a nova grande coisa
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a nova grande coisa
acontecendo no brasil
matheusa dos santos
1
inclui os poemas
búzio
pousar a coroa do mestre na cabeça do jaguar
honoris causa
siriá
arthur
sobre uma caixa #1
sobre uma caixa #2
24h são 10 a.m.
uma dúvida
boto cor-de-rosa
seu filho não te amou
cabeça rio
lygia clark
sem título #1
um dia quente
dieta
ramón
a nova grande coisa
acontecendo no brasil
matheusa dos santos
2
a palavra é um búzio
mais de mil entendimentos ela pode permitir
ainda assim há coisas que ficam folgadas
apertadas
cada poema é um oráculo
não importa a intenção
3
pousar a coroa do mestre na cabeça do jaguar
uma gota de orvalho
sal mineral
dentro da terra
molhada
enterrada
em antiga raiz
mayr aba esquisita
estrangeira
testemunha do tempo
troca de pele, ressuscita
rasteja no chão com peixes e pão
coloca ovos que nascem depois
e ascende
4
atravessa a porta funda
para em outro lugar, encruzilhada
se prepara, nunca foi embora
honoris causa
para minhas amigas e amigos
eu sou a nova grande coisa
que vai acontecer no brasil
é uma sensação engraçada
ser uma falange e corroer
com nossa doce timidez
o que ainda não é revolta
abandonar a modéstia
sentar no trono de ossos
hastear a preta bandeira de seda
fornicar meus nomes com a história
ao mesmo tempo esquecer
as contas de energia de 40$
baratas porque uso velas no quintal
caras porque dinheiro não é grama
5
a pessoa só se torna poeta
depois da morte só sobra a palavra
dita entre duas pautas de tilibra
explodida num canhão como tibira
honoris causa jurar dedicar a vida
a uma missão antes mesmo
de entender qual é ela afinal
siriá
quando conheci sua mãe ela dançava carimbó. eu aprendi que
cafezá era quando o povo plantava café, e siriá era o milagre dos
peixes saciando a fome na beira do rio. era o que ela parecia. um
siriá pro qual eu queria dançar,
arthur
domingo às 9 eu estava pronto
pra me entregar de vez pra ele
desiludido e sem alternativas
6
ele, solitária constante
eu, triste vendo homens condenados
mulheres mortas no meio da rua
chorando escravidão, transmutando
se eu chorar você vai entender?
domingo às 9 eu quis desistir
de ser eu e me tornar nós
convidá-lo para brindar a dor
do vinho dos espíritos
juntemos nossas taças
eu bebo, você bebe
sobre uma caixa
1
apresento todas maçanetas
mostro a rota segura pra fuga
todas mentiras e todas piruetas
que fiz com a verdade vais saber
nessa caixinha está a munição
inofensiva lista de defeitos curadoria
minha mesmo em pesquisa de anos
a mercê da tirania que virás a ter
boba seria se não esperasse sua fuga
se feito aeromoça não fizesse a dança
pra depois de tudo deixar seguro o lugar
onde vivo desde antes de sua aparição
2
pequeno agrado repousa na mesa de madeira
é uma caixa azul ciano dentro dela há um mistério
a mesa, em frente a uma janela desenha um degradê
e as cores que se organizam no céu são, também,
um mistério
7
o som da chuva, o cheiro da terra que ela molha
um homem barbudo que entra na sala e se senta
despe o rosto da máscara vermelha de papel machê
afofa o bumbum na cadeira e faz barulho
brinca de passar a caixa entre os dedos
as unhas limpas longas de tocar harpa
desiste de entregar o presente, leva a mão à boca e
aperta a caixa contra o rosto até que ela amasse
satisfeito com a meleca vira o assento para a janela
a chuva que re-começa a cair molha a terra e levanta
um cheiro diferente, ele observa e espera que com isso
torne-se ele também, um mistério
24 horas são 10 da manhã
saudades de medo daquilo
oferenda e serenata
bater na trave do peito: mús
culolembrete: não sou ela
me agradece um dia.
a mão de minha gêmea emerge
na lama do quintal & para você
é difícil de ver uma coisa
e enxergar outra em cima,
aceita quando ela tomar meu lugar
silenciosamente não vai entender
a terra não é plana, ela é curva e gira
o equinócio acontece em março e setembro
esse é o seu último ano nessa cidade
8
poderia dançar nua na praça
poderia roubar um banco e matar velhinhas
poderia quebrar o asfalto com martelo
plantar melancias e outras rasteiras
que ninguém vai lembrar
uma dúvida
é o som do pássaro
ou o som do iphone
tocando o despertar?
cheiro de alvorada
laranja, terra úmida
é uma máquina zunindo
ou um coração que bate
ainda bate procurando?
pergunto quem é,
ouço a resposta
não recebo de volta
a pergunta que fiz
morre o assunto
era só o pássaro
saltitando ao sol
9
boto cor-de-rosa
boto cor de rosa iara cantante
conchinha no bico do peito
um búzio aberto outro fechado
cantando com a iara
batendo palmas para ela
lençol de peixes azul prateado
cheiro de peixe azul prateado
uauaua iara canta
o boto seduz a moça eles vão
um dia talvez se abraçar
eu te protejo das cobras
não preciso não tenho medo
ousa desafiar o boto, sua sedução
ele chora chora
desmancha aquela pele
cor de rosa bebê começa a aparecer
10
seu filho não te amou
ele fugiu
diversas vezes você
não notou, mas ele
escapou dos seus braços
na noite fria e cigarros
onde buscou acalento
BEATNIK STYLE GANJAMAN
no corpo de alguns homens
encontrou dioniso,
& achou ele tedioso
mais do que isso, achou que
faria melhor que dioniso
fez da sua vida
o objetivo > ceticismo dionisíaco
um anjo uma auréola
uma ideia e uma taça de vinho
11
cabeça rio
por dentro sou uma vila
a primeira cidade na beira
do rio nilo do rio tebas
egito capítulo um
acordo, estamos em assembleia
por dentro da minha cabeça
rio ori ori rio
quem vou ser hoje?
ori rio rio ori
toda vez que a chuva evaporar
eu vou evaporar com a chuva
e quando eu evaporar quem vai
ficar aqui dentro?
12
lygia clark
seu maior drama é nunca ter tocado
no bicho de Lygia Clark odiava vitrine
odiava objetos que precisamos proteger
por causa de seus herdeiros e royalties
torós sutis: negociar, trair, quebrar
reorganizar uma prioridade
dela brotam três alternativas
escolher não é o seu forte
coloca nos stories sobre ioga
mas coloca também quantas carreiras
de pó foi necessário pra essa ruga
a arte vale tanto a pena assim?
13
sem título #1
momento agridoce puxa
da garganta um som
ou outro tique lembrando
pra ficar no presente
ao invés de ir pra lá
pra isso tem borracha
na outra ponta do lápis
fazer amizade é difícil
desfazer pior ainda:
fico sozinha
sangue não é só
vermelho por isso
é tão difícil matar
alguém e não ser
pega no pulo
a vida, um poema
cuja estrofe curta
encurta mais cada dia
é isso que espero
14
um dia quente
anos entram, me lembram: não sou eu
a dona do tempo, eu chamo seu vulto
se bruxaria fosse fácil, se fosse liceu
curso de tarô: 2 semanas você sabe tudo
faço planos assisto conforme desmanchar
é difícil manter palavra em dia de calor
a língua é macia, é fácil de queimar
com os chicletes promessa de ano novo
anos entram, me lembram: sim sou eu
linha que quebra uma curva nua rara
é difícil manter palavra em dia calor
quando da de fritar o sim no asfalto
nem precisa ser pra comer só pra ver
a crosta preta que faz na borda da letra
brincar com o sim, afogar o sim, tostar
os chicletes promessa de ano novo
15
o som do óleo chicoteando a letra contra
a frigideira chicoteando contra a bolha
explode encharca meu braço queima
dieta
para cada caixa de bolo,
você come dois ovos
para cada pacote de miojo,
um saquinho de glutamato
cada novo transgênico,
requer tão novo agrotóxico
para cada narina, um sopro de tsunu
problemas de açúcar pedem chá de amora
a goiabeira infestada de cupim dá fruto doce
eu sei, são onze da manhã, estou comendo
goiaba
16
ramón
do nada muito calor
imagino uma bandeira
preta naquele prédio
tu acabou de dar um tequinho
me ofereceu eu não quis
eu e davi competimos
quem mais fuma na festa
tira essa máscara, mostra
esse rosto. eu mostro
aqui o vexame é coletivo
no momento que o primeiro
lobo decidiu virar cachorro
começou gostar do ser humano
mais ainda de seus ossos
restos e carniça também
estou comemorando você
mesmo tendo chorado dias
desde que cobras tinham patas
desde que decidi não te amar
desde que convenci Eva
17
18