17.01.2013 Views

dissertação antonio edson deroma junior - Milton Campos

dissertação antonio edson deroma junior - Milton Campos

dissertação antonio edson deroma junior - Milton Campos

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

ANTÔNIO EDSON DEROMA JÚNIOR<br />

ADAPTAÇÃO DAS DISTORÇÕES DO AVAL<br />

À NOVA LEGISLAÇÃO<br />

NOVA LIMA - MG<br />

FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS<br />

2006


ANTÔNIO EDSON DEROMA JÚNIOR<br />

ADAPTAÇÃO DAS DISTORÇÕES DO AVAL<br />

À NOVA LEGISLAÇÃO<br />

Dissertação apresentada ao curso de Pós-<br />

Graduação Mestrado Stricto Sensu com área<br />

de concentração em Direito Empresarial da<br />

Faculdade de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>, como<br />

requisito obrigatório à obtenção do título de<br />

Mestre em Direito Empresarial.<br />

Orientador: Profº Dr. Wille Duarte Costa.<br />

NOVA LIMA - MG<br />

2006


D437 a<br />

Deroma Júnior, Antônio Edson<br />

Adaptação das distorções do aval à nova legislação/Deroma Júnior,<br />

Antônio Edson – Nova Lima: Faculdade de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>/FDMC,<br />

2006.<br />

96f., enc.<br />

Orientador: Prof. Wille Duarte Costa<br />

Dissertação (Mestrado) – Dissertação para obtenção do título de Mestre,<br />

área de concentração Direito Empresarial junto a Faculdade de Direito<br />

<strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>.<br />

Bibliografia: f. 93 – 96.<br />

1. Aval – legislação 2. Aval - distorções 3. Aval - adaptações I. Costa,<br />

Wille Duarte II. Faculdade de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong> III. Título.<br />

CDU 347.768


TERMO DE APROVAÇÃO<br />

A <strong>dissertação</strong> Adaptação das distorções do aval à nova legislação,<br />

elaborada pelo aluno ANTÔNIO EDSON DEROMA JÚNIOR, foi julgada adequada<br />

por todos os membros da Banca Examinadora, para a obtenção do título de Mestre<br />

em Direito Empresarial e ________________, em sua forma final, pela Faculdade<br />

de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>.<br />

Nova Lima, _____ de ____________de 2006.<br />

___________________________________________________<br />

Prof. Dr. Wille Duarte Costa<br />

Apresentada à Banca integrada pelos seguintes professores:<br />

__________________________________________________<br />

Prof(a). Dr(a).<br />

__________________________________________________<br />

Prof(a). Dr(a).<br />

__________________________________________________<br />

Prof(a). Dr(a).


“À minha mãe Carmem Deroma e meu pai Edson Deroma,<br />

que forneceram uma base sólida para as minhas<br />

conquistas.”<br />

“À minha querida esposa Nádia, pelo apoio incondicional e<br />

pelo incentivo constante em todas as etapas.”<br />

“Aos meus filhos, Neto, Henrique e Bernardo, alegria de<br />

nossas vidas.”


AGRADECIMENTOS<br />

Agradeço a Deus, por me conceder o privilégio da vida, e possibilitar a<br />

transformação dos meus sonhos em projetos, e estes em realizações.<br />

Ao meu orientador, Professor Wille Duarte Costa, profissional competente e<br />

dedicado, que acreditou em meu trabalho e me acolheu de forma carinhosa,<br />

tornando o desafio do mestrado mais agradável.<br />

A todos os professores da Faculdade <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>, pelo incentivo,<br />

profissionalismo e dedicação na coordenação local do mestrado.<br />

À Faculdade <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>, instituição que transformou meu trabalho num<br />

campo fértil para um aprendizado constante, numa perspectiva de cooperação<br />

enquanto prática vivenciada.<br />

Aos colegas de mestrado, que me acolheram, ajudaram e ensinaram, sempre,<br />

com muito carinho.<br />

trabalho.<br />

Aos amigos professores, pela valiosa contribuição à consecução deste<br />

A todos os que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste<br />

trabalho, transmitindo-me apoio e amizade.


RESUMO<br />

DEROMA JÚNIOR, Antônio Edson. Adaptação das distorções do aval à nova<br />

legislação. Nova Lima, 2006, 96 pp. Dissertação (Mestrado em Direito Empresarial)<br />

– Faculdade de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>.<br />

O foco deste estudo foi a análise das formas de distorções do aval face à<br />

nova legislação. Este objetivo evidencia o tipo de pesquisa realizada, que se<br />

caracteriza como sendo bibliográfica. O estudo inicia-se descrevendo os aspectos<br />

gerais dos títulos de créditos, sua origem histórica, conceitos, características e<br />

classificação. Também é contemplada a fiança, com ênfase nas principais<br />

abordagens e discussões sobre o tema. Em seguida, faz-se uma incursão sobre o<br />

aval, objeto deste estudo, o que foi importante para a pesquisa teórica. Em relação<br />

ao aval, constatou-se, com base em toda a referência conceitual, que é um instituto<br />

cambiário, caracterizado pela autonomia, liquidez, certeza e exigibilidade que adere<br />

ao título de crédito para garantir a obrigação cambiária por ele constituída. Ao se<br />

considerar as percepções dos autores pesquisados, conclui-se que o aval se<br />

estende, em última análise, como garantia de efetivação e realização do crédito, e<br />

que, a par do título de crédito, ele se revela como tutela de crédito, e se constrói no<br />

crédito como elemento que credita valor ao título. Por fim, pode-se concluir que o<br />

aval, em toda a dimensão das responsabilidades cambiais, é imprescindível para o<br />

equilíbrio das transações empresariais, não sendo visto como anacrônico, obsoleto<br />

ou ultrapassado.<br />

Palavras-chave: Distorções; Aval; Legislação.


ABSTRACT<br />

DEROMA JÚNIOR, Antônio Edson. Adaptation of the guarantee distortions to<br />

the new legislation. Nova Lima, 2006, 96 pages. Dissertation (Master Degree in<br />

Business Law) - Faculdade de Direito <strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>.<br />

This study is focused on analyzing the different kinds of guarantee distortions<br />

in face of the new legislation. This objective justifies the type of research performed,<br />

which is characterized as being bibliographic. The study starts by describing the<br />

general aspects of the securities, their historical bases, concepts, characteristics and<br />

classification. Surety is also contemplated, with an emphasis on the main approaches<br />

and debates on it. Following, it makes an incursion in the guarantee, its subject<br />

matter, which was important for the theoretical research. In relation to the guarantee,<br />

it was found, based on the conceptual background as a whole, that it is an exchange<br />

instrument characterized by the autonomy, liquidity, certainty and enforceability that it<br />

attaches to the security so as to guarantee the exchange obligation it constitutes. By<br />

considering the views of the researched writers, it was concluded that the guarantee<br />

ultimately extends itself as an assurance of effectiveness and realization of the credit,<br />

and that, apart from the security, it shows itself as a credit custody, and is inserted in<br />

credit as an element that provides value to the security. Last but not least, it was<br />

concluded that the guarantee, in the full range of exchange-related responsibilities, is<br />

essential for a balance in the business transactions, thus not being regarded as<br />

useless, obsolete or outdated.<br />

Key words: Distortions; Guarantee; Legislation.


SUMÁRIO<br />

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11<br />

2. ASPECTOS TEÓRICOS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO ........................................ 17<br />

2.1. Origem e evolução dos títulos de crédito............................................................. 17<br />

2.1.1. Período italiano................................................................................................. 19<br />

2.1.2. Período francês ................................................................................................ 20<br />

2.1.3. Período alemão ................................................................................................ 22<br />

2.1.4. Período moderno .............................................................................................. 23<br />

2.2. Conceituações de crédito .................................................................................... 27<br />

2.3. Importância e conceitos de título de crédito......................................................... 30<br />

2.4. Requisitos essenciais aos títulos de créditos....................................................... 34<br />

2.4.1. Cartularidade .................................................................................................... 35<br />

2.4.2. Literalidade ....................................................................................................... 36<br />

2.4.3. Autonomia......................................................................................................... 39<br />

3. PRESSUPOSTOS SOBRE FIANÇA...................................................................... 41<br />

3.1.1. Aspectos gerais e essências ............................................................................ 41<br />

4. AVAL ...................................................................................................................... 47<br />

4.1. Evolução histórica do aval ................................................................................... 47<br />

4.2. Conceito de aval .................................................................................................. 50<br />

4.3. Aval versus fiança................................................................................................ 52<br />

4.4. Formas de aval .................................................................................................... 57<br />

4.4.1. De obrigação nula............................................................................................. 57<br />

4.4.2. Parcial............................................................................................................... 57<br />

4.4.3. Simples e plural ................................................................................................ 58<br />

4.4.4. Incondicional..................................................................................................... 59<br />

4.4.5. Posterior ao vencimento ................................................................................... 59<br />

4.4.6. Simultâneos e sucessivos................................................................................. 60<br />

4.5. Abordagens sobre aval ....................................................................................... 62<br />

4.5.1. Aval antecipado ................................................................................................ 62


4.5.2. Aval em título em branco, incompleto ou futuro............................................... 63<br />

4.5.3. Cancelamento e extinção do aval..................................................................... 64<br />

4.5.4. Prescrição e protesto cambial........................................................................... 66<br />

4.5.5. O aval no cheque e na duplicata ...................................................................... 69<br />

4.5.6. O aval na falência............................................................................................. 72<br />

4.5.7. Aval e alienação fiduciária em garantia ........................................................... 74<br />

4.6. O avalista............................................................................................................. 76<br />

4.6.1. Quem pode ser avalista.................................................................................... 76<br />

4.6.2. Responsabilidade do avalista ........................................................................... 81<br />

4.6.3. Direitos do avalista............................................................................................ 83<br />

4.7. Aval e o Código Civil vigente ............................................................................... 85<br />

5. CONCLUSÃO......................................................................................................... 89<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 93


1. INTRODUÇÃO<br />

Desde os primórdios da evolução do comércio, o homem faz uso do aval. Se<br />

isso não fosse feito, a evolução econômica das civilizações estaria prejudicada ou<br />

mesmo inviabilizada. Diante das necessidades evolutivas das relações humanas<br />

nesse sentido, o Direito buscou desenvolver e instituir o aval.<br />

Para Rubens Requião, “o aval, que é uma instituição de Direito Cambial, tem<br />

como finalidade garantir o pagamento da letra de câmbio e da nota promissória, bem<br />

como de outros títulos (cheques e duplicatas) assimilados, em parte, aos cambiais.” 1<br />

Na prática dos negócios, o aval refere-se a qualquer classe de garantia<br />

pessoal. Outras vezes, utiliza-se como “sinônimo de fiança, pelo que seria o contrato<br />

pelo qual o avalista se obriga a pagar ou cumprir por um terceiro (avalizado), no<br />

caso de este não o fazer.” É reconhecido, muitas vezes, aproximado da fiança pela<br />

doutrina, em virtude da tradução portuguesa equivocada que fala em "pessoa<br />

afiançada", no art. 32 da Lei Uniforme de Genebra 2 (LUG), como lembrado por<br />

Rubens Requião. 3 No entanto, o aval tem características próprias. Dentre elas, o<br />

autor coloca que o prestador do aval pode ser acionado para pagar antes do<br />

avalizado, o que não ocorre na fiança, em que se estabelece, em princípio, o<br />

benefício de ordem. Além disso, no aval, o avalista não pode alegar, perante<br />

terceiros de boa fé, exceções pessoais que teria contra o avalizado. O contrário,<br />

porém, opera-se na fiança, em que é dado ao fiador alegar defesas pessoais contra<br />

o credor. É importante dizer que a fiança é uma obrigação essencialmente<br />

acessória, que não subsiste sem a obrigação principal, sendo que o aval é uma<br />

obrigação autônoma, cuja validade não é afetada por nenhuma outra obrigação<br />

cambiária, nem mesmo por aquela à qual é equiparada.<br />

Assim sendo, o aval, por se tratar de ato formal e autônomo, adquire<br />

independência com relação à obrigação principal. Trata-se de declaração unilateral<br />

cuja finalidade é garantir um título de crédito. É obrigação autônoma e literal, como<br />

toda cambial, e segue os princípios dos títulos de crédito.<br />

1 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 23 ed., v. 2. São Paulo: Saraiva, 2003, p.421-422.<br />

2 A LUG foi introduzida no Direito Brasileiro pelo Decreto nº 57.663, de 24 de janeiro de 1966, que<br />

promulgou as convenções para adoção de uma lei uniforme em matéria de letras de câmbio e notas<br />

promissórias.<br />

3 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 377.<br />

11


Neste prisma, o CC vigente veio regular "papéis outros" diversos dos títulos<br />

de crédito hoje existentes, e que continuarão a existir com a sua entrada em vigor.<br />

Assim, “alguns doutrinadores tratam como uma impropriedade do CC vigente ao<br />

intitular o seu Título VIII como dos títulos de crédito.” 4<br />

Com o CC vigente o título de crédito passa a integrar, formalmente, matéria<br />

de Direito Comercial. As divergências trazidas pelo novo ordenamento cível vêm<br />

causando muita polêmica entre “comercialistas”, críticas pelos doutrinadores e<br />

muitos equívocos de entendimento, sobretudo acerca da força impositiva do CC<br />

vigente.<br />

Desta forma, tanto as pessoas físicas como as jurídicas se obrigam nos títulos<br />

de crédito através das declarações cambiais. Enfatiza-se que entre essas<br />

declarações está o aval, garantia cambiária que coloca no mesmo nível obrigacional<br />

o seu dador e aquele que foi garantido, isto é, o avalista se obriga da mesma<br />

maneira que seu avalizado, estando a posição daquele definida no art. 32 da LUG.<br />

Conquanto já definida a posição do avalista, grande divergência doutrinária e<br />

jurisprudencial também subsiste no tocante ao aval.<br />

É nesse contexto que está inserido este estudo. Em matéria de aval, o<br />

mandamento do CC vigente de 2002 vem gerando maior polêmica no meio jurídico.<br />

É fundamental que as pessoas em geral, e os comerciantes em especial, estejam<br />

atentos para algumas alterações que foram introduzidas pelo CC vigente, que entrou<br />

em vigor em 11 de janeiro. Afinal, algumas mudanças foram substanciais e podem<br />

produzir efeitos nefastos sobre negócios que não as considerem. É o caso do aval.<br />

No geral, o CC vigente manteve a disciplina anterior: pode-se garantir por aval<br />

o pagamento de título de crédito, que contenha obrigação de pagar soma<br />

determinada, vedando expressamente o aval parcial; assim, ou o avalista garante a<br />

totalidade do crédito, ou nada garante. O aval parcial, anotado na cártula,<br />

desobedece à lei, sendo considerado nulo (ART. 166, VII, CC VIGENTE). O aval<br />

poderá ser dado na parte da frente ou na parte de traz do título, acompanhado de<br />

texto que o caracterize (avalizo, em aval, avalizo fulano de tal, dentre outros).<br />

Enfatiza-se, porém, que esse texto, é desnecessário quando o avalista<br />

simplesmente assina o título na parte da frente, o que, por si só, caracteriza o aval.<br />

O aval pode ser dado a qualquer momento, mesmo muito após a emissão do título.<br />

4 ALBERNAZ, Lister Freitas. Títulos de crédito eletrônicos. Disponível<br />

em:. Acesso em: 31 ago. de 2006, p.1.<br />

12


O avalista é garantidor daquele que indica no título; se não há indicação da pessoa<br />

garantida, pressupõe-se que o aval foi passado a favor do devedor final. Logo após<br />

assinar como avalista – e antes de devolver o título - é possível desistir, cancelando<br />

o aval; após a entrega, não mais. Se o avalista pagar o título, poderá voltar-se contra<br />

o avalizado e dele cobrar o que desembolsou. Estas são todas regras que já<br />

vigoram em nosso direto.<br />

vigente:<br />

A distinção – que por se só se justifica - está anotada no art. 1647, III, do CC<br />

“Se o avalista for casado em regime distinto da separação absoluta de<br />

bens, a prestação do aval exige autorização do outro cônjuge. Portanto, o<br />

aval agora demandará assinatura do avalista e, se ele é casado pelos<br />

regimes de comunhão universal de bens ou comunhão parcial de bens, a<br />

assinatura do cônjuge autorizando o ato de garantia. Na ausência de tal<br />

autorização, poderá o cônjuge, o marido ou a esposa, demandar a<br />

invalidação do aval, como expressamente prevê o art. 1.642, IV, do mesmo<br />

CC. É preciso estar atento para o fato de tratar-se de anulabilidade, ou<br />

seja, de negócio que, na forma do art. 172, pode ser confirmado pelas<br />

partes, salvo direito de terceiro; ademais, diz o art. 177, a anulabilidade não<br />

tem efeito antes de coisa julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício;<br />

só os interessados (no caso o cônjuge que não autorizou o aval) a podem<br />

alegar, e aproveita exclusivamente aos que alegarem, salvo os casos de<br />

solidariedade ou indivisibilidade. A regra é repetida, especificamente, para<br />

o tema aqui examinado, pelo art. 1.650 da mesma lei, segundo o qual a<br />

decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem<br />

consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo<br />

cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.”<br />

A confirmação do aval a posteriori poderá se dar de forma expressa, hipótese<br />

na qual se faz necessário que o ato de confirmação contenha a substância do<br />

negócio celebrado e vontade expressa de mantê-lo, como exigido no art. 173. Para o<br />

aval, essa ratificação expressa pode fazer-se pela assinatura da cártula, certo que,<br />

na forma do art. 176, quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização<br />

de terceiro, será válido se este a der posteriormente; a autorização a posteriori pode<br />

dar-se pela mesma forma que a que se daria a priori ou simultaneamente, vale dizer,<br />

pela assinatura conjunta na cártula. Poderá, igualmente, fazer-se por instrumento<br />

avulso, hipótese na qual deverá ser descrito minuciosamente o título, permitindo<br />

identificação inequívoca da obrigação, bem como afirmada expressamente a<br />

autorização dada a posteriori para o aval. Esse instrumento deverá ser público ou,<br />

se privado, deverá apresentar-se autenticado, como exigido pelo art. 1.649,<br />

parágrafo único, do CC.<br />

13


Por fim, uma tranqüilidade para os portadores de títulos que foram avalizados<br />

antes de 11 de janeiro de 2003: o aval, nesses casos, é considerado ato jurídico<br />

perfeito, celebrado adequadamente sob o regime da lei anterior, portanto válido. A<br />

preservação dos seus efeitos jurídicos é garantida pela própria Constituição da<br />

República de 05/10/88, em seu art. 5º, XXXV.<br />

Poder-se-ia questionar também a respeito da validade e/ou eficácia legal de<br />

uma autorização aposta em título de crédito para o fim específico de satisfazer a<br />

exigência do art. 1.647, III, do NCC de 2002. 5 Mesmo que eventualmente se<br />

discorde do conteúdo da exigência legal, é forçoso admitir que não há, por outro<br />

lado, óbice algum a desautorizar a aposição da autorização conjugal no título.<br />

Rachel Sztajn e Haroldo Verçosa 6 colocam que se por um lado a LUG não<br />

previu, expressamente, a necessidade de autorização conjugal para prestação de<br />

aval, por outro, também não a coibiu. Não há, de fato, na legislação cambiária<br />

(ainda) em vigor, um só dispositivo que desautorize textualmente a outorga conjugal,<br />

razão pela qual, aliás, a questão sempre se reportou ao direito comum. Como o CC<br />

de 1916 era também omisso quanto à questão, não se exigia a outorga para a<br />

concessão do aval, mas apenas para fiança. Entretanto, o diploma de 2002<br />

disciplina o assunto de modo explícito, estendendo a exigência legal também à<br />

garantia cambiária, emergindo, assim, a inconteste validade da autorização em<br />

exame.<br />

Tais divergências contribuem para alguns conflitos jurídicos, os quais, por si<br />

só, constituem justificativas importantes para este trabalho. Nesse sentido, o ilustre<br />

Wille Duarte Costa 7 argumenta que:<br />

“o aval, garantia típica cambiária, sofrerá agora a limitação da outorga<br />

marital ou uxória, sendo o avalista casado, exceto se o regime do<br />

casamento for o da separação absoluta (art. 1.647, III, do novo Código). Na<br />

espécie, a nova disposição vai sobressair, já que a Lei Uniforme e demais<br />

normas especiais não trataram do assunto, isto é: não deram ao aval tal<br />

caráter, de obrigação vinculada à autorização do outro cônjuge, como<br />

ocorria e ocorre com a fiança.”<br />

Dada a importância do aval, este é um caminho interessante para estudar e<br />

entender as adaptações das distorções do aval à nova legislação.<br />

5 SZTAJN, Rachel; VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. A disciplina do aval no novo código civil.<br />

Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, v. 128. São Paulo: Malheiros, 2002.<br />

6 SZTAJN e VERÇOSA. Op. Cit. 2002.<br />

7 COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.28-29.<br />

14


Portanto, a realização deste estudo justifica-se pelo interesse específico do<br />

pesquisador por algumas formas de distorções do aval face à nova legislação, que<br />

surgiu a partir da experiência profissional vivenciada sobre títulos de crédito, fiança e<br />

aval.<br />

Entende-se que uma das possíveis contribuições a serem apontadas por este<br />

trabalho situa-se na reflexão crítica que o estudo busca empreender sobre o aval,<br />

nas adaptações à nova legislação que se explicitam na instituição do Direito<br />

Cambial.<br />

Adicionalmente, espera-se que este trabalho possa trazer contribuições ao<br />

atual ensino acadêmico de Direito, em seus processos de aperfeiçoamento, pelo fato<br />

de ter sido evidenciada a carência de trabalhos e discussão sistemática sobre o<br />

tópico aval, em todos os seus aspectos relevantes e controversos. Nesse sentido,<br />

deseja-se que as questões aqui tratadas possam suprir lacunas bibliográficas<br />

existentes, assim como estimular debates e um fluxo sempre contínuo de produção<br />

intelectual na área.<br />

O trabalho torna-se relevante, ainda, na medida em que descreve algumas<br />

dinâmicas, formas de aplicação e interpretação do aval, o qual se apresenta<br />

adaptado à praxe comercial e aos costumes do Brasil. A análise do aval, com base<br />

de pesquisa predominantemente doutrinária e jurisprudencial, permitiu compreender,<br />

de forma prática e direta, a atual estrutura cambial brasileira.<br />

Com base no exposto, um dos aspectos metodológicos norteadores deste<br />

trabalho é a pesquisa teórica. Para Jorge Vala, 8 a pesquisa teórica:<br />

“prioriza a construção de esquemas conceituais específicos e utiliza-se dos<br />

vários processos discursivos e argumentativos para o convencionamento<br />

sobre a validade dos esquemas propostos. As fontes utilizadas por esta<br />

pesquisa são as fontes de papel que são todas aquelas que não são<br />

personificadas [...] que se utilizam de dados secundários extraídos de livros<br />

de toda espécie, documentos históricos e de arquivos, artigos de revistas,<br />

jornais, jurisprudências, legislações, dentre outras inúmeras fontes destes<br />

tipos.”<br />

A coleta de dados se deu por meio de pesquisa bibliográfica, compreendendo<br />

a utilização de publicações, como livros, periódicos, dissertações, sites, o que<br />

permitiu uma melhor compreensão da base teórica do trabalho desenvolvido.<br />

8 VALA, Jorge. A análise de conteúdo. In: PINTO, José Madureira; SILVA, Augusto Santos (Org.).<br />

Metodologia das ciências sociais. 8 ed. Porto: Afrontamento, 1986, p.112.<br />

15


A análise dos dados efetivou-se pela análise de conteúdo. Krippendorf (apud<br />

MARIA TERESA DIAS e MIRACY GUSTIN2002, p.110-111) 9 aduz que a análise de<br />

conteúdo é:<br />

“uma técnica de investigação que permite fazer interferências, válidas e<br />

replicáveis, dos dados para o contexto. São tipos específicos de análise de<br />

conteúdo: as histórias de vida, a análise de discurso, a análise das<br />

mensagens da mídia, o exame de documentos, legislações e<br />

jurisprudências, entre outros.”<br />

Segundo Maria Teresa Dias e Miracy Gustin 10 , a análise de conteúdo é<br />

relevante para a compreensão de legislações e suas conexões contextuais, bem<br />

como das jurisprudências.<br />

Assim, dividir-se-á esta <strong>dissertação</strong> em cinco capítulos. O primeiro capítulo<br />

apresenta a introdução do estudo. Inicia-se com a apresentação do tema de<br />

pesquisa. Na seqüência, evidencia-se o problema, os objetivos, bem como a<br />

justificativa do estudo, a metodologia da pesquisa e a organização do trabalho.<br />

O segundo capítulo analisa os aspectos gerais dos títulos de créditos,<br />

abordando sua origem histórica, conceitos, características e classificação.<br />

No terceiro capítulo considera-se a fiança, com ênfase nas suas principais<br />

abordagens e discussões.<br />

O quarto capítulo refere-se ao aval, objeto deste estudo, o que foi importante<br />

para a pesquisa teórica.<br />

Para finalizar, o quinto capítulo compreende as conclusões deste estudo,<br />

apontando as limitações da pesquisa e algumas recomendações para futuros<br />

estudos sobre o tema investigado.<br />

9 DIAS, Maria Tereza Fonseca; GUSTIN, Miracy Barbosa Souza. (RE) Pensando a pesquisa jurídica.<br />

Belo Horizonte, Del Rey, 2002, p.110-111.<br />

10 Idem, 2002.<br />

16


2. ASPECTOS TEÓRICOS DOS TÍTULOS DE CRÉDITO<br />

Este capítulo analisa os aspectos gerais dos títulos de crédito, abordando sua<br />

origem histórica, importância e conceituações. Dando continuidade, procede-se à<br />

revisão dos requisitos essenciais aos títulos de crédito com ênfase na Cartularidade,<br />

Literalidade e Autonomia, conforme a literatura atual se reporta ao tema.<br />

2.1. Origem e evolução dos títulos de crédito<br />

Os títulos de crédito remontam à Idade Média, no momento em que houve<br />

uma grande expansão do comércio. Desenvolveram-se a partir de um papel, que na<br />

verdade era um documento, que representava um instrumento de câmbio. Nos<br />

dizeres de Wille Duarte Costa, 11 a letra de câmbio é “o mais antigo título de crédito.<br />

Foi o primeiro deles, seguido da nota promissória”. Para o autor, a letra de câmbio é:<br />

“uma ordem de pagamento escrita, dada por alguém a terceira pessoa, para<br />

que esta pague, a quem estiver indicado naquela ordem como beneficiário, a<br />

importância em dinheiro então fixada. É o saque que representa a ordem [...]<br />

foi objeto de criação dos judeus expulsos das França.”<br />

A nota promissória, não obstante ser um título menos complexo que a letra de<br />

câmbio, não foi o primeiro a ter sua estrutura desenvolvida. Nesse sentido, acentua<br />

João Eunápio Borges, 12<br />

“a letra de câmbio e a nota promissória, são nascidas ambas do contrato de<br />

câmbio. Enquanto a letra de câmbio se firmou e desenvolveu rapidamente, a<br />

nota promissória permaneceu estacionária, devido a ser considerada como<br />

instrumento do câmbio seco, que era proscrito, pela facilidade que<br />

disfarçava o mútuo usuário severamente condenado pelas leis canônicas.”<br />

Assim, o nascimento do título de crédito surgiu das necessidades<br />

momentâneas de caráter mercantil, ao invés de ser um procedimento visando<br />

especialmente à evolução de um problema jurídico. Começam a surgir naquela<br />

época, de maneira mais completa e freqüente, documentos que representaram<br />

direitos de crédito, que poderiam ser utilizados apenas pelos que figuram nos<br />

documentos como:<br />

11 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.3.<br />

12 BORGES, João Eunápio. Títulos de créditos. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p.47.<br />

17


“seus titulares (credores) e que, posteriormente, passaram a ser<br />

transferidos por esses titulares a outras pessoas que, de posse dos<br />

documentos, podiam exercer, como proprietários, os direitos mencionados<br />

nos papéis. A chamada cláusula à ordem, que nada mais é que a<br />

faculdade que tem o titular de um direito de crédito (credor) de transferir<br />

esse direito a outra pessoa, juntamente com o documento que o incorpora,<br />

marcou, realmente, o início de uma fase importantíssima para a economia<br />

dos povos, que é a de circulação do crédito.” 13<br />

O título de crédito constituiu-se no “instrumento mais perfeito e eficaz em<br />

função da necessidade de se obter uma circulação mais rápida que a permitida pela<br />

moeda manual, visando uma imediata mobilização da riqueza. Além disso, passou a<br />

resolver “a circulação de direitos de crédito, que não era possível de acordo com as<br />

normas do direito comum porque somente disciplinava a circulação de bens”. 14<br />

Waldirio Bulgarelli 15 aduz que “os títulos de crédito representam o principal<br />

instrumento de circulação da riqueza, devendo ser dotados de certos requisitos que<br />

os caracterizam frente aos demais documentos.”<br />

A história dos títulos de crédito é dividida, didaticamente, em três períodos. O<br />

primeiro, chamado período italiano, vai da Idade Média até 1673, quando a letra de<br />

câmbio constituía meio de troca, de escambo, de moeda. O segundo, chamado<br />

período francês, das ordenanças de Comércio, foi de 1673 a 1848, quando o título<br />

representava apenas meio de pagamento de um contrato, do qual não se<br />

desvinculava. O terceiro período foi o alemão, que teve início em 1848 indo até o<br />

momento atual, no qual se cria, finalmente, um título de crédito literal e abstrato,<br />

independentemente de um contrato. Sobre o surgimento e a evolução da cambial,<br />

Túllio Ascarelli 16 afirma que:<br />

“Por certo, na evolução histórica dos títulos de crédito, a importância<br />

atribuída à circulação cresceu na medida do progresso econômico e, por<br />

isso, nas suas origens estava em plano inferior à das demais funções do<br />

título. A cambial surgiu para tomar possível o transporte do dinheiro – hoje<br />

possibilita a mobilização do crédito.”<br />

13 MIRANDA, Maria Bernadete. Os títulos de crédito como documentos representativos de obrigações<br />

pecuniárias. Disponível em: http://www.direitobrasil.adv.br/artigos/artigo6.pdf#search=%22>. Acesso<br />

em: 31 ago. de 2006 (a), p. 2.<br />

14 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio F. Títulos de crédito. 2 ed. revista e atualizada, de acordo com o<br />

novo Código Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.39.<br />

15 BULGARELLI, Waldirio. Títulos de crédito. São Paulo: Atlas, 15. Ed., 1999, p. 53.<br />

16 ASCARELLI, Túllio. Teoria geral dos títulos de crédito. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1969, p. 30.<br />

18


A seguir serão descritos os períodos da origem e evolução dos títulos de<br />

crédito, baseando-se nos fatos históricos ocorridos nos períodos italiano, francês e<br />

alemão, conforme abordagens de Túllio Ascarelli, João Eunápio Borges, Wille Duarte<br />

Costa, Fran Martins e José Maria Whitaker.<br />

2.1.1. Período italiano<br />

O período italiano se caracteriza pelo surgimento e uso dos títulos como<br />

instrumentos de transporte e troca, ou seja, o câmbio entre comprador e vendedor<br />

de moedas em locais diversos, designado como o cambium trajectium. 17<br />

Naquela época, florescia o comércio nas cidades italianas, sobretudo<br />

naquelas localizadas na orla marítima, onde aconteciam as férias da Idade Média,<br />

promovidas por comerciantes de alguns lugares, que almejavam realizar transações<br />

e obter lucro. 18<br />

Entretanto, as cidades italianas da época não eram interligadas por estradas<br />

seguras. Na verdade, existiam caminhos rudimentares por onde circulavam<br />

mercadorias e valores. Desta maneira, os comerciantes se tornavam alvos fáceis de<br />

assaltantes oportunistas cada vez mais especializados nesse tipo de crime.<br />

Ressalta-se que o transporte de moedas era feito no lombo de mulas, sujeito até<br />

mesmo ao ataque de animais selvagens.<br />

Outro aspecto que se sobressai neste contexto é o fato de que as diversas<br />

cidades sedes de feiras e mercados possuíam estrutura de pequenos Estados,<br />

cunhando as suas próprias moedas, o que obrigava os comerciantes a realizar o<br />

conhecido “câmbio manual” nas feiras, após as quais os comerciantes temiam<br />

retomar as estradas perigosas transportando consideráveis valores em moeda. No<br />

princípio, começaram a realizar a cautio – um instrumento público, que representava<br />

o depósito da moeda do comerciante em mãos de um banqueiro ou seu<br />

representante. Desta forma, através da cautio o banqueiro prometia efetuar, em<br />

outro local, o pagamento ao depositante das moedas. 19<br />

A cautio, que era chamado também de instrumento seco, possibilitava ao<br />

banqueiro aumentar significativamente seus lucros às custas da necessidade dos<br />

17 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969.<br />

18 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003.<br />

19 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969.<br />

19


comerciantes, caracterizando-se numa verdadeira agiotagem (Cambia sicco no sunt<br />

cambia, sed mutuum usurarium).<br />

Ainda no século XIII, o mencionado instrumento de troca vinha acompanhado<br />

de uma carta particular do banqueiro a seu representante ou correspondente no<br />

local de pagamento (ordem de pagamento precursora da letra de câmbio), em que<br />

constava uma ordem para pagar ao portador da carta a soma nela determinada, em<br />

moeda local. 20<br />

Segundo José Eunápio Borges, 21 a cautio teria sido a promessa de<br />

pagamento que deu origem à nota promissória:<br />

“A cautio teria sido a origem da nota promissória (a cambiale própria do<br />

direito italiano) e a lettera de pagamento di pagamento di cambio (também<br />

denominada tracta), constitui a primitiva letra de câmbio (a cambiale tracta),<br />

cuja denominação littera cambili foi expressamente consagrada em 1.368<br />

no Estatuto dos comerciantes de Paiva.”<br />

Com o passar do tempo, na medida em que as relações comerciais se<br />

intensificavam e aprimoravam, a carta que acompanhava a cautio, sempre com a<br />

finalidade de troca e remessa de moeda, começou a ser utilizada<br />

independentemente, sendo entregue diretamente ao depositante. Em seguida,<br />

surge a lettera di cambio, tomando o papel principal da cautio, ficando esta relegada<br />

ao segundo plano e entrando em desuso.<br />

Essa fase de concepção dos títulos, da lettera di cambio, fica marcada pelo<br />

uso dos mesmos apenas para remessa e troca de moedas, não havendo, portanto,<br />

uma verdadeira operação de crédito.<br />

O período italiano foi da Idade Média até o final do século XVII quando, em<br />

1673, a Ordenança de Comércio francesa, seguida pelo Código de Comércio de<br />

1808, ampliou o conceito de letra de câmbio.<br />

2.1.2. Período francês<br />

O período francês teve marco inicial em 1673, com o advento da Ordenança<br />

de Comércio Terrestre, que acolheu a letra de câmbio, passando esta a significar<br />

20 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969.<br />

21 BORGES, João Eunápio. Do aval. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1975, p.38.<br />

20


não mais somente um instrumento de câmbio e remessa de moeda, mas sim um<br />

instrumento de pagamento, o que foi ratificado pelo Código francês de 1808 22 .<br />

Ela já não era mais necessariamente o depósito em mãos do banqueiro que<br />

originava a letra, mas qualquer valor que o sacado, pessoa que deveria acatar a<br />

ordem de pagamento do título, deveria ou viesse a dever ao sacador, pessoa que<br />

dava a ordem de pagamento, originário de qualquer transação onerosa entre<br />

ambos. 23<br />

Naquela época houve alguma evolução, com a criação da cláusula à ordem<br />

do endosso e do aceite. Entretanto, o título circulava sem autonomia, ou seja, sem<br />

se desvincular da causa debendi ou do negócio originário.<br />

A letra necessitava de um contrato inicial, uma vez que deveria haver uma<br />

provisão do sacador em mãos do sacado para reconhecimento do débito, aceite,<br />

declarando que cumpria com a obrigação contratual existente naquele título.<br />

A cláusula à ordem constava na letra a fim de possibilitar a sua circulação e,<br />

por conseqüência, geraria o endosso, que se consolidaria pela assinatura do atual<br />

portador do título. Todavia, a letra de câmbio não passava de documentação<br />

comprobatória de um contrato oneroso, e sua circulação resultava de simples<br />

delegação ou mandato, ou seja, o endosso nada mais era do que a formalização<br />

dessa delegação de poderes, através da qual se desligaria do negócio ou contrato<br />

originário do título. 24<br />

Fran Martins 25 elucida que caracterizou-se, assim, esse segundo período<br />

evolutivo da letra de câmbio,<br />

“por se transformar ela em um instrumento de pagamento, pelas facilidades<br />

criadas para sua circulação, com adoção da cláusula à ordem e do endosso,<br />

e pela vinculação do sacado à obrigação, com aceite.”<br />

A partir desse período, o título já circulava com maior facilidade em virtude da<br />

criação da cláusula à ordem, do endosso e do aceite, e representaria apenas um<br />

instrumento de pagamento, embora ainda dependente de uma contraprestação<br />

originária.<br />

22<br />

COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003.<br />

23<br />

ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969.<br />

24<br />

Idem, 1969.<br />

25<br />

MARTINS, Fran. Títulos de crédito: letra de câmbio e nota promissória. 5 ed. Rio de Janeiro:<br />

Forense, 1975, p.40.<br />

21


2.1.3. Período alemão<br />

O período alemão, com início a partir do século XIX, se caracteriza pela<br />

evolução final da letra de câmbio como título de crédito. Nessa época, os juristas se<br />

preocuparam em desenvolver a letra de câmbio de forma a torná-la um título<br />

autônomo, abstrato e independente, desvinculado de qualquer contrato inicial<br />

obrigatório, que não se prestasse tão somente ao pagamento ou troca e remessa de<br />

moeda. Consolidava-se, então, o título de crédito, que até hoje permeia o<br />

ordenamento e a praxe comercial. 26<br />

Em Leipzi, na data de 24/11/1848, foi aprovada pelos Estados que<br />

compunham a Alemanha a “Lei Geral Alemã” sobre letras de câmbio (Die Allgemeine<br />

Detsche Wechselordung), que viria a influenciar diversos outros países de todo o<br />

mundo. 27 “Essa lei sofreu algumas modificações, mas, com pequenas modificações,<br />

o Império alemão tornou-a obrigatória pela Lei de 22 de abril de 1871”. 28<br />

Conforme coloca o ilustre Wille Duarte Costa, 29 a partir desta época,<br />

“o título passou a ter valor por si próprio e, para sua validade, não dependia<br />

de anterior depósito de dinheiro aos banqueiros ou a quem quer que seja,<br />

nem precisava indicar provisão ou aquisição de mercadorias. Bastava<br />

assinar o título que o desejo de obrigar-se se manifestava. O papel<br />

assinado, por si só, era suficiente para obrigar seu signatário.”<br />

Com as inovações do período alemão, a letra de câmbio não necessitava<br />

mais de provisão; tornava-se abstrata logo após sua assinatura, sem necessidade<br />

de uma causa a ela vinculada. Somente a vontade e a assinatura do sacador do<br />

título criariam um título existente por si só, ainda que sem a concordância ou aceite<br />

do sacado. Karl Einert, na Alemanha, chegou a chamar a letra de câmbio de “papel<br />

de moeda do comerciante”, diante das peculiaridades que revestiam tais títulos. 30<br />

Também foi objeto das inovações alemãs a literalidade da letra de câmbio,<br />

isto é, esta somente valeria conforme o que nela estivesse escrito. Tornar-se-ia um<br />

título completo – não dependente de nenhum outro papel ou contrato anterior.<br />

26<br />

ASCARELLI, Tulio. Op. Cit. 1969.<br />

27<br />

Idem, 1969.<br />

28<br />

COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.13.<br />

29 Idem, 2003, p.12.<br />

30 Idem, 2003, p.12.<br />

22


Com propriedade, José Maria Whitaker menciona que “no primeiro período, a<br />

letra de câmbio operava a circulação de dinheiro; no segundo, a circulação de<br />

valores; e no terceiro, passou a constituir por si mesma um valor.” 31<br />

A letra de câmbio passaria, portanto, a ter um formato próprio e regulado por<br />

lei, com requisitos de segurança e identificação. Concretizava-se, assim, o<br />

nascimento de um título formal.<br />

Dessa forma, se fez do período alemão. Nasceu, de forma definitiva, até hoje<br />

corrente, a letra de câmbio abstrata (a obrigação nasce do próprio título circulante),<br />

literal (vale pelo que nela está escrito), completa e formal (deve atender certos<br />

requisitos impostos por lei).<br />

Portanto, como acentua Wille Duarte Costa, 32 “foram os estudos alemães que<br />

deram um novo caráter à letra de câmbio, transformando-a num verdadeiro título de<br />

crédito, completamente diferente de outro título.” Assim, esses estudos acabaram<br />

por influenciar outros países, que passaram a adotar em suas legislações os<br />

mesmos princípios.<br />

2.1.4. Período moderno<br />

Um dos primeiros cientistas a considerar essa interação no ramo do Direito foi<br />

Norbert Wiener, considerado como "o Pai da Cibernética”. Junto de outros cientistas,<br />

afirmou na década de 40 que "o conjunto de problemas centrados no controle e na<br />

comunicação, tanto nas pessoas quanto na máquina, apresentavam uma unidade<br />

essencial.” 33<br />

Dentre suas reflexões sobre a possibilidade de aplicação da cibernética ao<br />

Direito, coloca os problemas da lei como problemas de controle sistemático e<br />

reiterável de certas situações críticas, conceituando-a como:<br />

“o controle ético aplicado à comunicação e à linguagem enquanto forma de<br />

comunicação, especialmente quando tal aspecto normativo esteja sob o<br />

31 WHITAKER, José Maria. Letra de câmbio: criação, circulação, realização. 7 ed. revisada e<br />

atualizada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963, p.16.<br />

32 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.13.<br />

33 SZKLARWOSKY, Leon Fredja. A informática e o mundo moderno. Disponível:<br />


mando de alguma autoridade suficientemente poderosa para dar às suas<br />

decisões o caráter de sanção social efetiva.” 34<br />

Na visão de Flamarion Tavares Leite, 35 a cibernética do Direito parte do<br />

princípio de que:<br />

“o Direito é um sistema, e, portanto, pode ser analisado através da<br />

cibernética como ciência ou teoria do sistema de regulação e controle. O<br />

Direito tem inputs (entradas) e outputs (saídas), tem o sistema de feedback,<br />

retroalimentações, sendo um sistema cibernético. De outro lado, tem-se na<br />

cibernética a base de todo o progresso tecnológico das comunicações e da<br />

informação, e conseqüentemente isso passa pelo direito. O direito não<br />

pode ficar indiferente às transformações sociais.”<br />

É neste contexto que estão inseridos os títulos, agregando novos mecanismos<br />

jurídicos conseqüentes à influência que a cibernética vem ocasionando nas práticas<br />

do comércio e dos negócios jurídicos em geral.<br />

No chamado período moderno, tendo em vista a multiplicação das atividades<br />

comerciais, “o título surgiu como um mecanismo perfeito e eficaz da mobilização da<br />

riqueza e da circulação do crédito, influenciando todos os negócios jurídicos,<br />

principalmente os de natureza econômica.” 36<br />

“[...] O registro da concessão e circulação do crédito em meio magnético<br />

tornou obsoletos os preceitos do direito cambiário, intrinsecamente ligados à<br />

condição de documento dos títulos de crédito. Cartularidade, literalidade,<br />

distinção entre atos em branco e em preto representam aspectos da<br />

disciplina cambial desprovidos de sentido, no ambiente informatizado.” 37<br />

Depreende-se, portanto, que a nova disciplina geral dos títulos de crédito é<br />

acrescida de mudanças, dentre elas a cibernética. Para o ilustre Wille Duarte Costa,<br />

“na utilização da cibernética os títulos de crédito deverão sofrer grande influência da<br />

tecnologia, que vai modificar hábitos, costumes e até princípios sobre os títulos de<br />

crédito.” 38<br />

O CC vigente de 2002, na parte que trata das normas gerais sobre os títulos<br />

de crédito, reconhece, ainda que de forma superficial, a existência de títulos virtuais,<br />

em seu art. 889, § 3º, conforme descrito no art. 889: “Deve o título de crédito conter<br />

34<br />

WIENER, Norbert. Cibernética e Sociedade. In: DE LUCCA, Newton; SIMÃO FILHO, Adalberto<br />

(Coord.), Direito & Internet: aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Edipro, 2000, p. 35.<br />

35<br />

LEITE, Flamarion T. L. Os nervos do poder: uma visão cibernética do direito. São Paulo: Max<br />

Limonad, 2001, p.32.<br />

36<br />

ALBERNAZ, Lister Freitas. Op. Cit. 2006, p.1.<br />

37<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, v. 1. 4 ed. São Paulo: Saraiva. 2000, p.378-379.<br />

38 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.15.<br />

24


a data de emissão, a indicação precisa dos direitos que confere, e a assinatura do<br />

emitente.”<br />

Tais posicionamentos vão de encontro ao pensamento de Fábio Ulhoa<br />

Coelho, 39 o qual menciona que não se pode mais negar executividade aos títulos de<br />

crédito eletrônicos. Isto se dá pelo esclarecimento do NCC, desde que preenchidos<br />

os requisitos do art. 889, caput.<br />

A norma do art. 889, §3º, do NCC, vem acrescentar o entendimento de parte<br />

da doutrina, sobre a qual os ilustres Luis Emygdio 40 e Fábio Ulhoa Coelho 41<br />

acentuam que a duplicata virtual é título executivo, desde que observados os<br />

requisitos essenciais e mínimos previstos no caput do art. 889, diferentemente do<br />

boleto bancário, por faltar um dos requisitos essenciais.<br />

Assim sendo, o reconhecimento dos títulos eletrônicos, norma contida no §3º<br />

do art. 889, permite que o título possa ser emitido a partir dos caracteres criados em<br />

computador ou equipamento equivalente e que constem da escrituração do emitente,<br />

observados os requisitos mínimos previstos no mencionado artigo.<br />

Isto se deu pela necessidade de diminuir ou eliminar o trânsito de papéis, o<br />

que, aliado à lei, propiciou o surgimento de uma forma de circulação do crédito<br />

totalmente diferenciada, em que é possível a existência de um título de crédito<br />

eletrônico, emitido através dos caracteres criados em computador.<br />

Miguel Pereira Neto 42 elucida que no Brasil os títulos de crédito já vêm<br />

recebendo tratamento eletrônico, citando o caso das duplicatas encaminhadas a<br />

protesto por indicação dos bancos aos cartórios do teor dos títulos, por meio<br />

eletrônico ou Internet, sem a apresentação material dos títulos.<br />

Cabe destacar que, no momento atual, pouco a pouco vai desaparecendo a<br />

duplicata materializada em papel, em cártula, substituída pelo título eletrônico, cuja<br />

executividade vem sendo, no entanto, contestada por parte da doutrina, mas com<br />

legalidade na sua emissão por meios eletrônicos no Direito, dependendo a sua<br />

eventual nulidade de aplicação em cada caso concreto, não podendo ser<br />

questionada a sua definição.<br />

39 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, v. 3, 8 ed. São Paulo: Saraiva. 2005.<br />

40 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio F. Op. Cit. 2002.<br />

41 COELHO, Fábio Ulhoa.Op. Cit. 2005.<br />

42 PEREIRA NETO, Miguel. Os documentos eletrônicos utilizados como meio de prova para a<br />

constituição de título executivo extrajudicial e judicial. In: PEREIRA NETO, Miguel. Internet: o direito<br />

na era virtual. Rio de Janeiro: Forense: 2000, p.23-24.<br />

25


Neste prisma, verifica-se que a emissão dos títulos eletrônicos ou escriturais é<br />

feita via sistema, com mais rapidez e segurança. A empresa fatura, porém não emite<br />

papéis. “O borderô é eletrônico, em que os dados do faturamento são importados<br />

através de uma conexão com os computadores do banco, usando-se um software de<br />

comunicação computador a computador.” 43<br />

Verifica-se, portanto, a existência de mudanças no comportamento das<br />

relações credítícias entre fornecedores e consumidores, bancos e clientes, enfim,<br />

entre todos que, de uma forma ou outra, são abrangidos pela utilização de títulos<br />

cambiários.<br />

Trata-se de uma importante inovação que poderá ajudar a resolver os<br />

problemas jurídicos relativos ao título virtual, decorrente da evolução tecnológica,<br />

que é escriturado e reduz a importância do dogma da cartularidade. Assim, o título<br />

virtual está reconhecido no art. 889, § 3º, se posicionando nas “Disposições Gerais”<br />

sobre títulos de crédito. Entende-se, desta forma, “que não se pode mais negar<br />

executividade aos títulos eletrônicos, especificamente à duplicata escritural<br />

elaborada de forma eletrônica (duplicata virtual).” 44<br />

A duplicata escritural eletrônica (ou virtual), com efeito, é um título formal,<br />

obedecendo aos requisitos exigidos pelo art. 2º, §1º, da Lei 5.474 de 1968 (Lei das<br />

Duplicatas). 45<br />

Reconhecida no mercado como título de crédito, a duplicata virtual se<br />

constitui em obrigação líquida e certa, desde que os caracteres criados em<br />

computador, ou equipamento equivalente, constem da escrituração do emitente e o<br />

título observe os requisitos mínimos previstos no art. 889. 46<br />

Por fim, pode-se concluir que a duplicata eletrônica (virtual), como qualquer<br />

outro título eletrônico, recebe previsão legal. Enfatiza-se que nada muda no<br />

processamento da duplicata ou de nota promissória nas transações cotidianas.<br />

43 MIRANDA, Maria Bernadete. O título de crédito eletrônico no novo código civil. Disponível em:<br />

. Acesso em: 31 ago. de 2006 (b). p.1.<br />

44 MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006 (b), p.2.<br />

45 Idem, 2006 (b).<br />

46 Idem, 2006 (b).<br />

26


2.2. Conceituações de crédito<br />

Antes de abordar, especificamente, os títulos de crédito, torna-se necessário<br />

e interessante discorrer sobre o crédito em si, enquanto fenômeno econômico.<br />

De acordo com Maria Bernadete Miranda, 47 “a utilização do crédito somente<br />

se tornou universal após a revolução Industrial, especialmente no século XX, quando<br />

a tecnologia de produção, distribuição e consumo adquiriu grande complexidade.”<br />

O crédito retrata a confiança e a fé do credor, num ato realizado face à<br />

terceiro. Daí a origem etimológica da palavra creditum – credere (confiar, emprestar<br />

dinheiro). Para Fran Martins, “representa a confiança que uma pessoa inspira na<br />

48 49<br />

outra de cumprir, no futuro, obrigação atualmente assumida.”<br />

Proclama Wille Duarte Costa que o crédito corresponde tanto à confiança<br />

quanto ao tempo.<br />

“O credor acredita (confia) no devedor e lhe dá tempo para liquidar a<br />

obrigação decorrente. Não ocorrendo a confiança do credor no devedor,<br />

não haverá crédito. Sem crédito não há título de crédito. Se, ao contrário,<br />

ocorrer a confiança do credor, este deve conceder tempo que materializa a<br />

relação creditícia. Havendo só a confiança, sem permissão de tempo para<br />

liquidação do débito, não há também crédito e menos ainda título de<br />

crédito. Mas pode ocorrer que a confiança venha da garantia oferecida:<br />

garantia pessoal ou fidejussória (aval) ou garantia real (penhor, hipoteca,<br />

entre outros).” 50<br />

Corroborando, Luis Emygdio 51 acentua que “a confiança é necessária, pois o<br />

crédito se assegura numa promessa de pagamento, e o tempo também, pois o<br />

sentido do crédito é, justamente, o pagamento futuro combinado, pois se fosse à<br />

vista, perderia a idéia de utilização para devolução posterior.”<br />

Nos dizeres de Rubens Requião, 52 “o crédito não configura um agente de<br />

produção, pois consiste apenas em transferir a riqueza de “A” para “B”. Ora,<br />

transferir evidentemente não é criar, nem produzir. O crédito não é mais do que a<br />

permissão para usar o capital alheio.”<br />

47<br />

MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006 (a), p.1.<br />

48<br />

MARTINS, Fran. Op. Cit. 1995, p.3.<br />

49<br />

RIOS, Victor Eduardo. Títulos de crédito e contratos mercantis, v.22, 2 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

2005, p.3.<br />

50<br />

DUARTE, Wille Costa. Op. Cit. 2003, p.70.<br />

51<br />

ROSA Júnior, Luis Emygdio. Op. Cit. 2002, p.3.<br />

52<br />

REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2000, p.320.<br />

27


Gide, economista francês (apud RUBENS REQUIÃO) 53 , menciona que a<br />

“venda a prazo e o empréstimo constituem duas formas essenciais do crédito. São<br />

caracteres essenciais do crédito, primeiramente, o consumo da coisa vendida ou<br />

emprestada e, segundo, a espera da coisa nova destinada a substituí-la.”<br />

Depreende-se, desta forma, que o crédito é um artifício humano que veio<br />

facilitar o comércio e o fluxo de capital, levando ao desenvolvimento das economias<br />

e dos povos. Somente o crédito permite que uma pessoa usufrua o dinheiro ou a<br />

coisa anteriormente ao respectivo pagamento, que ocorrerá futuramente, quando já<br />

presentes os resultados de um trabalho. Dessa forma, o crédito, com dilação<br />

temporal e boa-fé por natureza, se apresenta como preponderante às relações<br />

comerciais e econômicas.<br />

Em comércio e finanças, o crédito é “o termo utilizado para designar as<br />

transações que implicam em uma transferência de dinheiro a ser devolvido, depois<br />

de um certo tempo. Aquele que transfere o dinheiro torna-se o credor e aquele que o<br />

recebe, o devedor.” 54<br />

comerciais:<br />

Na concepção de Waldo Fazzio Júnior, 55 as modernas organizações<br />

“jamais poderiam desenvolver com suficiente amplitude seus negócios e<br />

atuar eficazmente no mercado, sem utilização do crédito, instrumento por<br />

excelência da mobilização de capitais. Sem dúvida, o crédito transforma o<br />

capital inerte em capital circulante, ensejando-lhe maior utilidade, fazendo-o<br />

mais produtivo.”<br />

Waldirio Bulgarelli (apud FAZZIO JÚNIOR) 56 acrescenta, com propriedade,<br />

que não se deve, contudo, chegar ao extremo de crer:<br />

“[...] como já ocorreu no passado, que o crédito cria capital, pois sua função<br />

é de fomentar a criação de riquezas, injetando recursos antecipadamente<br />

nas atividades econômicas. O crédito, economicamente, consiste em trocar<br />

bens presentes por bens futuros, e obviamente, não leva à criação de<br />

capitais.”<br />

Todavia, o crédito somente não bastaria para fomentar a economia com<br />

civilidade e praticidade. No Direito Romano, por exemplo, a circulação de capitais<br />

53 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.357.<br />

54 Enciclopédia® Microsoft®. Crédito. Encarta 2001. © 1993-2000. Microsoft Corporation, p.1.<br />

55 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.369.<br />

56 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.369.<br />

28


ocorria através do crédito. Contudo, naquela época, a obrigação se caracterizava<br />

pelo elo pessoal criado entre o credor e devedor. A obrigação aderia ao corpo do<br />

devedor, assibus haeret, segundo forte expressão de uso dos glosadores.<br />

Assim, a partir da Idade Média, viriam os títulos de crédito a possibilitar o uso<br />

e circulação dos créditos e, por conseguinte, aderir, definitiva e amplamente, ao<br />

ordenamento jurídico mundial. O ilustre Rubens Requião 57 lembra que:<br />

“sem dúvida, devido à criação dos títulos de crédito, os capitais, pela rápida<br />

circulação, tornam-se mais úteis e, portanto, mais produtivos, permitindo<br />

que deles melhor se disponha, a serviço da produção de riqueza,<br />

compreendendo-se, assim, a enorme importância que adquiriram os títulos<br />

de crédito na economia atual, tornando seu estudo um dos pontos altos do<br />

moderno Direito Comercial.”<br />

Os créditos podem ser classificados sob os seguintes aspectos:<br />

a) comerciais - concedidos por fabricantes a outros fabricantes, para<br />

financiamento da produção e distribuição de produtos;<br />

b) de investimento - concedidos às empresas para a aquisição de<br />

equipamentos, e que também podem ser financiados pela emissão de<br />

notas promissórias, bônus, e outros instrumentos financeiros que<br />

representam o crédito que a empresa recebe;<br />

c) bancários - concedidos por um banco, e entre os quais estão incluídos os<br />

empréstimos;<br />

d) pessoais ou de consumo - permitem aos indivíduos a aquisição de bens e<br />

o pagamento a prazo;<br />

e) hipotecários - destinados à compra de bens imóveis;<br />

f) públicos - concedidos aos governos que adquirem uma dívida pública;<br />

g) internacionais - concedidos por um país a outro país, ou por uma<br />

instituição internacional, como os praticados pelo Banco Internacional para<br />

a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD) e o Fundo Monetário<br />

Internacional (FMI). 58<br />

57 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.358.<br />

58 Enciclopédia® Microsoft®. Crédito. ©1993-2000. Microsoft Corporation. Encarta 2001, p.1.<br />

29


Já a classificação dos créditos segundo Carvalho de Mendonça (apud<br />

WILLER DUARTE COSTA) baseou-se na definição e obra de Cesare Vivante:<br />

“1) Títulos de crédito propriamente ditos - nos quais se atesta uma operação<br />

de crédito, figurando entre eles os títulos da dívida pública, as letras de<br />

câmbio, as warranties, as debêntures, entre outros.<br />

2)Títulos de créditos impropriamente ditos – nos quais, ainda que não<br />

representem uma operação de crédito, se encontra, a par da sua literalidade<br />

e autonomia, id quod quacunque causa debetur.” 59<br />

Neste contexto, a principal função do crédito consiste em transferir a<br />

poupança de alguns agentes econômicos a outros que não possuem o capital<br />

necessário para os projetos econômicos planejados. Essa transferência de dinheiro<br />

é temporária e custa um preço denominado ágio (juros). São inevitáveis nos grandes<br />

investimentos e na criação de empresas de grande porte, necessárias à melhoria do<br />

nível de vida e ao desenvolvimento econômico.<br />

O nível de atividade econômica, ou etapa do ciclo econômico em que se<br />

encontra um país em determinado momento, pode ser deduzido a partir do sistema<br />

creditício: quando aumenta o volume de crédito, a etapa é de expansão econômica<br />

e, quando diminui, significa um período de recessão econômica. 60<br />

2.3. Importância e conceitos de título de crédito<br />

O título de crédito é um instrumento para a atividade negocial. A compreensão<br />

sobre esta parte é de fundamental importância à assessoria empresarial.<br />

Conforme Túllio Ascarelli, 61 as pessoas encontram-se em uma economia<br />

creditória e nela os títulos de crédito constituem a construção mais importante do<br />

Direito Comercial moderno.<br />

A importância do crédito para o desenvolvimento da economia tem sido<br />

destacada unanimemente, tanto por economistas como pelos juristas, que vêem nele<br />

o responsável pelo crescimento da economia das nações, em geral, e das empresas<br />

e suas operações, em particular.<br />

que:<br />

O ilustre Luiz Emygdio 62 coloca que o título de crédito nasceu para circular e<br />

59<br />

COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.74.<br />

60<br />

Enciclopédia® Microsoft®. Crédito. ©1993-2000. Microsoft Corporation. Encarta 2001, p.1.<br />

61<br />

ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969.<br />

62<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2002, p.49.<br />

30


“essa função de negociabilidade revela a sua importância nas áreas<br />

econômicas, civil, comercial, particular e pública porque, embora disciplinado<br />

pelo direito comercial, constitui-se, na realidade, em instituto geral de direito,<br />

em instrumento de técnica jurídica, a que recorrem, para fins de<br />

financiamento, o comerciante e o lavrador, o industrial e o construtor de<br />

prédios, o particular, o Estado, entre outros.”<br />

Rubens Requião 63 elucida que permite, o título de crédito, a possibilidade de<br />

se obter, em sua troca, outro capital em substituição àquele que se tinha emprestado<br />

anteriormente. Pode-se dizer que devido à criação dos títulos de crédito, os capitais,<br />

pela rápida circulação, tornam-se mais úteis e, portanto, mais produtivos, permitindo<br />

que deles melhor se disponha a serviço da produção de riqueza. Compreende-se,<br />

desta forma, a importância que adquiriram os títulos de crédito na economia, o que<br />

torna seu estudo um dos pontos relevantes do moderno Direito Comercial.<br />

Assim, os títulos de crédito, incontestavelmente, exercem fundamental<br />

importância na economia, contribuindo para o seu desenvolvimento. Para Lister de<br />

Freitas Albernaz, a criação dos títulos de crédito “trouxe novos contornos às práticas<br />

comerciais, na medida em que valorizou a figura do crédito, dando-lhe posição de<br />

destaque no fomento das atividades desenvolvidas pelos comerciantes e os<br />

modernos empresários.” 64<br />

Depreende-se, portanto, que os negócios que se realizam por meio de tais<br />

títulos adquirem notável velocidade, o que se deve à possibilidade de essencial<br />

rapidez em sua circulação. Portanto, àqueles que com esses títulos transacionam,<br />

deve ser assegurada, além da velocidade, a segurança, que são importantes à<br />

realização dos negócios. 65<br />

Maria Bernadete Miranda acentua que “com o aparecimento dos títulos de<br />

crédito e a possibilidade de circulação fácil dos direitos neles incorporados, o mundo,<br />

na verdade, ganhou um dos mais decisivos instrumentos para o desenvolvimento e o<br />

progresso.” 66<br />

O título de crédito, também denominado título de valor, é um documento de:<br />

“direito, de conteúdo patrimonial, que pode ser exercido pelo possuidor do<br />

documento. O direito se incorpora ao documento, de forma que a cessão<br />

deste implica na transmissão do direito, facilitando desse modo a sua<br />

63 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 1977.<br />

64 ALBERNAZ, Lister Freitas. Op. Cit. 2006, p.1.<br />

65 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003.<br />

66 MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006(a), p.1.<br />

31


circulação. São títulos de crédito as ações de uma sociedade anônima, a<br />

letra de câmbio e os cheques ao portador. Podem ser títulos ao portador<br />

anônimos, quer dizer, os que permitem que qualquer possuidor do título<br />

(que deve ser apresentado) possa exigir o direito a ele incorporado, embora<br />

não seja titular do mesmo; ou títulos nominais são os que designam uma<br />

determinada pessoa a quem deve ser paga a ordem de quem o<br />

subscreve.” 67<br />

Os títulos de crédito, definidos em lei como títulos executivos extrajudiciais<br />

(Código do Processo Civil – CPC, art. 585, inciso I), possibilitam a execução<br />

imediata do valor devido.<br />

Fábio Ulhoa Coelho 68 definiu os títulos de crédito como:<br />

“documentos representativos de obrigações pecuniárias. Não se confundem<br />

com a própria obrigação, mas se distinguem dela na exata medida em que<br />

representam. Como documento, ele reporta um fato, ele diz que alguma<br />

coisa existe [...]; o título prova a existência de uma relação jurídica,<br />

especificamente de uma relação de crédito; ele constitui a prova de que<br />

certa pessoa é credora de outra, ou de que duas ou mais pessoas são<br />

credoras de outras.”<br />

Para Navarrini (apud NEWTON LUCCA), o título de crédito “é como um<br />

documento que certifica uma operação de crédito, cuja posse é necessária para<br />

exercer o direito que dele deriva e para conferi-lo a outras pessoas.” 69<br />

Já Alberto Asquini 70 define título de crédito “como um documento de um<br />

direito literal destinado à circulação, idôneo a conferir de modo autônomo a<br />

titularidade de tal direito ao proprietário do documento, e necessário e suficiente para<br />

legitimar o possuidor ao exercício do mesmo direito.”<br />

Fran Martins 71 elucida que para ser título de crédito é necessário que a<br />

declaração obrigacional esteja exteriorizada em um documento escrito, corpóreo, em<br />

geral uma coisa móvel (cartularidade).<br />

“Tal documento é necessário ao exercício dos direitos nele mencionados. A<br />

literalidade, por sua vez, reside no fato de que só vale o que se encontra<br />

escrito no título. A autonomia do título de crédito determina que cada pessoa<br />

que a ele se vincula assume obrigação autônoma relativa ao título. É em<br />

razão da autonomia do título de crédito que o possuidor de boa-fé não tem o<br />

seu direito restringido em decorrência de negócio subjacente entre os<br />

primitivos possuidores e o devedor.”<br />

67 Enciclopédia® Microsoft®. Título de crédito. Encarta 2001. © 1993-2000. Microsoft Corporation, p.1.<br />

68 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, 6 ed. revisada e atualizada, de acordo com o<br />

novo código civil (Lei n. 10.406, de 10/01/2002). São Paulo: Saraiva, 2002, p.369-370.<br />

69 LUCCA, Newton. Aspectos da teoria geral dos títulos de crédito. São Paulo: Pioneira, 1979. p. 18.<br />

70 ASQUINI, Alberto. Titolo di Credito. (Trad. Livre). Pádua: Giuffrè, 1966. p. 49.<br />

71 MARTINS, Fran. Op. Cit. 1995, p. 52.<br />

32


Conforme Waldirio Bulgarelli, “os títulos de crédito representam o principal<br />

instrumento de circulação da riqueza, devendo ser dotados de certos requisitos que<br />

os caracterizam frente aos demais documentos.” 72 Esse documento, de acordo com<br />

Fran Martins, “é necessário para o exercício dos direitos nele mencionados.” 73<br />

Em que pese ao mérito de outras definições, a clássica definição de Cesare<br />

Vivante 74 é que o título de crédito é “o documento necessário para o exercício do<br />

direito literal e autônomo nele mencionado.”<br />

Essa definição foi adotada pelo ordenamento jurídico, através do NCC de<br />

2002, em seu art. 887, que consta: “O titulo de crédito, documento necessário ao<br />

exercício literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preenche os<br />

requisitos da lei.”<br />

Analisando este conceito, pode-se inferir que o título de crédito é um<br />

documento, e isso significa que, para se ter um título de crédito, será indispensável a<br />

existência de um documento escrito, que poderá ser um papel, uma coisa corpórea,<br />

material, em que se possa vir inscrita a manifestação da vontade do declarante.<br />

Acrescenta Fran Martins 75 que dentre as inúmeras definições que foram<br />

dadas aos títulos de crédito, coube a Cesare Vivante formular aquela que, sem<br />

dúvida, é a mais completa, pois encerra, em poucas palavras, algumas das<br />

principais características desses instrumentos.<br />

No Brasil, José Maria Whitaker 76 se destacou ao abordar o conceito sob o<br />

enfoque econômico. Segundo o autor, “todo documento capaz de realizar<br />

imediatamente o valor que representa é um título de crédito.” É importante destacar<br />

que esse aspecto não abordado por Vivante, o da fungibilidade do título, consiste na:<br />

“mobilização imediata de seu valor, permitindo-se ao portador receber a<br />

importância contida no documento, antes da data do vencimento, por meio<br />

de uma operação denominada desconto bancário. Pelo desconto, o<br />

banqueiro paga ao portador o valor do título diminuído do juro devido em<br />

razão do prazo que medeia as datas do pagamento e a data do vencimento<br />

do mesmo: afinal, o título nasce com o objetivo de circular e não o de restar<br />

nas mãos das partes primitivas. Ele realiza uma função nitidamente<br />

econômica. Trata-se, pois, de um verdadeiro elemento propiciador de<br />

circulação rápida e segura de riqueza e, em conseqüência, dinamizador da<br />

72<br />

BULGARELLI, Waldirio. Op. Cit. 1999, p. 53.<br />

73<br />

MARTINS, Fran. Op. Cit. 1977, p.5.<br />

74<br />

VIVANTE, Cesare. Trattato di Diritto Commerciale, v.3, 5. ed. (Trad. Livre). Milano: F. Vallardi,<br />

1945, p.154.<br />

75<br />

MARTINS, Fran, Op. Cit. 1977.<br />

76<br />

WHITAKER, José Maria. Letra de câmbio. 6. ed. Rio de Janeiro: RT, 1985, p. 18.<br />

33


economia. É estimável, portanto, a contribuição do título de crédito para a<br />

formação e o desenvolvimento das modernas economias de mercado.” 77<br />

Na concepção de José Luiz da Silva Machado, 78 a vida econômica seria de<br />

todo inadmissível sem a existência dos títulos de crédito, eis que faltariam meios<br />

jurídicos para a adequada formalização das relações comerciais, as quais, por essa<br />

razão, teriam necessariamente de assumir outro aspecto.<br />

É importante enfatizar que, “diferentemente dos outros institutos jurídicos, no<br />

título de crédito o Direito materializa-se ou incorpora-se no documento e não na<br />

pessoa possuidora do papel. Perdido o papel denominado “título de crédito, o direito<br />

normalmente segue-lhe o destino.” 79<br />

Pode-se inferir, então, que o título de crédito é como um documento formal<br />

que representa valor, dando a seu possuidor o direito de exigir de outrem o<br />

cumprimento da obrigação nele contida.<br />

2.4. Requisitos essenciais aos títulos de créditos<br />

Os títulos de crédito são instrumentos caracterizados de forma a cumprirem<br />

sua função de circular valores com segurança e facilidade. Como coloca Túllio<br />

Ascarelli,<br />

“[...] a circulação dos créditos, vale dizer – o máximo de rapidez e de<br />

simplicidade no transmiti-los a vários adquirentes sucessivos, com o mínimo<br />

de insegurança para cada adquirente que deve ser posto, não só em<br />

condições de conhecer pronta a eficazmente aquilo que adquire, mas,<br />

também a salvo das exceções cuja existência não lhe fosse dado notar,<br />

facilmente, no ato de aquisição.” 80<br />

A circulação dos títulos de crédito só foi possível devido a princípios que os<br />

incorporam e norteiam. Não seria possível a circulação das cambiais sem a<br />

existência de uma estrutura bem definida e uniforme de regras e princípios basilares,<br />

que se constituem em características indeléveis dos títulos cambiais.<br />

77 LOPES, André Cortes Vieira. Inoponibilidade das exceções ao terceiro de boa-fé nos títulos<br />

cambiais. Disponível em: . Acesso em: 02 set. de<br />

2006, p.1.<br />

78 MACHADO, José Luiz Silva. Os títulos de crédito e seus caracteres singulares, v.1. Salvador:<br />

Forense, 1961, p.55-61.<br />

79 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.70.<br />

80 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969, p.19.<br />

34


Entre as características fundamentais dos títulos de crédito, esboçadas por<br />

Cesare Vivante, três merecem maior destaque por serem caracteres preponderantes<br />

da circulação de créditos: Cartularidade, Literalidade e Autonomia.<br />

2.4.1. Cartularidade<br />

A característica da cartularidade significa a necessidade de um documento,<br />

isto é, o documento é necessário para a realização, para o exercício dos direitos<br />

cambiais.<br />

Verifica-se, desta forma, que a cartularidade consiste na materialização do<br />

direito no documento, ou seja, não pode o direito ser exercido sem a apresentação<br />

do documento. Assim, pode-se dizer que o direito se incorpora ao documento,<br />

expressão usada até mesmo por Cesare Vivante. A expressão cartularidade ou<br />

direito cartular (de chartula) é empregada para significar tanto a incorporação do<br />

direito ao documento, como direito decorrente do título em relação ao negócio<br />

subjacente, de relação extracartular. Portanto, “cártula significa o direito (abstrato)<br />

que se apresenta sob a forma de título. É a exteriorização do título por meio de um<br />

documento. A exibição desse documento é necessária para o exercício do direito de<br />

crédito nele mencionado.” 81<br />

Nesta mesma linha de pensamento, Fábio Ulhoa Coelho 82 coloca que<br />

“somente quem exibe a cártula pode pretender a satisfação de uma pretensão<br />

relativamente ao direito documentado pelo título.”<br />

“Para que o credor de um título exerça os direitos por ele representados é<br />

indispensável que se encontre na posse do documento (também conhecido<br />

como cártula). Sem o preenchimento dessa condição, mesmo que a<br />

pessoa seja efetivamente a credora, não poderá exercer o seu direito de<br />

crédito valendo-se dos benefícios do regime jurídico-cambial.” 83<br />

Assim, a cartularidade é a necessidade da apresentação do título para o<br />

exercício do direito nele mencionado: "o credor deve possuí-lo, deve apresentá-lo ao<br />

devedor e deve restituí-lo a este quando receber o respectivo valor.” 84<br />

81<br />

MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006 (a), p.4.<br />

82<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Op. Cit. 2002, p.372.<br />

83<br />

Idem, 2003, p.229.<br />

84<br />

PEREIRA, Pedro Barbosa. Curso de direito comercial, v.2, 2.ed. São Paulo: RT, 1968, p.136.<br />

35


O direito, portanto, "não se encontra incorporado ao título”, como prepondera<br />

João Eunápio Borges 85 , mas permanece em uma relação de conexidade àquele:<br />

“[...] essa situação reveste-se de nitidez quando há a hipótese de perda do<br />

título: o direito à sua recuperação está fora da cambial e funda-se no vínculo<br />

jurídico existente entre credor e devedor; somente extingue-se ela no<br />

instante em que o direito cartular for exercido, quando, então, ocorrerá a<br />

confusão dos dois direitos (o direito cartular e o direito à recuperação).<br />

Enquanto não for exercido o direito cartular, o direito à recuperação continua<br />

fora do título.”<br />

A definição legal presente na Lei nº 10.406 de 2002, art. 887, afirma que: “o<br />

título de crédito, documento necessário ao exercício literal e autônomo nele contido,<br />

somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.”<br />

O legislador, ao colocar a palavra documento na norma cogente, diz,<br />

necessariamente, que o título de crédito deve ser um documento físico e palpável,<br />

um material, ainda que não seja exatamente papel, mas que constitua fisicamente o<br />

documento. Por isso, o título de crédito resulta num título de apresentação, ou seja,<br />

seu portador ou detentor deve apresentá-lo ao devedor ou a quem deva pagar.<br />

Não seria possível, por exemplo, que um título de crédito tivesse seu direito<br />

provado oralmente, ainda que houvesse gravação em fita magnética que pudesse<br />

ser repetida a qualquer hora. Mesmo que cem testemunhas possam afirmar o direito,<br />

o título de crédito só se constitui por documento escrito e palpável, que pode ser um<br />

papel, um pergaminho, devendo, de qualquer modo, ser um instrumento onde se<br />

possa ver a manifestação de vontade.<br />

Contudo, não é necessário que todas as declarações constantes do título<br />

sejam escritas de próprio punho pelo declarante do direito. Torna-se, assim,<br />

necessário apenas a assinatura da pessoa reconhecendo o crédito escrito no<br />

documento.<br />

2.4.2. Literalidade<br />

A literalidade é a medida do direito que está contido no título. A literalidade<br />

entende-se no sentido de que, “para a determinação da existência, conteúdo,<br />

extensão e modalidades do direito, é decisivo exclusivamente o teor do título; sendo<br />

85 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1976, p.12-13.<br />

36


assim, o título de crédito obedece rigorosamente ao que nele está contido.” 86 É o<br />

princípio característico dos títulos de crédito; como os demais, também faz parte da<br />

definição legal de título de crédito, conforme descrito no art. 887 do NCC, quando se<br />

impõe que o título é documento necessário ao exercício literal e autônomo nele<br />

contido.<br />

Cesare Vivante explicitou a literalidade, ao referir que o direito mencionado no<br />

título é literal, porquanto ele existe segundo o teor do documento. Pode-se inferir<br />

que a melhor acolhida pela doutrina foi a lição de Messineo (apud NEWTON<br />

LUCCA): "O direito decorrente do título é literal no sentido de que, quanto ao<br />

conteúdo, à extensão e às modalidades desse direito, é decisivo exclusivamente o<br />

teor do título.” 87<br />

A literalidade, para Marco Aurélio Ventura Peixoto, “significa que somente se<br />

considera aquilo que estiver escrito no título de crédito.” 88 Ao ser título representado<br />

por um documento escrito, é de se esperar que a declaração constante do<br />

documento descreva e especifique o direito de crédito nele incorporado. E, mais que<br />

declarar e especificar o que nele está escrito, limita o direito. Nos dizeres de Fran<br />

Martins, “literalidade é, assim, o que está escrito no título, limitando os direitos nele<br />

incorporados.” 89<br />

Em um título, o importante é o que está escrito nele, significando que o que<br />

nele consta tem valor, ao passo que o que não consta, por escrito, não vale nem se<br />

pode alegar.<br />

O princípio da literalidade é de suma importância para a circulação e<br />

existência dos títulos de crédito, uma vez que a delimitação das obrigações neles<br />

constantes oferece extrema segurança ao emitente e demais obrigados pelo<br />

documento. Menciona o jurista Theophilo de Azevedo Santos 90 que a “literalidade<br />

visa proteger terceiros, que confiam no teor do título, e a evitar discussões que<br />

prejudicariam a rápida circulação do mesmo.”<br />

Túllio Ascarelli coloca, com propriedade, sobre a importância da literalidade<br />

dos títulos de crédito, ensinando que:<br />

86 MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006 (a), p.5.<br />

87 LUCCA, Newton. Op. Cit. 1979, p. 79.<br />

88 PEIXOTO, Marco A. V. Documentos eletrônicos: a desmaterialização dos títulos de crédito.<br />

Disponível em:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2361>. Acesso em: 02 set. de 2006, p.2.<br />

89 MARTINS, Fran. Op. Cit. 1995, p.10.<br />

90 SANTOS, Theophilo Azevedo. Manual dos títulos de crédito. Rio de Janeiro: Companhia Editora<br />

Americana CEA, 1971, p.4.<br />

37


“a explicação da literalidade, em que a doutrina eleva a característico<br />

essencial do título de crédito, está na autonomia da declaração<br />

mencionada no mesmo título (declaração cartular) e na função constitutiva<br />

que, a respeito da declaração cartular e de qualquer das suas<br />

modalidades, exerce a redação do título; essa declaração está, pois,<br />

submetida exclusivamente à disciplina que decorre das cláusulas do<br />

próprio título. Se a nossa explicação não fosse exata, se o documento<br />

tivesse apenas uma eficácia probatória da declaração documentada, o<br />

portador do título – ao contrário do que antes lembramos – poderia gozar<br />

de direitos diversos dos decorrentes do título, mesmo sem recorrer a<br />

qualquer convenção extracartular.” 91<br />

Depreende-se, portanto, que a literalidade pode ser encarada sob duplo<br />

enfoque: tanto pode atuar favoravelmente ao credor do título de crédito, facultando a<br />

este exigir todos os direitos nele mencionados, quanto, de idêntica maneira, em favor<br />

do devedor, já que o credor está impossibilitado de pedir mais do que o estabelecido<br />

no documento. 92<br />

Os ensinamentos do ilustre Paulo da Silva Pinto 93 são relevantes para o<br />

assunto em pauta:<br />

“Forte argumento no sentido de se reconhecer a literalidade no sistema<br />

anglo-americano é a existência da parol evidence rule, prevista em common<br />

law. De acordo com esta regra, não se admite prova testemunhal para<br />

contrariar ou modificar o teor de um documento em que se contenham os<br />

termos de um contrato. Há uma preferência absoluta em favor da prova<br />

documental. Diante dessa, desaparece a possibilidade de recurso à prova<br />

testemunhal, sempre passível de vícios e incertezas. Como a cambial basta<br />

a si mesma, não se admite qualquer prova testemunhal para contrariar os<br />

seus termos.”<br />

Para Túllio Ascarelli, 94 o conceito de literalidade não foi aprofundado na<br />

doutrina brasileira. Segundo o autor, não existe um único autor que tenha se<br />

preocupado com o assunto. Ele explica a literalidade: “na autonomia da declaração<br />

mencionada no título e na função constitutiva em que exerce a sua redação-<br />

declaração cartular”, esta que se verifica submetida “exclusivamente à disciplina<br />

decorrente das cláusulas constantes no próprio título.” É esse o passo mais<br />

importante para a compreensão dos títulos de crédito e, conseqüentemente, para o<br />

entendimento de seu alcance.<br />

91 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969, p. 40.<br />

92 LOPES, André Cortes Vieira. Op. Cit. 2006, p.3.<br />

93 PINTO, Paulo José Silva. Direito cambiário: garantia cambiária e direito comparado. Rio de Janeiro:<br />

Forense, 1948. p.57.<br />

94 ASCARELLI, Túllio. Op. Cit. 1969, p.56.<br />

38


2.4.3. Autonomia<br />

Como último requisito essencial, tem-se a autonomia, que se manifesta<br />

também no conceito de Cesare Vivante e na lei, promovendo a circulação segura e<br />

autônoma dos títulos.<br />

André Cortes Vieira Lopes coloca que a expressão autonomia, para quase<br />

toda a doutrina, indica que “o direito do titular é um direito independente no sentido<br />

de que cada pessoa, ao adquirir a cártula, recebe um direito próprio, diferente do<br />

direito que tinha ou podia ter quem lhe transferiu o mencionado título.” 95<br />

O ilustre Pontes de Miranda 96 elucida a autonomia afirmando que:<br />

“[...] a necessidade de assegurar a circulação cambiária levou à concepção<br />

da autonomia das obrigações cambiárias. Certamente, o título cambiário é<br />

unidade, e por vezes o designamos pela expressão ato unitário; mas,<br />

coexistente com a aparência do todo, há a aparência dos outros singulares,<br />

cujo despregamento resulta do fato mesmo das assinaturas, que são<br />

diversas e lançadas em diversos tempos. Seria sem história e, portanto,<br />

sem traços do tráfico, título em que, a despeito da multiplicidade das mãos<br />

por que andou, recebesse declarações bilaterais de vontade, sem lhes<br />

assegurar autonomia. O andar deu-lhe o ser soltura que se reflete, como<br />

vimos, na solidariedade cambiária.”<br />

A autonomia implica que as obrigações cambiais são independentes, isto é,<br />

os terceiros de boa-fé não podem ser prejudicados, havendo uma inoponibilidade<br />

das exceções ao terceiro de boa-fé. 97<br />

Pela autonomia, “seu adquirente passa a ser o titular do direito autônomo,<br />

independentemente da relação anterior entre os possuidores”. 98 A autonomia,<br />

conforme aduz o ilustre Wille Costa Duarte, 99 se manifesta sobre dois aspectos,<br />

quais sejam:<br />

“1) Autonomia do direito - significa que o direito do legítimo possuidor do<br />

título é autônomo ou independente em relação aos possíveis direitos dos<br />

anteriores possuidores do título, aos quais se vincula. O possuidor exerce<br />

um direito próprio e não derivado do direito de quem quer que seja;<br />

2) Autonomia das obrigações cambiais - corresponde ao fato das diversas<br />

obrigações existentes no título serem independentes, não se vinculando<br />

uma à outra, de tal forma que uma obrigação nula não afeta as demais<br />

obrigações válidas no título.”<br />

95 LOPES, André Cortes Vieira. Op. Cit. 2006, p.11.<br />

96 MIRANDA, Pontes. Tratado de direito privado. 2.ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1961, p.119.<br />

97 PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura. Op. Cit. 2006, p.4.<br />

98 MIRANDA, Maria Bernadete. Op. Cit. 2006 (b), p.3.<br />

99 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.71.<br />

39


Também são autônomas as diversas obrigações cambiais existentes no título,<br />

não se veiculando uma à outra. Assim, dispõe o art. 7º da LUG que:<br />

“se a letra contém assinaturas de pessoas incapazes de se obrigarem por<br />

letras e assinaturas falsas, assinaturas de pessoas fictícias ou assinaturas<br />

que por qualquer outra razão não poderiam obrigar as pessoas que<br />

assinarem a letra, ou em nome das quais ela foi assinada, as obrigações<br />

dos outros signatários nem por isso deixam de ser válidas.”<br />

De acordo com o princípio da autonomia, as obrigações assumidas pelos<br />

diversos responsáveis por um título são autônomas entre si, e não intervêm,<br />

portanto, umas nas outras. O portador de um título não tem relação ou<br />

responsabilidade perante as demais relações condensadas no mesmo instrumento,<br />

somente respondendo pela sua própria relação, ou seja, pelo vínculo mantido com<br />

quem lhe tenha transmitido o direito ao crédito. Em relação aos demais coobrigados,<br />

o portador é considerado um terceiro de boa-fé, alheio aos problemas negociais<br />

anteriores e não atingido por eles.<br />

Enfatiza-se que este princípio não impõe autonomia somente face à causa<br />

original, ensejadora da criação do título – causa debendi – como se percebe em<br />

algumas explanações sobre o tema, mas, sim, entre todas as relações<br />

eventualmente existentes ao longo da circulação da cambial.<br />

Verifica-se que existem diversas teorias a respeito da autonomia, mas a que<br />

parece predominar é a de que “a relação existente entre o sujeito portador do título e<br />

o documento é de natureza real.” Assim sendo, quanto “ao direito que surge da<br />

cártula, tratando-se de um direito constitutivo, cada um dos proprietários da cambial<br />

o adquire de forma originária, em uma relação real e não derivada de um acordo”. 100<br />

Após esta exposição sobre os aspectos gerais dos títulos de crédito,<br />

apresentam-se, no próximo capítulo, alguns pressupostos sobre fiança.<br />

100 LOPES, André Cortes Vieira. Op. Cit. 2006, p.10.<br />

40


3. PRESSUPOSTOS SOBRE FIANÇA<br />

3.1.1. Aspectos gerais e essências<br />

A “origem da fiança é antiga”. 101 "No direito romano, a palavra cautio (de<br />

cavere, guardar) designava todas as garantias que um devedor podia dar ao credor.<br />

Todas elas (sponsio, fidejussio, fidepromissio, mandatum, pecuniae, credentiae)<br />

vieram a fundir-se no moderno instituto da fiança.” 102<br />

Manoel de Queiroz Pereira elucida que a fiança é regulada pelo CC e que “se<br />

encarta no gênero dos contratos de caução ou de garantia, os quais podem ser reais<br />

ou fidejussórios.” 103 Ela tem a finalidade de outorgar ao credor uma garantia<br />

adicional àquela consubstanciada no patrimônio do devedor.<br />

A fiança caracteriza-se, ainda, “como obrigação unilateral, uma vez que o<br />

fiador assume obrigações em relação ao credor, o qual, no entanto, não se obriga<br />

em relação àquele.” 104<br />

O objetivo do contrato de fiança é aumentar as chances de adimplemento de<br />

uma obrigação, o que é feito através da inclusão de uma garantia, de natureza<br />

pessoal, dada por um terceiro em relação ao credor, caso o devedor não pague a<br />

dívida originalmente assumida. Desta forma, haverá maior probabilidade do<br />

recebimento do quantum devido.<br />

propõe a:<br />

Segundo James Corrêa Caldas 105 , a fiança ocorre quando terceira pessoa se<br />

“pagar a dívida do devedor, se este não o fizer. É contrato acessório,<br />

unilateral, solene e, em regra, gratuito. É acessório porque garante a<br />

obrigação principal. É unilateral porque só gera obrigação para o fiador, com<br />

relação ao credor. É solene porque depende de forma escrita, imposta pela<br />

lei, e sua validade fica condicionada a outorga uxória. É gratuito porque o<br />

fiador, em geral, nada recebe; inspira-se apenas no propósito de ajudar o<br />

afiançado.”<br />

101<br />

ZAINAGH, Maria Cristina. A fiança locatária e novo código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />

2003, p. 38-42.<br />

102<br />

GONÇALVES, Cunha apud SANTOS, J. M. Carvalho. Código civil brasileiro interpretado: direito<br />

das obrigações. 12. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1988. p. 433.<br />

103<br />

CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Exoneração da fiança. Disponível em: . Acesso em: 13 set. de 2006., p.1.<br />

104<br />

Idem, 2006, p.1.<br />

105<br />

CALDAS, James Corrêa. Fiança e benefício da ordem. Disponível em: . Acesso em: 13 set. de 2006, p.1.<br />

41


O art. 1.481 do atual CC (Lei 3.071/16) assim define a fiança: “Dá-se o<br />

contrato de fiança, quando uma pessoa se obriga por outra, para com o seu credor,<br />

a satisfazer a obrigação, caso o devedor não a cumpra.”<br />

Da mesma forma, o NCC (Lei 10.406 de 10/01/20032), que entrou em vigor<br />

em 11/01/2003, traz a seguinte definição: “Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma<br />

pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso<br />

esse não a cumpra.”<br />

Para Holmes Anderson 106 , a fiança pode ser definida como “um contrato pelo<br />

qual um devedor acessório junta-se a um devedor principal a fim de garantir o<br />

adimplemento da obrigação por este assumida. Portanto, o fiador é um devedor<br />

acessório, que se obriga a cumprir uma obrigação, caso o devedor principal não o<br />

faça”.<br />

O ilustre Clóvis Beviláqua 107 aduz que a fiança é um contrato bilateral<br />

imperfeito. O autor argumenta que se o fiador pagar o débito afiançado, subrogar-se-<br />

à nos direitos do credor principal, sendo-lhe assegurado o direito de propor ação<br />

contra o devedor para ser reembolsado dos valores que pagou por conta do débito<br />

daquele. Enfatiza, ainda, que é contrato gratuito, uma vez que, em regra, institui<br />

obrigações apenas para o fiador, o qual, por seu turno, normalmente, não aufere<br />

nenhum benefício.<br />

No que concerne à fiança, os doutrinadores parecem concordar que ela é, de<br />

regra, um negócio jurídico gratuito, podendo, no entanto, ser oneroso, já que é<br />

possível estipular contraprestação à garantia firmada.<br />

Em decorrência de sua onerosidade (ex vi, do art. 1.090 do NCC), o contrato<br />

de fiança deverá ser interpretado estritamente quanto à pessoa afiançada, quanto à<br />

sua duração e quanto ao seu objeto. Mesmo que o contrato de fiança fosse oneroso,<br />

pelo exposto no art. 1.4833 do CC, também não se admitiria a interpretação<br />

extensiva.<br />

Segundo Lauro Laertes de Oliveira, 108 “[...] a fiança não passa de pessoa a<br />

pessoa [...], afiançado “B”, num contrato de locação, se houver cessão da locação<br />

para “C” (com anuência do locador), extinguir-se-á a fiança.”<br />

106<br />

ANDERSON, Holmes. Fiança. Disponível em: . Acesso em: 14<br />

set. de 2006, p.1.<br />

107<br />

BEVILÁQUIA, Clóvis. Código civil comentado. São Paulo: Editora Paulo de Azevedo, 1957.<br />

108<br />

OLIVEIRA, Lauro Laertes. Da fiança. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1986, p.23.<br />

42


Lecionando a respeito da fiança, Caio Mário da Silva Pereira 109 enumerou<br />

seus caracteres jurídicos.<br />

“[...] Gratuito, em regra, referentemente ao devedor; nem sempre, porém,<br />

pois há casos em que o afiançado remunera o fiador pela fiança prestada;<br />

anúncios são encontrados nos jornais, contento propostas de fiança, nos<br />

termos mencionados.”<br />

Corroborando, Maria Helena Diniz menciona que:<br />

“A fiança convencional apresenta as seguintes características: [...]<br />

Gratuidade, que incidirá sobre o crédito concedido ao devedor, pois, em<br />

regra, o fiador não receberá uma remuneração, mas apenas procurará<br />

ajudar o afiançado, pessoa em quem confia e que, espera, cumprirá a<br />

obrigação assumida. [...] Todavia, a gratuidade é natureza da fiança e não<br />

de sua essência; logo, nada obsta que o fiador reclame certa remuneração,<br />

o que é muito comum na fiança bancária, em que os bancos assinam<br />

termos de responsabilidade em favor de seus clientes, em troca de uma<br />

porcentagem sobre o montante garantido. O mesmo ocorre com<br />

determinadas firmas especializadas em prestar fiança, mediante<br />

porcentagem. Nestes casos, está claro que a fiança estará onerosa.”<br />

A fiança será, portanto, em geral, gratuita, visto que trará vantagens apenas<br />

para o devedor, que terá ao seu dispor o crédito concedido pelo fiador e não estará<br />

obrigado a qualquer contraprestação. No entanto, é possível que eles despertem<br />

para o fato de o afiançado ficar obrigado a algo, a título de contraprestação ao<br />

crédito a ele concedido pelo fiador. Não é outra a opinião de Washington de Barros<br />

Monteiro 110 , o qual menciona que:<br />

“[...] gratuito, em regra, referentemente ao devedor; nem sempre, porém,<br />

pois há casos em que o afiançado remunera o fiador pela fiança prestada;<br />

anúncios são encontrados nos jornais, contendo propostas de fiança, nos<br />

termos mencionados.”<br />

Depreende-se, desta forma, que a gratuidade é da natureza da fiança, mas<br />

não da sua essência; porquanto, caso se estipule contraprestação, a fiança passa a<br />

109<br />

PEREIRA, Caio Mário Silva. Instituições de direito civil: fontes de obrigações, v.3. Rio de Janeiro:<br />

Forense, 1963, p.457.<br />

110<br />

MONTEIRO, Washington Barros. Curso de direito civil: direito das obrigações. 6 ed, 2ª parte. São<br />

Paulo: Saraiva, 1969, p. 378.<br />

43


ser onerosa, mas não deixa de ser fiança. Isto que dizer que o elemento gratuidade<br />

não é essencial para que se configure a fiança, embora em regra esteja presente.<br />

A fiança é uma espécie contratual que tem como objeto garantir um negócio<br />

jurídico principal. É, pois, contrato acessório, tendo como pressuposto de existência<br />

o contrato principal por ela garantido.<br />

Como elemento de garantia, a fiança vem aumentar as possibilidades para o<br />

credor receber a dívida. Se o devedor não pagar a dívida e seu patrimônio for<br />

insuficiente para assegurar uma possível execução, pode o credor voltar-se contra o<br />

fiador, reclamando o pagamento e executando seus bens para obter o pagamento.<br />

As garantias podem ser de dois tipos: real ou pessoal, sendo que a fiança é<br />

espécie desta segunda. Assim, explica Cáio Mário da Silva Pereira: 111<br />

“No gênero caução compreende-se todo negócio jurídico como objetivo de<br />

oferecer ao credor uma segurança de pagamento, além daquela genérica<br />

situada no patrimônio do devedor (v.67, supra v.3). [...] Mas pode realizarse,<br />

também, mediante a segurança de pagamento oferecida por um terceiro<br />

estranho à relação obrigatória, o qual se compromete a solver pro debitare,<br />

e desta sorte nasce a garantia pessoal ou fidejussória [...]Como garantia<br />

pessoal (fideiusso, cautionnement, fideiussione), ora resulta do acordo<br />

livremente (fiança convencional), ora emana da lei (fiança legal), ora provém<br />

de imposição do juiz (fiança judicial).”<br />

Washington de Barros Monteiro 112 coloca fiança como, “efetivamente,<br />

obrigação acessória, e por isso não pode ser mais extensa e mais gravosa que a<br />

principal, quer no seu objeto, quer nos seus acidentes de modo e de tempo [...].”<br />

Corroborando, Orlando Gomes 113 coloca que a fiança “pode ter duração<br />

limitada ou ilimitada, mas se for dada em limitação de tempo, o fiador pode exonerar-<br />

se da obrigação a todo o tempo.” (Art. 835 do CC de 2002).<br />

Outro aspecto importante quanto à fiança é a imprescindibilidade da outorga<br />

uxória. Mas a nulidade da fiança, nesta situação, poderá ser desconsiderada,<br />

segundo parte da jurisprudência, caso haja a dissolução da sociedade conjugal.<br />

Firmada a fiança, seus efeitos começam a ocorrer imediatamente e<br />

diretamente entre fiador e credor. Em um segundo plano, entre fiador e devedor. O<br />

credor tem o direito de exigir do fiador o pagamento da dívida inadimplida pelo<br />

111 PEREIRA. Op. Cit. 1963, p. 341.<br />

112 MONTEIRO. Op. Cit. 1969, p. 378.<br />

113 GOMES, Orlando apud JÚNIOR THEODORO, Humberto. A fiança e a prorrogação do contrato de<br />

locação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p.67-83.<br />

44


devedor afiançado, mas tem o fiador o direito de requerer o benefício de ordem.<br />

Consoante a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira, 114<br />

“[...] demandado, tem o fiador o benefício de ordem, em virtude do qual lhe<br />

cabe exigir, até a contestação da lide, que seja primeiramente executado o<br />

devedor, e, para que se efetive, deverá ele nomear bens a este<br />

pertencentes, sitos no mesmo município, livres e desembargados,<br />

suficientes para suportar a solução de débito.” (CÓDIGO CÍVIL, ARTIGO Nº<br />

1.491).<br />

Quanto aos efeitos da fiança na relação entre fiador e devedor, após paga a<br />

dívida em sua totalidade pelo seu garantidor, este sub-roga-se nos direitos do<br />

credor. Assim, o fiador poderá agir regressivamente contra o seu afiançado para que<br />

este faça o ressarcimento do que foi pago, além de possíveis prejuízos sofridos por<br />

ele.<br />

“Mas, [...] para que lhe compita a sub-rogação, deverá pagar integralmente<br />

a dívida, pois que, sendo garantidor do afiançado, não pode concorrer com<br />

o credor, não totalmente satisfeito, na execução dos bens do devedor.” 115<br />

Falecendo o fiador, suas obrigações transmitem-se para seus herdeiros,<br />

respeitando-se, entretanto, as forças da herança, que não podem ser ultrapassadas.<br />

Segundo Caio Mário 116 , extingui-se a fiança nos seguintes casos:<br />

a) fato do fiador – este tem o direito de ser exonerado quando lhe convier,<br />

desde que a fiança tenha sido dada sem limitação de tempo, uma vez que<br />

prazo indeterminado não pressupõe perpetuidade. Para isto, deverá<br />

requerer ao credor a sua exoneração. Se este não o fizer, deverá pedir em<br />

juízo a sua liberação, que será feita, portanto, a partir de sentença judicial;<br />

b) fato do credor – se este conceder moratória ao devedor, dilatando o prazo<br />

para o cumprimento da obrigação sem a anuência do fiador, ocorrerá a<br />

extinção da fiança, uma vez que isto poderá agravar a situação do<br />

devedor, que poderá não ter mais bens para garantir o pagamento,<br />

impedindo o direito de regresso do fiador. Se também o credor renunciar<br />

às outras garantias que tem, impossibilitando que o fiador sub-rogue-se<br />

em todos os seus direitos, também cessará a fiança;<br />

114 PEREIRA. Op. Cit. 1963, p.378.<br />

115 Idem, 1963, p.343.<br />

116 Idem, 1963.<br />

45


c) extinção da obrigação garantida – se esta for paga ou se ocorrer, quanto à<br />

dívida principal, novação, compensação, confusão ou remissão, a fiança,<br />

como contrato acessório, também será extinta.<br />

A partir deste ponto, faz-se necessário abordar o aval, no sentido de tornar<br />

mais objetivo o entendimento deste estudo.<br />

46


4. AVAL<br />

4.1. Evolução histórica do aval<br />

De acordo com alguns doutrinadores, a etimologia do termo aval surgiu de<br />

três correntes doutrinárias. A primeira deriva do termo francês faire valois ou de a<br />

valoir, do equivalente latino a valere. Neste caso, o aval é o ato que faz valer, que<br />

atribui valor ao crédito cambiário por ele garantido. Esta etimologia tem suporte na<br />

antiga doutrina francesa, e é seguida por alguns juristas modernos. A segunda<br />

corrente encontra a fonte do aval na palavra hawâda, do Direito Árabe, como sendo<br />

uma obrigação de garantia, semelhante à figura do aval. A terceira e última corrente<br />

repousa no Direito italiano, avallo, correspondente ao francês aval, a explicação do<br />

termo aval. 117<br />

Evidencia-se, portanto, que a evolução histórica do aval tem pouca<br />

importância para o Direito Comercial, haja vista que está o Direito Comercial sujeito,<br />

por natureza, a constante transformação e rápida evolução, fazendo com que a sua<br />

aplicação prática não dependa de um escorço histórico mais pormenorizado.<br />

A história do aval confunde-se com a própria história da letra de câmbio,<br />

desde o limiar do século XIII, quando da regulamentação do instituto pela<br />

Ordounance du Commerce de 1673.<br />

Porém, é importante destacar que na prática comercial e bancária dos últimos<br />

períodos históricos, o aval constitui-se num instituto cambiário cada vez mais<br />

utilizado, em oposição ao aceite, podendo-se dar destaque ao fato de que o instituto<br />

da intervenção vem perdendo a sua aplicabilidade.<br />

Pode-se dizer que o aval, na prática cambiária germânica, é quase<br />

desconhecido. Na França, desde os primórdios de 1673, devia ser obrigatoriamente<br />

inscrito sobre o próprio título, sob pena de ser desconstituído e considerado como<br />

fiança ordinária. Já a lei inglesa de 1.882 simplesmente omitia-se em disciplinar o<br />

aval, equiparando o sacador ou aceitante. Este, ao assinar uma letra de câmbio,<br />

assumia, para com o portador, as mesmas obrigações de endossador, e sua<br />

assinatura poderia ser aposta tanto no verso quanto no anverso do título.<br />

117 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003.<br />

47


No que diz respeito ao ordenamento jurídico pátrio, cabe ressaltar que o<br />

Código Comercial Brasileiro de 1850 não disciplinou o aval, generalizando sua<br />

expressão: “garantem a letra de câmbio o sacador, os endossadores, os aceitantes e<br />

os abonadores”, o que poderia gerar ambigüidade para efeito de exegese e<br />

hermenêutica, dada a complexidade dos negócios jurídicos contemporâneos.<br />

Para outros doutrinadores, como Luiz Emygdio, 118 a origem etimológica do<br />

aval passou por quatro correntes:<br />

“1) Savary, Toubeau, Bornier, entre outros - prevista nos ditames da antiga<br />

doutrina francesa), propalada na expressão latina a valore, ou outra<br />

assemelhada em francês, faire valoir ou valoir, traduzindo o ato que atribui<br />

valor ao título de crédito, corrente esta muito criticada por não se encontrar<br />

no desdobramento dos fatos na evolução histórica da instituição, por<br />

traduzir uma forma verbal com ausência semântica (dificuldade de<br />

significante e significado no campo técnico lingüístico).<br />

2) Grasshoff, Huvelin e Gueisenberger - determina a origem da instituição<br />

no termo árabe hawala, significando obrigação de garantia, informando que<br />

o direito europeu se origina da prática cambiária árabe do século VIII,<br />

corrente esta não aceita pelos doutrinadores italianos que se dizem<br />

precursores do direito cambiário nos últimos séculos da Idade Média.<br />

3) Littre, Thöl e demais doutrinadores alemães - designa o termo aval dos<br />

termos italiano avallo e francês à val proveniente de a valle, por ter<br />

significado firmare a vallo, ou seja, assinar abaixo de outra firma,<br />

considerando que a assinatura do avalista é normalmente oposta abaixo da<br />

assinatura da pessoa avalizada, no corpo do título de crédito, entendimento<br />

este que aponta defeitos porque a lei não obriga o avalista a opor sua<br />

assinatura abaixo da firma da pessoa avalizada, sendo que o aval<br />

designando o avalizado (aval em preto), como por exemplo, aval em favor<br />

do emitente, pode ser lançado em qualquer lugar da cambial, anverso ou<br />

verso (LUG, art. 31, al. 2.ª). Outrora, nos países que adotaram a reserva do<br />

art. 4º do Anexo II da LUG, como a França, o aval podia ser dado em<br />

documento separado do título.<br />

4) Jules Valery, Arrigo Solmi e outros - identifica-se a origem nos termos<br />

latinos vallatus, vallare, de estrutura técnica inovadora, aperfeiçoando para<br />

os termos advallore, avallare, e, em epílogo, avallo, no sentido de enfatizar<br />

obrigações. A expressão está registrada nos clássicos latinos, sendo<br />

empregada na linguagem mercantil italiana, na qual o pactum vallatum, a<br />

carta vallata, eram convenção ou carta confirmadas com especial e<br />

extraordinária garantia.”<br />

No século XIII, a origem do aval, na instituição do Direito Cambial, já era<br />

enunciada. O banqueiro assumia, como avalista, obrigação de pagamento do título,<br />

em separado, mediante uma outra littera cambi por ele emitida. Assim procede a<br />

assertiva de que o aval foi empregado desde que a letra de câmbio passou a ser<br />

utilizada no comércio. 119<br />

118 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op.Cit. 2003, p.275-276.<br />

119 GALIZZI, Gustavo Oliva. O aval e a outorga conjugal instituída pelo Código Civil de 2002.<br />

Disponível em: . Acesso em: 22 set. de 2006.<br />

48


Entretanto, no direito brasileiro, o Código Comercial de 1850 não se reportou<br />

expressamente ao aval, mas os arts. 380 a 442 regulamentavam a letra de câmbio e<br />

as atribuições atinentes aos abonadores. O abono consistia em uma fiança<br />

comercial solidária, parecida ao aval do sistema francês de 1.807, que caracterizou o<br />

Código Comercial Brasileiro. O Decreto nº 2044 de 31 de dezembro de 1908<br />

disciplinava o aval, em matéria de letra de câmbio e nota promissória, nos arts. 14 e<br />

15, tendo este último sido derrogado pela LUG (ART. 31, ALS. 3ª e 4ª). O art. 14 do<br />

Decreto nº 2044 de 1908, acatando o aval antecipado, permanece em vigor por não<br />

ter sido disciplinado pela LUG. O governo brasileiro não adotou a reserva do art. 4º<br />

do Anexo II, e, por isso, o aval só pode ser lançado no título de crédito ou em folha<br />

anexa 120 (alongue), sendo inconcebível, portanto, a sua formalização em documento<br />

separado do título (LUG, ART. 31, I, E LC, ART. 30). 121<br />

A Lei nº 7.357, de 2 de setembro de 1985, dispõe sobre o aval em matéria de<br />

cheque nos arts. 29 a 31. Já a Lei nº 5.474, de 18 de julho de 1968, ao disciplinar a<br />

duplicata, diz respeito ao aval somente em seu art. 12, que dispõe sobre a<br />

identificação do avalista e os efeitos do aval dado após o vencimento do título. A Lei<br />

Civil de 2002 disciplina o aval na instituição do direito cambiário, nos arts. 897 a<br />

900. 122 Já o art. 898 preceitua que: “O aval deve ser dado no verso ou anverso do<br />

próprio título”. 123<br />

Túllio Ascarelli elucida que a simples assinatura na parte da frente do titulo é<br />

considerada aval, desde que não se trate das assinaturas do sacado e do sacador.<br />

O aval também pode ser escrito no verso do titulo, ou em folha anexa. 124<br />

Por fim, o aval, mais que uma garantia fidejussória, consolida um reforço das<br />

garantias já existentes no título de crédito, porque quando alguém se obriga como<br />

avalista, o título já contém, no mínimo, a obrigação do emitente na nota promissória<br />

e no cheque, a do sacador na letra de câmbio, e se o título circular, existirá também<br />

a obrigação do endossante. Decorre disso que a função do aval é reforçar as<br />

garantias do pagamento do título de crédito em seu vencimento (LUG, ART. 30, AL.<br />

1ª, LC, ART. 29 E LD, ART. 12), tornando fácil a sua circulação, sendo um dos mais<br />

120<br />

Folha anexa dá-se quando, não cabendo mais assinatura no título, utiliza-se uma folha de papel<br />

que a ele vai colada para receber novas assinaturas (Wille Costa Duarte, 2003, p.1999).<br />

121<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975.<br />

122<br />

Idem, 1975.<br />

123<br />

ASCARELLI, Túllio. Panorama do direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1947.<br />

124 Idem, 1947.<br />

49


importantes e utilizados na instituição do direito cambiário, prioritariamente nas<br />

operações bancárias. 125<br />

Assim sendo, constata-se que a importância do aval resulta da sua função de<br />

reforço das garantias já existentes no título, sendo fácil a sua circulação pela maior<br />

segurança que confere ao portador no que tange ao seu pagamento. Pode-se inferir,<br />

portanto, que raramente encontrar-se-á título de crédito sem aval, constatando-se<br />

um grande número de decisões judiciais sobre o aval.<br />

4.2. Conceitos de aval<br />

O aval consiste na obrigação assumida cambialmente por uma pessoa,<br />

garantindo o pagamento do título e obrigando-se nas mesmas condições do<br />

avalizado. É uma garantia do pagamento de título de crédito, de natureza pessoal,<br />

dada por terceiro.<br />

“O aval não se confunde com o endosso nem com a fiança. Não se<br />

confunde com o endosso porque neste o endossante é parte do título,<br />

proprietário que transfere sua propriedade a outrem. Por outro lado, não se<br />

confunde com a fiança porque esta é obrigação subsidiária; o fiador<br />

responde apenas quando o afiançado não o faz, mas pelo aval o avalista<br />

torna-se co-devedor, em obrigação solidária, e o pagamento da obrigação<br />

pode ser imputado diretamente a ele, sem que o seja, anteriormente,<br />

contra o avalizado.” 126<br />

Na linguagem usual, Aurélio Buarque de Holanda 127 define aval como uma<br />

garantia pessoal, plena e solidária, que se dá de qualquer obrigado ou coobrigado<br />

em título cambial, ou figurativamente, é o apoio moral ou intelectual. O aval em preto<br />

seria aquele nome da pessoa em favor da qual é dado; o aval em branco é o que<br />

não traz o nome da pessoa à qual é dado, consistindo apenas na assinatura do<br />

avalista. O aval pode ser sucessivo, cumulativo ou simultâneo, e pode ainda ser total<br />

ou parcial.<br />

Segundo João Eunápio Borges, 128 em obra destinada especificamente ao<br />

aval, este constitui “instituição de direito cambial e tem por finalidade garantir o<br />

125<br />

REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003.<br />

126<br />

SOBRINHO CORRÉIA, Adelgício Barros. Dos efeitos da outorga uxória no aval e na fiança após o<br />

CC de 2002. Disponível em: . Acesso em: 22 set de 2006, p.1.<br />

127<br />

FERREIRA, Aurélio Buarque Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:<br />

Nova Fronteira, 1988.<br />

128<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit, 1975, p.15.<br />

50


pagamento da letra de câmbio e da nota promissória, assim como de outros títulos<br />

(cheques e duplicatas) em parte assimilados aos cambiais.”<br />

Fran Martins 129 coloca que o aval é como a:<br />

“obrigação cambiária assumida por alguém no intuito de garantir o<br />

pagamento da letra de câmbio nas mesmas condições de um outro<br />

obrigado. É uma garantia especial, que reforça o pagamento da letra,<br />

podendo ser prestada por um estranho ou mesmo por quem já se haja<br />

anteriormente obrigado no título.”<br />

Complementando, Fábio Ulhoa Coelho 130 diz que aval é ato cambiário pelo<br />

qual uma pessoa (avalista) se compromete a pagar título de crédito, nas mesmas<br />

condições do devedor deste título (avalizado). Segundo Antônio Carlos Zarif 131 , “aval<br />

é a obrigação que uma pessoa assume por outra, a fim de garantir o pagamento de<br />

um titulo de crédito; aquele que concede o aval se denomina avalista, e a pessoa em<br />

favor de quem é concedido se chama avalizado.”<br />

Para o Professor Wille Costa Duarte, 132 aval “é a declaração cambial e<br />

sucessiva, pela qual o signatário responde pelo pagamento do título de crédito. É<br />

uma garantia típica cambiária que não existe fora do título de crédito. É escrito no<br />

próprio título ou numa folha anexa.”<br />

Corroborando com este pensamento, Rubens Requião coloca que “o aval é a<br />

garantia de pagamento de letra de câmbio, dada por um terceiro ou mesmo por um<br />

de seus signatários [...] uma garantia pessoal do pagamento da letra de câmbio que<br />

acresce, como o aceite, mais um devedor ao título.” 133<br />

Aquele que presta o aval é chamado avalista ou dador do aval, e o<br />

beneficiário do mesmo se denomina avalizado. O aval é uma garantia especial ao<br />

pagamento do título, que pode ser dada por pessoa estranha à relação cambial ou<br />

mesmo por quem já faça parte desta.<br />

O avalista assume solidariamente as obrigações do avalizado e, para se<br />

obrigar, necessita ser capaz, como todos que se obriguem cambialmente. Todavia, a<br />

nulidade do aval dado por incapaz não prejudica o título, devido à autonomia das<br />

129 MARTINS, Fran. Op. Cit. 1997, p.153.<br />

130 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 4 ed. São Paulo: 2000.<br />

131 ZARIF, Antônio Carlos. Diferenças entre aval e fiança. Disponível em:<br />

http://www.advocaciaconsultoria.com.br>. Acesso em: 22 set de 2006.<br />

132 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.199.<br />

133 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.420.<br />

51


obrigações, conforme art. 7 º da LUG. Esta mesma lei trata do aval em seus arts. 30,<br />

31 e 32, e o CC vigente, em seu art. 897 e seguintes. 134<br />

Quando o título é pago pelo avalista, este fica sub-rogado nos direitos<br />

incorporados à cártula, podendo cobrar o valor pago do avalizado e daqueles que<br />

este poderia cobrar e de seus outros garantes.<br />

4.3. Aval versus fiança<br />

Existem conceitos meramente naturalísticos, isto é, que emergem de<br />

fenômenos concretamente existentes, que são etnologias usadas comumente, e<br />

existem conceitos eminentemente jurídicos, significados dados pelo Direito a<br />

palavras ou expressões que divergem do seu sentido usual, mas que têm fins<br />

específicos.<br />

Neste estudo, descreveu-se que o aval é garantia própria dos títulos<br />

cambiários, que não se mistura com as demais garantias do direito comum, dentre<br />

as quais a fiança. Desta maneira, algumas pessoas consideram o aval como fiança<br />

nos títulos de crédito, nivelando os dois institutos que, na realidade, são distintos.<br />

Bonelli 135 diz que é na doutrina italiana que mais radicalmente se separa o ser<br />

ou não ser o aval uma fiança:<br />

“O elemento característico da fiança não é garantia, a assunção de<br />

responsabilidade por uma obrigação originariamente contraída por outrem, a<br />

acessão a uma relação jurídica não criada pelo fiador; isso é próprio de<br />

vários institutos. Na cambial, a obrigação dos endossadores, e até a do<br />

sacador, quanto o título for aceito, é simples obrigação de garantia, embora<br />

suas firmas não tenham a garantia como fim direto e imediato.”<br />

Avais e fianças, como coloca Dylson Dória, 136 são expressões freqüentemente<br />

usadas de forma imprópria e confusa, principalmente em contratos e títulos.<br />

Entretanto, esta confusão não se restringe ao senso comum; existem aqueles que<br />

entendem que o aval é uma espécie de fiança, e para eles todas as regras da fiança<br />

deveriam ser aplicadas ao aval, mas a maioria os compreende como institutos<br />

completamente autônomos.<br />

134 MARTINS, Fran. Op. Cit. 1997.<br />

135 BONELLI apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.30-31.<br />

136 DÓRIA, Dylson. Curso de direito comercial. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 1998.<br />

52


É muito comum confundir a diferença entre aval e fiança, ambos garantia de<br />

obrigação alheia. No entanto, constituem institutos distintos: enquanto o primeiro é<br />

típico do Direito Cambial, ou seja, próprio dos títulos de crédito, o segundo é garantia<br />

contratual acessória a uma obrigação principal. Assim, o aval se diferencia da fiança,<br />

sobretudo, pelas suas características cambiais, tais como autonomia e abstração,<br />

sendo um instituto de garantia totalmente independente da relação obrigacional do<br />

avalizado e do negócio fundamental do próprio título de crédito. Ao contrário do aval,<br />

a fiança será afetada a qualquer tempo pela relação obrigacional a que visa garantir.<br />

Para Fran Martins, “muitas pessoas consideram o aval como fiança nos títulos<br />

de crédito, igualando os dois institutos que, apesar de terem pontos de contato, na<br />

realidade são diversos.” 137<br />

“A equiparação do aval à fiança é questão meramente acadêmica,<br />

principalmente por parte daqueles que gostam de pesquisar a natureza<br />

jurídica de tudo que encontram pela frente. Mas é perda total de tempo<br />

pesquisar se o aval, como garantia cambiária, tem ou não natureza de<br />

fiança. Isto não tem a menor utilidade e nem qualquer interesse prático. Em<br />

verdade, aval é aval e fiança é fiança. Ambos correspondem à garantia<br />

pessoal e fidejussória, mas não se confundem. São garantias diferentes,<br />

ainda que com o novo Código Civil o aval válido de pessoa casada<br />

necessite da autorização prévia do outro cônjuge.” 138<br />

De acordo com Marcelo Colombelli Mezzomo, 139 duas são as formas de<br />

garantia fidejussória, materializadas no aval e na fiança. Embora ambas<br />

representem garantias pessoais, ocorrem certas diferenças oriundas da natureza<br />

diversa que possuem.<br />

“O aval é de natureza comercial, ao contrário da fiança, que é de direito<br />

civil. Como sabido, o direito comercial se pauta pela celeridade própria das<br />

relações mercantis, defluindo deste fato outras diferenças entre ambos. Por<br />

isso, o aval não carece da outorga uxória do cônjuge, requisito cuja<br />

ausência pode redundar em nulidade ou anulabilidade da fiança. 140 Da<br />

mesma forma, o aval, ao contrário da fiança, não comporta o beneficum<br />

excussionis, ou benefício de preferência sobre os bens do devedor<br />

principal.”<br />

137 FRAN, Martins. Op. Cit. 1997, p.156.<br />

138 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.201-202.<br />

139 MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Aval e a meação do cônjuge. Disponível em: http.://. Acesso em: 23 set. de 2006, p.1.<br />

140 A conseqüência da ausência de outorga uxória ou autorização marital, se nulidade ou<br />

anulabilidade, ainda não foi totalmente pacificada.<br />

53


A discussão sobre as diferenças entre aval e fiança está presente no art.<br />

1.647 do CC de 2002:<br />

“Art. 167. Ressalvado o disposto no art. 1648 (caso do suprimento da<br />

outorga pelo juiz), nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro,<br />

exceto no regime da separação absoluta: I – alienar ou gravar de ônus rela<br />

os bens imóveis; II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou<br />

direitos; III – prestar fiança ou aval; IV – fazer doação, não sendo<br />

remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura<br />

meação. Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos<br />

filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.”<br />

Corroborando com esse pensamento, Rubens Requião 141 coloca que sustenta<br />

no Direito brasileiro que:<br />

“[...] não sendo aval espécie de fiança, ao contrário do que acontecia com<br />

esta, não se exigia a outorga da mulher para a sua validade. Com o advento<br />

da Lei nº 4.121, de 1962, modificou-se a solução correntia, pois pelos títulos<br />

de qualquer natureza, firmados por um só dos cônjuges, ainda que casados<br />

pelo regime de comunhão universal, somente responderão os bens<br />

particulares do signatário e os comuns até o limite de sua meação (art. 3º).<br />

Tanto o marido, como a mulher casada, obrigando apenas os seus bens até<br />

a meação que possuírem na sociedade conjugal, poderão dar o aval<br />

comprometendo apenas a sua meação. Para que o patrimônio do casal<br />

garanta as obrigações assumidas pelo marido ou pela mulher, em título de<br />

crédito, como de resto de qualquer dívida, como se procedia anteriormente,<br />

deve obter a autorização do outro cônjuge ou fazê-lo assinar conjuntamente<br />

o aval dado.”<br />

Como se evidencia, existe ressalva no ordenamento quanto à necessidade de<br />

outorga uxória para que qualquer dos cônjuges preste fiança ou aval, salvo no caso<br />

do regime da separação absoluta de bens.<br />

Conforme o ilustre Luiz Emygdio, 142 o aval não se confunde com instituto de<br />

fiança, pelas seguintes razões:<br />

“A fiança é instituto regulado pelo direito comum (CCB, arts. 1481 a 1504,<br />

CCom., arts. 256 a 263, e CCB de 2002, arts. 818 a 839), podendo ter<br />

natureza civil ou comercial e garantir qualquer obrigação, enquanto o aval é<br />

instituto próprio do direito cambiário, sendo sempre comercial, e só pode<br />

ser lançado em título de crédito. Mas nada obsta que o pagamento da nota<br />

promissória seja garantido por fiança, como ocorre, por exemplo, com<br />

operações de empréstimo de valor bastante elevado realizadas por<br />

instituições financeiras em favor de pessoas jurídicas, que, além do aval<br />

dado no título, exigem também a apresentação de fiança prestada por<br />

outro banco. O aval só pode garantir o pagamento do título de crédito, não<br />

141 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.423.<br />

142 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003, p.281.<br />

54


podendo, assim, ter por objeto obrigação de natureza não cambiária. A<br />

fiança pode ser formalizada no próprio instrumento que consubstancia a<br />

obrigação garantida, ou em documento em separado, mas o aval só pode<br />

ser lançado no título de crédito, em razão do princípio da literalidade (LUG,<br />

art. 31, al. 1ª, LC, art. 30), não tendo o governo brasileiro adotado a reserva<br />

do art. 4º do Anexo II da LUG, que lhe permitiria, por lei, admitir o aval por<br />

documento em separado.”<br />

Evidencia-se, também, que aval e fiança carregam consigo certa semelhança<br />

e diversas formas de interpretação entre os ordenamentos mundiais. A doutrina<br />

francesa, conforme esclarece Rubens Requião,<br />

“conceitua muitas vezes o aval como fiança, dependente da obrigação<br />

principal. Na doutrina italiana, alguns autores (Vidari) o consideram uma<br />

fiança sui generis, enquanto outros (Bolaffio e Bonelli) nele vêem uma<br />

garantia puramente objetiva e substancialmente independente. Vivante<br />

sustenta que o aval é uma garantia peculiar às formas cambiárias, tendo<br />

sua lição uma profunda ressonância na doutrina brasileira.” 143<br />

A própria LUG, ou melhor, a infeliz e errônea tradução portuguesa adotada<br />

pelo Brasil, através do Decreto nº 57.663 de 1966, diz no seu art. 32 que “o dador<br />

de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada.” 144 Esta<br />

equivocada tradução da LUG leva à falsa informação de que aval e fiança seriam<br />

garantias de obrigação alheias idênticas. O texto original do convencionado<br />

genebrino, em versão francesa, dispõe: Le donneur d’aval est tenu la mêne manière<br />

que celui dont il s’est porté garant. Assim, é possível visualizar o erro de tradução da<br />

palavra garant, a qual seria melhor traduzida para a versão legal brasileira como<br />

“garantida” e não “afiançada”.<br />

A própria LUG acaba com qualquer dúvida acerca da natureza da fiança e do<br />

aval, ao afirmar que a obrigação do avalista mantém-se, mesmo no caso de a<br />

obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de<br />

forma. Na fiança, esta prática seria impossível, dado que essa, como obrigação<br />

acessória, segue a obrigação principal e dela não se desvincula.<br />

143 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p.421.<br />

144 FRAN, Martins. Op. Cit., 1995, p. 209. A tradução oficial da Lei Uniforme faz confusão entre aval e<br />

fiança, ao declarar, no art. 32, 1 ª alínea, que “o dador do aval é responsável da mesma maneira que a<br />

pessoa por ele afiançada. A tradução é incorreta, pois, em vez de afiançada, devia dizer garantida. O<br />

texto francês é claro: Le donneur d’aval est de la mêne manière que dont celui il s’est porté garant.<br />

55


Por serem as obrigações de um título de crédito autônomas, o avalista não<br />

pode opor-se ao pagamento do mesmo, valendo-se de exceções pessoais que teria<br />

o avalizado em face do credor.<br />

4.4. Formas de aval<br />

A simples assinatura do avalista no dorso ou anverso do título constitui o aval,<br />

salvo se a assinatura for do emitente da nota promissória. A LUG, em seu art. 31,<br />

preconiza:<br />

“O aval é escrito na própria letra ou numa folha anexa. Exprime-se pelas<br />

palavras bom para aval ou por qualquer fórmula equivalente: é assinado<br />

pelo dador do aval. O aval considera-se como resultante da simples<br />

assinatura do dador aposta na face anterior da letra, salvo se trata das<br />

assinaturas do sacado ou do sacador. O aval deve indicar a pessoa por<br />

quem se dá. Na falta de indicação, entender-se-á ser pelo sacador.” 145<br />

De acordo com Rubens Requião, no Direito germânico, “o aval, sendo ato<br />

autônomo e independente da obrigação principal, é concessível em documento<br />

estranho ao título, prática de resto admitida pela Lei Uniforme, consoante o art. IV do<br />

Anexo II da Convenção de Genebra.” 146<br />

Diferentemente do Direito alemão, no Direito brasileiro o aval somente pode<br />

ser dado no próprio título ou numa folha anexa. A posição do Brasil surge da reversa<br />

ao art. 4º, do Anexo II da Convenção de Genebra. 147<br />

Nos títulos de crédito, não há assinatura inútil. Como exemplo, o caso do<br />

lançamento de uma simples assinatura no anverso da nota promissória, que não<br />

seja do próprio emitente, a qual, certamente, configurará o aval. Assim, uma simples<br />

assinatura sem indicação do avalizado, quando lançada no anverso do título, será<br />

considerada como aval ao emitente. Se o aval for dado no verso do título, deve-se<br />

usar a expressão bom para aval, por aval, ou outra equivalente.<br />

145 Lei nº 57.663 de 24 de janeiro de 1966. Promulga as Conversões para adoção de uma lei uniforme<br />

em matéria de letras de câmbio e notas promissórias. Diário Oficial da União. Brasília, jan.2006.<br />

146 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003, p. 422.<br />

147 Decreto nº 57.663 de 24 de janeiro de 1966 (Lei Uniforme de Genebra), Anexo II, artigo 4 º : Por<br />

derrogação da alínea primeira do artigo 31 da Lei Uniforme, qualquer das Altas Partes Contratantes<br />

tem a faculdade de admitir a possibilidade de ser dado um aval no seu território por ato separado em<br />

que se indique o lugar onde foi feito.<br />

56


4.4.1. De obrigação nula<br />

Por exemplo, “C” avaliza “B” que, por sua vez, manteve relação obrigacional<br />

com “A”. Caso seja viciada a relação de “B” e “A” e, portanto, eivada de nulidade, o<br />

aval dado por “C” também será nulo? Em virtude da autonomia das relações, o aval<br />

persistirá válido, não sendo atingindo pela ineficácia do ato obrigacional do<br />

avalizado.<br />

Sobre a responsabilidade do avalista dispõe o art. 32, alínea 2, da Lei<br />

Uniforme: “a sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele<br />

garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.”<br />

O aval dado a uma relação não é afetado pelos vícios desta, a não ser que se<br />

trate de vício de forma. O aval a uma pessoa incapaz, por exemplo, não é atingido<br />

pela nulidade.<br />

O CC vigente também segue esse princípio, em seu art. 899, 2 º , que dispõe:<br />

“subsiste a responsabilidade do avalista, ainda que nula a obrigação daquele a<br />

quem se equipara, a menos que a nulidade decorra de vício de forma.”<br />

4.4.2. Parcial<br />

Segundo o ilustre Professor Wille Duarte Costa, o aval parcial foi “uma<br />

inovação das Leis Uniformes, tanto a referente às letras de câmbio e notas<br />

promissórias, como a dos cheques”. O autor coloca que sua “introdução na LUG<br />

deu-se por insistência e iniciativa do Ministério Plenipotenciário de Portugal, José<br />

Caeiro da Mata.” 148<br />

O aval parcial, também conhecido como aval limitado, é permitido pela Lei<br />

Uniforme, em seu art. 31, para o qual o “pagamento da letra pode ser, no todo ou em<br />

parte, garantido por aval”. Assim sendo, pelo aval limitado ou parcial, responde o<br />

avalista por pagamento inferior ao valor do título, limitando-se ao que declarou<br />

obrigar-se. 149<br />

Não obstante, salienta-se a divergência do entendimento defendido por José<br />

Carvalho de Mendonça, 150 aceitando o aval daquele que se obriga só até certa<br />

148 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.31 e 205.<br />

149 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003.<br />

150 CARVALHO DE MENDONÇA apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p. 159.<br />

57


quantia pelo pagamento do título. Procura o mesmo autor razão para a sua posição<br />

em uma flexibilização ou extensão literal da lei, o que não se pode admitir, sob a<br />

lógica da nossa lei cambial, em seu art. 15, buscando substituir a expressão “é<br />

equiparado por é equiparado em parte”, posição isolada, repita-se, estribada na<br />

liberdade de convenção entre as partes, no interesse do comércio e circulação do<br />

título.<br />

Já o CC vigente, através do parágrafo único do seu art. 897, 151 veta o aval<br />

parcial, mas prevalece a legislação especial sobre títulos de crédito, sendo<br />

permitido, por conseguinte, o aval parcial.<br />

No momento atual, o aval parcial, anotado na cártula, desobedece à lei,<br />

sendo considerado nulo (art. 166, VII, CC vigente). O aval poderá ser dado na parte<br />

da frente ou na parte de traz do título, acompanhado de texto que o caracterize<br />

(“avalizo”, “em aval”, “avalizo fulano de tal”, dentre outros). Esse texto, porém, é<br />

desnecessário quando o avalista simplesmente assina o título na parte da frente, o<br />

que, por si só, caracteriza o aval. O aval pode ser dado a qualquer momento, mesmo<br />

muito após a emissão do título. O avalista é garantidor do pagamento do título. Logo<br />

após assinar como avalista e antes de devolver o título é possível desistir,<br />

cancelando o aval; após a entrega, não mais. Se o avalista pagar o título, poderá<br />

voltar-se contra o avalizado e dele cobrar o que desembolsou. Estas são todas as<br />

regras que já vigoram no Direto.<br />

4.4.3. Simples e plural<br />

O ilustre jurista Luiz Emygdio aduz que o aval pode ser simples, quando dado<br />

por uma pessoa, ou plural, quando dado por duas ou mais pessoas, podendo<br />

ocorrer em três casos:<br />

“1) Dois ou mais avais dados em favor de obrigados cambiários distintos,<br />

por exemplo: “C” é avalista do emitente “A” e “D” é avalista do endossante<br />

“B”.<br />

2) Dois ou mais avalistas de uma mesma obrigação cambiária (avais<br />

simultâneos e co-avais).<br />

3) Aval de aval (avais sucessivos). A primeira hipótese (avalizados distintos)<br />

não apresenta qualquer dúvida porque todos os avalistas serão devedores<br />

solidários de natureza cambiária sucessiva, e o portador pode acionar<br />

cambiariamente os avalistas e avalizados, em conjunto ou isoladamente,<br />

151 Novo CC – Lei nº 10.406, de 10/01/2002, art. 897, parágrafo único: É vetado o aval parcial.<br />

58


4.4.4. Incondicional<br />

sem estar sujeito a ordem a que se obrigaram (LUG, art. 47, als. 1ª e 2ª, LC,<br />

art. 51 e § 1º). Se um dos avalistas pagar a quantia cambiária, adquire os<br />

direitos decorrentes do título em relação ao avalizado e aos que o garantem<br />

(LUG, art. 32, al. 2ª, LC, art. 31 e Lei Civil, art. 899, § 1º), por se tratar de<br />

solidariedade cambiária de natureza sucessiva. As demais hipóteses de<br />

avais simultâneos e sucessivos serão tratadas em separado.” 152<br />

Conforme o ilustre Luiz Emygdio, a LUG “não informa que o aval deva ser<br />

puro e simples, como faz em relação ao endosso”. Pode-se concluir que por<br />

exclusão o aval poderá ser condicional, haja vista “nenhuma declaração cambiária<br />

poder ser subordinada a um evento futuro e incerto, não podendo contrariar o<br />

principio da literalidade e dificultar a circulação do título de crédito”. 153 Enfatiza-se<br />

que o aval condicional:<br />

“[...] deixaria o portador do título na incerteza da ocorrência e no evento<br />

futuro e incerto, sem saber se o avalista teria ou não obrigação cambiária. É<br />

importante considerar como não escrita a cláusula de evento futuro e<br />

incerto, por beneficiar o devedor.” (Decreto n.º 2.044/1908, art. 44, IV<br />

vigente em razão do silêncio da LUG). 154<br />

O art. 890 da Lei Civil também considera como não escrita a cláusula que,<br />

além dos limites fixados em lei, exclua ou restrinja direitos e obrigações do título de<br />

crédito.<br />

4.4.5. Posterior ao vencimento<br />

Alguns autores já insistiram em afirmar que o aval posterior ao vencimento<br />

produz os mesmos efeitos de uma fiança, pois seria lançado no título após sua vida<br />

cambial. João Eunápio Borges assevera:<br />

“Porque tal forma (de aval) lançada depois do vencimento, ou será aval ou<br />

não será coisa nenhuma, para quem, com os olhos no nosso direito cambial,<br />

sabe distinguir aval de fiança, abstendo-se, como deve, de ver naquele uma<br />

espécie de fiança qualificada pelo rigor cambial. Pontes de Miranda, a meu<br />

ver com a razão, sustenta a possibilidade do aval posterior ao vencimento,<br />

com os mesmos efeitos cambiais do que é prestado durante a fase<br />

circulatória do título. Não tem razão Carvalho de Mendonça quando diz que<br />

o aval visa garantir o pagamento, no vencimento da letra. Depois do<br />

152 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003, p.293.<br />

153 Idem, 2003, p.291.<br />

154 Idem, 2003, p.291.<br />

59


vencimento, pergunta o mestre, que garantiria ele? Garantiria o pagamento,<br />

pois a função do aval é garanti-lo durante toda a vida da obrigação que<br />

contraiu, a qual, como veremos, pode sobreviver à que houver avalizado;<br />

enquanto existir uma obrigação cambiária, é suscetível de ser avalizada.” 155<br />

Sobre o assunto, é saliente a legislação específica. Contudo, melhor<br />

entendimento é o que busca, na intenção do avalista, a solução para a questão.<br />

Afinal, quem lança um aval quer avalizar e, obviamente, não quer dar fiança.<br />

Ademais, quem avaliza garante o título e não uma obrigação.<br />

Leia-se a Lei de Duplicatas (Lei nº 5.474 de 18 de julho de 1968), a qual<br />

dispõe, em seu art. 12, parágrafo único: “O aval dado posteriormente ao vencimento<br />

do título produzirá os mesmos efeitos que o prestado anteriormente àquela<br />

ocorrência.” 156<br />

Assim, entende-se que pode o aval ser dado após o vencimento do título,<br />

obrigando o avalista ao pagamento da obrigação, o que foi expressamente ratificado<br />

pelo art. 900, do novel ordenamento civil, que dispõe: “O aval posterior ao<br />

vencimento produz os mesmos efeitos do anteriormente dado.”<br />

Cumpre esclarecer que, diante do silêncio da legislação específica sobre o<br />

tema, ainda que o entendimento das pessoas não coadunasse com o CC vigente,<br />

seu art. 900 valeria e se imporia, por não contradizer legislação especial. Assim, o<br />

aval posterior ao vencimento já é reconhecido por lei válida e aplicável, não mais<br />

comportando dúvidas quanto aos seus efeitos.<br />

4.4.6. Simultâneos e sucessivos<br />

Conforme já analisado, qualquer um daqueles que assumem obrigações na<br />

nota promissória – emitente ou endossante – pode ter sua obrigação garantida por<br />

aval. Assim, um mesmo título pode conter diversos avais, constantes em suas<br />

muitas e autônomas relações. É admitido o comparecimento de duas ou mais<br />

pessoas, no mesmo título, avalizando o mesmo obrigado. Estes co-avalistas podem<br />

ser dadores de avais simultâneos ou sucessivos.<br />

“Os avais simultâneos ou co-avais ocorrem quando o aval é dado em<br />

conjunto, por duas ou mais pessoas, em relação à mesma obrigação<br />

155 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.157-158.<br />

156 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.207.<br />

60


cambiária, como devedores do mesmo grau. São reputados de mesmo<br />

grau quando co-signatários de uma mesma obrigação, como dois ou mais<br />

emitentes, sacadores, endossantes e avalistas. Obrigados em graus<br />

diversos são os que contraem obrigações autônomas, como emitente,<br />

sacador, aceitante e avalista. A solidariedade entre obrigados do mesmo<br />

grau não tem natureza cambiária, mas simultânea, do direito comum,<br />

enquanto que a solidariedade em grau diverso tem natureza cambiária.” 157<br />

Conforme lúcido esclarecimento de Wille Duarte Costa,<br />

“co-avalistas são aqueles que assinam como avalistas o mesmo título de<br />

crédito. São considerados simultâneos os avais dados ao mesmo avalizado.<br />

Seus avalistas são considerados co-avalistas ou avalistas do mesmo grau.<br />

São sucessivos os avais em que um avalista se equipara expressamente a<br />

outro avalista (aval de aval) no mesmo título.” 158<br />

Muito já se discutiu acerca dos efeitos dos avais em branco e superpostos.<br />

Seriam estes simultâneos (todos os avalistas são garantes diretos do avalizado) ou<br />

sucessivos (garantes sucessivos uns dos outros)? A polêmica sobre o tema já não<br />

repercute, pois o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Súmula 189, assim<br />

pacificou a questão: “avais em branco e superpostos consideram-se simultâneos e<br />

não sucessivos”.<br />

Convém rememorar que o avalista que paga o título fica sub-rogado nos<br />

direitos cambiais contra seu avalizado e contra os obrigados para com este. Em<br />

virtude da solidariedade cambial, pode o avalista cobrar tudo que pagou. A respeito,<br />

dispõe o art. 47 da Lei Uniforme:<br />

“Os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos<br />

solidariamente responsáveis para com o portador. O portador tem o direito<br />

de acionar todas estas pessoas individualmente (ou coletivamente), sem<br />

estar adstrito a observar a ordem por que elas se obrigam. O mesmo direito<br />

possui qualquer dos signatários de uma letra quando a tenha pago. A ação<br />

intentada contra um dos coobrigados não impede acionar os outros, mesmo<br />

os posteriores àquele que foi acionado em primeiro lugar.” 159<br />

Os avalistas do mesmo grau equiparam-se a um mesmo avalizado. Nesse<br />

caso, o avalista que paga o débito pode cobrar dos demais a quota parte respectiva.<br />

Por exemplo, uma nota promissória no valor de R$ 3.000,00 que seja emitida por<br />

“A”, em benefício de “B”, com aval de “X”, “Y” e “Z”. Se “Y” pagar os R$ 3.000,00 a<br />

157 ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003, p.292.<br />

158 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.207.<br />

159 Lei n. 57.663 de 24 de janeiro de 1966. Promulga as conversões para adoção de uma lei uniforme<br />

em matéria de letras de câmbio e notas promissórias. Diário Oficial da União. Brasília, jan.2006.<br />

61


“B” poderá cobrar R$3.000,00 de “A”, mas apenas R$1.000,00 de cada um dos<br />

avalistas “X” e “Z”. Este benefício de divisão é uma exceção da solidariedade<br />

cambial, assemelhando-se, nesse particular, à solidariedade comum.<br />

4.5. Abordagens sobre aval<br />

4.5.1. Aval antecipado<br />

O aval antecipado consiste em firmar o aval antes do aceite ou do endosso.<br />

No sistema cambiário, pode ser “dado mesmo antes da obrigação a que o avalista<br />

pretende equiparar-se. São obrigações autônomas, entre as quais não existe<br />

nenhuma relação de acessoriedade [...].” 160<br />

Como coloca o ilustre Wille Duarte Costa 161 , “o aval deve ocorrer depois que o<br />

avalizado se obriga no título de crédito, mas pode surgir antes da obrigação do<br />

avalizado a quem o avalista procura.”<br />

Os doutrinadores mais importantes em Direito Cambiário concordam, pois que<br />

desde o surgimento do título de crédito é possível antecipar-se o aval. Dentre os<br />

autores, pode-se citar, apenas a título de ilustração, a visão de Lacerda 162 , que não<br />

difere do pensamento de Carvalho de Mendonça, 163 Whitaker, 164 Magarinos, 165<br />

Vivante, 166 entre outros que prelecionam pela licitude do aval antecipado, cuja<br />

existência futura não fica dependendo da validade do aval. Outrossim, cabe destacar<br />

que este tipo de aval trata-se de uma obrigação condicional, qual seja, a efetiva<br />

obrigação que se visou garantir, ainda que haja divergências doutrinárias quanto à<br />

validade e eficácia deste aval depender da existência da obrigação futura que foi<br />

objeto do aval.<br />

Neste sentido, pode-se dizer ser o aval uma garantia do pagamento do título.<br />

Assim, com base no art. 14 da Lei Cambiária, sustenta-se que nenhum laço há de<br />

acessoriedade entre as duas declarações, tratando-se de obrigações autônomas e<br />

independentes entre si, à luz do art. 43 da referida lei. Sustenta-se, ainda, que uma<br />

160<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.131.<br />

161<br />

COSTA, Wille Duarte. Op.Cit. 2003, p.204<br />

162<br />

LACERDA apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.131.<br />

163<br />

CARVALHO DE MENDONÇA apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p. 131.<br />

164<br />

WHITAKER, José Maria. Op. Cit. 1963.<br />

165<br />

TORRES, Magarinos. Nota Promissória. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1935.<br />

166 VIVANTE, Cesare. Op. Cit. 1945.<br />

62


vez firmado o aval, o avalista adquire o status de obrigado também, sendo, pois,<br />

ambos co-responsáveis.<br />

4.5.2. Aval em título em branco, incompleto ou futuro<br />

Questão remota e pouco discutida, o aval em título em branco, incompleto ou<br />

futuro não se consolidou na prática dos negócios jurídicos cambiários, isso porque o<br />

aval só garante obrigação cambiária. Assim, se o documento não é título de crédito<br />

por não conter todos os requisitos formais essenciais previstos em lei, não há aval.<br />

Pelo Direito antigo, como coloca o ilustre João Eunápio Borges 167 , os títulos<br />

em branco “reputam-se dados, no Direito Italiano, em favor de uma mesma pessoa:<br />

são, pois, conjuntos ou simultâneos, e nunca sucessivos, e não tem o avalista que<br />

paga, ação de regresso contra os demais avalistas”.<br />

em branco,<br />

“O aval em título em branco é aquele que não identifica o avalizado;<br />

enquanto não integrado com todos os requisitos impostos pela lei, é apenas<br />

um título in feri, em potência, não é ainda um título de crédito. [...]; pela LUG<br />

(art. 10º), os títulos de crédito em branco sempre foram reconhecidos pela<br />

doutrina e pela jurisprudência.” 168<br />

Entretanto, como bem lembra Luiz Emygdio 169 sobre o aval for dado no título<br />

“o aval somente produzirá seus efeitos e irá se convolar em garantia caso<br />

seu preenchimento e a formalização no título siga passo a passo a<br />

legislação cambiária que rege e determina validade da letra de câmbio, nota<br />

promissória e cheque, matéria discutida pela LUG, nos arts. 1º, 2º, 75 e 76,<br />

e Lei Cambial (LC), art. 1º e 2º.”<br />

No que concerne ao título incompleto, observa-se que o CC vigente positivou<br />

a mencionada súmula no caput do seu art. 891: “O título de crédito, incompleto ao<br />

tempo da emissão, deve ser preenchido de conformidade com os ajustes<br />

realizados.”<br />

Luiz Emygdio acentua que o título incompleto configura-se como inexiste<br />

acordo para preenchimento do título pelo seu beneficiário, mas por descuido de seu<br />

criador, dele não constam todos os requisitos legais, formais e extrínsecos.<br />

167<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.116.<br />

168<br />

Idem, 1975, p.88.<br />

169<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003, p.325.<br />

63


“Tratando-se de cambial incompleta, contudo profícua a entendimento da<br />

Súmula 387 do STF, segundo o qual a cambial emitida ou aceita com<br />

emissões, ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-fé antes<br />

da cobrança ou do protesto. Disso resulta que o aval dado em título<br />

incompleto é válido e eficaz, desde que preenchido corretamente, orientado<br />

pela boa-fé do portador, e que não haja em nenhuma hipótese a<br />

constatação de vício de forma.” 170<br />

No que diz respeito ao título futuro, este não é admitido pelo ordenamento<br />

jurídico brasileiro, o que vale dizer que o aval dado ou formalizado em qualquer<br />

documento em separado do título não é válido e eficaz, posição esta defendida com<br />

apoio do art. 4º do Anexo II da LUG, dispositivo não adotado pelo governo brasileiro.<br />

O aval diferido só seria possível em documento apartado do título, tal como<br />

disciplina o direito argentino; no entanto, a ele equiparam-se as regras aplicáveis ao<br />

título em branco e incompleto, sem se introduzir maiores inovações ou revoluções de<br />

entendimento doutrinário, primando-se pela observância dos requisitos formais,<br />

essenciais, legais e extrínsecos. 171<br />

4.5.3. Cancelamento e extinção do aval<br />

O cancelamento do aval se dá pelo pagamento, ou seja, no silêncio da LUG<br />

prevalece a norma contida no art. 24 do Decreto nº 2.044 de 1908: “o pagamento<br />

feito pelo aceitante ou pelos respectivos avalistas desonera da responsabilidade<br />

cambial todos os coobrigados.” 172<br />

Complementando, Saraiva 173 coloca que: “o coobrigado não pode intervir<br />

como avalista por lhe não ser facultado agravar sua responsabilidade além dos<br />

limites fixados por lei.”<br />

Já para Carvalho de Mendonça, 174 o avalista deve ser “uma pessoa estranha<br />

à letra de câmbio, porque o coobrigado, dando o aval, nada adiantaria, pois já<br />

responde para com todos aqueles relativamente aos quais o aval de novo o<br />

obrigaria.”<br />

É clara esta regra porque o aceitante da letra e o emitente da nota<br />

promissória e do cheque são devedores principais, e por isso, efetuando o<br />

170<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2003, p.325-326.<br />

171<br />

Idem, 2003, p.325.<br />

172<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.52.<br />

173<br />

SARAIVA apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.44.<br />

174<br />

MENDONÇA, Carvalho apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.44.<br />

64


pagamento, extingui-se a vida cambiária do título por ocorrer a quitação do débito,<br />

ficando desonerados todos os coobrigados. Se o pagamento se der pelo avalista do<br />

aceitante ou do emitente, ficarão desobrigados os coobrigados posteriores, mas o<br />

avalista adquire os direitos do título em relação ao avalizado e aos coobrigados que<br />

o garantem. O pagamento por sacador, endossantes ou respectivos avalistas,<br />

devedores de regresso, implica em pagamento recuperatório e não extintivo, ficando<br />

desonerados da responsabilidade cambial somente os coobrigados posteriores<br />

(DECRETO N.º 2.044 DE 1908, ART. 24, AL. 2ª). Em conseqüência, o parágrafo<br />

único do art. 24 do mencionado diploma legal permite que: “o endossador, ou<br />

avalista, que pagar ao endossatário ou ao avalista posterior, possa riscar o próprio<br />

endosso ou aval e os dos endossadores ou avalistas posteriores.” 175<br />

A Lei Uniforme não contém, de forma expressa, regra idêntica à norma do art.<br />

24 do Decreto nº 2.044 de 1908, quanto ao direito de cancelamento da assinatura<br />

por parte do avalista do endossante que efetua o pagamento da obrigação cambial.<br />

Compreende-se que tal entendimento encontra suporte na norma da alínea 2ª do art.<br />

50 da LUG, ao prescrever que qualquer dos endossantes que tenha pago uma letra<br />

pode riscar o seu endosso e os dos endossantes subseqüentes. Da mesma maneira<br />

que o avalista, o endossante que efetua o pagamento pode anular a sua assinatura,<br />

bem como as dos endossantes avalistas posteriores. Conclui-se, portanto, que se o<br />

endossante que pagar a soma cambiária não cancelar a assinatura de seu avalista,<br />

este corre o risco de ser cobrado em caso de extravio ou perda do título pago,<br />

contudo que não contenha quitação, ou, em havendo, não identifique a pessoa do<br />

devedor que efetuou o pagamento. 176<br />

O cancelamento do aval por causa distinta do pagamento do título deve ser<br />

examinado em razão do silêncio da LUG, à luz do Decreto nº 2.044 de 1908, que<br />

considera não escrito, para os efeitos cambiais, o endosso ou aval cancelado. 177<br />

Conforme coloca o ilustre Luiz Emygdio, 178<br />

“o cancelamento do aval pode se dar pelas razões de: pagamento (extinção<br />

das obrigações), anulação (causas referidas no art. 147 da LC e art. 171),<br />

decadência (por falta de protesto), prescrição cambiária (LUG, art. 70, LC,<br />

175 MENDONÇA, Carvalho apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.51.<br />

176 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975.<br />

177 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op.Cit. 2003.<br />

178 Idem, 2003, p.328.<br />

65


4.5.4. Prescrição e protesto cambial<br />

art. 59, LD art. 18), e cancelamento da assinatura do avalista (art. 44, § 1.º,<br />

do Decreto n.º 2044 de 1908).” 179<br />

Primeiramente, é importante dizer que o direito cambial não ministra normas<br />

especiais para a interrupção da prescrição, a qual se opera por qualquer dos meios<br />

admitidos pelo direito comum.<br />

A prescrição do aval na lei cambial nº 2.044 é regulada pelos arts. 52 e 53.<br />

Desses dispositivos legais tem-se que nenhum prazo prescricional começará a<br />

correr a não ser a partir do dia em que a ação pode ser proposta.<br />

Pelo princípio basilar de que o acessório segue o principal, a prescrição da<br />

obrigação principal é decisiva para a vida da letra de câmbio. Uma vez consumada,<br />

extingue-se conseqüentemente a ação relativa à obrigação subsidiária, perdendo a<br />

letra definitivamente o seu valor. Quanto à prescrição do avalista ou contra o<br />

avalista, esta começa a correr no dia em que a ação puder ser proposta.<br />

Declina-se, desta forma, o termo de prescrição como sendo de três anos, a<br />

partir desse dia, contra o avalista do aceitante, do emitente ou do sacador, e de doze<br />

meses contra o avalista dos endossadores. Para o fenômeno jurídico da sub-<br />

rogação na prescrição do aval, aplica-se a mesma regra quanto ao crédito sub-<br />

rogado, começando a correr a partir do dia da sub-rogação. Sendo esta prescrição<br />

ordinária, aplicável à dívida de que houver sub-rogação, começará a correr na data<br />

do pagamento do qual resultou a sub-rogação.<br />

Quanto aos prazos prescricionais, segundo a Lei Uniforme são bem menores,<br />

fixados em seu art. 70, quais sejam: três anos a contar da data do vencimento de<br />

“todas as ações resultantes da letra de câmbio contra o aceitante”; em um ano as<br />

ações do portador contra o sacador e os endossadores, contado o prazo da data do<br />

protesto levado em tempo útil, ou do dia do vencimento, se houver cláusula de sub-<br />

rogação que dispensa o protesto. Prescrevem em seis meses as ações dos<br />

endossadores, uns contra os outros e contra o sacador, contados a partir do dia em<br />

que o endossador pagou ou foi acionado para pagar.<br />

179 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), A. I. 26.630, 5ª CG, rel. Des. Ebert Vianna<br />

Chamoun, RDTJRJ 37/36.<br />

66


Neste prisma, o protesto cambial é o ato notarial pelo qual o portador de título<br />

cambial (duplicata, nota promissória, letra de câmbio, contratos de prestação de<br />

serviços, cheques e outros) prova a falta de pagamento, a devolução ou o aceite do<br />

mesmo por parte do devedor. Tem como finalidade primeira a constituição de uma<br />

prova - prova de apresentação do título, nos rigores do formalismo e solenidade<br />

inerentes aos títulos de crédito, à pessoa que deve pagá-lo, o que, resumidamente,<br />

constitui o devedor em mora.<br />

Poder-se-ia dizer, usando as palavras de Gustavo Bonelli, 180 que a finalidade<br />

primordial do protesto é a constituição através de um ato público e solene por meio<br />

do qual se documenta a apresentação da cambial, para o aceite ou pagamento ao<br />

sacado, com o escopo de se habilitar o portador a voltar-se contra os obrigados<br />

regressivos, sendo o protesto, em suma, o ato oficial pelo qual se prova a não<br />

realização da promessa contida na letra.<br />

De acordo com o ilustre Fran Martins: "se bem que, entre os efeitos do<br />

protesto, figure o asseguramento do direito regressivo contra os coobrigados no<br />

título, a sua finalidade maior é comprovar a falta ou recusa do aceite ou do<br />

pagamento, sendo, assim, um meio de prova.” 181<br />

Cláudio Barroso Ribeiro 182 menciona que na legislação dos títulos de crédito o<br />

protesto cambial apresenta-se sob duas modalidades principais:<br />

“o protesto em razão da falta ou recusa do aceite e o protesto baseado no<br />

não pagamento do título. Além destes, existem protestos em casos<br />

especiais, como o protesto tirado para efeitos de requerimento de falência<br />

ou o protesto por falta de devolução da letra de câmbio entregue para aceite<br />

do sacado.”<br />

Tomando como referência a legislação cambial, o protesto pode ser<br />

classificado de duas formas:<br />

“[...] de acordo com os efeitos que produz em relação ao direito do portador<br />

(ou apresentante do título): o protesto indispensável (ou essencial) e o<br />

facultativo. Esta classificação decorre da necessidade ou não do registro<br />

para o exercício do direito de ação para exigência do pagamento da<br />

180<br />

BONELLI, Gustavo. Commentario ao Códice di Commercio. Milão: Ed. Rio, 1938, p.471.<br />

181<br />

MARTINS, Fran. Op. Cit. 1997, p.270.<br />

182<br />

RIBEIRO, Cláudio Barroso. Protesto de créditos públicos inscritos ou não em dívida ativa.<br />

Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2691>. Acesso em: 27 set. 2006, p.1.<br />

67


obrigação inserida no título contra os que nele lançaram sua assinatura,<br />

seja como emitentes, seja como aceitantes, avalistas ou endossantes.” 183<br />

O protesto, via de regra, não se faz a ninguém. Ele é feito contra a falta de<br />

pagamento ou de aceite e tem por fim documentar, de modo inequívoco e solene,<br />

que deixou de ser cumprida, no dia e no lugar determinados, a ordem contida na<br />

letra, ordem que é ao mesmo tempo uma promessa feita ao portador da letra por<br />

aquele que, pelo saque, a criou. João Eunapio Borges 184 reforça e insiste que o<br />

protesto não é feito contra quem quer que seja, e que a exclusão do protesto de<br />

qualquer dos coobrigados é, por um lado, impossível e, por outro, supérflua e inútil.<br />

Consubstanciado na LC, em seu art. 29, II, assevera impossível, porque o<br />

instrumento do protesto, para perfeita individualização do título, conterá<br />

obrigatoriamente:<br />

“a transcrição literal, constando, pois, do instrumento, os nomes de todos<br />

os coobrigados, sacador, avalistas, endossadores, entre outros. Supérflua<br />

e inútil, se a intenção do portador é simplesmente a de dispensar a<br />

intimação pessoal, ou por meio de editais, de qualquer dos coobrigados,<br />

pois que tal intimação, por determinação legal, será feita apenas ao sacado<br />

ou aceitante, na letra de câmbio, ao emitente, na nota promissória.”<br />

O protesto cambial, para que o portador do título possa agir cambialmente<br />

contra o avalista do aceitante, segundo João Eunápio Borges, é dispensável:<br />

“contra qualquer de seus avalistas, inclusive contra aqueles que, no próprio<br />

título, se declarem avalista de avalista do aceitante, uma vez que, para<br />

efeitos cambiários, a declaração é considerada não escrita, sendo todos<br />

co-avalistas do aceitante.” 185<br />

Como bem coloca o ilustre Fran Martins,<br />

183<br />

RIBEIRO, Cláudio Barroso. Op. Cit. 2006, p.2.<br />

184<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.188.<br />

185<br />

Idem, 1975, p.184.<br />

186<br />

MARTINS, Fran. Op. Cit. 1997, p.163.<br />

“o ato de protesto praticado contra o aceitante não se reflete sobre o<br />

avalista. Sendo o título protestado contra um aceitante, não se pode, se o<br />

avalista for comerciante, requerer a falência deste baseada naquele<br />

protesto, uma vez que não foi o título contra ele protestado.” 186<br />

68


“O temor da falência é o princípio da sabedoria comercial.” 187 Entretanto,<br />

pode-se afirmar que o protesto é ainda mais temido do que a falência.<br />

Conforme se depreende do art. 32 da LC, contra os avalistas do sacador e<br />

dos endossadores, o portador só poderá agir se e depois de tirado o protesto, em<br />

tempo útil e na forma regular, no lugar do aceite ou do pagamento, dado o<br />

formalismo e o rigor técnico da lei. 188<br />

É importante destacar que no desenvolver deste trabalho, o avalista é<br />

equiparado ao avalizado, não apenas em relação às obrigações, mas igualmente em<br />

relação aos direitos. O que pode fazer o aceitante, igualmente pode o seu avalista.<br />

Quem pode o mais, pode o menos.<br />

Assim, pode-se inferir que o protesto cambial é simples meio oficial para a<br />

prova de que o portador do título, letra de câmbio, cheque, duplicata, dentre outros,<br />

procurou, no dia e lugar próprios, obter o cumprimento da ordem do sacador ou<br />

emitente, apresentando o título ao sacado, a quem a ordem foi dirigida. Com isso,<br />

não é qualquer protesto por falta de pagamento que poderá abalar legitimamente o<br />

crédito de alguém.<br />

Conclui-se, portanto, que o instituto do protesto cambial não tem, em relação<br />

ao aval, peculiaridades especiais que mereçam maiores comentários.<br />

4.5.5. O aval no cheque e na duplicata<br />

Cheque pode ser definido como ordem de pagamento à vista para a retirada<br />

de fundos que o emitente tenha disponíveis. O pagamento do cheque pode ser<br />

garantido por aval prestado por qualquer pessoa capaz, seja terceiro ou signatário<br />

do cheque, exceto pelo sacado (art. 29, Lei do Cheque).<br />

Para o Professor Wille Duarte Costa, ӎ uma promessa indireta de pagamento<br />

feita pelo emitente, cujo conteúdo, tal como na letra de câmbio, corresponde a uma<br />

ordem de pagamento [...].” 189 Na sua estrutura de ordem de pagamento, revestido da<br />

formalidade e do rigor que caracterizam os títulos de crédito, é uma espécie de letra<br />

de câmbio de funções mais restritas. Assim sendo, é o cheque uma ordem de<br />

pagamento da qual resulta imediatamente a obrigação do emitente ou sacador que,<br />

187<br />

MENDONÇA, Carvalho apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.187.<br />

188<br />

Idem, 1975.<br />

189<br />

COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.323.<br />

69


ao firmá-lo, como acontece na letra, faz, ao mesmo tempo, uma promessa indireta<br />

de pagamento.<br />

Embora seja o cheque simples instrumento para retirada de fundos, sendo<br />

sempre ordem de pagamento à vista, não se destinando normalmente a circular<br />

como outros títulos de crédito, não deixa de se incluir entre estes, uma vez que o<br />

recebimento de um cheque, em lugar do dinheiro, de cuja retirada ele é o<br />

instrumento, implica sempre em crédito feito ao emitente.<br />

Segundo a Lei nº 2.591 de 1912, bem como a LC e a LUG, o cheque adquire<br />

as mesmas peculiaridades dos demais títulos de crédito, tanto no que tange à ação<br />

regressiva quanto aos seus efeitos para a figura do aval. Nenhuma dúvida paira,<br />

então, de que podem ser avalizados tanto o emitente como os endossadores do<br />

cheque, não havendo, quer na lei do cheque, quer na LC, nenhum dispositivo, nem<br />

princípio, que se oponha à validade e eficácia do aval ao sacado, o aval é possível,<br />

válido, e eficaz. Quanto à sua utilidade, é evidente: é útil ao portador que, não<br />

confiando no sacado, confia no avalista; ao sacado, que consegue prazo para o<br />

pagamento; e ao emitente e demais coobrigados, que se exoneram com a marcação<br />

do aval. 190<br />

Se aplicam aos avalistas, no cheque, as mesmas normas da LC. A ação<br />

contra o avalista é a mesma e pode ser proposta nos mesmos prazos e sob as<br />

mesmas condições requeridas para a ação contra o avalizado, tema este já<br />

comentado no bojo deste trabalho. A ação contra o emitente é, em rigor de técnica<br />

cambial, uma ação de regresso. A ação contra o emitente ou sacador do cheque, do<br />

mesmo modo que a ação contra o sacador de uma letra de câmbio é, pois,<br />

cambialmente, uma ação de regresso. Ao emitente e aos seus avalistas a ação<br />

poderá ser proposta em qualquer tempo, enquanto não prescrita independentemente<br />

do protesto. 191<br />

Uma vez que se aplicam ao cheque os mesmos dispositivos dos demais<br />

títulos de crédito, a assinatura aposta por qualquer pessoa, no verso ou no anverso<br />

do título, pode obrigá-la como avalista, do mesmo modo que poderá ter a<br />

significação de um endosso a assinatura do beneficiário no verso do cheque. Tal<br />

assinatura poderá configurar, conforme as circunstâncias, um aval ou endosso em<br />

190 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975.<br />

191 REQUIÃO, Rubens. Op. Cit. 2003.<br />

70


anco. Vale lembrar que cheque ao portador não é suscetível de endosso, só<br />

podendo receber endosso o cheque nominativo com a cláusula à ordem. 192<br />

"Cheque. Aval. Assinatura aposta no verso do cheque ao portador,<br />

sem pertencer ao próprio sacador, constitui aval em favor do<br />

emitente, mesmo que desacompanhada de quaisquer expressões<br />

atinentes aquele fim. Desnecessidade de protesto para a execução<br />

contra o avalista do emitente-sacador, especialmente quando<br />

demonstradas a apresentação tempestiva ao sacado, de<br />

compensação, e a inexistência de fundos.” 193<br />

“Embargos à execução. Cheque. A assinatura lançada no dorso do<br />

cheque, por terceiro, se constitui em aval. Conseqüentemente, é ele<br />

parte passiva legítima na execução. Embargos Improcedentes.<br />

Sentença Mantida. Apelo Improvido.” 194<br />

Fran Martins lembra que quando o aval for dado por um signatário do cheque<br />

(emitente ou endossantes), não haverá reforço de garantia de pagamento do título,<br />

pois os signatários já estavam obrigados anteriormente, caso o sacado não<br />

efetuasse o pagamento. 195<br />

No que tange à duplicata, é um título de crédito tipicamente brasileiro, com<br />

origem no art. 219 do Código Comercial Brasileiro de 1850. 196 Ela desempenha o<br />

papel de uma letra de câmbio provisionada e causal, sendo um título de crédito<br />

cujas obrigações poder sem avalizadas. O pagamento de uma duplicada pode ser<br />

avalizado, sendo o avalista equiparado àquele de cujo nome indicar; na falta de<br />

indicação, aquele abaixo de cuja firma lançar a sua; fora desses casos, ao<br />

comprador, conforme expressa determinação do art. 19 da Lei nº 187 de 1936.<br />

Estabelece, ainda, o art. 22, § 3º, que “os signatários da duplicata ou triplicata<br />

obrigam-se solidariamente pelo aceite e pelo pagamento”, acrescentando o art. 23<br />

que se aplicarão à duplicata, no que for possível, os dispositivos da Lei nº 2.044 de<br />

1908. Tem-se, com isso, que aplica-se ao aval das duplicatas tudo o que foi dito em<br />

relação ao aval dos títulos cambiais. 197<br />

192<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975.<br />

193<br />

TARGS, APC nº 186014932, 3ª Câm. Cív. Rel. Elvio Schuch Pinto, j. 14/05/86. In: PROCERGS -<br />

VIA/RS).<br />

194<br />

TARGS, APC nº 189045750, 5ª Câm. Cív., Rel. Ramon Georg Von Berg j. 27/06/89. In:<br />

PROCERGS -VIA/RS).<br />

195<br />

MARTINS, Fran. Op. Cit. 1997.<br />

196<br />

COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003.<br />

197<br />

BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.200.<br />

71


Salienta, por oportuno, que o aval em branco, na duplicata, que não seja<br />

contíguo a qualquer outra assinatura, será sempre considerado como aval ao<br />

comprador, tenha ou não este reconhecido a exatidão da duplicata, reconhecimento<br />

que, nesse título, equivale ao aceite.<br />

Conclui-se, com isso, que o aval em branco, não contíguo à firma do emitente<br />

ou de qualquer endossador, é sempre pelo comprador, quer este aceite ou deixe de<br />

aceitar, negando-se ao reconhecimento da duplicata. Tal avalista, como qualquer<br />

outro signatário, obriga-se pelo aceite e pelo pagamento do título.<br />

Quanto ao aval posterior ao vencimento, a Lei 5.474 dispõe expressamente,<br />

no parágrafo único do art. 12, que: “O aval dado posteriormente ao vencimento do<br />

título produzirá os mesmos efeitos que o prestado anteriormente àquela ocorrência”.<br />

Depreende-se, assim, que quem assinar como avalista, depois de vencida e mesmo<br />

depois de protestada a duplicata, obriga-se do mesmo modo que se houvesse feito<br />

antes do vencimento. Outro não pode ser o entendimento e os efeitos deste aval. 198<br />

4.5.6. O aval na falência<br />

A condição é suspensiva a que está subordinada a obrigação do avalista do<br />

sacador ou dos endossadores, apesar do art. 32 da LC dispor que à falta do<br />

protesto, o portador perde o direito contra eles. É suspensiva, pois, e não resolutiva,<br />

a obrigação de tais avalistas.<br />

No diz respeito aos direitos do avalista e demais coobrigados solventes<br />

perante o obrigado, tais coobrigados podem apresentar-se na falência por tudo<br />

quanto houverem pago e também pelo que mais tarde devam pagar, se o credor não<br />

pedir a sua inclusão na falência, observados, em qualquer caso, os preceitos letais<br />

que regem as obrigações solidárias. 199<br />

Ainda quanto à condição ser suspensiva, observa-se que, segundo a<br />

legislação pertinente já invocada, independentemente de qualquer condição, os<br />

coobrigados solventes “podem apresentar-se na falência por tudo quanto houverem<br />

pago”, peça ou não o credor a sua inclusão na falência, bem como podem, ainda,<br />

198 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975.<br />

199 Idem, 1975.<br />

72


tais coobrigados, apresentarem-se também pelo que mais tarde devam pagar, se o<br />

credor não pedir a sua inclusão na falência. 200 Portanto, conclui-se, que:<br />

a) a inclusão do credor na falência só constitui impedimento absoluto à<br />

habilitação dos coobrigados solventes em relação àquilo que mais tarde<br />

devam pagar;<br />

b) em relação ao que pagou parcialmente, nem sempre a inclusão do credor<br />

comum é obstáculo à habilitação do coobrigado solvente.<br />

Se o credor da obrigação solidária, conforme o art. 27 da LC, concorre pela<br />

totalidade de seu crédito às massas de todos os coobrigados falidos, é porque<br />

somente assim terá ele a possibilidade de ser integralmente pago. É o pleno<br />

funcionamento e a integral eficácia da solidariedade que a lei procura resguardar.<br />

O art. 29 da antiga Lei de Falências estabelece que o coobrigado somente<br />

poderá concorrer à falência quando o credor não concorrer ou quando não tiver mais<br />

o direito de concorrer pela totalidade da dívida. 201<br />

Algumas conclusões de ordem prática se fazem prementes, quais sejam:<br />

a) se o avalista nada pagou, não poderá habilitar-se na falência do emitente<br />

como credor condicional pelo valor do título, se o portador não pedir a sua<br />

inclusão na falência;<br />

b) se o avalista pagou integralmente o título, quer antes quer depois da<br />

decretação da falência, irá ele habilitar-se na falência, pela totalidade da<br />

dívida que pagou;<br />

c) se o avalista pagou parcialmente a dívida, depois da decretação da<br />

falência do emitente, quando o credor pedir a sua inclusão na falência pela<br />

totalidade do crédito, como lho faculta o art. 27 da Lei de Falências, o<br />

avalista não poderá habilitar-se;<br />

d) se o avalista pagou parcialmente a dívida antes de decretada a falência do<br />

emitente, o portador só poderá pedir sua inclusão pelo saldo de seu<br />

crédito. Pelo que houver pago, poderá habilitar-se o avalista, haja ou não o<br />

portador pedido sua inclusão. Os créditos somados, do portador e do<br />

avalista, perfazem a soma cambial, isto é, o débito do emitente e falido.<br />

200 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975<br />

201 Idem, 1975.<br />

73


As conclusões acima apontadas coadunam rigorosamente com a lei, bem<br />

como aos estritos caracteres legais pertinentes, tanto para os direitos quanto para os<br />

interesses, quer da massa falida, do portador do título ou do avalista.<br />

4.5.7. Aval e alienação fiduciária em garantia<br />

A legislação pertinente da alienação fiduciária em garantia teve início, no<br />

Direito brasileiro, com o “art. 66 da Lei 4.728, de 14 de julho de 1965, alterada pelo<br />

Decreto-lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, que também estabeleceu normas<br />

processuais sobre a matéria.” 202<br />

Conforme o ilustre Orlando Gomes, 203 a alienação fiduciária em garantia é "o<br />

negócio jurídico pelo qual o devedor, para garantir o pagamento da dívida, transmite<br />

ao credor a propriedade de um bem, retendo-lhe a posse direta, sob a condição<br />

resolutiva de saldá-la.”<br />

Pode-se dizer que se trata a alienação fiduciária de um contrato de garantia<br />

em que o devedor aliena um bem a fim de assegurar o pagamento de uma dívida<br />

até que adimplido seja este débito, quando retorna o bem ao patrimônio do<br />

fiduciante.<br />

A alienação fiduciária configura, em sua forma, um negócio jurídico bilateral<br />

em que uma das partes (fiduciante) aliena a propriedade de um bem ao financiador<br />

(fiduciário), até que se extinga a relação contratual pelo adimplemento ou pela<br />

inexecução de qualquer das obrigações contratuais. Desta forma, através desse<br />

contrato, transfere-se ao credor ou fiduciário o domínio resolúvel da coisa alienada e<br />

a posse indireta do bem dado em garantia independente de efetiva tradição da<br />

coisa, tornando-se o alienante ou devedor em mero possuidor direto e, por força da<br />

lei, depositário do bem alienado. 204<br />

No que concerne à instituição financeira, Luiz Emygdio 205 coloca que, ao<br />

conceder o financiamento, além de tornar-se titular da propriedade resolúvel do bem,<br />

é também detentora de nota promissória emitida a favor pelo financiado e avalizada<br />

por terceiro, no valor corresponde ao débito.<br />

202<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2002, p.329.<br />

203<br />

GOMES, Orlando apud BULGARELLI, W. Contratos mercantis. São Paulo: Atlas, 1995, p.307.<br />

204<br />

PARIZZATO, João Roberto. Alienação fiduciária: doutrina, jurisprudência e prática forense. Minas<br />

Gerais - Ouro Fino: Edipa, 1998.<br />

205<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2002.<br />

74


Neste sentido, a alienação fiduciária em garantia, para atender às entidades<br />

financeiras e também aos consumidores, facilitou inegavelmente a concessão de<br />

crédito direto ao comprador, oferecendo ao financiador garantia efetiva do<br />

ressarcimento do seu crédito, sem, no entanto, retirar do financiado seu direito de<br />

posse sobre a coisa alienada, lhe assegurando o uso e gozo, podendo usufruí-los da<br />

forma como entendesse. 206<br />

Também com o fim de inibir a má utilização da alienação fiduciária em<br />

garantia por parte dos contratantes, vedou o legislador no § 7º, art. 66 207 , da Lei<br />

4.728 de 1965, a incidência do que se conhece por pacto comissório 208 209 , instituto<br />

que dá ao credor o poder de avocar para si a coisa dada em garantia face ao não<br />

pagamento do preço pelo comprador. Torna-lhe obrigatório, portanto, vender o bem<br />

para que restituído seja o valor do débito. Tal vedação foi posteriormente ratificada<br />

pela edição do Decreto-Lei nº 911 de 1.969, que em seu art. 1º, § 6º, declarou nula a<br />

cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em<br />

garantia, se a dívida não for paga no seu vencimento.<br />

Quanto à mora do devedor, esta ocorre ex-re, ou seja, com o simples<br />

descumprir do prazo para pagamento, servindo como comprovação a notificação<br />

feita pelo:<br />

“Cartório de Títulos de Documentos ou o protesto do título, a critério do<br />

credor (Decreto-lei nº 911/69, art. 2º, § 2º). Comprovada a mora, é<br />

imprescindível a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente<br />

(Súmula 72 do STJ). Permite a lei que a instituição financeira proceda à<br />

venda extrajudicial do bem objeto de alienação fiduciária em garantia<br />

(Decreto-lei nº 911/69, art. 2º). Não havendo a prévia avaliação do bem e a<br />

concordância do devedor, o título de crédito emitido pelo financiado perde a<br />

sua liquidez, descaracterizando-se como título executivo, e assim, o devedor<br />

somente responde pessoalmente pelo saldo devedor em processo de<br />

conhecimento.” 210<br />

206 DIREITO BANCÁRIO ON-LINE. Alienação Fiduciária. Disponível em: Acesso em: 27 set. de 2006, p.1.<br />

207 A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse direta da<br />

coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou<br />

devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe<br />

incumbem de acordo com a lei civil e penal.<br />

208 Consagrado no art. 1.163 do CC Brasileiro, é o pacto comissório ente comum aos contratos de<br />

compra e venda e faculta ao credor desfazer o contrato, se não cumprido até certo dia pelo devedor,<br />

ficando de pleno direito com a coisa passados dez dias do vencimento da obrigação.<br />

209 Importante que se saliente que é o pacto comissório também vedado às demais modalidades de<br />

garantia real, tais quais o penhor, a anticrese e a hipoteca, na forma do que dispõe o artigo 765 do<br />

CC: "É nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário, a ficar com o<br />

objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento".<br />

210 ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2002, p.329-330.<br />

75


Isso ocorre pelo fato de que “o único título executivo criado sem ou contra<br />

vontade do devedor é a Certidão da Dívida Ativa da Fazenda Pública. Todavia, os<br />

demais títulos executivos dependem da expressa anuência do devedor no que toca<br />

ao na e quantum debeatu.” 211<br />

No que diz respeito à posição do avalista, o Decreto-lei nº 911/69 determina<br />

que o avalista, fiador ou terceiro interessado, que pagar a dívida do alienante ou<br />

devedor, se sub-rogará, de pleno direito, no crédito e na alienação fiduciária em<br />

garantia constituída por alienação fiduciária em garantia. Pode-se dizer que,<br />

executada a garantia, o saldo devedor remanesce a responsabilidade do avalista:<br />

“por se tratar de obrigação autônoma e por força do dispositivo contido no<br />

art. 66, § 5º, da Lei nº 4.728/65, com redação dada pelo Decreto-lei nº<br />

911/69, pelo qual não bastando o produto da venda do bem para<br />

pagamento do débito, o devedor continuará responsável pessoalmente<br />

pela obrigação de pagar o saldo devedor apurado, no mesmo sentido da<br />

norma contida no art. 767 da Lei Civil. Portanto, a propriedade fiduciária se<br />

extingue com a excussão da garantia real.” 212<br />

É importante destacar que no caso de frustrar a sub-rogação legal por ato ou<br />

omissão do credor, “o avalista pode se recusar a efetuar o pagamento”, como<br />

ocorre, por exemplo, quando desaparecem as mercadorias objeto da alienação<br />

fiduciária, sem que o credor fiduciário tenha tomado qualquer providência para<br />

localizá-las ou responsabilizar o depositário em caso de extravio ou perda. 213<br />

4.6. O avalista<br />

4.6.1. Quem pode ser avalista<br />

Primeiramente, insta salientar que pode ser avalista qualquer pessoa que<br />

detenha capacidade civil ou comercial. 214 O avalista torna-se co-devedor, em<br />

obrigação solidária, e o pagamento da obrigação pode ser imputado diretamente a<br />

ele, sem que o seja, anteriormente, contra o avalizado. É o que se depreende do art.<br />

42 da LC: quem quer que tenha capacidade para obrigar-se cambialmente, seja<br />

211<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio. Op. Cit. 2002, p.330.<br />

212<br />

Idem, 2002, p.330.<br />

213<br />

Idem, 2002, p.330.<br />

214<br />

MARTINS , Fran. Op. Cit. 1997.<br />

76


pessoa física ou jurídica, pode ser avalista, inclusive o estrangeiro, que poderá ser<br />

avalista no Brasil desde que capaz nos termos do ordenamento jurídico, ainda que<br />

incapaz pela lei do Estado a que pertença.<br />

Depreende-se, portanto, que o avalista não precisa ser necessariamente um<br />

terceiro, estranho ao título de crédito, posto fato de adquirir responsabilidade a partir<br />

de tal nexo cambial: podendo avalizar qualquer dos coobrigados, o endossador, o<br />

sacador, o próprio aceitante da letra de câmbio ou o emitente da nota promissória.<br />

Contrários a esta afirmação, alguns doutrinadores, tais como Saraiva, Carvalho de<br />

Mendonça 215 e outros, lecionam pugnando que o coobrigado não pode intervir como<br />

avalista por lhe não ser facultado agravar sua responsabilidade além dos limites<br />

fixados por lei.<br />

Ainda que respeitáveis os argumentos contrários, pode-se afirmar, com fincas<br />

na LUG, art. 30, alínea 2ª, ou na Lei nº 2.044, que no Brasil pode ser avalista não<br />

apenas um terceiro, estranho ao nexo cambial, mas qualquer um dos coobrigados,<br />

um endossador, o sacador, o próprio aceitante da letra de câmbio ou o emitente da<br />

nota promissória, desde que, como já dito anteriormente, tenha capacidade civil ou<br />

comercial. Este leque abrangente de pessoas detentoras de capacidade para ser<br />

avalista apresenta inúmeras vantagens práticas, tanto do ponto de vista de direito<br />

quanto de fato, no sentido de se amalgamar os efeitos e as razões de ser do aval,<br />

qual seja, garantir o pagamento da letra de câmbio e da nota promissória.<br />

"Uma vez que a obrigação do avalista é equiparada à do avalizado, está<br />

claro que não é a mesma que esta, mas uma outra, diferente na sua<br />

essência, embora idêntica nos seus efeitos. O avalista obriga-se de um<br />

modo diverso, mas responde da mesma maneira que o avalizado, sendo<br />

neste sentido que se diz que o aval corresponde a um novo saque, um<br />

novo aceite, um novo endosso, segundo a posição que ocupa na letra de<br />

câmbio. Em virtude desta dupla situação, por um lado, a falsidade, a<br />

inexistência ou a nulidade da obrigação do avalizado não afetam a<br />

obrigação do avalista, não aproveitando a este nenhuma das defesas<br />

pessoais, diretas ou indiretas, que àquele possam legitimamente competir;<br />

por outro lado, o avalista obriga-se apenas como o avalizado, e nos<br />

mesmos termos que este, e, por isso, quando garante ao endossante, tem<br />

a seu favor a prescrição de um ano e libera-se com a falta do protesto;<br />

quando, porém, garante ao sacador ou ao aceitante, não lhe aproveita a<br />

omissão do protesto e só lhe é lícito invocar a prescrição de cinco anos.” 216<br />

215 SARAIVA, José Antônio; CARVALHO DE MENDONÇA apud BORGES, João Eunápio. Op. Cit.<br />

1975, p.44.<br />

216 MIRANDA, Pontes. Op. Cit. 1961, p.376.<br />

77


Tendo em vista que qualquer pessoa civil e comercialmente capaz pode ser<br />

avalista, conclui-se, estrito senso, que também o aval pode ser firmado através de<br />

instrumento de procuração, desde que o procurador esteja munido de poderes<br />

especiais para o ato. Da inteligência do art. 46 da LC, infere-se que o mandatário<br />

que o subscreve sem estar devidamente autorizado não obrigará o mandante, mas<br />

ficará pessoalmente obrigado ao pagamento da letra.<br />

A distinção que por se só se justifica está anotada no art. 1.647, III, do CC<br />

vigente: se o avalista for casado em regime distinto da separação absoluta de bens,<br />

a prestação do aval exige autorização do outro cônjuge: outorga marital ou uxória.<br />

Portanto, o aval agora demandará assinatura do avalista e, se ele é casado pelos<br />

regimes de comunhão universal de bens ou comunhão parcial de bens, a assinatura<br />

do cônjuge autorizando o ato de garantia. Na ausência de tal autorização, poderá o<br />

cônjuge, o marido ou a esposa, pleitear a invalidação do aval, como expressamente<br />

prevê o art. 1.642, IV, do mesmo CC. É preciso estar atento para o fato de tratar-se<br />

de anulabilidade, ou seja, de negócio que, na forma do art. 172, pode ser confirmado<br />

pelas partes, salvo direito de terceiro; ademais, diz o art. 177, a anulabilidade não<br />

tem efeito antes de coisa julgada por sentença, nem se pronuncia de ofício; só os<br />

interessados (no caso o cônjuge que não autorizou o aval) a podem alegar, e<br />

aproveita exclusivamente aos que a alegarem, salvo os casos de solidariedade ou<br />

indivisibilidade. A regra é repetida, especificamente, para o tema aqui examinado,<br />

pelo art. 1.650 da mesma lei, segundo o qual a decretação de invalidade dos atos<br />

praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá<br />

ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.<br />

A confirmação do aval a posteriori poderá se dar de forma expressa, hipótese<br />

na qual se faz necessário que o ato de confirmação contenha a substância do<br />

negócio celebrado e vontade expressa de mantê-lo, como exigido no art. 173. Para o<br />

aval, essa ratificação expressa pode fazer-se pela assinatura da cártula, certo que,<br />

na forma do art. 176, quando a anulabilidade do ato resultar da falta de autorização<br />

de terceiro, será válido se este a der posteriormente; a autorização a posteriori pode<br />

dar-se pela mesma forma que a que se daria a priori ou simultaneamente, vale dizer,<br />

pela assinatura conjunta na cártula. Poderá, igualmente, fazer-se por instrumento<br />

avulso, hipótese na qual deverá ser descrito minuciosamente o título, permitindo-se<br />

identificação inequívoca da obrigação, bem como afirmada expressamente a<br />

autorização dada a posteriori para o aval. Esse instrumento deverá ser público ou,<br />

78


se privado, deverá apresentar-se autenticado, como exigido pelo art. 1.649,<br />

parágrafo único, do CC.<br />

O aval prestado por pessoa jurídica contra vedação de contrato ou estatuto<br />

social corresponde ao ato de liberdade e, sendo assim, normalmente o contrato<br />

social de sociedades por quotas de responsabilidade limitada e o estatuto das<br />

sociedades anônimas vedam aos seus administradores a dação de fiança e aval em<br />

nome da sociedade, correndo dúvida, no entanto, se o aval, quando dado, obriga ou<br />

não a sociedade. Alguns doutrinadores e julgados entendem que este aval não tem<br />

validade pelas seguintes razões:<br />

a) os arts. 316 e 331 da Lei Comercial não permitem que os sócios possam<br />

contrair, em nome da sociedade, obrigações estranhas ao seu objeto;<br />

b) considerando que o contrato social tem que ser arquivado no Registro<br />

Público de Empresas Mercantis, predomina o princípio da publicidade,<br />

permitindo-se que um terceiro possa facilmente examinar o contrato da<br />

sociedade e verificar a ocorrência ou não de restrição contratual na dação<br />

do aval;<br />

c) o art. 46 do Decreto nº 2.044/1908 reza que aquele que assina a<br />

declaração cambial, como mandatário ou representante legal de outrem,<br />

sem estar devidamente autorizado, fica por ela pessoalmente obrigado,<br />

colecionando neste sentido os arts. 8.º da LUG e 14 da LC. Portanto, a<br />

sociedade não responderia pelo aval em razão da restrição contratual ou<br />

estatutária.<br />

Outrossim, a orientação predominante é no sentido de considerar válida e<br />

eficaz a obrigação cambiária decorrente do aval prestado por sociedade em razão<br />

de contrato escrito ou estatuto social. De acordo com o Decreto nº 2.044 de 1908,<br />

em seu art. 42, reza sua capacidade cambiária toda pessoa natural ou jurídica que<br />

tenha capacidade jurídica. Esta lei contém norma de ordem pública, pela qual não<br />

pode ser afastada mera cláusula contratual ou estatuto social, cuja eficácia fica<br />

sujeita às relações entre a sociedade dos prejuízos causados por ter praticado o<br />

aval (LSQ. ART. 10, LSA, ARTS. 158 e 159). Além do mais, não tem aplicação no<br />

direito societário brasileiro a teoria ultravires, pela qual a sociedade não teria<br />

responsabilidade pelos atos praticados, em seu nome, por seus administradores,<br />

quando estranhos ao objeto social, sendo a única exceção a sociedade em nome<br />

79


coletivo (CÓDIGO COMERCIAL BRASILEIRO, ART. 316). Segundo, porque os<br />

negócios mercantis caracterizam-se por sua celeridade, pelo que não se pode criar<br />

obstáculo ao seu desenvolvimento, exigindo-se que para a prática de cada ato de<br />

administração normal, o terceiro deva tomar conhecimento do contrato social, ou<br />

estatuto, que com ele transacione, para saber se seus administradores têm ou não<br />

poderes para a prática do ato. A tendência do direito moderno é aplicar a teoria da<br />

aparência, visando a proteção do contratante de boa-fé, reconhecendo a eficácia de<br />

situações aparentes, para que a aparência predomine sobre a realidade. Portanto, a<br />

aparência funciona como elemento primordial de situações formalmente irregulares<br />

em sua origem, constituídas, porém, sobre o mando da boa-fé, por ter a sociedade<br />

contribuído para criar uma aparência de legitimidade no que toca a esses atos<br />

praticados pelo sócio com excesso de poderes, de maneira a levar terceiros a<br />

acreditarem na sua legitimidade. Por isso, em havendo vedação contratual ou<br />

estatutária, a sociedade deve responder pelo aval dado por culpa in elegendo e in<br />

vigilando, em relação aos seus administradores. Terceiro, porque o administrador da<br />

sociedade não é seu mandatário, não a representa, não transmite a sua vontade,<br />

mas constitui um de seus órgãos, que exprime e realiza a vontade da sociedade,<br />

gera a vontade social, ou melhor, representa a sociedade. Portanto, a<br />

responsabilidade da sociedade não deve ser considerada como regra absoluta<br />

porque deve ser examinada em cada caso concreto.<br />

De tal maneira, a sociedade não tem responsabilidade como avalista quando<br />

o beneficiário do título tem ciência da vedação contratual do aval (ou deveria ter, em<br />

razão de sua profissão, porque não pode ser considerado de boa-fé). A exemplo,<br />

cita-se a hipótese de uma pessoa ser sócia-gerente de uma sociedade por quotas<br />

de responsabilidade limitada, cujo contrato social vede a dação de aval. Essa<br />

pessoa retira-se da sociedade, concorda em receber a prazo seus haveres sociais<br />

mediante nota promissória emitida pessoalmente pelo sócio-controlador e avalista<br />

pela sociedade. Neste caso, a sociedade não deve responder pelo aval, por não ser<br />

o credor terceiro de boa-fé, porque tinha conhecimento da cláusula do contrato<br />

social proibindo a dação do aval.<br />

80


4.6.2. Responsabilidade do avalista<br />

O avalista é uma pessoa que se torna responsável pelo pagamento de um<br />

título de crédito, nas mesmas condições de seu avalizado. O art. 15 da LC preceitua,<br />

quanto aos efeitos do aval, que o avalista é um obrigado cambial que ocupa, no<br />

contexto cambiário, a mesma posição jurídica objetiva da pessoa a favor de quem<br />

avalizou e à qual se equipara. Será, pois, um obrigado direto, se avalista do<br />

aceitante ou do emitente, quando se tratar de promissórias, ou de regresso, se<br />

avalista do sacador ou dos endossadores. Contudo, não se pode dizer que sua<br />

obrigação seja a mesma obrigação do avalizado, mas simplesmente que é obrigação<br />

do avalizado, que pode não existir ou não ser válida, sem que a do avalista sofra a<br />

menor restrição quanto à validade e à eficácia.<br />

Sob o pálio do art. 43 da já citada LC, insta salientar que o aval é obrigação<br />

autônoma, independente de quaisquer outras decorrentes do mesmo título, inclusive<br />

da do avalizado. Firmando o aval, o signatário fica vinculado e solidariamente<br />

responsável pelo aceite e pelo pagamento da letra, sem embargo da falsidade, da<br />

falsificação ou da nulidade de qualquer outra assinatura.<br />

Em oposição ao que afirmam alguns doutrinadores, a expressão contida na<br />

nossa lei, em seu art. 43, não pode ser vista como um pleonasmo ou expressão<br />

redundante, ao mencionar que as obrigações cambiais são autônomas e<br />

independentes umas das outras. Autonomia não se confunde com independência. A<br />

autonomia é a independência que possui cada uma das obrigações cambiais,<br />

isoladamente consideradas, perante a causa, a relação fundamental determinante<br />

de cada declaração; já a independência é a autonomia considerada nas relações<br />

existentes entre as diversas obrigações cambiais. Outro elemento característico da<br />

obrigação do avalista é o seu caráter abstrato, como são de resto todos os títulos<br />

cambiais ou aqueles que, por lei, lhes forem assimilados.<br />

Outrossim, reforça que no aval, obrigação de uma garantia, a abstração é<br />

ainda, se possível, maior do que em qualquer outra obrigação cambial. Vale dizer<br />

que o simples fato de ser o avalista equiparado ao avalizado não induz à existência<br />

de qualquer relação entre eles. Portanto, cambialmente, a responsabilidade que<br />

decorre para o avalista, qualquer que seja a causa de sua declaração, é a mesma<br />

que contrai qualquer subscritor do título: a garantia do pagamento.<br />

81


Salutares são as expressões de João Eunapio Borges 217 quanto à autonomia.<br />

Por isso mesmo, é transcrita abaixo a sua abalizada opinião, ao dispor que é a<br />

autonomia a obrigação do avalista que não poderá opor ao portador do título<br />

exceções pessoais do que o obrigado a que se equiparou. Como todo devedor<br />

cambial, poderá defender-se, exclusivamente, com as exceções pessoais que lhe<br />

forem próprias, com os defeitos formais do título e com a falta de requisitos<br />

necessários para que o possuidor possa exercer a ação cambial.<br />

O princípio da inoponibilidade das exceções é característica tão essencial ao<br />

direito cambiário, que o admitem e defendem os mais decididos partidários do<br />

caráter acessório do aval em relação à obrigação principal. Com isso, comprova o<br />

princípio que todas as obrigações cambiais são independentes e que sua<br />

inexistência, a falsificação ou a nulidade de umas não refletem sobre as outras.<br />

Segue que nenhum obrigado pode opor ao exeqüente as exceções pessoais que lhe<br />

seriam oponíveis por um dos outros devedores cambiais.<br />

Quanto à equiparação das obrigações cambiais, ressalta-se que esta não é à<br />

obrigação concreta da pessoa avalizada, mas uma equiparação à figura daquele que<br />

figura como obrigado. Substancialmente, o avalista ocupa no contexto cambiário a<br />

mesma posição objetiva que o obrigado, ao qual se equiparou, sem prejuízo para a<br />

independência de suas obrigações.<br />

Só a título de doutrina comparada em outros Estados, tais como a Argentina e<br />

o Uruguai, importa destacar, segundo Segovia: 218 tem-se que o aval constitui<br />

obrigação pessoal distinta e independente dos demais firmatários da letra; é forçoso<br />

concluir que o avalista não pode invocar as exceções pessoais de seu garantido.<br />

Salienta-se, contudo, que embora tão categórico o dispositivo argentino, a<br />

doutrina daquele país tenta conciliá-lo, à medida do possível, com o princípio da<br />

inoponibilidade, aliás, essencial aos interesses da circulação e à própria natureza do<br />

direito cambiário.<br />

Outras características básicas para a validade da declaração cambiária, como<br />

em todo negócio jurídico, são: capacidade, objeto, vontade. Por se tratar de negócio<br />

que se formaliza pela manifestação da vontade, esta deve ser manifestada através<br />

de uma forma escrita. Prestada tal declaração, fatos impeditivos como a<br />

incapacidade do signatário, a ausência de uma vontade livre, consciente, e a<br />

217 BORGES, João Eunápio. Op. Cit. 1975, p.146.<br />

218 SEGOVIA apud COBO. El aval en el derecho argentino, p.159.<br />

82


discordância entre a vontade real e o conteúdo da declaração cambiária, podem<br />

obstar à existência ou à validade da obrigação, que dela devia resultar. Esses<br />

impeditivos se baseiam na falta ou nos vícios da vontade.<br />

Ainda no que tange às exceções oponíveis, vislumbram-se aquelas oponíveis<br />

erga nomes, ou seja, as que refletem o fato constitutivo da obrigação cambiária, bem<br />

como os fatos impeditivos, eminentemente afetos à capacidade do signatário da letra<br />

e aos fatos modificativos ou extintivos, por exemplo, quitação sobre o título.<br />

Alguns fatos impeditivos, como erro, violência, moral, serão exceções<br />

pessoais inoponíveis aos terceiros de boa-fé. Outros são modificativos ou extintivos,<br />

com caráter extracambiário, como no pagamento sem quitação no título,<br />

compensação. Essas regras se aplicam a todas as obrigações cambiais, e são<br />

absolutamente independentes umas das outras.<br />

Admite-se que a exceção de pagamento feito pelo avalizado possa ser oposta<br />

pelo avalista, desde que lhe seja possível fazer prova literal do pagamento. É que o<br />

avalista, sendo responsável pelo pagamento, não é propriamente um devedor da<br />

soma cambial, uma vez que ele tem a responsabilidade, não a dívida. Uma vez<br />

efetuado o pagamento, desaparece aquela responsabilidade.<br />

A figura do dolo, como sendo a exceção a todas as regras, também se<br />

constitui como oponibilidade das exceções.<br />

4.6.3. Direitos do avalista<br />

O avalista assume, no contexto cambiário, obrigação análoga à da pessoa a<br />

que se equipara. É importante destacar que o avalista, para todos os efeitos<br />

cambiais, é o sacador da letra de câmbio, ou o emitente da nota promissória, ou o<br />

endossador, ou o aceitante, ou o interveniente.<br />

Wille Duarte Costa elucida que “se o avalista paga o título, fica sub-rogado<br />

nos direitos emergentes do título contra a pessoa a quem se equiparou pelo aval e<br />

contra os obrigados para com tal pessoa. Se paga, recebe ainda todas as garantias<br />

cambiárias que eram asseguradas ao possuidor.” 219<br />

Não se pode olvidar que o avalista é obrigado da mesma espécie que a<br />

pessoa à qual legalmente se equiparou: o avalista é co-aceitante, co-sacador, co-<br />

219 COSTA, Wille Duarte. Op. Cit. 2003, p.207.<br />

83


endossador, co-interveniente. E, entre obrigados da mesma espécie, não há ação<br />

cambial, posição clara na doutrina.<br />

Se o avalista é o sacador, fica vinculado como sacador (co-sacador); se<br />

aceitante, o avalista responde como aceitante (co-aceitante); se endossador, fica na<br />

posição deste (co-endossador).<br />

Os autores são uníssonos ao reconhecerem que avalista e avalizado são<br />

coobrigados do mesmo grau, e afirmam que entre coobrigados do mesmo grau não<br />

existe regresso cambial. A melhor doutrina, que é conforme os intuitos da lei,<br />

considera a ação do avalista como a do principal obrigado – cambial e direta.<br />

Pode-se inferir que se avalista e avalizado são obrigados do mesmo grau, são<br />

obrigados equiparados se entre obrigados do mesmo grau não há vínculo cambial,<br />

não cabendo ação cambial de uns contra outros, a não ser por força de um<br />

dispositivo expresso. Cabe destacar que o art. 24 da LC prevê que o pagamento<br />

feito pelo aceitante ou pelos respectivos avalistas desonera da responsabilidade<br />

cambial todos os coobrigados. O pagamento feito pelo sacador, pelo endossador ou<br />

respectivo avalista desonera da obrigação cambial os coobrigados posteriores. O<br />

endossador ou o avalista, que paga ao endossatário ou ao avalista posterior, pode<br />

riscar o próprio endosso ou aval e os dos endossadores ou avalistas posteriores.<br />

Compuscando-se a lei cambial, é forçoso admitir ser impossível falar em ação<br />

cambial do avalista contra o avalizado, quando nossa lei não a conhece, nem<br />

explícita nem implicitamente. Nossa lei nega ao avalista a ação cambial específica<br />

contra a pessoa à qual se equiparou, isto porque não há regresso tipicamente<br />

cambial entre obrigados do mesmo grau, destinando-se a ação cambial específica a<br />

garantir os credores ou portadores que se encontrem em situação de supremacia<br />

relativamente aos obrigados anteriores.<br />

Outro ponto que se sobressai no debate cinge-se à solidariedade a que se<br />

refere a LC. Neste ponto, cada signatário é ao mesmo tempo credor e devedor,<br />

obrigado pela dívida inteira perante os obrigados posteriores, com direito a toda<br />

soma cambial em face dos anteriores. Embora sejam autônomas as obrigações<br />

cambiais e cada avalista assuma sua própria obrigação – de garantia – há ao<br />

mesmo tempo uma única responsabilidade, idêntica e solidária para todos. Este<br />

vínculo solidário, sobre o qual se reflete naturalmente o caráter cambiário do título,<br />

autoriza e justifica, nas relações entre coobrigados do mesmo grau, a aplicação das<br />

84


normas comuns das obrigações solidárias, não modificadas pelas regras peculiares<br />

ao direito cambiário relativamente à solidariedade cambial ou sucessiva.<br />

Paga a dívida cambial pelo avalista, poderá este exigi-la, pela ação cambial,<br />

dos obrigados anteriores à pessoa a que se equiparou, isto é, anteriores a seu<br />

avalizado. Mormente no caso de não haver qualquer relação entre avalizado e<br />

avalista, podendo ser o aval firmado sem o conhecimento e mesmo contra a vontade<br />

do avalizado, a defesa deste terá a máxima amplitude, incompatível com as<br />

restrições que cercam a defesa na ação cambial.<br />

Avalista e avalizado são dois coobrigados de igual responsabilidade, cujas<br />

relações se regulam pelas normas das obrigações solidárias. Não estão um defronte<br />

o outro como o fiador perante o afiançado, mas como dois coobrigados ao<br />

pagamento de uma dívida comum. A igualdade no débito é presunção, contrariável,<br />

por todos os meios de prova.<br />

Para haver do avalizado ou do co-avalista aquilo que houver pago por eles,<br />

embora não disponha da ação cambial específica, em virtude de seu caráter<br />

excepcional e das restrições que dela decorrem, nos termos do art. 51, da L C, para<br />

a defesa do executado, tem o avalista a ação executiva. É cambial a ação de que<br />

dispõem os co-avalistas uns contra os outros.<br />

4.7. Aval e o Código Civil vigente<br />

A Lei nº 10.406 de 2002, que institui o CC vigente, tratou do aval no seu art.<br />

897 e seguintes, não trazendo, no seu capítulo Intitulado “Dos Títulos de Crédito”,<br />

grandes ou significativas novidades às cambiais que já não houvessem sido tratadas<br />

pela legislação específica ou pacificada pelo entendimento doutrinário e<br />

jurisprudencial, conforme já analisado. Cumpre lembrar que as alterações que<br />

contrariaram as leis específicas vigentes não lograram aplicabilidade, tal como<br />

ocorreu com a do parágrafo único do art. 897, que veda o aval parcial.<br />

Com efeito, em matéria de títulos de crédito, nomeadamente quanto ao aval,<br />

o mandamento do CC vigente que vem gerando maior polêmica no meio jurídico é o<br />

do art. 1.647, inciso III 220 , sobretudo pelo fato de se aplicar, indistintamente, aos<br />

220 Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art.1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro,<br />

exceto no regime da separação absoluta: III – prestar fiança ou aval. A jurista paulista Regina Beatriz T. da<br />

Silva informa que a iniciativa da exigência da autorização conjugal para o aval foi do Fernando Henrique<br />

Cardoso. In: FIUZA, Ricardo. Novo CC. São Paulo:Saraiva, 2002, p.1459.<br />

85


títulos típicos e atípicos, preexistentes ou não ao novel diploma. Dispõe, nesse<br />

contexto, o artigo, que nenhum dos cônjuges poderá, sem autorização do outro,<br />

garantir obrigação assumida em título de crédito por meio de aval, salvo se casado<br />

no regime matrimonial de separação absoluta de bens, alterando, assim, o direito<br />

antes vigente, que não exigia a autorização conjugal para que o indivíduo casado no<br />

regime de comunhão de bens prestasse aval, mas somente para que prestasse<br />

fiança.<br />

Entretanto, o novo ordenamento civil causou forte impacto no instituto do aval,<br />

fazendo-o em capítulo diverso do dirigido aos títulos de crédito, dispondo no seu art.<br />

1647, Inciso III: “ressalvando o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode,<br />

sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: [...] III – prestar<br />

fiança ou aval.”<br />

Cabe destacar, porém, que por uma questão de princípios, esse preceito do<br />

Novel Ordenamento Cível, com a sua aplicabilidade e exigência, não contraria<br />

nenhuma legislação específica, apenas acrescentando novidade à legislação, o que<br />

não lhe é vedado. No entanto, cumpre, por oportuno, criticar o legislador pátrio, que,<br />

ao impor a autorização do cônjuge para validade do aval, prejudica a livre e<br />

independente circulação da cártula, acrescentando o procedimento de garantia<br />

cambial, passando o aval a necessitar da participação do terceiro estranho à relação<br />

do título.<br />

Diante da atual legislação cível, o avalista necessita da autorização do<br />

cônjuge para garantir qualquer cambial, salvo se for casado pelo regime de<br />

separação absoluta de bens. O aval prestado sem a vênia conjugal não é nulo,<br />

apenas passível de anulação pelo cônjuge cuja autorização não fora concedida,<br />

competindo a este e seus herdeiros o direito à ação de invalidação do aval 221 .<br />

Faz-se necessário esclarecer que a anulabilidade e não nulidade do aval que<br />

prescinda da autorização conjugal advém do caput do art. 1.649 do Novel<br />

Ordenamento Civil, que assim dispõe: “a falta de autorização, não suprida pelo juiz,<br />

quando necessária (art.1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro<br />

cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade<br />

conjugal.”<br />

221 Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Novo Código Civil). Artigo 1.642: qualquer que seja o regime de<br />

bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: Inciso IV: demandar a rescisão dos contratos de<br />

fiança e doação, ou invalidação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos<br />

Incisos III e IV do art. 1.647 [...].<br />

86


Segundo a inteligência do art. 1.648 do CC vigente, 222 o juiz poderá suprir a<br />

outorga quando o cônjuge a denegue sem justo motivo ou lhe seja impossível fazê-<br />

la. Caso o juiz não supra a autorização ou não a faça quando necessário,<br />

considerar-se-á o aval anulável, cabendo ao cônjuge, que não o avalista, fazer o<br />

pleito pertinente. Nesse caso, por força do art.1.646 do ordenamento cível em voga,<br />

o terceiro prejudicado com sentença favorável ao autor terá direito regressivo contra<br />

o cônjuge que realizou o negócio jurídico ou seus herdeiros.<br />

A aprovação do cônjuge ao aval poderá ser feita por instrumento público ou<br />

particular, desde que autenticada a assinatura. Cumpre salientar que a referida<br />

autorização conjugal não se confunde com o próprio aval, porque aquele que<br />

autoriza não é avalista e, por conseguinte, não é garante do pagamento.<br />

Mesmo quando ainda não exigível a vênia conjugal para o aval, ou seja, antes<br />

do CC vigente, por observância à ainda vigente Lei nº 4.121, de 27 de agosto de<br />

1962, já se preservava o cônjuge não avalista, pois já dispunha o art. 3 º da referida<br />

lei que “pelos títulos de dívida de qualquer natureza, firmados por um só dos<br />

cônjuges, ainda que casados pelo regime de comunhão universal, somente<br />

responderão os bens particulares do signatário e os comuns até o limite de sua<br />

meação.”<br />

Diante da proteção legal ao cônjuge não avalista, convém esclarecer que<br />

aquele que pretender o resguardo da meação deverá comprovar que o aval de seu<br />

marido ou esposa não lhe logrou proveito, direta ou indiretamente. Caso o aval<br />

tenha beneficiado o casal, a defesa de meação torna-se infrutífera.<br />

No que tange ao avalista casado, conclui-se que o CC vigente trouxe, como<br />

novidade, a possibilidade de anulação do aval concedido por pessoa casada, o qual<br />

prescinda da aprovação do respectivo cônjuge. Todavia, nos aspectos práticos e do<br />

ponto de vista do direito empresarial, muitas são as implicações, sendo que a cártula<br />

avalizada por pessoa casada poderá estar acompanhada de uma “verdadeira<br />

papelada” e calcada em procedimentos burocráticos indesejáveis e prejudiciais ao<br />

Direito Cambial, sobretudo, à sua capacidade de livre circulação.<br />

Por fim, acrescenta-se que, tendo em vista as diversas questões envolvidas<br />

na discutida autorização conjugal, e buscando evitar problemas para circulação e<br />

222 Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Novo CC). Art. 1.648: cabe ao juiz, nos casos do artigo<br />

antecedente, suprir a outorga, quando um dos cônjuges a denegue sem motivo justo, ou lhe seja<br />

impossível concedê-la.<br />

87


exigência da nota promissória, entende-se que o melhor seria colher o aval do casal<br />

e não de um só cônjuge.<br />

88


5. CONCLUSÃO<br />

A discussão do aval, longe de se resumir a um mero debate retórico do<br />

instituto cambiário, encontra eco nas crescentes preocupações do Direito<br />

relacionadas às modificações promovidas pelo CC vigente, que influenciaram de<br />

forma imprecisa e errônea o Direito Mercantil. Nesta perspectiva, o objetivo geral<br />

deste trabalho consistiu em estudar e entender as adaptações das distorções do<br />

aval à nova legislação.<br />

Em relação ao aval, constatou-se, com base em toda a referência conceitual,<br />

que é um instituto cambiário, caracterizado pela autonomia, liquidez, certeza e<br />

exigibilidade que adere ao título de crédito para garantir a obrigação cambiária por<br />

ele constituída. Verificou-se que o aval pode ser dado nas duas faces do título,<br />

quais sejam verso e anverso, podendo ser lançado em qualquer lugar, por ilação a<br />

LUG, art. 31 al. 2ª, sem que haja prejuízo para sua natureza jurídica. É importante<br />

destacar que o aval inexiste fora do título; o instituto cambiário apenas existe a partir<br />

do saque do título de crédito, que é um título de valor.<br />

Sobre a natureza da obrigação do avalista, esta depende do grau de<br />

responsabilidade do avalizado, conforme a LUG art. 32, 1ª, e LC, art. 31, concluindo-<br />

se que o grau de responsabilidade do avalista é idêntico ao do avalizado, verdadeira<br />

simbiose e interdependência.<br />

A questão do avalista é bastante ampla, tornando-se importante destacar que<br />

ele se responsabiliza pelo pagamento e pela quitação do valor da obrigação<br />

cambiária, na sua integralidade, e não pela pessoa do avalizado, desfazendo-se<br />

qualquer balbúrdia de hermenêutica e exegese. O estudo revelou que o aval nasce<br />

da simples assinatura do avalista, portanto não há necessidade de combinação ou<br />

pluralidade de assinaturas do sacado ou do emitente (subscritor) ou do aceitante. A<br />

assinatura deve ser de próprio punho, sendo inadmissível suprir a assinatura a<br />

autenticação ou chancela mecânica, passível de anulação processual.<br />

Aspectos relacionados a aval e fiança também foram analisados. Observou-<br />

se que o aval difere da fiança, sendo a equiparação entre os institutos apenas<br />

acadêmica. As informações obtidas permitem afirmar que a fiança não pode ser<br />

classificada como instituto cambiário, pois não guarda afinidade técnica e prática<br />

com qualquer título de crédito, e é por sua vez restrita aos contratos e deles<br />

dependente, ostentando caráter bilateral ou sinalagmático.<br />

89


Os dados coletados permitiram também verificar que o aval pode ser<br />

invalidado se casado o avalista e não houver consentimento do cônjuge, salvo se o<br />

regime de casamento for o de separação absoluta de bens; portanto, o aval respeita<br />

a máxima da autonomia de vontades indissociável, a liberdade de negociar fatores<br />

que desencadeiam a fluidez dos negócios cambiais. No entanto, o aval e a fiança se<br />

assemelham como garantia pessoal e fidejussória, mas regidos por regras distintas.<br />

A pesquisa revela, como necessidade, trabalhar as questões em torno do aval<br />

dado por pessoa que integra união estável, tratando-se de pessoa não casada e por<br />

cônjuge separado judicialmente, ainda não divorciado, haja vista que em tais<br />

questões deve prevalecer a responsabilidade do avalista, caso contrário haverá um<br />

prejuízo inestimável para a credibilidade e aplicabilidade do instituto cambiário, que<br />

já se encontra consagrado pela tradição cambiária. Ressalta-se, portanto, que<br />

embora a matéria não seja objeto de previsão legal, existe lacuna ou omissão do<br />

legislador ordinário em enfrentar o desafio do tema no que tange à responsabilidade<br />

do aval dado por pessoa que integra união estável e por pessoa separada<br />

judicialmente não divorciada, não havendo também pacificação na jurisprudência.<br />

Destaca-se, ainda, que o aval feito através de mandato exige a outorga de<br />

poderes expressos, especiais e específicos por meio de procuração, instrumento do<br />

mandato, tendo nomenclatura de mandatário especial para designar o avalista, a<br />

exemplo do que se infere no art. 14 do Decreto nº 2044, de 1908.<br />

Um outro aspecto detectado através da pesquisa diz respeito à omissão dos<br />

arts. 1.295 do antigo CC de 1916, do art. 145 do Código Comercial de 1850, e art.<br />

661 do CC de 2002, por não disciplinarem expressamente a outorga de poderes<br />

para o aval, sendo frágil o Código Comercial de 1850 ao compreender a expressão<br />

garantes da letra de câmbio, a polissemia do sacador, dos endossadores, dos<br />

aceitantes e dos abonadores, fato que gerava balbúrdia jurisprudencial. Digna de<br />

lembrança histórica é a fiança comercial solidária, que na época equipara-se ao aval<br />

no sistema francês, porém se perdeu num ciclo histórico, pelo anacronismo e pela<br />

limitação.<br />

As informações obtidas permitem afirmar que o aval só pode ser dado no<br />

título, pode ser em preto ou em branco, pode ser realizado após o vencimento do<br />

título, não se interpretando como mera cessão, com a ressalva da omissão da LUG<br />

no que concerne a esta indagação.<br />

90


Sobre o aval parcial ou limitado, observou-se que era desconhecido pelo<br />

Decreto nº 2.044 de 1908, e que através do dispositivo do art. 44, inciso IV, passou a<br />

ser admitido pela LUG, na redação existente no art. 30, al. 1ª, e ao contrário do<br />

ordenamento jurídico interno, que veda e torna passivo de nulidade o instituto, tal a<br />

lição encartada no CC vigente pelo art. 166, VII, combinado com o art. 897,<br />

parágrafo único.<br />

Outro assunto cuja complexidade se sobressai nos debates repousa sobre as<br />

restrições quanto ao aval incondicional. É admissível o simples e plural; assim, avais<br />

simultâneos ou co-avais e avais sucessivos ou aval de aval, podendo ainda ser<br />

realizados avais superpostos em branco. Foi possível verificar, também, que o aval<br />

corresponde em regra a ato de liberalidade; no entanto, o contrato social de<br />

sociedades por quotas de responsabilidade limitada e o estatuto das sociedades<br />

anônimas vedam aos seus administradores a outorga de aval em nome da<br />

sociedade, fato que se torna passível de anulação processual, diante da segurança<br />

e equilíbrio dos negócios jurídicos. Outrora, a lei não pode desguarnecer os<br />

interesses e direitos dos terceiros de boa-fé, interpretando-os como alheios aos atos,<br />

fatos e negócios que antecederam o aval em nome da sociedade; portanto, não<br />

devem ser prejudicados no aspecto da patrimonialidade, razão pela qual a lei põe a<br />

salvo tal circunstância na qualidade de credores.<br />

Porém, uma ressalva: tornou-se prática habitual e rotineira em operações<br />

bancárias a dação de aval em títulos de crédito com lastro de garantia de contratos<br />

de outorga de crédito mobiliário e imobiliário, abrangendo leasing, alienação<br />

fiduciária em garantia, consórcio, desconto de títulos e hipotecas, todos<br />

contemplando a possibilidade de cobrança ou execução autônoma contra o avalista<br />

independentemente do contrato, não se tratando o aval de obrigação cambiária<br />

acessória, em regra só podendo ser desconhecido por vício de forma, ou seja, o<br />

título de crédito deixa de ser considerado como tal, na realidade, por não se revestir<br />

dos elementos essenciais.<br />

A partir das análises dos resultados, foi possível constatar que as obrigações<br />

de ordem falimentar são contraídas por força do aval, respondendo o avalista do<br />

falido pelas mesmas obrigações deste, sendo que apenas a resolução sobre os<br />

contratos bilaterais fica a cargo do síndico, ou do liquidante, na hipótese de se tratar<br />

de liquidação extrajudicial.<br />

91


Desta forma, ao se justapor as percepções dos autores pesquisados neste<br />

trabalho, conclui-se que o aval se estende, em última análise, como garantia de<br />

efetivação e realização do crédito. A par do título de crédito, ele se revela como<br />

tutela de crédito, e se constrói no crédito como elemento que credita valor ao título.<br />

Assim, as informações levantadas neste estudo sobre as adaptações das<br />

distorções do aval à nova legislação permitem concluir que o aval, em toda a<br />

dimensão das responsabilidades cambiais, é imprescindível para o equilíbrio das<br />

transações empresariais, não sendo visto como anacrônico, obsoleto ou<br />

ultrapassado.<br />

92


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

ALBERNAZ, Lister Freitas. Títulos de crédito eletrônicos. Disponível<br />

em:. Acesso em: 31 ago. de<br />

2006.<br />

ASCARELLI, Túlio. Teoria geral dos títulos de crédito. 2 ed. São Paulo: Saraiva,<br />

1969.<br />

________. Panorama do direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1947.<br />

ASHTON, Peter Walter. Títulos de crédito e valores mobiliários: uma análise<br />

diferenciadora. Direito & Justiça. Revista da Faculdade de Direito da Pontifícia<br />

Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Faculdade de Direito, v.29, n.1, ano<br />

XXVI, p.171-193. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.<br />

ASQUINI, Alberto. Titolo di credito. (Trad. Livre). Pádua: Giuffrè, 1966.<br />

BEVILÁQUIA, Clóvis. Código civil comentado. São Paulo: Editora Paulo de<br />

Azevedo, 1957.<br />

BONELLI, Gustavo. Commentario ao códice di commercio. Milão: Ed. Rio, 1938.<br />

BORGES, João Eunápio. Do aval. 3 ed., revista e aumentada. Rio de Janeiro:<br />

Forense, 1960.<br />

______. Do aval. 4 ed. Rio de Janeiro: 1975.<br />

______. Títulos de crédito. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971/1976.<br />

BOTREL, Sérgio. A eficácia jurídica da pós-datação do cheque em relação ao<br />

endossatário - concorrência entre os princípios cambiários e o princípio da função<br />

dos contratos – repercussão na contagem do prazo prescricional. Revista da<br />

Faculdade Mineira de Direito, v.7, n.13, p.172-182. Belo Horizonte: 2004.<br />

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o código civil. Diário<br />

Oficial da União. Brasília, jan.2002.<br />

_______. Lei nº 5.474, de 18 de julho de 1968. Dispõe sobre as duplicatas, e dá<br />

outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, jul.1968.<br />

_______. Lei n. 57.663 de 24 de janeiro de 1966. Dispõe sobre a promulgação das<br />

conversões para adoção de uma lei uniforme em matéria de letras de câmbio e<br />

notas promissórias. Diário Oficial da União. Brasília, jan.2006.<br />

_______. Decreto n. 57.663, de 24 de janeiro de 1966. Promulga as conversões<br />

para adoção de uma lei uniforme em matéria de letras de câmbio e notas<br />

promissórias. Diário Oficial da União. Brasília, jan.1966.<br />

93


BULGARELLI, Waldirio. Títulos de crédito. 5 ed. São Paulo: Atlas, 1993.<br />

________. Contratos mercantis. 8. ed. São Paulo: Atlas, 1995.<br />

CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Exoneração da fiança. Disponível em:<br />

. Acesso em: 13 set. de 2006.<br />

CALDAS, James Corrêa. Fiança em benefício da ordem. Disponível em:<br />

. Acesso em: 13 set. de 2006.<br />

COBO. El aval en el derecho argentino. Argentina, (s/a).<br />

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, 4 ed., v.1. São Paulo: Saraiva.<br />

2000.<br />

______. Curso de direito comercial. 6 ed. Revisada e atualizada, de acordo com o<br />

novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10/01/2002). São Paulo: Saraiva, 2002.<br />

______. Curso de direito comercial, 8 ed., v.3. São Paulo: Saraiva. 2005.<br />

COSTA, Wille Duarte. Títulos de crédito: de acordo com o novo código civil. Belo<br />

Horizonte: Del Rey, 2003.<br />

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v.1, 14 ed., revisada. São<br />

Paulo: Saraiva, 1998.<br />

DIREITO BANCÁRIO ON-LINE. Alienação fiduciária. Disponível em: Acesso em: 27 set. de 2006.<br />

DÓRIA, Dylson. Curso de direito comercial. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 1998.<br />

ENCICLOPÉDIA® MICROSOFT®. Crédito. Disponível em: Encarta 2001. © 1993-<br />

2000 Microsoft Corporation. Acesso em: 31 ago. de 2006.<br />

______. Título de crédito. Disponível em: Encarta 2001.©1993-2000 Microsoft<br />

Corporation. Acesso em: 01 set. de 2006.<br />

FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 3 ed. São Paulo: Atlas,<br />

2003.<br />

FERREIRA, Aurélio Buarque Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.<br />

Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.<br />

FIUZA, Ricardo. Novo código civil. São Paulo: Saraiva, 2002.<br />

FURTADO, Jorge Henrique C. P. Títulos de crédito. Porto-Portugal: Almeida, 2000.<br />

GALIZZI, Oliva Gustavo. O aval e a outorga conjugal instituída pelo código civil<br />

de 2002. Disponível em:. Acesso<br />

em: 24 ago. de 2006.<br />

94


JÚNIOR THEODORO, Humberto. A fiança e a prorrogação do contrato de<br />

locação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 66-83.<br />

LEITE, Flamarion Tavares Leite. Os nervos do poder: uma visão cibernética do<br />

direito. São Paulo: Max Limonad, 2001.<br />

LOPES, André Cortes Vieira. Inoponibilidade das exceções ao terceiro de boa-fé<br />

nos títulos cambiais. Disponível em:<br />

. Acesso em: 02 set. de 2006.<br />

LUCCA, Newton. Aspectos da teoria geral dos títulos de crédito. São Paulo:<br />

Pioneira, 1979.<br />

MACHADO, José Luiz Silva. Os títulos de crédito e seus caracteres singulares,<br />

v.1. Salvador: Forense, 1961.<br />

MARTINS, Fran. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 1997/2000.<br />

MEZZOMO, Marcelo Colombelli. Aval e a meação do cônjuge. Disponível em:<br />

http.://. Acesso em: 23 set. de 2006.<br />

MIRANDA, Maria Bernadete. Os títulos de crédito como documentos<br />

representativos de obrigações pecuniárias. Disponível em:<br />

http://www.direitobrasil.adv.br/artigos/artigo6.pdf>. Acesso em: 31 ago. de 2006 (a).<br />

________. O título de crédito eletrônico no novo código civil. Disponível em:<br />

. Acesso em: 02 set. de 2006.<br />

PEREIRA, Caio Mário Silva. Instituições de direito civil. 3 ed. Rio de Janeiro:<br />

1992.<br />

PEREIRA NETO, Miguel. Os documentos eletrônicos utilizados como meio de prova<br />

para a constituição de título executivo extrajudicial e judicial. In: PEREIRA NETO,<br />

Miguel. Internet: o direito na era virtual. Rio de Janeiro: Forense, 2000.<br />

95


PINTO, Paulo José Silva. Direito cambiário: garantia cambiária e direito<br />

comparado. Rio de Janeiro: Forense, 1948.<br />

REQUIÃO. Rubens. Curso de direito comercial. 23 ed., v.2. São Paulo: Saraiva,<br />

2003.<br />

RIBEIRO, Cláudio Barroso. Protesto de créditos públicos inscritos ou não em<br />

dívida ativa. Disponível em: .<br />

Acesso em: 27 set. 2006.<br />

RIOS, Vitor Eduardo. Títulos de crédito e contratos mercantis. 2 ed., v.22. São<br />

Paulo: Saraiva, 2005.<br />

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio F. Títulos de crédito. 2 ed. Revista e atualizada, de<br />

acordo com o novo código civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.<br />

SANTOS, Theophilo Azevedo. Manual dos títulos de crédito. Rio de Janeiro:<br />

Companhia Editora Americana CEA, 1971.<br />

SANTOS, J. M. Carvalho. Código civil brasileiro interpretado: direito das<br />

obrigações. 12. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1988.<br />

SOBRINHO CORRÉIA, Adelgício Barros. Dos efeitos da outorga uxória no aval e na<br />

fiança após o Código Civil de 2002. Disponível em:<br />

. Acesso em: 22 set. de 2006.<br />

SZKLARWOSKY, Leon Fredja. A informática e o mundo moderno. Disponível:<br />

. Acesso em: 22 set. de 2006.<br />

96

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!