01.03.2023 Views

185 RIOT

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.


3. 2. 1.

4.

‘cause you’re free to do what

you want to do

Direitos Humanos da Mulher

she never dream for ever be

nobody’s wifey

A Mulher no Casamento

even if you hate it I still warp

my hijab

Os Direitos da Mulher no Islão

‘cause baby you were born

this way

A Mulher Lésbica e Trans aos Olhos da Lei

pág. 260-261

pág. 262-263

pág. 264-265

pág. 266-267

5.

the wrong side of heaven

O Caso Português

pág. 268-269

6.

don’t touch my hair

Os Direitos da Mulher Negra Autóctone

pág. 270-277

7.

all i’m askin’ is for a little

respect when you come home

Os Direitos da Mulher Africana (Na Atualidade)

pág. 278-279

8.

entre a invisibilidade e a

visibilidade da mulher designer

pág. 280

Coordenação e Revisão

Margarida Aguiar

Design Editorial

David Estrela

Madalena Leitão

Web Design

João Pedro Costa

Rodrigo Nunes

Tipografia

Ortica desenhada por Benedetta Bovani, Collectivo Foundry.

FreightNeo Pro por Joshua Phil’s Fonts Foundry.

Papel

120g/M2

Impressão

Gráfica J. & L.

/6 exemplares

Agradecimentos

Aos professores Cândida Teresa, Sónia Rafael e

Victor M. Almeida pelos constantes desafios e apoio neste

ano atípico.

185riot.editorx.io/blog

www.instagram.com/185riot

Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa

Design de Comunicação II

2020/2021

Publicado no Âmbito do Projeto “Enciclopédia de Mulheres”




quem somos?

185 RIOT assume-se perante o território público

como um grupo revolucionário e de ímpeto

anárquico. Procura extinguir quaisquer tipo de

preconceitos, não se limitando ao território da

mulher, extendendo-se ao próprio design gráfico.

O nome, surgindo do casamento entre o

número 185 com a palavra “Riot”, reúne em si a essência

dinâmica e efervescente do grupo. O Pantone 185 CP, uma

cor entre o vermelho e o cor de rosa, compõe a identidade

do grupo enquanto um transmissor dos ideais de força

e poder, ao passo “Riot” (“rebelião” ou “revolução”)

de etimologia latina no termo revolutio (que significa

movimento), vinca a mudança emergente, a agitação

inquieta te, a esperança pela transformação que o grupo

espera provocar.

185 RIOT são cinco aluno do primeiro ano do

curso de Design de Comunicação da Faculdade de Belas-

Artes da Universidade de Lisboa que quer ser ouvido. 185

RIOT é interseccional, é inclusivo, é consciente do passado,

é revolucionário, é um apelo a mudança, é uma anarquia

estética que subjuga as convenções.

A construção identitária dos géneros

feminino e masculino são configurações ideológicas

balizadas pelas ideias atribuídas à imagem de um corpo

humano que tende a ser valorizado ou desvalorizado até

aos dias de hoje. Assim, torna-se tão pertinente quanto

urgente o estudo do posicionamento da Mulher face

à agressividade política, económica e social a que esta

é remetida. Inserido no contexto da unidade curricular

de Design de Comunicação II do ano letivo 2020/2021,

Mulieribus Encyclopædia entende-se como um projeto

de comunicação, desenvolvido através da investigação,

exploração, ação e divulgação. Este orienta a edição de

uma publicação de amplitude universal, a enciclopédia,

através de um percurso de quatro fases projetuais.

Recorrendo ao formato analógico e digital, tem como

propósito primordial esclarecer e impulsionar o leitor para

a temática das mulheres.

Perante o tema global, o conjunto

selecionou a área de estudo dos Direitos Humanos das

mulheres, um setor congregador de vários pontos cruciais

do paradigma do território cultural da mulher, sendo

impossível ignorar a importância do mesmo ao explorar as

diversas mulheres e os seus movimentos. Esta área está na

origem de toda a luta feminista, tanto dentro de casa como

na rua, num contexto individual e grupal.

260-261 ‘cause you’re free to do

what you want

Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã

por Olympe de Gouges, 1791

outros limites senão na tirania perpétua que o

homem lhe opõe; (...)

Direitos Humanos da Mulher

“U.N.I.T.Y” da Queen Latifah transporta em si uma mensagem acerca das

mulheres maltratadas na nossa comunidade, impactando assim, com as

mensagens misóginas incluídas no hip-hop que vêm enaltecer o denegrir

das mulheres. A cantora e compositora norte-americana cria, assim, um hino

autêntico de empoderamento feminino.

Ao longo do tempo, a mulher foi ganhando território na sociedade. Foram

pequenas conquistas ao longo dos séculos que permitiram que as gerações futuras

vivessem numa sociedade menos marcada pelo patriarcado, apesar de, ainda se

verificar uma dominação masculina em relação à mulher, em diversas áreas.

dos pais em relação aos filhos. (...)

Mulher, desperta-te; a força da razão se faz

escutar em todo o universo; reconhece teus

direitos. O poderoso império da natureza não está

mais envolto de preconceitos, de fanatismo, de

superstição e de mentiras. A bandeira da verdade

dissipou todas as nuvens da tolice e da usurpação.

O homem escravo multiplicou suas forças e teve

necessidade de recorrer às tuas, para romper os

seus ferros. Tornando-se livre, tornou-se injusto

em relação a sua companheira.

Oh mulheres.

VI. (...) Todas as cidadãs e todos os cidadãos,

sendo iguais aos seus olhos, devem ser igualmente

admissíveis a toda a dignidade, lugares e empregos

públicos, segundo as suas capacidades e sem

outras distinções.

XI. A livre comunicacão dos pensamentos e das

opiniões é um dos direitos os mais preciosos da

mulher, pois esta liberdade assegura a legitimidade

As mães, as filhas, as irmãs,

representantes da nação, reivindicam

constituir-se em Assembleia Nacional.

Considerando que a ignorância, o

esquecimento, ou o desprezo da mulher

são as únicas causas das desgraças

públicas e da corrupção dos governantes,

resolverem expor em uma Declaração

solene, os direitos naturais, inalienáveis,

e sagrados da mulher, a fim de que esta

Declaração, constantemente, apresente

todos os membros do corpo social seu

chamamento, sem cessar, sobre seus

direitos e seus deveres, a fim de que os

atos do poder das mulheres e aqueles do

poder dos homens, podendo ser a cada

instante comparados com a finalidade

de toda instituição política, sejam mais

respeitados; a fim de que as reclamações

das cidadãs, fundadas doravante sobre

princípios simples e incontestáveis,

estejam voltados à manutenção da

Constituição, dos bons costumes e à

felicidade de todos.

As Três Marias

Em consequência, o sexo superior

tanto na beleza quanto na coragem, em meio aos

sofrimentos maternais, reconhece e declara, na

presença e sob os auspícios do Ser superior, os

Direitos seguintes da Mulher e da Cidadã:

II. A finalidade de toda associação política é a

conservação dos direitos naturais e imprescritíveis

da mulher e do homem: estes direitos são a

liberdade, a propriedade, a segurança, e sobretudo

a resistência a opressão.

IV. A liberdade e a justiça consistem em devolver

tudo o que pertence a outrem; assim, o exercício

dos direitos naturais da mulher não encontra



A Igualdade de direitos

entre homens e mulheres ainda não é facto

por Hélio Vieira, presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Rondônia

Há muito se repete que homens e mulheres

são iguais em direitos e obrigações e que

com tal igualdade devem ser tratados. É um

dos principais pilares da igualdade jurídica

preconizada como direito fundamental por

todos os povos.

Mas ainda é só uma

previsão legal, pois a realidade

demonstra que a mais degradante

desigualdade no tratamento desses

direitos ainda pesa sobre as costas

das mulheres, muitas vezes escondida

sob os olhares que se voltam para as

conquistas de algumas.

A diferença de

remuneração entre homens e

mulheres, no exercício do mesmo

trabalho e da mesma função e as

dificuldades de acesso aos cargos

mais elevados e de maior prestígio

nas organizações, é uma dessas

realidades. Poucas conquistam

de fato tal espaço concorrendo

em igualdade com os homens. A

ideia de que as mulheres são mais

voltadas ao trato familiar do que o

profissional ainda é uma imagem que

garante preferência aos homens,

uma ideia equivocada e que precisa

ser mais rapidamente revista,

pois as que conquistam postos

mais importantes demonstram de

maneira incontestável que mulheres

conseguem conciliar carreira e

família, e com isso acabam por ter

maior rendimento profissional em

razão da harmonia emocional.

É ainda injustificável o

grande número de casos de assédio

moral e assédio sexual a que são submetidas, em números

alarmantes se comparados com os casos de assédio

contra homens. Esse tipo de assédio implica estados

de depressão e medo que diminuem o rendimento

profissional e contribuem mais ainda para a manutenção

do preconceito.

Acrescenta-se que, na contramão da

igualdade, a violência contra a mulher foi declarada

problema de saúde pública pela Organização Mundial de

Saúde, quando se divulgaram dados de que um terço dos

atendimentos de emergência em nosso país têm origem

em violência doméstica.

O Tribunal Superior do Trabalho, em

recente decisão, decidiu ser incompatível com a

Constituição a norma contida na CLT que prevê para a

mulher, no caso de prorrogação de jornada de trabalho,

descanso de 15 minutos antes de iniciar o trabalho

extraordinário. Segundo aquela Corte, esse dispositivo

não estaria em harmonia com a igualdade entre homens

e mulheres, pelo que foi reformada decisão de Tribunal

Regional que o concedia esse benefício a uma mulher.

Penso que a conclusão deveria ser

exatamente o inverso: se há igualdade entre homens e

mulheres, essa igualdade é recíproca. Não é o homem

um” paradigma “para que os direitos a ele conferidos

sejam estendidos à mulher. O inverso também é

verdadeiro, de tal forma que para garantir o direito

igualitário, dever-se-ia garantir o descanso, nos mesmos

moldes, aos homens, e não negá-lo às mulheres porque os

homens não o têm.

Quando a Consolidação das Leis do

Trabalho dedicou um capítulo à proteção do trabalho da

mulher não criou privilégios infundados, mas, ao contrário,

idealizou aproximar a igualdade ao ideal de realidade fática

que deve nortear o cumprimento de tal princípio.

Resta que todos devemos procurar

o máximo empenho para tornar esse princípio da

igualdade uma realidade presente, na qual a conquista da

mulher não seja mais notícia de uma grande vitória, mas,

sim, um cotidiano de nossas cidadãs, incorporado às

relações do trabalho.

E esperar que elas ensinem aos homens

como conciliar o ímpeto da vida profissional e a conquista

por espaço no mercado de trabalho, numa disputa

frenética e desigual, com a doçura com que ainda

acolhem as suas famílias ao final do dia.

A direção do CNMP no 2º Congresso

Feminista e de Educação (Lisboa, 1928)


262-263 she never dream for ever

be nobody wifey

As Escrituas Sagradas Enquanto Molde

Primordial da discriminação feminina.

Women in the Bible: Miracle

Births, Heroic Deeds, Bloodlust

and Jeolousy

por John Baldock

Mahanagar (1963), Dir. Satyajit Ray

homem e a mulher sem distinção de

género, apenas à sua imagem, com

igualdade de direitos e liberdades,

em harmonia com a natureza. E o

termo “ajudante”, usado por Deus

como a razão da criação da mulher

(para “ajudar” o homem) não indica

inferioridade, muito pelo contrário.

Contudo, para o homem, a mulher

é vista como um apêndice, que

lhe pertence, que é descartável e

substituível e nunca como um ser

igual, que nasce com ele. O facto de

Eva ter sido o último ser criado também

reforça as ideias de inferioridade

feminina, mas a verdade é que Deus a

criou porque só depois da sua criação é

que a Terra estava finalmente completa.

Assim, as escrituras aos olhos das

civilizações da época, certamente

atendem às condições sociais em que

se vivia, criando preceitos que ainda são

discutidos séculos mais tarde.

decisivo para a sua integração social.

Eram economicamente dependentes,

e objeto da autoridade do pai, irmãos,

e mais tarde marido, sem poder herdar

propriedades diretamente (com raras

excessões em que um pai não possuía

filhos, por exemplo). Estas eram leis

sociais aceites como normais e até

lógicas. Considerava-se que se vivia

em igualdade: a mulher cumpria os

seus deveres domésticos, e o homem

económicos e políticos.

Women in the Bible, Qumran

and Early Rabbinic Literature

Their Status and Roles

A Mulher No Casamento

“Free” é uma música da cantora

americana Ultra Naté lançada em

1997. Esta foi vista pela comunidade

gay como uma música sobre empoderamento,

adotando-a assim como hino.

A análise das doutrinas religiosas, como a Bíblia

e o Corão, é fundamental para a compreensão

da posição histórica da mulher na sociedade,

uma vez que constituem pilares estruturantes da

nossa cultura. Claro está que, as interpretações

destas ao longo dos séculos muito influenciaram

o status da mulher face ao homem, e portanto o

regime patriarcal.

por Paul Heger

Alexander Andreyevich Ivanov (1835)

“Appearence of Jesus Christ to Maria Magdalena”

As narrativas da Creação

e da Queda do Homem (presentes

no Genesis) foram partircularmente

interpretadas de forma inferiorizante

para a mulher tanto na religião

Cristã, como na Judaica, retratando a

Mulher (Eva) como uma personagem

“secundária”, uma ajudante, que

provém e depende totalmente do

Homem (Adão), e que é a razão do

pecado no ser humano. A posição

da mulher na antiga sociedade

Israelita também é justificada com

estas narrativas: corroboram o dever

da mulher ser submissa, e não lhe

poder ser dada uma posição de

independência seja no contexto social,

familiar, político, entre outros.

No entanto, segundo

a narrativa da Creação, Deus cria o

Nas Escrituras, é

frequente que as mulheres não sejam

referidas pelo nome, excetuando as

vezes em que se destacavam por razões

incomuns. Mesmo Maria, é chamada

de “a Virgem” ou a “mãe de Jesus” e é

raramente mencionada nos Evangelhos.

Apesar de socialmente a mulher não

ser aceite na vida pública ou religiosa (o

que se verifica tanto no Antigo como no

Novo Testamento), Jesus muitas vezes

contrariava esta norma (o que causava

escândalo entre os seus seguidores)

abordando mulheres de forma

preocupada e carinhosa numa série de

episódios, como o da Mulher Samaritana.

No que toca às

perspetivas da Bíblia sobre o papel

da mulher no casamento, observase,

segundo os costumes da época,

uma clara segregação com base no

género, de valorização dos direitos

do homem em detrimento dos da

mulher. O adultério era castigado

com apedrejamento apenas para a

mulher, bem como outros crimes

sexuais, como a masturbação e a

homosexualidade. O divórcio era

livremente permitido ao homem, e à

mulher apenas com o consentimento

do marido. As leis relativamente à

virgindade e pureza da mulher não

têm qualquer equivalente no que toca

ao homem, e o seu cumprimento era


The story of bedouin-arab

women in a polygamous

marriage

por Alean Al-Krenawi e John R. Graham, 1999

Em “The story of

bedouin-arab women in a

polygamous marriage” é

feita uma pesquisa acerca

da dinâmica familiar e

do papel da mulher num

casamento poligâmico

árabe, em Israel. A

comunidade árabe tem

estabelecido um sistema

severamente patriarcal,

onde os papéis de género

são arcaicos sem serem

questionados: as mulheres

devem permanecer em

casa e estar ao serviço do

bem-estar da família.

Com 73 anos,

Ahmad tem seis mulheres,

que entre si vão dos 30 aos

67. Com todas elas, partilha

um total de 60 filhos, o mais

velho com 40 anos, e o mais

novo com 2 meses. Como

é de esperar os problemas

não acabam. O clima entre as

mulheres é de tensão constante,

não só entre elas como com

os próprios filhos. Dividindo

atenções com os irmãos, os

filhos de comportamento

agressivo onde é comum

haver intimidação irmão-irmã

e filho-mãe, exemplos que

estes jovens vão certamente

buscar ao pai. Nenhum deles

acabou o ensino secundário,

e muitos sofrem com abuso

de substâncias e doenças

psicológicas, provavelmente

devido à falta de apoio da parte

da família. As mulheres, objetos

da autoridade castradora do

marido e de agressão física e

verbal recorrente, encontram na

família o principal motor da sua

opressão, quando este devia ser

um espaço de conforto e amor.

Nestes casos,

todo o conjunto de género/raça/

religião/classe social, contribui

para colocar a mulher e as

crianças destes casamentos

em risco, constituindo por isso

importantes casos de estudo

para a compreensão dos

direitos da mulher.

A mulher e o dote

no casamento na Índia

por Madalena Leitão

O dote é um costume cultural e religioso do casamento

oriental com fortes raíses na Índia, consistindo na

transferência de bens (monetários ou materiais) da

família da noiva para a do noivo, que normalmente se

casam por conveniência.

É uma prática que define o paradigma patriarcal destas

comunidades, marcado pela crença de que a mulher deve residir com,

ou perto da família do marido. Em termos históricos, o dote era uma

forma de compensar a família do noivo financeiramente, uma vez que

a mulher ia passar a viver com eles, e não podia ter independência

laboral: era culturalmente inaceitável a mulher trabalhar fora do espaço

doméstico. Por causa desta prática, ter filhas era visto como uma

grande despesa a longo termo, mas também como uma oportunidade

de ascender socialmente, dependendo do valor do dote. Este valor

era de extrema importância: garantia aos pais da noiva que a sua filha

seria bem tratada em casa dos genros, que geralmente lhes davam

menos responsabilidades domésticas e mais liberdade se o dote fosse

significativo. Quando as expectativas relativamente a esta valor não eram

cumpridas, as noivas sofriam as consequências, que incluem ataques de

ácido, violência física, e eventualmente a morte.

Assim como muitas outras formas de violência contra

a mulher, os ataques de ácido, são fenómenos de uma sociedade que

priveligia o controlo masculino através do uso da intimidação agressiva.

Segundo a OMS, estes ataques devem-se, essencialmente, a três fatores:

à desigualdade e descriminação de género, a disponibilidade de ácido, e à

falta de legislação contra o atacante. Estas formas de violência constituem

atrocidades que continuam a ser praticadas diariamente, perpetuando

a condição inferior da mulher e, sejam elas relacionadas ou não com o

dote. Mesmo assim, apesar deste ter sido removido da legislação em

1961, há mulheres que aceitam esta tradição, olhando para ela como

uma componente normal do ritual do casamento, uma perspetiva que

certamente se foi transformando numa resposta a uma sociedade cada

vez mais materialista, um motivo de orgulho para estas comunidades.


264-265 even if you hate it I still

wrap my hijab

Muhammad Rezaa

“Universal Versus Islamic Human

Rights: A Clash of Cultures Or A Clash

With A Construct?” é um volume

importante na contextualização da

dimensão e da complexidade da

temática que é a universalização dos

diretos humanos, essencialmente, pela

incompatibilidade com o Islão.

A Declaração Universal dos

Direitos Humanos (DUDH) de 1948, foi

pouco aceite no Islão, pois não estava em

conformidade com os princípios da Lei Sharia.

Consequentemente, foram redigidos alguns

documentos acerca dos direitos humanos

adaptados ao Islão, entre os quais a Declaração

do Direitos Humanos do Cairo de 1990 (DDHC).

Segundo Ann Elizabeth Mayer,

a Declaração do Direitos Humanos do Cairo

Os Direitos da Mulher no Islão

Mona Haydar, uma artista sírio-americana, lançou “Hijabi

(Wrap my Hijab)” com o intuito de homenagear o Dia

da Mulher Muçulmana e expor os preconceitos acerca

dos muçulmanos na cultura americana. A música procura destruir

as estruturas invisíveis que oprimem as mulheres e mudar a

narrativa para uma que seja positiva.

Mulheres muçulmanas que usam o hijab têm sido cada vez mais

mencionadas à medida que a islamofobia aumentou nos últimos

anos. O número de agressões físicas contra os muçulmanos

nos Estados Unidos tem subido a cada ano e, por isso, torna-se

urgente chamar a atenção para os direitos humanos deste grupo.

“Universal Versus Islamic Human Rights: A Clash Of Cultures

Or A Clash With A Construct?”

de Ann Elizabeth Mayer

é uma tentativa fracassada de conjugar os

princípios internacionais da Declaração Universal

dos Direitos Humanos com princípios do Islão.

Esta fusão resulta na limitação dos direitos

humanos logo, na declaração do Cairo, estes

são circunscritos pela lei Islãmica, limitandoos.

Existem, também, alguns direitos que são

reduzidos a um nível problemático, entre estes

estão presentes os direitos das mulheres.

Assim sendo, Ann Elizabeth

tece uma crítica à DDHC referindo várias

secções da declaração onde os direitos das

mulher são omitidos e indiretamente negados

(Artigos 1, 19, 6, 12 e 13). No artigo 6, podemos

ler “woman is equal to man in human dignity”,

não aludindo a igualdade de direitos. Podemos,

assim, concluir que a igualdade-dignidade é

muito distinta da igualdade-direitos.

Muhammad Rezaa

Aludindo à história da Arábia

Saudita (país de doutrina conservadora)

que surge com Muhammad ’Abd al-Wahhad

no século XVIII. O Wahhabism defende a

intolerância, a interpretação literal (e radical)

e puritana da Lei. Em 1992, foi instituída a

Lei Básica da Arábia Saudita, um documento

resumido e próximo do que seria uma

constituição, representando um curto passo

para o constitucionalismo.

Na Lei Básica Saudita, subsistem

bastantes discussões como a ausência de

referência a qualquer tipo de igualdade de

género e, devido à dificuldade e complexidade

do assunto dos direitos humanos no Islão,

perduram diferentes escolas de interpretação e

de pensamento sobre a mesma.


Ines Sayadi

Islamic

Jurisprudence

de C. G. Weeramantry

levantados, é o facto da experiência

de interpretação do jurista ser muitas

vezes confundida com a sua opinião

e interesse pessoal. Sob o contexto

das bases legais do Islão, é importante

referir os direitos das mulheres e é

afirmado que o Corão e o profeta

deixaram claro que a mulher deve ser

bem tratada. Assim, caso a mulher seja

desrespeitada ou lhe sejam negados os

seus direitos, a culpa estará nos sujeitos

que lhe rejeitam os mesmos, e não

no Corão. Deste modo, é necessário

destacar que a Lei Sharia promove a

igualdade de género, entregando a culpa

da problemática à própria sociedade.

Os Sunitas e os Xiitas são

dois grupos que surgiram

depois da morte do profeta

com visões muito distintas

sobre a forma como a lei deve

ser interpretada. Os Xiitas

consideraram Ali (genro do

profeta) o seu líder e os Sunitas

escolheram Abu Bakr (amigo

e confidente do profeta) para

a mesma função. O primeiro

grupo não deixa margem para

qualquer interpretação da lei

seguindo-a literalmente numa

conduta mais dada à valorização

do martírio e do sofrimento,

em memória da casa de Ali.

O segundo grupo (a maioria)

deixa margem para uma

interpretação da lei baseada

em decisões democráticas e

pensadas, não alterando a lei

do Corão.

Relativamente aos

deveres dos jurístas na interpretação

da Lei, como esta não foi redigida por

nenhuma instituição em específico,

cabe unicamente ao jurista entendê-la

com base na sua experiência pessoal.

Um dos problemas usualmente

Primeira Jurista

Islâmica: Thuml

Al-Qahramana

por Rodrigo Nunes

Em 941 d.C., Thuml Al-

Qahramana serviu o sistema

judicial Islâmico depois de ter

atuado como conselheira do

líder muçulmano da época.

Al-Quaramana é considerada

a primeira jurísta e talvez a

única que é referenciada nos

discursos académicos sobre a

religião, o género e a lei no Islão.

Thuml viveu na época

de Abbasid Caliph al-Muqtadir cujo a

mãe foi nomeada rainha. Esta ficou

impressionada com a inteligência e

o conhecimento sobre as ciências

da religião de Thuml e escolheu-a

para ser chefe de justiça (juíza). Foi

uma decisão bastante contestada e,

na altura, as pessoas recusaram-se a

aceitar as suas ordens. A sua aceitação

só começou quando um jurísta

homem importante (Qadi Abu’l-Hasan)

expressou aprovação pela juíza.

Rumman Amin

To Judge or not to Judge

de Engy Abdelkader

O artigo menciona que, ainda hoje,

nenhuma das quarto escolas Sunitas,

supostamente mais liberais, defendem

que os jurístas devem ser homens e,

no caso dos xiitas e da escola Maliki,

as mulheres são mesmo proibidas de

ocupar esta posição.

De seguida, a autora menciona

argumentos dados para defender esta opinião,

baseados em algumas passagens do Corão, em

um Hadith (que é por muitos considerado falso,

já que, a falsificação de Hadith é relativamente

comum na história do Islão) e por fim, as razões

biológicas. Neste último argumento afirma-se que

a mulher irá causar adiamentos de julgamentos

quando grávida e que ficará nervosa e instável

no período de menstruação, tomando decisões

instintivas e contraditórias. Porém, são depois

dados argumentos que refutam os anteriores,

assumindo que o intuito e a condição emocional

da mulher deveria ser visto como uma qualidade,

refutando o Hadith, que se mostra incoerente ao

defender também

que a mulher

deve representar

um papel na

sociedade.

Refere-se, ainda,

que o Corão não

se pronuncia

relativamente à

mulher jurista

e ao que não é

proibído no Livro

Sagrado.

Na Lei Islâmica estabelece-se uma

hierarquia entre as diversas fontes

que a compõem. O Corão mostra-se

como a mais importante, de seguida,

as Sunnas (interpretações do Profeta

sobre o Corão) e, depois, os Hadith

(relatos sobre as afirmações, ações

e ensinamentos do Profeta). Engy

Abdelkader aborda o tema da aceitação

da mulher em cargos de jurisdição

nas sociedade Islâmicas e, como

referido em documentos anteriores, a

lei Sharia surge de 5 fontes diversas,

uma delas, a Ijtihad, baseada no bomsenso

e na interpretação do Corão.

Esta interpretação é feita por jurístas

e, durante toda a história dos Islão, a

mulher foi sempre recusada de ocupar

esta profissão. Apesar de existirem

alguns casos de mulheres juristas, estas

nunca foram bem vistas e estiveram

sempre em grande minoria.

Mostafa Meraji

“Indeed, the majority of the Sunni schools

of law—Maliki, Shafii, and Hanbali—

opine that judges must be male (…)”

- Engy Abdelkader



Dr. Taha J. al-Alwani esclarece

questões acerca da maneira

como a mulher é vista pelo

Corão e o Islão. Este refere o

único verso no Corão referente

a uma situação de testemunho

de inclusão das mulheres.

“And call upon two of

your men to act as witnesses; and if two

men are not available, then a man and

two women from among such as are

acceptable to you as witnesses (…) so that

if one of them should make a mistake, the

other could remind her (…) ”

Assim, é aludida

esta clara discriminação de género,

afirmando que para um homem teriam

de existir duas mulheres.

Segundo o presidente da

School of Islamic and Social Sciences

em Virginia, esta mentalidade surgiu

da cultura pré-Islâmica Árabe, onde

a mulher era vista como inferior e

como a culpa da humanidade não ter

Plato Terentev

The Testimony of Women in Islamic Law

de Taha Jaber Al-Alwani

conquistado o paraíso. Nesta época,

afirma o autor, era comum o infanticidio

feminino, pois as meninas eram motivo

de vergonha e castigo para os pais. É

mencionado também que muito desta

cultura pré-Islâmica era baseada na

tradição oral, sendo que veio a afetar

a mentalidades de várias gerações e,

que ainda hoje é possível ver alguns

resultados disso.

Concluindo, o Corão promove a igualdade,

seja ela qual for, porém, a forma

como os juristas interpretam a lei do

Corão está, muitas vezes, errada.

“All individual human beings have the

same rights from birth to death.

We are all the same.”

- Dalai Lama

266-267 ‘cause baby you were

born this way.

Cressida J. Heyes trabalha

atualmente no departamento

de Filosofia do Género e

Sexualidade da Universidade de

Alberta. A filósofa inglesa toma

em consideração a existência de

mulheres transgénero e o facto

de muitas feministas consideram

a existência destas mulheres

como inválida, colocando em

polos opostos as suas lutas.

Mulheres Lésbicas e Trans

Aos Olhos da Lei

Inspirada pelas músicas de emancipação

feminina e homossexual dos anos 90, a cantora e

compositora norte-americana Lady Gaga lançou

“Born This Way” enquanto uma canção de liberdade,

um renascer numa sociedade sem qualquer tipo de

preconceitos.

Transgénero refere-se ao que é conhecido como

identidade ou expressão de género, ou seja, a maneira

como uma pessoa se identifica. O ser humano tende a

recear o diferente, aquilo que não conhece ou não percebe

e, por isso, continua a existir uma forte resistência perante

este grupo de pessoas.

Por isto mesmo, também a mulher lésbica permanece

sujeita a esta discriminação desumana e suja, até aos dias

de hoje.

“The efforts of transgender people over the twentieth

century and (...) to achieve visibility and justice are adding

rich, vibrant chapters to this history.”

- Gennyn Beemy

Feminist Solidarity after Queer

Theory: The Case of Transgender

de Cressida J. Heyes

Pose (2018-2021)

enfatiza que a problemática transsexual

só é possível devido aos avanços da

tecnologia médica, estando estas

mulheres inteiramente dependentes

destes fatores para estarem de acordo

com a sua expressão de género.

À luz destas ideias

incisivas e divisórias, Heyes afirma

que a hipótese da transsexualidade

ser antifeminista nestes pontos de

vista torna-se impossível de contestar,

porque as suas defensoras consideram

apenas um sujeito, que nomeia de

women-identified women.

Ao não considerarem

outras identidades e expressão de

género, mulheres ferministas não-trans,

falham em formar alianças, deixando as

mulheres transsexuais expostas ainda

mais a uma sociedade das quais já são

alvo de grande ódio.

Assim, é patenteada uma

perspetiva acerca da hostilidade entre

feministas e mulheres trans, e em como

estas podem convergir as suas lutas,

sendo solidárias umas com as outras,

indo a autora, além do preconceito

de que mulheres transgénero são

“pacientes” patológicos que dependem

inteiramente de intervenção médica.

Heyes começa por

analisar a assunção de muitas teoristas

de que género é um conjunto de

relações hierárquicas entre sujeitos

com géneros diferentes criticando

as posições de escritoras feministas

Janice Raymond e Bernice Hauman

- que colocam apenas as mulheres

transsexuais no domínio da patologia

– defendendo que o livro Transsexual

Empire de Raymond se tornou a

arquetípica hostilidade de mulheres

feministas cis-género contra mulheres

transsexuais, cortando estas mulheres

da experiência feminina, argumentando

que transsexuais são um resultado da

sociedade patriarcal, pois “são homens

que negam o seu privilégio”. Dentro da

mesma linha de pensamento, Hauman,

Euphoria (2021)



Transsexual Women and Feminist Thought:

Towards New Understanding and New Politics

de Raewyn Connell

As reações de mulheres feministas

face ao surgir da questão das mulheres

transsexuais e dos ideais trans vieram

moldar as visões políticas internas do

movimento feminista e externas a um

nível institucional.

Inicialmente, o feminismo

prestou pouca atenção a mulheres transsexuais,

apesar de, muitas perfilarem nas lutas das

mulheres cis-género. Em The Transsexual

Empire, testemunha-se o primeiro ataque de

uma feminista radical às mulheres transsexuais,

acusando-as de serem homens invasores do

território da mulher. Apesar desta linha de

pensamento, com a qual muitas mulheres

se identificavam, muitas outras suportam

mulheres transsexuais, considerando a luta de

ambas, a mesma luta.

As mulheres transsexuais,

para as feministas que as apoiavam, vieram

comprovar a plasticidade do género e a

importância da pluralidade de género como

parte da experiência das mulheres, indo

muito ao encontro daquilo que Judith Butler

argumenta e desconstrói no seu trabalho.

Raewyn Connell é bastante

precisa ao aludir a discriminação que mulheres

transsexuais sofreram de outras mulheres,

enquanto tentam caminhar para um território

que se demonstra receoso com a sua presença,

apesar de a luta ser a mesma: a de lutar contra

a imagem do homem enraizada em todas

as instituições que gerem e comandam a

sociedade ocidental.

Sylvia Rivera e Marsha P. Johnson, Ativistas Trans

“My feminist utopia does not include

rigid disciplining of dismorphic sex

and gender categories, an enforced

normative ideal body type, obtification,

or abjection”

- Cressida J. Heyes

Elas não se anulam para sobreviver.

As mulheres trans

exigem “existir com felicidade”

de Andreia Friaças

No contexto do dia internacional da mulher

celebrado a 8 de março de 2021, três mulheres

trans, Alice, Leonor e Júlia, relatam as suas

vivências num país que ainda é claramente

homofóbico e transfóbico. O caminho

que estas pessoas têm que percorrer para

conseguirem ser vistas como mulheres numa

sociedade completamente patriarcal, assente

numa família binária e intransigente é um

atentado aos seus direitos humanos.

As mulheres mostram como as suas

experiências de vida não convergem apenas numa

infância atribulada, repleta de incompreensão de pais e

familiares e dificuldades de integração nas escolas, mas

também nas experiências da adolescência, do acesso à

saúde, do acesso ao mercado de trabalho e mesmo em

contexto sociais completamente comuns.

Apesar de em 2018 Portugal, ter

reconhecido o direito à autodeterminação da identidade

e expressão de género e de ter sido aprovada

uma estratégia para a melhor integração de

pessoas LGBT no SNS, continua a existir um

tempo de espera exasperante, aliado muitas

vezes a comentários transfóbicos e dificuldades

no acesso a tratamentos hormonais, algo que a

pandemia só veio agravar.

Alice, Leonor e Júlia vêem-nos

relembrar de como uma mulher não pode

ser reduzida ao órgão reprodutor, e de que

como sociedade temos e devemos proteger

pessoas trans, especialmente mulheres trans.

É imperativo refletir como podem os direitos

humanos destas mulheres ser garantidos,

para impedir que mais pessoas como elas

sejam vítimas de crimes de ódio ou caiam em

situações de pobreza sem acesso a trabalho.

Transgender History in the United States

de Genny Beemyn

Igualmente na visibilidade de pessoas trans,

principalmente mulheres trans, a importância dos

avanços médicos tanto cirúrgicos como hormonais

permitiram o levantamento desta problemática

ainda mais a fundo. Christine Jorgensen foi

revolucionária também, no sentido de trazer para as

bocas do mundo, a existência de pessoas como ela.

Entende-se que a história

contemporânea das pessoas transsexuais

se movimentou depressa, lado a lado com o

movimento LGB e feminista, reclamando direitos

básicos humanos como proteção, acesso a

trabalho e apoios para si também.

O contributo de mulheres como

Sylvia Rivera e Marsha P. Johnson, tanto para o

movimento Transgénero, como para o movimento

das mulheres e a sua influência nos dias de hoje é

também de grande destaque no livro.

A autora termina por denunciar a

falta de leis que proteje as pessoas transgénero

nos EUA e como isso tem efeitos diretos nos

assassínios destas pessoas por todo o mundo,

sendo as principais afetadas por esta rejeição de

pessoas transgénero, mulheres negras transsexuais.

A história das pessoas transgénero desde

os Índios Nativos Americanos e as suas

expressões de género transgressivas

- reconhecendo muitos géneros para

além do binário vigente na sociedade

Cristã dos Colonizadores Ingleses - até

à atualidade contemporânea com os

movimentos e a surgente Teoria de

Género ou Estudos Transgéneros, é

pouco relatada e reconhecida.

Genny Beemyn elucida a

importância de sabermos que o termo

“transgénero” é bastante recente e surge à luz de

muitos outros movimentos e eventos históricos

que tomaram lugar ao longo do séc. XX, por isto,

fica em aberto a possibilidade de classificar como

transgénero as pessoas que viveram numa época

em que este termo não era existente, no entanto, a

sua importância na história desta minoria

é incontestável.

Assim, não se pode esquecer as

pessoas pioneiras das comunidades de drag do

séc. XIX, que reclamavam para si uma nova forma

de expressão de género através da aparência.



Portrait of a Lady on Fire (2019)

Rafiki (2018)

Narratives of Lesbian

Existence in Egypt –

Coming to Terms with

Identities

de Christina Lindström

Narratives of Lesbian Existence in Egypt surge da

necessidade de estudar e analisar as vivências de

mulheres lésbicas no Médio Oriente, especialmente

no Egito, onde as identidades homossexuais são

consideradas inexistentes ou pecado, existindo uma

invisibilidade destas mulheres.

Lindström aborda o tema da homossexualidade

a partir de uma perspetiva de género, isto é, analisa apenas as

representações e as experiências de mulheres, pois no Egito as

imagens que existem destas mulheres são escassas ou bastante

discriminatórias.

Para suportar esta assunção de invisibilidade da

mulher lésbicas no médio oriente, são analisados diversos artigos ou

ensaios que tratam da temática da homossexualidade nesta região e

todos chegam a uma semelhante conclusão: a homossexualidade é

uma ocidentalização das identidades e é um pecado consciente.

Neste sentido, a autora entrevistou cinco mulheres

egípcias, que mantêm relações com mulheres, todas com educação

superior (ou a frequentar) e a viver na cidade do Cairo, são elas:

Khadidja, Negma, Sarah, Leila e Mariam. Todas estas fazem-se passar

por mulheres heterossexuais, devido ao medo de retaliações que

podem sofrer se revelarem a sua autêntica identidade.

As entrevistadas descrevem a perseguição e ódio que

mulheres lésbicas sofrem quando são expostas como homossexuais,

resultando em tentativas de expulsarem estas mulheres de

Universidades e internamentos forçosos em instituições mentais.

Em adição, as mulheres relatam também como as

suas mães reagiram à possibilidade das suas filhas

serem homossexuais, sendo que muitas entraram

em negação, descartando essa ideia, adotando

sempre atitudes bastante agressivas.

Este artigo, fornece um olhar

bastante realista daquilo que é ser-se uma

mulher lésbica numa civilização do médio

oriente, entendemos o medo e a invisibilidade,

de mulheres que vêm os seus direitos humanos

violados, oprimidas enquanto são forçadas a casar

para reprimir a sua verdadeira identidade.

Gisberta Salce Júnior,

mulher trans morta e violada

a 22 de Janeiro de 2006 no Porto

268-269 the wrong side

of heaven

“A ditadura tinha uma ideologia de género fortíssima

que nunca foi posta em causa”

entrevista a Lígia Amâncio

Manifestação do Movimento de Libertação das Mulheres,

no Parque Eduardo VII, a 13 de janeiro de 1975.

forte! E foi muito eficiente. Eu pertenço a uma

geração em que essa ideologia era ensinada nos

manuais escolares. O Salazar tem discursos sobre

o que as mulheres devem ser. A Constituição

de 1933, no capítulo da igualdade dos cidadãos,

abre uma excepção para as mulheres devido

ao seu papel na família. Temos uma ditadura

com uma ideologia de género fortíssima que

nunca foi completamente posta em causa por

nenhuma acção da democracia. A democracia

nunca combateu activa e conscientemente essa

ideologia. (...) Não há nenhuma acção política que

combata a ideologia de género.

experiências, sororidade entre mulheres, respeito

pela voz das mulheres. Em contrapartida, tivemos

uma entrada facilitada das mulheres no mercado

de trabalho pela própria Guerra Colonial. Nos

outros países, a entrada das mulheres no mundo

do trabalho é uma reivindicação do movimento

feminista. O movimento da primeira vaga tinhase

focado no acesso ao voto. O da segunda vaga

foca-se no acesso ao emprego. Em Portugal não

foi preciso. Não havia homens, tinham emigrado,

estavam na guerra, portanto as mulheres tiveram

que ir trabalhar.

A socióloga Lígia Amâncio diz que em

Portugal ninguém se habituou a debater

as desigualdades sociais baseadas no

sexo, na etnicidade. “É por isso que

estamos com o problema sobre o

racismo, outra negação da sociedade

portuguesa”. Apesar de ter esperança

nas novas gerações, mais desprendidas

em relação à “mordaça” existente

na sociedade, admite que as coisas

ainda piorem “por conta da invasão da

extrema-direita”.

O Caso Português

“Wrong Side of Heaven” da banda Five Finger

Death Punch consolida em si a ideia dos

“brandos costumes” ao qual Portugal sempre se

procurou associar.

Somos um país amável e extremamente acolhedor para

os estrangeiros, contudo, não deve ser nunca apagado ou

coberto o nosso passado obscuro e dissimulado.

Nunca tivemos um movimento

feminista forte?

O século XXI pode ser o século das

mulheres? Houve uma altura que se falava

muito do pós-feminismo…

As Carquejeiras: As Escravas do Porto (2019)

Na primeira

vaga, tivemos, mas toda a

gente já se esqueceu. E nos

anos seguintes é diluída

na luta antifascista. Depois

da dissolução do Conselho

Nacional das Mulheres

Portuguesas, da prisão

da Maria Lamas, aqueles

anos 40/50 são anos de

aniquilação, já ninguém

pensava no feminismo, era

preciso era combater a

ditadura. Isso compreendese

perfeitamente.

Agora não há nada colectivo

para analisar, é tudo individual. E como é tudo

individual, tudo depende da minha vontade, da

sua vontade... Essa é uma característica de uma

época que explica bem a ausência de feminismo.

O feminismo, como qualquer outro movimento

social, vive de um sentimento de mobilização

colectiva. Aqui em Portugal temos outra agravante:

nos outros países, os anglo-saxónicos, a própria

Itália e a França, tiveram movimentos feministas

importantes na segunda vaga e nós não tivemos.

Segunda vaga? Está a falar dos anos 60...

Mas como se explica que

haja poucos movimentos

feministas em Portugal?

É que a

ideologia de género da

ditadura era muito, muito

Nós tivemos uma primeira vaga

importante (...) , mas na segunda vaga estamos

em plena Guerra Colonial, era impossível. Uma

sociedade em guerra não pode ter feminismo. A

preocupação das mulheres naquela altura era com

os pais, os irmãos e os maridos. Essa ausência

de experiência histórica do feminismo também

nos deixou alguns défices, nomeadamente de



A mulher portuguesa

na legislação civil

de Elina Guimarães

Elina Guimarães procura esclarecer os

avanços e recuos dos direitos da mulher

na legislação portugesa, das Ordenações

até à atualidade com referências e

exemplos elucidativos da profunda

desigualdade de género patente em

inúmeros aspectos. Dividido em: As

ordenações, O Código Civil de 1867, A

legislação republicana, O Estado Novo, O

Código Civil de 1966 e O post-25 de Abril,

a pesquisa prova que não é ao acaso, mas

sim por razões sociais e económicas, que

as ordenações correspondem a períodos

históricos definidos.

É necessário um certo tempo

para que as mudanças sociais tomem aspetos

legislativos, contudo, podemos facilmente

verificar que houve uma menor mudança na

estrutura da família desde os primórdios do País,

visto que, as primeiras ordenações compilavam

a legislação anterior. Daqui talvez resulte certo

um imobilismo mental na família e o lugar da

mulher dentro dela, imobilismo que tem levado

à incompreensão da legislação atual, não se

verificando a aplicação geral dos seus princípios.

Concluindo que, não é em décadas que se pode

reconstruir o efeito de séculos.

Leis da Família,

Leis da República

O artigo 1º do Decreto n.º 1 define o casamento como «um

contrato celebrado entre duas pessoas de sexo diferente com o

fim de constituir legitimamente família». A redação é exatamente

a mesma que a do Código, salvo a omissão da expressão

«contrato perpétuo» (artigo 1056º).

Ana de Castro Osório e

Carolina Beatriz Ângelo

A diferença é explicada no artigo 2º, que diz que o casamento é

um contrato puramente civil e que se presume perpétuo, salvo a possibilidade

de recurso ao divórcio. Isto não impedia ninguém de o considerar também ou,

principalmente, como um sacramento, se tal fosse a sua crença.

As Leis da Família eram compostas por dois decretos: o n.º 1,

intitulado O Casamento como Contrato Civil, e o n.º 2, intitulado Lei de Protecção

aos Filhos. Apesar de tudo, ambos davam à família um aspeto mais equitativo no

que respeita à mulher. Foram promulgadas a 25 de dezembro de 1910.

Lígia Amâncio

Concordata de 1940

Santa Sé e República Portuguesa

1911 e o subsequente corte de relações

diplomáticas que vigorou até 1918.

Por este diploma, os

casais unidos canonicamente depois da

sua promulgação não podiam divorciarse.

Mas este direito conservavam-no os

casais unidos anteriormente, mesmo

com cerimónia religiosa e todos que

casassem civilmente.

Se as pessoas que

casavam canonicamente obedecessem

às leis da Igreja sobre a indissolubilidade

do casamento, como obedeciam às

regras da sua celebração, haveria

apenas dramas privados.

A Concordata entre a Santa Sé

e a República Portuguesa de

1940 foi assinada no dia 7 de

Maio de 1940, juntamente com

o Acordo Missionário, durante

o papado de Pio XII e o governo

de António de Oliveira Salazar,

tendo sido ratificada pela

Assembleia Nacional a 30 de

Maio de 1940.

Enquanto a 5ª

Concordata da História de Portugal,

procurou normalizar as relações

entre o Estado e a Igreja Católica

após o conflito originado pela Lei da

Separação do Estado das Igrejas de


270-271 don’t touch

my hair

Domitília Trovoada

How Colonialism Preempted

Modernity in Africa

por Olúfémi Táíwò

Why hasn’t Africa been able to respond to the

challenges of modernity and globalization?

Going against the conventional wisdom that

colonialism brought modernity to Africa,

Olúfémi Taíwò claims that Africa was already

becoming modern and that colonialism was

an unfinished project. Africans aspired to

liberal democracy and the rule of law, but

colonial officials aborted those efforts when

they established indirect rule in the service of

the European powers. Taíwò looks closely at

modern institutions, such as church missionary

societies, to recognize African agency and the

impulse toward progress. He insists that Africa

can get back on track and advocates a renewed

engagement with modernity. Immigration,

capitalism, democracy, and globalization, if

done right this time, can be tools that shape a

positive future for Africa.

Colonialism: A Philosophical Profile

Taíwò nota que apesar de o Canadá e os

EUA terem sido colónias estão muito mais modernizados

do que África, onde também houveram diversas colónias.

Estas ex-colónias não africanas, hoje em dia, também

são responsáveis pela exploração de países que foram

colónias africanas, contudo, este é apenas um dos

fatores que não permitiram o “desenvolvimento natural”

de África. Uma das causas mais determinantes foi o

colonialismo em si e a forma como este foi “executado”

durante o domínio colonial em África.

V. Y. Mudimbe (filósofo da República

Democrática do Congo) e Delavignette (diretor da

National School of Overseas France) apresentam

divergências no assunto do colonialismo. Olúfémi propõe

uma perspetiva à base da existência de dois tipos de

A Mulher Negra Autóctone

“Don’t Touch my Hair” transporta uma mensagem de respeito,

integração e libertação, utilizando o cabelo como uma metáfora

para toda a essência da mulher negra. Este é o símbolo perfeito,

visto que, é algo que sempre foi fiscalizado, desde o início da história até

ao presente. A música refere-se a uma comunidade específica, contudo,

a sua mensagem é acessível e relevante para uma ampla comunidade de

mulheres em geral.

Quando uma região se encontra sob domínio colonial todos os membros

desta comunidade são afetados, contudo, de que forma podem estar

as mulheres africanas representadas na história do seu próprio país

quando são raras as menções das mesmas em documentos oficiais da

época?Até que ponto é que a sua própria narrativa não lhes é roubada?

Negligenciada? Esquecida...

Júlia Santiago

colonialismo, que estariam

na base dos problemas

das colónias de África.

Desta forma, a primeira

forma de Colonialismo

seria o mais pacífico

entre os dois. Esta seria

baseada na ocupação de

territórios vazios ou com

muito pouca população,

a fim de evitar problemas

de grande dimensão. Por

vezes eram feitos acordos

entre colonizadores e

colonizados. Neste caso de

colonização, era comum

os colonizados manterem

os seus costumes e

práticas, desde que

reconhecessem autoridade

perante os ocupantes. Em

certo casos, a definição de

“territórios vazios” era relativamente deturpada, sendo

que os poucos ocupantes existentes eram vistos como

“floresta para desflorestar”.

O segundo tipo de colonialismo, mais

agressivo, seria visto como uma expansão do Estado, com

o intuito de criar um sistema político em que o centro

era a Metrópole. Este tipo de colonização é caracterizado

pela imposição de uma “falsa modernização” que foi

abandonada pelos próprios colonizadores. A ideia deste

tipo de colonização estaria associada à redução de

diferenças culturais entre o colonizador e o colonizado,

abolindo costumes e criando leis que controlassem os

“nativos”. Este género de colonização levou à conotação

negativa de África, excluindo-a e desacreditando as suas

capacidades de desenvolvimento.


As cores do racismo

português: do colonialismo

à actualidade

por Patrícia Ferraz de Matos, in Público

Um olhar histórico e

incisivo sobre o passado

colonial português

entre o final do séx.

XIX e o Estado Novo

leva a entender a matiz

estrutural do racismo

no mantimento de um

império conquistado à

força, especialmente

nos países Africanos,

apesar de já em séculos

anteriores encontrar-se no

Brasil distinções a partir

da cor da pele com termos

que perduram mesmo

hoje: mulato, pardo, cabra

e crioulo.

A verdadeira

segregação por escrito é

encontrada nas legislações

portuguesas do início do séc.

XX. O Acto Colonial de 1930

estabele-se os direitos e deveres

daqueles que nasceram na

metrópole e aqueles que são

indígenas que, aliado ao decreto

ministerial de 6 de fevereiro

de 1929, desenha uma clara

distinção entre os colonizados e

os colonizadores.

As bases deste

claro racismo encontram-se no

séc. XVIII com filósofos como

Hume e Lineu, que defendiam

a superioridade natural do

homem branco face ao homem

negro, levando a que cientistas

dividam o ser humano em raças,

estabelecendo as relações de

poder a partir da cor de pele que

seriam aplicadas e adaptadas nas

colónias portuguesas.

Estas ideias

são então disseminadas na

sociedade portuguesa através

de propaganda imperialista

como no jornal O Século,

Missões de Angola e Congo e

o periódico O Pretinho, aliados

a uma educação totalmente

racista assente na ideia de

indígena e não indígena em que

os negros eram considerados

aqueles que eram mais inferiores

e assim, a cor da pele começa a

suportar um império inteiro.

Após a Segunda

Guerra Mundial, o discurso

altera-se: para Portugal

conseguir manter o Império, as

colónias passam a chamar-se

Províncias Ultramarina no ano de

1951, transmitindo uma ideia de

país multicultural e multirracial,

utilizando como moleta

doutrinária a teoria do lusotropicalismo

e aqui, talvez, surge

a ideia do bom colonizador e do

país dos brandos costumes.

Colonialism: A Global History

por Marc Ferro

Para se entender o fenómeno dos países colonizadores tem

que se distinguir os conceitos de Colonização, subordinada

ao Colonialismo e o fenómeno de Imperialismo, conceitos

completamente interligados ao longo dos cinco séculos de

hegemonização de países Europeus.

O colonialismo, como é definido nos dias de hoje, resulta

de uma procura principalmente mercantil de países como Portugal

e Espanha de encontrarem novas rotas de acesso a especiarias e a

riquezas, face a fragilidades financeiras, aliado a preceitos religiosos de

evangelização. Pelo menos até ao século XIX, o Colonialismo dominou e

era classificado como o “poder” de um determinado grupo de pessoas

ao conseguir “reproduzir-se” em diferentes territórios.

A partir de 1870, ocorre uma mudança de paradigma

nas mentalidades dos colonizadores à luz da Revolução Industrial e do

surgimento de potências industrializadas como a Alemanha, os EUA e

a Rússia. Isto vem justificar a expansão territorial além-mar de países

como Portugal, Inglaterra, França e Espanha que procuram agora nas suas

colónias apropriarem-se dos bens

materiais destes territórios como

meios de produção industrial.

O imperialismo

está aliado também a uma ideia

de que a nação-mãe tem o

dever e o direito de colonizar e

civilizar outros territórios. São

estes os impulsos primários do

imperialismo: colonizar, civilizar,

expandir e disseminar uma

cultura em detrimento de outra.

“Os debates públicos

insistem em perguntar se

temos ou não um problema

de racismo, em vez de passar

à discussão de políticas

públicas e maneiras de

reduzir os fossos sociais”

- Patrícia Ferraz de Matos

Black Girl (1966) Dir. Ousmane Sembène


272-273 don’t touch

my hair

Perdidas na exposição?

Desafiar o imaginário colonial

português através de fotografias

de mulheres negras

por Júlia Garraio

A realidade vivida pelas mulheres

negras nos “paraísos tropicais”

do perverso império português

De que forma estiveram as mulheres presentes na política

do continente africano no pós-colonialismo?

Novas necessidades resultaram na criação da União

Africana, em 2002, na capital da Etiópia. Esta tinha como modelo a União

Europeia e mostrava uma preocupação elevada em relação aos direitos

humanos que a diferenciava da antiga OUA.

A comissão é composta por um presidente, um vicepresidente

e oito comissários. Estes dez elementos devem refletir uma

representação de dois elementos por cada uma das regiões africanas,

sendo que um destes deverá ser uma mulher.

O tribunal de justiça é composto por 11 juízes e, em 2010,

integravam o colectivo de juizes: Hamdi Fanoush, Kelello Mafoso-Gunni,

El Hadji Guisse, Fatsah Ouguergouz, Modibo Guindo, Jean Mutsinzi,

circulação de imagens de mulheres

negras semi-nuas tornou-se comum,

quer no espaço público, quer no

espaço privado, não sendo raro ver

estas fotografias nos jornais, postais

e exposições. Em 1934, na exposição

colonial do Porto, o caso de “Rosita”,

uma mulher trazida para Portugal

devido ao seu corpo peculiar, ficou

bastante conhecido e, inclusive, muitos

autores concordam que o sucesso

da exposição se deveu à exibição dos

corpos negros semi-nus. Deste modo,

a mulher negra era símbolo de prazer

sexual, do ultramar e dos selvagens,

sendo que as relações sexuais com elas

eram social e culturalmente aceites,

no entanto, se fossem com mulheres

brancas seria considerado pornografia.

Por fim, os

Colonizadores estabeleceram um

sistema económico e social em que

os nativos saíam muito prejudicados,

esta assimetria racial levou algumas

mulheres negras a assumirem a

prostituição para manter a subsistência

do povo e como uma forma de navegar

entre estratos sociais e económicos.

Júlia Garraio concebe

um discurso acerca do imaginário

das mulheres negras no colonialismo

português através da análise da

exposição Retornar: Traços de

Memória, constituída por fotografias

colonialistas de álbuns de família.

Esta começa por referir

que o álbum é um objeto que resulta da

seleção de momentos memoráveis feita

por quem está a fazer a compilação do

mesmo. As descrições das fotografias

abrangem figuras de soldados brancos e

de mulheres negras, semi-nuas, onde os

soldados estão a tocar nos seios ou na

zona púbica das mulheres.

Estas imagens poderão

ser um bom retrato das realidade

vividas por estas mulheres, fruto de

uma extrema sexualização racial do

corpo das colonizadas, de violações

e explorações de outro tipos. As

fotografias e a violência sexual seria

como uma performance de afirmação

do poder colonial e supremacia do

homem branco.

A metrópole portuguesa

era muito católica e conservadora,

condenando a nudez e controlando

a sexualidade feminina, contudo, a

Da Organização de Unidade Africana à União Africana

por Arquivo Janus: African Union Profile

Postal da exposição colonial do Porto

Gerard Niyungeko, Sophia Akuffo, Githu Muigai, Joseph Mulenga e

Bernard Ngoepe. Destes onze membros apenas um é uma mulher.

Foram catorze os comités temáticos que a União Africana

optou por priorizar. Um deles é o “Comité de Género e Capacitação das

Mulheres” e funciona como um órgão de preparação dos programas e

projetos da UA e, numa fase posterior, como órgão de acompanhamento

e implementação dos mesmos.

A União Africana visava a maximização das afinidades

entre estados africanos e o resultado proveniente da complementaridade

de múltiplas realidades com um passado comum (regime colonial).

Num contexto alargado de redefinição do panorama internacional para

construção e funcionamento dos Estados pós-independências, verificaramse

avanços no plano da cooperação regional a nível económico e político

procurando sempre alcançar uma sociedade estável e democrática.


Congresso do Protocolo de Maputo

“The Portuguese

colonial context,

similar to other colonial

contexts, reveals the

banalization of the

practice of white men

photographing black

colonized women”

- Filipa Lowndes Vicente

As Relações NATO – União Africana

e a resolução de conflitos no Continente Africano

in Revista Internacional de Direitos Humanos

A conflitualidade que se

verifica em África assume

importância global e exige

respostas multidimensionais e

multidisciplinares. Deste modo,

a Organização do Tratado

do Atlântico Norte (OTAN)

assumiu uma postura de apoio,

de acordo com as solicitações

africanas, as suas prioridades e

as capacidades disponíveis.

O estudo apresentado procura efetuar

o levantamento de opções, prioridades,

possibilidades de cooperação

e complementaridade entre os

atores, verificando as hipóteses de

aprofundamento e sistematização da

relação OTAN-União Africana.

Por fim, pode-se concluir que a

intervenção da OTAN para a resolução

dos conflitos, vem promover com

sucesso a evolução face às tendências

de conflitualidade em África no

horizonte de 2030.

Adesão ao processo

Perante a ação da Arquitetura de Paz

e Segurança Africana (APSA), notouse

a inexistência de um mínimo de

cooperação na África do Norte, a

África Central tem dado passos muito

reticentes e a África Oriental apresenta

coisas a coordenar e a implementar.

É de elevado interesse que África evolua

em todos os planos, em particular, no

plano da segurança. A análise da NATO

vem revelar estas atuais contradições

que, após solucionadas, serão um grande

passo para o desenvolvimento africano.

A apropriação cultural

A problemática do colonialismo

Antes da sua evolução para União

Africana (UA), a Organização da

Unidade Africana (OUA), estava

compreensivelmente focada na fase

histórica anticolonial, a preocupação

focalizava-se na afirmação das

nacionalidades e também a tentativa

de preservação das fronteiras, para

evitar um movimento anti-Berlim e a

enorme perturbação que daí resultaria.

Visto que, um dos objetivos da OUA

foi a eliminação de toda forma de

colonialismo em África com o intuito

criar condições adequadas para tirar o

continente da marginalização tendo em

conta o contexto de decadência vivdo

na época. Assim, os direitos humanos

foram colocados em segundo plano,

devido às necessidades de uma época

sob regime colonial.

É abordada ainda a questão de

responsabilidade histórica e cultural

que remete à época do regime colonial

em África.

“Não se trata de saldar contas de

passados coloniais, trata-se de os

europeus terem exportado para todo

o mundo, mas com particular vigor

para África, o seu modelo cultural

e civilizacional”. A grande maioria

das sociedades africanas falam as

nossas línguas e têm uma herança

cultural nossa, por assim dizer. Estes

percorreram importantes ciclos

históricos enquanto ainda eram colónias,

o que define uma responsabilidade nos

países colonializadores. Enquanto países

mais ricos e desenvolvidos estamos lá na

colaboração entre regiões e procuramos

cooperar, mas não como devíamos e

podíamos, deixando aquém todo o

potencial desta ligação internacional.


274-275 don’t touch

my hair

Lutas e Formas de

Organização Feminina em África

de Tatiana Raquel Reis Silva

A abordagem histórica

aos movimentos

feministas em África e

a luta pelos direitos da

mulher autóctone

Johann Moritz Rugendas

de Ribeirão Manuel de 1910 e

algumas alterações que se têm

feito na contituição de Cabo-

Verde como os Planos Nacionais

de Igualdade e Equidade de

Género e os Planos Nacionais

de Combate à Violência Baseada

no Género. Entre 1990 e 2000,

foram, ainda, criadas inúmeras

instituições em defesa dos

direitos da mulher e libertação

do estatuto de reprodutora.

Contudo, apesar dos avanços,

nomeadamente na participação

da mulher na sociedade em

alguns trabalhos, educação,

saneamento, liberdade, ainda há

muita exclusão da mulher no

mercado formal de trabalho e,

sobretudo, na política.

A Igualdade de Género em

São Tomé e Príncipe:

Entre a Realidade e a Utopia

por Lurdes Santos

O desenvolvimento e o domínio do

género em São Tomé e Príncipe

“Entre a Realidade e a

Utopia”, afirma Lurdes Santos que expõe

a evolução do Movimento de Mulheres em

São Tomé e Príncipe, nos períodos colonial

e pós-colonial. Este último compreendeu

duas etapas: a primeira república, de 1975 a

1990, em que só existia uma organização de

mulheres (OMSTEP) do partido no poder

MLSTP e a segunda república, a partir de

1990, período a partir do qual surgiram outras

associações e organizações da sociedade cívil,

o pluripartidarismo, a nova constituição e as

eleições livres e democráticas.

O Governo de São Tomé e

Príncipe adotou por decreto, a partir de

2007, a Estratégia Nacional para a Igualdade e

Equidade de Género. Este estudo pretendeu

saber como encaram as Associações de

Mulheres e os dirigentes políticos e de

Movimentos Sociais o modo como as políticas

e os programas tomam em conta esses

engajamentos/compromissos assumidos.

Assim, tornou-se conhecido

como se posicionam mulheres e homens face à

prática efetiva da igualdade de género, tendo em

conta a existência de leis favoráveis à mesma.

era predominante. A mulher

foi subjugada e subordinada ao

homem, desaparecendo a ideia

de igualdade e agregado familiar

para dar lugar à familia nuclear

onde o homem está no centro.

Muitos destes ideais surgem

com o cristianismo e com o Islão.

Tornou-se necessário fortalecer

a luta pelos direitos humanos

das mulheres africanas no

pós-colonialismo, a fim de criar

distanciação do tempo colonial e

(re)criar igualdade.

As lutas

pela libertação nacionalista,

trouxeram mudanças como:

a educação das crianças,

independentemente do sexo

e a participação das mulheres

na sociedade, nomeadamente

nas forças armadas (Guiné),

no FRELIMO e Destacamento

feminino (Moçambique). No 2º

Congresso do PAIGC (Partido

Africano para independência

Guiné e Cabo Verde), foram

discutidos temas relativos

à participação política das

mulheres no estado e à

participação no mercado

de trabalho. Deve-se, ainda,

destacar as diversas intituições

foram criadas para lutar pelos

direitos da mulher, a Revolução

O aparecimentto

de movimentos feministas em

África está muito relacionado

com a luta pela independência

e movimentos anti-colonialistas.

Desde 1990, é possível

observar algumas melhorias

em relação ao estatuto da

mulher, comparativamente

ao colonialismo. Contudo, é

mencionado que os movimentos

feministas em África,

inicialmente, estavam divididos

em vertentes que, por vezes,

tornava difícil a própria definição

do feminismo no continente. Os

principais movimentos dividiamse

em movimentos endógenos

de mulheres, resistência anticolonial,

libertação nacional

e luta pelo reconhecimento

do trabalho da mulher

africana. Como referido, estes

movimentos surgem em meados

da década de 1970, opositores

aos ideais colonialistas. O

coloniaslismo colocou o

homem como líder, fazendo

desaparecer organizações de

poder locais onde o matriarcado


Protocol to the African Charter on Human

and Peoples’ Rights on the Rights of

Women in África

de African Union

The African Union (AU) is a

continental body consisting of the 55 member

states that make up the countries of the African

Continent. It was officially launched in 2002 as a

successor to the Organisation of African Unity.

The most important decisions of the AU are

made by the Assembly of the African Union, a

semi-annual meeting of the heads of state and

government of its member states.

A abolição de quaisquer práticas que

impeçam os progressos na igualdade

de género

O Protocolo Africano dos Direitos

Humanos e dos Povos sobre os Direitos das

Mulheres em África foi adotado a 11 de julho de

2003 e tem como objetivo estabelecer os direitos

da mulher africana, eliminar práticas prejudiciais

que subordinam a mulher, bem como a eliminação

da discriminação de género ou sexual. O Protocolo

tem 23 artigos e foi redigido para os 55 estados

membras (na altura 53).

Nas ex-colónias portuguesas,

bem como na maioria do continente africano, o

protocolo foi assinado e ratificado. O documento

não foi assinado nem ratificado apenas pelo Egito,

Tunísia e Botsuana. Este documento cobre desde

a eliminação da discriminação à proteção de

mulheres desfavorcidadas e desabilitadas.

O documento menciona a abolição

de qualquer tipo de discriminação e em diversos

artigos menciona a necessidade de criar leis para

a proteção da mulher e alterar as constituições

dos países onde existirem leis que permita a

subordinação da mulher. Refere-se também, em

vários artigos a necessidade de tomar medidas e

implementar programas para a sensibilização da

população, bem como programas de reabilitação

para mulheres vítimas de violência. A violência está

claramente proibida, desde a violação à violência

verbal, bem como ameaças de qualquer tipo.

O artigo menciona também

que a idade minima para casar é de 18 anos

e que o casamento não deverá ocorrer sem

consentimento da mulher. De seguida, mencionase

o direito de a mulher participar no mercado

de trabalho e políticas, sendo que deverá haver

igualdade de opotunidades e de remuneração. No

artigo no 8 é estabelecido que a mulher é igual

ao homem antes e perante da lei e devem ser

abolidas leis que contradigam este facto ou sejam

dúbias a este respeito.

De entre muito outros assuntos,

é referido o direito à educação, onde na alínea

b) do artigo 12 escreve-se que deverá haver a

eliminação de esteriótipos nos manuais escolares.

Promove-se a sensibilização de género e assuntos

como os direitos humanos, a fim de não permitir a

perpetuação de discriminação.

“vive uma conflitualidade (...)

indiscriminada e bárbara e uma violência

intolerável sobre as mulheres.”

- Paulo Emanuel Maia Pereira, Investigação Individual, 2013/2014

Manifestação Black Women’s Action Group


276-277 don’t touch

my hair

A Situação da Mulher em Angola

de Maria Idalina de Oliveira Valente

Alice Cruz

Women and Colonialism

de Kathleen Sheldon

Na conferência de Berlim, em 1884-

1885, as nações europeias da Grã-

Bretanha, França, Alemanha, Bélgica e

Portugal dividiram áreas de domínio do

continente africano entre si.

população não tem acesso) e o escasso

acesso a serviços primários de saúde da

mulher, contribuem para a fragilização

da posição da mulher em Angola,

acentuando o alto nível de mortalidade

deste país.

Adicionalmente, apesar

de nos agregados familiares se dar

ênfase à mulher devido às tradições

não-católicas, havendo mesmo

inúmeras mulheres que assumem a

chefia das famílias, a politica continua

a ser um campo em que a presença

da mulher angolana é escassa,

pois ao ter sido algo transmitido e

institutionalizado pelos colonizadores,

existe uma elitização do próprio

sistema politico democrático que foi

desenhado por homens e para homens,

que exploram todas as riquezas naturais

e mão de obra do seu país.

Em termos legais, a

mulher angolana não é protegida em

situações de violência doméstica,

violação e aborto. A própria estrutura

familiar que é aceite é a família

monogâmica, apesar de em Angola

a poligamia ser bastante comum e

culturalmente aceite.

A mulher em angola,

encontra-se numa situação de extrema

pobreza e de debilitação dos seus

direitos básicos humanos. É imperativo

refletir sobre como estas mulheres são

as principais vitimas do colonialismo

e do conflito armado que se seguiu à

independência angolana.

O desenvolvimento de uma

nação, inicialmente, era apenas

visto como um desenvolvimento

económico, descartando-se

de forma sistemática todos os

fenómenos humanos, sociais,

políticos e ambientais, nesta

amalgama daquilo que se

considera o desenvolver de

um país. Neste sentido, Maria

Idalina de Oliveira Valente

explica como a situação da

mulher angolana deve ser vista

à luz de um desenvolvimento

que engloba a pobreza, a

fome, os recursos humanos, as

instituições e o meio ambiente,

aliado a um contexto histórico e

político, bastante marcado pela

colonização e pela guerra civil.

minas de ouro, diamantes e cobre. Relativamente

aos sistemas jurídicos relativos ao colonialismo,

as mulheres estavam em desvantagem, uma vez

que foram estabelecidas leis “consuetudinárias”

(fundadas nos usos ou costumes).

Assim, algumas mulheres mudaramse

para as novas comunidades urbanas em

desenvolvimento, em busca de oportunidades.

A atividade política précolonial

das mulheres foi geralmente

ignorada pelas autoridades coloniais que se

focaram exclusivamente nos homens quando

estabeleceram gabinetes políticos locais.

Em muitas partes da África

Ocidental, as mulheres eram membros de

associações dirigidas por e para as mulheres, o

que dava às mesmas a última palavra nas disputas

sobre mercados ou agricultura. No entanto,

os agentes coloniais, quase sempre homens,

ignoraram essa realidade.

Assim, seguiram-se os anos de

colonialismo mais intenso, com o progresso da

guerra quando os europeus tentaram impor o seu

próprio controlo político sobre África.

Nos anos 50 e início dos anos 60, as

mulheres estiveram envolvidas na independência

das nações africanas de diversas formas. Contudo,

o trabalho das mulheres durante o período colonial

sofreu de diversas formas: as mulheres perderam o

poder e a autonomia económica, foram excluídas

do mercado global, desenvolveram trabalho não

remunerado, entre outros.

As mulheres continuaram o seu

trabalho de cultivo de alimentos para consumo

familiar, enquanto os homens ganhavam salários

trabalhando em plantações de chá e algodão,

A globalização e as

intensas migrações como consequência

da guerra civil angolana, vieram

acentuar a feminização da pobreza em

angola, tendo consequências agravantes

como a alta taxa de analfabetismo

de 58%, dos quais 75% são mulheres,

levando ao desemprego, à prostituição

e à desintegração de famílias.

É alarmante como a

situação da mulher rural e da mulher

urbana é completamente dispare, sendo

que pobreza atinge maioritariamente

o primeiro grupo de mulheres. A falta

de acesso a água potável (cerca de

65% da população não o tem), o não

acesso a saneamento básico (75% da


“As mulheres estavam em

desvantagem, uma vez que

foram estabelecidas leis (...)

baseadas em testemunhos

masculinos que deram

aos homens”

- Kathleen Sheldon

Decolonizing Women

por Rachael Hill

Embora frequentemente negligenciadas, as mulheres

desempenharam um papel importante na luta anti-colonial.

As mulheres não aparecem muito nos registos oficiais

da época porque estavam proibidas de participar no

governo ou nos negócios. Em alguns casos, os governantes

coloniais forçaram as mulheres a viver como os europeus

pensavam que estas deveriam: como mães, esposas e donas

de casa, sendo que não eram oficialmente autorizadas a

desempenhar quaisquer papéis fora de casa durante o

domínio colonial. Deste modo, pode-se confirmar com

certidão que estas sofreram mais sob o domínio colonial do

que os homens.

Apesar da sua ausência na grande maioria dos registos da

época, as mulheres desempenharam papéis importantes

nas lutas armadas pela independência contra os

colonizadores europeus.

Luta pela Independência

I. Nigéria

As comunidades do Sudeste da Nigéria eram,

anteriormente, dirigidas por grupos de homens e mulheres em vez de

líderes singulares. Contudo, os ocupantes coloniais apenas permitiam

“chefes” masculinos.

Antes do colonialismo, em muitas sociedades da

África Ocidental, as mulheres cultivavam e participavam nos negócios

locais e, por isso, estas tiveram de batalhar para ganhar dinheiro sob

o domínio colonial. Apesar do pouco reconhecimento recebido, as

mulheres ajudaram a produzir culturas importantes como o óleo de

palma nas sociedades Igbo e o cacau nas sociedades Yoruba. Todavia,

os colonialistas britânicos apenas permitiram o conceito de propriedade

individual de terras na Nigéria aos homens, deste modo, as mulheres

tiveram dificuldade em ganhar dinheiro com estas importantes culturas

de rendimento.

Diversos grupos como a Associação de Mulheres

do Mercado (liderada por Alimotu Pelewura) e a União de Mulheres

Abeokuta (liderada por Funmilayo Ransome-Kuti), insistiram nos direitos

das mulheres e ajudaram a difundir um sentimento de nacionalismo que

acabou por levar a Nigéria a conquistar a independência em relação aos

britânicos. Infelizmente, os líderes masculinos nigerianos não apoiaram os

Juliana Jordão com os filhos

direitos da mulher e minimizaram o papel da mulher na conquista

da independência.

IV. Cabo-Verde

No contexto cabo-verdiano, a partir de uma análise

etnográfica dos efeitos do passado colonial pormenorizada,

maioritariamente, nos valores e nas práticas contemporâneas relativos ao

universo doméstico, apercebemo-nos do duplo desafio que as mulheres

cabo-verdianas enfrentam hoje na constituição das suas famílias:

1: Necessitam lidar com um contexto marcado por

múltiplos constrangimentos, que envolvem a carência de recursos

materiais, os impactos do intenso fluxo migratório no país e a violência

baseada no género.

2: Precisam lidar com os reflexos atuais de uma

moralidade colonial que procurava balizar as relações no interior das

famílias. A noção de uma “família saudável”, nuclear, monogâmica e

patriarcal (herdada do colonialismo e reproduzida pelas instituições

que determinam hoje as políticas públicas em Cabo Verde) precisa

ser considerada por essas mulheres na construção dos seus projetos

pessoais, à medida que evitam os julgamentos socialmente elaborados.

Navegando entre os seus desejos pessoais, os discursos que consolidam

um modelo ideal de família e as condições concretas de existência, essas

mulheres revelam um quotidiano muito mais dinâmico e ambíguo a contextualizar

os projetos de vida familiar.

Militantes do Partido Panteras Negras

Os Colonos

Alamy Photos

A Descolonização de Angola

e o retorno dos Nacionais:

Uma Perspectiva Histórica Pós-Colonial

por Carolina Peixoto

Dentro das colónias, existia uma

ideia do “colono perfeito”, este seria aquele que

garantisse a permanência da soberania lusa nos

territórios ultramarinos.

Na época, o modelo tido como

o ideal era a de um colono saudável, robusto e

relativamente jovem para suportar o clima dos

ambientes tropicais mais hostis. As mulheres,

desde que possuíssem boa resistência física, eram

vistas como elementos essenciais à colonização

porque da sua presença dependia a manutenção

da dignidade dos colonos em África, o afastamento

de todas as tentações e vícios imorais que

conduzia à reprodução da família cristã.

O colono devia, pelo menos,

saber ler e escrever e ter um ofício e os colonos

enviados para Angola e Moçambique tinham

baixas qualificações escolares e profissionais.

Os territórios coloniais ofereciam

oportunidades acrescidas aos naturais da

metrópole baseado na exploração de mão-de-obra

local e à própria estrutura social construída com

base em fortes barreiras raciais que protegiam

os colonos e lhes garan tiam um estatuto e um

prestígio inquestionáveis.

Nas colónias de povoamento

na África, a segregação racial separava “nãobrancos”

de brancos

em quase todas as

esferas da vida pública

e privada. Assim,

Portugal estabeleceu

um sistema legal e

jurídico baseado em

hierarquias raciais

e “civilizacionais”

no “Estatuto do

Indigenato”, que

excluía as populações

indígenas dos

direitos de voto

e representação,

destinados a proteger

o caráter racial e culturalmente branco da

população de colonos.

Descolonização das colónias

portuguesas em África

Durante muito tempo os

colonizados dirigiram os seus esforços à supressão

das injustiças sofridas como o trabalho forçado, as

sanções corporais, a desigualdade nos salários, as

limitações dos direitos políticos, entre outros.

Até aos anos 50, europeus

tomaram como objetivo máximo a missão

civilizadora, dando impulso à consciencialização

social, cultural e política sob novos moldes onde

poucos negros e mestiços que conseguiram ter

acesso à educação.

Posteriormente, os movimentos

nacionalistas surgiram e afirmaram-se como portavozes

das aspirações dos povos indígenas das

colónias portuguesas. Os organizadores destes

movimentos, mostraram-se relutantes em assumir

uma atitude mais pró-ativa no que dizia respeito

às divisões transversais como as que passavam

pelos fatores de classe, diferença de gé- nero,

etnicidade, sexualidade, religião, entre outros.

O principal objetivo ds colonos

era a autonomia administrativa, participando,

assim, mais ativamen- te na condução dos seus

próprios destinos.

Em 1974, cerca de 330.000

brancos viviam em Angola. Isto constituía a

segunda maior população branca do continente

africano e os brancos dominavam quase

totalmente a infraestrutura da agricultura, dos

transportes e da administração.

Os “imigrantes da descolonização”

que aparentavam evidências de parentesco com

africanos negros foram mantidos de forma muito

visível e marcadamente na sociedade portuguesa

como “racialmente outros”. A sua identidade foi

assim involuntariamente reescrita conforme uma

concepção da identidade nacional portuguesa

na qual raça, nação e cada vez mais a localização

podiam ser vistas como coincidentes.



século XV

Chegada dos Portugueses ao Brasil 1501

Chegada dos Portugueses a Macau 1557

Portugueses em Angola 1574

Primeiros escravos negros nos EUA 1581

Fundação da East Indian Company 1600

Ingleses em Barbados 1605

Franceses em Guadalupe e Martinica 1635

Franceses no Senegal 1637

século XVIII

Início de revoluções na América Latina 1801

Independência do Brasil 1822

Franceses ocupam a Argélia 1830

Inauguração do Canal Suez 1869

Conferência de Berlim:

divisão de África mapa cor-de-rosa 1884

Início da ideologia do imperialismo 1884

Abolição da Escravatura no Brasil 1888

Revolta de Ribeirão Manuel 1910

Estatuto do Indígena 1921

Entra em vigor o Acto Colonial 1930

Exposição Colonial de Paris 1932

Exposição Colonial do Porto 1934

Prisioneiros Políticos partem para Tarrafal 1936

Portugal altera a designação

de “colónia” para “província ultramarina” 1946

Guiné torna-se uma ameaça islâmica 1950

Massacre de Batepá 1953

Ocupação de Nagar Haveli e Dadra,

União da índia 1954

Massacres UPA, Angola 1961

India recupera territórios

tomados pelos Portugueses 1961

Independências no Continente

Africano: Argélia 1962

Organização de Unidade

Africana (OUA) Etiópa 1963

“Guiné é Portugal” propaganda 1965

Destacamento Feminino 1966

Declaração Unilateral de Guiné-Bissau 1973-1975

Revolução dos Cravos de Abril 1974

Independência de Guiné-Bissau 1974

Independência de Moçambique,

Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, e Angola 1975

FRETILIN proclama independência de Timor 1975

Primeiras Eleições Livres

em Portugal após 50 anos 1975

Guerra Civil Moçambique 1976-1992

MULEIDE (Primeira organização de defesa

de direitos humanos em Moçambique) 1991

Fim do Apartheid na África do Sul 1994

século XXI

1419 Portugueses na Madeira

1434 Reconhecimento da Costa Africana

1445 Chegada a Cabo Verde

1446 Portugueses chegam à Costa da Guiné

1465 Primeiros desenvolvimentos extensivos

do mercado de escravos

1471-72 Portugueses chegam a São Tomé

1482 Diogo Cão chega a Angola

1492 Cristovão Colombo nas Caraíbas

1494 Tratado de Tordesilhas (Divisão do

Mundo entre Espanha e Portugal)

1498 Vasco da Gama em Moçambique a

caminho da Índia

século XVI

século XVII

1778 Independência dos EUA

século XIX

século XX

2002 União Africana Etiópia

2003 Protocolo de Maputo

2006 Fórum Feminista Africano Gana

278-279 all I’m askin’ is for a little

respect when you

come home

Carta Africana dos Direitos

dos Humanos e dos Povos

Carta Banjul

Artigo 3º

1. Todas as

pessoas beneficiam de uma total

igualdade perante a lei.

Os Direitos da Mulher Africana

(Na Atualidade)

“Respect” é uma canção escrita por Otis Redding

como forma de pedir respeito e reconhecimento

a uma mulher, contudo, em 1967, Aretha Franklin

reverteu os papéis e fez a sua própria versão. Esta segunda

interpretação foi considerada uma das canções que moldou

os anos 60 e tornou-se uma marca do movimento feminista.

De que forma variam as legislações à volta do globo?

Serão os direitos humanos das mulheres distintos

de país para país?

Estarão estes sequer assegurados?

Artigo 6º

Melinda Gates, co-presidente da Fundação Bill & Melinda

Gates, desenvolveu uma pesquisa acerca da situação

económica vivida em África abordando, especificamente,

as mulheres africanas. Esta defende a adoção de políticas

públicas no continente africano com o intuito de promover

a redução da carga de trabalho doméstico das mulheres

para que possam produzir mais no campo.

O Produto Interno Bruto (ou PIB que representa a soma

de todos os bens e serviços finais produzidos numa determinada região,

durante um período de tempo; este tem como objetivo quantificar a

atividade económica de uma região) de África cresce mais rápido que

o de qualquer outro continente. Quando se pensa acerca dos motores

Conferência dos Chefes de

Estado e de Governo relativa à

elaboração de um anteprojeto

de Carta Africana dos Direitos

Humanos e dos Povos, prevendo

nomeadamente a instituição

de órgãos de promoção e de

proteção dos Direitos Humanos

e dos Povos.

Esta tinha como

principal objetivo intensificar a

cooperação e os esforços para

oferecer melhores condições

de existência aos povos de

África e favorecer a cooperação

internacional tendo devida

atenção à Carta das Nações

Unidas e a Declaração Universal

dos Direitos Humanos.

A Carta de Banjul

indica a determinação em ir ao

encontro de práticas sociais

mais equilitárias, tendo sempre

em conta as virtudes das

tradições históricas e os valores

da civilização africana que

inspiram e caracterizam as suas

reflexões sobre a conceção dos

direitos humanos e dos povos.

Todo indivíduo

tem direito à liberdade. Ninguém

pode ser privado da sua

liberdade.

Artigo 19º

Todos os povos

são iguais, gozam da mesma

dignidade e têm os mesmos

direitos.

A Carta de Banjul

foi aprovada pela Conferência

Ministerial da Organização da

Unidade Africana (OUA) em

Banjul, Gâmbia, em janeiro

de 1981.

A 27 de julho

de 1981, foi adotada pela

XVIII Assembleia dos Chefes

de Estado e Governo da

Organização da Unidade Africana

(OUA) em Nairóbi, Quênia.

De 17 a 20

de julho de 1979, deu-se a

Redução da desigualdade de género na agricultura africana

por Melinda Gates

que impulsionam esse crescimento, Gates relaciona-o com as comódites

(produtos de qualidade e características uniformes, o seu preço é

determinado pela oferta e procura internacional) como o petróleo, o

ouro e o cacau, ou talvez as indústrias, como bancos e telecomunicações.

Melinda Gates passa muito do seu tempo em busca

de entendimento nas diversas formas através das quais as mulheres e

meninas conduzem o desenvolvimento adiante como, por exemplo, o

investimento na nutrição dos seus filhos, na saúde básica, na educação ou

pelo trabalho agrícola.

Através do “Project Syndicate” esta concluiu que, para

África colocar em prática uma transformação agrícola, os países do

continente terão de remover uma das suas maiores barreiras que os

atrasa e limita: a desigualdade entre homens e mulheres.



Guia para proteger os direitos

das africanas em tempos de Covid-19

de ONU News

O Escritório de Direitos Humanos da

ONU em parceria com a organização

regional para proteger as mulheres

desenvolveu sete novas ações em

que as mulheres e meninas africanas

são o público alvo. Esta inciativa das

Nações Unidas com a União Africana

tencionam promover os direitos

das mulheres durante a pandemia e

combater a discriminação.

74% das mulheres africanas

atuam na economia informal e, deste modo,

estão a ser fortemente afetadas pelas medidas

de ação da pandemia. Durante os surtos de

ebola e zika, foi concebido um guia semelhante

com o objetivo de aliviar o impacto a curto e

longo prazo sobre mulheres e meninas, que são

frequentemente mais atingidas pelo vírus.

Segundo o guia, os países devem

incluir a autonomia económica das mulheres

nas suas medidas e políticas com o objetivo de

mitigar as consequências da pandemia e, assim,

fazer com que as mulheres do setor informal

recebam assistência financeira.

É importante destacar que as

mulheres correm maior risco de contaminação,

visto que, 70% dos trabalhadores da saúde e da

assistência social são do sexo feminino.

Este guia recomenda ações

em áreas como o acesso ao alimento, água e

saneamento, a processos decisórios, coleta de

dados e informação e situação humanitária.

Este guia, ramificado em sete

ações, mostrou-se crucial na proteção e

empoderamento das mulheres africanas nesta

situação pandémica em que nos encontramos.

É necessário entregar a atenção devida

em torno deste tema de forma a alcançar

progresso e salvaguardar as mulheres africanas

neste momento de crise.

Marc Veraart

“É preciso estimular o acesso das mulheres ao mercado.”

- Melinda Gates, Project Syndicate, 2014

O Comité da ONU e os direitos

das mulheres em Angola

de ONU News

conhecer melhor o plano executivo de

combate à violência doméstica do país e

saber como este incentiva as mulheres

a denunciarem atos de violência.

A acusação dos

agressores e a proteção às vítimas (seja

esta através de apoio legal, médico e/ou

psicológico) são duas medidas essenciais

e que devem estar sempre asseguradas.

Foi ainda solicitado ao

governo angolano que este fornecesse

mais estatísticas sobre o número de

casos relatados à polícia que poderá

resultar numa melhor gestão dos

processos judiciais. O mesmo tipo de

informação foi pedido para o tráfico

humano e exploração de prostituição.

Em 2019, O Comité das Nações

Unidas para a Eliminação

da Discriminação contra as

Mulheres (CEDAW) tomou

como prioridade a situação dos

direitos das mulheres em Angola.

Foram levantadas

diversas questões acerca do tema

como, por exemplo, quais as

medidas tomadas para adotar uma

lei antidiscriminação abrangente que

contenha uma proibição explícita

de discriminação com base no sexo.

Outra questão solicitada foi acerca da

definição de discriminação contra as

mulheres de forma direta e indireta nas

esferas pública e privada.

II. Participação na Política

I. Violência de Género

O Comité das

Nações Unidas para a Eliminação da

Discriminação contra as Mulheres

aponta que, apesar da Lei dos Partidos

Políticos exigir que as mulheres

representem pelo menos 30% dos

candidatos das eleições gerais, o

número de mulheres em cargos eletivos

permanece baixo. Deste modo, foram

solicitadas explicações quanto à queda

da presença feminina no Parlamento

de 38,2% para 26,5% e, os integrantes

do comité, procuraram saber quais

as medidas tomadas ou previstas

para acelerar a participação plena e

igualitária das mulheres nos cargos de

decisão na vida política e pública.

A assembleia de A

assembleia de especialistas pretendeu

Erica Deeman


entre a invisibilidade e a visibilidade da mulher designer...

é imperativo desmascarar a misoginia na

história do design.

Refletir acerca da sociedade e das

suas nuances é pensar em e com

design surgindo, assim, um conjunto

de vídeo-conversas de mulheres que

pensam acerca desta área. Desta

forma, Isabel Duarte, mulher designer

e investigadora, incita-nos a olhar para

a história da nossa prática subordinada

ao contexto português, fazendonos

questionar: É a mulher designer

esquecida ou negligenciada?

É nos dito que o bom designer

é invisível, contudo, a história está inundada

de homens designers que são aclamados

mundialmente pelo seu génio e inovação...

O mesmo não se aplica à mulher designer.

Na História traçada para

favorecer homens, a mulher não tem lugar.

Nesta perspetiva, a mulher no design é, muitas

vezes, considerada “à quem” da sua habilidade,

uma peça “solta” que vive à sombra do

masculino, forçada, assim, a ser invisível.

A mulher designer NÃO É

esquecida, a sua prática nunca foi reconhecida,

mas antes seletivamente omitida e ignorada.

A rara menção da mulher na história do design

restringe-a a um grupo limitado de figuras

despidas da sua humanidade em que o génio é

avaliado em detrimento dos cânones masculinos.

Maria Keil realizou uma obra vasta e diversificada que abrange diversas áreas, entre elas

o design gráfico e de mobiliário. Esta é uma das mulheres apresentadas por Isabel Duarte

no seu projeto ERRATA que se materializa numa revisão feminista à história do

design gráfico português.

Isabel Duarte expõe esta

mesma problemática, assegurando que todas

as mulheres conhecidas historicamente não

representam a totalidade das mesmas nesta

prática e que muita herança visual que nos foi

deixada não é do nosso conhecimento.

Reforça-se, ainda, a ideia

da inúmera quantidade de mulheres que

estiveram em frente de estúdios e projetos,

revolucionando a forma de pensar e ver,

todavía, nunca serão estas aclamadas,

abordadas ou sequer notadas. Por isto mesmo,

é obrigatório e urgente repensar e reescrever

a história do design, trazendo à luz todos os

nomes femininos que foram negligenciados

e não esquecidos. Fazendo justiça a estas

mesmas mulheres, podemos avançar para uma

sociedade mais transparente e igualitária onde

o bom design é desprovido de género.

“O feminismo reconhece a desigualdade

das mulheres no passado e não a

continua no futuro.”

- Isabel Duarte

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!