Gentil mas reservada, a velha não tinha amigos<br />

e pouco falava com as pessoas. Participava da missa nas manhãs<br />

de <strong>do</strong>mingo, mas, quieta e pensativa, voltava para casa<br />

logo após a bênção final. Havia, mas ninguém sabia exatamente<br />

o quê, algo de misterioso nessa senhora.<br />

Entre os peruibenses de então, principalmente os mais velhos,<br />

circulavam muitas histórias sobre ela. O velho Vital, pesca<strong>do</strong>r<br />

aposenta<strong>do</strong>, comentava que conhecia “a velha Nena” desde a<br />

82


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

infância, e que nunca a havia visto de aparência mais jovem.<br />

Tinha certeza, dizia, que a velha seria uma bruxa e, ali em<br />

Peruíbe, teria descoberto uma erva que lhe adiava a morte.<br />

A vizinha de Vital, <strong>do</strong>na Mocinha, cujos antepassa<strong>do</strong>s eram<br />

caiçaras e guaranis que sempre haviam vivi<strong>do</strong> na região, dizia<br />

que a velha seria uma feiticeira; que devia ter algum pacto<br />

com a morte e com o mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> além.<br />

De fato, o comportamento de <strong>do</strong>na Nena causava muita estranheza<br />

entre aquelas pessoas simples. Nos dias frios e úmi<strong>do</strong>s<br />

de outono, quan<strong>do</strong> a forte garoa e o vento sudeste mantinham<br />

to<strong>do</strong>s em casa à volta <strong>do</strong>s fogões a lenha, a velha senhora<br />

havia si<strong>do</strong> vista diversas vezes, coberta por grosso casaco,<br />

caminhan<strong>do</strong> na praia gesticulan<strong>do</strong> e como que conversan<strong>do</strong><br />

com alguém. A mesma cena foi testemunhada em três outras<br />

ocasiões, exatamente às vésperas <strong>do</strong>s naufrágios de pequenos<br />

barcos de pesca, nos quais morrem pesca<strong>do</strong>res da vila. Houve<br />

até quem dissesse ter observa<strong>do</strong>, ao anoitecer, escondi<strong>do</strong> na<br />

alta vegetação que existia perto da praia, <strong>do</strong>na Nena falan<strong>do</strong><br />

com <strong>do</strong>is vultos, que depois de abraçarem a velha, caminharam<br />

em direção às ondas e desapareceram no mar.<br />

Certo dia, assim disseram os mora<strong>do</strong>res, <strong>do</strong>na Nena desapareceu<br />

da cidade, junto com seus animais. Sobrou apenas a casa<br />

vazia, que foi se degradan<strong>do</strong> até por fim ser demolida. Das<br />

árvores, uma ou outra ainda continua ali até hoje. Dizem as<br />

más línguas que a velha tivera uma visão de como a cidade<br />

se transformaria, e que por isso teria resolvi<strong>do</strong> ir para outras<br />

paragens.<br />

Num desses dias de garoa e vento, passan<strong>do</strong> pela praia ao<br />

anoitecer, tive a impressão de ter visto o vulto recurva<strong>do</strong> de<br />

uma velha, caminhan<strong>do</strong> para a água e por fim desaparecer no<br />

mar. Mas acho que foi só impressão.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Terezinha F. <strong>do</strong> Nascimento Dantas<br />

Membro <strong>do</strong> Movimento Poético em São Paulo;<br />

associada à Casa <strong>do</strong> Poeta Lampião de Gás de<br />

São Paulo, desde 2009 e à Associação Portuguesa<br />

de Poetas. Mãe <strong>do</strong>s Poetas na Casa Lampião de Gás<br />

em 2013. Autora <strong>do</strong>s livros: “Escola gratuita”, “As<br />

Camponesas”, “Talentos de Luz” e “Meus primeiros<br />

versos”. Participação em antologias poéticas da Casa<br />

<strong>do</strong> Poeta de São Paulo.<br />

tecadam14@gmail.com<br />

O pássaro e a rosa<br />

Havia um pássaro há muitos anos atrás, que era aventureiro.<br />

Às vezes ele saia com outros pássaros <strong>do</strong> ban<strong>do</strong> e, vez por<br />

outra, gostava de se aventurar pelo mun<strong>do</strong> de meu Deus.<br />

Seu nome era: Azul, pois esta era a cor de suas penas que,<br />

por sinal, eram bonitas e bem cuidadas.<br />

Onde o pássaro Azul estava, parece que tu<strong>do</strong> mudava a sua<br />

volta, pois ele irradiava alegria, otimismo e paz; to<strong>do</strong>s gostavam<br />

de estar perto dele e fazerem parte de sua vida.<br />

Do que o pássaro Azul mais gostava era de sua liberdade,<br />

conhecer outros lugares: jardins, parques e estar em contato<br />

com a natureza da qual fazia parte.<br />

Um dia ele estava no jardim da casa da Amélia, uma menina<br />

que gostava muito dele e falou:<br />

— Pássaro Azul, me conta suas aventuras, por onde você<br />

tem anda<strong>do</strong>, o que você encontra, como se sente?<br />

— Calma, calma, respondeu pássaro Azul, vou para vários<br />

lugares e vejo muitas coisas, mas gosto das flores porque<br />

elas enfeitam com sua beleza, oferecem seus perfumes e estão<br />

sempre gratas pelo seu trabalho em servir à vida.<br />

— Eu também gosto muito das flores e percebi que elas<br />

são <strong>do</strong> jeitinho que você está descreven<strong>do</strong>, então fico pensan<strong>do</strong>...<br />

que engraça<strong>do</strong> toda natureza oferece alguma coisa de si<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

em silêncio e gratidão, por que os seres humanos não conseguem<br />

seguir este exemplo?<br />

— Bem, de humanos eu não enten<strong>do</strong>, mas o que sei é que a<br />

natureza tem harmonia que lhe é própria, talvez ela exista para<br />

ensinar os homens a refletirem sobre o lugar de cada coisa no<br />

universo.<br />

— Acho que você tem razão, pássaro Azul, na sua colocação,<br />

porque cada coisa tem seu próprio mecanismo e está aí<br />

para nos ensinar.<br />

— Às vezes tenho vontade de ser um pássaro ou uma flor<br />

e conservar a beleza e simplicidade dadas por Deus.<br />

— Amélia, como você é minha amiga e entende minha<br />

linguagem, vou te contar uma estória fascinante, de uma de<br />

minhas aventuras.<br />

— Certa vez, já faz um bom tempo, eu me perdi pelas<br />

matas da Jureia, em Peruíbe. Eu tinha me afasta<strong>do</strong> <strong>do</strong> ban<strong>do</strong> e<br />

voei, voei... fiquei muito cansa<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong> percebi, estava em<br />

um <strong>abismo</strong>, no meio de to<strong>do</strong> aquele mataréu. O cansaço me<br />

fez a<strong>do</strong>rmecer e quan<strong>do</strong> acordei mais refeito, resolvi explorar<br />

aquela região perdida na mata. Saí voan<strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>samente,<br />

observan<strong>do</strong> a vegetação, quan<strong>do</strong> de repente, alguma coisa me<br />

chamou a atenção: comecei sentir um aroma de rosa, pensei:<br />

rosa por aqui... impossível! Fui seguin<strong>do</strong> na direção <strong>do</strong> perfume<br />

e visualizei a rosa. Realmente era uma rosa de verdade,<br />

com perfume, espinhos e tu<strong>do</strong>. No começo fiquei meio atrapalha<strong>do</strong>,<br />

pensan<strong>do</strong>: será que estou imaginan<strong>do</strong> coisas, não é<br />

possível. Firmei os olhos e vi que realmente era a rosa. Fiquei<br />

a apreciá-la meio de longe encabula<strong>do</strong>, depois me aproximei<br />

e puxei conversa com ela:<br />

— Que fazes perdida aqui neste <strong>abismo</strong>, sem contato com<br />

ninguém, como consegue sobreviver?<br />

A rosa sorriu, o mais belo sorriso de uma flor e me disse:<br />

— Não estou sozinha, toda vegetação da mata é minha<br />

companhia, temos vida e obedecemos leis que nos sustentam,<br />

85


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

irradian<strong>do</strong> força e luz para sobrevivermos.<br />

— Ainda perguntei: rosa <strong>do</strong> <strong>abismo</strong>, você é feliz neste lugar<br />

estranho, sombrio, esquisito e longe de tu<strong>do</strong>?<br />

— Sim, pássaro Azul, sou feliz onde fui colocada e por ser<br />

a única que enfeita e perfuma este <strong>abismo</strong>, ele não se torna tão<br />

sombrio como parece e tem a energia divina que está em tu<strong>do</strong><br />

e to<strong>do</strong>s não importa o lugar.<br />

— Fui escolhida para este lugar, me sinto honrada porque<br />

sou única aqui, mas quan<strong>do</strong> já não estiver mais aqui, quem<br />

sabe terei outras rosas para me fazer companhia?<br />

O pássaro Azul ainda arriscou:<br />

— Deixa ver se entendi, você é feliz, exemplo de aceitação,<br />

humildade, gratidão e obediência a este universo infinito,<br />

que se utiliza de cada um de nós, com uma finalidade.<br />

Me despedi da rosa <strong>do</strong> <strong>abismo</strong>, agradeci pela grande lição<br />

e trouxe em minha alma a fragrância da beleza de uma rosa,<br />

não importa o lugar onde foi colocada.<br />

Amélia então se expressou:<br />

— Que linda sua aventura, encontrar com uma rosa perfumada<br />

no meio <strong>do</strong> <strong>abismo</strong>, não é para qualquer um.<br />

— Por isso sou grato e feliz, por ter asas e poder voar, mas<br />

compreenden<strong>do</strong> que cada um está no lugar certo.<br />

— Hoje fiquei feliz de conversar com você, pássaro Azul,<br />

e conhecer a estória da rosa <strong>do</strong> <strong>abismo</strong>, na Jureia, Peruíbe.<br />

Mesmo no <strong>abismo</strong>, o divino se manifesta para mostrar às<br />

criaturas o seu poder, o poder de criar!<br />

---ooo000ooo---<br />

Foi escrito dia 26-03-2018<br />

Este conto foi uma inspiração baseada em minhas crenças,<br />

filmes, livros, palestras; to<strong>do</strong> um conteú<strong>do</strong> que forneceu material<br />

para minha imaginação poder criar sua fantasia.<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

A <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo<br />

Por que chora rosa <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Perdida em um recanto só;<br />

Entre as árvores da mata<br />

Neste <strong>abismo</strong> que dá <strong>do</strong>?<br />

Choro a solidão<br />

De ter perdi<strong>do</strong> o meu paraíso;<br />

Perdida neste <strong>abismo</strong><br />

Não diviso um sorriso.<br />

Trago uma recordação<br />

Do mun<strong>do</strong> em que vivi;<br />

Era a mais bela das rosas<br />

Beleza igual, nunca vi.<br />

Um dia eu fui banida<br />

Pelo Senhor <strong>do</strong> jardim;<br />

Porque era muito orgulhosa<br />

Da beleza que havia em mim.<br />

O Senhor então me disse:<br />

Vai para o <strong>abismo</strong> aprender;<br />

A humildade é uma virtude<br />

Pra nunca mais esquecer.<br />

Me achava melhor que as outras<br />

Humilhava sem compaixão;<br />

Hoje neste <strong>abismo</strong> me sinto<br />

Sou livre, nesta prisão!<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Poesia<br />

A poesia faz parte <strong>do</strong> meu ser<br />

Quan<strong>do</strong> não sabia quem eu era;<br />

Mas tu<strong>do</strong> que eu sentia<br />

Era uma linda primavera.<br />

Primavera <strong>do</strong>s sonhos<br />

De menina a crescer;<br />

A descobrir cada coisa<br />

Acontecen<strong>do</strong> em meu ser.<br />

A poesia foi crescen<strong>do</strong> em mim<br />

Que ia também desenvolven<strong>do</strong>.<br />

Depois descobri o que sentia<br />

Que precisava escrever;<br />

Era a poesia nascen<strong>do</strong><br />

Fazen<strong>do</strong> parte <strong>do</strong> meu viver.<br />

Assim me tornei poetisa<br />

Sem saber mesmo que era;<br />

Um rouxinol me contou<br />

Quan<strong>do</strong> abri minha janela.<br />

Poesia fonte da vida<br />

Nascente <strong>do</strong> meu viver;<br />

Navego em suas águas<br />

Descobrin<strong>do</strong> meu ser.<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Thereza Costa<br />

Participação nas Coletâneas II, III, IV e na presente<br />

edição da APLetras. Participação em Crônicas e Poesia no<br />

Jornal <strong>do</strong> Núcleo da 3ª Idade, perío<strong>do</strong> 2008 a 2010. Diploma<br />

Honra ao Mérito no 3º Concurso Literário Núcleo<br />

da 3ª Idade Peruíbe. Participação na Mostra de Cultura e<br />

Arte, Prefeitura Peruíbe, 2009. 1º Lugar Etapa Municipal<br />

Mapa Cultural Paulista 2009/2010, Modalidade Crônica.<br />

Participação 11º Concurso Talentos da Maturidade ( Bancos<br />

Santander e Real).<br />

thereza.peruibe@hotmail.com<br />

<strong>Rosa</strong> ou Rainha<br />

Tanto faz, mas “<strong>do</strong> Abismo” já torna essa coisa misteriosa,<br />

fugitiva, inalcançável. E por isso mesmo perseguida por to<strong>do</strong>s<br />

que foram atingi<strong>do</strong>s pelo fascínio das lendas <strong>do</strong> lugar e<br />

em to<strong>do</strong> lugar. E como são muitos os busca<strong>do</strong>res, pelo tempo<br />

afora, tem ela seu séquito... séquito <strong>do</strong> quê ou de quem, mesmo?<br />

Nem eles sabem. São os Cavaleiros <strong>do</strong> Graal, de to<strong>do</strong>s<br />

os Poetas, de Peruíbe, da Jureia... Engajei-me nessa turba nos<br />

primeiros meses de residência aqui.<br />

Egípcios sobraçavam feixes de papiros ou colhiam lótus nos<br />

brejos, páli<strong>do</strong>s símbolos da flor perfeita de sua devoção, ela<br />

não medrava nos solos mas em suas almas. To<strong>do</strong>s os místicos<br />

ao cruzar as mãos sobre o peito imaginam aprisionar sua rainha<br />

ou rosa mística, e parecem sossegar, por um tempo.<br />

Também sou peregrina da <strong>Rosa</strong>. Desde a infância fui especulativa<br />

quanto às plantinhas humildes <strong>do</strong>s barrancos, das beiradas<br />

de caminhos... Mas se levava uma muda ou semente<br />

para casa, lá vinha mamãe... “não plante isso, não presta, vira<br />

mato!” Mas como já escrevi nas minhas Memórias, eu curtia<br />

às escondidas e por muitas horas açucenas e capichus e sabo-<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

reava frutinhas estranhas como as amoras silvestres e os roxos<br />

mirtilos que hoje se sabe cosméticos além de comestíveis e<br />

muito caros no merca<strong>do</strong>.<br />

Minha mãe cultivava to<strong>do</strong> tipo de flores de jardim e quanto<br />

mais difíceis ou “de estufa”, mais ela cobiçava. Assim falava<br />

de uma distante Rainha <strong>do</strong> Abismo, e sobre isso também comentei<br />

à página 136 <strong>do</strong> livro “Amaenga”... Pois bem, em uma<br />

feira popular longe daqui vi as batatas ou bulbos da planta<br />

que asseguravam serem de Rainha <strong>do</strong> Abismo!... Comprei,<br />

plantei e em pouco tempo pudemos admirar a folhagem vistosa<br />

e os buquezinhos rosa aveluda<strong>do</strong>s, lin<strong>do</strong>s, porém longe da<br />

esperada magnificência de uma Rainha.<br />

Minha mãe parecia incrédula... Por certo ela também só ouvira<br />

falar, jamais vira a flor misteriosa. E para ela o sonho<br />

permaneceu. Isto faz muito tempo e mamãe já foi transplantada<br />

para os Jardins Eternos. Quanto a mim, imediatamente<br />

associei a begônia com seus buquês a uma plantinha já minha<br />

conhecida de infância, <strong>do</strong>s barrancos úmi<strong>do</strong>s, menorzinha e<br />

de flores vermelhas; seria uma subespécie.<br />

Por isso foi com muita ansiedade que assisti em uma TV local,<br />

Programa Revista Eletrônica... uma subida ao Morro da<br />

Jureia em busca da Rainha <strong>do</strong> Abismo, que a lenda dizia só<br />

existir aqui. E foram. E eu vi na tela. Foi mostrada de relance,<br />

em meio ao matagal... Grandes folhas concorren<strong>do</strong> com<br />

o samambaial de entorno... Mas nada com parecença de rosa<br />

ou de rainha, e nem era um <strong>abismo</strong>, era um matagal hirsuto<br />

onde o buquê medíocre não conseguia sobressair. A subida <strong>do</strong><br />

morro fora demorada e cansativa mas o final foi de minutos e<br />

frustrante, pelo menos para mim, que assistia de sofá o descobrimento<br />

da Rainha <strong>do</strong> Abismo, de Peruíbe! A planta era uma<br />

versão maior, uma gigantona, comparada à minha coleção de<br />

90


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

begônias medíocres, ora bolas!<br />

Mas valeu para desfazer o mistério e louvar o esforço <strong>do</strong>s<br />

desbrava<strong>do</strong>res. Talvez algum dia retornem a esse Itatins de<br />

tantas lendas, para outra busca, pois mamãe também falava<br />

de uma lagoa com marrequinhas de ouro que existiria perdida<br />

por aqui.<br />

Essa lagoa <strong>do</strong>urada já foi celebrada, em versos e prosa, por<br />

Martins Fontes, em seu livro “Paulistânia”, 1934. E também<br />

pode ser desse lago encanta<strong>do</strong> o Tucano de Ouro <strong>do</strong> escritor<br />

iguapense Roberto Fortes... e vejam bem que esse Roberto<br />

não é <strong>do</strong> tipo da<strong>do</strong> a quimeras (só um pouquinho). E quiçá<br />

outros aventureiros possam ter mais sorte ao cruzar com os<br />

habitantes da noite que cultivam suas roças e desaparecem<br />

aos primeiros tons da madrugada; não são hostis mas fóbicos<br />

à luz <strong>do</strong> sol, vide Maya Ekman, in memoriam.<br />

Mas, leitores, não sorriam, ou terão que sorrir também <strong>do</strong>s<br />

que avistaram o Fantasma <strong>do</strong> Portal, monge guardião da Morada<br />

<strong>do</strong>s Deuses ou Olimpo de Peruíbe! Eu não rio, não, eu<br />

tenho é muita vontade de adivinhar a palavra de passe para o<br />

interior dessa Rocha que já imagino colossal geo<strong>do</strong> incrusta<strong>do</strong><br />

de ametistas piscantes como os vagalumes das trilhas <strong>do</strong> Padre<br />

Voa<strong>do</strong>r (tem que ser ametistas, note-se). Eu não inventei<br />

estas lendas, elas vêm de longe no Tempo, antes mesmo de<br />

Martim Afonso e Cabral! Talvez começassem a ser registradas<br />

pelos jesuítas ou por aquele aventureiro Pero Correa, o<br />

tal que depois de uma vida pregressa resolveu se tornar padre<br />

mas... por não merecimento acabou morto bem mata<strong>do</strong> pelos<br />

índios. Aqui se faz aqui se paga, de um jeito ou de outro.<br />

No Padre Voa<strong>do</strong>r, Abarebebê, nosso Leonar<strong>do</strong> Nunes, eu acredito<br />

piamente. Quanto ao Portal aberto esporadicamente e só<br />

91


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

para os habitantes internos ou visitantes extraterrenos... bem...<br />

fica à conta de gentes feito eu, que fiz <strong>do</strong> Itatins um geo<strong>do</strong><br />

monumental. É para meu enleio ou de mentes iguais, mas<br />

também especulação de safa<strong>do</strong>s que elegeram Peruíbe a Capital<br />

da Ufologia, não por convicção própria mas para vender<br />

revistas e livros. O que se supõe um benefício pode redundar<br />

em grande prejuízo.<br />

Até aqui um pouco <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e <strong>do</strong> presente. E o futuro? Que<br />

Peruíbe não seja molestada, em função mesmo da exploração<br />

dessas ideias, como já está pelo atrativo de seu ar puríssimo,<br />

praias algumas inexploradas, paisagem de cartão postal,<br />

Lama Negra “sacrilegamente espoliada”... Sobre essa riqueza<br />

não onírica mas bem física e natural paira ameaça de uma<br />

Usina Termelétrica a dar cabo de tu<strong>do</strong>. Fora, Usina! Voltemos<br />

à <strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> Abismo.<br />

Eu cruzo com muita reverência minhas mãos ao peito para<br />

que não fuja pelo menos esta <strong>Rosa</strong>, que esta sim, eu sei real.<br />

Mística? Sim, ela é. Dos Ventos? De vez em quan<strong>do</strong>... Do<br />

Abismo? Com certeza.<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Wellington Lima Amorim<br />

Pós <strong>do</strong>utoran<strong>do</strong> em Filosofia pela Universidade<br />

Federal <strong>do</strong> Rio de Janeiro. Membro<br />

da Casa <strong>do</strong> Poeta em Praia Grande/SP.<br />

Principais publicações: A <strong>do</strong>r e a afirmação<br />

trágica da vida: sobre a possibilidade de<br />

uma clínica da potência. Imun<strong>do</strong>s: Pessoas<br />

Inseridas no Mun<strong>do</strong>! O extraordinário mun<strong>do</strong><br />

pornográfico.<br />

wellington.amorim@gmail.com<br />

Flanan<strong>do</strong> no Rio de Janeiro<br />

Podem dizer que o carioca é um ser mitológico, que<br />

não existe no real. Mas o que nos move no mun<strong>do</strong>? Sonhos<br />

e mitos e que quase sempre nos servem de referência. Fiz na<br />

UFRJ o Bacharela<strong>do</strong> de Filosofia ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> Gabinete Real<br />

de Leitura, uma das bibliotecas mais lindas que já conheci.<br />

E por isso, sempre que posso, estou pensan<strong>do</strong>, dizen<strong>do</strong>, e por<br />

vezes escreven<strong>do</strong>, sobre a dialética da malandragem. Tenho<br />

que admitir: sinto saudades, da antiga escola Politécnica onde<br />

Lima Barreto se matriculou. As ruas <strong>do</strong> RJ, cada cantinho,<br />

cada caquinho de lajota possuem uma história, e talvez poucos<br />

lugares no Brasil possuam tanta coisa para se contar e ver.<br />

Andan<strong>do</strong> pelas ruas <strong>do</strong> Rio de Janeiro é ter o prazer de assistir<br />

ao vivo e a cores uma bela aula de História <strong>do</strong> Brasil. Muitos<br />

turistas, têm a impressão que o RJ é apenas o bondinho e o<br />

corcova<strong>do</strong>, que é um erro. Mas existem muitos lugares que<br />

precisam ser menciona<strong>do</strong>s.<br />

Se você se lançar em uma aventura atravessan<strong>do</strong> as<br />

barcas e descer na Praça XV, é um bom começo. Na travessia<br />

pode-se ver a Ilha Fiscal, onde ocorreu o último baile <strong>do</strong> Império.<br />

Ao descer deve-se observar de perto o Paço Imperial e<br />

o seu Café majestoso. O Centro Cultural <strong>do</strong> Banco <strong>do</strong> Brasil<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

é parada obrigatória, para lanchar, tomar um café expresso<br />

e principalmente ver a cultura acontecen<strong>do</strong>. Do outro la<strong>do</strong>,<br />

a Candelária. Palco de beleza e tragédia. Dan<strong>do</strong> meia volta,<br />

encontramos a Casa França Brasil. Seguin<strong>do</strong> a 1º de Março,<br />

podem ser vistas as Igrejas Históricas, lindas, suplican<strong>do</strong> para<br />

serem violadas, desveladas em sua beleza e elegância. Ao<br />

la<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paço Imperial, o palácio Tiradentes, lugar de martírio<br />

<strong>do</strong> inconfidente. Não podemos esquecer que é na Praça XV<br />

que é o lugar por excelência <strong>do</strong> Almirante Negro e sua revolta<br />

contra a chibata, sen<strong>do</strong> uma das últimas grandes revoltas de<br />

escravos no Brasil, aquele que Aldir Blanc chamou de navegante<br />

negro, o Antônio Cândi<strong>do</strong>.<br />

Seguin<strong>do</strong> pela Rua da Assembléia até chegarmos no<br />

Largo da Carioca é como estarmos em uma imensa praça<br />

medieval. Malabaristas, imigrantes, camelôs, brincam, negociam,<br />

divertem as pessoas que passam. Acima de to<strong>do</strong>s está o<br />

convento Santo Antônio, que se ergue diante de nossos olhos,<br />

nos lembran<strong>do</strong> de que somos apenas homens, grãos perdi<strong>do</strong>s<br />

na areia. Continuan<strong>do</strong> nossa aventura, seguimos até a Cinelândia.<br />

É diante de nossos olhos que surge a Biblioteca Nacional<br />

e o Teatro Municipal. Mas existe ainda outro reduto<br />

que precisa ser visita<strong>do</strong>: Santa Tereza. Conhecer o Parque das<br />

Ruínas e o Museu da Chácara <strong>do</strong> Céu e descer a pé o morro<br />

de Santa Tereza até a Lapa. Por fim, em uma sexta-feira à<br />

noite, curtir a boemia da Lapa, ao estilo de Sartre e Simone<br />

Beavouir, lugar de carisma e malandragem, que tem como<br />

símbolo Madame Satã. Em to<strong>do</strong> esse trajeto, encontramos a<br />

alma carioca presente entre os transeuntes. Desde o taxista, ao<br />

vende<strong>do</strong>r e os botecos da Lapa. Ser carioca é ser peregrino, é<br />

transitar por estes lugares, com o espírito flexível e leve como<br />

uma pena. É ser um poeta-filósofo e fazer da vida uma obra<br />

de arte. É necessário viver essa experiência, ser um flanêur.<br />

Mas o mais importante, que não pode ser esqueci<strong>do</strong>, é que<br />

ninguém nasce carioca, nos tornamos um, e como uma amiga<br />

94


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

afirmou: “cariocas não gostam de sinal fecha<strong>do</strong>” (Olhe bem,<br />

quem disse isso foi uma gaúcha). Se entendermos por fecha<strong>do</strong><br />

tu<strong>do</strong> que é rígi<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> o que impede a passagem, então a frase<br />

é perfeita. Abram alas para os cariocas <strong>do</strong> nosso imaginário e<br />

para os cariocas que ultrapassam nossa imaginação.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Yolanda de Santis Bello<br />

Nascida em São Paulo capital, cursou magistério, fez vários<br />

cursos volta<strong>do</strong>s para a arte e criação, decoração de interiores, aulas<br />

de pinturas com artistas de estilos varia<strong>do</strong>s e outras. Participou de<br />

várias exposições importantes e assim ingressou na Faculdade de<br />

Artes Plásticas da PUC, de Campinas, enveredan<strong>do</strong> para o paisagismo<br />

por vinte e <strong>do</strong>is anos. Frequenta<strong>do</strong>ra de Peruibe desde muito<br />

jovem e agora como mora<strong>do</strong>ra, descobre a escrita. É convidada<br />

para integrar na Academia Peruibense de Letras inician<strong>do</strong> mais um<br />

ciclo em sua vida.<br />

yopaisagismo@hotmail.com<br />

Peruíbe<br />

Lançan<strong>do</strong> um voo sobre o passa<strong>do</strong>, descortino inebriantes<br />

lembranças, deste lugar energiza<strong>do</strong> pela paz e a luz divina,<br />

reverencia<strong>do</strong> pela natureza.<br />

Criança ainda, a cidade era apenas uma vila, poucos habitantes,<br />

na maioria pesca<strong>do</strong>res, isto por volta de 1953, cercada<br />

de um verde deslumbrante e um mar tardio, que nos oferecia<br />

pesca tão abundante, que, às vezes, era posta fora, pois não<br />

havia onde condicioná-las.<br />

Aventuras não faltavam. Chamar a criançada para um <strong>do</strong>ce<br />

de banana em copinhos comestíveis. Pensava que eram da<strong>do</strong>s<br />

de graça na venda <strong>do</strong> Pedro Omuro e depois descobrir<br />

que eram pagos por meu avô, o mesmo que correu atrás para<br />

emancipar Peruíbe de Itanhaém, e cujo nome era Afonso Morch.<br />

Areia que chegava até o meio <strong>do</strong> joelho, impossibilitan<strong>do</strong><br />

os passos e algazarras, buracos enormes que viravam casas e<br />

com cores diversas faziam navegar a imaginação.<br />

Quantas vezes de madrugada caminhávamos pelas picadas<br />

por horas no meio da mata para descortinarmos um recanto<br />

chama<strong>do</strong> Prainha, lugar esqueci<strong>do</strong> no meio <strong>do</strong> verde e <strong>do</strong> mar<br />

e com um farnel farto, envolto pelo sabor <strong>do</strong> sal e da inocência,<br />

desfrutávamos de um convescote neste recanto inebriante<br />

96


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

e esqueci<strong>do</strong> no nada.<br />

Saltan<strong>do</strong> sobre as ondas e mergulhan<strong>do</strong> em parafuso, não<br />

lembrávamos que teríamos que voltar subin<strong>do</strong> e descen<strong>do</strong> serra.<br />

A água cristalina da nascente estalava gelada nos dentes e<br />

lábios, as ondas violentas nas pedras distantes dispersavam<br />

um mun<strong>do</strong> de espumas, que lavavam a alma e os pensamentos.<br />

Desfrutar de um cozi<strong>do</strong> de mariscos, pegos nos alvéolos<br />

<strong>do</strong> mar, convertiam-se num grande banquete, com a fogueira<br />

feita de gravetos sobre as pedras, somávamos o sabor <strong>do</strong> sal,<br />

da concha e <strong>do</strong> molusco vibrante.<br />

Um pouco mais distante, falava-se de uma praia chamada<br />

Guaraú, a que se tinha acesso apenas saltan<strong>do</strong> pelas pedras, o<br />

que envolvia grandes riscos para crianças sapecas.<br />

No dia a dia de nossas férias, curtíamos o mar de manhã e à<br />

tarde minha mãe reunia uma penca de crianças para irmos ao<br />

Costão, outra praia, porém mais próxima da vila e onde não<br />

dispensávamos as travessuras. Tínhamos que atravessar o Rio<br />

Preto, caudaloso e muito fun<strong>do</strong>, através de uma ponte feita<br />

de pedaços de madeira em que existiam grandes vazios para<br />

saltarmos, e ninguém ali sabia nadar.<br />

Usávamos este mesmo lugar para pescar ou com um puçá<br />

joga<strong>do</strong> lá de cima conten<strong>do</strong> uma cabeça de peixe, a fim de<br />

recolhermos os siris desavisa<strong>do</strong>s, para um gostoso ensopa<strong>do</strong>.<br />

Tenho um irmão pesca<strong>do</strong>r que, quan<strong>do</strong> cismava, completávamos<br />

o dia puxan<strong>do</strong> a rede à noite na escuridão e ao fe<strong>do</strong>r<br />

<strong>do</strong> lampião de carbureto, para adentrar o mar e recolher camarões,<br />

finalizan<strong>do</strong> assim o nosso dia. Às vezes meu pai nos<br />

surpreendia, com uma fieira de rãs que vinham fresquinhas<br />

<strong>do</strong>s manguezais, que eram muitos na cidade.<br />

Não duvidem uma a<strong>do</strong>lescência diferente, bailinhos ao<br />

som de músicas italianas, lanternas e namoricos inocentes.<br />

Reuniões no mirante durante o dia para as paqueras habituais<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

e encontros eram marca<strong>do</strong>s com trocas de olhares e gracejos.<br />

O tempo não deixou sequelas e hoje caminho livre e envolta<br />

pela leveza de espírito que esta terra implantou, o semblante<br />

transparece a alegria de pisar nesta mesma areia, olhar<br />

o mar e ser acolhida pelo verde ensurdece<strong>do</strong>r, que encaran<strong>do</strong> a<br />

tu<strong>do</strong> e a to<strong>do</strong>s preserva a sua imponência, cheia de deslumbres<br />

e mistérios.<br />

98


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

SOBRE A ACADEMIA<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

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<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

História da<br />

A história da Academia Peruibense de Letras, como instituição<br />

formal, inicia-se em 2004, mas suas raízes históricas<br />

estendem-se à década anterior quan<strong>do</strong>, em 1995, um grupo<br />

de entusiastas das artes em geral decidiu transformar sonho<br />

em realidade e fun<strong>do</strong>u a Oficina Cultural Tom Jobim, a associação<br />

cultural que, em Peruíbe e região, durante vários anos,<br />

promoveu e organizou exposições de artes plásticas individuais<br />

e coletivas, encontros de corais, noites de autógrafos, recitais,<br />

concertos, peças teatrais, concursos de trovas e saraus.<br />

Em meio a essa efervescência cultural intensificaram-se<br />

os contatos entre os escritores e essa descoberta mútua bem<br />

101


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

como de uma vasta produção literária, repleta de obras dignas<br />

de serem publicadas, mas forçadas ao anonimato das gavetas,<br />

foi o cataliza<strong>do</strong>r de um impulso até então silencioso em seu<br />

potencial a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>: a fundação de uma academia de letras<br />

em Peruíbe, à semelhança <strong>do</strong> que já ocorria em outras cidades<br />

da região. Se havia o sonho, se os sonha<strong>do</strong>res se encontraram<br />

graças aos caminhos abertos pela Oficina Cultural Tom Jobim,<br />

então só podia acontecer a magia daquele momento criativo.<br />

Talvez ninguém saiba o instante exato, mas sabe-se que<br />

havia cerveja em uma mesa de bar, estimulan<strong>do</strong> as asas <strong>do</strong> entusiasmo<br />

daqueles pioneiros reuni<strong>do</strong>s na amizade e na literatura.<br />

Ali, entre o riso espontâneo da esperança e o tilintar das<br />

taças e copos, nasciam as primeiras moléculas de um sonho<br />

até então apenas acalenta<strong>do</strong>.<br />

Nos meses seguintes os jornais anunciaram aos escritores<br />

da cidade e região um encontro para fundarem a instituição<br />

que os receberia e pela qual teriam finalmente representatividade<br />

e mais oportunidades de contribuírem com sua literatura<br />

para o engrandecimento cultural da sociedade.<br />

E assim nasceu, no dia 21 de novembro de 2004, a Academia<br />

Peruibense de Letras, entidade cultural literária sem finalidade<br />

econômica, dedicada à cultura da língua portuguesa,<br />

ao apreço da literatura brasileira, ao fomento da cultura e ao<br />

estímulo das atividades literárias e artísticas.<br />

Academia por sua própria natureza atenta à cultura regional,<br />

mas de mente aberta para o global. Cavalgan<strong>do</strong> com seu<br />

cavalo ala<strong>do</strong> pelo moto-contínuo da metamorfose lépida, neste<br />

mun<strong>do</strong> virtualiza<strong>do</strong> de hoje, mas sem esquecer das tradições e<br />

<strong>do</strong>s que nos antecederam nas conquistas <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>. Olhan<strong>do</strong><br />

atenta e interessada para o futuro, mas saben<strong>do</strong> que nele nos<br />

espreita um mun<strong>do</strong> que poderá, talvez, prescindir de muitas<br />

coisas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> antigo, mas que ainda assim precisará, cada<br />

vez mais, <strong>do</strong>s sonha<strong>do</strong>res de sempre, homens e mulheres ca-<br />

102


pazes de inventar sonhos literários.<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Não importa se a tinta é feita de bytes e o papel é feito<br />

de páginas da internet, nossa academia seguirá cumprin<strong>do</strong> o<br />

papel que é dela nos espaços novos que certamente encontraremos<br />

nesse “Admirável mun<strong>do</strong> novo”.<br />

Não obstante as incompreensões ocasionais e graças aos<br />

muitos amigos que nos apoiam, persistiremos na trilha aberta<br />

pelos funda<strong>do</strong>res e pelos mestres da literatura brasileira e da<br />

universal. É assim que a Academia Peruibense de Letras, em<br />

pequenas mas determinadas passadas, completa 12 anos de<br />

vida com um pé naquele passa<strong>do</strong>, a cabeça neste momento e o<br />

outro pé nas maravilhas <strong>do</strong> futuro que nos aguarda.<br />

Ouça o podcast “História da Academia Peruibense<br />

de Letras” em:<br />

http://apeletras.blogspot.com/p/sobre-apletras.<br />

html<br />

103


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Como tornar-se um membro da APLetras<br />

Se você é um escritor ou poeta e mora em Peruíbe poderá<br />

tornar-se membro efetivo da Academia. Caso more em outra<br />

cidade poderá tornar-se membro correspondente.<br />

Mas antes de falarmos em como isto pode ser realiza<strong>do</strong>, é<br />

bom que saibamos claramente o que é a Academia Peruibense<br />

de Letras e por que se tornar um membro desta instituição é<br />

importante para quem nela se propuser a ingressar.<br />

A Academia Peruibense de Letras, com sede em Peruíbe<br />

– SP, é pessoa jurídica de direito priva<strong>do</strong>, de fins não econômicos,<br />

com duração por tempo indetermina<strong>do</strong>, constituída por<br />

número limita<strong>do</strong> de cadeiras acadêmicas, atualmente fixa<strong>do</strong><br />

em 40 cadeiras, ou seja, quarenta vagas, das quais 27 estão<br />

ocupadas.<br />

Segun<strong>do</strong> o Estatuto da Academia, esta tem por fim precípuo<br />

a cultura <strong>do</strong> vernáculo; o apreço à literatura brasileira; a<br />

defesa <strong>do</strong> patrimônio cultural da nação em geral e, em especial,<br />

o da região de Peruíbe; o estímulo às atividades literárias,<br />

artísticas e técnicas da União, <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, <strong>do</strong> Município<br />

e de particulares; a defesa das liberdades democráticas, da<br />

livre manifestação de pensamento em todas as suas formas,<br />

da liberdade de cátedra, reunião e associação, que garanta a<br />

dignidade humana contra os preconceitos de raça, língua, nacionalidade<br />

e crença; a coexistência pacífica <strong>do</strong>s povos, capaz<br />

de permitir o intercâmbio econômico, científico e cultural; e a<br />

defesa intelectual e cultural <strong>do</strong>s seus acadêmicos.<br />

A partir da finalidade da Academia exposta anteriormente,<br />

evidencia-se por si mesma a importância de ser um membro<br />

dessa instituição. Nesta casa o escritor encontrará o ambiente<br />

e as relações que lhe darão oportunidades ímpares de manifestar-se<br />

literariamente e expor seu talen¬to, apreciar o de seus<br />

104


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

pares e poder contribuir para a sociedade, para a cultura e para<br />

a literatura, partin<strong>do</strong> <strong>do</strong> regional e descortina<strong>do</strong>, diante de si, a<br />

vastidão <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> globaliza<strong>do</strong> e interconecta<strong>do</strong> ubiquamente.<br />

Para realizar este sonho, quais são os requisitos para os<br />

candidatos?<br />

Primeiro, amar a literatura brasileira e a universal, ser escritor,<br />

seja poeta, romancista, ensaísta, cronista, filósofo, historia<strong>do</strong>r,<br />

enfim, dedicar-se à escrita ficcionista ou não. Significa<br />

que você deverá ter trabalhos escritos de sua autoria e que<br />

julgue em condições de apresentá-los à co¬missão de avaliação<br />

da Academia. Não necessariamente você deverá ser um<br />

autor publica<strong>do</strong>. Aqui, o que vai contar mesmo é o seu talento<br />

e sua determinação para escrever. E claro, o seu conhecimento<br />

da técnica, o que inclui um <strong>do</strong>mínio adequa<strong>do</strong> <strong>do</strong> vernáculo.<br />

Escrever é arte e técnica.<br />

Segun<strong>do</strong>, ser brasileiro nato ou naturaliza<strong>do</strong> e ser <strong>do</strong>micilia<strong>do</strong><br />

no município de Peruíbe há mais de cinco anos para ser<br />

membro efetivo. Esta exigência é para ser membro efetivo e<br />

não para o membro correspondente.<br />

Terceiro, possuir mais de 30 anos de idade, condição esta<br />

que, no caso de reconheci<strong>do</strong> valor cultural e artístico da produção<br />

literária, poderá, a juízo da Academia, ser dispensada<br />

com vistas à admissibilidade.<br />

E quarto, enviar cópias de suas obras principais e de uma<br />

breve autobiografia para o seguinte endereço:<br />

ACADEMIA PERUIBENSE DE LETRAS<br />

Caixa Postal 141<br />

CEP 11.750-000 PERUÍBE – SP<br />

No início <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> semestre de cada ano, a Academia<br />

avalia o mérito literário <strong>do</strong>s postulantes e os que forem se-<br />

105


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

leciona<strong>do</strong>s tomarão posse em solenidade, em data oportunamente<br />

divulgada aos interessa<strong>do</strong>s.<br />

Mais informações? Acesse nosso blog:<br />

www.apeletras.blogspot.com.br<br />

Então, ficou interessa<strong>do</strong>? Não espere mais, venha juntar-se<br />

a nós. A messe é grande, os trabalha<strong>do</strong>res são poucos, mas a<br />

gratificação e o sentimento de autorrealização, ao fazer parte<br />

de uma confraria em ação voluntária para o progresso da cultura<br />

e, consequentemente, <strong>do</strong> povo bra¬sileiro, simplesmente<br />

é imensurável.<br />

Esperamos você por aqui!<br />

Academia Peruibense de Letras<br />

Av. Pe. Anchieta, nº 4297<br />

CEP 11.750-000 Peruíbe – SP92<br />

106


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

EFEMÉRIDES & AL.<br />

Acadêmico, este espaço é seu. Sua participação em eventos<br />

culturais e sociais, externos e internos, representan<strong>do</strong> a Academia,<br />

será noticiada nestas “Efemérides”. Participe, a Academia<br />

recomenda e incentiva.<br />

107


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

108


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Sarau da Muriel<br />

O povo não para de fazer arte. Isso é um impulso natural no<br />

ser humano. Mesmo saben<strong>do</strong> disso, ficamos agradavelmente<br />

surpresos quan<strong>do</strong> descobrimos que pessoas estão se reunin<strong>do</strong><br />

regularmente para cantar, recitar poemas, ler histórias e outros<br />

textos. Sim, é isto que faz um grupo de pessoas em Peruíbe,<br />

que têm uma agenda de reuniões para se apresentarem e apreciarem<br />

as apresentações <strong>do</strong>s amigos, em um sarau que está<br />

fican<strong>do</strong> conheci<strong>do</strong> como Sarau da Muriel. O espaço é cedi<strong>do</strong><br />

pela Muriel, que empresta seu nome ao sarau, e seu mari<strong>do</strong>.<br />

Quem conferiu isso tu<strong>do</strong> foi nosso confrade João Líbero que<br />

já participa desde a edição quatro <strong>do</strong> sarau, que já está na sua<br />

sexta edição. Cada sarau tem uma temática como, por exemplo,<br />

“Norte e Nordeste”, “Festa Junina” e “Jovem Guarda”.<br />

Mas vamos ver as fotos para termos melhor ideia dessa brilhante<br />

iniciativa da Muriel e seu esposo. Parabéns!<br />

João Líbero faz a leitura <strong>do</strong><br />

seu poema “O pau de sebo”,<br />

no Sarau da Muriel.<br />

João Líbero faz a leitura <strong>do</strong><br />

seu poema “O retorno”, no<br />

Sarau da Muriel.<br />

109


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Sarau da Banda Musical de Peruíbe<br />

Nossos acadêmicos João Líbero e Martha Fujita estiveram<br />

presentes no Sarau da Banda Musical de Peruíbe, em 22 de<br />

abril, representan<strong>do</strong> nossa Academia. João declamou seu poema<br />

“Eu sou”. Livros da Academia e de acadêmicos foram<br />

sortea<strong>do</strong>s para o público.<br />

Confreira Martha Fujita e Confrade João Líbero no Sarau<br />

da Banda Musical de Peruíbe. Notem as camisetas que ambos<br />

estão usan<strong>do</strong>. Parabéns aos acadêmicos pelo entusiasmo<br />

com o qual têm participa<strong>do</strong> de eventos culturais em representação<br />

a Academia Peruibense de Letras.<br />

Faz parte <strong>do</strong> estatuto da Academia o “estímulo às atividades<br />

literárias, artísticas e técnicas da da União, <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e <strong>do</strong><br />

Município”. Martha e João são exemplos de acadêmicos que<br />

saem em campo e transformam letras em ação.<br />

110


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Exposição foto-literária<br />

Os acadêmicos Jorge Braga, Ecilla Bezerra e Elizabeth Watanabe<br />

participaram da Exposição foto-literária, na Pinacoteca<br />

Municipal de Itanhaém - SP, evento integrante da agenda da<br />

Semana Literária, uma realização anual da Academia de Letras<br />

de Itanhaém, com apoio <strong>do</strong> COFIT e da Prefeitura Municipal<br />

de Itanhaém. Também fez parte das comemorações o<br />

aniversário de vinte e um anos daquela academia. Este ano a<br />

participação na Exposição foto-literária foi mais desafia<strong>do</strong>ra.<br />

Os acadêmicos tiveram que escrever seus textos a partir de<br />

uma foto que lhes foi enviada. Ecilla, por exemplo, recebeu<br />

uma foto de um casal passean<strong>do</strong> na praia com seus cães. Jorge<br />

recebeu simplesmente a foto de um portão projetan<strong>do</strong> a sombra<br />

no solo.<br />

O acadêmico Jorge Braga frente ao quadro foto-literário “A<br />

sombra <strong>do</strong> portão”.<br />

111


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

O quadro foto-literário “A sombra <strong>do</strong> portão” com o poema<br />

<strong>do</strong> acadêmico Jorge Braga sobre a foto de Marcos Rogério<br />

Meneghessi. A foto inspirou o poema.<br />

A fotógrafa Tamires Macieira, autora da foto <strong>do</strong> quadro foto-<br />

-literário “Impie<strong>do</strong>so mar revolto”, e Ecilla Bezerra, a autora<br />

<strong>do</strong> conto que deu título ao quadro.<br />

112


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

O quadro foto-literário “Impie<strong>do</strong>so mar revolto” com o poema<br />

da acadêmica Ecilla Bezerra sobre a foto de Tamires<br />

Macieira. A foto inspirou o conto.<br />

Jorge Braga, o autor <strong>do</strong> poema que deu título ao quadro foto-literário<br />

“A sombra <strong>do</strong> portão” e Marcos Rogério Meneghessi,<br />

o autor da foto.<br />

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Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Sarau na Academia Vicentina de Letras Artes e<br />

ofícios<br />

Presença também da Academia Peruibense de Letras no<br />

“18º Pensan<strong>do</strong> Entre Palavras e Amigos”, em São Vicente,<br />

na “Academia Vicentina de Letras, Artes e Ofícios” que<br />

aconteceu no Instituto Histórico e Geográfico de São Vicente,<br />

no dia 15 de setembro.<br />

◄ Fachada <strong>do</strong> Instituto<br />

Histórico e Geográfico de<br />

São Vicente.<br />

Calorosa acolhida <strong>do</strong> Coordena<strong>do</strong>r<br />

<strong>do</strong> “18º Pensan<strong>do</strong><br />

Entre Palavras e Amigos“,<br />

Augusto Cesar Estevam da<br />

Silva.▼<br />

Augusto (Coor.), Jorge Braga (Pres. da APLetras), Ecilla Bezerra (Secretária<br />

da APLetras) e Ricar<strong>do</strong> Rose (Dir. Cultural da APLetras).<br />

114


<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

Ricar<strong>do</strong> Rose, Ecilla Bezerra e Elaine Braga, no 18º Pensan<strong>do</strong> Entre Palavras<br />

e amigos.<br />

Cumprin<strong>do</strong> a programação<br />

<strong>do</strong> evento, houve homenagens<br />

à árvore centenária <strong>do</strong><br />

jardim <strong>do</strong> Insituto com apresentação<br />

<strong>do</strong> saxofonista Jonas<br />

Oona, performance de<br />

Eliana Greco, homenagens à<br />

personalidade cultural Deise<br />

Domingues, declamações de<br />

poesias, palestras, lançamentos<br />

de livros por escritores<br />

locais e exibição <strong>do</strong> curtametragem<br />

“Pesca<strong>do</strong>res de palavras”,<br />

de Madeleine Alves,<br />

sobre três seguimentos importantes da literatura marginal /<br />

independente <strong>do</strong> litoral paulista. Um destaque <strong>do</strong> evento foi<br />

a palestra “Do Papiro ao Livro Eletrônico”, com Cláudia<br />

Brino e Vieira Vivo, da editora artesanal Costelas Felinas.<br />

115


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Publicaram em 2018:<br />

Darcio Pasotto<br />

Publica a revista trimestral Toy-Mel<br />

& Cia, nobilíssimo trabalho em<br />

prol da causa animal. Na imagem,<br />

a capa da 25ª edição da revista que<br />

tem alcança<strong>do</strong> tiragens da ordem de<br />

100 mil exemplares. Nessa luta para<br />

mudar atitudes, comportamento e<br />

cultura em nossas relações com os<br />

animais alinha-se a Academia Peruibense<br />

de Letras que tem compareci<strong>do</strong>,<br />

em prosa e versos, às páginas<br />

da prestigiosa publicação, através<br />

da participação <strong>do</strong>s seus acadêmicos. A publicação pode ser<br />

acessada em https://issuu.com/toyemelecia.<br />

Darcio Pasotto<br />

Uma verdadeira coletânea de declarações<br />

de amor aos nossos irmãos<br />

animais. É gratificante ver o esforço<br />

de tantos autores converti<strong>do</strong> neste<br />

livro emocionante. Ainda mais neste<br />

mun<strong>do</strong> alucina<strong>do</strong> onde não faltam<br />

maus tratos a esses frágeis seres,<br />

cada vez mais dependentes da espécie<br />

humana que os manipula a seu<br />

bel prazer, tiran<strong>do</strong> deles todas as formas<br />

de proveitos, grande parte delas<br />

indignas daqueles que se proclamam<br />

tão humanos.<br />

Toy-Mel & Cia - Histórias que os animais contam!<br />

Darcio Pasotto e outros. Peruíbe: 2017.<br />

e-mail: darcio.pasotto@yahoo.com.br<br />

116


Jorge Braga<br />

<strong>Rosa</strong> <strong>do</strong> <strong>abismo</strong><br />

A vida é uma corda tensionada entre o<br />

nascimento e a morte, <strong>do</strong>is extremos<br />

misteriosos entre os quais temos que<br />

viver o melhor que pudermos. A corda<br />

está no seu limite, ninguém sabe quan<strong>do</strong><br />

irá romper-se. Pode ser a qualquer momento.<br />

Essa ruptura precipita-nos para<br />

o mais temi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s extremos da vida, a<br />

morte. Tão temi<strong>do</strong> que evitamos pensar<br />

a respeito. E falar sobre morte é ainda<br />

um tabu. Então inventamos negócios<br />

importantes para consumir nosso tempo<br />

e, quan<strong>do</strong> nos damos conta, na correria<br />

da vida, a vida já correu quase toda a<br />

estrada. Quan<strong>do</strong> a morte ronda, lidamos<br />

com ela cada um a seu mo<strong>do</strong>. Há os que choram em segre<strong>do</strong> e os<br />

que riem da ceifa<strong>do</strong>ra. Em “Contos entre a vida e a morte” vamos<br />

encontrar personagem encaran<strong>do</strong> esse desafio e veremos, algumas<br />

vezes com surpresa, como eles se saíram.<br />

Contos entre a vida e a morte.<br />

Jorge Braga. Na internet: https://issuu.com/jhorgebraga , 2018.<br />

E-mail: jhorgebraga@gmail.com<br />

Yolanda De Santis Bello<br />

Vivenciar as nuances <strong>do</strong> ser, ter ou<br />

querer. O leitor poderá acompanhar<br />

o descortinar das primeiras linhas<br />

redigidas aos sessenta e <strong>do</strong>is anos e<br />

assistir à evolução <strong>do</strong> pensamento<br />

da autora, através <strong>do</strong>s meandros <strong>do</strong>s<br />

sentimentos e busca de emoções jamais<br />

expostas ou exploradas.<br />

Repensar o ser.<br />

Yolanda de Santis Bello. Na internet:<br />

https://issuu.com/yopaisagismo<br />

, 2018.<br />

E-mail: yopaisagismo@hotmail.com<br />

117


Academia Peruibense de Letras - 9ª Coletânea<br />

Acadêmicos da Academia Peruibense de Letras<br />

lançam blog sobre filosofia<br />

“Filósofos na praia” (www.filosofosnapraia.blogspot.com)<br />

é o nome <strong>do</strong> blog lança<strong>do</strong> em setembro pelos acadêmicos Ricar<strong>do</strong><br />

Ernesto Rose e Edwal<strong>do</strong> Camargo Rodrigues, ambos<br />

gradua<strong>do</strong>s em Filosofia. A publicação, segun<strong>do</strong> os coordena<strong>do</strong>res,<br />

também contará com a participação de outros filósofos<br />

que vivem no litoral, “pensan<strong>do</strong>, discutin<strong>do</strong> e escreven<strong>do</strong>, observan<strong>do</strong><br />

as constantes mudanças <strong>do</strong> oceano, mutável como a<br />

vida humana”, como diz a apresentação <strong>do</strong> blog.<br />

A publicação, como frisaram os autores, será bastante variada.<br />

Não pretende publicar longos, vetustos e obscuros textos<br />

acadêmicos, mas trazer material bastante acessível ao grande<br />

público, que possibilite ao leitor formar uma nova e mais<br />

aprofundada opinião sobre determina<strong>do</strong> assunto. Além disso,<br />

haverá espaço para debates, resenhas e indicações de livros,<br />

excertos de artigos e livros de importância, comentários sobre<br />

autores; mostran<strong>do</strong> a conexão da filosofia com a literatura, as<br />

artes, a ciência, a religião, a política, etc.<br />

Pessoas formadas em filosofia e com interesse em expor suas<br />

ideias, estão convidadas a contatarem os organiza<strong>do</strong>res pelo<br />

e-mail: filosofianapraia@outlook.com<br />

118

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