A ORIGEM NACIONALISTA DO AMBIENTALISMO BRASILEIRO
Descreve a como o ambientalismo brasileiro se desenvolveu a partir de uma visão nacionalista
Descreve a como o ambientalismo brasileiro se desenvolveu a partir de uma visão nacionalista
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A ORIGEM NACIONALISTA DO AMBIENTALISMO NO BRASIL
Ivomar Schuler da Costa – Instituto Federalista
04/03/2023 – ivomarcosta@gmail.com ou vp@if.org.br
Na atualidade, acredita-se que a proteção ao meio-ambiente natural seja uma
agenda da esquerda. Como sabemos, a quase totalidade da esquerda é de matriz
antinacionalista. Todo o discurso ambiental extremista e globalista atual tem um tom
esquerdizante, a tal ponto que até quem é “de Direita” crê piamente que é impossível a
vinculação das pautas ecológicas com o Conservadorismo. No entanto, isso é um
engano. É verdade que nos Estados Unidos, por conta da influência das filosofias
românticas e transcendentalistas, os “liberais”, que são os atuais “democratas” foram os
que com mais força e destaque defenderam politicas conservativistas 1 , fundando os
primeiros parques e reservas naturais. Mas no Brasil, no inicio da emergência da
consciência ambientalista, esta esteve ligada ao nacionalismo.
Acredito que José Bonifácio tenha sido um dos primeiros brasileiros a se
preocupar com o meio-ambiente natural. Isso é compreensível, tendo em vista a
formação em geologia e mineralogia do santista. Suas ideias acerca da necessidade de
conservação dos nossos recursos naturais estão nos seus escritos.
No mesmo século em que viveu Bonifácio, e na mesma cidade onde passou
alguns anos, quando teve forte atuação política, os primeiros indícios de que o meioambiente
estava sendo maltratado começaram a aparecer. Os cursos d’água que
abasteciam a então capital começaram a lentamente desaparecer. Devido ao lento
desmatamento das encostas do maciço da Tijuca nos séculos anteriores, as nascentes
pareciam estar se rebelando e deixando de entregar a água de que tanto necessitava a
cidade para viver.
Nas primeiras décadas do Século XX, começa a despertar a consciência
ecológica. Em 1913 o botânico Alberto Loefgren inicia o trabalho para a criação do
Parque Nacional do Itatiaia 2 , na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e de Minas
Gerais. Em 1931 o botânico Alberto Sampaio fundou a “Sociedade dos Amigos das
Árvores”. No ano de 1933 foi realizada a primeira reunião nacional visando à discussão
de políticas de proteção ao “patrimônio natural”. O título desta importante reunião foi
*“Primeira Conferência Brasileira de Proteção à Natureza”*. Ela tinha um conjunto de
pautas amplas para a época, demonstrando que a consciência abrangia tanto o meio-
1 O termo “conservativista” é utilizado aqui para evitar confusões semânticas, tendo em vista que aqueles
que lutavam pelo meio-ambiente natural nos EUA, no Século XIX, dividiram-se em duas correntes, uma
era “preservacionista” e a outra “Conservacionista”. Estes viam o meio-ambiente natural como um
recurso econômico que poderia ser utilizado com os devidos cuidados, enquanto os preservacionistas não
admitiam esta hipótese.
2 Tive a oportunidade de escalar o Pico das Agulhas Negras, no alto da Serra do Itatiaia e realizar uma
travessia de quatro dias pela Serra do Mar, em 1986, compondo uma equipe de escaladores militares do
antigo Destacamento de Precursores Paraquedistas, da Brigada de Infantaria Paraquedista do Exército
brasileiro. A equipe foi comandada pelo então Tenente José Luiz Lisboa Neiva, e era composta pelos
Sargentos Adair Teixeira, Ribeiro e Cabo Ivomar Schuler da Costa. O objetivo da missão era conhecer a
região e abrir rotas para posterior treinamento de outras equipes de escaladores do Destacamento de
Precursores.
ambiente natural como outros aspectos que envolviam a cultura nacional, sendo
estendida até o cuidado com os recursos necessários ao desenvolvimento do país e da
qualidade de vida da população, para usar expressões correntes na atualidade, pois
buscava “a defesa da flora, fauna, sítios de monumentos naturais, em suma, a proteção e
o melhoramento das fontes de vida no Brasil”.
Necessário lembrar que no inicio do século, juntamente com o desaparecimento
das nascentes na Cidade do Rio de Janeiro, o norte do Paraná era alvo de uma super
exploração madeireira que, se por um lado permitiu a ocupação de extensas áreas do
Brasil que permaneciam desocupadas, ao mesmo tempo em que ofereceu os recursos
econômicos necessários a este avanço sobre o sertão paranaense, também reduziu de
forma exagerada a cobertura vegetal, sobretudo a árvore mais comum naquela região e
que deu nome a capital paranaense 3 , a Araucária, cujo nome científico é Araucária
angustifólia, o pinheiro-do-paraná. Talvez tenha sido esta a motivação da “Sociedade
Protetora das Árvores” tê-la escolhido como símbolo.
Embora a extensão dos temas daquela primeira conferência ambientalista
brasileira, o ponto de convergência das suas preocupações, sem dúvida foi a
conservação do meio-ambiente natural. O Brasil, nas primeiras décadas, vivia ainda um
ciclo econômico extrativista e agropastoril. Mais de oitenta por cento da população
vivia na área rural, encontrando ocupação em atividades campesinas. Em algumas áreas
do imenso território brasileiro, cuja economia era dependente da exportação de produtos
extrativistas e agrícolas, o avanço indiscriminado e descuidado fazia despertar a atenção
daqueles que sabiam da importância de ordenar adequadamente tais atividades.
Não se pode esperar que ha quase um século uma entidade conservacionista
conseguisse o mesmo nível de adesão às suas propostas que hoje os movimentos
ambientalistas radicais atingem. Ainda assim, podemos dizer que aqueles pioneiros
foram completamente exitosos, pois daquela primeira conferência em 1933, eles
geraram ideias que contribuíram significativamente para a elaboração do primeiro
Código Florestal, em 1934. Essa vitória se tornou ainda mais gloriosa no ano de 1937,
quando por um Decreto Federal era criado o Parque Nacional de Itatiaia, cuja semente
havia sido lançada mais de uma década antes. Em 1939 os esforços desses pioneiros
haviam sido coroados com outras vitórias, a criação do Parque Nacional da Serra dos
Órgãos, também no Estado do Rio de Janeiro, e o Parque Nacional das Cataratas do
Iguaçu, no Paraná.
Pode-se afirmar com certeza que Conservacionismo e Nacionalismo foram os
gametas geradores do ambientalismo brasileiro. Enquanto o conservacionismo não
encontrou o seu epítome em nenhuma figura individual, o nacionalismo encontrou o seu
no jornalista, bacharel em Direito e político Alberto de Seixas Martins Torres (1865-
1917). De fato, Alberto Torres foi um pensador social brasileiro preocupado com
questões da unidade nacional e da organização social brasileira. Suas ideias foram
importantes para a solidificação do nacionalismo brasileiro, pois ele não somente
pensou, em termos teóricos, como também foi capaz de elaborar programas de
organização da nação. Suas análises dos problemas nacionais eram profundas. Devido a
isso, inspirou uma geração inteira de nacionalistas. O interessante é que tanto os de
esquerda como os de direita foram influenciados por ele. Alguns expoentes são o
integralista Plínio Salgado; o militar, professor, escritor, colunista e historiador
brasileiro e marxista, Nelson Werneck Sodré, falecido em 1999; o professor, jurista,
historiador e sociólogo brasileiro, Francisco José de Oliveira Viana, falecido em 1951.
3 Curitiba é uma corruptela do nome indígena Koré-atuba, que significa “Terra dos Pinhais”.
Oliveira Viana caracterizou-se por ser o primeiro a tratar no Brasil a sociologia
sistematicamente. Ele foi o responsável por grande parte da sistematização das Ciências
Sociais brasileiras e considerado o sucessor de Alberto Torres em decorrência da sua
famosa obra, “Populações Meridionais do Brasil”.
Alberto Torres ocupou os seguintes cargos: Ministro da Justiça e Negócios
Interiores do Brasil, de 30 (trinta) de agosto de 1896 a 07 (sete) de janeiro de 1897;
Presidente do estado do Rio de Janeiro, de 31 (trinta e um) de dezembro de 1897 a 31
(trinta e um) de dezembro de 1900; Ministro do Supremo Tribunal Federal, de 18
(dezoito) de maio de 1901 a 18 (dezoito) de setembro de 1909.
A despeito de encontrar-se em um país periférico, o pensamento de Alberto
Torres tinha algo de original, pois em um momento em que as teorias socialistas
estavam em ascensão no mundo, devido à sua crescente aceitação, refutava as suas
teses. Mas, por outro lado, refutava as teses opostas, as do “individualismo”. Ele
considerava ambas, se vistas de uma perspectiva exclusivista, como impróprias à nossa
realidade e se aplicadas, poderiam provocar a desagregação da nossa sociedade. Por esta
razão, segundo ele, os problemas brasileiros somente poderiam ser efetivamente
solucionados se a sociedade fosse bem estudada e compreendida. O conhecimento da
nossa realidade social, os fatores que a mantinham unida, seria uma condição sine qua
non para a apresentação de medidas pragmáticas. De certa forma, Alberto Torres
manifestava a sua orientação positivista. Contudo, o intelectual nacionalista não se
deixou influenciar pelas doutrinas raciais e eugênicas que circulavam nos meios
acadêmicos, médicos e políticos àquela época.
As principais obras do pensador brasileiro são: “O Problema Nacional
Brasileiro”, “A Organização Nacional” e “As Fontes da Vida no Brasil”. As duas
primeiras foram compostas a partir de séries de artigos publicados na “Gazeta de
Noticias” e no “Jornal do Comércio”. Os artigos publicados entre 1910 e 1911
formaram “A Organização Nacional”, que foi a lume em 1914. Aqueles publicados no
Jornal do Comércio em 1912, acrescido de um discurso proferido no Instituto Histórico
e Geográfico em 1911, formaram a obra “O Problema Nacional Brasileiro”,
Um fato interessante é que Alberto Torres foi o primeiro a mencionar no Direito
Brasileiro o remédio constitucional conhecido como “Mandado de Segurança”, cujo
objetivo é fazer respeitar sob o modo preventivo os direitos individuais ou coletivos,
públicos ou privados, quando estes forem lesados pelo Estado.
A temática de Alberto Torres era bem ampla, porquanto a natureza do problema
que se propunha estudar também o era. Consciente da importância do processo
diferenciado de formação das sociedades que haviam sido colônias as estudou com
profundidade; criticou as teorias raciais e eugênicas da sua época, e não deixou passar
em branco as mudanças modernizantes que estas sociedades estavam sofrendo, o que
alterava as condições políticas destas. Sendo um arguto sociólogo e um competente
jurista, percebeu que a solução de parte dos problemas exigiria uma nova constituição.
A convergência das ideias conservacionistas dos cientistas brasileiros, entre os
quais se destacavam os botânicos, e do nacionalismo de Alberto Torres se deu na
necessidade de manter a independência da nação. Para tanto, em pensamento, ambos
concordavam que havia necessidade de cuidar com atenção de “os órgãos vitais da
nacionalidade, entre eles seus principais recursos”. Podemos perceber nesta expressão
a linha de pensamento que considerava o meio-ambiente não como um aspecto a ser
mantido exclusivamente para contemplação, no melhor sentido do romantismo alemão,
mas sim como um recurso econômico, não, porém, exclusivamente. A conjunção de
interesses, de ideais e de pensamentos nacionalistas e conservacionistas gerou o
movimento ambientalista brasileiro. Na sua origem, então, o movimento ambientalista
brasileiro não se caracterizava por nenhuma atitude extremista, como se apresenta
atualmente, produzindo violência de todos os tipos, desonestidade intelectual,
perturbação social e desvios econômicos sob a falsa bandeira de um desenvolvimento
que tem por base uma suposta sustentabilidade. Sabemos que os movimentos surgem de
diversos pontos e em diversos momentos, e na medida em que se constroem os nexos
entre as ideias e interesses de cada grupo é que o movimento emerge. No inicio sempre
reina a informalidade, todavia, momento chega em que se manifesta a necessidade de
formalização do conjunto. Assim, em 1958, o Rio de Janeiro viu nascer a primeira
entidade ambientalista brasileira que conseguiu marcar sua identidade e presença em
nível nacional, a Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza (FBCN).
Tal fato desfaz a ideia equivocada, segundo a qual o ambientalismo seria assunto
promovido exclusivamente por globalistas, comunistas, esquerdistas de forma geral.
Sendo o meio-ambiente natural necessário a sobrevivência com dignidade das
populações, excluídos os seus sentidos extremistas aplicados por certas aquelas corrente
políticas citadas, e trazendo a claridade a raiz nacionalista do ambientalismo brasileiro,
é perfeitamente compreensível a importância de todos se interessarem por este tema.