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DEFINIDO UMA NOVA ECONOMIA

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Definindo uma

nova economia:

questões centrais para a transição

Realização:

Apoio:


Definindo uma

nova economia:

questões centrais para a transição

Realização:

Apoio:


FICHA TÉCNICA

Título: Definindo uma nova economia: questões centrais para a transição – governança, convivência, finanças, emprego

Realização: Vitae Civilis – Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz

Patrocínio:

Parceiros dos debates:

Redação: Silvia Dias

Contribuições: Alexandra Keschke (IDS), Aron Belinky (Vitae Civilis), Bazileu Margarido (IDS), Catarina Faria Alves Silveira

(CUT), Laura Martin (Sustainlabour), Gustavo Ferroni (Vitae Civilis), Henrique Liam (Ethos), Reginaldo Magalhães (Ethos),

Rubens Born (Vitae Civilis), Silvia Alcântara (FBOMS), Silvio Sant’Ana (FBOMS).

Capa e Diagramação: Nathany Paola da Silva

Apoio Institucional:

Apoio Institucional na Rio+20:

O Instituto Vitae Civilis, é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos cujo objetivo é contribuir para a construção de

sociedades sustentáveis, mediante o apoio a implementação participativa de políticas públicas integradas; o fortalecimento de

iniciativas geradoras de renda e emprego associadas à sustentabilidade ambiental; geração e disseminação de conhecimentos e

práticas nas áreas de clima, energia, águas, ecoturismo, conservação de florestas e de serviços ambientais; e fortalecer organizações

e iniciativas de sociedade civil em tais áreas. O nome Vitae Civilis, que em latim significa “para a sociedade civil”, reforça a orientação

do Instituto em servir ao fortalecimento da cidadania e das organizações da sociedade.

Presidente do Conselho Deliberativo: Percival Maricato

Vice-Presidente do Conselho Deliberativo: Francisco Rodrigues

Conselheiros: Alceu Rodrigues de Freitas, Bianca Regina Zello Pereira, Julio Weiner, Neide Yumie Takaoka.

Coordenador Executivo: Marcelo Cardoso

Coordenador Executivo Adjunto: Rubens Harry Born

Coordenadora Financeira Administrativa: Danny Rivian

Coordenadora de Projetos: Pilar Cunha

Coordenador de Processos Internacionais: Aron Belinky

Equipe do Vitae Civilis: Bárbara Gonçalves, Bruno Andreoni, Carlos Krieck, Carolina Derivi, Carolina Ramalhete Vieira, Délcio Rodrigues,

Eduardo Rombauer, Francisco Biazini, Gabriella Contoli, Gustavo Ferroni, Morrow Gaines Campbell III, Nathany Paola da Silva, Nina

Best, Pedro Telles, Renata de Almeida Rodrigues, Samuel Gabanyi, Silvia Dias.

Para saber mais acesse: www.vitaecivilis.org.br

Vitae Civilis – Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz

Rua Itápolis, 1468 - CEP 01245-000 / Pacaembu - São Paulo – SP

Tel.: +55 11 3662-0158 / e-mail: vcivilis@vitaecivilis.org.br

São Paulo, maio de 2012


ÍNDICE

SUMÁRIO EXECUTIVO 05

APRESENTAÇÃO

05 06

CONTEXTO: As discussões sobre economia verde e a transição para

um modelo sustentável

08

CAPÍTULOS TEMÁTICOS: Reflexões e propostas dos debates

10

Sustentabilidade e convivência digna nos biomas e territórios

Governança do desenvolvimento sustentável, integridade

ambiental e justiça social

Instituições financeiras e instrumentos econômicos

Empregos verdes, trabalho decente, produção e consumo

sustentável

11

15

18

23

CONCLUSÃO

27

ANEXO: Lista de participantes

30


SUMÁRIO EXECUTIVO

O Vitae Civilis, com o apoio da Ford Foundation, convidou organizações-chave da sociedade civil -

como o Fórum Brasileiro ONGs e Movimentos Sociais, a Central Única dos Trabalhadores, a Fundação

Sustainlabour, o Instituto Democracia e Sustentabilidade e o Instituto Ethos - para co-organizarem

uma série de debates sobre quatro temas transversais que permeiam o conceito de economia verde:

governança, finanças, convivência e trabalho e emprego –. O objetivo foi gerar insumos que servissem

de alerta e orientação, permitindo uma atuação mais produtiva e eficiente da sociedade na transição

para a economia verde e, especificamente, nos debates referentes à Rio+20. A presente publicação

traz um retrato dessa rica troca de informações, percepções e propostas apresentadas e debatidas em

reuniões que contaram com a participação de cerca de 60 representantes de mais de 30 organizações

da sociedade civil brasileira.

Independente da área de atuação, da abordagem e das premissas ideológicas, alguns aspectos

sobressaíram nas conclusões dos debates: 1) o atual modelo de produção e consumo é a origem e causa

das atuais crises econômica, ambiental e social, e precisa urgentemente mudar; 2) essa mudança deve

ocorrer no sentido de fazer com que os fatores humano e ambiental sejam devidamente considerados

frente aos parâmetros econômico-financeiros, e portanto reconhecidos como definidores dos seus

limites; 3) tanto o processo de transição para esse novo modelo, como sua própria gestão, devem ser

amparados por uma nova governança, socialmente inclusiva e participativa; 4) a sociedade civil deve ter

papel mais ativo nas decisões e deliberações que tenham impactos coletivos.

SUMÁRIO EXECUTIVO

05

A economia é o principal “instrumento” que a sociedade moderna dispõe para obter rapidamente

a escala e o volume necessários para atingirmos o desenvolvimento sustentável. Mas para isso, não

podemos contar com a economia descontrolada e descolada da base produtiva, que nos trouxe às

bolhas especulativas, à crise global e às exacerbação das desigualdades estruturais atuais.

O que está sendo chamado de economia verde – ainda uma proposta em construção - pode vir a

ser a resposta que precisamos, desde que esteja baseada em uma estrutura que respeite os limites

planetários e garanta os direitos humanos de todos. Apenas desta maneira atingiremos o espaço seguro

e justo para a Humanidade.

Por isso, lhe convidamos a conhecer, nas próximas páginas, os principais pontos debatidos em cada um

dos eixos eleitos para este trabalho, bem como as propostas elencadas no processo de debates que

levou a organização desta obra, onde buscamos alinhavar diretrizes críticas para a economia do futuro

que queremos.

Utilizamos o termo economia verde (EV) - sem qualquer outro adjetivo - para nos referirmos ao conjunto

de propostas voltadas ao desenvolvimento sustentável ou, mais especificamente, à transformação da

economia global para padrões socialmente justos e ambientalmente sustentáveis, num marco ético e

democrático. Para mais informações sobre este posicionamento acesse: www.economiaverde.org.br

e/ou www.greeneconomy.org.br


APRESENTAÇÃO

Duas décadas depois daquele que é considerado um marco no processo de descoberta e avanço em

direção a modelos de desenvolvimento mais justos e sustentáveis, a Rio-92, a sociedade civil organizada

prepara-se para influir positivamente naquele que talvez venha a ser o próximo grande marco nesse

trajeto: a Rio+20. Sua estrutura, bem como o Zero Draft, alavancaram os debates sobre economia verde

entre todos os atores envolvidos em todo o mundo, inclusive no Brasil. Se por um lado, uma parte da

sociedade e do setor privado viu-se refletindo sobre o tema pela primeira vez, por outro encontramos

atores bastante céticos, especialmente em relação ao conceito de economia verde, que tende a ser

criticado como uma forma de mercantilização da vida, um esquema de Relações Públicas e, enfim,

como greenwashing.

APRESENTAÇÃO

06

Independente de como interpretamos ou de como nos sentimos em relação ao termo, a economia

verde está na agenda e é importante que atores-chave da sociedade brasileira troquem suas visões e

impressões sobre o tema de forma a desenvolver um entendimento comum que possa contribuir com

a formatação dos debates em curso e evitar o mau uso desta onda poderosa e emergente.

Contribuir e influenciar o debate público: este é objetivo prioritário do trabalho cujas conclusões

encontram-se nesta publicação e que resultaram de um processo abrangente e compreensivo de

reflexões, debates e proposições.

Metodologia

Dentro dos inúmeros temas que compõem a transição para um modelo econômico sustentável e

que subjazem aos conceitos de economia verde e desenvolvimento sustentável, deu-se foco a quatro

pilares estratégicos, por sua importância para o Brasil e sua transversalidade em relação a outros temas:

“Instituições financeiras e instrumentos econômicos”, “Empregos verdes, trabalho decente, produção e

consumo sustentáveis”, “Sustentabilidade e convivência digna nos biomas e territórios” e “Governança

do desenvolvimento sustentável, integridade ambiental e justiça social”.

O Vitae Civilis, condutor deste projeto que recebeu o apoio da Fundação Ford, convidou quatro

instituições-chave da sociedade civil brasileira para se tornarem parceiras da iniciativa: Fórum Brasileiro

de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS), Instituto Ethos, Central Única dos Trabalhadores (em conjunto

com a Fundação Sustainlabor) e Instituto Democracia e Sustentabilidade. Cada entidade assumiu a

liderança do processo de reflexão e mobilização em torno de um dos temas, produzindo documentosbase

para orientar os debates, convidando stakeholders e outros representantes da sociedade civil para

as discussões, coordenando o diálogo e gerando o relato das conclusões obtidas.

A etapa dos debates presenciais foi executada em fevereiro de 2012 e reuniu cerca de 60 pessoas de

mais de 30 organizações representando vários setores da sociedade brasileira.

Figura em nuvem compilando o nome das organizações participantes.


Os debates foram organizados no formato de mesa redonda. Em todos eles, foi proposta a reflexão

sobre os matizes por trás dos conceitos de economia verde e desenvolvimento sustentável – porém

sem perder o foco na necessidade premente de buscar alternativas ao modelo econômico atual, que

precisa migrar para formatos e propostas mais equilibrados e justos: que promovam a real distribuição

de renda e que revertam a atual tendência de dilapidação dos recursos naturais além dos limites e da

capacidade de recuperação do planeta.

Perfil dos parceiros dos debates

FBOMS - Foi criado em 18 de junho de 1990, visando facilitar a participação da sociedade civil em todo

o processo da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), a

Rio-92. Neste processo, por sua estrutura e forma democrática e participativa de trabalhar, o FBOMS

se consolidou, firmando-se no seu papel de interlocução com outros atores sociais nacionais e

internacionais importantes, para cumprir sua missão de contribuir com a unificação entre as questões

sócio-econômicas e ambientais na busca de um desenvolvimento sustentável, com a finalidade de

atingir uma sociedade mais justa, eqüitativa e ambientalmente correta.

CUT - É uma organização sindical brasileira de massas, em nível máximo, de caráter classista,

autônomo e democrático, cujo compromisso é a defesa dos interesses imediatos e históricos da

classe trabalhadora. Baseada em princípios de igualdade e solidariedade, seus objetivos são organizar,

representar sindicalmente e dirigir a luta dos trabalhadores e trabalhadoras da cidade e do campo,

do setor público e privado, ativos e inativos, por melhores condições de vida e de trabalho e por

uma sociedade justa e democrática. A Fundação Internacional Trabalhista para o Desenvolvimento

Sustentável (“Sustainlabour”) foi fundada e se desenvolveu com a crença que os trabalhadores têm

um papel fundamental no caminho para um mundo sustentável. Organizações sindicais estão em uma

posição única para estimular os aspectos sociais do desenvolvimento sustentável enquanto, ao mesmo

tempo, podem também contribuir para as dimensões econômicas e ambientais.

APRESENTAÇÃO

07

IDS - É uma organização da sociedade civil, plural e apartidária. Criado em outubro de 2009, o IDS é

o resultado da busca por alternativas para o desenvolvimento do Brasil baseadas em novos valores e

premissas baseadas na valorização do potencial econômico, dos ativos ambientais e da diversidade

cultural e social do País.

Instituto Ethos - É uma organização sem fins lucrativos criada em 1998 que tem por missão mobilizar,

sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negócios de forma socialmente responsável, tornando-as

parceiras na construção de uma sociedade justa e sustentável.


As discussões sobre economia verde e a transição

para um modelo sustentável

A discussão sobre a transição do atual modelo econômico para um modelo socialmente mais justo e

ambientalmente sustentável não é nova e não surgiu com o conceito de economia verde. Este é um

debate travado há muitas décadas e que ganhou os contornos atuais com a noção de desenvolvimento

sustentável e seu tripé (econômico ambiental e social).

CONTEXTO

O conceito de desenvolvimento sustentável, ao ser lançado na década de 80 pela comissão Brundtland,

foi de suma importância e, podemos dizer, pautou as discussões da ECO 92. Porém sua implementação,

em especial pelo lado econômico, ficou aquém do necessário, pois durante as décadas de 80 e 90

vivemos o ápice da doutrina neo liberal, com o consenso de Washington e Clube de Paris ditando as

regras e disseminando tais conceitos econômicos ao mundo por meio do FMI e do Banco Mundial.

Como essa corrente disseminou exatamente o baixo controle do Estado sobre os agentes econômicos,

sua hegemonia junto aos tomadores de decisão dificultou que qualquer avanço significativo fosse feito

na direção de integrar questões ambientais e sociais nas decisões e políticas econômicas. Sem um

Estado capaz de propor e implementar políticas direcionando a transição, a velocidade de mudança

ficará sempre limitada e a direção enviesada pelos interesses de quem tem mais poder.

08

A diminuição dos controles públicos e sociais sobre os agentes do mercado distanciou as expectativas

da sociedade das ações e respostas do mundo financeiro, tornando a transição para o desenvolvimento

sustentável mais difícil. Isto ficou claro nas crises econômicas vividas nas últimas duas décadas, e em

especial nas respostas dadas para sair destas crises. Basta lembrarmos alguns exemplos como as crises

asiática, russa, argentina e brasileira nos anos 90 e, mais recentemente, o pacote de austeridade na

União Europeia.

Com a mais recente crise econômica, deflagrada em 2008 pelo estouro da bolha especulativa em

torno hipotecas de imóveis nos Estados Unidos, diversos atores sociais, em especial o PNUMA 1 ,

vislumbraram que a resposta para esta crise poderia ser uma oportunidade para acelerar a transição

para um modelo econômico sustentável. Neste contexto, o PNUMA começou uma série de estudos que,

adotando a “economia verde” como marca, visou mostrar esse argumento em linguagem econômica, e

especialmente para os agentes pautados pela lógica financeira.

Para o PNUMA economia verde pode ser definida como aquela que resulta em melhoria do bem-estar

humano e da igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais

e a escassez ecológica. Ela teria três características preponderantes: ser pouco intensiva em carbono,

ser eficiente no uso de recursos naturais e ser socialmente inclusiva.

A transição para uma economia verde no contexto da preservação do meio ambiente e da biodiversidade,

e na perspectiva da erradicação da pobreza e das desigualdades, foi eleita um dos dois temas centrais

da Rio+20, ideia lançada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2007, e oficializada pela ONU no

final de 2009. O debate na conferência de 2012 terá como outro eixo central o quadro institucional

(instrumentos de governança) para que se implemente o desenvolvimento sustentável.

Com a economia verde colocada no centro da agenda da Rio+20, o tema ganhou proeminência e

destaque. Os principais fóruns debateram o tema e à medida em que esta discussão crescia, os atores

sociais e políticos foram desenvolvendo diferentes perspectivas e uma série de críticas e polêmicas

foram sendo identificadas. Resumidamente poderíamos separ as perspectivas sobre a economia verde

em três categorias:

1

PNUMA: Programa das Nações Unidas Pelo Meio Ambiente


• A dos atores que debatem como a economia – verde ou de qualquer cor - deveria se desenvolver

dentro de uma perspectiva da sustentabilidade e garantia de direitos.

• A dos atores que tem uma visão acrítica e focam apenas em questões práticas ligadas às suas

oportunidades de negócio e vantagens/desvantagens competitivas.

• E a dos atores que recusam o tema em si, considerando que ao aceitar o mercado e as empresas

como parte da solução a economia verde seria ilegítima e incongruente, propondo um fim oposto

à sua própria lógica.

Reconhecendo esta situação de perspectivas diferentes e algumas vezes opostas, nossa abordagem foi

desenvolver uma iniciativa que buscasse aproximar diferentes segmentos da sociedade dentro de uma

perspectiva crítica com relação à economia verde, mas reconhecendo este assunto como um importante

campo para a sociedade civil ocupar.

Nossa iniciativa foi composta por uma série de debates com importantes organizações da sociedade

brasileira, que tiveram um foco objetivo em torno de pontos cruciais de intersecção entre o econômico,

o ambiental e o social. Buscou-se fugir de um debate teórico e entrar em questões concretas para uso

da lógica econômica como uma ferramenta para a transição em prol do desenvolvimento sustentável 2

e da garantia de direitos.

Atualmente, nossa visão está pautada pela grande relevância que a criação de metas para o desenvolvimento

sustentável terá na transição para outro modelo. Temos compartilhado a visão dos que buscam combinar

a noção de limites planetários com uma noção de limites sociais, onde teríamos um “teto” ambiental para

o uso de recursos naturais, e um “piso” social para a garantia de direitos e bem estar.

CONTEXTO

09

Numa abordagem inicial, proposta com base em respeitáveis estudos mas totalmente aberta a

ajustes, aprimoramento e adequação a diferentes realidades, o “teto” ambiental seria composto por:

poluição química, acumulo de gases aerossóis na atmosfera, esgotamento da camada de ozônio, perda

de biodiversidade, mudanças no uso da terra, mudanças climáticas, água doce, ciclo do fósforo e do

nitrogênio, acidificação dos oceanos. Já o “piso” social seria composto por: energia elétrica, água,

comida, renda, educação, resiliência, participação, empregos, equidade social e igualdade de gênero.

Acreditamos que este é o momento de criar mecanismos efetivos e capazes de, rapidamente, ganhar

proeminência na sociedade, mudando enquanto é tempo o perigoso caminho em que nos encontramos.

2

Para maiores informações acesse: www.vitaecivilis.org/rosquinha


CAPÍTULOS TEMÁTICOS:

Reflexões e propostas

dos debates

Tema Governança - Parceiro: IDS | Tema Finanças - Parceiro: Ethos

Tema Convivência - Parceiro: FBOMS | Tema Emprego - Parceiros: CUT e Sustainlabour

A seguir estão os quatro capítulos que reúnem as principais conclusões

e propostas dos debates. Os capítulos são baseados nos materiais

desenvolvidos pelas organizações parceiras do Vitae Civilis e buscam

refletir da melhor maneira possível as discussões realizadas. O resultado

final não reflete necessariamente a posição institucional do Vitae Civilis

ou de seus parceiros, e sim o produto das ricas e intensas discussões.


Sustentabilidade e convivência digna nos biomas

e territórios

Há 20 anos, a Rio-92 marcou o início das atividades de ONGs e redes articuladas em torno da preservação,

recuperação e integração das populações dos grandes biomas brasileiros, e de territórios especiais, como

zona costeira e unidades de conservação. No inicio do século XXI, houve tentativas de se articular atores

da sociedade e de governos em torno de meso-regiões, além das iniciativas associadas à existência e

ao funcionamento de colegiados, como comitês de bacia hidrográfica e processos de Agenda 21 local

(municipal, estadual, de bairros, de cidades). Mais recentemente, a Plataforma Cidades Sustentáveis

e iniciativas como Nossa São Paulo e Nossa Brasília lidam com territórios urbanos e metropolitanos.

Isso sem falar em processos que não geram redes ou alianças mas abrem-se como oportunidades para

essas oferecerem suas perspectivas, como os de Planos Diretores Municipais Participativos, exigidos

pelo Estatuto da Cidade.

O termo “bioma” admite várias acepções. No sentido aqui empregado, refere-se simplesmente a um

espaço geográfico com certo grau de homogeneidade onde interagem o ambiente físico (incluindo

clima, solo), a flora e a fauna. Neste conceito, “zonas urbanas”, “metropolitanas” tanto quanto

“territórios” e/ou “áreas” e/ou “unidades de conservação” são enclaves inseridos nos biomas e por

eles sobredeterminadas.

O conceito de “convivência”, tal como vivenciado pelas redes, é um processo em plena construção.

Nesse sentido, as recomendações que constam neste documento basearam-se no valioso ativo de nada

menos de duas décadas de experiência prática. É utilizado ao mesmo tempo em que continua sendo

objeto de pesquisa técnico-científica, inclusive de conhecimentos tradicionais, e com forte dose de

experimentação. Baseiam-se também na convicção de que o conceito de convivência remete à busca

de um novo modelo de desenvolvimento e de que:

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

11

• A coexistência respeitosa só pode existir quando a preservação ambiental e o bem estar social são

tratados como inexoravelmente unidos e como o centro de políticas, e não só como foco de ações

de mitigação.

• Não existe uma única solução para tudo. Precisaremos de soluções específicas para cada região

e bioma, de acordo com demandas e necessidades específicas. Algumas serão de cunho político,

outras mais sócio-culturais e outras mais tecnológicas.

• A discussão sobre economia verde não pode ser vista como algo novo. Os fundamentos e objetivos da

sustentabilidade foram estabelecidos há muito tempo. O que precisamos é sabido e boa parte já está

acordada em instrumentos internacionais. O desafio é colocar a economia como um todo a serviço do

desenvolvimento sustentável, seja ela adjetivada como verde ou de qualquer outra forma.

• Existe o risco de que as discussões na Rio+20 fiquem na superfície, ou seja, debatendo a

implementação mas sem avançar em direção a decisões políticas essenciais para sua efetivação.

• A transição para a economia verde exige a garantia de um papel mais forte para a sociedade civil,

tanto em nível nacional como internacional.

Premissas da convivência sustentável

Segundo as lideranças das entidades participantes do debate, todos os biomas representados estão

ameaçados por pressões oriundas do padrão e modo de crescimento econômico adotados no País e

que estão colocando em risco a resiliência e a própria sobrevivência dos mesmos. Não custa reforçar

que estamos falando de uma pressão que é exercida tanto sobre áreas rurais como urbanas. E não

se trata apenas da dilapidação dos recursos ou do esgotamento da capacidade de recuperação da

natureza: o atual modelo de crescimento tem limites no próprio aspecto econômico-financeiro, como

as recorrentes crises estão demonstrando, e no aspecto social, onde a desigualdade permanece e se

amplia, apesar da crescente geração de riqueza apontada pelos tradicionais critérios de mensuração da

atividade econômica.


A noção de convivência, portanto, parte de uma crítica às propostas convencionais de “desenvolvimento”

e “crescimento econômico”.

Mas ela busca também a superação do que poderia tornar-se um “determinismo ecológico”, que implica

em uma ideia de “ajustamento passivo” ou submissão ao mundo natural. E reconhece que não existe

consenso ou parametrização sobre o que se considera “vida digna”: a dignidade é afirmada como um

ponto de partida para conquistas mais amplas, e não como ponto de chegada.

Proposições das Redes de Biomas 3

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

12

• Reconhecer o chamado “meio-ambiente” (o meio natural onde se desenvolve a atividade humana)

como uma “condição natural de produção” (e reprodução da vida) e não como apenas um “recurso

produtivo” (econômico-financeiro). A distinção não é somente semântica: ela tem profundas

implicações sociais e políticas, posto que uma das características intrínsecas do conceito de “recurso

econômico” é a possibilidade de sua substituição (por outro “recurso”), enquanto uma “condição

natural” pode até ser alterada, mas não substituída.

• Criar as condições para que o território seja livre e acessível à comunidade (apropriação comunitária).

Não pode haver “cercas” e a apropriação individual é reduzida (e tem papéis reduzidos). Nos biomas

amazônico, cerrado e da caatinga, a densidade humana (e de trabalhadores) é relativamente baixa,

há forte presença de atividades extrativistas e são freqüentes situações de nomadismo. Por isso, a

questão de acesso aos territórios se apresenta como essencial ao funcionamento do modelo.

• Prever grandes espaços (territórios) e a presença de gestão e trabalho coletivos nas unidades de

produção submetidas a restrições ambientais, fortes limitações de crédito, de mão de obra e sem

muitas alternativas tecnológicas. É reduzida ou bastante limitada a busca pela geração de excedentes

(conceito de produção para um mercado). Mesmo sendo o contrário do que é alardeado como

sendo objetivo ideal de uma sociedade “capitalista avançada”, estas “opções” são reconhecidamente

racionais e, se submetidas a uma análise econômico-financeira não imediatista, mostrarão sua

consistência e adequação.

• Favorecer elevado grau de auto-fornecimento (de insumos) e auto consumo, como nos modelos

semi-autárquicos antigos. O consumo intermediário (tal como explicitado nas “Contas Nacionais”)

tende a ser baixo (e obviamente o valor agregado por unidade de energia elevado).

• Desvincular o modelo de produção de objetivos de busca de acumulação financeira e de “maximização

da lucratividade privada”. Diferentemente do modo de produção mercantil (orientado ao mercado),

os critérios de escolha e alocação (para a produção) são bastante autônomos em relação aos

chamados “preços e incentivos de mercado” ou critérios de “produtividade de fatores de produção”.

No caso da agricultura familiar (campesina), por exemplo, a máxima eficiência do modelo parece

residir na relação entre o resultado do “dia de trabalho adicional” e os ganhos adicionais em

“energia” (calorias) que serão produzidas por mais este dia. O segundo critério (e objetivo) de

alocação sempre explicitado é o da manutenção da coesão unidade familiar e comunitária; ou seja,

recursos são aplicados de modo a assegurar a “permanência” do próprio modelo (produto e família/

comunidade), mesmo se isto possa gerar no curto prazo e em termos de rentabilidade financeira

perdas ou ganhos menores.

• Incorporação participativa de coletivos e lideranças de segmentos sociais mais vulneráveis e

historicamente alijados dos processos sociais e de deliberação de políticas públicas. A insistência

das Redes na garantia e ampliação da participação dos interessados nos processos de decisão a

respeito do destino econômico social de seus territórios visa, antes de mais nada, ampliar o poder

político destes grupos como elemento constitutivo da estratégia de “convivência com os Biomas”.

3

ASA-Articulação no Semi-Árido Brasileiro, Rede Cerrado, GTA- Grupo de Trabalho Amazônico e RMA- Rede Mata Atlântica


• Valorização dos chamados conhecimentos tradicionais e das tecnologias sociais, elementos

que compõem a “esfera cultural” (ideológica) do modelo e que servem obviamente tanto para

reproduzir o modelo produtivo quanto como elemento para consolidar a identidade política dos

grupos envolvidos. Ao deterem informações e conhecimentos, percebem que detêm também poder

político e aumentam, com isto, sua capacidade de negociação. Para tais grupos, a apropriação

mercantil de tais conhecimentos é inaceitável pois os fragilizaria politicamente ainda mais.

• Reivindicar mais experimentação, estudos e pesquisas (para integrar conhecimentos tradicionais e

científicos) que fortaleçam o conhecimento tradicional.

• Promover uma educação contextualizada (adaptada) que não promova (tal como agora) a perda ou

a destruição deste patrimônio cultural.

Governança

Um elemento importante, mas ainda pouco trabalhado pelas próprias Redes, é o tema da Governança,

no qual chamam a atenção:

• A contradição entre unidades institucionais e administrativas existentes e as condições de cada

bioma, situação que determina um modelo de “governo” (e governança) que dificilmente consegue

responder adequada e integralmente às questões da sustentabilidade.

• As contradições de governança se manifestam também no âmbito da ideologia que orienta os sistemas

de decisão, pois é bastante evidente a tendência dos agentes institucionais a considerar os chamados

“mecanismos de mercado”, que as Redes e os movimentos sociais, baseados em experiência real,

rejeitam. De fato, observamos que para alcançar a sustentabilidade, tais mecanismos de mercado

devem ter papel absolutamente secundário.

• Outro elemento a considerar é que, nas propostas das Redes (e nos experimentos em andamento),

o sistema de participação da população nas deliberações e na gestão requerem a implantação de

mecanismos de ‘democracia direta’ que se confrontam com estruturas tradicionais de ‘democracia

representativa’ e da burocracia.

• Em um outro nível, pode-se acrescentar a necessária mudança do quadro de valores morais, éticos

e – por que não dizer? - espirituais, sobrepondo a importância da cooperação e da solidariedade

sobre a atual tradição individualista e competitiva do modelo capitalista ocidental.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

13

Proposições sobre o território urbano e a “Cidade Sustentável”

No ambiente urbano é onde fica mais evidente que sustentabilidade não se limita à questão ambiental.

Do ponto de vista econômico-social (e cultural), encontramos aqui uma infinidade de problemas

derivados de comportamentos coletivos e individuais bem como de comportamentos determinados

pelas “regras de mercado” ou das necessidades de valorização do capital (não vinculadas as condições

naturais e sociais).

Tal como nas Redes focadas sobre os Biomas, a sociedade civil em geral vem, desde muitos anos,

buscando construir um corpo prático e teórico de reivindicações, iniciativas e propostas de “cidades

sustentáveis”. O Fórum Nacional de Reforma Urbana – FNRU, rede de Organizações da Sociedade Civil

operando em várias partes do País, trabalha neste sentido, desde o fim dos anos 80 e conta em seu

ativo com conquistas importantes como o “Estatuto da Cidade” (Lei Federal de 2001). Um aspecto

importante deste Fórum é a priorização e o seu foco no atendimento das reivindicações das populações

mais pobres e vulneráveis das cidades.

A partir de 2004 se desenha uma nova iniciativa sobre o mesmo assunto. Constitui-se a Plataforma

sobre Cidades Sustentáveis. Esta iniciativa foi inspirada nos “Compromissos de Aalborg” (iniciativa

dinamarquesa, assinado por centenas de municípios a partir de 2004).


“A cidade que queremos” - Uma cidade que respeite e garanta o direito à moradia, ao saneamento

ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte, à saúde, à educação, à cultura, aos serviços públicos,

ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações. Para tanto, é necessário que os governos

estejam comprometidos com uma política urbana articulada com estratégias de inclusão social e de

justiça ambiental, local, regional, estadual e nacionalmente

“Uma cidade com Desenvolvimento Urbano Sustentável” - O desenvolvimento econômico deve

integrar os direitos sociais em harmonia com o meio ambiente. As políticas e planos para a cidade

precisam assegurar o acesso democrático aos recursos ambientais e paisagísticos, reduzindo os riscos

ambientais e promovendo uma efetiva melhoria da qualidade de vida.

Eixos:

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

14

• Promover a mobilidade sustentável, reconhecendo a interdependência entre os transportes, a

saúde, o ambiente e o direito à cidade.

• Adotar e proporcionar o uso responsável e eficiente dos recursos e incentivar um padrão de produção

e consumo sustentáveis.

• Apoiar e criar as condições para uma economia local dinâmica e criativa, que garanta o acesso ao

emprego sem prejudicar o ambiente.

• Integrar na educação formal e não formal valores e habilidades para um modo de vida sustentável

e saudável.

• Desenvolver políticas culturais que respeitem e valorizem a diversidade cultural, o pluralismo e

a defesa do patrimônio natural, construído e imaterial, ao mesmo tempo em que promovam a

preservação da memória e a transmissão das heranças naturais, culturais e artísticas, assim como

incentivem uma visão aberta de cultura, em que valores solidários, simbólicos e transculturais

estejam ancorados em práticas dialógicas, participativas e sustentáveis.

• Reconhecer o papel estratégico do planejamento e do desenho urbano na abordagem das questões

ambientais, sociais, econômicas, culturais e da saúde, para benefício de todos.

• Implementar uma gestão eficiente que envolva as etapas de planejamento, execução e avaliação.

• Promover comunidades inclusivas e solidárias.

• Assumir plenamente as nossas responsabilidades para proteger, preservar e assegurar o acesso

equilibrado aos bens naturais comuns.

• Fortalecer os processos de decisão com a promoção dos instrumentos da democracia participativa

• Assumir as responsabilidades globais pela paz, justiça, equidade, desenvolvimento sustentável,

proteção ao clima e à biodiversidade.

• Proteger e promover a saúde e o bem-estar dos nossos cidadãos.


Governança do desenvolvimento sustentável,

integridade ambiental e justiça social

O mundo vem debatendo as questões relacionadas ao desenvolvimento e ao meio ambiente há pelo

menos quatro décadas. Desde então, o tema tem conquistado espaço nas universidades, empresas,

imprensa e fóruns intergovernamentais, porém de forma fragmentada, descoordenada e com diferentes

agendas. Muitos avanços foram obtidos graças à pressão de setores sociais sobre empresas e governos,

mas essa pressão está longe de representar um fator de mudanças substanciais nos padrões de produção

e consumo vigentes. A construção de um sistema democrático e participativo de governança global é

um contrapeso necessário para que o sistema econômico cumpra seu papel: é impossível falar em

economia verde sem falar em governança para o desenvolvimento sustentável.

A necessidade de construção de um quadro efetivo de instituições e processos de tomada de decisão

nos níveis local, nacional, regional e global tem sido um dos pontos-chave quando se discute a

sustentabilidade e os caminhos para o futuro. Opções para a reestruturação da governança ambiental

global já vem sendo discutidas há alguns anos, inclusive no âmbito das Nações Unidas, e consultas e

propostas vem sendo realizadas tanto pela sociedade civil como pelos governos nacionais. Tal discussão

esteve presente durante as negociações para a elaboração do Draft Zero da Conferência das Nações

Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), nos encontros que reuniram a sociedade civil,

como o Fórum Social Temático (ocorrido em janeiro deste ano em Porto Alegre), e em toda a série de

debates preparatórios para a Rio+20, bem como em alguns outros documentos produzidos no âmbito

das Nações Unidas, como o relatório do Painel de Alto-Nível em Sustentabilidade Global das Nações

Unidas, denominado Resilient People, Resilient Planet: a Future Worth Choosing.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

15

Nesse contexto, reconhece-se que a ONU avançou ao abrir a possibilidade de maior participação no

processo de elaboração do documento-base que será levado para deliberação dos países integrantes do

sistema. Para a elaboração do Zero Draft, foram consideradas 677 propostas encaminhadas por países

e instituições da sociedade. Foi um valioso canal de diálogo e uma experiência a ser aprofundada.

Porém o documento gerado se apresentou como insuficiente perante as demandas da sociedade civil e

a riqueza de contribuições aportadas, inclusive no tema Governança. Da mesma forma, as negociações

que se seguiram continuaram a enfraquecer ainda mais o documento. Alguns pontos críticos merecem

ser apontados: a falta de um sentido de urgência com relação às questões ambientais, o pressuposto de

que o avanço da tecnologia e o aumento da eficiência são suficientes para lidar com as atuais crises, a

falta de conectividade e profundidade entre os temas citados no documento, a falta de avanço na forma

de implementação dos compromissos já adotados em outras conferências e convenções da ONU e a

falta de referência ao tema governança global. Causa desconforto a ausência de propostas claras para

um avanço concreto em direção à sustentabilidade.

Não existe uma sobreposição entre o que as pessoas em geral entendem como governança e o que está

de fato na pauta de discussões da Rio+20, que é basicamente a reforma das instituições da ONU que

respondem de alguma forma pelas questões ambientais (entre elas, o PNUMA e o ECOSOC), buscando

reduzir a fragmentação do processo decisório e a baixa efetividade das ações. Até o momento, esse

debate não refletiu a necessidade de buscar formas para colocar o tema do desenvolvimento sustentável

nos centros decisórios das Nações Unidas e das outras instituições de governança global (Conselho de

Segurança, OMC, G-20).


Atuação do Governo Brasileiro na Rio+20

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

16

O governo brasileiro vem gradativamente buscando maior articulação no processo de consulta através da

Comissão Nacional Preparatória da Rio+20, de iniciativas como o Grupo de Trabalho instituído no âmbito

do CDES-Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que está promovendo o diálogo interatores

sobre temas relacionados à conferência. Porém o processo ainda é pontuado por desequilíbrios entre

os vários atores. É fato que existe uma distância relevante entre o que a sociedade espera como

resultados das discussões da Rio+20 e o que poderá realmente ser discutido entre os Chefes de Estado

e representantes oficiais presentes na Conferência, o que não impossibilita a sociedade civil de se

articular e traçar caminhos que atendam suas demandas, tanto nas discussões oficiais, como na Cúpula

dos Povos, nos chamados “Dias do Meio” 4 , nos Diálogos Nacionais sobre economia verde, entre outros

fóruns. Essa articulação se faz necessária para definirmos o que esperar das metas de desenvolvimento

sustentável e como alcançá-las, além de abrir mais espaços para a atuação desses grupos e repensar

formas de levar a discussão sobre sustentabilidade às mais altas instituições de governança global.

É necessário, portanto, criar uma sinergia para que a sociedade civil articulada possa influenciar as

rodadas de negociação preparatórias.

As propostas do Zero Draft

Em relação às propostas de reforma do sistema de governança ambiental, o Zero Draft se resume à

exposição das propostas que vêm sendo há algum tempo debatidas. As negociações informais que

vêm se seguindo evidenciam ainda mais as dificuldades para se chegar a um arranjo que confira poder

normativo real, capacidade de coordenação em alto nível e instrumentos de participação da sociedade

nos processos decisórios.

Essas propostas não alcançam o objetivo de inserir a perspectiva do desenvolvimento sustentável no

centro decisório da ONU, para guiar estratégias e ações de desenvolvimento em todos os níveis, que

tenham atribuições mandatárias. O arcabouço institucional da ONU é insuficiente para solucionar os

problemas de governança para o desenvolvimento sustentável. O entendimento amplo de governança

global não pode se restringir ao que está de fato na pauta de discussões da Rio+20, que é basicamente

a reforma das instituições da ONU que respondem de alguma forma pelas questões ambientais (dentre

elas o Pnuma e o Ecosoc 5 ), buscando reduzir a fragmentação do processo decisório e a baixa efetividade

das ações. Até o momento, o debate ainda não refletiu a necessidade de buscar formas para colocar o

tema do desenvolvimento sustentável nos centros decisórios da comunidade internacional, que envolve

o Conselho de Segurança da ONU, a OMC, o Banco Mundial, o FMI e até mesmo o G-20.

A criação de uma Organização Mundial para o Meio Ambiente (OMMA) vem ganhando força, mas

não houve avanços suficientes nos últimos anos rumo ao estabelecimento de uma reestruturação da

governança ambiental global ou de padrões de desenvolvimento sustentável. Com equipe, orçamento

e força política reduzidos, o Pnuma não é visto como órgão capaz de lidar com os desafios atuais.

No que se refere à participação e representação de todos os stakeholders, a necessidade de cumprir com

o Princípio 10 da Declaração do Rio, que dispõe sobre a participação de todos os cidadãos interessados

no processo decisório, é frequentemente citada. No entanto, as propostas de ampliação da participação

pública e privada no processo de tomada de decisão são tímidas. Questões como mecanismos para

conferir efetividade às contribuições da sociedade, ao apoio para o aprimoramento de sua capacidade

técnica e organizacional, principalmente nos países menos desenvolvidos, estão ausentes das discussões

em curso.

4

Trata-se do evento “Diálogos para o desenvolvimento sustentável” evento organizado pelo governo brasileiro e que até o momento não se mostrou

realmente aberto para a sociedade civil.

5

Ecosoc: Conselho Econômico e Social das Nações Unidas.


Neste momento em que a comunidade internacional se dispõe a discutir mecanismos de mercado para

induzir processos econômicos voltados ao desenvolvimento sustentável, causa forte preocupação a

ausência de uma postura mais atenta às demandas da sociedade por mecanismos de regulação. Hoje,

não há mais espaço para dúvidas quanto à necessidade de um arcabouço institucional que tenha

capacidade de regulação do mercado e que esse arcabouço deva ser participativo, transparente e que

tenha instrumentos de verificação e contrapesos.

Necessidades

• É preciso aumentar a cooperação e a coordenação entre os Acordos Ambientais Multilaterais,

buscando maior sinergia e eficácia na implementação desses acordos.

◦◦

Recomenda-se a criação de organismo independente de revisão de cumprimento dos

compromissos assumidos nos Acordos Ambientais Multilaterais pelos Estados-Membros,

garantindo acesso à sociedade civil para desencadear processos de controle e verificação.

◦◦

Será necessário também criar novas métricas para o desenvolvimento sustentável que

considerem fatores ambientais e de bem estar que superem os valores estritamente monetários.

• Urge incrementar a coerência entre os órgãos da ONU sobre temas transversais e reduzir a

fragmentação dos temas referentes ao meio ambiente e desenvolvimento nas diversas organizações,

agências e programas da ONU e outros organismos internacionais. É necessário levar a pauta

sobre desenvolvimento sustentável para ser discutida dentro do G-20, o que gera eco inclusive nos

movimentos sociais, pois fazer com que a pauta do G-20 incorpore outras questões é um ponto de

convergência entre esses movimentos. Outro ponto é tentar influenciar o governo brasileiro para

que o País adote postura favorável à introdução dos temas da sustentabilidade nas negociações do

G-20.

• Olhando-se para o que já existe, recomenda-se transformar o Conselho Econômico e Social - Ecosoc

- em Conselho de Desenvolvimento Sustentável, assegurando o assento de representantes da

sociedade civil na sua composição.

• Porém é fundamental avançar para a criação de agência especializada para o meio ambiente, a

partir do PNUMA, com a adesão universal e um mandato reforçado e início de negociações para

criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente a partir de 2015.

• A questão do funding deve ser igualmente abordada com a criação de fundo para o financiamento

do desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento a partir de taxa a ser aplicada

sobre as transações financeiras internacionais. A criação de um fundo global a partir da taxação

das transações financeiras internacionais pode ser um instrumento importante de financiamento

do esforço de transição para o desenvolvimento sustentável, principalmente nos países em

desenvolvimento. Estes são temas que ampliariam significativamente o escopo da discussão, hoje

limitado à reforma institucional dos quadros ambientais da ONU.

• Para assegurar o acesso à informação e também a participação da sociedade, deve-se estabelecer

uma convenção global sobre o Princípio 10 da Declaração do Rio e as diretrizes para fortalecer

a participação em fóruns internacionais relacionados ao desenvolvimento sustentável. Com o

mesmo objetivo, deve-se estabelecer uma convenção internacional sobre responsabilidade social

corporativa.

• O comprometimento com programa intensivo de capacitação para implementar as diretrizes de

2010 de Bali sobre o Princípio 10 é igualmente fundamental para o funcionamento eficiente de um

novo arcabouço de governança.

• É necessário ainda definir instrumentos e critérios transparentes que induzam ao uso sustentável

dos recursos naturais.

• Deve-se garantir a aplicação dos princípios do Rio, com especial atenção ao princípio de precaução,

e o equilíbrio de gênero.

• Deve-se estabelecer um processo inclusivo e participativo para elaboração e implementação das

Metas de Desenvolvimento Sustentável consistentes com os princípios da Agenda 21.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

17


Instituições financeiras e instrumentos

econômicos

Não existe economia verde ou desenvolvimento sustentável se as artérias financeiras que irrigam o

corpo produtivo não estiverem alinhadas a valores e práticas aos princípios que norteiam a transição

para um novo modelo de desenvolvimento. Por isso, a discussão sobre a transição para a economia

verde precisa abordar seriamente os mecanismos e instituições que vão viabilizar os investimentos

nessa área. Existem diversos tipos de políticas que podem ser utilizadas para direcionar o capital de um

tipo de atividade para outro: algumas que focam em incentivos e empreendedorismo dos agentes do

mercado, e outras mais voltadas a desincentivos e criação de regras mais restritivas.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

18

É necessário que as instituições financeiras assumam a liderança do processo de transição para uma nova

economia e, com apoio dos governos e em diálogo com a sociedade; coloquem essas iniciativas no centro

de suas estratégias de negócio, criando mercados financeiros mais resilientes que contribuam para uma

maior estabilidade da economia e que gerem valor compartilhado para investidores e também para a

sociedade. Uma análise do atual cenário mostra que o mercado financeiro avançou significativamente

nessa direção. Como se verá mais adiante neste capítulo, já existe uma ampla gama de iniciativas

públicas e privadas que contribuem para que os mercados financeiros tenham um papel positivo na

construção da nova economia. Ocorre que tais iniciativas carecem de escala e, principalmente, pecam

por não estarem integradas às estratégias de negócio das principais instituições financeiras.

Uma estratégia de longo prazo para o fortalecimento do sistema financeiro brasileiro e para ampliar seu

papel na transição para uma nova economia deve ser orientada por três premissas de desenvolvimento

de modelos de negócios e gestão:

Finanças verdes

Finanças inclusivas

Finanças responsáveis

1. Que preparem as instituições financeiras para o atendimento das novas

demandas do setor, provenientes dos investimentos necessários para a

construção de uma economia verde e, ao mesmo tempo, desenvolver uma

visão de risco de longo prazo que oriente os negócios para instrumentos

adequados diante das novas condições ambientais e sociais resultantes das

mudanças climáticas.

2. Que possibilitem o fortalecimento de pequenas empresas, especialmente

dentro de modelos e cadeias de valor integradas aos padrões da

sustentabilidade, e que atendam adequadamente as populações que estão

saindo da miséria, de forma que estas tenham condições de organizar sua

vida financeira.

3. Com o aperfeiçoamento de padrões, mecanismos de gestão e de controle

que previnam o uso de instituições financeiras em atividades de corrupção

e que favoreçam a oferta de serviços que preservem a saúde financeira de

seus clientes.

É necessário que a atividade financeira migre da atual abordagem, predominantemente focada em

riscos, para uma visão financeira que leve em consideração seu papel de provedor de estabilidade

às economias e de proteção aos consumidores. Tal mudança está totalmente alinhada com a atual

necessidade de ir além dos modelos tradicionais de reprodução e de recuperação de crises, pois o

crescente e contínuo estímulo à demanda e ao endividamento dos governos para retomada do

crescimento está na beira dos limites físicos dos ecossistemas e dos recursos naturais – intransponíveis

ao crescimento. Mudanças incrementais que preservem o business as usual não são mais suficientes.

Nas bases de uma nova organização dos sistemas financeiros devem estar presentes abordagens mais

amplas de risco, visão de longo prazo e relacionamento com stakeholders, a criação de novas medidas

de desempenho e risco, novos incentivos e, sobretudo, a ampliação da transparência dos mercados.


Modelagem de Financiamento

• Em termos de modelagem, os bancos não oferecem produtos voltados à sustentabilidade: seu foco

é no curto prazo e no retorno, quando finanças sustentáveis são para o longo prazo. Falta mão de

obra capaz de fazer essa análise integrada em vários níveis: hoje sustentabilidade se integra ao

projetct finance apenas em grandes obras.

• A indústria de Venture Capital no Brasil ainda é nova e carece de pipeline adequado para cumprir seu

potencial de alavancador da economia verde. Incubadoras e business schools precisam incentivar

mais o empreendedorismo que fomenta esse pipeline. Políticas governamentais de educação,

empreendedorismo e inovação também podem contribuir para diminuir o gargalo. O mesmo se

aplica às linhas de financiamento do BNDES, reembolsáveis ou não: elas existem, mas faltam bons

projetos.

• Sugere-se a criação de um mecanismo, como um banco da sustentabilidade, para desenvolver

pequenos e médios empreendimentos que hoje não são foco das instituições financeiras.

• Recomenda-se ainda investir em modelos e práticas de transparência para análise financeira dos

riscos.

Instrumentos financeiros

• Os recursos disponíveis pelas linhas existentes são insuficientes para os grandes desafios da economia

verde. Recursos adicionais podem ser externos, ou ainda vir de modelagens que combinem fluxos

públicos e privados. Podem ser criados fundos que usam recursos privados a partir de diretrizes e

linhas de atuação públicas, como o programa nacional de restauração de biomas, por exemplo.

• A Taxa Tobin poderia apoiar a criação de um fundo global, com a aplicação de 0,07% do PIB da OCDE

em desenvolvimento sustentável.

• A abordagem setorial, por sua vez, pode ser mais efetiva, especialmente se concentrada em

atividades que permeiam todas as cadeias de valor da economia, como energia que, por isso, tem

alto potencial indutor de mudanças. Da mesma forma, o agronegócio poderia também ser um dos

focos prioritários, porque pode seguir um rumo equivocado se não for pressionado por eficiência,

gestão de terras e accountability.

• Uma alternativa a ser avaliada é a inclusão de demandas por adicionalidades socioambientais em

debêntures usadas em projetos de infraestrutura.

• O BNDES deve ser o “banco do desenvolvimento sustentável”, estabelecendo padrões operacionais

e criando instrumentos para uma nova economia. Mas o financiamento para uma economia

verde deve contar com outros atores, além do BNDES, tais como fundos de pensão e gestores de

recursos com carteiras expressivas, os quais precisam ser informados sobre a sustentabilidade dos

empreendimentos que financiam. Para tanto, urge aproximar o mercado financeiro dos objetivos

ambientais, reorganizar o fluxo financeiro e redefinir o que é um bom investimento, com a inclusão de

outros indicadores de sucesso, além do financeiro, tais como água, inclusão social etc., traduzindoos

para sua linguagem específica.

• Um banco verde assumiria riscos maiores, porém com custos mais baixos. Uma boa ideia nesse

sentido é o Fundo Clima, que permite a captação de recursos do Ministério do Meio Ambiente e

empresas.

• Criar sistemas de monitoramento e informação que ampliem a transparência, por meio de

informações padronizadas em melhores sistemas (pelo IBAMA, secretarias etc.): o sistema de

informação socioambiental deveria ser tão fundamental para qualquer operação financeira como

o cadastro de crédito. Recomenda-se criar um think tank ou força tarefa de alto nível para ter

propostas e metodologias na mesa – o Ethos poderia fazer a ponte para que atores apropriados

trabalhem este assunto com propriedade, criando um ‘cardápio’ do que é possível e não é mero

piloto.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

19


Regulamentação

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

20

• São necessários instrumentos regulatórios que façam a economia verde crescer. A antecipação

voluntária permite vantagens competitivas a partir da mitigação de riscos, mas, num segundo

momento, deve haver pressão para que autorregulamentação se transforme em regra. O controle

púbico foi citado como mais adequado, e a dificuldade de se falar em autorregulamentação em um

mercado globalizado também aponta nesta direção.

• A transparência deve ser premissa para a criação de laços de confiança na sociedade sobre

mecanismos econômicos justos e adequados.

• É necessário que haja advocacy sobre os pontos discutidos: precisa haver força política para

convencer governos de que é necessário investir em regulamentação para uma economia verde

• Para as discussões continuarem, é preciso envolver bancos privados e sua entidade de classe, como

a FEBRABAN. Foi recomendado ainda o envolvimento de fundações e institutos ligados aos bancos.

• A abordagem para uma nova economia deve ser sistêmica, envolvendo setor financeiro e sociedade,

entre parceiros que aceitem uma lógica nova e demonstrem que ela é viável. Criar outros espaços

como a Bolsa Verde, do Rio de Janeiro, ou um think tank com apoio do BNDES, seria recomendado

para que atores pensem sobre a criação de instrumentos com liquidez, integridade ambiental e que

sejam regulamentados pelo governo.

• Hoje a regulamentação restritiva é mais efetiva na criação de um mercado e geração de investimentos.

Deve-se tornar mais caro o que é insustentável e facilitar-lhe menos o crédito. Incentivos e isenções

fiscais também podem ser parte da solução para viabilizar projetos específicos.

• O Brasil assinou a Partnership for Market Readiness, sinalizando a existência de um mercado de

carbono e o comprometimento com metas até 2020 e definindo um mecanismo de mercado, ao

invés de taxas, comandos e controles. No processo, enfrenta-se hoje assimetria de legislação e falta

de informação, por isso um ambiente de proatividade deve ser fomentado: deve haver um first

mover, mesmo se o primeiro movimento for desvantajoso.

Recomendações para instituições financeiras e para o governo

A partir destas análises e premissas, instituições financeiras e governo devem seguir uma agenda de

mudanças em direção a uma nova economia:

Agenda de mudanças para

instituições financeiras

• Criar mecanismos para ampliar o

acesso da população de baixa renda a

serviços financeiros que melhorem suas

oportunidades de geração de renda e

qualidade de vida.

• Ampliar mecanismos financeiros que

estimulem o uso sustentável de recursos

naturais, em especial o manejo sustentável

de florestas.

• Criar mecanismos financeiros de estímulo

ao uso mais eficiente de recursos naturais na

produção industrial e agrícola, na indústria

de base e infraestrutura e nos domicílios.

• Ampliar investimentos em energias

renováveis.

Agenda de mudanças para o governo

• Massificar programas de educação financeira, desde o

ensino básico, nas empresas e organizações sociais

• Fortalecer mecanismos de defesa dos direitos do

consumidor

• Estabelecer padrões de venda responsável de produtos

financeiros

• Ampliar os sistemas públicos de informação para

facilitar a avaliação de riscos e impactos econômicos,

sociais e ambientais das operações financeiras

• Criar processos mais inteligentes, eficientes e efetivos

de avaliação e monitoramento dos impactos sociais

e ambientais de investimentos em infraestrutura,

extração mineral, petróleo e gás, energia, transporte,

construções e agricultura


Agenda de mudanças para

instituições financeiras

• Incluir a mensuração das emissões dos gases

de efeito estufa nos parâmetros de avaliação

de financiamentos.

• Incorporar a prática de valoração econômica

de riscos e impactos sociais e ambientais dos

empreendimentos e clientes financiados.

• Estabelecer processos contínuos de

relacionamento com stakeholders para

discussão das estratégias dos bancos e

demais agentes financeiros para a nova

economia.

• Desenvolver, em parceria com governo e

organizações da sociedade civil, centros

de inteligência e pesquisa sobre riscos e

oportunidades de negócios relacionados às

mudanças climáticas.

Agenda de mudanças para o governo

• Criar processos mais inteligentes, eficientes e efetivos

de avaliação e monitoramento dos impactos sociais

e ambientais de investimentos em infraestrutura,

extração mineral, petróleo e gás, energia, transporte,

construções e agricultura

• Ampliar espaços de diálogo e consulta pública para

a discussão sobre grandes investimentos e seus

impactos na sociedade e no meio ambiente

• Estabelecer padrões mínimos para gestão de risco e

governança e divulgação dessas informações sobre

sustentabilidade para instituições financeiras

• Criar grupo de trabalho para definir as bases da

responsabilidade fiduciária dos investidores sobre

impactos sociais e ambientais

• Desenvolver incentivos públicos para o fortalecimento

de pequenos bancos, cooperativas de crédito e

instituições de microfinanças

• Aplicar os principais padrões internacionais de

sustentabilidade em finanças e investimentos em

bancos públicos, fundos de pensão e de investimentos

com participação governamental

• A criação do Imposto de Transação Financeira

(também conhecida como Imposto de Tobin) tem que

ser considerado seriamente como um instrumento

para a transição para a economia verde

• Criar um fórum aberto e contínuo de debates

entre instituições financeiras, órgãos reguladores e

organizações da sociedade civil para avaliação e revisão

da agenda de sustentabilidade do setor financeiro

• Defender um padrão mínimo de regulação dos sistemas

financeiros em todos os países e o fortalecimento da

governança do sistema financeiro global

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

21

Avanços reconhecidos

A agenda de iniciativas que ainda precisam ser desenvolvidas e implementadas não exclui a continuidade

de ações já em curso:

• Quase todas as instituições financeiras estão desenvolvendo padrões e serviços para o financiamento

de projetos mais alinhados com princípios de sustentabilidade. O que falta é estas iniciativas ganhem

escala e sejam incorporadas nas estratégias de negócios de todos os serviços financeiros.

• No setor de microfinanças, temos uma cobertura de 60% da demanda brasileira, segundo dados do

Banco Central. O que falta é atender 14 milhões de pessoas e 16 milhões de empreendimentos de

pequeno porte que permanecem à margem do sistema financeiro.

• No campo das mudanças climáticas, os bancos brasileiros tem um compromisso institucional

formalizado com políticas para o clima, mas ainda não calcula as emissões de CO2 em sua cadeia

de valor.

• Já há a oferta de alguns produtos financeiros relacionados às mudanças de clima, mas são ainda

ações pontuais com baixa representatividade nas carteiras.


CAPÍTULOS TEMÁTICOS

22

• Os Princípios do Equador são um dos padrões mais importantes de avaliação de riscos sociais e

ambientais no financiamento de grandes projetos, mas é preciso avançar em três grandes campos:

a ampliação do escopo dos princípios para que sejam aplicados a outros tipos de modelos de

financiamento, e não só para grandes projetos; ampliar a consistência de sua implementação por

seus membros; e promover a transparência sobre sua aplicação. Os Princípios do Equador também

estão definindo o escopo para incorporação de riscos associados à biodiversidade e serviços de

ecossistema em seu processo de avaliação de financiamentos.

• A Global Investor Statement on Climate Change, declaração de 285 investidores que controlam 20

trilhões de dólares em ativos mostra a preocupação dos grandes agentes quanto aos riscos mas,

sobretudo, a identificação de oportunidades em eficiência energética, renováveis e descarbonização,

dentro de um processo de longo prazo de desenvolvimento de uma nova economia.

• O mercado de créditos de carbono, embora ainda fortemente concentrado na Europa, que movimenta

mais de 80% do mercado global, atingiu volume de negócios da ordem de 140 bilhões de dólares

em 2010. Seu potencial de expansão depende especialmente dos novos acordos climáticos. Uma

eventual entrada de países como Estados Unidos, China, Índia e Brasil deverá promover um grande

aumento no volume global. No Brasil, a regulamentação da lei de mudanças climáticas, a definição

de metas setoriais e a criação de infraestrutura para criação de um mercado nacional abrirá uma

grande oportunidade de negócios.

• A iniciativa do governo britânico de criar o Green Investment Bank pode se tornar uma importante

referência para que outros bancos de investimentos reorganizem-se e estruturem negócios para

atender a demanda de investimentos em economias de baixo carbono.

• O painel de alto nível criado pelo Secretário Geral da ONU para discussão de propostas para a

sustentabilidade global defende o estabelecimento da responsabilidade fiduciária dos investidores

sobre impactos nos capitais social e ambiental. É necessário levar essa discussão adiante e

ampliá-la, envolvendo investidores, empresas, governo e sociedade – no Brasil, essa visão já está

sendo incorporada em decisões do judiciário, porém sem uma definição prévia da extensão da

responsabilidade fiduciária, levando os agentes à insegurança na análise de risco de seus investidores.

• Existem importantes iniciativas em curso também no campo regulatório, sendo que as mais

promissoras são as promovidas por bancos centrais, como o Banco do Povo da China, que criou uma

lista de exclusão de empresas que não respeitam a legislação ambiental e, por isso, estão impedidas

de receber novos financiamentos. O Green Insurance obriga todas as empresas com altos risco de

danos ambientais a assumir as responsabilidades. O Green Securities, por sua vez, exige que todas

as empresas avaliem previamente os riscos de impacto como condição para abertura de capital.

Além disso, as autoridades monetárias estão estudando a incorporação de padrões ambientais no

sistema tributário, nos seguros e no mercado de capitais.


Empregos verdes, trabalho decente, produção e

consumo sustentável

Falar de empregos é estabelecer uma ponte tanto com a crise econômica que afeta Europa e Estados

Unidos, como com a falta de mão de obra no Brasil e a crescente inclusão de trabalhadores nas

emergentes economias de Índia e China. Se por um lado há consenso de que o crescimento econômico

não deve se dar às custas da dignidade do trabalhador e de sua inclusão no sistema produtivo, o que

se percebe, no atual modelo de desenvolvimento, é uma necessidade de investimentos do Produto

Interno Bruto de um país para que haja geração de postos de trabalho, por conta dos enormes avanços

em produtividade conquistados nas últimas décadas. Já em um novo modelo de crescimento, pautado

pela sustentabilidade e pelos princípios da economia verde, o desafio é promover uma transição que

não penalize a mão de obra empregada em setores que tendem a diminuir ou desaparecer, dentro

dessa nova forma de economia.

É com um olho no presente e outro no futuro que foram feitas proposições para a geração de empregos

verdes e trabalho decente. Elas se baseiam na constatação da relação entre pobreza e degradação

ambiental, apontada na Agenda 21, e buscam promover uma intersecção entre a agenda tradicional dos

sindicatos – crise econômica, financeira, de emprego – com a agenda ecológica, tendo como referência

os conceitos de economia verde, produção e consumo sustentáveis.

Princípios e propostas para uma economia verde

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

23

A intersecção das agendas ecológica e laboral tem por ponto de partida os itens que devem aportar à

economia verde para que esta seja defendida pelos sindicatos:

• A economia verde deve estar baseada em direitos e respeitar o direitos laborais.

◦◦

As mulheres devem ser contempladas de forma particular, com a promoção de emprego para

trabalhadoras por meio de políticas antidiscriminação e pró-família, cota para mulheres em

empregos não-femininos.

◦◦

Em todo o mundo, são os jovens quem sobre as piores condições laborais. No Sul, a maior

parte dos jovens tem como expectativa um futuro difícil no setor informal. No Norte, a bolha

imobiliária e o resgate dos bancos deixaram um futuro negro para as novas gerações. Sua

inclusão na economia verde é fundamental para que esta seja justa.

◦◦

É necessário prever formação setorial em setores “verdes”e políticas orientadas para reduzir a

brecha salarial.

◦◦

Neste contexto, desafios futuros já devem ser contemplados, a saber: as condições mais

desfavoráveis de novos setores, em relação a indústrias mais maduras, pela ausência de

sindicatos organizados e a consequente ausência de acordos coletivos. A inclusão de cláusulas

ambientais dentro de acordos coletivos poderá ser um caminho rumo a novos padrões de

produção e consumo.

• A economia verde deve cumprir objetivos sociais: nesse contexto, nota-se que tornar a produção

mais limpa exige uma mudança de foco da produção de bens para a prestação de serviços, uma vez

que a satisfação das necessidades dos trabalhadores não exige a posse de um bem (um carro, por

exemplo), mas sim do benefício que ele oferece (transporte) – o que pode ser provido por outras

formas.

◦◦

Eliminar a prática da obsolescência programada em prol da conservação e manutenção dos

produtos também gera empregos no setor de serviços e reduz impactos ambientais da produção.


• A economia verde deve basear-se na equidade entre e dentre os países.

◦◦

A solidariedade internacional, a cooperação e transferência de tecnologia entre Norte e Sul

são fundamentais para evitar que medidas de proteção ambiental adotadas nos países

industrializados afetem indiretamente os países em desenvolvimento, especialmente as

pequenas empresas de países pobres que não tem capacidade de adaptar suas tecnologias ou

de formar seus trabalhadores.

• A economia verde deve basear-se na economia real e não na especulativa

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

24

• A economia verde deve ter uma agenda em favor da geração de empregos que possam ser

classificados como trabalho decente.

◦◦

Os empregos verdes não podem ser patrimônio do Sul ou do Norte, nem devem se concentrar

nos únicos setores já vistos com potencial para gerar empregos verdes: devem ser promovidas

mais investigações sobre novos setores e trabalhar na conversão para empregos verdes.

• A economia verde deve reverter a tendência do sistema atual de “espremer” os trabalhadores,

promovendo o emprego pleno, junto com o uso eficiente de materiais e energia e transformando o

atual desequilíbrio de forças entre capital e trabalho.

• Uma economia verde deve ampliar os sistemas de proteção social como ferramentas de construção

de resiliência das economias e de combate à pobreza. Nesse sentido, um Piso de Proteção Social

para países onde não há nenhuma proteção seria um grande avanço, assim como a ratificação da

Convenção 102 da OIT, relativa à fixação de normas mínimas de seguridade social.

• A economia verde deve ser democrática, promovendo processos nos quais a sociedade civil participe

da tomada de decisão.

◦◦

É preciso promover o conhecimento sobre a cadeia produtiva de forma que trabalhadores e

empresas possam rever processos e também para que o consumidor possa se posicionar melhor

e tomar decisões mais conscientes.

• A transição para uma economia verde deve ser justa, com a gestão dos setores que serão afetados

negativamente e proteção social adequada a trabalhadores e famílias afetados. Esta transição Uma

transição justa deve ser baseada em políticas industriais e laborais ativas, proteção de ingresso,

formação profissional, diálogo social, avaliação dos potenciais, investimentos no âmbito local e

políticas de diversificação econômica.

Da obsolescência programada à reparação e conservação

Os atuais sistemas de produção se baseiam na produção mais barata de produtos menos duráveis,

sendo que uma das principais características da produção e consumo sustentáveis é a durabilidade

dos produtos. Por isso, uma das propostas é justamente acabar com a obsolescência programada

(planejamento pelo fabricante durante a fase de design para que depois de um tempo o produto se

torne inútil ou obsoleto), embora, à ̀ primeira vista, esta abordagem pareça ter conseqüências negativas

para o emprego, pois exigiria menos postos de trabalho para a produção de bens duráveis e para a

extração de recursos. No entanto, a reparação e manutenção de bens abrem novas oportunidades de

empregos que se perderam nas últimas décadas, mas que eram muito numerosos em tempos menos

recentes. Na verdade, a reparação de mercadorias é mais intensa no emprego do que a produção de

novos produtos.


Redução da jornada de trabalho

Faz-se necessário encarar a variável tempo de forma mais sistemática dentro dos debates para geração

de empregos verdes e padrões de consumo mais sustentáveis. Estudo do Centro de Investigação

Econômica e Política em Washington concluiu que se os americanos reduzissem suas horas de trabalho

às normas européias, reduziriam sua pegada de carbono entre 20% e 30%. Nesse contexto, a redução

da jornada de trabalho não só teria um impacto ambiental positivo, como seria também uma maneira

de reverter a atual crise de emprego, notadamente nas economias desenvolvidas, repartindo o trabalho

e aumentando a população assalariada. Seria, ainda, uma solução que nos ajudaria a coletivamente

mover-nos para um consumo mais sustentável, o qual requer ajustes em horários e prazos para que o

trabalhador não fique refém do fast food ou possa utilizar transportes públicos ou até mesmo locomoverse

a pé ou de bicicleta para o trabalho.

O cargo de delegado para questões ambientais dentro das empresas

A participação dos sindicatos e trabalhadores já havia sido apontada como relevante na Agenda 21,

que recomendava: promoção da participação de trabalhadores nas auditorias nos locais de trabalho

e na avaliação de impacto ambiental; participação em atividade relacionada ao meio ambiente e

desenvolvimento nas comunidades locais, e de ações conjuntas para problemas que sejam coletivos;

e por fim ter um papel ativo nas atividades de desenvolvimento sustentável, nacional e regional e

particularmente no sistema das Nações Unidas.

Duas décadas depois da redação dessas propostas, constata-se que a atuação das organizações sindicais

na temática socioambiental está muito mais avançada. Programas de melhoria do local de trabalho,

mobilidade urbana, eficiência energética, atuação nas convenções internacionais e no contexto

nacional relacionado a clima, desertificação e biodiversidade já é parte da realidade de centenas de

centros nacionais de organizações sindicais. Porém os sindicatos precisam de novos direitos, como um

delegado para questões de meio ambiente nas empresas, um cargo que já está sendo implementado

em alguns países.

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

25

Regulação do mercado

A mudança que desejamos não se dará sem regulação do mercado. A autorregulação não foi eficiente,

portanto é preciso contemplar a criação de marcos regulatórios ou utilizar a reforma tributária com esse

fim.

Informação e educação

Há falta de acesso à informação e falta de educação sobre o tema, o que dificulta a atuação do

trabalhador e do consumidor de forma consciente e ativa. Deve ser obrigação do setor empresarial

aplicar critérios socioambientais às suas atividades e disponibilizar as informações para orientação de

governos e agentes financiadores para orientar cessão de créditos, e para o consumidor, para orientar

decisões de consumo. O consumidor precisa conhecer e entender a cadeia produtiva pois o papel do

controle social é fundamental neste processo de transição. É preciso promover o consumo consciente

e de qualidade com controle social também em diálogo com o trabalho para levar a uma nova cultura

sobre consumo.

Alianças

É preciso reforçar alianças entre organizações que trabalham os pilares do tripé do desenvolvimento

sustentável.


Transição justa

O olhar para o presente faz aflorar a necessidade de foco na transição justa para uma economia verde

– e este é o conceito que o movimento sindical compartilha com a comunidade internacional envolvida

com esta transição, entre governos, empresas e a sociedade civil organizada, como maneira de tornar o

caminho mais suave durante a transição. Uma transição justa está baseada na justiça social e ambiental,

na solidariedade, no diálogo social, no princípio do poluidor-pagador e no de responsabilidades comuns,

porém diferenciadas. A participação dos trabalhadores e sindicatos nos processos de tomada de decisão

é fundamental para garantir que as questões sociais e laborais estejam no centro das decisões.

Uma transição justa será aquela que:

CAPÍTULOS TEMÁTICOS

26

• Minimize as consequencias negativas para os setores mais vulneráveis: que reduza ao mínimo

possível os efeitos ambientais e sociais negativos, políticas e ações que se implementem.

• Proteja os setores mais afetados: que amplie e fortaleça (e crie em alguns casos) os sistemas de

proteção social.

• Garanta o trabalho decente e gozo pleno de direitos para todas as pessoas: que implemente e

se faça cumprir as declarações, convênios e normativas vigentes, como por exemplo a declaração

relativa aos princípios e direitos fundamentais do trabalho, os convênios e recomendações da OIT e

declaração dos direitos humanos.

• Conte com mecanismos de decisão e controle democráticos em todos os níveis, que inclua

participação de todos os interessados/ afetados, através de diálogos tripartites entre trabalhadores,

empregadores e governos.

• Uma transição justa requer políticas e medidas especialmente orientadas para os trabalhadores

e comunidades especificas. Essas políticas incluem compensações para determinados grupos que

poderão ter afetadas suas fontes e ferramentas de trabalho de maneira temporária ou permanente,

programas de formação para aqueles que deverão adaptar-se as mudanças no mercado de

trabalho ou para o surgimento de novos tipos de emprego, a atenção às as comunidades que serão

afetadas pelo fechamento de instalações através de sistemas de proteção social e da realização de

investimento que permitam a criação de trabalho decente e diversificação da economia.

Focar em certos setores econômicos, como energia, alimentação, conservação e saneamento, pode ser

um dos caminhos para avançar na transição justa para a economia verde.

Consumo

• A autorregulamentação dos mercados não foi eficiente, portanto trabalhar o consumo desenfredo

exige regulação, eventualmente por meio de uma reforma tributária pela qual os impostos fariam

essa função.

• Há a necessidade de se criar mecanismos e veículos de informação ao consumidor que lhe permitam

entender o que está por trás da cadeia de valor dos produtos que adquire.

• Para tanto, o setor empresarial deve incorporar critérios socioambientais em seus mecanismos de

accountability.

• Os governos devem regular para que os recursos financeiros não beneficiem quem não está alinhado

com as premissas e metas da economia verde.

• Fomentar o controle social como ferramenta de criação de uma nova cultura de consumo por meio

de educadores ambientais e multiplicadores em nível local.


CONCLUSÃO

Durante os debates realizados para este projeto, e no caminho preparatório para a Rio+20 como um todo,

a riqueza e diversidade de contribuições da sociedade civil foram fator de destaque e predominância.

Claramente já há consenso em muitas coisas, e em especial na expectativa de que a economia deve

ser transformada para fomentar uma sociedade justa e sustentável que garanta os direitos humanos e

respeite os limites planetários. Porém ficou clara a necessidade de criarmos um maior entendimento

comum nas discussões sobre a implementação de políticas e ações concretas para realizarmos esta

transição.

Tal constatação deve servir de alerta para os tomadores de decisão na esfera pública e privada.

Grandes mudanças devem vir de acordos amplos na sociedade, considerando os interesses de todos,

para terem legitimidade e efetividade. Apenas com a participação efetiva da sociedade civil, em seus

vários segmentos, é que qualquer mudança para a economia verde poderá ter sucesso. Neste sentido,

devemos destacar um tema que tem sido recorrente nas discussões sobre a transição para uma nova

economia: o controle e participação social no setor público e privado.

A economia verde deve ser acompanhada por um novo sistema de governança da sociedade. Um sistema

mais equilibrado, no qual as decisões que tenham impacto nos interesses coletivos sejam tomadas de

maneira participativa e transparente. O controle social sobre os atores políticos e econômicos, incluindo

os mercados financeiros, deve ser uma das bases para uma nova governança social, e por consequência,

para uma nova economia. A participação da sociedade deve ser uma diretriz transversal que permeie

todos os aspectos da economia verde.

CONCLUSÃO

27

Outro fator que deverá ser considerado para a transição e que tem sido um tema recorrente é a

regulação do mercado financeiro. Depois de décadas, está claro que a autorregulação não é eficiente

para produzir mudanças efetivas em escala e, portanto, é preciso contemplar a criação de marcos

regulatórios para direcionar o comportamento dos agentes do mercado em direção ao desenvolvimento

sustentável. Estes novos marcos regulatórios devem buscar incentivar as atividades sustentáveis e

justas, e desincentivar os modelos produtivos que agridem o meio ambiente e não garantem os direitos

humanos dos trabalhadores e comunidades.

Em nosso processo de reflexão, definimos quatro temas centrais para a transição para uma nova

economia: governança, convivência, empregos e finanças.

A governança do desenvolvimento sustentável foi colocada como um fator chave para esta transição.

Neste sentido, não devemos nos focar apenas na reforma burocrático-institucional da ONU, por

exemplo, na necessidade de transformar o PNUMA (Programa de Meio Ambiente da ONU) e o ECOSOC

(Conselho Econômico e Social da ONU), mas também nos processos para criar, monitorar e implementar

metas para o desenvolvimento sustentável. Tais metas podem ter um papel chave, mas precisam ser

elaboradas por meio de um processo participativo e que estar alinhadas com os todos os princípios da

Declaração do Rio.

A convivência respeitosa e digna nos biomas e territórios só poderá ser atingida com preservação

ambiental e bem-estar social. Para tanto, é necessário que abandonemos a noção tradicional de

crescimento econômico e busquemos modelos mais inclusivos e menos agressivos de gerar riqueza e

bem-estar para a sociedade. Precisamos que a economia verde se baseie e reforce todos os acordos

e conhecimentos acumulados na área do desenvolvimento sustentável (em especial, os princípios da

Declaração do Rio) e que não gere algo novo, em conflito com eles. Outro fator essencial é que o meio

ambiente não seja visto apenas como um mero “recurso econômico” para o setor produtivo, mas seja

valorizado em todas as suas dimensões, em especial como o espaço de reprodução da vida e condição

essencial para a sobrevivência.


Em uma nova economia, deveremos buscar modelos de geração de empregos verdes, de trabalho

decente, como parte de processos de produção e consumo sustentáveis. Para tanto, a força de trabalho

deverá ser tratada como um ator chave para o desenvolvimento sustentável e não como simples fator de

produção. Acordos coletivos devem começar a refletir tais preocupações e a solidariedade internacional

deverá ser sedimentada de maneira a gerar a equidade entre os trabalhadores de diferentes países,

acabando com as diferenças que propiciam a exploração.

A produção de bens duráveis deve abandonar o paradigma da obsolescência programada, buscando

fomentar novas práticas de produção e de consumo, com eficiência e equilíbrio. A redução da jornada

de trabalho deverá ser encarada como uma das principais ferramentas para reduzir impactos ambientais

da produção (em especial as emissões de carbono) e para aumentar a inclusão social através da geração

de emprego e renda.

CONCLUSÃO

28

O setor financeiro, tanto público quanto privado, terá necessariamente um papel chave na transição para

outro modelo econômico e, para tanto, deverá passar por transformações profundas nas instituições

financeiras e instrumentos econômicos. Apesar de já existirem iniciativas que visam dar ao setor um papel

positivo no desenvolvimento sustentável, elas ainda não tem um papel central e carecem de escala.

Três principais premissas devem ser adotadas para orientar o setor financeiro na transição para uma

nova economia: 1) finanças verdes, com uma visão de custos integrais (sem externalidades) e riscos

de longo prazo, que contemple as condições sociais e ambientais que vivemos; 2) finanças inclusivas,

que fortaleçam o papel das pequenas empresas dentro das grandes cadeias produtivas, alinhando

estas cadeias à sustentabilidade; 3) e finanças responsáveis, com mecanismos de controle e gestão que

garantam que a atividade financeira estará alinhada aos interesses da sociedade, aos limites do planeta

e à garantia de direitos humanos.

O setor financeiro deverá ter um novo papel: o de prover estabilidade às economias e proteção aos

trabalhadores e consumidores. Um papel que exige romper com o atual modelo de reprodução e

recuperação de crises e endividamento contínuo dos governos.

Nas bases de uma nova organização do sistema financeiro devem estar presentes abordagens mais

amplas de riscos e custos, visão de longo prazo, controle social e engajamento com stakeholders. A

criação de marcos regulatórios, com novas medidas de desempenho e risco, eliminação de exernalidades,

novos incentivos e desincentivos e, sobretudo, a ampliação da transparência e responsabilização dos

mercados e seus operadores, deverá dar estrutura para a transição ruma à economia verde.

Os debates que desenvolvemos em volta destas quatro questões chave - governança, convivência,

empregos e finanças - evidenciaram ainda mais a constatação que a separação entre questões sociais,

políticas e ambientais não é compatível com a busca do desenvolvimento sustentável. Temas como

desigualdade, pobreza, equidade, distribuição de renda, empregos, justiça social e participação cidadã

estão diretamente relacionados com temas como desmatamento, poluição, mudanças climáticas,

preservação, uso sustentável dos recursos naturais e justiça ambiental.

Esta conclusão advém da constatação de que a origem dos problemas é a mesma, a saber, as

contradições inerentes ao atual modelo econômico: a acumulação de riqueza sem limites e sem a

garantia de direitos e da preservação do meio ambiente. Advém ainda da percepção de que as soluções

propostas e implementadas deverão considerar a interdependência do “social” com o “ambiental”,

buscando sempre aliar a solução de problemas específicos com mudanças transversais nas estruturas

de governança da sociedade.


Encarando o desafio de propor soluções que contemplem tanto os limites planetários quanto a garantia

mínima de direitos, a Oxfam propôs uma metodologia que temos endossado em nossos trabalhos:

CONCLUSÃO

29

Fonte: Oxfam (www.oxfam.org/grow)

Trata-se do reconhecimento que o espaço seguro e justo para a Humanidade seria composto de dois

limites, um “teto” e um “piso”.

De um lado teríamos o “piso”: um projeto de civilização com o imperativo ético de garantir os direitos

humanos, não deixando em privação nossos concidadãos globais.

De outro teríamos o “teto”: os limites do planeta que vivemos em sua capacidade de garantir os

elementos essenciais à vida.

É no intervalo entre esses dois limites que precisamos construir nossa prosperidade. E este deve ser o

papel da economia: mobilizar, aproveitar e distribuir recursos, dentro desses limites.

Mais que uma visão de futuro, esta estrutura de limites ambientais e sociais está sendo trabalhada com

indicadores e métricas concretas , já podendo contribuir para o desenvolvimento de políticas globais e

locais na transição para a economia verde.

A solução para as permanentes crises ambiental e social que temos vivido só poderá vir de uma

mudança em nosso modelo econômico. As instituições e instrumentos econômicos possuem escala

global e permeiam todos os aspectos da vida diária. Já passou da hora de colocarmos a economia a

serviço do desenvolvimento sustentável.


ANEXO: Lista de participantes

Agradecemos a todos que participaram dos debates e contribuíram para este processo.

ANEXO

30

Nome Organização Tema

Ana Rubia Carvalho ABRAMPA - Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público do Meio Ambiente Governança

Adriana Charoux IDEC - Instituto de Defesa do Consumidor Empregos

Alexandra Reschke IDS - Instituto Democracia e Sustentabilidade Governança

Ana Carolina Velasco GIFE - Grupo de Institutos, Fundações e Empresas Finanças / Convivência

André Dhaite Prefeitura de São Paulo Empregos

Ariel Kogan Movimento Nossa São Paulo Convivência

Aron Belinky Vitae Civilis - Instituto para o Meio Ambiente, Desenvolvimento e Paz Convivência / Empregos / Finanças / Governança

Athayde Mota Fundo Baobá Governança

Bazileu Margarido IDS - Instituto Democracia e Sustentabilidade Governança

Bello Monteiro SOS Mata Atlântica Convivência / Governança

Candido Grzybowski IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas Finanças

Carmem Foro CUT - Central Única dos Trabalhadores Empregos

Catarina Silveira CUT - Central Única dos Trabalhadores Empregos

Daniel Angelim CSA - Central Sindical das Américas Empregos

Daniele Castro Prefeitura de São Paulo Empregos

Errolflynn Paixão CUT - Amapá Empregos

Fabrizio Voilini Vitae Civilis - Instituto para o Meio Ambiente, Desenvolvimento e Paz Convivência

Fernando Silva FETRAF - Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar Empregos

George Winnik Movimento Nossa São Paulo Governança

Gustavo Pimentel Dinamus Inteligência em Negócios Finanças

Helena Moura USP - Universidde de São Paulo Governança

Helio da Costa Observatório Social Empregos

Hélio Neves Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo Convivência

Henrique Lian Instituto Ethos Finanças

Ivy Weins Rede Mata Atlântica / ISA - Instituto Socio Ambiental Convivência

Jorg Zimmerman ISPN - Instituto Sociedade População e Natureza Convivência

Josete Santos

SINDIMERCADOS - Sindicato dos Trabalhadores em Mercados, Supermercados e Hipermercados no

Atacado e Varejo do Município de São Paulo

Empregos

Julia Nogueira CUT - Secretaria Nacional de Combate ao Racismo Empregos

Laura Martin Murillo Fundação Sustainlabour Empregos

Leandro S Souza especialista Governança

Leonardo Sakamoto Reporter Brasil Empregos

Lucilene Binsfeld CONTRACS - Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços Empregos

Luiz Motta GTA - Grupo de Trabalho Amazônico Convivência

Marcelo Furtado Greenpeace Empregos / Finanças

Marcelo Cardoso Vitae Civilis - Instituto para o Meio Ambiente, Desenvolvimento e Paz Convivência

Marcia Regina CUT-Pará Empregos

Marcio Astrini Greenpeace Empregos

Márcio Macedo BNDES - Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social Finanças

Marco Antonio Fujihara Key Associados Finanças

Marcos Rochinski FETRAF - Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar Empregos

Mario Mantovani SOS MataAtlântica Convivência

Mário Sérgio Vasconcelos FEBRABAN - Federação Brasileira do Bancos Finanças

Oriana Rey Programa Eco-Finanças Finanças

Otávio Tescari Natura Finanças

Paulo Padilha Inst. Paulo Freire Governança

Pauto Itacarambi Instituto Ethos Finanças

Pedro Jacobi PROCAM/USP Convivência

Rachel Biderman WRI - World Resources Institute Governança

Rachel Moreno Observatório da Mulher Empregos

Rafael Poço GCCA - Campanha Global de Ações pelo Clima Governança

Reginaldo Magalhães Instituto Ethos Finanças

Renata Benacchio Regino Natura Finanças

Ricardo Abramovay Faculdade de Economia e Administração - FES/USP Governança

Roberta Simonetti GVces - Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas Finanças

Roberto Guimarães FGV-RIO - Fundação Getúlio Vargas Convivência

Roland Widmer OneAdvisory Finanças / Empregos

Rosangela Soga CUT - Secretaria Nacional do Meio Ambiente Empregos

Rubens Born Vitae Civilis - Instituto para o Meio Ambiente, Desenvolvimento e Paz Convivência / Empregos / Finanças / Governança

Sergio Mauro Santos especialista Convivência

Sergio Mindlin Instituto Ethos Finanças

Silva Picchioni FBOMS - Forum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente e Desenvolvimento Convivência

Silvio Santana FBOMS - Forum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente e Desenvolvimento Convivência

Tasso Azevedo Especialista Governança

Vânia Viana CUT - Central Única dos Trabalhadores Empregos

Walter Figueiredo De Simoni Subsecretaria de Economia Verde do Estado do Rio de Janeiro Finanças

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